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Edição Especial

INOVAÇÃO PARA SAÚDE, QUALIDADE DE VIDA E


SEGURANÇA NAS EMPRESAS BRASILEIRAS

Organização
Alberto José Niituma Ogata

Co-organizadora
Viviane Coelho Lourenço

2017
TEMAS AVANÇADOS
EM QUALIDADE DE VIDA
VOL. 6

Edição Especial
INOVAÇÃO PARA SAÚDE, QUALIDADE
DE VIDA E SEGURANÇA NAS
EMPRESAS BRASILEIRAS

Organizador
Alberto José Niituma Ogata

Co-organizadora
Viviane Coelho Lourenço

Capa, projeto gráfico


e editoração eletrônica:
Studio Moons Copyright © 2017 by Alberto José Niituma Ogata e
studiomoons@uol.com.br SESI – Departamento Nacional

Impressão: Qualquer parte desta obra poderá ser reproduzida,


Midiograf desde que citada a fonte.

Catalogação elaborada pela Bibliotecária Roseli Inacio Alves


CRB 9/1590

T278 Temas avançados em qualidade de vida v.6 / Alberto José Niituma Ogata
organizador ...[et al.]. – Londrina : Midiograf, 2017.
288 p. : il.

Vários colaboradores.
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-8396-104-8

1. Saúde do trabalhador – Ergonomia. 2. Gestão de segurança – Trabalho.


3. Inovação – Saúde e segurança. 4. Qualidade de vida no trabalho. 5. Longe-
vidade. 6. Higiene ocupacional. 7. Ogata, Alberto José Niituma.

CDU 658.512.2:614.8

Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Sumário

APRESENTAÇÃO...............................................................................................9
INTRODUÇÃO.................................................................................................13
AUTORES...........................................................................................................19
EXPEDIENTE...................................................................................................287

CAPÍTULO 1
DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA INOVAÇÃO EM
GESTÃO DA SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHADOR...................31
Georgia Antony Gomes de Matos
Emmanuel de Souza Lacerda
Antonio Eduardo Muzzi Machado
Introdução............................................................................................33
Mudanças no cenário da gestão da segurança e saúde
pelas empresas: em busca de uma gestão integrada.............................34
Porque inovar em saúde e segurança: evolução dos modelos de
gestão nas empresas..............................................................................38
Inovação SESI em saúde e segurança: dimensões para atuação ........50
Conclusão ............................................................................................61
Referências...........................................................................................62

CAPÍTULO 2
PREVENÇÃO DA INCAPACIDADE..............................................................65
André Luna
Cristina de Sá Pacheco Rocha
Eliane Cardoso Sales

Sumário 5
Lívia Maria Aragão de Almeida Lacerda
Newton Augusto Novis Figueiredo
Introdução............................................................................................67
A incapacidade para o trabalho, contexto e tendências.....................69
Conceito de incapacidade para o trabalho..........................................71
Prevenção da incapacidade na empresa..............................................75
Considerações finais.............................................................................91
Referências...........................................................................................93

CAPÍTULO 3
LONGEVIDADE SAUDÁVEL.........................................................................97
Noélly Cristina Harrison Mercer
Viviane Gariba de Souza
A longevidade no Brasil e no mundo................................................100
Os efeitos do envelhecimento no mercado de trabalho....................106
Os desafios da segurança e saúde no trabalho na longevidade dos
trabalhadores......................................................................................113
Conclusão...........................................................................................119
Referências.........................................................................................121

CAPÍTULO 4
ERGONOMIA..................................................................................................125
Alfredo Manoel dos Santos Santana
Ana Paula da Silva
Carla A. Gonçalves Sirqueira
Cláudia Ferreira Mazzoni
Flávia Komatsuzaki
Fernanda Oliveira Petry
Panorama da ergonomia e seu impacto na segurança e saúde..........127
Ergonomia sob a ótica de normatizações no Brasil............................132
Conceitos e atuações da ergonomia...................................................135
Abordagem da ergonomia de participação........................................140
Necessidades e tendências da ergonomia .........................................142

6 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Gerenciamento dos riscos ergonômicos.............................................144
Considerações finais...........................................................................149
Referências.........................................................................................150

CAPÍTULO 5
HIGIENE OCUPACIONAL............................................................................153
Antonio Augusto Fidalgo Neto
Paulo Roberto Furio
Rachel Novaes Gomes
Sergio Noboru Kuriyama
A saúde ocupacional na indústria......................................................157
Perspectivas e da higiene ocupacional na indústria do futuro...........180
Referências.........................................................................................187

CAPÍTULO 6
TECNOLOGIAS PARA SAÚDE....................................................................193
Eloisio Andrey Bergamaschi
Fernanda Vargas Amaral
Greice Bordignon
Luciano Caminha Junior
Marcela Purificação
Rodrigo Bastos Fernandes
Viviane Coelho Lourenço
Marcelo Benedet Tournier
A 4ª revolução industrial e os paradigmas para a saúde ...................196
Tecnologias para saúde no ambiente de trabalho..............................203
Tecnologias para saúde em prol do comportamento seguro
e saudável do trabalhador..................................................................206
A gestão em saúde por meio das tecnologias.....................................208
Tecnologias e modelos preditivos.......................................................215
Considerações finais...........................................................................222
Referências.........................................................................................223

Sumário 7
CAPÍTULO 7
ECONOMIA PARA SAÚDE E SEGURANÇA.............................................227
Francisco Cláudio Patrício Moura Filho
Haidinne Fernandes Coelho
Juliana de Albuquerque Souza
Kassandra Maria de Araújo Morais
Luciana Cavalcanti Costa
Introdução..........................................................................................229
Impacto das doenças crônicas não transmissíveis.............................231
Impacto do absenteísmo.....................................................................237
Impacto na saúde suplementar..........................................................240
Compreendendo ROI e VOI.............................................................244
Benefícios tangíveis e intangíveis do investimento em saúde e
segurança............................................................................................248
Referências.........................................................................................253

CAPÍTULO 8
FATORES PSICOSSOCIAIS ..........................................................................257
Gabriela Hermann Cibeira
Graziela Alberici
Letícia Lessa da Silva Silveira
Luciana Mercês de Lucena
Roberta Cristina Sawitzki
Panorama dos fatores psicossociais relacionados ao
ambiente de trabalho.........................................................................259
Transformações no mundo do trabalho e riscos ocupacionais..........261
Abordagem dos fatores psicossociais no ambiente de trabalho ........263
Cenário da saúde mental no brasil e no mundo................................267
Necessidades futuras em gestão de fatores psicossociais:
conceito e tendências.........................................................................274
Considerações finais...........................................................................282
Referências.........................................................................................283
Apresentação

9
N
o Brasil, o cenário da saúde e de segurança na indústria brasi-
leira tem apresentado uma mudança no sentido de valorização
dos investimentos em Segurança e Saúde no Trabalho (SST) e
Promoção da Saúde, enquanto fatores de redução de custos e aumento
da produtividade do trabalhador.
Uma pesquisa inédita realizada pelo SESI, junto a 500 executivos
de RH revelou que, para quase metade destes gestores os investimentos
realizados em saúde e segurança geraram redução nas faltas ao traba-
lho e aumento da produtividade no chão de fábrica, assim como, para
34,8% destes gestores, verificou-se uma redução de custos com a saúde
dos trabalhadores.
Todo esse empenho da indústria brasileira já apresenta resultados
positivos para as empresas e trabalhadores. Dados da Previdência Social
apontam uma redução de 22%, entre 2007 e 2014, no número de aciden-
tes de trabalho, por grupo de 100 mil profissionais da indústria.
Entretanto, os avanços para a gestão em saúde e segurança na in-
dústria impõem uma mudança de paradigma, aumento na efetividade de
atuação, que considere a inovação como fator chave para o desenvolvi-
mento de soluções integradas, por meio da incorporação de tecnologias,
com foco em gestão.
A abordagem deste livro ressalta, portanto, a importância da ino-
vação face aos desafios de saúde e segurança na indústria brasileira acerca
de algumas temáticas, que nortearam a criação dos Centros de Inovação
do SESI, quais sejam: prevenção da incapacidade, longevidade saudável,
ergonomia, higiene ocupacional, tecnologias para saúde, economia para
saúde e segurança e fatores psicossociais.

Apresentação 11
Ao longo dos oito capítulos desta publicação é possível aprofundar
o debate e a compreensão destas temáticas, destacando as propostas de
linhas e projetos de pesquisa aplicada, desenvolvidas pelos Centros de
Inovação do SESI, em prol da criação de tecnologias e metodologias ino-
vadoras, em parceria com a indústria.
Espera-se assim, que esta iniciativa possa contribuir para a dissemi-
nação de conhecimento em conjunto com os profissionais e especialistas
de SST e Promoção da Saúde, potencializando a incorporação de tecno-
logias inovadoras na indústria brasileira, contribuindo com a melhoria da
saúde e segurança dos trabalhadores e consequente aumento da compe-
titividade na indústria brasileira.

Robson Braga de Andrade


Confederação Nacional da Indústria
Presidente
Introdução

13
O
presente volume da coleção “Temas Avançados em Qualidade
de Vida” traz textos inéditos escritos pelos especialistas dos cen-
tros de inovação em saúde e segurança do Serviço Social da
Indústria (SESI). Trata-se de uma contribuição para a atualização, refle-
xão e ampliação do escopo de atuação em temas relevantes selecionados.
O trabalho é um espaço muito importante na vida das pessoas e
proteger e promover a sua saúde, e as ações estratégicas realizadas neste
espaço trazem impactos relevantes na qualidade de vida, em suas vá-
rias dimensões e domínios (físico, financeiro, social, emocional, comu-
nitário, ambiental e espiritual), assim como o desempenho individual e
coletivo no trabalho com impactos importantes na competitividade das
organizações.
O Brasil tem muitas etapas a percorrer até estar entre os principais
países em competitividade e o capital humano sempre deverá ser situada
entre as prioridades as serem abordadas e desenvolvidas.
Os temas abordados neste volume foram selecionados pela rele-
vância, mas não pretendem esgotar o assunto e sim trazer tópicos impor-
tantes que, muitas vezes, não têm sido abordados na literatura técnica
em nosso país.
O primeiro capítulo aborda os novos conceitos, princípios e práti-
cas de prevenção da incapacidade e contribuem para enfrentar a proble-
mática dos afastamentos e do retorno ao trabalho. Os autores ressaltam
que nas empresas, os resultados alcançados com o desenvolvimento de
estratégias baseadas nessa nova forma de pensar e atuar na incapacidade
têm sido promissores. Os profissionais envolvidos com recursos humanos,
saúde do trabalhador e supervisão de equipes de trabalho devem estar

Introdução 15
envolvidos neste enfrentamento. Algumas propostas de intervenção são
bastante simples e pequenas mudanças são capazes de gerar resultados
positivos e são aplicáveis ao mercado brasileiro. Ressaltam que essa nova
forma de pensar não se configura em uma metodologia com passos pre-
viamente determinados, o que permite grande diversidade de iniciativas.

No capítulo sobre “longevidade saudável”, os autores buscaram re-


visitar as principais discussões teóricas sobre o tema, além de apresentar
os novos desafios à Saúde e Segurança no Trabalho (SST) no que se
refere à longevidade e ao envelhecimento da população. Com certeza,
o aumento da longevidade populacional, combinado à redução das ta-
xas de fecundidade e de mortalidade, representa um grande desafio para
o nosso país. Neste contexto, discutem fatores que possibilitem que o
capital humano seja visto como um ativo que proporciona valor e não
como um passivo que gera despesas cada vez maiores com aposentadoria
e saúde no futuro. Os autores sugerem a implantação de uma política de
SST que foque não apenas na gestão do envelhecimento do trabalhador,
mas, sobretudo, num programa mais amplo, que contemple toda a massa
trabalhadora, uma vez que cada geração, independentemente da idade,
possui pontos fortes e fraquezas.
O capítulo sobre “ergonomia” ressalta que, devido às exigências
de mercado e à competitividade das empresas, torna-se cada vez mais
necessário o desenvolvimento de métodos que possam contribuir para
a melhoria das condições de trabalho, garantindo a qualidade dos servi-
ços e a sustentabilidade das organizações. Sugerem que a aplicação dos
conhecimentos em ergonomia, compreendida como o estudo do rela-
cionamento entre o homem e seu trabalho, apresenta subsídios para o
reconhecimento do que se entende como fatores de risco potenciais para
gerar adoecimentos relacionados ao trabalho, bem como para reconhe-
cer as condições adequadas para o desenvolvimento da atividade laboral.
Propõem que a ergonomia, aliada ao movimento de Sistema de Gestão,
coloca-se como uma base para a proposta de melhoria contínua dos pro-

16 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


cessos produtivos e deve ser considerada para além de um instrumento
que fornece elementos para compreender a interface entre pessoas, tec-
nologia e a organização. Discutem as normas e regulamentos vigentes e
sugerem abordagens práticas e aplicáveis no dia-a-dia.
O capítulo sobre “higiene ocupacional” apresenta aspectos pou-
co conhecidos ou discutidos no ambiente corporativo e ressalta o seu
conceito em que se busca antecipar, reconhecer, controlar e prevenir
os riscos ocupacionais com potencial para afetar, de qualquer forma, o
bem-estar dos trabalhadores. Discutem a perspectiva histórica mundial
e brasileira sobre o tema, destacam tópicos importantes como o câncer
ocupacional e a exposição aos nanocompostos, assim como os novos de-
safios a serem enfrentados com a quarta revolução industrial. Ressaltam
que a pesquisa aplicada à higiene ocupacional e industrial surge então
como um fator preponderante para que a competitividade e produtivi-
dade industrial aumentem à mesma medida que a saúde ocupacional e
bem-estar dos trabalhadores.
Neste contexto, se destacam as “tecnologias para a saúde”, discu-
tidas no capítulo seguinte. Sem dúvida, o desenvolvimento de novas tec-
nologias possibilita a inovação em saúde e segurança no trabalho, uma
vez que a tecnologia digital promete revolucionar o processo de produ-
ção industrial, em termos de impacto, escalabilidade, redução dos cus-
tos, aplicabilidade e ampliação das oportunidades de receita, sobretudo
quanto aos modelos preditivos, enquanto solução para a gestão em saúde
nas empresas brasileiras. Os autores ressaltam que as tecnologias para
saúde e segurança no local de trabalho são investimentos importantes, à
medida que podem ser rentáveis no que diz respeito ao tempo e dinheiro
otimizados, por meio da inteligência gerada, os quais se traduzam em re-
sultados positivos, tanto para as empresas, quanto para os trabalhadores.
A viabilidade dos investimentos em saúde e segurança e o retorno
proporcionado é discutido no capítulo que aborda a “economia para a
saúde e segurança no trabalho”, onde os autores destacam que as orga-
nizações, não apenas em períodos de recessão e de crise econômica, bus-

Introdução 17
cam melhorar sua competitividade e visam à manutenção do seu mer-
cado e à sustentabilidade da sua marca. Alcançam por meio da análise
de dados e gestão do conhecimento, informações disponíveis para uma
gestão mais assertiva dos recursos, além do direcionamento das ações
com maior valor agregado e retorno sobre os investimentos. O capítulo
aborda questões que estão diretamente relacionadas ao impacto dos cus-
tos da saúde nas empresas, com as taxas crescentes das doenças crônicas
não transmissíveis, o benefício saúde (saúde suplementar), a produtivi-
dade e o desempenho do capital humano.
Finalmente, o capítulo sobre “fatores psicossociais” aborda um
tema que tem se revelado cada vez mais relevante na gestão em saúde nas
empresas. Os autores abordam, particularmente as questões relacionadas
às transformações no mundo do trabalho, a importância de se abordar os
fatores psicossociais no trabalho, o cenário da saúde mental no Brasil e
no mundo e as necessidades futuras na gestão de tais fatores. Concluem
com propostas para uma abordagem integrada dos fatores psicossociais,
alinhada à gestão das organizações.

Boa leitura!

Alberto José Niituma Ogata


Organizador
Autores

19
Alfredo Manoel dos Santos Santana
Graduado em Administração de empresas pela PUC-MG. Gerente de Segurança
e Saúde no Trabalho - SESI-MG.

Ana Paula da Silva


Graduada em Fisioterapia pela Universidade Federal de Minas. Especialista em
Ergonomia pela mesma instituição. Atua como assistente técnica no Centro de
Inovação SESI em Ergonomia – SESI-MG.

André Luna
Psicólogo (UFBA), mestrando em Psicologia Organizacional e do Trabalho pela
UFBA. Formação em terapia cognitivo-comportamental (CTC – Salvador). 
Presta serviço na área de psicologia organizacional e do trabalho no Centro de
Inovação SESI de Prevenção da incapacidade há 2 anos.

Antônio Augusto Fidalgo Neto


Coordenador de PD&I do Instituto SENAI de Inovação em Química Verde.
Biomédico pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Mestre em
Toxicologia pela Fundação Oswaldo Cruz, Doutorado e Pós-doutorado em ciências
na mesma instituição.

Antonio Eduardo Muzzi


Gestor de Promoção da Saúde do Serviço Social da Indústria com experiência de
15 anos na implantação de programas e projetos de qualidade de vida do trabalha-
dor em empresas. Formação superior em Educação Física com pós-graduação em
Metodologias de Ensino e MBA em Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho.

Autores 21
Carla A. Gonçalves Sirqueira
Graduada em Educação Física pelo Instituto de Educação Anízio Teixeira.
Especialista em Higiene Ocupacional pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas
Gerais. Especialista em Ergonomia pela Universidade Gama Filho. Mestre em
Administração de Serviços de Saúde pela UCES. Gerente do Centro de Inovação
SESI em Ergonomia – SESI-MG.

Cláudia Ferreira Mazzoni


Bacharel em Fisioterapia pela UFMG. Mestre em Ergonomia pela University of
Southern California – EUA. Doutora em Biomecânica Ocupacional pela Queen’s
University – Canadá. MBA em Gestão Estratégica de Empresa pela Fundação
Getúlio Vargas. Professora Adjunta da Universidade Fumec. Pesquisadora em
Tecnologia do Centro de Inovação SESI em Ergonomia – SESI-MG.

Cristina de Sá Pacheco Rocha


Graduação em Medicina pela Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública (1989);
Especialização em Medicina Social e Preventiva pela UFBA (1991), Sanitarista e
Médica do Trabalho; Pós-Graduação em Gestão de Saúde pela Fundação Getúlio
Vargas – FGV (2010); Gerente de Processos de Saúde SESI/DR-BA e Responsável
Técnica da Unidade SESI de Serviços em Segurança e Saúde do Trabalhador
(Salvador e RMS).
 
Eliane Cardoso Sales
Médica do Trabalho – Especialista pela Associação Nacional de Medicina de
Trabalho (ANAMT), com doutorado em Saúde Pública pela Universidade Federal
da Bahia (2009). É consultora do Serviço Social da Indústria SESI/BA onde de-
senvolve protocolos médicos, realiza auditorias às Unidades e ministra treinamentos
voltados à área, com vistas à melhoria da qualidade técnica da atenção.

22 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Eloisio Andrey Bergamaschi
Analista de Sistemas pela PUCRS com Especialização em Tecnologias de Redes
de Comunicação pela UFRGS e Mestrado em Administração, ênfase em Gestão
de Tecnologia e Produção pela UFRGS. Atualmente atua como Coordenador de
Inovação no Centro de Inovação SESI em Tecnologias para Saúde.

Emmanuel de Souza Lacerda


Gerente Executivo de Saúde e Segurança do SESI Departamento Nacional.
Graduado em Engenharia Mecânica, pós-graduado em Gestão de Tecnologias
Ambientais e mestrado em Administração Estratégica. Executivo com mais de 20
anos de experiência profissional, com atuação em empresa industrial de grande por-
te e entidades do Sistema S.

Fernanda Oliveira Petry


Bacharel em Fisioterapia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Especialista em Fisioterapia do Trabalho e Ergonomia pela Faculdade de Ciências
Médicas de Minas Gerais. Analista de Saúde do Centro de Inovação SESI em
Ergonomia – SESI-MG. Responsável pela supervisão técnica dos serviços de
Ergonomia – SESI-MG.

Fernanda Vargas Amaral


Doutora em Investigación en Actividad Física y Deporte pela Universidade de
Málaga, Espanha, com reconhecimento e validação pela Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Investigación en Actividad Física y
Deporte pela Universidad de Málaga. Bacharel em Ciências do Desporto pela
Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC).

Flávia Komatsuzaki
Graduada e mestre em Estatística pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Atualmente atua como professora assistente e coordenadora do curso de Engenharia
da qualidade da Faculdade de Engenharia de Minas Gerais (FEAMIG). Analista
de Projetos no Centro de Inovação SESI em Ergonomia – SESI-MG.
Autores 23
Francisco Cláudio Patrício Moura Filho
Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Campina Grande - PB, es-
pecialista em Medicina do Trabalho pela Universidade Estácio de Sá - RJ, atua
como Médico do Trabalho de Centro de Inovação SESI em Economia para a Saúde
e Segurança como pesquisador sênior.

Gabriela Hermann Cibeira


Doutoranda e Mestre em Medicina Ciências da Saúde, Cardiologia e Ciências
Cardiovasculares pela UFRGS. Tem formação em Nutrição pela UFRGS, é
Analista Técnico Sênior da Gerência de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação
do Serviço Social da Indústria do Rio Grande do Sul/FIERGS, e Professora da
Universidade La Salle.

Georgia Antony Gomes de Matos


Mestre em Educação pela Universidade de Brasília (2001), especialista em Gestão
de Iniciativas Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2004) e soció-
loga pela Universidade de Brasília (1993). Especialista em desenvolvimento indus-
trial do SESI Departamento Nacional.

Graziela Alberici
Formação em Psicologia pela PUCRS, Pós-graduação em Saúde do Trabalhador
pela UFRGS e Psicologia Clínica pelo Instituto Contemporâneo de Psicanálise
e Transdisciplinaridade. É Analista Técnico Sênior da Gerência de Pesquisa,
Desenvolvimento e Inovação do SESI do Rio Grande do Sul/FIERGS, responsável
Técnica do Centro de Inovação SESI em Fatores Psicossociais.

24 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Greice Bordignon
Graduada em Nutrição pela UFSC (2000), especialização em Gerência de
Serviços de Alimentação e Nutrição pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (2005), MBA em Gestão de Segurança dos Alimentos pelo SENAI SC
(2008). Formação em Coach em Saúde e Bem- Estar pela CAREVOLUTION
(2016). Atua como pesquisadora em promoção de saúde no Centro de Inovação
SESI em Tecnologia para Saúde.

Haidinne Fernandes Coelho


Graduada em Enfermagem pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR
e Especialista em Enfermagem do Trabalho pela Universidade
Estadual do Ceará - UECE, atualmente cursa Direito na UNIFOR.
Atua no Centro de Inovação em Economia para Saúde do SESI-CE como
pesquisadora.

Juliana de Albuquerque Souza


Graduada em Administração de Empresas pela Universidade de Fortaleza –
UNIFOR e Especialista em Marketing pela Universidade Estadual do Ceará –
UECE. Atualmente é analista no Centro de Inovação SESI em Economia para
Saúde e Segurança.

Kassandra Maria de Araújo Morais


Graduada em Psicologia pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR. Especialista
em Gerenciamento da Qualidade e Gestão de Pessoas, ambos pela Universidade
Federal do Ceará - UFC, com MBA em Consultoria Organizacional pela Faculdade
de Tecnologia SENAI CTAI – Florianópolis. Gerente de Saúde e Segurança para
a Indústria no SESI-CE.

Autores 25
Letícia Lessa da Silva Silveira
Formação em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
Pós-graduação em Gestão de RH - UFSC, Gerontologia Social - UFRGS e Saúde
do Trabalhador – UFRGS, Curso de extensão em Socioterapia, Gerente da Área
de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação do SESI do Rio Grande do Sul/FIERGS.

Lívia Maria Aragão de Almeida Lacerda


Médica (UFBA), Especialização sob a forma de Residência em Medicina Preventiva
e Social, com concentração em Epidemiologia (ISC/UFBA), mestre em Saúde
Coletiva, com concentração em Planejamento e gestão em saúde (ISC/UFBA).
Coordena o Centro de Inovação SESI em Prevenção de Incapacidade.

Luciana Cavalcanti Costa


Especialista em Inovação Tecnológica pelo Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia do Ceará - IFCE. Graduada em Letras pela FAFIRE, Mestre em
Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Ceará - UFC e Especialista
em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UECE. Coordenadora de Pesquisa,
Desenvolvimento e Inovação, no Centro de Inovação SESI em Economia para
Saúde e Segurança.

Luciana Mercês de Lucena


Mestre em Psicologia pela Universidade Católica de Brasília (UCB), Pós-
Graduação em Psicologia Clínica da Saúde (UNB), em Ontologia da Linguagem
(UCB), e em Gestão de Projetos (UCB). É certificada pela Newfiled Consulting
em Coach Ontológico Organizacional. É Analista de Desenvolvimento Industrial
no SESI DN. Coordena a Rede SESI de Fatores Psicossociais.

Luciano Caminha Junior


Graduado e mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina, com
ênfase em psicologia cognitiva e psicofisiologia. Pesquisador no Centro de Inovação
SESI em Tecnologias para Saúde e cursa graduação em Engenharia Eletrônica no
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina.
26 Gestão de Programas de Qualidade de Vida
Marcela Purificação
Graduada e Mestre em Biotecnologia pela Universidade Federal de Santa Catarina
- UFSC. Em Pesquisa com passagens em Instituições do Uruguai e Japão com pes-
quisa básica de saúde e OGM’s. Atua no Centro de Inovação SESI em Tecnologias
para Saúde como QA e Consultora em Biotecnologia.

Marcelo Benedet Tournier


Graduado em Medicina pela UFSC, com Residência Médica em Medicina Física
& Reabilitação (Fisiatria) e Pós-Graduação em Tratamento da Dor. Mestre em
Gestão de Tecnologia e Inovação em Saúde. Possui formação em Design Thinking
e Design de Comportamento pela Universidade Stanford. Diretor do Centro SESI
de Inovação em Tecnologias para Saúde.

Newton Augusto Novis Figueiredo
Médico do Trabalho especialista pela Associação Nacional de Medicina do Trabalho
(ANAMT), Residência em Ortopedia e Traumatologia (MEC-UFBA/SESAB).
Atua no SESI DR BA na coordenação médica de PCMSO e gestão do absenteís-
mo. Atua também como consultor para a Gerência de Qualidade de Vida (SESI
- GQV) e Instituto SESI de Inovação em gestão do absenteísmo e retorno ao tra-
balho - BA.

Noélly Cristina Harrison Mercer


Enfermeira pela Universidade Estadual do Norte do Paraná. Especialista em en-
fermagem do trabalho. Mestre em Psicologia Social Comunitária pela Universidade
Tuiuti do Paraná. Atualmente atua como coordenadora do Centro de Inovação Sesi
em Longevidade e Produtividade.

Autores 27
Paulo Roberto Furio
Graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade Católica de Petrópolis
- UCP (1994), Pós-graduação em Gestão Estratégica pela UCAM (1999),
Especialização em Meio Ambiente pela COPPE/UFRJ (2010) e Mestrado em
Administração pela FGV-EBAPE (2005). Atualmente, é o responsável pela
Gestão dos Instituto SENAI de Tecnologia Ambiental-IST Ambiental e Instituto
SENAI de Inovação em Química Verde-ISI QV.
 
Rachel Novaes Gomes
Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro-UERJ (1996), Mestrado em Biologia Celular e Molecular pela FIOCRUZ
(2001) e Doutorado em Biologia Celular e Molecular pela FIOCRUZ (2006).
Pesquisadora Analista do Instituto SENAI de Inovação em Química Verde, de-
senvolvendo projetos de pesquisa aplicada para a indústria química farmacêutica,
farmoquímica e similares com ênfase em Inovação, especialmente em Processos
Bioquímicos e Bioprocessos.

Sergio Noboru Kuriyama


Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (1996), mestrado em Biologia (Biociências Nucleares) pela Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (2000) e doutorado em Toxicologia - Charite University
of Medical School Berlin (2005). De 2005 a 2006, fez o Pós-Doutorado no
Laboratório de Toxicologia Ambiental da Fundação Oswaldo Cruz.

Roberta Cristina Sawitzki


Doutoranda e Mestre em Administração - PPGA/UFRGS (Programa de Pós-
graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
Bacharel em Administração pela Escola de Administração da UFRGS, Analista
Técnico Sênior da Gerência de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação do Serviço
Social da Indústria do Rio Grande do Sul/FIERGS e Professora Visitante da
UNISC.

28 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Rodrigo Bastos Fernandes
Graduado em Engenharia Industrial Mecânica pela Universidade Tecnológica
Federal do Paraná (2009), mestrado em Génie des Systèmes Mécaniques -
Universitè de Technologie de Compiègne (2009) e doutorado em Engenharia
Mecânica pela Universidade Federal de Santa Catarina (2016). Atua como pes-
quisador no Centro de Inovação SESI em Tecnologias para Saúde.

Viviane Gariba de Souza


Economista pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Engenharia da
Produção com ênfase em Gestão Estratégica pela Universidade Tecnológica Federal
do Paraná. Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do
Paraná. Atualmente atua como analista técnica no Centro de Inovação Sesi em
Longevidade e Produtividade.

Viviane Coelho Lourenço


Graduada em Nutrição, com pós-graduação em Consultoria Alimentar e
Nutricional pela Universidade Federal de Goiás. Mestranda em Gestão da Saúde
para a Competitividade pela FGV. Atua na área de promoção da saúde para o traba-
lhador da indústria, no âmbito do Serviço Social da Indústria – SESI. Interlocutora
Nacional do Centro de Inovação SESI em tecnologias para Saúde.

Autores 29
Desafios e
oportunidades para
inovação em gestão da
segurança e saúde do
trabalhador
Georgia Antony Gomes de Matos
Emmanuel de Souza Lacerda
Antonio Eduardo Muzzi Machado

31
INTRODUÇÃO

O
propósito do presente capítulo é estimular a reflexão sobre os
impactos das transições epidemiológica e demográfica da popu-
lação e dos novos modos de produção e organização do traba-
lho no cenário de saúde e segurança na indústria.
A nova revolução industrial 4.0, associada ao envelhecimento po-
pulacional e ao crescimento das doenças crônicas não transmissíveis –
DCNT nos permite identificar desafios em saúde, novos paradigmas de
atenção à saúde e oportunidades para desenvolvimento de programas
adequados para seu enfrentamento.
O contexto destas transformações englobará desde perspectiva do
trabalhador que inclui dimensões relacionadas ao seu estilo de vida e a
sua inserção aos diferentes modelos de trabalho, marcados pela rápida in-
corporação de tecnologias, internet das coisas, robotização, uso de inte-
ligência artificial, nanotecnologia e sistemas de produção colaborativos.
Este capítulo visa, portanto, delimitar três questões relacionadas
a esse cenário de transformação ao expor a necessidade de mudanças
nas dimensões da gestão de saúde na indústria, quais sejam: i) uma visão
integrada dos sistemas de saúde assistencial, ocupacional e previdenciá-
rio; ii) o foco na atuação em promoção e prevenção de riscos à saúde e
segurança como pilares deste novo modelo de gestão; e, por fim, iii) as
dimensões para o desenvolvimento de uma estratégia de inovação pelo
SESI para atuação neste contexto.
gestão da segurança e saúde do trabalhador 33
O SESI busca assim reafirmar o seu papel de indutor de práticas
de excelência voltadas à melhoria da saúde e segurança do trabalhador
com reflexos na produtividade e competitividade da indústria brasileira.

Mudanças no cenário da gestão da


segurança e saúde pelas empresas: em
busca de uma gestão integrada

O peso da saúde e segurança nos custos das empresas tem apresen-


tado uma tendência de crescimento nos últimos anos impulsionado prin-
cipalmente pelas despesas com seguro acidente de trabalho e benefícios
de saúde suplementar para os trabalhadores e dependentes.
Na perspectiva da segurança e saúde ocupacional, não obstante
a expressiva redução da do coeficiente de incidência de acidentes na
indústria(de 28,8 para cada mil trabalhadores em 2010 para 20,2 em
2015) verificou-se um aumento dos custos com seguro de acidente de
trabalho (AEAT e AEPS/MPS, 2017).
Tal situação demonstra como a incidência de agravos a saúde afeta
o orçamento das organizações devido aos custos do Seguro de Acidente de
Trabalho (SAT), calculado com base no Fator Acidentário de Prevenção
(FAP). O FAP foi instituído pela Lei 10.666/03 e é um multiplicador que
varia de 0,5 a 2. É aplicado sobre a contribuição do grau de incidência de
incapacidade laborativa decorrente dos Riscos Ambientais de Trabalho.
O SAT varia entre 1% a 3%, incidindo sobre a folha de pagamento,
podendo resultar em uma majoração ou redução dessa contribuição
(art. 22, Lei 8.212/91). Assim, empresas com mais acidentes e acidentes
mais graves em uma subclasse - Classificação Nacional de Atividades
Econômicas (CNAE) passarão a contribuir com um valor maior. Entre
2011 e 2015 os custos com SAT cresceram 31% e em 2015 alcançaram o
valor de R$ 28.076.969.292,25 (Gráfico 1).

34 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Gráfico 1 Seguro Acidentario do Trabalho - SAT (*10.000)
Fonte: Nota SIC Cetad/Copan nº 129, de 26/06/2017, Centro de Estudos Tributários
e Aduaneiros – Receita Federal

O seguro de acidente de trabalho deveria dar o pronto e adequado


atendimento ao trabalhador afastado devido a acidente ou doença, ga-
rantindo que esse receba a assistência necessária para sua recuperação,
reabilitação (quando for o caso) e retorno ao trabalho. Entretanto, o que
se observa são afastamentos prolongados, sem acompanhamento, com
baixa capacidade de reabilitação. Quanto mais o trabalhador demora
em retornar ao trabalho, maior é a dificuldade para a sua reinserção. As
falhas no atendimento contribuem para o processo de exclusão do traba-
lhador do mundo do trabalho e redução de sua renda familiar.
No âmbito dos benefícios de saúde suplementar concedidos pelas
empresas, a situação atual é crítica do ponto de vista da sua sustenta-
bilidade, refletida por aumentos dos seus custos acima da inflação. Os
planos de saúde coletivos empresariais representam 80% da cobertura
da saúde suplementar. Somente o setor industrial é responsável por uma
em cada três pessoas cobertas pelos planos de saúde empresariais (ANS,
2011), envolvendo aproximadamente 10 milhões de trabalhadores e de-
pendentes. A manutenção desse benefício para os trabalhadores e seus
dependentes exige inovação e ajustes no seu processo de gestão e de
regulação, no modelo de atenção e no incentivo ao protagonismo dos
diferentes atores envolvidos.

gestão da segurança e saúde do trabalhador 35


Um primeiro aspecto que onera o sistema de saúde suplementar
é a baixa racionalidade e efetividade na utilização dos serviços de saúde
cobertos, sem ênfase na promoção e prevenção de doenças. Chapchap,
Torelly, Pena & Alves Junior (2017) alertam que o sistema de saúde é
majoritariamente fragmentado, episódico, reativo e focado na doença. O
Brasil convive com o aumento da procura por atendimento de emergên-
cia, não apenas pelo crescimento de acidentes e traumas, mas pelo mo-
delo de atendimento às DCNT que usa a mesma lógica de atendimento
a casos agudos no nível secundário, sem a devida continuidade que a
atenção precisa. Mais de 50% dessas demandas poderiam ser resolvidas
na atenção primária e não em uma estrutura de alta complexidade vol-
tada para casos de emergencia ou para atenção de maior complexidade.
Esse padrão gera mais desperdício de recursos humanos, materiais,
exames, procedimentos e deixa de atender emergencialmente quem real-
mente precisa. Segundo estudo do Banco Mundial referido pelos autores,
cerca de 30% das internações hospitalares são desnecessárias e geram
desperdício de cerca de 10 milhões de reais por ano. O incremento do
índice de Variação de custos médico-hospitalares (VCMH) chegou a
20,3% em 2016 (IESS, 2017).
Dados do Mapa Assistencial da Agência Nacional de Saúde
Suplementar de 2017 demonstram que no Brasil se realizam mais exa-
mes de ressonância magnética e tomografia computadorizada que paises
desenvolvidos, com taxas de crescimento na ordem de 22% nos últimos
2 anos. É um cenário que oferta grande quantidade de serviços, mas não
necessariamente os serviços mais necessários à população. É organiza-
do por um mecanismo de remuneração por procedimentos e não por
resultados. “É um modelo descoordenado que permite que os custos do
desperdício sejam continuamente transferidos entre todos os atores da
cadeia de saúde, num ciclo vicioso de negociações que não geram valor
e perpetuam a dinâmica do perde-perde. Nesse contexto, inexiste coo-
peração entre os diferentes atores, o que gera mais desconfiança, mais
ineficiência e mais consumo de recursos destinados não à saúde, mas ao
sustento da saúde suplementar.” (Chapchap et al, 2017).

36 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


É preciso pensar, portanto, um modelo de atenção à saúde do
trabalhador que tem como um dos fundamentos a ideia de que existem
diversificados determinantes sociais da saúde. É fundamental que as
empresas, em conjunto com os governos, sistemas de saúde, universidades,
focalizem os multiplos determinantes de saúde relacionados aos agravos
à saúde, adotando conceitos e práticas ligados a focos mais integrativos
ou holísticos de proteção e promoção e gestão integrada da saúde nos
ambientes de trabalho.
O ambiente de trabalho passa a ser percebido como um impor-
tante espaço na promoção da saúde integral e bem estar (não apenas
fator de risco). Essa perspectiva tem se fortalecido ao longo dos anos e
é apontada em diversos dispositivos legais e políticos que posicionam a
saúde como direito universal que demanda estratégias intersetoriais de
ação, com ampla participação da sociedade civil e da iniciativa privada
enquanto colaboradores e executores de intervenções e programas.
O ambiente saudável (do inglês “healthy settings”) é um movimen-
to global capitaneado pela OMS que tem suas origens no movimento
de “saúde para todos” e na chamada Carta de Ottawa para promoção
da saúde (MS, 2002). A Assembleia Mundial de Saúde da Organização
Mundial de Saúde aprovou, em 2007, o documento denominado “Saúde
dos Trabalhadores: Plano de Ação Global (PAG)” (WHO, 2007) cuja
principal finalidade era estimular os Estados Membros a agirem, desen-
volvendo uma agenda propositiva no tocante à saúde do trabalhador.
Dois anos mais tarde, avançando no desenvolvimento do PAG, a
OMS desenvolveu, com apoio de seus centros colaboradores de vários
países, entre eles o SESI, um manual no qual apresentava um modelo
para o desenvolvimento de iniciativas voltadas para ambientes de traba-
lho saudáveis (healthy workplace framework and model) (OMS, 2010). O
documento, traduzido para o Brasil pelo SESI, intitulado “Ambientes de
trabalho saudáveis: Um modelo para ação” apresenta uma proposta de
ação abrangente que focaliza em três aspectos principais: riscos psicos-
sociais e físicos relacionados ao trabalho; promoção e apoio à adoção de

gestão da segurança e saúde do trabalhador 37


comportamentos saudáveis; e, determinantes ambientais e sociais mais
amplos (nível comunitário e organizacional).
A ideia subjacente à proposta do ambiente de trabalho saudável
é estabelecer um arcabouço metodológico e oferecer diretrizes para o
desenvolvimento de políticas públicas, da infraestrutura, de tecnologias
e de parcerias que permitam, em certa medida, combinar os esforços de
saúde ocupacional aos de saúde pública, maximizando a aplicação de
recursos e os resultados que podem ser alcançados.
A gestão integrada da saúde do trabalhador é importante para a
melhoria do cuidado em saúde, dos seus resultados para a qualidade de
vida e também, para a competitividade das empresas e para a sustentabi-
lidade do sistema de saúde. O estado de saúde dos trabalhadores se refle-
te economicamente nos custos das empresas através do absenteísmo, da
perda de produtividade, dos afastamentos prolongados e da aposentado-
ria precoce, nos custos com substituição do funcionário na atividade e na
piora no clima organizacional.

Porque inovar em saúde e segurança:


evolução dos modelos de gestão nas
empresas

Além dos desafios já conhecidos e dos que surgem com as novas


configurações de trabalho, com novas ocupações e formas de produção, a
saúde dos trabalhadores é desafiada por transformações epidemiológicas,
demográficas, nutricionais. De acordo com dados recentes do monitora-
mento de cargas de doenças, agravos e riscos (Global Burden of Diseases
– GBD, IHME, 2017), no Brasil 86,7% dos anos vividos com incapaci-
dades (Years lived with disability - YLD's) e 71% dos anos perdidos por
incapacidades ou morte precoce (Disability Adjusted Life Years – DALYs)
são decorrentes de DCNT (Gráficos 2 e 3).

38 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Gráfico 2 Anos vividos com incapacidades - YLD's por DCNT e por riscos ocupacionais,
todas as idades, ambos sexos, Brasil
Fonte: IHME – GBD Results Visualization - 2017

Gráfico 3 Anos de vida perdidos por incapacidades e morte precoce - DALY's, por DCNT
e por riscos ocupacionais todas as idades, ambos sexos, Brasil
Fonte: IHME – GBD Results Visualization - 2017

O GBD apresenta dados entre 1990 e 2015 dos quais é possível


verificar uma redução de 25% da exposição a riscos sanitários, polui-
ção doméstica, desnutrição e atraso infantil e tabagismo. Por outro lado,
observa-se nesse mesmo período o crescimento de 25% no sobrepeso e
obesidade, no uso abusivo de álcool e drogas e a exposição a riscos ocu-
pacionais (Kirsten e Ogata, 2017). Os dados demonstram claramente
melhorias em questões ambientais e sanitárias e o crescimento dos de-

gestão da segurança e saúde do trabalhador 39


safios relacionados a riscos comportamentais e metabólicos. Esses dados
evidenciam a transição epidemiológica vivenciada globalmente e a ne-
cessidade de novos modelos de saúde. Os riscos comportamentais são
responsáveis, isoladamente, por quase metade das causas de agravos à
saúde e, associado a outros fatores, respondem por cerca de 75% de todos
os agravos.
No Brasil e em outros países de todos os continentes, as cinco prin-
cipais causas de anos vividos com incapacidades (YLD's) e de anos per-
didos por incapacidades ou morte precoce (DALY's) estão relacionadas
a doenças e agravos associados a riscos comportamentais e metabólicos.
Destaca-se a presença, em quase todos os países, dos distúrbios muscu-
loesqueléticos, dos transtornos mentais e uso de drogas e outras DCNT's
como principais fatores de anos vividos com incapacidades (YLD's)
(Tabela 1).
As cinco primeiras causas de anos perdidos por incapacidades e
morte precoce (DALY's) são praticamente as mesmas em vários países.
Entretanto, no Brasil, diferentemente das tendências observadas em ou-
tros países, a violência e automutilação são a 6ª causa de DALY's. Esses
desafios trazem ainda, ao Brasil, a necessidade de lidar com o estigma
e mitos relacionado aos temas para que estratégias efetivas possam ser
adotadas (Tabela 2).

Tabela 1 Anos vividos com com incapacidade (YLD's), ambos os sexos, todas as idades
Fonte: Healthdata.org

Anos vividos com incapacidades (YLD's), ambos sexos, todas as idades, 2015
CAUSAS China Japão Argentina USA Brasil Índia Alemanha México
Músculo-esqueléticos 1 2 2 2 3 3 1 3
Mental & abuso de drogas 2 3 1 1 1 2 3 1
Outras DCNTs 3 1 3 3 2 1 2 2
Diabetes 4 5 5 4 5 6 5 4
Neurológica 5 4 4 5 4 5 4 5

40 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Tabela 2 Anos perdidos com incapacidades e morte precoce (DALY's), ambos sexos,
todas as idades, 2015
Fonte: Healthdata.org

CAUSAS China Japão Argentina USA Brasil Índia Alemanha México


Cardiovascular 1 2 1 1 1 1 1 3
Neoplasias 2 1 2 2 4 9 2 5
Mental & abuso de drogas 3 6 4 3 3 7 5 4
Outras DCNTs 4 4 3 5 2 4 4 2
Músculo-esqueléticos 5 3 5 4 5 11 3 6
Diabetes 6 7 6 6 7 6 7 1
Respiratória 7 9 9 8 13 5 9 14
Neurológica 8 5 10 7 8 13 6 7
Acidente de trânsito 9 12 13 11 10 14 14 13
Lesão não intencional 10 8 8 9 11 10 8 10
Violência e automutilação 13 11 12 10 6 14 15 8

Dados do Fórum Econômico Mundial permitem estimar perdas


globais associadas às doenças crônicas não transmissíveis - DCNT que
podem chegar a U$ 47 trilhões no período de 2011 a 2030. (Goulart,
2011).
Dados oficiais demonstram que quase sete em cada dez adultos são
fisicamente inativos e cerca oito em cada dez adultos não se alimentam
adequadamente, em termos, por exemplo, do consumo adequado de fru-
tas e hortaliças. Além disso, mais da metade da população brasileira aci-
ma de 18 anos apresenta excesso de peso. Tais condições podem impactar
diretamente o setor produtivo, que assim deve se preparar para lidar com
uma força de trabalho que precisa de suporte e atenção contínua à saúde
(Kirsten e Ogata, 2017).

gestão da segurança e saúde do trabalhador 41


Estima-se, por exemplo, que a inatividade física está associada à
perda de 53,8 bilhões de dólares com custos globais diretos com saúde, de
13,7 bilhões de dólares em perda de produtividade e em 13,4 milhões de
anos perdidos com incapacidades e morte precoce em 2013. (Ding-Ding
e cols., 2016).
Neste contexto, qual seria o impacto da inatividade física en-
quanto fator de risco para a saúde ocupacional? Monitoramento desen-
volvido pelo SESI desde 2010 em empresas industriais que desenvolvem
programas ou intervenções de promoção da saúde demonstra que a ina-
tividade física de lazer, a percepção negativa de estresse, a percepção
negativa de relacionamentos e a percepção negativa de saúde são os
fatores preditivos para a perda de produtividade e bem estar no traba-
lho. Os trabalhadores que reportam algum desses indicadores têm mais
chances de sentir falta de disposição e ânimo para trabalhar, de reportar
dor e desconforto para realizar as tarefas de trabalho, de ter dificuldades
para se concentrar no trabalho, e de faltar ao trabalho por problemas
de saúde (SESI, 2017). Trabalhadores que reportam inatividade física
de lazer, por exemplo, tem 1,65 vezes mais chances de reportar dor e
desconforto para realizar as tarefas de trabalho que um trabalhador fisi-
camente ativo no lazer (Gráfico 5).

Gráfico 4 Inatividade física de lazer vs Perda de Produtividade (razão de chance –


odds ratio)
Fonte: SESI, 2017

42 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Os trabalhadores que referem percepção negativa de relaciona-
mentos, apresentam 3,4 vezes mais chances de faltar ao trabalho e 3,6
mais chances de ter dificuldades de concentração no trabalho (Gráfico 6).
Trabalhadores que referem percepção negativa de saúde tem quase
4 vezes mais chances de sentir dor e desconforto ao realizar tarefas de tra-
balho, 3,3 mais mais de não se sentir disposto para trabalhar (Gráfico 7).
Os trabalhadores que referem percepção negativa de estresse po-
dem reportar 4,5 mais vezes falta de disposição e dificuldades de concen-

Gráfico 5 Percepção negativa de relacionamentos vs perda de produtividade – razão


de chance (odds ratio)
Fonte: SESI, 2017

Gráfico 6 Percepção negativa de saúde vs perda de produtividade – razão de chace


(odds ratio)
Fonte: SESI, 2017

gestão da segurança e saúde do trabalhador 43


Gráfico 7 Percepção negativa de estresse vs perda de produtividade – razão de chance
(odds ratio)
Fonte: SESI, 2017

tração no trabalho que trabalhadores com percepção positiva de estresse


(Gráfico 8).
Os trabalhadores menos concentrados, menos dispostos e com
mais dor são também mais vulneráveis a acidentes e doenças ocupa-
cionais e ao desenvolvimento de agravos que estão entre as principais
causas de YLDs como transtorno mental e abuso de drogas, distúrbios

Gráfico 8 Percentual de trabalhadores que apresentam 5 a 10 fatores de risco em


estilo de vida
Fonte: SAEVP, SESI, 2011 a 2016. (SESI, 2017)

44 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


musculoesqueléticos. Estudo desenvolvido por Schulte, Pandalai, Wulsin
& Chun (2012) demonstra que a maioria das doenças e acidentes (ocu-
pacionais ou não) experimentados pelos trabalhadores são multifatoriais.
Entretanto, as evidências demonstram que as intervenções de saúde e
segurança desenvolvidas no trabalho ainda não consideram essas inte-
rações entre fatores de risco à saúde pessoais e ocupacionais. O estudo
apresenta 32 exemplos de quatro modelos combinatórios dessa interação
e demonstra que modelos que focalizam essa interação conseguem me-
lhores resultados (Figura 1).

Figura 1 Modelo de interação entre fatores de risco ocupacionais e pessoais


Fonte: Schult et al, 2012

gestão da segurança e saúde do trabalhador 45


O estudo estabeleceu modelos preditivos correlacionando fatores
pessoais como sexo, tabagismo, abuso de álcool, envelhecimento, doen-
ças crônicas, fatores genéticos, obesidade com fatores de risco ocupacio-
nais. A obesidade, por exemplo, é um fator de risco para o desenvolvi-
mento de disturbios osteomusculares, assim como fatores psicossociais
no trabalho. Associados esses dois riscos aumentam, portanto, as chan-
ces do trabalhador desenvolver distúrbios osteomusculares (modelo 1).
No modelo 2 há uma condição preexistente de risco no trabalho
como atividade que demanda muito tempo agachado ou de joelhos e que
traz risco de desenvolvimento de artrite ocupacional. O trabalhador obe-
so, quando associado a esse trabalho, aumenta as chances de incidência
da artrite relacionada ao trabalho.
No modelo 3 a obesidade é uma condição preexistente de risco
para incidência de asma no trabalhador. A exposição a fatores asmato-
gênicos no trabalho aumentam as chances do trabalhador ter asma rela-
cionada à obesidade.
No modelo 4, a obesidade gera apnéia do sono. Trabalho sedentá-
rio aumenta as chances de gordura no fígado. A interação entre apnéia
do sono e gordura no fígado se retroalimentam.
Os desafios colocados pelo cenário de saúde apontam para a ne-
cessidade de focalizar riscos comportamentais que não se encontram,
necessariamente, apenas no contexto específico do trabalho, mas, dis-
seminado em valores e práticas da sociedade contemporânea. Por isso,
é preciso superar a fragmentação da atenção em saúde, implantar ações
inter setoriais que potencializem vários espaços e contextos e considerem
os múltiplos determinantes.
Na área de saúde do trabalhador, a partir das evidencias disponí-
veis, o entendimento de que o seu adoecimento é originado isoladamen-
te nos processos de trabalho vem sendo revisto. O cenário é de mudanças
profundas, passando de um foco exclusivo em modelos uni causais e com
atenção baseada no controle de determinantes laborais das chamadas
doenças ocupacionais para um cenário mais contemporâneo, no qual a

46 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


evolução tecnológica, os riscos comportamentais e metabólicos, o enve-
lhecimento populacional e as novas estratégias de trabalho surgem como
importantes determinantes do processo saúde-doença.
Evidências disponíveis sugerem que programas focalizando aspec-
tos de saúde e segurança, cultura e ambiente organizacional, e estilos
de vida podem ser efetivos, proporcionando melhoria da saúde e, por
conseguinte, transferindo parte deste impacto para indicadores de com-
petitividade (Polanyi, 1996; Duxbury, 2001). A intervenção sanitária
com foco nestas dimensões além de permitir a melhoria da saúde dos
trabalhadores, tem potencial para alterar o ciclo no qual a insalubridade
e insegurança do ambiente de trabalho provocam redução da competiti-
vidade empresarial (Figura 2).
O sistema de monitoramento do SESI nas empresas que desen-
volvem serviços ou programas de promoção da saúde verificou que, ao
longo de 4 anos, houve redução de 30% na proporção de trabalhadores
em perfil de medio alto e alto risco (que acumulam 5 a 10 fatores de risco
no estilo de vida) (Gráfico 9).
O mesmo monitoramento mostrou redução de 25% no absenteís-
mo de 3 ou mais dias (redução de 5% para 4%). Em uma população total
de 2 milhões de trabalhadores, essa redução significaria uma economia
de 720 mil dias de trabalho por ano.
Os resultados apontam também para redução média de aproxi-
madamente 25% nos fatores de presenteísmo como falta de motiva-
ção para ir ao trabalhar, falta de disposição para trabalhar, dificuldade
de concentração no trabalho, dor e desconforto para realizar as tare-
fas de trabalho.
Recente artigo publicado na revista Harvard Business Review
Brasil apresenta os resultados de programa integrado de saúde do traba-
lhador implantado internamente em uma instituição hospitalar. O pro-
grama estruturou ambulatório de atenção primária à saúde articulado
e complementar à saúde ocupacional e com coordenação dos demais
níveis de saúde. O programa também contempla intervenções de pro-

gestão da segurança e saúde do trabalhador 47


Figura 2 Interrelação entre a insalubridade e insegurança do ambiente de trabalho e a
redução da competitividade
Fonte: Adaptado de Burton, 2010 por Mauro Barros, 2013

moção de bem estar focalizadas em fatores de estilo de vida entre outras


iniciativas de gestão geral como central de apoio, prontuário eletrôni-
co e núcleo de regulação. O objetivo foi romper o modelo de gestão de
doenças e para passar a fazer a gestão da saúde, “romper com modelos
de atendimento episódico agudo curativo para um modelo de preven-
ção e cuidado contínuo”, na qual o paciente é também sujeito da sua

48 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Gráfico 9 Percentual de trabalhadores que referem absenteísmo por problemas de
saúde
Fonte: SAEVP, SESI, 2011 a 2016. (SESI, 2017)

Gráfico 10 Percentual de trabalhadores que referem presenteísmo


Fonte: SESI, 2017

atenção à saúde. (Chapchap e cols, 2017). Esse modelo incluiu atributos


como longitudinalidade, integralidade, coordenação, resolubilidade, co-
municação, responsabilização, foco na família, competência cultural e
orientação comunitária. “O exame periódico deixou de ser uma consulta
orientada para os controles de riscos ocupacionais e passou a ser uma
oportunidade de cuidar efetivamente do trabalhador” (Chapchap e cols,
2017). Os resultados observados incluiu alto indice de participação e de
satisfação, redução de consultas em prontos socorros, redução de inter-

gestão da segurança e saúde do trabalhador 49


nações, cirurgias e exames desnecessários, melhores resultados clínicos e
adoção de hábitos de vida mais saudáveis.
O quadro epidemiológico, de mudanças na organização do trabalho
e de esgotamento e fragmentação dos sistemas de saúde de apoio ao tra-
balhador exige, portanto, que o modelo de saúde ocupacional tradicio-
nal seja ampliado em favor de um modelo de saúde dos trabalhadores.

Inovação SESI em Saúde e Segurança:


dimensões para atuação

Os cenários de saúde, os novos modos de produção e organização


do trabalho, as novas tecnologias e novos modelos de atenção à saúde
apresentam movimentos semelhantes no que se refere ao reconhecimen-
to dos múltiplos determinantes de saúde e segurança; à busca da inte-
gralidade da saúde e sua coordenação na atenção primária; à defesa do
planejamento e simulação da segurança e saúde desde à concepção do
produto; à ampliação do foco para resultados além de procedimentos,
para fatores de bem-estar além de fatores de risco; ao fomento da sinergia
e da colaboração.
A revolução tecnológica na saúde e segurança do trabalho avança
para o uso de realidade aumentada, simulador de processos e exoesque-
letos, que facilitam tarefas de produção com redução de erros, manuten-
ção de posturas físicas adequadas, supervisão de normas de segurança
e aumento a produtividade. Sistemas de saúde e segurança do trabalho
também se beneficiam das exponenciais bases de dados para predizer pa-
drões comportamentais, gerar diagnósticos precoces e detecção de de-
ficiências do sistema de gerenciamento. Contribuem, dessa forma, para
atuação precoce na atenção à saúde e prevenção de incapacidades e para
inibição da ocorrência de atos inseguros e de acidentes. As tecnologias
da informação podem, portanto, desempenhar um papel vital na redu-
ção de risco, racionalização e coordenação de cuidados; na melhoria da

50 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


comunicação entre os diferentes atores do sistema de saúde e diferentes
níveis de atenção; para captura e correção de erros; para o deslocamento
do foco de procedimentos para resultados em saúde e bem-estar.
Áreas tradicionais de segurança e saúde no trabalho, como
a ergonomia, higiene ocupacional, prevenção de incapacidades,
reabilitação e retorno ao trabalho são desafiadas a expandir seu foco de
atuação, superando as dicotomias entre riscos e saúde para focalizar todo
o espectro entre eles. Por outro lado, novas temáticas e determinantes
de saúde do trabalhador como envelhecimento populacional, gestão
integrada da saúde, fatores psicossociais e contribuição de novas
tecnologias para a gestão e o atendimento em saúde surgem como
dimensões fundamentais de inovação e do adequado enfrentamento dos
desafios atuais.

Prevenção da incapacidade
O crescente custo para trabalhadores, suas famílias, empresas e
sociedade e o longo caminho do processo de reabilitação associado ao
crescente número de anos vividos com incapacidades tem estimulado
estudos, em especial acerca de prevenção de incapacidades relacionadas
a disturbios musculoesqueléticos e transtornos mentais. Novos concei-
tos e práticas impulsionam a superação do modelo biomédico, centrado
na relação médico e paciente, em prol de uma abordagem ecológica,
biopsicossocial. Nessa abordagem o sujeito é visto em interação com o
ambiente em diferentes níveis, não apenas com o trabalho. Esse novo
paradigma vem promovendo mudanças nas políticas, programas e práti-
cas de prevenção, reabilitação e retorno ao trabalho. O conceito de in-
capacidade ganho novos contornos. Antes, focado apenas na limitação
do indivíduo, passa agora a focalizar no resultado da interação do indi-
víduo com o meio. A Classificação Internacional de Funcionalidades –
CIF publicada pela OMS permite o olhar não apenas para as disfunções,
mas também para as funcionalidades presentes. Nessa nova abordagem

gestão da segurança e saúde do trabalhador 51


outros profissionais são considerados fundamentais no processo de pre-
venção, como os supervisores e gestores de RH, que passam a observar
fatores de risco como desmotivação, faltas e atrasos ao trabalho, dificul-
dade de concentração, isolamento social. A partir desses dados, buscam
uma comunicação clara com o trabalhador visando compreender suas
dificuldades e encontrar arranjos provisórios que permitam ao traba-
lhador manter-se ativo e ao mesmo tempo prevenir seu adoecimento.
Quando necessário, buscam apoio das áreas de segurança e saúde ocu-
pacional buscando readequar o trabalho e encaminhar o trabalhador
tratamentos ou atendimentos em promoção da saúde voltados à ma-
nutenção da sua saúde e capacidade funcional. O trabalhador é, nessa
abordagem, sujeito fundamental no processo, bem como sua equipe de
trabalho que precisa estar sensibilizada para conviver e apoiar arranjos
temporários ou definitivos visando a convivência com as diferentes con-
dições de saúde e capacidades dos seus membros. O próprio trabalho é
visto como um novo ator na promoção da saúde e no sucesso do pro-
cesso de recuperação e reabilitação. Inúmeros estudos evidenciam que
a adequação do ambiente de trabalho traz mais efetividade ao processo
de retorno do trabalhador.
Os fatores ambientais, nessa abordagem, podem facilitar ou criar
barreiras para a atuação profissional e social dos indivíduos. Um exemplo
claro dessa perspectiva refere-se a atuação social e profissional dos indi-
víduos mais velhos no Brasil. O problema é que as pessoas envelhecem e
se tornam incapazes ou os ambientes sociais são excludentes e não estão
preparados para conviver com idosos? Não se trata, portanto, de colocar
a incapacidade unicamente no indivíduo, mas na interação desses com o
meio. Com base nisso, varios países têm alterado suas políticas e normas
previdênciárias e trabalhistas que favorecem adequações no contexto de
trabalho que sejam mais inclusivas à diversidade de características pes-
soais do trabalhador não apenas em termos técnicos, mas em termos de
recursos de saúde.

52 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Tecnologias para saúde na revolução industrial 4.0
Estamos vivenciando a revolução industrial 4.0, que é a fusão da
tecnologia digital e da internet com a indústria convencional. Máquinas
e seres humanos conectados, interagindo em tempo real. Genética, inte-
ligência artificial, robótica, nanotecnologia, impressão 3D e biotecnolo-
gia são exemplos dessa revolução.
Do ponto de vista da saúde, a revolução industrial 4.0 traz uma
crescente utilização de dispositivos vestíveis (wearables) para diagnós-
tico, monitoramento e maior participação do sujeito na gestão da sua
saúde. Além de tornarem o acesso mais fácil, conferem maior autono-
mia aos sujeitos e favorecem o auto-cuidado apoiado. A disseminação
destes equipamentos estimula o crescimento de dados de saúde gerados
no mundo relacionados a sinais motores (atividade física) e fisiológicos
(pulso cardíaco, resposta galvânica da pele, frequência respiratória, on-
das cerebrais), acompanhando o estado do usuário por longos períodos
de tempo, incluindo o sono. Esses dados individuais serão analisados por
inteligências artificiais e profissionais de saúde serão capazes de fornecer
diagnósticos mais precisos e personalizados a partir do conhecimento do
histórico de cada indivíduo, além de permitir que doenças sejam diagnos-
ticadas em estágios muito mais precoces. A tecnologia digital facilita o
acesso a informações, agendamento e atendimentos; permite ao paciente
receber cuidados coordenados, concentrados em suas necessidades es-
pecíficas ao invés de ter que buscar diferentes profissionais de saúde por
conta própria. A computação em nuvem facilita a atuação das plata-
formas interoperáveis em Saúde (HIE – Health Information Exchange),
possibilitando uso mais racional e resolutivo do sistema de saúde com
consequente redução de custos.
Na saúde, a tecnologia pode ser usada tanto para reabilitar quanto
para aprimorar a capacidade das funções humanas (cognição, audição,
visão e mobilidade). As interfaces entre cérebro e computador, os we-
arables e exoesqueletos são alguns dos exemplos. Os exoesqueletos, ou
robôs wearables, são projetados para serem usados ao lado de membros

gestão da segurança e saúde do trabalhador 53


humanos que podem aumentar, complementar, substituir ou melhorar a
capacidade e funções desses membros. Estes dispositivos mecânicos se
encaixam no corpo do usuário e trabalham em conjunto com os movi-
mentos do usuário.

Ergonomia
As revoluções industriais anteriores foram observadas e diagnosti-
cadas a posteriori. Porém, a Indústria 4.0 está sendo prevista e organizada
previamente. Essa transição de processos reativos para proativos pode
ser sentida em várias esferas da atuação humana, inclusive nos processos
de saúde e segurança. Assim, tanto a organização dos processos quanto a
previsibilidade dos acontecimentos adversos devem ser mapeados a prio-
ri, como forma de aperfeiçoar os processos e prevenir eventos adversos.
É nesse contexto que se fortalece também a ergonomia de concepção,
que permite agir precocemente, possibilitando a projeção do ambiente,
do processo de trabalho ou do produto com vistas à prevenção de pro-
blemas. Assim, fatores de riscos ergonômicos, tais como posturas inade-
quadas, layouts desfavoráveis, altas demandas cognitivas e regras organi-
zacionais exigentes podem ser evitados antes do estabelecimento de uma
nova linha de produção. 

Higiene ocupacional
Embora seja consenso que a tecnologia das informações e da co-
nectividade tenha grande potencial de proporcionar melhorias na qua-
lidade do ambiente de trabalho, preveem-se também novos desafios no
âmbito da saúde ocupacional. A área de higiene ocupacional precisa se
adaptar e se antecipar com uma visão mais holística dos novos desafios
que irão surgir com a consolidação desta 4ª revolução industrial e que
estarão diretamente relacionadas às mudanças das organizações e dos
trabalhadores, os avanços tecnológicos, o trabalho virtual, a globalização

54 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


e o envelhecimento da força de trabalho como, por exemplo: a crescente
dependência da tecnologia da informação com longas horas gastas atrás
de computadores e diminuição da interação humana; danos sobre a saú-
de física e psicológica em pessoas que trabalham com tecnologia; mani-
pulação de crescente volume de informação que elimina as barreiras de
tempo e espaço gerando estresse e o acesso em tempo real a informação;
desvinculação da atividade a um local e horário específico podendo o
trabalhador ficar conectado ao trabalho 24 horas por dia; a inatividade
física associada ao crescente trabalho virtual e automatizado; a exposição
excessiva da visão e da pele à luz dos equipamentos; a manutenção du-
rante muitas horas seguidas a posturas desafiadoras à anatomia humana,
além de outros fatores sociais.
O cenário de transições e da revolução industrial 4.0 pressiona a
Higiene Ocupacional a um novo paradigma científico, que mescla várias
metodologias multi- e interdisciplinares, com um olhar mais holístico so-
bre o indivíduo. A investigação ocupacional passa a buscar as intercone-
xões entre segurança, ergonomia, estresse e saúde física e fisiológica; não
apenas dos riscos de doenças, mas dos benefícios para a saúde e o bem-
-estar. Não apenas prevenir doenças, mas promover saúde. Não apenas
reduzir perdas de produtividade, mas estimular o seu incremento. Nesse
sentido, o novo paradigma precisa de uma abordagem multidisciplinar,
envolvendo médicos, psicólogos, sociólogos, administração e engenharia. 
A higiene ocupacional pode, por exemplo, contar com novas
oportunidades para coletar e analisar dados de exposição e saúde sem
excluir riscos fora do trabalho, gerando conhecimento mais completo
e multivariado (dentro e fora do trabalho) sobre os riscos ocupacio-
nais. Ou seja, a antecipação de riscos da higiene ocupacional passa a
ser entendida de modo integral, afetando a saúde do trabalhador de
forma mais holística.

gestão da segurança e saúde do trabalhador 55


Longevidade saudável
O envelhecimento da população no Brasil é outro grande desafio
da atualidade. A “transição demográfica” tem implicações significativas
na área de saúde ocupacional que vai desde limitações físicas até o bem-
-estar psicológico, com impacto direto sobre a produtividade. No Brasil
o envelhecimento da população ocorre sem o devido avanço da renda
per capita e da redução da desigualdade, tornando o processo ainda mais
desafiador para os sistemas de saúde e de previdência e também para a
inclusão do potencial dessa camada da população no mundo do trabalho.
Estima-se que o Brasil seja a 6ª nação mais idosa em 2030, com 41,5 mi-
lhões de pessoas tenham mais de 60 anos no Brasil (IBGE, 2013)
Um dos desafios do envelhecimento populacional refere-se à am-
pliação do tempo de vida profissional com manutenção da saúde, bem-
-estar e capacidade produtiva. Para isso é preciso mudar a percepção da
sociedade sobre o idoso e adequar cidades, empresas e sistemas de saúde
e previdência. A vida produtiva ao longo da vida, por outro lado, é um fa-
tor fundamental para o envelhecimento ativo e saudável. Trabalhadores
mais velhos tem mais experiência, conhecimento técnico, habilidades
pessoais. De acordo com monitoramento feito pelo SESI, eles apresen-
tam mais motivação e disposição para trabalhar e menos dificuldade de
concentração no trabalho que trabalhadores mais jovens. Entretanto,
esse é um desafio adicional para a segurança e saúde no trabalho, de-
vido à maior probabilidade de perdas motoras e de capacidades físicas
e devido a questões psicossociais relacionadas a estereótipos e conflitos
intergeracionais. Assim, é preciso promover adequações no ambiente fí-
sico, na preparação de trabalhadores para o planejamento de uma longa
vida profissional, no desenho de planos de carreira dentro das organiza-
ções e até mesmo na estrutura organizacional que permita um ambiente
de trabalho mais inclusivo. Outro aspecto importante para o sistema de
saúde em geral e ocupacional em particular refere-se à promoção de en-
velhecimento saudável, cultivando ao longo de toda a vida profissional
hábitos e cuidados que permitam preservar recursos individuais (saúde

56 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


e aptidões funcionais; educação e competência; valores, atitudes e mo-
tivação). Assim, a área de SST tem um importante papel na gestão do
envelhecimento ativo de grande parcela da população.

Fatores psicossociais
Esse cenário de desenvolvimento tecnológico, inovação, digitaliza-
ção; novas formas de organização e reestruturação do trabalho; envelhe-
cimento populacional, crescimento das DCNT; desequilíbrio entre traba-
lho e vida privada; crise econômica global, desemprego e insegurança no
emprego fazem emergir novos riscos ocupacionais: os psicossociais. Os
fatores de risco psicossociais associam-se à abordagem mais integralista
da saúde entendida como um estado de completo bem-estar físico, psico-
lógico e social e não apenas como ausência de doenças. A Organização
Internacional do trabalho - OIT define fatores psicossociais no trabalho
a partir da interação entre fatores ambientais (condições de trabalho,
condições organizacionais, carga e ritmo de trabalho, conteúdo do traba-
lho) e fatores pessoais (capacidades, necessidades, cultura, gênero, esco-
laridade, estilo de vida, estado civil, idade e considerações pessoais extra
emprego) que podem, através de percepções e experiências, influenciar a
saúde, o desempenho e a satisfação no trabalho.
A interação entre ambiente e fatores pessoais pode ser negativa,
gerando prejuízos e agravos que podem não ser tão facilmente identifica-
dos ou relacionados ao trabalho quanto os acidentes de trabalho: estresse
relacionado ao trabalho, assédio moral, assédio sexual, transtornos de-
pressivos, transtornos ansiosos, transtornos de humor, transtornos men-
tais e abuso de substâncias psicoativas e álcool.
Porém, a interação pode ser positiva, gerando autoconfiança, mo-
tivação, desenvolvimento pessoal e profissional, satisfação, e melhora da
saúde do trabalhador. 
Os transtornos mentais e abuso de drogas figuram entre as três
primeiras causas de anos vividos com incapacidades em vários países,

gestão da segurança e saúde do trabalhador 57


segundo o Global Burden of Disease – GBD. No Brasil, segundo a mes-
ma fonte, os transtornos mentais e abuso de drogas são 1ª causa de anos
vividos com incapacidades (YLD's) e 2ª causa de anos perdidos por inca-
pacidades e morte precoce (DALY's).
O tema tem sido alvo de estudos multidisciplinares envolvendo
medicina, psicologia, sociologia, ergonomia. Os riscos psicossociais foram
inseridos em políticas nacionais dos ministérios de trabalho e instituições
de seguridade social. Ferramentas específicas de avaliação e campanhas
de sensibilização e esclarecimentos são desenvolvidas, a exemplo a cam-
panha realizada pela Organização Mundial da Saúde em 2017. O cresci-
mento dos riscos psicossociais fez surgir uma maior preocupação com a
instituição de normas e condutas legais e já há em muitas organizações
uma gestão sistemática desses fatores. Apesar das discussões sobre o tema
terem seu início nos anos 80, sua disseminação ainda é incipiente e desi-
gual. Em especial no Brasil há poucos estudos a respeito e muito a avançar.

Economia para saúde e segurança


Com a revolução industrial 4.0 cada vez a análise de dados e gestão
do conhecimento se tornam estratégicos para gestão e competitividade
das empresas e para que elas façam investimentos assertivos de seus re-
cursos. Isso é ainda mais necessário em cenários de grandes mudanças e
em sistemas que vem apresentando descoordenação e desperdício, como
é o caso da saúde de trabalhadores e seus familiares.
Os investimentos das empresas com saúde é o segundo maior, per-
dendo apenas para as despesas com a folha de pagamento. O aumento
constante e acima da inflação média dos gastos com saúde no Brasil,
associado aos baixos resultados em saúde tem levado empresas a buscar
melhoria nos processos de gestão e maior gestão das informações visando
corrigir rumos.
A sensação é de insustentabilidade do sistema atual, de falta de
transparência dos dados e de falta de conhecimento sobre a efetivida-

58 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


de das intervenções e programas. A falta de informações tem gerado
descrédito aos programas de qualidade de vida e saúde corporativa. Em
momentos de crise, a falta de compreensão do valor estratégico dessas
iniciativas pode gerar descontinuidade de importantes programas volta-
dos tanto para a qualidade de vida do trabalhador, como para a compe-
titividade das empresas.
Se não são bem geridos, os gastos com saúde podem ser apenas
custos, perdas, desperdícios, não contribuindo nem para a saúde e bem-
-estar dos trabalhadores e nem para a sustentabilidade e competitividade
das empresas. O foco não deve estar no fazer por fazer, mas sim fazer
para obter melhores resultados em saúde. A informação inteligente, útil,
multivariada, integrada é essencial para a gestão e a revolução 4.0 é o
momento propício para melhorias nessa área.
O retorno de investimento (ROI) quantifica o retorno financeiro
de intervenções e programas e verifica se esses são economicamente viá-
veis. Mais da metade dos gestores afirmaram, em pesquisa da KPMG, que
esperam retorno de investimento no período de 3 a 4 anos. A maioria dos
gestores acredita que a prevenção é o investimento de melhor retorno
econômico, mas afirmam não ter maturidade e capacidade para avaliar
o ROI em saúde.
A gestão dos investimentos com saúde nas empresas é importante
para reduzir desperdícios e também para garantir a alocação de recursos
em aspectos estratégicos, emergentes, prioritários para a saúde do traba-
lhador e para a produtividade da empresa.
O constante monitoramento e análise dos dados permite conhecer
o retorno e valor sobre o investimento (ROI e VOI) da saúde e bem-es-
tar dos trabalhadores para o sucesso da empresa, qualidade dos produtos,
manutenção da produtividade, força da sua marca, retenção de talentos.
Quanto maior e mais qualificado o conhecimento, melhor é a tomada de
decisão e mais efetiva será a decisão com base nos dados. Muitos resul-
tados dos programas e intervenções talvez não consigam ser demonstra-
dos financeiramente com fidedignidade, mas representam mais para os

gestão da segurança e saúde do trabalhador 59


trabalhadores e empresários do que resultados expressos pelo ROI. São
resultados que vão além da saúde do trabalhador e extrapolam o foco
de cortar custos. O VOI pode ser medido em relação ao negócio (e. de-
sempenho, lucratividade, retenção de talentos); à saúde do trabalhador
(incapacidades, hábitos relacionados à saúde); à produtividade (absen-
teísmo e presenteísmo) e a valores humanísticos (e. ânimo, satisfação no
trabalho, realização por trabalhar com propósito).
No Brasil os estudos sobre o retorno e o valor dos investimentos
(ROI e VOI) em saúde e bem-estar dos trabalhadores ainda são escassos
e fragmentados, mas o cenário de crise da saúde, transições demográfica
e epidemiológica exigem urgência no avanço dessas práticas e no desen-
volvimento dessas metodologias adequadas às peculiaridades do país.

Sistema de Gestão em SST


O debate sobre o monitoramento e avaliação dos programas cor-
porativos integrados da saúde do trabalhador abarcam também a impor-
tância, os métodos e os sistemas de gestão que apoiem as empresas a
implantar essas práticas.
O Brasil está implantando um grande sistema de informações de
SST para monitorar a atuação das empresas, o eSocial. Esse fato adiciona
mais uma pressão para que as empresas brasileiras adotem sistemas infor-
matizados e inteligentes de gestão não apenas das normas legais, mas de
todo o arcabouço de variáveis e de processos relacionados à segurança
e saúde do trabalhador e à sustentabilidade e competitividade dos negó-
cios. São alguns exemplos: simulador de processos produtivos, gestão de
Ambientes de Risco, realidade virtual em SST para treinamento, gestão
de Projetos BIM em SST, ferramentas para inovar a aplicação de modelos
e processos inovadores das indústrias.
Além de grandes desafios, esses cenários trazem grandes oportu-
nidades e exigem respostas rápidas. Por esse motivo, o SESI estruturou
oito centros de inovação que focalizam os grandes temas emergentes:

60 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


economia da saúde, ergonomia, prevenção de incapacidades e retorno
ao trabalho, tecnologias da saúde, longevidade e produtividade, higiene
ocupacional, gestão de fatores psicossociais e sistemas de gestão em SST.
O investimento do SESI em inovação visa trazer valor aos traba-
lhadores e seus familiares, a empresas e à sociedade mediante o alcance
das melhorias de gestão, integração, sinergia, saúde e bem-estar deseja-
das, contribuindo também para a competitividade do país. As inovações
tecnológicas auxiliarão a avaliação, monitoramento e predição de riscos,
a identificação de oportunidades, a adoção de modelos mais holísticos e
integrados de saúde e segurança, a compreensão dos pontos fortes e das
necessidades de correção de rumos, à reabilitação da saúde, ao treina-
mento de trabalhadores, ao empoderamento e autonomia dos trabalha-
dores para a gestão de sua saúde com suporte especializado.

CONCLUSÃO

A atuação sinérgica entre o setor público e privado e dos diferentes


atores da saúde constitui um desafio e, ao mesmo tempo, uma condição
indispensável à concretização dos objetivos estabelecidos nas políticas de
atenção à saúde. O desafio da atuação sinérgica decorre da magnitude
dos problemas a serem enfrentados, a exemplo da profunda transição epi-
demiológica e demográfica, dos novos modos de produção da indústria
4.0 e do esgotamento dos sistemas de saúde tradicionais. Mas, principal-
mente, da necessária transformação na cultura institucional de todos os
setores que não tem tradição de ação integrada.
Os novos modelos de gestão da saúde do trabalhador convidam os
diferentes atores para a superação do ciclo vicioso de perde-perde, com
fortalecimento do diálogo e colaboração entre os atores, para o desloca-
mento do foco em procedimentos para o foco em resultados, maximi-
zando a redução da exposição a riscos, a redução da morbimortalidade,
contribuindo para a melhoria do quadro de saúde, inclusão, capacidades
dos trabalhadores.
gestão da segurança e saúde do trabalhador 61
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Saúde: indicadores de saúde e mercado de trabalho. Rio de Janeiro, IBGE/MS,
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62 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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World Health Assembly, Geneva: World Health Organization, WHO 60.26; 2007.

gestão da segurança e saúde do trabalhador 63


PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE
André Luna
Cristina de Sá Pacheco Rocha
Eliane Cardoso Sales
Lívia Maria Aragão de Almeida Lacerda
Newton Augusto Novis Figueiredo

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 65
INTRODUÇÃO

E
sse capítulo foi elaborado com o propósito de apresentar novos
conceitos, princípios e práticas de prevenção da incapacidade,
discutidos internacionalmente e voltados para enfrentar a proble-
mática dos afastamentos e do retorno ao trabalho. Os avanços alcança-
dos podem promover a manutenção e qualidade de vidas sustentáveis e
produtivas, além de contribuir para a competitividade das empresas e no
desenvolvimento da sociedade.
A prevenção da incapacidade para o trabalho tem despertado o
interesse de diversos setores da sociedade, entre eles empresas, governos
e pesquisadores. Na literatura sobre o tema, evidências apontam que os
custos relacionados com a incapacidade para o trabalho são substanciais,
especialmente para as patologias osteomusculares e transtornos mentais
(UK, 2013; OECD, 2010).
Considerando que o impacto negativo desse problema atinge tanto
indivíduos, como empresas e a sociedade, novos conceitos da incapacida-
de impulsionam a superação do modelo biomédico, centrado na relação
médico paciente, e sugerem a adoção de uma abordagem biopsicossocial,
na qual há uma importante interação entre o sujeito e os diversos aspec-
tos que envolvem o amplo conceito de ambiente. Essa reestruturação do
pensamento leva a mudanças na concepção e organização de políticas e
de intervenções neste campo de atuação.

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 67
Diversos países estão revendo suas políticas de seguridade social
para concessão de benefícios por incapacidade, contemplando a possi-
bilidade de afastamento parcial do trabalho (OECD, 2010; KAUSTO et
al., 2014), além do aperfeiçoamento nas práticas de reabilitação, consi-
derando novas formas de atuar na gestão do retorno ao trabalho com a
participação da empresa.
Nas empresas, os resultados alcançados com o desenvolvimento de
estratégias baseadas nessa nova forma de pensar e atuar na incapacidade
têm sido promissores. Os profissionais envolvidos com recursos huma-
nos, saúde do trabalhador e supervisão de equipes de trabalho ganha-
ram destaque. Algumas propostas de intervenção são bastante simples e
pequenas mudanças são capazes de gerar resultados positivos. Na pers-
pectiva da redução de custos e aumento da produtividade, intervenções
organizacionais antecedem e se somam a intervenções multidisciplinares
voltadas para os indivíduos (MARTIMO et al., 2010).
Quando abordagens organizacionais envolvem melhor comuni-
cação entre trabalhador com um agravo e liderança, verifica-se que o
tempo discorrido para o retorno ao trabalho é menor (NOBEN et al.,
2015). Nessa direção, evidências de custo efetividade têm sido demons-
tradas em intervenções incluindo a participação ativa dos supervisores
no processo de prevenção da incapacidade e gestão do retorno ao traba-
lho (SHAW et al. 2011). Além disso, o uso de práticas cognitivo com-
portamentais frente às experiências de dor por distúrbios musculoesque-
léticos (SCHWEIKERT et al., 2006) e a aplicação dos conhecimentos
avançados em fisioterapia têm influenciado prognósticos mais favoráveis
(HUNTER, 2006). 
Com base nesse pressuposto, a reestruturação de práticas leva em
conta as representações dos sujeitos sobre incapacidade, bem como a
existência de barreiras e facilitadores para a permanência e retorno ao
trabalho que não são relacionadas apenas ao tratamento e reabilitação
de uma doença. A cooperação, a comunicação no ambiente de trabalho,
o manejo adequado de trabalhadores com dor crônica, a autoeficácia en-

68 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


quanto a crença na capacidade de adotar determinados comportamentos
e, a interdisciplinaridade traduzida na participação e trocas entre psi-
cólogos, fisioterapeutas entre outros profissionais são elementos impor-
tantes que caracterizam o processo inovador para tratar de um tema de
relevância nos tempos atuais.
Nos tópicos que se seguem, o leitor encontrará um maior aprofun-
damento sobre as novas abordagens frente ao problema dos afastamen-
tos por distúrbios musculoesqueléticos, bem como, sobre as tendências
e estratégias para a prevenção e redução da incapacidade, sobretudo no
âmbito da empresa.

A incapacidade para o trabalho,


contexto e tendências

A incapacidade para o trabalho é um fenômeno complexo, de al-


cance mundial crescente e alto custo para indivíduos, empresas e so-
ciedade. A discussão no cenário internacional está calcada no impacto
negativo relacionado aos aspectos individuais, sociais e de custos para
governos e empresas (OECD, 2010). Na Holanda, o absenteísmo e a
redução da produtividade alcançam 26 milhões de euros, quase 5% do
Produto Nacional Bruto (NOBEN et al., 2012). Nos Estados Unidos,
em 2014, as ausências do trabalho por doença ou lesão, na indústria,
comprometeram em média 1,9%, do total de horas semanais, usualmen-
te trabalhadas. Neste caso específico, as pessoas trabalhavam em média
menos de 35 horas semanais, numa jornada habitual de 35 horas ou mais
por semana (BUREAU OF LABOR STATISTICS, 2015).
No Brasil, cerca de 2,5 milhões de benefícios por incapacidade
temporária e 250 mil por incapacidade permanente, são concedidos
anualmente para os segurados pela Previdência Social que, por motivo
de doença ou de acidente relacionados ou não ao trabalho, passaram
a apresentar limitações físicas ou psíquicas que os impediram de con-

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 69
tinuar sua atividade (BRASIL, 2015). Observa-se que cerca de 50%
dos trabalhadores, que estão vinculados ao Programa de Reabilitação
Profissional do INSS, permanecem afastados do trabalho por mais de 240
dias (SANTOS; LOPES, 2015). Esse achado causa preocupação, tendo
em vista que os trabalhadores afastados por um longo prazo apresentam
uma maior dificuldade para retornar ao trabalho.
Os afastamentos por lesões e traumas causados por acidentes são
as principais causas de concessão de benefícios temporários devido à in-
capacidade para o trabalho. Os afastamentos por distúrbios musculoes-
queléticos e os transtornos mentais, que muitas vezes estão associados às
doenças musculoesqueléticas, são a segunda e a terceira causas de con-
cessão de benefícios por incapacidade temporária na indústria (BRASIL,
2015). Estes problemas de saúde, muitas vezes, não estão diretamente
relacionados ao trabalho, mas geram afastamentos prolongados e bar-
reiras para o retorno e a permanência do trabalhador na vida produtiva.
Para o trabalhador, a incapacidade para o trabalho é um desafio,
pois quando prolongada, tende a impactar na sua vida familiar, levar a
perda de renda, baixa autoestima, desvalorização social, além da depen-
dência de assistência médica e de seguridade social (ODEEN, 2013).
Escuta recente, realizada pelo SESI com diversas empresas indus-
triais, evidenciou que, para a empresa, a incapacidade para o trabalho
traz vários desafios. Destacam-se como principais: a queda na produti-
vidade, sobretudo devido aos afastamentos de curto prazo que desorga-
nizam e reduzem a produção; a dificuldade no processo de retorno ao
trabalho, principalmente em trabalhadores afastados por longo prazo; as
recidivas de afastamento de curto e de longo prazo; e os custos com os
dias de trabalho perdidos, horas extras, substituições, novas contrata-
ções, capacitações, Seguro Acidente de Trabalho devido ao aumento do
Fator Acidentário de Prevenção, Termos de Ajustes de Conduta (TAC),
ações regressivas, ações judiciais, entre outras implicações.

70 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Conceito de incapacidade para o
trabalho

O aprofundamento nesse tema aponta para muita imprecisão no


conceito de incapacidade para o trabalho. Coexistem diversas concep-
ções, muitas dessas, ainda consideram a incapacidade como um proble-
ma exclusivo do indivíduo. Os modelos utilizados para analisar o tema
na atualidade são diversos, entre eles destacam-se: o modelo Biomédico
centrado no binômio médico/paciente e também no diagnóstico; o Social
que busca explicar a partir de determinantes correlatos as razões dos su-
jeitos se tornarem incapazes; e o Forense que imprime um rigor peri-
cial e tecnicista na definição de dano e limitação funcional (KNAUF;
SCHULTZ, 2016).
Diante de múltiplos significados para o mesmo problema, faz-se
necessário definir o um conceito a ser adotado, pois a compreensão do
fenômeno sob perspectivas diversas gera conflitos na comunicação com
os atores implicados, entre eles, os profissionais de saúde, trabalhado-
res, familiares, representantes dos estabelecimentos, sindicatos, Instituto
Nacional de Seguro Social (INSS), Ministério do Trabalho e Ministério
Público do Trabalho (MPT) (BAHIA, 2014).
Em 2001, a OMS publicou a Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), na qual a definição de in-
capacidade foi ampliada, passando a considerar a interação entre o indi-
víduo portador da enfermidade e o seu meio social. Especificamente, a
incapacidade passou a ser considerada como resultante da interação en-
tre uma disfunção apresentada pelo indivíduo (orgânica ou da estrutura
do corpo) e as limitações ou restrições nas suas atividades e participação
social. Os fatores ambientais, nessa abordagem, atuam como facilitadores
ou barreiras para o desempenho das atividades e participação social desse
indivíduo (OMS, 2004). Inclui-se entre os pressupostos da CIF a noção
de que todos ficarão incapazes, por algum tempo, em algum momento da
vida e, para isso, existe a necessidade de valorização das capacidades e

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 71
funcionalidades diante de algum grau de limitação ora apresentada pelos
indivíduos.
Nessa abordagem o diagnóstico específico de doença não é mais o
principal ponto de partida. A incapacidade será considerada a partir da
interação entre determinados contextos e os impactos negativos que o
adoecimento produz. Loisel e Côté (2013) propõem um novo paradigma,
partindo do modelo da História Natural da Doença, de Leavell e Clark
(1965), como uma referência histórica, que orienta as estratégias de pre-
venção nos níveis primário, secundário e terciário, e concentram seus ar-
gumentos na importância da identificação e intervenção sistêmicas sobre
os determinantes da incapacidade.

Determinantes da incapacidade para o trabalho


Esses autores reforçam o entendimento de que a maioria dos de-
terminantes da incapacidade para o trabalho não está circunscrita a um
distúrbio, mas também se associa a outros fatores como, preocupações
dos trabalhadores, percepções sobre o trabalho, condições de trabalho
ou atitudes dos atores sociais envolvidos no processo de permanência,
reabilitação e retorno ao trabalho. Destacam a importância do acesso à
serviços de saúde resolutivos e à eficiência no sistema de concessão de
benefícios sociais que, também contribuem para a determinação da inca-
pacidade para o trabalho.
Nessa perspectiva, o trabalhador com incapacidade está no centro
de uma rede de interações dinâmicas que envolve ele próprio, portador
de uma determinada condição de saúde (doença, trauma, lesão, distúr-
bio), com o seu sistema pessoal (aspectos físicos, cognitivos, afetivos e de
relações sociais) e o ambiente onde vive (sistema de saúde, sistema de
concessão de benefícios sociais e sistema de trabalho). Como pode ser
observado na Figura 1, o indivíduo enfermo precisa enfrentar uma arena
para manter sua capacidade produtiva (LOISEL; ANEMA, 2013).

72 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE
Figura 1 Arena da incapacidade para o trabalho

73
Dessa forma, estudos têm evidenciado que a duração da incapaci-
dade, poucas vezes, está associada a fatores puramente físicos. Diversos
fatores podem atuar como barreiras e dificultar a permanência ou retor-
no do trabalhador a sua atividade produtiva.
Considerando o ambiente de trabalho, pouca cultura de segurança
e bem-estar na organização evidenciadas por altas demandas físicas auto
referidas, estresse e controle do trabalho, pouco suporte social, pouca
capacidade de modificar o trabalho se constituem em barreiras expressi-
vas que dificultam a permanência no trabalho, bem como, o retorno ao
trabalho (SHAW; KRISTIMAN; VEZINA, 2013).
Por outro lado, na perspectiva do indivíduo, entre os vários fa-
tores considerados como obstáculos, a percepção da impossibilidade de
se adequar ao trabalho pode estar relacionada ao medo, fundamentado
ou não, que ele tem de realizar movimentos físicos ou o receio de que
o trabalho possa oferecer ameaças a sua saúde, ou ainda, por ter perdi-
do sua condição de competitividade pelo afastamento prolongado, por
exemplo. O fato de acreditar que não consegue enfrentar os obstáculos
para permanecer ou retornar ao trabalho podem influenciá-lo na escolha
de estratégias de enfrentamento inadequadas e atitudes não adaptativas.
O baixo suporte dos colegas de trabalho, superiores, família e sociedade,
sobretudo prestadores de serviços de saúde e a previdência social, pode
contribuir para um sentimento de injustiça.
Outra barreira importante pode estar associada aos provedores de
serviços de saúde, antes e durante o período de afastamento por motivo
de acidente ou doença. O indivíduo, muitas vezes, percorre um longo e
demorado caminho na busca por tratamento. A abordagem dos servi-
ços, muitas vezes, está limitada a remoção dos sintomas e certificação
da doença por atestado médico, condições que favorecem a cronificação
do agravo. Com isso, o indivíduo apresenta dificuldades em estruturar,
adotar e manter um plano de tratamento adequado e efetivo para seu
problema de saúde.

74 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Também como obstáculos, especificamente relacionados ao siste-
ma de concessão de benefícios sociais observam-se divergências quan-
to ao reconhecimento da incapacidade, entre especialistas e médicos
peritos da previdência, além de baixa resolutividade dos Programas de
Reabilitação Profissional.

Condições de saúde e desempenho no trabalho


Ainda que o afastamento da atividade laboral seja indicado para
pleno ou parcial restabelecimento de uma condição de saúde, vale referir
que nem toda situação de saúde traz consequências para a capacidade
do indivíduo em realizar suas atividades. Ou seja, um problema de saúde
pode não interferir na vida cotidiana e não se constituir em obstáculo
para o trabalhador continuar a realizar suas atividades laborais. Manter-
se ativo no trabalho pode se configurar em um fator protetor para do-
enças crônicas, entre elas as osteomusculares e as mentais (ODEEN et
al., 2013). Nos casos com redução da capacidade de trabalho, o manejo
adequado do caso requer, na empresa, o acompanhamento e cooperação
dos supervisores (NOBEN, 2015).
A partir de modificações no trabalho ou no modo como ele é rea-
lizado, as limitações provocadas pela condição de saúde podem ser com-
pensadas para que o trabalhador se mantenha ativo.  Evidências apon-
tam para resultados bem-sucedidos quando o trabalhador em questão é
envolvido nesse processo de mudança (LOISEL, 2001).

Prevenção da incapacidade na empresa

A adoção de um novo paradigma de prevenção da incapacidade


apresentado, possibilita a redução de novos eventos, recidivas e duração
dos afastamentos. Na empresa, deve-se levar em conta que o processo
de mudança de uma cultura no interior da organização requer o envolvi-

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 75
mento de pessoas chave, fundamentais na implementação de diretrizes e
práticas de prevenção da incapacidade e gestão do retorno ao trabalho.
Nessa perspectiva, diferentes visões sobre o problema podem emergir e
gerar a necessidade de superação de conflitos para favorecer a coopera-
ção na empresa.

Cooperação na empresa
Na medida em que se amplia a visão sobre doença e incapacida-
de para além da relação médico-paciente, faz-se necessário na empresa,
uma articulação proativa entre as áreas de recursos humanos, saúde, se-
gurança no trabalho e produção. O envolvimento do trabalhador deve
ser considerado como um requisito imprescindível. Essa articulação,
entretanto, implica lidar com crenças, valores, interesses e percepções
diferentes, tornando a cooperação um desafio entre as diversas partes
envolvidas.
Nesse sentido, a comunicação entre as partes interessadas tem sido
apontada como um fator-chave, essencial e custo-efetivo para evitar des-
fechos indesejáveis (PRANSKY et al., 2004). A postura de boa-vontade
e de confiança são considerados na literatura um bom ponto de partida,
pois amenizam barreiras que naturalmente são colocadas pelos atores en-
volvidos (MACEACHEN et al., 2006). Os profissionais podem fazer a di-
ferença diante de situações difíceis e conflituosas ao aplicar conhecimen-
tos e competências comportamentais adequadas para essas situações.
Uma iniciativa referida como estratégia eficaz na comunicação en-
tre os envolvidos é o estabelecimento de um coordenador de retorno ao
trabalho, sobretudo após afastamentos de longo prazo. O coordenador
tem a função de facilitar e mediar a comunicação entre as partes inte-
ressadas, contribuindo com a solução de conflitos (SHAW et al., 2008).
Portanto, uma comunicação efetiva configura-se em um fator im-
portante para o sucesso das intervenções de prevenção da incapacidade
e gestão de retorno ao trabalho. A comunicação das diretrizes e práticas

76 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


adotadas pela empresa deverá ser estruturada e disseminada usando lin-
guagem e meios adequados, para cada uma das partes interessadas.

Modificação ou adaptação do trabalho


A modificação ou adaptação do trabalho constitui-se em uma das
atividades chave que necessita de empenho e cooperação na empresa.
Para um retorno ao trabalho bem-sucedido, a oferta de trabalho modifi-
cado ou ajustado tem sido apontada como elemento central na gestão da
incapacidade (FRANCHE et al., 2005).
Estudos demonstram que o retorno ao trabalho não é um momen-
to pontual, é um período lento, individualizado, além de dependente de
múltiplos fatores. Nos casos de distúrbios musculoesqueléticos, o serviço
de ergonomia pode contribuir, sobretudo quando o plano de retorno ao
trabalho em questão aponta dificuldades em adaptar o trabalho. A revi-
são sistemática de Franche et al. (2005) também sugere que a ergonomia
no local de trabalho deva ser considerada como um dos componentes im-
portantes na prevenção da incapacidade e no retorno ao trabalho. Uma
adaptação inadequada pode contribuir para a ruptura do processo de re-
torno e de permanência do trabalhador na atividade laboral. Sempre que
possível, o ideal é reinserir o trabalhador na sua área de trabalho, onde
ele está familiarizado com o ambiente, com o processo de trabalho e com
as pessoas.
Modificações na organização do trabalho têm sido descritas como
itens importantes que influenciam nesse processo. Vale ressaltar que
quanto maior a autonomia do trabalhador para lidar com as suas tarefas,
melhores são os resultados no processo de retorno ao trabalho. A auto-
nomia configura-se em um item importante, na medida em que permite
não associar o retorno ao trabalho à representação de “retorno ao ado-
ecimento” ou “retorno ao agravamento dos distúrbios osteomusculares
relacionados ao trabalho”.

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 77
Com base nesta premissa e a fim de diminuir os custos e facilitar o
processo de retorno, alguns empregadores oferecem mudanças no traba-
lho para os empregados reabilitados. Ainda que o denominado trabalho
modificado seja considerado a “cereja do bolo”, sabe-se pouco sobre a
estrutura, a eficácia e a eficiência das respectivas intervenções. Em uma
revisão sistemática da literatura, realizada entre os anos 1975 e 1997,
avaliou-se criticamente a eficácia de 13 programas que incluíam este tipo
de estratégia. Indivíduos expostos a um tipo de trabalho modificado re-
tornam duas vezes mais rapidamente do que aqueles aos quais não foram
ofertadas atividades com adequações (KRAUSE et al. 1998).
Os resultados dessa revisão realizada por Krause et al. (1998) ainda
demonstram que programas que incluem trabalho modificado reduzem a
quantidade de dias de trabalho perdidos à metade e sugerem assim tam-
bém, sinais de custo-efetividade. Entre as modalidades implementadas
em outros países, encontra-se a exposição gradativa ao trabalho (retorno
ao trabalho terapêutico, work hardening) entendido como uma forma es-
pecializada de atividade leve em que as horas, cargas ou expectativas
de desempenho de um trabalho são aumentadas gradativamente. O es-
tabelecimento de ritmos e cargas leves de trabalho, a exemplo de res-
ponsabilidades limitadas ou trabalhos restritos, correspondem a qualquer
atividade temporária ou permanente, com menor carga do que a regular
ou completa de modo a permitir que o trabalhador siga um trabalho de
acordo com um conjunto de condições prescritas.

Dor crônica e incapacidade


A dor se constitui em um dos principais obstáculos para a per-
manência no trabalho e pode causar prolongamento de afastamentos
ou recidivas. No caso dos distúrbios musculoesqueléticos, a dor é um
dos sintomas que mais gera incapacidade. No mundo do trabalho, a alta
frequência de desordens musculoesqueléticas suscita o desenvolvimento
de intervenções mais efetivas. De acordo com a Pesquisa Nacional por

78 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Amostra de Domicílios, as dores da coluna são a segunda condição de
saúde com maior prevalência no Brasil, 13,5% (PNAD, 2010).
Os custos relacionados a dor e a incapacidade por problemas mus-
culoesqueléticos são expressivos, especialmente quando esses quadros se
tornam crônicos. Nos Estados Unidos, por exemplo, as dores nas costas
geram um gasto estimado de US$ 100 bilhões com a utilização dos ser-
viços de saúde e perda de produtividade (Research and Markets, 2009
apud Gatchel & Schultz, 2015). Tratamentos bem-sucedidos têm sido
estabelecidos a partir de evidências, como: redução no tempo de recupe-
ração da lesão, redução nos custos médicos associados e o apoio ao traba-
lhador no retorno seguro ao trabalho e num período de tempo adequado
(GATCHEL; SCHULTZ, 2015).
Vários fatores de risco têm sido identificados no desenvolvimento
da dor musculoesquelética persistente. Alguns estão relacionados dire-
tamente com o trabalho, tais como: alto nível de estresse, insatisfação,
trabalho pesado e perigoso, tarefas repetitivas, entre outros. Vale ressal-
tar que não só o uso repetitivo, mas também, o desuso das estruturas
musculoesqueléticos tem sido associado à dor. Somam-se ainda, fatores
“não físicos”, a exemplo de: depressão, tendência a exacerbar sintomas
ou evitar situações estressantes, conflitos pessoais ou familiares, entre
outros (GATCHEL; MAYER, 2002).
É importante saber distinguir cuidados relativos à dor e a
incapacidade musculoesquelética nos níveis primário, secundário e
terciário. Todos irão requerer abordagens interdisciplinares, porém
tratamentos distintos (KISHINO, 2006 APUD GATCHEL &
SCHULTZ, 2015). O cuidado primário é frequentemente aplicado no
tratamento da dor aguda com severidade limitada. Os métodos utilizados
para o controle dos sintomas são para o alívio da dor durante o período
normal de recuperação. Além disso, a orientação psicossocial básica é de
que a dor aguda é temporária e, em breve será resolvida.
O cuidado secundário representa a retomada do tratamento de um
paciente com dor musculoesquelética que não seguiu a evolução normal

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 79
de recuperação. Ele deve ser administrado com o objetivo de dar atenção
ao problema e ao retorno ao trabalho, antes que o trabalhador desenvol-
va perda avançada do condicionamento físico e surjam barreiras psicos-
sociais significativas. Em um paciente em que a dor musculoesquelética
parece não estar diminuindo, pode haver necessidade uma intervenção
psicossocial mais ativa (TURK; MONARCH, 2002).
O cuidado terciário se destina para aqueles que estão com perda
importante do condicionamento físico e apresentam dor crônica associa-
da à incapacidade. Neste estágio é necessária uma intervenção interdis-
ciplinar abrangente (GATCHEL, 2005).

Autoeficácia
Entre as formas de abordagem interdisciplinar, modalidades tera-
pêuticas que buscam desenvolver autoeficácia de trabalhadores emer-
gem como uma possibilidade de entender as razões e processos que levam
um trabalhador a não se sentir capaz de retornar ao trabalho.
A autoeficácia pode ser definida como a crença individual sobre a
capacidade de produzir determinados níveis de desempenho ou compor-
tamento. As crenças de eficácia são as bases da capacidade de agir in-
tencionalmente, independentemente de que haja outros fatores atuando
como guias ou motivadores, visto que estes estão enraizados na crença
central de que o indivíduo tem o poder de produzir efeitos a partir de suas
próprias ações (BANDURA, 2001).
No campo da prevenção da incapacidade, estudos sinalizam que
indivíduos mais autoeficazes têm maiores condições de fazer frente às de-
mandas do afastamento por doença no contexto do retorno ao trabalho
– não só às demandas da recuperação do adoecimento, trauma ou lesão,
mas também àquelas do reingresso no ambiente, na rotina organizacional
e no relacionamento interpessoal com supervisores e colegas de trabalho.
A autoeficácia tem se mostrado um forte preditor para efetivo re-
torno em trabalhadores com distúrbios mentais ou musculoesqueléticos.

80 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Assim, na atualidade, busca-se evidenciar facilitadores e barreiras para o
planejamento de ações de prevenção da incapacidade e gestão do retor-
no ao trabalho. Shaw (2011) identificou determinantes de autoeficácia
para trabalhadores acometidos com dor lombar aguda, como por exem-
plo, atender as demandas de trabalho, modificar tarefas e comunicar ne-
cessidades aos outros. A escala de Lagerveld (2010) aponta outros deter-
minantes, relacionados às desordens mentais, inclusive já adaptada para
o Brasil (SILVA JUNIOR, 2017). Modelos mais recentes incluem fatores
de autoeficácia voltados para doença musculoesquelética e transtornos
mentais, simultaneamente (BLACK, 2017).
O desenvolvimento da autoeficácia deriva sempre da interação do
indivíduo com seu sistema interno (emoções, dor, pensamentos, etc) e
contexto externo (ambiente de trabalho, mercado laboral, contato com
serviços de saúde, sistema previdenciário, entre outros). Assim, há que
se ter em perspectiva que a baixa autoeficácia em relação ao retorno ao
trabalho pode ser tanto produto de uma percepção distorcida do contex-
to, como pode também refletir uma avaliação realista deste indivíduo em
relação às dificuldades que ele e outros trabalhadores podem encontrar
nas complexas relações de trabalho (NIEUWENHUIJSEN et al., 2013).
Entender esse e outros aspectos individuais podem ajudar os pro-
fissionais que atuam na prevenção da incapacidade e gestão do retorno
ao trabalho a compreender os diferentes processos que levam os indiví-
duos a apresentarem comportamento favorável ou desfavorável. Dessa
forma, o uso de ferramentas de triagem e avaliação permite a identifica-
ção de baixos níveis de autoeficácia e com isso o direcionamento de in-
tervenções que minimizem as barreiras e assim, evitem o prolongamento
ou recidivas de afastamento.

Plano de retorno ao trabalho


Com base nos conteúdos apresentados, sugere-se a estruturação
de um plano para o retorno ao trabalho composto por um conjunto de

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 81
ações voltadas à construção de alternativas para um retorno sustenta-
do, que se inicia com a identificação de barreiras e facilitadores desse
processo. O plano é mais do que uma combinação de alternativas para
compensar restrições físicas voltadas para a execução de determinadas
atividades. Ele deve considerar o retorno ao trabalho ainda como um pe-
ríodo de vulnerabilidade para o trabalhador. Nessa fase, colegas e super-
visores devem ser envolvidos e contribuir no estabelecimento de novas
relações e rotinas.
O componente qualitativo da revisão sistemática, elaborado pelo
Institute for Work & Health, 2007 aponta um aspecto que merece aten-
ção. Os colegas de trabalho e supervisores podem ter uma percepção de
prejuízo no retorno ao trabalho de pessoas com restrições e isto pode
levar a conflitos em vez de conduzir o grupo à cooperação. Dois desafios
ilustram situações críticas que podem ser antecipadas e fomentar o de-
senvolvimento de soluções previstas no plano:
a) os colegas de trabalho podem se sentir em desvantagens por
terem que acumular um maior número de atividades;
b) o supervisor pode se sentir pressionado a manter as metas de
produção e ao mesmo tempo acolher um trabalhador com ca-
pacidade reduzida.

Além do trabalhador, dos colegas de trabalho e do supervisor, os


profissionais de saúde são essenciais na condução adequada do processo
de retorno. Os médicos do trabalho, especificamente, têm importante
contribuição na elaboração do plano que deve ser construído contando
com a participação do trabalhador. O manejo clínico dos problemas de
saúde é muitas vezes realizado por meio do gerenciamento de sintomas,
o que não é suficiente para permitir ao trabalhador manter ou retornar
aos níveis normais de atividade.
A recuperação e retorno ao trabalho são processos ativos que en-
volvem, entre outros fatores, a motivação e o esforço do trabalhador. O
papel do médico é de fornecer segurança, apoio técnico e intermediação

82 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


no processo. O quadro abaixo lista alguns aspectos que merecem ser le-
vados em consideração:

•  Estabelecer objetivos claros


•  Combinar metas realistas
•  Levantar expectativas quanto a assistência à saúde
•  Discutir com o trabalhador as formas de superar obstáculos para o retorno
•  Envolver equipe multiprofissional
•  Discutir o que o trabalhador pode fazer e evitar dar ênfase ao que ele não pode
•  Estabelecer comunicação com o setor de recursos humanos e supervisores
•  Estimular o trabalhador para que ele manifeste a necessidade de apoio
•  Estabelecer cronograma para execução das atividades previstas no trabalho

Quadro 1 Ações voltadas a promover um retorno ao trabalho de forma sustentada

Outro elemento chave em programas que facilitam o retorno ao


trabalho é o facilitador de retorno, que por meio da escuta e mediação
de conflitos, entre outras atribuições, promove a cooperação entre ato-
res envolvidos. Exemplos de alguns aspectos aos quais o facilitador deve
estar atento:
Conhecimento sobre o que está envolvido nos processos de adoe-
cimento, afastamento e retorno ao trabalho:
• Opções de tratamentos vigentes;
• Apoios no processo de adaptações do trabalho;
• Estímulo ao apoio por parte de colegas de trabalho e
supervisores;
• Interlocução com os setores da empresa na implementação do
plano de retorno ao trabalho;
• Habilidades administrativas, organizacionais e de avaliação;  
• Habilidades de comunicação e de relacionamento interpessoal.

Adaptado de: Gardner et al. (2010) e Pransky et al. (2010)

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 83
Intervenção precoce
A atuação em aspectos facilitadores e em obstáculos que influen-
ciam de maneira direta ou indireta a permanência ou o retorno do tra-
balhador à sua função deve ser realizada o mais precocemente possível.
Para tanto, é fundamental a identificação dos fatores de risco, a partir da
interação coordenada entre médicos do trabalho, recursos humanos e
supervisores.
Adicionalmente, as intervenções exitosas nesse âmbito possuem
em comum a abordagem interdisciplinar e participação dos trabalhado-
res na modificação de determinados componentes do trabalho. Em uma
revisão sistemática sobre o tema (FRANCHE, 2005), observou-se que
as intervenções que contavam com fisioterapeutas e terapias cognitivo
comportamentais apresentaram maior potencial de sucesso (menor tem-
po para retorno ao trabalho ou maior tempo para ocorrerem recidivas de
afastamento).
Uma atuação interdisciplinar, portanto, passa a ser um eixo arti-
culador da cooperação entre os diversos saberes e práticas destes profis-
sionais, além de contribuir para uma melhor compreensão do problema
em suas diversas dimensões e possíveis soluções, no contexto no qual o
trabalhador está inserido.
A identificação dos fatores de risco e respectivas intervenções
ocorrem em três níveis, assim hierarquizados para fins didáticos, embora
possam demandar análise simultânea no caso concreto:
• No nível primário a atuação se dá para que se evite o adoeci-
mento. Dessa forma auxilia os trabalhadores a se manterem
saudáveis e produtivos, a exemplo de programas que promo-
vam ambientes de trabalho saudáveis.
• No nível secundário, identificam-se fatores de risco para a
incapacidade prolongada. São exemplos de intervenções: o
acompanhamento de dados de afastamento, melhor envolvi-
mento do supervisor e atuação imediata diante de uma queixa.

84 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


• No nível terciário, limitam o impacto da incapacidade por
doença ou lesão e minimizam os obstáculos para o retorno e
permanência no trabalho, tais como, a gestão do retorno ao
trabalho e manejo de casos.

É importante destacar que intervenções clínicas adequadas ajudam


a melhorar a saúde restaurando as funções do organismo, tanto no campo
mental quanto físico, no entanto, quando excessivamente padronizadas
e sem o envolvimento do indivíduo, geralmente não resultam em um
desfecho positivo.
Já o estímulo à manutenção da saúde física e mental, a adoção
de comportamentos e hábitos saudáveis, bem como controle de doen-
ças crônicas e suas complicações, também têm sido associados à melho-
ria da resiliência em relação ao contexto de incapacidade (LADOU;
HARRISON, 2013). Para melhores resultados, os médicos do trabalho
devem considerar fatores que expõem uma pessoa ao risco de sofrer uma
lesão ou desenvolver incapacidade, tais como: uso de algumas medica-
ções, fadiga, distúrbios ou privação do sono, diabetes com pouco contro-
le, obesidade, tabagismo, abuso de drogas e álcool e sintomas depressivos.
Terapias cognitivo-comportamentais, incluindo práticas na so-
lução de problemas, treinamento de habilidades para melhorar as es-
tratégias pessoais de enfrentamento e de conflitos são recomendadas
(LADOU; HARRISON, 2013). Além disto, este tipo de intervenção
aborda fatores de risco comportamentais e psicológicos com foco no tra-
balho, que podem ajudar os trabalhadores a lidar com as demandas do
ambiente laboral.
Portanto, quanto mais precoces e articuladas forem as intervenções
para prevenção da incapacidade na empresa, maiores serão as chances de
sucesso relacionadas à prevenção de novos casos, recidivas e duração dos
afastamentos.

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 85
Alguns instrumentos aplicados para prevenção da
incapacidade

Existem diversos recursos que podem ser utilizados para rastrea-


mento de sintomas, bem como avaliação de capacidade para o trabalho.
Cada uma das ferramentas possui especificidades que atendem a deman-
das de investigação específicas. Não há necessariamente uma recomen-
dação estrita para uso de todas ou parte delas. No Quadro 2 são apresen-
tados exemplos de instrumentos que podem ser utilizados na abordagem
da prevenção da incapacidade para o trabalho. Alguns critérios de esco-
lha de uma ferramenta quanto à mensuração e praticidade merecem ser
observados:

Critérios quanto à mensuração:


• Adequação:  conteúdo da ferramenta corresponde à
finalidade da avaliação?
• Confiabilidade:  as medidas em diferentes ocasiões e
feitas por diferentes pessoas e usando testes paralelos ou
similares, produzem os mesmos resultados? (Estabilidade,
homogeneidade e equivalência)
• Validade: mede o que se propõe a medir? Existe validação
para aplicação no Brasil?
• Capacidade de resposta a mudança:  tem a habilidade de
medir mudanças clínicas importantes todo o tempo quando
a mudança está presente? 
• Precisão: reflete as verdadeiras mudanças ou diferenças?
• Interpretabilidade: fornece pontuações significativas?
 
Critérios quanto à praticidade:
• Aceitabilidade: os pacientes têm vontade e capacidade de
completar a ferramenta?
• Viabilidade:  requer tempo e recursos para administrar,
pontuar e interpretar?

86 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


FERRAMENTAS INDICAÇÃO QUEM APLICA GRUPO DE DOENÇAS ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS
Amplamente usado para triagem Pouca informação sobre sua
Örebro
de incapacidade em nível primário. confiabilidade. Validade é
Musculoskeletal
Doença Testado em culturas diferentes Fácil moderada. Vários itens não
Pain Autoaplicável
Osteomuscular de administrar são modificáveis fornecendo
Questionnaire
opções não claras de inter-
(ÖMPQ)
venção
Auxilia no tratamento primário de Não tem foco no ambiente de
dor lombar ao triar pacientes em trabalho real e na percepção
Subgroup
relação ao risco de mau prognós- do trabalho
for Targeted
tico de tratamento, levando em
Treatment Screening Autoaplicável Dor Lombar
consideração fatores psicossociais
Screening
Autoaplicável, curto, fácil de usar
(StarTBack)
e pontuar, e se concentra sobre os
fatores de risco modificáveis.
Concentra-se mais em fatores Instrumento recente de
Absenteísm relacionados ao trabalho, incluindo triagem desenvolvido para
Screening Doença fatores de risco organizacional e trabalhadores com dor lombar
Autoaplicável
Questionnaire Osteomuscular psicossociais. Prever o absentismo subaguda. Apenas um estudo
(ASQ) de longa duração entre os trabalha- sobre as propriedades psico-
dores com lombalgia métricas

Quadro 2 Ferramentas usadas na avaliação da incapacidade no trabalho

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE
87
88
Continuação...
FERRAMENTAS INDICAÇÃO QUEM APLICA GRUPO DE DOENÇAS ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS
Mede objetivamente a Geralmente são demoradas
capacidade física de uma e exigem equipamentos
pessoa que tenha sofrido uma especializados, licenciamento
lesão musculoesquelética e treinamento específico. Não
Functional para executar uma série de conseguem simular o verda-
Capacity Doença Osteomuscular tarefas de trabalho com deiro ambiente de trabalho
Evaluations segurança. Bons resultados e os fatores psicossociais.
(FCE) em confiabilidade Resultados contraditórios
em validade. Abordam mais
Capacidade aspectos psicofísicos, biome-

Gestão de Programas de Qualidade de Vida


para o cânicos e fisiológicos.
Trabalho
Natureza genérica, ampla São necessários estudo de
base conceitual, disponibili- confiabilidade. Aplicações
dade em várias línguas realizadas mais em ambiente
Assessment clínico que nos locais de
of Work Médicos Genérica trabalho pela dificuldade
Performance de acompanhamento por
(AWP) longo período. Difícil de aplicar
quando as tarefas muito
simples ou limitadas

Quadro 2 Ferramentas usadas na avaliação da incapacidade no trabalho


Continuação...
FERRAMENTAS INDICAÇÃO QUEM APLICA GRUPO DE DOENÇAS ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS
Abrange muitas bandeiras azuis (Per- Não indicado para
Obstacles to cepções sobre a relação entre o trabalho avaliação de casos
Return-to-Work Doença e a saúde). Amplamente conhecido e agudos. Aplicável em
Autoaplicável
Questionnaire Osteomuscular recomendado para avaliação de obs- nível secundário.
(ORTWQ) táculos RTW. Adequadas propriedades
psicométricas.
Identifica a percepção do trabalhador Projetado para comple-
com relação aos fatores psicossociais e mentar as avaliações
ambientais que influenciam a capacidade capacidade de trabalho
de retorno ao trabalho após doença ou com foco em fatores
Worker Role
Obstáculos Médicos Genérica acidente. Pode ser aplicado em grupos de psicossociais e ambien-
Interview (WRI)
ao Retorno diagnóstico e em diferentes contextos de tais que influenciam o
ao Trabalho trabalho. Traduzido em vários idiomas e retorno ao trabalho
estudado em diferentes culturas. Tem boas
propriedades psicométricas
Relacionado a bandeiras amarelas, é Depende muito de auto
focado mais em situações relacionadas ao avaliação.
Return-to-Work trabalho relacionado a bandeiras amarelas
Self-Efficacy Doença (crenças, apreciações e julgamentos,
Autoaplicável
Questionnaire Osteomuscular respostas emocionais comportamento
(RTWSE) doloroso incluindo a dor e as estratégias

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE
de enfrentamento). Aceitáveis proprieda-
des psicométricas.

Quadro 2 Ferramentas usadas na avaliação da incapacidade no trabalho

89
90
Continuação...
FERRAMENTAS INDICAÇÃO QUEM APLICA GRUPO DE DOENÇAS ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS
Combina auto relato e métodos de Abordagem centrada na
observação Propriedades psicométricas pessoa e não no ambien-
Dialogue About Problemas
Autoaplicável e do são boas Baseado no estabelecimento te de trabalho
Ability Related Psicossociais /
Médico de interação entre médico e paciente o
to Work (DOA) Psiquiátricos
qual tem papel ativo no seu processo de
reabilitação
Instrumento completo que identifica fato- O gerenciamento desta
res que dificultam o retorno ao trabalho. ferramenta consome

Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Ajuda a desenvolver um plano de rea- tempo e recursos
bilitação. Cobre as bandeiras vermelha Estudos sobre suas
Work Disability
Doença (laranja, na versão comuns a transtornos propriedades psicomé-
Diagnostic Autoaplicável e
Osteomuscular, mentais), amarela e azul. Utilizado tanto tricas ainda não foram
Interview Médico
Transtornos Mentais para transtornos mentais comuns ou publicados Este instru-
(WoDDI)
lesões musculoesqueléticas mento é utilizado para
prevenção secundária e
terciária de incapacidade
no trabalho.

Quadro 2 Ferramentas usadas na avaliação da incapacidade no trabalho


Considerações finais

Esse capítulo discutiu princípios de prevenção da incapacida-


de para o trabalho aplicados no ambiente laboral como alternativa às
abordagens tradicionais de gestão dos afastamentos e do retorno ao
trabalho. Para tanto, apontou-se a necessidade de superar o modelo
biomédico hegemônico na direção de intervenções efetivas baseadas
em um modelo mais abrangente.
Essa nova forma de pensar vai além da relação restrita e do-
minante entre lesão e incapacidade, na medida em que reconhece a
complexidade das relações envolvidas nesse binômio. A dor e seus me-
canismos ocupam um espaço importante nesse processo. Nele estão
também envolvidos aspectos cognitivos, emocionais, comportamentais
em inter-relação com o ambiente. Importa destacar, entretanto, que
o êxito da prevenção da incapacidade extrapola ações individuais e
inclui a necessidade de articulações intra e intersetoriais que envol-
vam por exemplo o trabalho e instituições de saúde, de previdência e
educacionais.
Além disso, o novo paradigma de prevenção da incapacidade e
gestão do retorno ao trabalho apresentado, fundamentam-se em vasta
literatura e observações empíricas que confirmam o trabalho como for-
te determinante da saúde, questão central na vida do indivíduo, com
impactos positivos tanto físicos, quanto mentais, financeiros e sociais.
Nesse sentido, a cultura e o contexto social devem ser considera-
dos. O envolvimento da sociedade na implantação dessa nova aborda-
gem tem se mostrado eficaz em diversos países, com exemplos citados
na Holanda, Finlândia, Canadá, entre outros. Mudanças vem ocorren-
do na legislação e nos sistemas de saúde e de concessão de benefícios
sociais, de educação e informação das partes interessadas e do público
em geral.
Com efeito, essa nova forma de pensar não se configura em uma
metodologia com passos previamente determinados, o que permite

PREVENÇÃO
DA INCAPACIDADE 91
grande diversidade de iniciativas. O importante é que na implementa-
ção de medidas preventivas e de controle se leve em conta os determi-
nantes apresentados na Arena da Incapacidade.
Toda essa reflexão contribui para nortear práticas inovadoras,
baseadas na atuação em rede, composta por equipes multiprofissionais
convidadas a exercerem a interdisciplinaridade e assumirem o desafio
da efetividade das intervenções implementadas.

92 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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96 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


LONGEVIDADE
SAUDÁVEL
Noélly Cristina Harrison Mercer
Viviane Gariba de Souza

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 97
O
aumento da longevidade é uma importante conquista da popu-
lação mundial. Segundo informações do World Bank (2017),
em razão dos avanços na área da saúde, da educação e do pro-
gresso tecnológico, hoje a expectativa de vida global é de 71,5 anos con-
tra 65,3 anos registrados em 1990.
Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), sugerem que grande parcela do aumento da expec-
tativa de vida da população mundial se deve ao aumento dos gastos com
assistência médica, conjugado com fatores como aumento do padrão de
vida, melhorias ambientais, mudanças no estilo de vida, melhor inserção
no mercado de trabalho e melhoria na educação. Para a Organização, é
a conjunção desses fatores que explica as diferenças existentes entre os
diversos países no que se refere à expectativa de vida e a longevidade de
uma população.
No cenário nacional, os efeitos desse fenômeno já começam a dar
sinais. Com uma população vivendo mais, os impactos na previdência
social e na assistência médica são os primeiros a serem sentidos. A pre-
vidência social brasileira já demonstra falta de fôlego para manter uma
população que, ao se aposentar, provavelmente, dependerá desses recur-
sos por mais 20 ou 30 anos. Especialistas econômicos afirmam que para
evitar a falência desse sistema, possivelmente, essas pessoas precisarão
permanecer mais tempo no mercado de trabalho.
Diante desse cenário, quais os efeitos que o aumento da expectati-
va de vida da população brasileira pode causar no mercado de trabalho?
Como as empresas estão se preparando para esse trabalhador mais velho
se manter produtivo e saudável ao mesmo tempo? Quais os efeitos e os

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 99
novos paradigmas para a área de saúde e segurança do trabalho? Essas
são as perguntas que surgem nesse novo contexto populacional vivencia-
do pelo Brasil e que fazem estudiosos e especialistas esforçarem-se para
responder.
Nesse sentido, esse capítulo tem como objetivo revisitar as princi-
pais discussões teóricas sobre o tema, além de apresentar os novos desa-
fios à Saúde e Segurança no Trabalho (SST) no que se refere à longevi-
dade e ao envelhecimento da população.
Para tanto, além dessa introdução e conclusão, o capítulo foi di-
vidido em três partes, sendo que a primeira aborda as questões sobre o
envelhecimento da população no cenário nacional e mundial; a segunda
dedica-se à apresentação dos impactos desse fenômeno no mercado de
trabalho e a terceira finaliza com a explanação sobre os desafios da SST
na longevidade dos trabalhadores.

A longevidade no Brasil e no mundo

Embora o processo de envelhecimento seja um fenômeno mun-


dial, registrado em grande parte da Europa, Japão e mesmo em países
vizinhos como Argentina e Uruguai, no Brasil e em outros países em
desenvolvimento, esse movimento tem ocorrido de forma muito mais
rápida do que o ocorrido nos países desenvolvidos (CAETANO, 2013).
Segundo dados do IBGE (2013), no cenário nacional, esse acele-
ramento dá-se principalmente pela junção de dois importantes fatores:
o aumento da expectativa de vida da população e a queda na Taxa de
Fecundidade Total (TFT), conforme apresentado no Gráfico 1.
Verifica-se que a estimativa para 2030 é de um crescimento signi-
ficativo da expectativa de vida da população, com um salto de aproxi-
madamente 13%, ou seja, segundo essa projeção, um indivíduo brasileiro
viverá até os 80 anos, aproximadamente.

100 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Gráfico 1 Evolução da expectativa de vida ao nascer e da TFT no Brasil – 2000 a 2030.
Fonte: IBGE (2013)

Ao mesmo tempo, observa-se que a taxa de fecundidade segue a


trajetória oposta, com uma estimativa para 2030 de apenas 1,51 filho
por mulher, o que representa, de acordo com o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), o menor número de filhos já registrado,
tendência apontada desde a década de 1970 e explicada, entre outros
fatores, pelo adiamento da maternidade.
Esses dois fatores, conjugados, refletem-se numa modificação sig-
nificativa da pirâmide etária do país, conforme ilustrado na Figura 1.

Figura 1 Evolução da pirâmide etária brasileira – 2013, 2040 e 2060.


Fonte: IBGE (2013)

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 101


Observa-se, em especial no ano de 2040, uma redução da propor-
ção da população mais jovem, ao menos tempo que se verifica um au-
mento da participação das pessoas acima dos 60 anos na população total.
Considerando esse grupo etário, estima-se que ele salte dos 19,2
milhões existentes hoje, para mais de 52,1 milhões em 2040 (Figura 2).
Cabe salientar que apesar de o aumento da expectativa de vida da
população brasileira ser um fator que ganhou maior destaque na atuali-
dade, desde a década de 1980, o assunto chama a atenção de estudiosos
e pesquisadores. São várias as discussões que permeiam os desafios que
esse cenário da população mais envelhecida gera.
Veras, Ramos e Kalache (1987) apontaram que o rápido cresci-
mento da população idosa no Brasil viria a ser um dos maiores desafios
dos governos das décadas subsequentes. Por sua vez, para Mendes e Rego
(2007), o aumento da longevidade populacional, combinado à redução
das taxas de fecundidade e de mortalidade, representaria grande mudan-
ça demográfica no Brasil.
Particularmente no Brasil, em virtude da política adotada após a
Constituição de 1988, estimulada por um cenário de população jovem,
grande pobreza e alta inflação, no qual a maior transferência de ren-
da pública deu-se aos idosos em detrimento das crianças, os gastos com
a população longeva foram superiores aos dos países da OCDE (BIRD,

Figura 2 Evolução da população brasileira com 60 anos ou mais – 1980 a 2040.


Fonte: IBGE (2013)

102 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


2011). No entanto, apesar da significativa redução da pobreza, os resul-
tados são baixos investimentos para os mais jovens e benefícios, na mé-
dia, muito maiores para os idosos, que hoje representam 66,5% da renda
média do país, contra 30,4% dos países da OCDE (BIRD, 2011).
De acordo com Caetano (2013) a rapidez com que vem aconte-
cendo a inversão da pirâmide demográfica torna o fenômeno brasileiro
mais complexo, uma vez que a renda per capita não acompanhou o mes-
mo ritmo do avanço da idade da população.
Segundo o autor o ritmo de envelhecimento da polução brasileira
acompanhou o ritmo europeu, no entanto a renda per capita é três vezes
menor. Os dados do World Bank (2017) corroboram essa afirmação, uma
vez que nos países da Zona do Euro a renda per capita anual é de US$ 30
mil enquanto a brasileira é de cerca de apenas US$ 10 mil.
Esse cenário demonstra que o Brasil está envelhecendo antes de
enriquecer, o que se configura como uma situação preocupante, pois as
consequências do envelhecimento da população são muito relevantes
para a situação econômica do país (HEISE, 2013). Nesse sentido o gran-
de desafio é criar uma agenda público-privada que sustente o crescimen-
to e o ganho de produtividade da economia.
Kalache (2015) diz que o Brasil passa por uma Revolução da
Longevidade. O autor refere-se ao momento atual dessa forma, pois no
início do século XX, em média, apenas 20% da população atingia 65 anos
de idade, enquanto atualmente 80% da população supera essa idade.
Da mesma forma, o IBGE aponta um crescimento significativo da
população brasileira com idade superior a 60 anos. Conforme ilustrado
no Gráfico 2, a estimativa é que em 2030 esse grupo etário atinja mais de
41,5 milhões de pessoas, representando, assim, mais de 19% da popula-
ção total do país (IBGE, 2013).
No caminho oposto, a parcela da população com 15 anos ou me-
nos vem demonstrando redução significativa ao longo dos anos, redu-
zindo a participação na população total de 32% para aproximadamente
25%, conforme ilustrado no Gráfico 3.

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 103


Gráfico 2 Evolução do grupo etário de 60 anos ou mais no Brasil – 2000 a 2030 (em
milhões de pessoas).
Fonte: IBGE (2013)

Gráfico 3 Participação (%) da população com 15 anos ou menos na população total do


Brasil – 2000 a 2030.
Fonte: IBGE (2013)

Nesse contexto, para o IPEA (2012), a expectativa é que a partir


de 2030 os únicos grupos populacionais que devam apresentar cresci-
mento positivo sejam os com idade superior a 45 anos.
Autores como Camarano e Pasinato (2004), Kalache (2015) e
Veras (1987) concordam que o aumento da expectativa de vida da popu-
lação é, ao mesmo tempo, a maior conquista da sociedade atual, porém
vem acompanhada de muitos desafios. Lima-Costa e Veras (2003) argu-

104 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


mentam que há grande preocupação quanto à desigualdade existente no
Brasil. Os autores afirmam que não é importante apenas viver mais, mas
sim que o período adicional de vida seja com qualidade. Além disso, res-
saltam a importância da inserção do idoso na sociedade e que esta esteja
preparada para atender às necessidades dessa camada da população.
Na visão de Heise (2013) para o Brasil superar o problema de en-
velhecer sem se tornar rico o suficiente para poder custear a população
longeva, o país terá de focar em quatro fatores:

1. M anter ou aumentar sua capacidade econômica.


2. Reformar o sistema de previdência social.
3. Aumentar a produtividade e elevar o tempo de vida profissio-
nal de seus trabalhadores.
4. Aceitar mais imigrantes qualificados.

Ressalta-se que o fenômeno presente no Brasil está longe de


ser uma exclusividade. Dados da World Health Organization (WHO)
(2002) apontam que o aumento da longevidade é um fenômeno mundial
que ocorre tanto em países desenvolvidos, como em subdesenvolvidos.
Além disso, destaca que em países como Canadá, Suíça e Japão, a ex-
pectativa de vida da população já é superior a 80 anos de idade (WHO,
2002).
Nesse sentido, se pode afirmar que a longevidade da população
representa um grande desafio às políticas públicas em âmbito mundial,
uma vez que esse fenômeno poderá acarretar aumento na demanda por
cuidados de longa duração e por serviços de saúde, além de requerer pa-
gamentos de benefícios previdenciários e assistenciais por um período de
tempo mais longo (IPEA, 2012).
Camarano e Pasinato (2004) afirmam que há necessidade de as-
segurar o desenvolvimento econômico necessário à consolidação dos
direitos adquiridos pelos idosos, sem que isso gere efeitos negativos nas
demais camadas da sociedade.

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 105


Dessa forma, o grande desafio permeia na criação de uma agenda
público-privada que sustente o crescimento e o ganho de produtividade
da economia.

Os efeitos do envelhecimento no
mercado de trabalho

De acordo com Debert (1999), para boa parte da população o en-


velhecimento representa a ausência de importância na sociedade. Além
disso, se configura como a etapa da vida em que ocorre a redução na
habilidade motora e diminuição da capacidade física. Porém, o autor
aponta que essa etapa pode ser representada como um momento em que
existe grande experiência acumulada, conhecimento técnico e habilida-
des pessoais, entre outras vantagens.
Paolini (2016) destaca que para a manutenção dos trabalhadores
idosos no ambiente de trabalho, são necessárias adequações à estrutura
de trabalho. Para a autora, os trabalhadores idosos têm muito a contri-
buir com o ambiente de trabalho, pois podem transferir conhecimento
aos mais jovens, compartilhar o conhecimento acumulado ao longo da
carreira, além de transmitir bons sinais relacionados à carreira de longo
prazo.
Magalhães (2008) ressalta que ainda há muita discriminação do
idoso no mercado de trabalho. A autora afirma que embora tenha havido
um crescimento significativo da população idosa no total da população
brasileira, não houve aumento proporcional da participação ativa do ido-
so na sociedade brasileira. Ainda de acordo com Magalhães (2008), em-
bora tenham sido elaboradas leis para garantir a inserção da população
idosa na sociedade, a camada mais experiente da população ainda precisa
de mais políticas afirmativas em prol da efetivação e da aplicação das leis
criadas em favor dos mais experientes.

106 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Se as leis criadas forem aplicadas adequadamente e as empresas
criarem condições para o desempenho dos trabalhadores mais idosos,
Magalhães (2008) destaca que a contribuição que o idoso pode trazer ao
trabalho é muito significativa. A autora ressalta, porém, que para tal, é
importante que o Estado desempenhe o papel de fiscalizar e garantir que
as condições de trabalho sejam adequadas para o trabalho do idoso.
Conforme Ilmarinen (2014), uma vida produtiva ativa se constitui
numa importante plataforma para o envelhecimento ativo, ou seja, para
os trabalhadores mais velhos permanecerem ativos é importante que eles
tenham boa vida profissional, a fim de contribuir com seus talentos e
pontos fortes para a construção de uma sociedade sustentável.
Adicionalmente, o autor defende que, além de uma vida profis-
sional ativa, um indivíduo precisa preservar os seus recursos individuais
(saúde e aptidões funcionais; educação e competência; valores, atitudes
e motivação), uma vez que a manutenção da capacidade para o trabalho
resulta desses dois fatores. Nesse sentido, quando o emprego e os recursos
individuais se coadunam entre si, existe uma boa capacidade de trabalho.
Sob a mesma ótica, a Organização Mundial da Saúde (OMS,
2005), acredita que se as pessoas puderem ter oportunidades de trabalho
digno o quanto antes em sua vida, ou seja, obtenção de salário adequado
e atuação em um local apropriado e protegido, essas poderiam continuar
a trabalhar de acordo com suas capacidades e preferências à medida que
envelhecessem.
Segundo Keller (2013), se as pessoas vão trabalhar mais tempo
no futuro, a gestão da idade nas organizações torna-se fundamental. Os
profissionais mais velhos merecem respeito, além de condições ergo-
nômicas e de trabalho que sejam adequadas às suas limitações físicas e
psicológicas. Porém, seu estudo concluiu que a maioria das instituições
empregadoras oferece pouca atenção às necessidades dos trabalhadores
em processo de envelhecimento.
Ambientes favoráveis a uma vida laboral produtiva possibilitam
aos profissionais oferecerem o seu melhor e fazem com que esse capital

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 107


humano seja visto como um ativo que proporciona valor e não como um
passivo que gera despesas cada vez maiores com aposentadoria e saúde
no futuro (PWC; FGV-EAESP, 2013).
Para Ilmarinen (2014), investir na promoção da capacidade de tra-
balho compensa, em seus estudos, a análise custo-benefício e mostra que
o retorno sobre o investimento (ROI – Return on Investment) pode ser
bom: o retorno sobre 1 euro ascende a 3-5 euros após alguns anos. O ROI
positivo deve-se à diminuição das licenças por doença e dos custos rela-
cionados à incapacidade de trabalhar e pelo aumento da produtividade.
Para Cepellos et al. (2013), as empresas brasileiras estão desprepa-
radas para enfrentar o futuro de uma força de trabalho envelhecida, por
isso alertam para a necessidade de realizar pesquisas na área e sensibilizar
os gestores quanto ao cuidado e à valorização do profissional com mais
idade. Keller (2013) sugere que novos estudos, inclusive empíricos, sejam
realizados sobre o tema, com vistas a alertar a sociedade sobre a ques-
tão da organização do trabalho e do envelhecimento, que para o autor
configura-se como uma lacuna a ser minimizada na literatura científica.
Nesse contexto, um estudo realizado em 2013, pela PWC em par-
ceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta que nos próximos
anos haverá redução do número de pessoas que entrarão no mercado de
trabalho e aumento da permanência dos que estão em atividade. A re-
tenção desses profissionais “[...] será necessária não apenas por questões
relacionadas ao equilíbrio das contas da Previdência Social, mas como
alternativa para a escassez de mão de obra especializada e à sustentação
do crescimento econômico” (PWC; FGV-EAESP, 2013).
O estudo ainda indica que as empresas precisam rever suas práti-
cas de gestão de pessoas, para que possam enfrentar as mudanças demo-
gráficas que estão ocorrendo no Brasil, principalmente com relação ao
“[...] planejamento da força de trabalho; práticas de saúde e qualidade de
vida; estratégias de retenção; estratégias de atração; estratégias de desen-
volvimento, educação continuada e gestão de conhecimento” (PWC;
FGV-EAESP, 2013).

108 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Na mesma direção, o IPEA (2012) acredita que esse cenário traz
novos e importantes desafios à área de segurança e saúde do trabalho,
que colocará pressões diferenciadas no mercado de trabalho, que por sua
vez demandarão políticas de capacitação continuada, saúde ocupacional,
redução de preconceitos em relação ao trabalho do idoso, entre outras.
Uma maneira de imaginar os efeitos do envelhecimento na econo-
mia seria a partir dos efeitos na força de trabalho, uma vez que o cresci-
mento econômico depende da expansão da força de trabalho, do capi-
tal ou do progresso técnico. Dessa forma, o envelhecimento pode atuar
como uma restrição ao crescimento econômico sustentável à medida que
contribui para reduzir o tamanho relativo da oferta de trabalho.
Em outras palavras, em um futuro breve, haverá poucos trabalha-
dores (população entre 15-64 anos) em condições de sustentar o número
crescente de aposentados. Soma-se a isso o impacto do envelhecimento
no aumento de despesas com saúde e na perda de capacidade para o
trabalho.
Por outro lado, mesmo com a redução do segmento da População
Economicamente Ativa (PEA) e com a tendência de aumento de doen-
ças e limitações, o país pode manter ou aumentar sua produtividade, uma
vez que as novas gerações têm chegado na PEA com maior escolaridade,
o que reflete no aumento da parcela de trabalho efetivo (número de tra-
balhadores vezes a produtividade deles). Ao mesmo tempo, melhorias
nas condições de saúde somadas às mudanças na tecnologia e na estru-
tura da economia implicam na possibilidade de aumento da participação
da população idosa no mercado de trabalho, o que altera a composição
da força de trabalho e afeta sua produtividade, assim como promove al-
terações no padrão de consumo e poupança, com implicações para toda
a economia e a sociedade.
Atualmente, a parcela da população com 40 anos ou mais repre-
senta o principal segmento da PEA, ultrapassando o segmento que sem-
pre ocupou essa posição: adultos de 25 a 39 anos (KRELING, 2009).
Esse fato corrobora-se na análise do Gráfico 4, no qual se percebe uma

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 109


inflexão da curva de pessoas com idade acima de 40 anos, em especial a
partir dos anos 2005, período em que essa parcela da população passou a
ter mais representatividade na PEA.
Em 2001, a população com 40 anos ou mais respondia por pouco
mais de 21% no total da PEA; em 2011, a representatividade passou a ser
de 24,6% aproximadamente.
Da mesma forma, observa-se que no volume total da população, a
partir dos anos 1970, a população com 40 anos ou mais passou a apresen-
tar mais representatividade em comparação à população de 25 a 39 anos.
Considerando o resultado do último censo realizado em 2010, observa-
-se que a diferença entre os dois grupos equivale a 9 pontos percentuais
(Gráfico 5).
De acordo com dados do IPEA (2006), em 2030, quase metade da
força de trabalho brasileira estará acima de 45 anos de idade. Esse fato
vai exigir adequação do mercado de trabalho, em virtude dos aspectos
relacionados ao envelhecimento da população trabalhadora, que estará
mais sujeita a riscos físicos, deficiências e doenças crônicas.
Considerando a população ocupada atualmente, conforme ilus-
trado no Gráfico 6, verifica-se essa tendência, uma vez que nos setores

Gráfico 4 Evolução da participação (%) da população com 40 anos ou mais na PEA


total – 2001 a 2010.
Fonte: IBGE/Censo demográfico (2010)

110 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


econômicos analisados, com exceção do setor de comércio, mais de 50%
dos trabalhadores têm entre 30 e 49 anos. Além disso, nos setores agro-
pecuário e de serviços, os trabalhadores com mais de 50 anos já represen-
tam aproximadamente 20% da força de trabalho total, segundo dados da
Relação Anual de Informações Sociais (RAIS, 2015).

Gráfico 5 Participação (%) da população com 25 anos ou mais na população total –


2001 a 2010.
Fonte: IBGE/Censo demográfico (1940-2010)

Gráfico 6 Pessoal ocupado por faixa etária e setores econômicos – 2015.


Fonte: MTPS/RAIS (2015)

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 111


Nesse contexto, é interessante observar que essa faixa etária vem
crescendo gradativamente no mercado de trabalho, enquanto os traba-
lhadores na faixa de 18 a 29 anos apresentam comportamento contrário
(Gráfico 7). Verifica-se que nos anos 2005, na soma de todos os setores
econômicos, os trabalhadores com 50 anos ou mais representam pouco
mais de 12% do total de trabalhadores, saltando para 14% em 2010 e
para 17% em 2015. Atualmente, essa população já soma mais de 8,2 mi-
lhões de trabalhadores, o dobro da quantidade registrada em 2005, que
era de aproximadamente 4,1 milhões de pessoas.
Assim sendo, a faixa etária da PEA com 40 anos ou mais configu-
ra-se, portanto, no Brasil, como um grupo de importância prioritária, não
apenas por ter a maior representação da população ativa, mas por ser,
tradicionalmente, o grupo com maior responsabilidade sobre o sustento
da família.
Cabe salientar que além dos desafios relacionados às políticas públi-
cas, o envelhecimento da população gera impactos no ambiente econômico,
passando desde o valor que a sociedade atual dá ao trabalho, até o contin-
gente disponível para atender às demandas de força de trabalho no futuro.

Gráfico 7 Evolução (%) da participação do pessoal ocupado no total de trabalhadores


por faixa etária – 2005, 2010 e 2015 (milhões). Fonte: MTPS/RAIS (2015)

112 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Nesse sentido, além de oferecer cursos de atualização de conhe-
cimentos e tecnologia, oportunidades de saúde e bem-estar para que os
mais velhos continuem competitivos no mercado de trabalho e gozem
de uma longevidade saudável, o Brasil precisa oferecer, aos mais jovens,
possibilidades de treinamento para atender às principais necessidades do
país com maior rapidez, atendimento para a manutenção da saúde, bem
como a capacidade para o trabalho.

Os desafios da segurança e saúde


no trabalho na longevidade dos
trabalhadores

Conforme ilustrado nos itens anteriores, o aumento de trabalhado-


res com mais idade dentro das empresas é uma realidade cada vez maior
no cenário nacional, fenômeno este experimentado pelos países euro-
peus já no fim da década de 1990. Nesses países, em razão da mudança
do perfil demográfico, o aumento do nível de emprego e o prolonga-
mento da vida laboral das pessoas tornaram-se importantes objetivos de
políticas públicas.
No Brasil, o cenário não é diferente, pelo contrário, o país ain-
da enfrenta o agravamento do fenômeno em virtude de suas condições
econômicas e sociais, caracterizadas pelo baixo crescimento econômico,
acentuada desigualdade social, altos custos com assistência médica e um
programa de previdência social com claros sinais de colapso.
Cabe salientar que além do envelhecimento da população, a forte
concorrência global cria uma necessidade social para que as pessoas am-
pliem suas vidas trabalhando e ao mesmo tempo mantenham alta produ-
tividade no trabalho (EU-OSHA, 2012).
Inseridas nesse contexto estão as empresas brasileiras que, se-
gundo estimativas do IBGE (2010), num período de 10 anos, poderão
sofrer pela falta de um contingente de trabalhadores jovens suficiente

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 113


para substituir a massa de trabalhadores em fase de aposentadoria. Além
disso, terão uma massa de trabalhadores envelhecidos, que tenderão a
permanecer mais tempo empregados.
Esse cenário ilustra o cenário aos profissionais da área de SST, que
terão papel fundamental no que se refere à gestão do envelhecimento
dos trabalhadores. Para Ilmarinen (2014), o primeiro passo é tratar do
assunto de maneira aberta, para que os paradigmas e estereótipos gerados
sobre os trabalhadores mais velhos sejam, se não eliminados, ao menos
reduzidos.
É importante salientar que os desafios para a manutenção desse
perfil de profissional, são muitos. Estudos mostram que os problemas
de saúde de longo prazo e as doenças crônicas aumentam com a idade.
Cerca de 30% dos homens e das mulheres no grupo etário dos 50-64 anos
necessitam de adaptações no local de trabalho, em virtude de problemas
de saúde relacionados à idade (ILMARINEN, 2014).
Além desses fatores, o autor ressalta a existência do decréscimo
da capacidade física para o trabalho à medida que se envelhece, além da
diminuição da capacidade cardiorrespiratória e da força muscular, fatores
que se configuram como limitadores, sobretudo nas profissões que exi-
gem uma elevada carga física.
Ainda segundo Ilmarinen (2014), no que se refere à SST, isso pode
configurar-se como um problema, uma vez que numa avaliação de risco,
faz-se necessário considerar possíveis modificações no ambiente de tra-
balho, a fim de tratar essas limitações, o que pode acarretar custos extras
às empresas.
Contudo, apesar da deterioração da capacidade física, Ilmarinen
(2014) defende que os trabalhadores mais velhos tendem a apresentar
muitos atributos, como pensamento estratégico, capacidade decisória e
de racionalização, maior percepção holística e melhora das competências
linguísticas, além de maior empenho e comprometimento com o traba-
lho que executam, já que muitas vezes registam níveis de absenteísmo
inferiores aos dos outros grupos etários.

114 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Adicionalmente, em termos de rendimento e produtividade do
trabalho, Ilmarinen (2014) enfatiza que a experiência profissional com-
pensa o declínio de alguns processos cognitivos básicos, como as funções
de memória e as competências psicomotoras:

[...] a idade e a experiência de trabalho também melhoram o valio-


so capital social dos trabalhadores mais velhos: (i) a competência
profissional, o conhecimento tácito, as competências em matéria
de cooperação aumentam, (ii) a consciência estrutural sobre a
empresa e as respetivas funções melhoram, e (iii) os contatos e as
redes de clientes expandem-se, e a compreensão das mudanças que
ocorrem no ambiente operacional melhora. Os trabalhadores mais
velhos podem adquirir novos conhecimentos. A aprendizagem não
depende da idade, mas o processo de aprendizagem muda com a
idade (ILMARINEN, 2014).

É importante salientar que o envelhecimento da população, assim


como dos trabalhadores traz consigo outros importantes desafios que
vão além da capacidade física e motora, isso porque com o aumento da
permanecia dos trabalhadores no mercado de trabalho, a heterogeneidade
entre as idades no ambiente profissional ocasiona o aumento dos conflitos
intergeracionais.
Sob essa ótica, Ribeiro (1999) corrobora que o conflito de gerações
e caracteriza como um importante fenômeno que surge como consequ-
ência do envelhecimento. Para o autor, esses conflitos são resultado, em
parte, do modelo de sociedade vivenciado atualmente:

[...] o contato entre jovens e adultos não deixa dúvidas de que,


em nossa sociedade, os jovens estão sendo moldados para apenas
tolerar o idoso, não para respeitá-lo e ouvi-lo com interesse, como
acontecia no passado. A imagem que se pode construir da velhice,
nesses casos, é uma imagem resultante da discriminação e da se-
gregação (RIBEIRO, 1999).
LONGEVIDADE SAUDÁVEL 115
Por outro lado, Motta (1989) acredita que o interesse dos jovens
se interessam pelas experiências vivenciadas pelos mais velhos e que o
convívio entre gerações pode ser extremamente rico e valioso.
Observando o contexto industrial brasileiro, conforme dados da
RAIS (2015), verifica-se que os novos padrões demográficos vivenciados
pelo país, têm resultado na atuação de quatro gerações no mesmo am-
biente (Figura 3).
Cabe salientar que o novo cenário delineado pela mudança de-
mográfica, ao mesmo tempo em que abre uma janela de oportunidades
para esse perfil de trabalhadores, indica, para o ambiente empresarial,
que num futuro próximo a contratação de pessoas mais velhas não será
uma opção, mas, sim, uma condição obrigatória. Sob essa ótica, resta às
empresas identificar e melhor aproveitar esses trabalhadores, de modo
que se tornem ativos valiosos em cada local de trabalho.
Nesse sentido, faz-se necessário observar as tendências mundiais
relacionadas ao tema, a fim de fazer proveito das melhores práticas. Nos
países europeus, essa preocupação já está amplamente difundida no am-
biente empresarial, por isso esses países podem ser utilizados como re-
ferência importante no que se refere à execução de boas práticas em
resposta ao desafio do envelhecimento da população ativa, conforme
apresentado na Tabela 1.

Figura 3 Perfil dos trabalhadores empregados na indústria da transformação, por


idade – 2015.
Fonte: MTPS/RAIS (2015)

116 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Tabela 1 Exemplo de boas práticas na Europa em resposta aos desafios do envelhecimento da população ativa no âmbito de SST.
Fonte: ENTERPRISE EUROPE NETWORK (2017)
PAÍS PÚBLICO PRÁTICA RESULTADO
Fábrica têxtil com 14 costureiras Programa de aquisição de novos equipamentos, melhoria Levou a zero acidentes e reduziu o absenteísmo por
permanentes da iluminação e melhoria da organização do trabalho. motivo de doença e idade.

Autarquia local com 1.200 trabalha- Programa de gestão em função da idade que utiliza ava- Redução das licenças por doenças e aumento da
dores, dos quais cerca de 25% com liações do desempenho, formação no domínio da gestão idade de reforma.
mais de 55 anos e serviços de medicina no trabalho.
Jardim de infância com 19 traba- Programa de coaching intergeracional, entre os funcioná- Redução da incidência de lesões musculoesque-
lhadores, dos quais 5 com mais de rios, de incentivo à prática de movimentos adequados e léticas.
55 anos com menor sobrepeso e utilização de ferramentas para
melhorar a capacidade para o trabalho.
Microempresa de construção de Introdução de aparelhos de elevação e a alteração da Manutenção dos trabalhadores mais velhos.
telhados com 4 trabalhadores com organização do trabalho.

Alemanha Dinamarca Finlândia Polônia


idade média de 40 anos.
Tem como alvo os trabalhadores Utiliza a experiência dos trabalhadores mais velhos, Aumento da produtividade e adaptabilidade dos
mais velhos, olhando para o amplo envolvendo-os na formação local de trabalho e capaci- trabalhadores com 55 anos ou mais. 
contexto das condições de trabalho. tação de jovens. O esquema também suporta a melhoria Inclusão de medidas para garantir o emprego
da SST. Estimula a formação on-the-job e incentiva a sustentável às pessoas com mais de 55 anos.

Bulgária
introdução de várias formas flexíveis de emprego (tempo
de trabalho flexível, rotação de trabalho, etc.).
Tem como alvo a adaptação de tra- As medidas incluíram horário de trabalho reduzido, sem Os mentores internos, apoiados pela Trilog e pela
balhadores mais velhos. A empresa afetar as aposentadorias, para os funcionários seniores. Qualification Alliance, ajudaram a melhorar as
SONNENTOR (distribuidor de alimen- Esses trabalhavam com um número limitado de horas. relações entre trabalhadores de diferentes idades.

LONGEVIDADE SAUDÁVEL
Áustria
tos biológicos) recebeu financiamen- Além disso, promoveram a mobilidade profissional Os resultados mostraram uma redução do absen-
to parcial para implementar medidas dentro da empresa e, a pedido dos trabalhadores, foram teísmo. Além disso, a iniciativa ajudou a empresa a
destinadas para esse público. fornecidas orientações sobre a promoção da saúde. obter a certificação Nestor Gold.

117
Verifica-se que países como Polônia, Finlândia, Dinamarca e
Áustria têm atuado nas adaptações do ambiente de trabalho, programas
de avaliação de desempenho, coaching, além de questões intergeracio-
nais, com vistas a reduzir o absenteísmo e os afastamentos em razão da
idade, além de reduzir a incidência de lesões musculoesqueléticas.
A Alemanha, por sua vez, tem optado pela introdução de apare-
lhos de elevação e alteração da organização do trabalho, a fim de garantir
a manutenção dos trabalhadores mais velhos.
Essas são medidas importantes, que têm apresentado resultados
satisfatórios nos países analisados, no entanto, segundo notícia divulga-
da pela Enterprise Europe Network (2017), além das medidas adotadas,
os fatores transversais, como uma abordagem holística (envelhecimento
e várias perspectivas da SST), implementação de medidas individuais
específicas, motivação e comprometimento por parte dos dirigentes da
empresa empregadora, têm sido chave para o sucesso desses países no
que se refere ao desafio do envelhecimento dos trabalhadores.
Soma-se a isso o envolvimento de todos os trabalhadores, sen-
sibilização para o benefício das medidas implementadas, comunicação
(formal e informal), medidas flexíveis e adaptáveis e apoio externo do
serviço de medicina no trabalho.
Dessa forma, assim como afirma Ilmarinen (2014):

[...] o local de trabalho tem um papel fundamental na promoção


de um estilo de vida saudável e apoio a atividades que travam o
declínio físico, contribuindo assim para manter a capacidade de
trabalho. A promoção da saúde no local de trabalho abrange uma
variedade de temas, incluindo alimentação e nutrição; consumo
de álcool; tabagismo; exercício físico e tempo de recuperação e de
sono suficientes (ILMARINEN, 2014).

Assim sendo, verifica-se que apesar desses limitadores, a maioria


dos trabalhadores mais velhos pode gozar de boa saúde e de uma adequa-

118 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


da capacidade de trabalho. Para tanto, faz-se necessária a implantação de
uma política de SST que foque não apenas na gestão do envelhecimento
do trabalhador, mas, sobretudo, num programa mais amplo, que contem-
ple toda a massa trabalhadora, uma vez que cada geração, independente-
mente da idade, possui pontos fortes e fraquezas.

CONCLUSÃO

O aumento da expectativa de vida é uma importante conquista


da população mundial, no entanto, com esse benefício, existem diversos
desafios no que se refere a manter um contingente populacional mais
envelhecido, com ganhos em saúde e bem-estar e ao mesmo tempo
garantir, aos diversos setores econômicos, ganhos em produtividade e
competitividade.
No cenário nacional, a questão do envelhecimento já é uma reali-
dade, não apenas em sociedade como no mercado de trabalho. Hoje, as
pessoas com mais de 50 anos já representam 19% da força de trabalho
brasileira, enquanto a população jovem, com até 29 anos, representa me-
nos de 12% e com tendência de queda. Cabe salientar que, na indústria,
esse reflexo ainda é menor, no entanto, nos setores de serviços e agro-
pecuário, isso já é uma realidade, o que ilustra um cenário de grandes
oportunidades e desafios.
Com uma expectativa de vida média de 80 anos, o Brasil terá,
em 2040, três trabalhadores para cada aposentado (IBGE, 2010). Nesse
caso, é necessário que as organizações, representadas por seus profissio-
nais de recursos humanos, sindicatos, previdência pública e privada e a
população em geral, discutam, com os órgãos governantes, ações conjun-
tas para permitir novas oportunidades de trabalhos para esse novo perfil
de trabalhadores.
Cabe salientar que os modelos de contrato de trabalho precisam
ser repensados, pois os moldes tradicionais não são capazes de manter

LONGEVIDADE SAUDÁVEL 119


os trabalhadores mais envelhecidos com a qualidade de vida suficien-
te para uma longevidade saudável. Nesse sentido, faz-se necessário re-
fletir, em conjunto, métodos capazes de apoiar esses profissionais, que
precisarão continuar trabalhando como forma de complementação de
renda, além de oferecer programas de preparação para a aposentadoria.
Adicionalmente, programas de mentorias e seniores contribuem para
que as pessoas assumam cargos estratégicos, mesmo aposentadas.
Ressalta-se que temas relacionados ao cuidado pessoal, à saúde, às
atividades de lazer, aos relacionamentos, aos hobbies, às finanças pessoais
e ao projeto de vida precisam ser tratados como primordiais, pois se ca-
racterizam como um pilar importante à manutenção de uma longevidade
saudável.
Atualmente, segundo o IBGE (2017), tem-se mais de 22 milhões
de pessoas com 60 anos ou mais e em menos de 30 anos, esse volume
saltará para 64 milhões. Portanto, esses são os desafios não apenas para
os profissionais de SST, mas para todos que direta ou indiretamente estão
relacionados à temática da longevidade. Nesse sentido, diversas medi-
das precisam ser tomadas pelos órgãos públicos e privados, a fim de que
os recursos sejam suficientes para garantir o bem-estar à população que
envelhece.

120 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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29. RIBEIRO, M. A. Terceira idade família e relacionamento de gerações. Revista A
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LONGEVIDADE SAUDÁVEL 123


ERGONOMIA
Alfredo Manoel dos Santos Santana
Ana Paula da Silva
Carla A. Gonçalves Sirqueira
Cláudia Ferreira Mazzoni
Flávia Komatsuzaki
Fernanda Oliveira Petry

ERGONOMIA 125
PANOR AMA DA ERGONOMIA E SEU
IMPACTO NA SEGUR ANÇA E SAÚDE

A
Constituição Brasileira de 1988, segundo artigo 7º, inciso XXII,
apresenta como um dos direitos do trabalhador a redução dos
riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, hi-
giene ocupacional e segurança. Em decorrência dessa orientação, o Brasil
desenvolveu uma estrutura legal e regulamentar, que ampara o emprega-
do em diversos pontos relacionados a sua saúde. No entanto, o que ainda
se verifica é um cenário de elevado custo econômico para o Estado e para
os empregadores, além de um alto custo social para o empregado.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 4% do
Produto Interno Bruto (PIB) dos países desenvolvidos e 10% do PIB
dos países em desenvolvimento estão relacionados à gastos com doen-
ças e aos agravos ocupacionais (ILO, 2015a). Em 28 estados da União
Europeia, transtornos musculoesqueléticos são as principais causas de
afastamentos relacionados ao trabalho, representando 51,90% de todas
as enfermidades profissionais reconhecidas em 2013 (EUROPE, 2015).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) sinalizou, em 2004,
85.898 dias de trabalho perdidos e 1.000 mortes devido à riscos ergonô-
micos (WHO, 2009a). Além disso, as lesões ocupacionais respondem por
18% do número total de lesões não intencionais em países de desenvolvi-
mento econômico médio, como é o caso do Brasil. As lombalgias relacio-

ERGONOMIA 127
nadas à falta de ergonomia no trabalho correspondem a 37% de todos os
casos. Um último dado estima que condições precárias de trabalho tam-
bém se relacionem com problemas mentais, de convívio com a família,
transtornos alimentares e riscos para doenças cardíacas (WHO, 2009b).
De acordo com relatório da OIT (2013), no cenário internacional,
2,02 milhões de pessoas morrem a cada ano devido a enfermidades labo-
rais e 160 milhões de pessoas sofrem de doenças não letais relacionadas
ao trabalho. Segundo a OIT, a prevenção é o caminho mais eficaz e de
menor custo que o tratamento e a reabilitação, assim, ela orienta que
todos os países tomem medidas concretas para melhorar sua capacidade
de prevenção das enfermidades profissionais ou relacionadas ao trabalho.
De acordo com os dados apresentados no 1º Boletim Quadrimestral
sobre benefícios por incapacidade 2017: Adoecimento Mental e Trabalho,
os benefícios concedidos por incapacidade temporária para o trabalho e os
auxílios-doença, totalizaram 7.168.633 de concessões no período entre 2012
e 2016 para o segurado empregado, enquanto as aposentadorias por invali-
dez, que retiram o trabalhador definitivamente da vida laboral, totalizaram
283.423 (Tabela 1).
Desse total, as prestações de auxílio-doença de natureza previdenciá-
ria, isto é, não relacionadas ao trabalho, representam mais de 80% das con-
cessões, enquanto o benefício de natureza acidentária responde por quase
16%.
A Tabela 1 demonstra que a duração média dos auxílios-doença con-
cedidos no período analisado é significativamente menor do que a associada a
aposentadorias por invalidez. Esta diferença é esperada, uma vez que consis-
tem em benefícios prestados por incapacidade temporária. O auxílio-doença
relacionado ao trabalho apresenta duração média de 183 dias, enquanto o
previdenciário, de 160 dias.
A Tabela 2 apresenta a concessão de auxílio-doença e aposen-
tadoria por invalidez, entre 2012 e 2016, por capítulo da Classificação
Internacional de Doenças – CID 10. Doenças do sistema osteomuscular
e do tecido conjuntivo, ocupam a segunda posição, como motivo de afas-

128 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Tabela 1 Concessão de Auxílio-Doença (B31 e B91) e Aposentadoria por Invalidez (B32 e B92) para o Segurado Empregado entre
2012 e 2016.
Fonte: Sistema Único de Benefício – SUB

Duração
Duração Valor Médio
Espécie Descrição Frequência % Despesas média
(em dias) por beneficio
(em dias)

Auxilio-doença
B31 5.991.180 80.40% 955.068.630 R$ 47.622.745.472,88 160 R$ 7.948,81
previdenciária

Auxilio-doença
B91 por acidente de 1.177.453 15.80% 215.365.507 R$ 10.666.821.046,75 183 R$ 9.059,23
trabalho

Aposentadoria por
B32 246.023 3.30% 262.203.805 R$ 14.605.872.798,68 1.066 R$ 59.367,92
invalidez

Aposentadoria
por invalidez
B92 37.400 0,50% 48.465.897 R$ 2.698.381.604,08 1.296 R$ 72.149,24
de acidente de
trabalho

ERGONOMIA
Totais 7.454.056 100% 1.482.003.838 R$ 81.358.723.105,65 199 R$ 10.917,62

129
130
Tabela 2 Distribuição da Concessão de Auxílio-Doença e de Aposentadoria por Invalidez de Naturezas Previdenciária e Acidentária.
Fonte: MPS. 1.º Boletim Quadrimestral sobre Benefícios por Incapacidade. Sistema Único de Benefícios, SUB. Brasília, 2017

Representatividade
Capítulo da CID 2012 2013 2014 2015 2016 Total percentual da concessão
total no período (%)

Capítulo XIX – Lesões,

Gestão de Programas de Qualidade de Vida


envenenamento e algumas
494.570 498.124 496.718 374.148 450.026 2.313.586 31,044%
outras consequências de causas
externas

Capítulo XIII – Doenças do


sistema osteomuscular e do 304.027 310.436 311.786 236.937 266.505 1.429.691 19,184%
tecido conjuntivo

Capítulo V – Transtornos
140.208 147.145 144.061 109.951 127.562 668.927 8,976%
mentais e comportamentais
tamento do trabalho, representando cerca de 19% do total de auxílios-
-doença e aposentadorias por invalidez no período.
Dos dados apresentados depreendem-se as consequências nega-
tivas para o empregado, o empregador e o governo, já que a saúde, a
capacidade produtiva e os gastos previdenciários ficam comprometidos,
impactando na sustentabilidade e na capacidade de competitividade da
indústria. Desta forma, o investimento na saúde do trabalhador justifica-
-se pelo potencial que as doenças relacionadas ao trabalho têm afetado os
índices de produtividade, contribuído para o aumento dos níveis de afas-
tamentos e de absenteísmos, gerado elevados custos diretos e indiretos
para a indústria recompor seu quadro de funcionários e sua produtivida-
de devido aos adoecimentos, além dos custos sociais para os empregados.
Devido às exigências de mercado e à competitividade das empre-
sas, torna-se cada vez mais necessário o desenvolvimento de métodos
que possam contribuir para a melhoria das condições de trabalho, garan-
tindo a qualidade dos serviços e a sustentabilidade da indústria. Neste
sentido, a aplicação dos conhecimentos em ergonomia, compreendida
como o estudo do relacionamento entre o homem e seu trabalho, apre-
senta subsídios para o reconhecimento do que se entende como fatores
de risco potenciais para gerar adoecimentos relacionados ao trabalho,
bem como reconhecer condições adequadas para o desenvolvimento da
atividade laboral.
Pode-se citar algumas características das condições de trabalho
que potencializam a presença dos riscos ergonômicos no trabalho:

• Tarefas que acontecem de forma repetitiva com ciclos curtos


de duração e com o mesmo padrão de movimentos;
• Excesso de sobrecarga física durante o manuseio de peso;
• Uso de força excessiva sem adequada recuperação;
• Posturas inadequadas provenientes de um mobiliário inapro-
priado, de ferramentas e equipamentos desfavoráveis para o
trabalhador;

ERGONOMIA 131
• Ritmo excessivo de trabalho devido a altas exigências de pro-
dutividade e metas.
• Trabalho monótono e sem estímulos;
• Falta de participação na tomada de decisões e má gestão de
mudanças organizacionais;
• Comunicação ineficaz;
• Ambientes desfavoráveis no que se diz respeito a iluminação,
ruído e temperatura.

Ergonomia sob a ótica de normatizações


no Brasil

As condições ergonômicas de trabalho são regradas pela Norma


Regulamentadora n.º 17 (NR 17), Portaria 3.214, de junho 1978, do
Ministério do Trabalho e Previdência Social, a qual inclui dois anexos
específicos para as atividades de Checkout e de Teleatendimento.
Como todas as outras 36 Normas Regulamentadoras brasileiras,
a NR 17 referente a Ergonomia, é de observância obrigatória às empre-
sas privadas, públicas e aos órgãos do governo que possuam empregados
regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
No cenário brasileiro, a contratação de serviços de ergonomia
ainda acontece, principalmente, devido a uma demanda legal, por parte
da cobrança da legislação vigente, como a NR 17 (MTE, 1990) e NR
36 (MTE, 2013), porém o desenvolvimento de ações continuadas de
melhoria e gerenciamento dos fatores ergonômicos levantados ainda é
tímida. Assim, muitas dessas empresas julgam a ergonomia como um gas-
to desnecessário e que não agrega valor, sendo obrigatório apenas para
cumprimento da lei. Entretanto, algumas empresas identificam na ergo-
nomia uma grande oportunidade de alcançar melhorias na produtivida-
de, qualidade do serviço e/ou produto e diminuição dos acidentes de tra-
balho e afastamentos, através da identificação dos riscos e melhoria das

132 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


condições de trabalho, criando um ambiente laboral ergonomicamente
adequado nos pilares físico, cognitivo e organizacional.
Conforme o item 17.1, a NR 17 visa estabelecer parâmetros que
permitam a adaptação das condições de trabalho às características psi-
cofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de
conforto, segurança e desempenho eficiente.
A Norma Regulamentadora n.° 36 (NR36), que estabelece os re-
quisitos mínimos para a avaliação, o controle e o monitoramento dos
riscos existentes nas atividades desenvolvidas na indústria de abate e
processamento de carnes e derivados destinados ao consumo humano,
também apresenta referências para o cumprimento de vários aspectos de
origem ergonômica, específicas para o setor frigorífico.
A NR 17 é caracterizada pela apresentação de princípios e não de
limites de tolerância como acontece em diversas normas que tratam de
aspectos de segurança e de higiene ocupacional. Assim, é comum a quei-
xa da dificuldade de aplicação da NR 17 devido ao seu caráter subjetivo.
No entanto, compreende-se que a NR 17 deve atender às naturezas dos
mais diversos processos produtivos. Dessa forma, o desafio para aten-
der aos princípios apontados na norma é minimizado pela capacidade
de conduzir a uma análise ergonômica da atividade que seja capaz de
responder às demandas iniciais e apontar possibilidades de intervenção
eficientes e realísticas para o contexto estudado.
Como exemplo, pode-se citar o item 17.2.2 da norma: “Não de-
verá ser exigido nem admitido o transporte manual de cargas, por um
trabalhador cujo peso seja suscetível de comprometer sua saúde ou sua
segurança”.
Assim, o Manual de Aplicação da NR 17, expedido pelo Ministério
do Trabalho (2002), afirma que o fato de a legislação ainda permitir
transporte e levantamento de carga com limite muito elevado (60 kg
de acordo com art. 198 da CLT) não quer dizer que se deva ater a ele.
Reconhece-se que quanto mais leve for a carga, menor é a possibilidade
de o trabalhador comprometer sua saúde e, portanto, de não faltar ao

ERGONOMIA 133
trabalho. Em seguida, o Manual referencia o método de análise de ma-
nuseio de carga desenvolvido pelo National Institute of Occupational
Safety and Health (NIOSH) dos Estados Unidos em 1981. Portanto, o
item da norma explicita a necessidade de se preservar a saúde do traba-
lhador que transporta carga manualmente, mas não especifica o valor
da carga, uma vez que, para tal é necessária uma análise que considere
diversos fatores da atividade, tais como localização da carga, movimentos
ao pegar a carga, frequência de levantamento da carga etc. Assim, a NR
17 não determina um valor específico, pois um mesmo valor de carga
pode gerar impactos diferentes dependendo das condições em que a ati-
vidade é realizada.
Para garantir o sucesso das intervenções propostas dentro dos pro-
gramas de ergonomia, é importante que as empresas tenham o que cha-
mamos de maturidade ergonômica, que pode ser definida como o grau de
desenvolvimento de uma organização para suprir e incorporar as ações
ergonômicas dentro de suas principais decisões relacionadas ao funcio-
namento de seus processos internos (VIDAL, 2009).
Empresas com níveis mais altos de maturidade investem em pro-
gramas de prevenção, com o objetivo de reduzir os gastos com as doenças
ocupacionais, para melhorar a produtividade e a qualidade de vida dos
trabalhadores (KIM et al., 2016).
Outro parâmetro legal, no qual os fatores de riscos ergonômicos
estão inseridos, é o Decreto n.º 8.373/2014, que instituiu o Sistema de
Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas
– e-Social. O programa e-Social do Governo Federal exige informações
acerca da existência dos riscos ergonômicos, descritos na seção Fatores
Ambientais presente no documento. Para cumprir essa nova exigência
legal, será importante que as empresas estejam cientes quanto aos riscos
ergonômicos existentes nos seus processos produtivos. Assim, documen-
tos como Análise Ergonômica do Trabalho (AET) serão imprescindíveis
e deverão estar atualizados. A compreensão da mensuração desses riscos,
o significado da sua presença e a proposição de ações para mitigá-los será

134 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


fundamental, pois a partir do registro no e-Social, a sua ocorrência pode-
rá justificar o surgimento de adoecimentos e acidentes.

Conceitos e atuações da ergonomia

Compreende-se como ergonomia o estudo de uma atividade, vi-


sando adaptá-la ao indivíduo. No entanto, a palavra “ergonomia” é, co-
mumente, associada às situações que lembram apenas as demandas físi-
cas de uma atividade como postura, conforto, cuidados no manuseio de
carga, cadeira adequada, movimentos repetitivos etc. Porém, essa visão
restrita do conceito de ergonomia não garante que outros aspectos rele-
vantes para a adequação do trabalho às características do trabalhador,
tais como as demandas cognitivas, as exigências de produção, o desenho
de ferramentas e maquinários sejam considerados.

Observa-se o uso recorrente do adjetivo “ergonômico” como estra-


tégia de marketing, valorizando as qualidades de produtos, como carros,
ferramentas, equipamentos, mobiliários e outros, sem, necessariamente,
considerar como será a sua utilização pelo homem. Nesse contexto, é
importante considerar as variáveis que possam interferir nas atividades
e demandas do trabalhador além dos fatores físicos, na busca de enten-
der as exigências cognitivas e organizacionais em que tais fatores estão
expostos.
A palavra “ergonomia” tem origem grega. Ergon significa trabalho,
e nomos significa leis, normas, preceitos. Assim, a ergonomia é compre-
endida como a ciência do trabalho, uma disciplina orientada para uma
abordagem sistêmica de todos os aspectos da atividade humana (IIDA,
2016).
A literatura científica descreve uma série de proposições para de-
finir ergonomia. No entanto, a conceituação aprovada na Reunião do

ERGONOMIA 135
Conselho Científico da International Ergonomics Association em 1.º de
agosto de 2000, em San Diego, nos Estados Unidos, é a descrição a seguir:

Ergonomia (ou Fatores Humanos) é a disciplina científica que tra-


ta da compreensão das interações entre os seres humanos e outros
elementos de um sistema, e a profissão que aplica teorias, princí-
pios, dados e métodos, a projetos que visam otimizar o bem-estar
humano e a performance global dos sistemas (IEA, 2000).

Os ergonomistas contribuem para o planejamento, para a confec-


ção do projeto e para a avaliação de tarefas, postos de trabalho, produtos,
ambientes e sistemas para torná-los compatíveis com as necessidades,
habilidades e limitações das pessoas. Esses profissionais devem ter uma
compreensão da amplitude de seu papel por meio da ergonomia, pro-
mover uma abordagem holística do trabalho, na qual considerações de
ordem física, cognitiva, social, organizacional, ambiental, entre outros
aspectos relevantes, devem ser levadas em conta.
Em decorrência da amplitude do conceito de ergonomia, se busca
ompreendê-la dividindo suas aplicações em domínios. Os domínios não
são mutuamente exclusivos e evoluem constantemente. De acordo com
a IEA (2000), os domínios podem ser descritos como a seguir:

• Ergonomia Física – concerne às características da anatomia


humana, fisiologia, antropometria e biomecânica, em relação
à atividade física. Essas áreas de conhecimento contribuem
nos estudos relativos às estruturas, ao funcionamento, às di-
mensões e aos movimentos do corpo humano. Os tópicos re-
levantes incluem postura no trabalho, manuseio de materiais,
movimentos repetitivos, distúrbios musculoesqueléticos rela-
cionados ao trabalho, projeto de postos de trabalho, segurança
e saúde;

136 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


• Ergonomia Cognitiva – refere-se aos processos mentais, tais
como percepção, memória, raciocínio e resposta motora, con-
forme afetam interações entre seres humanos e outros ele-
mentos de um sistema. Os tópicos relevantes incluem carga
mental de trabalho, tomada de decisão, performance especia-
lizada, interação homem-computador, estresse e treinamento,
conforme esses se relacionam aos projetos que envolvem seres
humanos e sistemas. Este domínio nos faz lembrar de que uma
atividade não se realiza apenas com base nos aspectos físicos.
A capacidade de receber informações, processá-las e, a partir
daí, tomar decisões é fundamental para o sucesso de qualquer
tarefa, desde a mais simples até a mais complexa. Ao dirigirmos
um automóvel, recebemos informações do painel do carro bem
como informações externas, por exemplo, do semáforo. Este,
ao ser avistado, informa ao motorista, por meio de suas cores,
as possibilidades de tomada de decisão, seja frear o carro, seja
seguir em frente. Um trabalhador em uma sala de controle de
uma mina está exposto às várias informações que subsidiarão
suas tomadas de decisão, as quais, muitas vezes, serão funda-
mentais para garantir a produção e a segurança do processo.
Portanto, sem treinamento/capacitação, as informações rece-
bidas podem não ter o significado necessário para a tomada de
decisão correta;
• Ergonomia Organizacional – destina-se à compreensão dos
processos de trabalho, à otimização dos sistemas de produção,
incluindo suas estruturas organizacionais, políticas e processos.
Os tópicos relevantes incluem comunicações, gerenciamento
de recursos, projeto de trabalho, organização temporal do tra-
balho, trabalho em grupo, projeto participativo, ergonomia co-
munitária e trabalho cooperativo, cultura organizacional, or-
ganizações em rede, teletrabalho e gestão da qualidade. Assim,
este domínio demonstra a necessidade de compreendermos

ERGONOMIA 137
que toda atividade está inserida em um contexto organizacio-
nal específico, o que faz com que tenhamos de estudar cada
caso, sem a pretensão de copiar e colar o estudo das atividades,
por exemplo, de recepcionistas. No entanto, em empresas di-
ferentes, o mesmo cargo de recepcionista pode gerar informa-
ções bem diferentes, pois as tarefas, a maneira de trabalhar e a
percepção do funcionário em relação ao seu trabalho mudam
de acordo com o contexto organizacional no qual a atividade
está inserida.

Dos conceitos apresentados, depreende-se portanto, que a ergono-


mia é um termo utilizado para estudar uma atividade no seu sentido mais
amplo. É uma ciência multidisciplinar, cuja várias áreas são essenciais para
a sua prática, tais como engenharia, fisiologia, biomecânica, psicologia,
administração, arquitetura, que devem compor o corpo de conhecimen-
to da formação do ergonomista. Assim, este conceito será a base para a
compreensão das inadequações e das necessidades de intervenções em
determinado processo de trabalho. Portanto, o trabalhador é um meio
para compreender a atividade, mas o ergonomista avalia a atividade e
esta deve ser planejada de maneira a garantir produtividade para o ne-
gócio e preservação da saúde e segurança das pessoas responsáveis pela
produção.
De acordo com Wisner (1987), podem-se distinguir dois campos
de atuação principais em ergonomia:

• Ergonomia do produto: diz respeito à concepção de novos


produtos, ou seja, às recomendações ergonômicas para o
projeto de um produto;
• Ergonomia de produção: refere-se às recomendações ergonô-
micas para o projeto de sistemas de trabalho, ou seja, às re-
comendações ergonômicas para atividades realizadas em qual-
quer processo produtivo: fábricas, hospital, escolas, indústrias

138 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


etc., considerando-se tanto os aspectos de produção quanto os
administrativos.

Em ambos os campos, os conceitos de ergonomia devem ser preser-


vados, ou seja, a aplicação dos conhecimentos que norteiam os domínios
físico, cognitivo e organizacional apresentados no item anterior.
Wisner (1987) apresenta, ainda, modalidades de intervenção da
ergonomia:

• Ergonomia de correção: promove mudanças no ambiente de


trabalho ou em um produto, a partir da análise de um proble-
ma que pode decorrer de erros de projetos ou de execução das
tarefas. A correção pode ser feita no nível físico (troca de mo-
biliários, adequação de posturas e movimentos etc.), no nível
cognitivo (necessidade de treinamento, redefinição de tarefas
etc.) ou no nível organizacional (alterações de procedimentos,
readequação de metas, mudanças de tecnologia etc.);
• Ergonomia de concepção: permite agir precocemente, já que
possibilita projetar o ambiente, o processo de trabalho ou o
produto com vistas à prevenção de problemas. Assim, fatores
de riscos ergonômicos, tais como posturas inadequadas, layouts
desfavoráveis, altas demandas cognitivas e regras organizacio-
nais exigentes podem ser evitados antes do estabelecimento de
uma nova linha de produção.

Os conceitos e os domínios da ergonomia são aplicáveis em


diferentes campos de atuação e em diferentes momentos de intervenção,
porém serão sempre a base de atuação do ergonomista. Dessa forma, a
ideia popular de que a ergonomia é ligada apenas às demandas físicas de
uma atividade foi ampliada e deve-se compreendê-la como o estudo da
atividade, considerando também seus aspectos cognitivos e o contexto
organizacional no qual ela está inserida. Assim sendo, por meio de um

ERGONOMIA 139
diagnóstico ergonômico, será possível apresentar recomendações de in-
tervenções que garantam melhor adequação das condições de trabalho
às características psicofisiológicas dos trabalhadores.

Abordagem da ergonomia de participação

A empresa que participa e contribui com o trabalho do ergono-


mista, dentro da corporação, tem maiores chances de alcançar seus ob-
jetivos com melhores resultados, promovendo também benefícios para
a sua própria cultura, já que possivelmente agregará valores nas esferas
econômica e social, uma vez que reduzirá gastos com acidentes, afasta-
mentos e absenteísmo e promoverá uma melhor qualidade de vida para
seus funcionários dentro do ambiente laboral, além do cumprimento das
exigências legais (WISNER, 1987).
Nas intervenções ergonômicas corretivas ou de concepção, a par-
ticipação dos trabalhadores é fundamental para integrar a equipe res-
ponsável pelas mudanças necessárias e para a concepção de um novo
projeto, visto que os trabalhadores conhecem a situação de trabalho e as
dificuldades nela envolvidas. A participação dos trabalhadores, tanto na
fase de concepção quanto na implementação de projetos, contribui para
um maior envolvimento e, por conseguinte, um maior índice de sucesso
nas intervenções. Para ser mais eficaz é importante que a prática ergonô-
mica faça parte da rotina de todos os funcionários da empresa. Segundo
Ole (2010), a ergonomia participativa tornou-se um campo generalizado
de pesquisa e prática.
Campos (2000) afirma que a participação dos trabalhadores, tanto
na gestão, quanto em um simples programa de sugestões, pode não so-
mente resultar em aumento de produtividade, mas também na preven-
ção de acidentes e doenças ocupacionais. Segundo Nagamachi (1996),
“a possibilidade de participar do processo decisório dá ao trabalhador um
sentimento de responsabilidade que resulta em maior motivação e satis-

140 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


fação”. Considera-se que, dessa forma, a resistência às transformações é
amenizada, uma vez que os próprios trabalhadores têm a oportunidade
de participar.
A Organização Holandesa para Pesquisa Científica Aplicada –
TNO Organization Netherlands– (2017), considera que a empresa que
não participa e que não tem interesse em colaborar, dificulta o processo
e interfere nos resultados de forma negativa, não sendo eficaz. Toda a
necessidade de colaboração, por parte da empresa, precisa ser celebrada
no momento inicial da abordagem, antes mesmo do início das ativida-
des, de modo que os papéis e responsabilidades de cada um estejam bem
claros e definidos. Segundo essa mesma organização, todos os aspectos
listados abaixo são fundamentais para favorecer o bom andamento das
intervenções, quais sejam:

• Estabelecer com clareza o motivo do projeto com a equipe que


vai trabalhar;
• Participação de pessoas estratégicas da empresa com poder de
decisão;
• Ter um plano bem claro de acompanhamento para ver se as
metas estão sendo bem atingidas;
• Divulgar as informações e estabelecer a comunicação;
• Proporcionar o conhecimento e envolvimento de toda a equi-
pe por meio de atividades participativas e lúdicas, de forma
que a absorção do conhecimento e o aprendizado sejam ainda
maiores;
• Informar o máximo de pessoas da organização, instruir as pes-
soas, desde o início do projeto até o final, sobre todas as etapas,
cronograma, resultados, acompanhamento etc.

Na realização de capacitações dos funcionários da indústria, por


meio de treinamentos, com foco na identificação dos riscos durante a
realização das suas atividades, é que se visualizam as estratégias para se

ERGONOMIA 141
lidar com eles. Assim, a aplicação dos conceitos da ergonomia de cons-
cientização e de participação, se torna fundamental na busca de um am-
biente de trabalho confortável e seguro. A diferença entre essas duas
formas de ação em ergonomia é que, enquanto na de conscientização o
profissional adquire conhecimento sobre a ergonomia, na de participação
ele atua efetivamente, auxiliando na criação da solução (IIDA, 2016).

Necessidades e tendências da ergonomia

Resultados de uma pesquisa realizada pelo SESI-MG, em 2015,


com indústrias de médio porte, demonstraram que as empresas têm atu-
ado em Segurança e Saúde no Trabalho - SST, de forma restrita e pouco
estratégica, preocupando-se primariamente com a não ocorrência de aci-
dentes típicos e com o cumprimento da legislação. Dessa forma, agindo
de maneira reativa, com poucas ações baseadas na promoção e na pre-
venção da saúde e segurança do trabalhador.
A aplicação dos conceitos da ergonomia nas análises, nos diagnós-
ticos e nas proposições de ações corretivas parece não ser suficiente para
conter os elevados índices de adoecimentos ocupacionais e absenteísmos
advindos da exposição dos trabalhadores aos fatores de riscos ergonômi-
cos, fato descrito pelas estatísticas da Previdência Social e do Ministério
do Trabalho. Além disso, intervenções em processos já estabelecidos po-
dem ter um alto custo, o que contribui para a prorrogação da exposição
aos riscos.
Atualmente a forma mais utilizada da ergonomia é a de correção,
que atua analisando e intervindo nos riscos encontrados buscando re-
duzi-los, por meio da melhoria dos postos de trabalho, dos processos e
dos produtos já existentes. Apesar de ser a forma de aplicação da ergo-
nomia mais utilizada, ela não é a mais efetiva, já que se torna mais difícil
intervir em processos e cenários já estabelecidos, pois a resposta para
resolução desses problemas, pode exigir alto custo de implementação e

142 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


muita morosidade, além de dificuldade em aceitação por parte de alguns
profissionais.
Uma forma preventiva para lidar com essas dificuldades seria as
empresas trabalharem com a ergonomia de concepção, já que nela é
construído o layout do novo posto de trabalho, da nova linha de produ-
ção e/ou do novo setor, por meio de estudo, levantamento das deman-
das da atividade e dos trabalhadores envolvidos e estruturação do novo
layout com base nessas necessidades, evitando a exposição aos riscos er-
gonômicos e os gastos com a correção de um novo posto.
A ergonomia de concepção exige maior conhecimento e experi-
ência da equipe envolvida, porque as decisões são tomadas em situações
hipotéticas sobre um sistema que ainda não existe (IIDA, 2016). Porém,
o nível dessas decisões pode ser melhorado buscando informações em
situações de referência, que são semelhantes à nova situação, construin-
do-se protótipos bidimensionais e tridimensionais dos postos do trabalho
em resina, madeira ou papelão, ou em softwares de simulação virtuais,
entre outros.
As aplicações da ergonomia de concepção são para projetos de
melhoria de processos, tais como; mudança tecnológica, alterações sig-
nificativas no processo de produção e projetos para desenvolvimentos de
novos produtos.
De acordo com Iida (2016), o projeto e o desenvolvimento de
produtos eram concentrados, principalmente nos aspectos técnicos e
funcionais, mas esse panorama mudou, e os aspectos ergonômicos e de
design passaram a ser considerados. A partir disso, observa-se mais uma
oportunidade de atuação para os ergonomistas. De acordo com Haubner
(1990), os ergonomistas podem contribuir nas seguintes atividades para
o desenvolvimento do produto: descrever e analisar as tarefas e caracte-
rísticas dos usuários do sistema, elaborar propostas de interface e alterna-
tivas para melhorar a usabilidade e agradabilidade, elaborar alternativas
que facilitem a produção, a montagem, a distribuição, o descarte e a re-
ciclagem, examinar as características para prevenir e eliminar eventu-

ERGONOMIA 143
almente riscos de erros e acidentes na operação ou no uso do produto
e fazer avaliação do produto do ponto de vista ergonômico, tanto do
hardware como do software. No entanto, observa-se pouca atuação dos
ergonomistas neste campo de trabalho.
Diante do exposto, os recursos que norteiam a ergonomia de con-
cepção podem contribuir para o planejamento físico e organizacional de
novos processos de trabalho. A análise antecipada dos riscos, por inter-
médio da percepção dos funcionários envolvidos com o novo processo
a ser implantado proporcionará ganhos nas relações interpessoais e na
diminuição da exposição aos riscos.
Tornar viável a aplicação dos princípios da ergonomia de concep-
ção nas indústrias brasileiras, é possibilitar antever os problemas tendo
por objetivo apoiar na disseminação de cultura prevencionista, além de
potencializar as oportunidades de inovação.

Gerenciamento dos riscos ergonômicos

Independente de qual forma de aplicação será escolhida ou a com-


binação dos diferentes modelos de atuação, faz-se necessário para as in-
dústrias a ciência dos riscos ergonômicos e de como atuar perante eles.
Assim, é importante que as indústrias gerenciem seus riscos para que
consigam identificar e controlar os pontos mais críticos existentes. Se
esses riscos não forem reduzidos, podem contribuir para o surgimento
de afastamentos, por doenças osteomusculares e, com o aumento dos
acidentes de trabalho, dos refugos e retrabalhos, refletindo em baixa pro-
dutividade, o que leva ao aumento dos gastos da indústria.
O programa de gerenciamento de riscos, inicia-se com o levan-
tamento dos riscos presentes no ambiente de trabalho a fim de desco-
brir suas causas raízes. Por intermédio deste levantamento situacional
será estruturada uma proposta de melhoria com as ações planejadas para
eliminá-los ou minimizá-los, estimando os custos e elaborando um cro-

144 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


nograma com essas ações de acordo com a prioridade, que dependerá do
grau de risco apontado pelo levantamento, e com a necessidade da em-
presa. Para testar a efetividade das mudanças propostas, gerando menor
custo para a empresa, possibilidade de reajustes e nova análise de riscos,
é importante fazer um teste piloto em um número menor de postos, am-
pliando para os demais postos após conclusão da eficiência das ações.
Além disso, calcular medidas de desempenho das ações de melhoria pelo
custo-efetividade, usar indicadores de desempenho e correlacioná-los
com os dados do absenteísmo, do acidente de trabalho e da qualidade
ajuda a mostrar os reais benefícios que a ergonomia proporciona em ter-
mos de custos e benefícios para as empresas.
De acordo com o Sistema de Escrituração Digital das Obrigações
Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial), já mencionado, as em-
presas devem registrar os códigos referentes aos riscos ergonômicos aos
quais estão expostas, com base na realização de um estudo ergonômi-
co. Essas informações deverão ser atualizadas no sistema do Governo
Federal, sendo de suma importância o acompanhamento contínuo do
ergonomista, como acontece no Programa de Gerenciamento dos Riscos
Ergonômicos da empresa.
Com o programa de gerenciamento de riscos ergonômicos, espera-
-se que a empresa consiga:
• demonstrar sua capacidade de adaptar as condições de traba-
lho às características dos trabalhadores;
• atender a legislação vigente;
• eliminar ou minimizar os riscos ergonômicos;
• reduzir afastamentos, queixas, acidentes relacionados à ergo-
nomia, absenteísmo e presenteísmo;
• reduzir custos;
• melhorar a produtividade;
• incluir processos de melhorias contínuas em ergonomia;
• oferecer subsídios para a empresa na tomada de decisão em
vários níveis.

ERGONOMIA 145
Após a implementação das melhorias, é fundamental a validação
pelos trabalhadores, os ajustes das necessidades apontadas e o monitora-
mento daquelas. O acompanhamento das melhorias pode ser um grande
aprendizado para as situações futuras e pode se tornar referência no caso
de reincidências.
Em busca de criar um sistema de gerenciamento completo e eficaz,
faz-se imprescindível ter indicadores que sejam abrangentes para abordar
as questões gerais da ergonomia, mas, ao mesmo tempo, sejam sensíveis
para não pormenorizá-los e para medi-los com fidedignidade.
Existem diversos indicadores para avaliar o desempenho do sis-
tema de produção, tais como o tempo médio e custo médio de produ-
ção, de acordo com o número de funcionários, porém há relativamente
poucas pesquisas sobre a criação e implementação de indicadores para
questões de ergonomia. Pode-se dizer que existem indicadores, o quais
agem de forma isolada e nem sempre oferecem as informações necessá-
rias para um programa de gerenciamento completo e eficaz envolvendo
a ergonomia.
Em se tratando de ergonomia, os indicadores podem ser qualitati-
vos ou quantitativos, o que vai depender da sua finalidade em entender
o estado e o andamento do processo. Os indicadores são alimentados por
uma base de dados incorporada com base nos levantamentos realizados.
Nesse caso, o conhecimento técnico e profissional do avaliador é de ex-
trema importância para que possa ser realizada a interpretação correta e
a validação de todas as informações.
A padronização dos dados é fundamental para que a empresa te-
nha mais conhecimento e controle sobre todos os itens levantados para
garantir todo o acompanhamento nos processos de melhoria contínua.
É observada a necessidade de uma maior integração de natureza parti-
cipativa, técnica e gerencial entre as áreas, para atender as principais
necessidades com o objetivo de alcançar sempre os melhores resultados.
Integrar esses sistemas é um grande desafio para as organizações. Essa
integração vai além do agrupamento de requisitos – ela considera a si-

146 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


nergia que cada assunto pode ocasionar. O foco no ambiente, na saúde,
no cliente, na segurança, na responsabilidade social e na própria organi-
zação deve ser equilibrado, visando ao atendimento de todas as partes.
Recomenda-se que o Programa de Gestão possa ser desenhado com a
empresa para considerar suas particularidades, permitindo atender, dessa
forma, as reais necessidades.
Ao se intervir em uma atividade, visando eliminar ou minimizar os
riscos ergonômicos, deve-se preservar o equilíbrio entre as intervenções
ergonômicas propostas e a preservação da capacidade de produção, pen-
sando em um Sistema de Gestão Integrada - SGI, composto por política,
organização, planejamento e implementação, avaliação e ação para me-
lhoria, conforme Figura 1.

Figura 1 Integração das áreas do SGI

ERGONOMIA 147
O modelo do prof. Meshakti (2007), estudioso sobre acidentes
em grandes empresas, conforme apresentado na Figura 2, demonstra a
importância de elos fortes entre homem, organização e tecnologia para
garantir o volume de produção. Ou seja, se qualquer um desses elos for
fraco ou se romper, a produção será diretamente afetada. Como o estudo
da ergonomia tem como pressuposto desenhar processos organizacionais
e aplicar tecnologias compatíveis com as características psicofisiológicas
dos trabalhadores, ela deve ser considerada também na sustentabilidade
dos volumes de produção.

Figura 2 Integração das áreas do SGI

148 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


CONSIDER AÇÕES FINAIS

A 4ª Revolução Industrial e por consequente sua evolução tec-


nológica exige das instituições um modelo de trabalho baseado numa
perspectiva integrada e colaborativa, cujo conhecimento é a chave para
inovação.
A ergonomia, aliada ao movimento de Sistema de Gestão, coloca-
-se como uma base para a proposta de melhoria contínua dos processos
produtivos. Em geral, as melhorias da ergonomia trazem efetivamente
benefícios para os processos produtivos. Isso ocorre em termos de melho-
rias em diversos aspectos do processo, tais como: produtividade, qualida-
de da produção, redução de erros, moral dos trabalhadores, entre outros,
e que, em todos os casos, podem ser traduzidos em resultados financeiros
(MAFRA, 2006). Conforme abordado neste capítulo, as empresas pre-
cisam conhecer os impactos causados pelo adoecimento dos trabalhado-
res e suas consequências no trabalhador, nas questões financeiras e no
processo produtivo. O monitoramento, por meio do método adequado
e sistemático, se torna essencial para a tomada de decisão da indústria.
Além disso, a ergonomia precisa ser considerada para além de um
instrumento que fornece elementos para compreender a interface entre
pessoas, tecnologia e a organização. A ergonomia necessita ser inserida
na cultura organizacional como um agente de conhecimento que cria
valor nas empresas, contribui para o aumento da competitividade e pro-
move a inovação.

ERGONOMIA 149
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152 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


HIGIENE
OCUPACIONAL
Antonio Augusto Fidalgo Neto
Paulo Roberto Furio
Rachel Novaes Gomes
Sergio Noboru Kuriyama

HIGIENE
OCUPACIONAL 153
N
os frios dias de céu azul e sol brilhante do outono eu-
ropeu do século XVIII, crianças maltrapilhas, frequen-
temente órfãs, se movimentavam em cidades como
Londres e Paris em busca de chaminés a serem limpas nas grandes
e ricas casas de família. Com o rigoroso inverno que chegaria em
breve, a necessidade de um eficiente sistema de aquecimento fazia
com que crianças tivessem oportunidades de algum ganho finan-
ceiro a partir da escalada no interior das chaminés e a sua limpeza
com pequenas escovas de mão, ou raspadores de metal. Por conta
das reduzidas dimensões das chaminés, meninos e meninas dos
7 aos 12 anos de idade apresentavam características físicas pró-
prias para o desempenho da árdua tarefa (Figura 1). Ainda na
Europa, existem relatos de crianças realizando esta tarefa desde
o século XIII. Entretanto, somente no século XIX, na Inglaterra,
a realização desta tarefa por crianças se tornou ilegal. No ano de
1864, o Lord de Shaftesbury criou a lei para regulamentação dos
limpadores de chaminés, estabelecendo, por exemplo, uma penali-
dade de 10 Libras esterlinas para aqueles que contratassem mão
de obra infantil para este fim (Act for the Regulation of Chimney
Sweepers).
Neste cenário, Sir Percival Pott, um eminente médico cirurgião
Londrino, publicou em 1775, observações sobre a grande incidên-
cia de câncer escrotal em meninos que limpavam chaminés. Pott
propôs que o acúmulo da fuligem era o agente causal do câncer.
Este pode ser considerado como um dos primeiros relatos históricos
da descoberta de causas ambientais para o câncer, incluindo, ob-

HIGIENE
OCUPACIONAL 155
viamente a associação causal estreita entre uma ocupação e uma
doença. Não menos importante, Sir Pott é também considerado
como um pioneiro da epidemiologia observacional, um século an-
terior ao relato de John Snow sobre a relação entre a qualidade da
água e cólera.

Figura 1 Criança limpadora de chaminés. (Spazzacamino, séc XIX).


Fonte: Autor desconhecido. Imagem de domínio público no seu país de origem e
outros nos termos do Direito Autoral.

156 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


A saúde ocupacional na indústria

Perspectiva Histórica e definições gerais


Mesmo não sendo o primeiro registro histórico envolvendo a
saúde e bem-estar dos trabalhadores, o câncer dos meninos limpadores
de chaminés é uma rica fonte de informações, consideradas como base
dos conhecimentos da saúde ocupacional e, por consequência a higie-
ne ocupacional.
A Higiene Ocupacional ou Industrial é a ciência que anteci-
pa, reconhece, controla e previne os riscos ocupacionais com poten-
cial para afetar, de qualquer forma, o bem-estar dos trabalhadores.
Tradicionalmente estes riscos são divididos em biológicos, físicos, quí-
micos, ergonômicos e psicossociais. Por questões lógicas, a higiene ocu-
pacional surgiu, naturalmente, após o conhecimento consolidado das
relações entre as ocupações e o bem-estar dos trabalhadores, essen-
cialmente, como causa objetiva de doenças, as doenças ocupacionais.
Muito do grande desenvolvimento da Higiene Ocupacional resulta da
revolução industrial do século XIX e suas grandes transformações, vi-
vas até os tempos atuais. Vale ressaltar, no entanto, quanto amplo é
o conceito de Higiene Ocupacional, não se restringindo, hoje, às do-
enças, mas também a qualquer injúria ou prejuízo causado à vida do
trabalhador e à comunidade circunvizinha.
Ao longo da história, os perigos do local de trabalho e a medicina
ocupacional foram moldados pelas forças que moldam o próprio traba-
lho, a evolução social, a mudança dos modos de produção, o desloca-
mento dos poderes econômicos e as mudanças demográficas na força
de trabalho.
Por questões essencialmente estatísticas, qualquer risco estará
aumentado a partir do aumento da frequência e/ou intensidade do seu
agente causador. Desta forma, é plausível imaginar que o conhecimen-
to – mesmo que empírico – sobre as relações causais entre trabalho e

HIGIENE
OCUPACIONAL 157
risco vem de tempos muito remotos. Mesmo não existindo descrições
sistemáticas, nossos antepassados caçadores/coletores apresentavam
risco inerente à atividade. Assim, podemos estabelecer que desde a
primeira ocupação, do primeiro homem, uma série de riscos estariam
associados à execução das tarefas habituais.
Por volta de 70 d.C., no império Romano, Plínio, o velho, des-
creveu que os fumos das minas de prata, enxofre e alumínio eram pre-
judiciais aos homens e animais. Há também registros sobre o uso de
véus, feitos de bexigas de animais, para a proteção dos trabalhadores
das minas.
Aparentemente, há uma grande lacuna de registros, com escassas
evidências de atenção à saúde ocupacional durante a idade das trevas,
considerada sob o ponto de vista Europocentrico, até os anos 1200s.
Mesmo com a forte oposição da igreja, houve significativo avanço, con-
siderando ainda, outras regiões e civilizações, como por exemplo, no
atual oriente médio e Ásia.
Durante a Idade Média, já existiam métodos primitivos de ven-
tilação, incluindo proteção individual para os trabalhadores nas minas
de ouro e prata. Há também relatos dos acidentes de mineração mais
comuns, e as doenças ocupacionais dos mineiros causados ​​por inalação
de poeira. Neste período, há também evidências de regulamentações
ambientais, como por exemplo, a obrigatoriedade, em algumas cidades
francesas, do descarte de matadouros serem realizados distantes de re-
giões residenciais. Algumas oficinas, como as de cerâmica e porcelana,
não eram autorizadas a operar dentro de áreas urbanas residenciais.
Muito possivelmente, pode-se associar ao médico Italiano,
Bernardino Ramazzini (1633 – 1714) à maior importância na medi-
cina ocupacional e Higiene Ocupacional pré-revolução industrial. É
atribuído a este importante médico um detalhamento clínico com a
preocupação do conhecimento da ocupação dos pacientes durante os
procedimentos de anamnese.

158 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


O trabalho de Ramazzini abrange inúmeras ocupações, incluin-
do mineiros, curandeiros, parteiras, boticários, ourives, ferreiros, vi-
draceiros, curtidores, fabricantes de queijos, trabalhadores do tabaco,
transportadores de cadáveres, vinicultores, padeiros, e trabalhadores
das oficinas de linho, cânhamo e seda. Ramazzini parece ter sido o pri-
meiro médico com preocupações em relação à ergonomia, assumin-
do a postura laboral como causas possíveis de doenças. Há detalhadas
observações, sobre pontos de estresse corporal em diversas ocupações
resultando na recomendação de períodos de descanso ao longo da jor-
nada de trabalho, a necessidade de exercícios e alterações posturais.
Um grande divisor de águas para a saúde ocupacional, e forte
pressão para o surgimento de regulamentações - e a própria higiene in-
dustrial mais à frente – se deu a partir da revolução industrial. A tran-
sição em direção de novos processos de manufatura, observado a partir
dos anos de 1760 até meados do século XIX, resultou na obsoletude
da produção artesanal, no uso de máquinas, novos processos, compos-
tos químicos e uso crescente de energia e combustíveis. Em essência,
observou-se um aumento de escala jamais visto na história da huma-
nidade. Sob um ponto de vista histórico mais abrangente, a revolução
industrial - final do século XVIII até meados do XIX - representou uma
significativa mudança de paradigma, contudo, quantitativamente limi-
tada. Há historiadores, inclusive, que denominam esta como a primeira
revolução industrial, havendo descrições da segunda, terceira e, mais
recentemente a quarta revolução industrial (Figura 2). Como exemplo,
o período compreendido após a II grande guerra mundial resultou de
mudanças ainda mais significativas, com impactos realmente globais.
A saúde ocupacional progrediu muito depois do estabelecimento
de uma clara relação de causa e efeito entre trabalho e doença. A saúde
ocupacional no século XIX centrou-se no trabalhador lesionado, basi-
camente envolvendo os direitos indenizatórios por danos resultantes
do trabalho. Por outro lado, no século XX, essencialmente no pós-guer-
ra, a ênfase mudou para os efeitos ocupacionais a longo prazo na saú-

HIGIENE
OCUPACIONAL 159
Figura 2 Modelo sob a perspectiva histórica da evolução industrial no mundo

de dos trabalhadores. Casos emblemáticos das relações ocupacionais e


ambientais com diversas doenças como câncer, doenças pulmonares,
hematológicas, dentre outras, modificaram a abordagem da saúde ocu-
pacional. Dentre tais mudanças, houve maior preocupação com as fon-
tes de exposição e a consequente redução dos riscos. Desta forma surge
uma ciência independente, a higiene industrial, que mais tarde incluiu
outras ocupações, não necessariamente industriais, resultando no ter-
mo mais amplo aqui utilizado, higiene ocupacional. Há alguns marcos
para esta ciência, como por exemplo, no estado Norte Americano de
Massachusetts que em 1905 tornou-se o primeiro estado a empregar
inspetores de saúde para investigaram riscos para a saúde nos locais de
trabalho. Durante a segunda década do século 20, a preocupação com
a higiene e segurança industrial se aprofundou com o estabelecimento
do escritório de Higiene Industrial e Saneamento dos EUA em 1914 e

160 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


da Sociedade Americana de Engenheiros de Segurança em 1915. Um
programa de graduação acadêmica em higiene industrial foi estabeleci-
do pela primeira vez na Faculdade de Medicina de Harvard em 1918.
O século XX é marcado pelo grande desenvolvimento tecnológi-
co e científico, impulsionando ainda mais o desenvolvimento industrial
como um todo. A partir da ainda mais massiva industrialização, síntese
e uso de novos compostos químicos, incluindo a grande plasticidade
das relações de trabalho, a toxicologia, medicina e a higiene ocupacio-
nal foram desafiadas, resultando em exposições antes desconhecidas,
novos efeitos e uma legislação cada vez mais restritiva.

Perspectiva Histórica Brasileira


O cenário nacional da saúde e higiene ocupacional seguiu uma
trajetória, sensivelmente diferente à europeia e norte americana, basi-
camente considerando aspectos cronológicos. O início da história ocu-
pacional brasileira, por mais de 350 anos pós colonização, foi baseada
na mão de obra escrava. As atividades ocupacionais eram praticamente
restritas à agricultura e mineração. Isto pode explicar o reduzido número
de informações disponíveis sobre as doenças relacionadas ao trabalho até
o final do século XIX no Brasil. Mesmo coincidindo com a estruturação
do ensino médico no Brasil, - Faculdades de Medicina de Salvador e do
Rio de Janeiro – a questão da saúde dos escravos é praticamente ine-
xistente nos registros históricos. Apesar do investimento representado
por cada escravo, nem todos os proprietários cuidavam adequadamente
da escravaria. A partir da segunda metade do século XIX, com o maior
controle sobre o tráfico de escravos, nota-se uma preocupação mais con-
sistente dos senhores com a preservação da mão-de-obra escrava, já que
a oferta se tornara mais escassa, mas não sua demanda, o que provoca a
sua valorização econômica, e por isso observa-se um melhor tratamento
aos escravos, sem lhes reduzir a jornada de trabalho, numa tentativa de
prolongar-lhes a vida útil.

HIGIENE
OCUPACIONAL 161
De qualquer modo, há registros de estudos em fábricas brasileiras
de charutos, rapé e velas de sebos, além de trabalhos sobre intoxicação
por chumbo, desenvolvidos na Universidade da Bahia entre os anos de
1880 e 1903.
Ainda no Brasil, no início do século XX, Oswaldo Cruz realizou
estudos para o combate às epidemias de doenças infecciosas, à época,
associadas ao trabalho. Dentre elas destacam-se estudos sobre a malária
e ancilostomose, e malária, que matavam milhares de trabalhadores da
construção de ferrovias e nos portos. No brasil, o início da industrializa-
ção se deu até os anos de 1920, que por analogia, pode ser considerada
como a revolução industrial brasileira – cem anos depois da inglesa.
Vários estudos fazem referências às más condições de trabalho, jor-
nada prolongada sem remuneração de hora-extra, utilização de mão de
obra infantil e ocorrências de acidentes e doenças profissionais, em am-
bientes mal ventilados e sem condições sanitárias mínimas. Destaca-se
no Brasil, em 1943, a consolidação das Leis do Trabalho que incluía um
capítulo sobre higiene e segurança do trabalho.
Mesmo com as profundas transformações na indústria, e conse-
quentemente nas relações de trabalho observadas nos últimos cem anos,
o uso industrial de compostos altamente tóxicos e carcinogênicos vem
sofrendo dramáticas reduções, as exposições ocupacionais e o número
de acidentes diminuem a cada ano. Isto resulta no inegável avanço na
saúde e bem-estar dos trabalhadores. Mesmo assim, novas configurações
de trabalho com novas ocupações e formas de produção vem se apresen-
tando, trazendo, além dos desafios já conhecidos, outros novos inerentes
à indústria do futuro.

Exposição ocupacional: desafios atuais e futuros


Um dos principais paradigmas da higiene ocupacional que nor-
teia as ações de prevenção e remediação é o conceito de risco que uma
atividade ou agente pode ter. Conceitualmente é muito comum con-

162 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


fundir “risco” com “perigo”, embora ambos os termos tenham signifi-
cados bem distintos. O “perigo” é na verdade qualquer coisa, seja ele
um agente físico, químico ou biológico, ou conjunto de circunstâncias,
que possa causar dano a um indivíduo; enquanto que “risco” é definido
como a probabilidade, ou chance de um “perigo” levar ao dano. Assim,
por definição, um “perigo” não terá nenhum risco, a não ser que o in-
divíduo seja exposto o suficiente para que o agente leve a um desfecho
prejudicial.
Uma vez que o perigo, em geral, é uma variável não controlável, o
controle do risco ocorre pela limitação da exposição ao agente estressor
de diferentes formas: a exposição pode ser limitada na fonte, na trajetó-
ria ou diretamente no indivíduo. Nas últimas décadas, o progresso tec-
nológico permitiu grandes avanços na proteção ao indivíduo tanto pela
utilização de agentes químicos mais seguros quanto pela otimização de
processos e redução no uso de substâncias perigosas. Entretanto, ainda
estamos longe da condição em que a exposição a agentes perigosos seja
nula. Por isso, medidas de controle da exposição ao agente estressor
tèm sido cada vez mais presentes e eficientes. Vale notar que a relação
entre o risco e a exposição não é necessariamente linear. Atualmente,
a partir dos conceitos de exposômica tem-se explorado as relações de
risco ocupacional a partir de informações mais integrais da exposição.
No ambiente ocupacional, minimizar os riscos de atividades, pro-
cessos ou exposição a agentes químicos de alta periculosidade é feita
em geral de maneira preventiva. Entretanto, medidas preventivas só
podem ser adotadas quando o perigo é conhecido, avaliado e identifi-
cado dentro do processo. Historicamente, o desconhecimento da pe-
riculosidade de certas substâncias químicas levou ao aparecimento de
doenças, como câncer. Hoje em dia, o progresso científico que possibili-
tou identificar e até mesmo antecipar os riscos de exposições ocupacio-
nais norteou o desenvolvimento de leis e regulamentações de proteção
ao trabalhador. Entretanto, existem ainda desafios a serem transpostos
nas atividades ocupacionais de hoje em dia, como a exposição ocupa-

HIGIENE
OCUPACIONAL 163
cional a substâncias carcinogênicas; e desafios que virão na indústria
do futuro, como a exposição a nanocompostos e nanopartículas.

Exposição ocupacional a carcinógenos


Câncer é a segunda maior causa de óbitos no mundo, sendo que
mais da metade dos casos e 63% das mortes por câncer ocorrem em paí-
ses pobres e em desenvolvimento. No ambiente ocupacional, a exposição
a carcinógenos pode ocorrer via inalação, ingestão e contato pela pele.
Uma vez que a maioria das pessoas trabalham aproximadamente 2/3 do
tempo de vida, eles têm muitas oportunidades de contato, frequente-
mente prolongadas, resultando em uma exposição ocupacional cumula-
tiva ao longo da vida. Por exemplo, em 2004, foi estimado que a exposi-
ção ocupacional a substâncias carcinogênicas para o pulmão (arsênico,
asbestos, berílio, cádmio e cromo) causou 111.000 mortes, sendo que
somente a exposição a asbestos causou a 59.000 mortes por mesotelioma.
A exposição a carcinógenos no ambiente ocupacional pode ser re-
duzida ou até mesmo eliminada através de medidas preventivas e ações
para mitigar a exposição a esses agentes. Podemos citar alguns exem-
plos de ações que reduziram a ocorrência de determinadas enfermidades
como: diminuição de canceres de bexiga em trabalhadores da indústria
de corantes; diminuição de câncer nasal em trabalhadores da indústria
de madeira; estabilização da incidência de mesotelioma pleural na Suécia
na década de 1990 após esse país ser um dos pioneiros a restringir o uso
de asbestos. Na verdade, esses casos mostram que a prevenção primária
que controla a fonte comum de exposição a carcinógenos é mais efetiva,
e com custo muito menor do que convencer as vezes milhares de pessoas
a mudar certos comportamentos individuais.
Hoje em dia devido a medidas restritivas de controle de exposi-
ção a substâncias carcinogênicas, em geral grandes populações expostas
no ambiente ocupacional têm risco reduzido. Observamos que quando
certa atividade ocupacional expõe trabalhadores a agentes reconhecida-

164 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


mente carcinogênicos a tendência é que medidas restritivas envolvendo
os processos de produção (muitas vezes através de medidas regulatórias
restritivas) sejam adotadas (ex. asbestos, arsênico).
Historicamente, existe um atraso grande entre a constatação da
evidencia cientifica e as ações de ordem prática para reduzir a exposição
e os riscos ocupacionais. Somente um número limitado de dados cientí-
ficos foram traduzidos em políticas de prevenção primárias. Até mesmo
substâncias que o perigo está muito bem documentado, como o asbesto,
ainda está em uso em diversos países. Esta é uma evidência da importân-
cia das pesquisas envolvendo a toxicologia e higiene ocupacional e seus
impactos na redução de custos e melhoria da saúde ocupacional.
Assim, em uma perspectiva futura, as atividades ocupacionais que
lidam com substâncias carcinogênicas devem focar em ações mais efeti-
vas de redução ou eliminação do risco em dois momentos:
1. ações de curto prazo para remediar as exposições ainda exis-
tentes no ambiente de trabalho através do: a) desenvolvimento
de biomarcadores mais sensíveis e mais específicos de exposi-
ção que antecipem o aparecimento da doença; b) desenvol-
vimento de sensores de monitoramento ambiental de tempo
real, proporcionando medidas corretivas imediatas; c) desen-
volvimento de programas educacionais e de conscientização
dos trabalhadores sobre prevenção e proteção no ambiente de
trabalho; d) aprimoramento de novos materiais, mais seletivos
para as substâncias de interesse, para uso em equipamento de
proteção individual e equipamentos de proteção coletiva; e)
controlar a exposição a carcinógenos baseado nos valores limí-
trofes de exposição.
2. ações de médio a longo prazo: a) regulamentação da substi-
tuição ou descontinuação de processo ou substância carcino-
gênica por outra que apresente menor perigo; b) prevenção
da liberação dos agentes carcinogênicos nos ambientes de tra-
balho, como por exemplo, os sistemas fechados, enclausura-

HIGIENE
OCUPACIONAL 165
mento, ventilação local exaustora, ventilação geral diluidora,
armazenamento adequado de produtos químicos, entre outras;
c) oferta pelos órgãos governamentais de políticas de incentivo
a empresas que eliminem ou substituam substâncias de poten-
cial carcinogênico de seus produtos ou processos.

Exposição ocupacional na escala nano


Em um futuro próximo, uma preocupação emergente relaciona-
da a segurança e saúde do trabalhador está relacionada a exposição aos
nanocompostos. Substâncias em escala nanométrica (entre 1 e 100 na-
nômetros) possuem propriedades diferentes daquelas de mesma compo-
sição em escala macro devido a algumas características: a relação entre
área de superfície e massa é muito maior, levando a uma maior reativida-
de química; material desta dimensão é mais sujeito a efeitos quânticos,
incluindo efeitos eletrônicos, magnéticos e óticos não usuais, que nor-
malmente não se observam em materiais de maiores dimensões; e devido
ao tamanho reduzido, os nanomateriais possuem grande capacidade de
transpor barreiras fisiológicas. Por exemplo, a exposição a nanopartículas
por via inalatória é de particular interesse uma vez devido que partículas
menores são absorvidas pelo epitélio bronqueolar chegando a corrente
sanguínea.
O número de publicações na área de nanotoxicologia vem crescen-
do exponencialmente, e já foi demonstrado efeitos tóxicos relacionados
a exposição a nanopartículas sobre o sistema reprodutor, trato gastroin-
testinal, sistema cardiovascular e sistema pulmonar. No âmbito regula-
tório, algumas iniciativas já existem na Europa e EUA. Na Comunidade
Europeia, dentro da política e regulação do REACH (Registration,
Evaluation and Authorization of Chemicals), o documento “Nanomaterials
in REACH” (EC, 2008) preconiza que o desenvolvimento de nanotecno-
logia e nanomateriais deve ser seguro para a saúde humana e para o meio
ambiente durante todo o ciclo de vida. Existem também outras iniciativas

166 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


de padronização já em desenvolvimento. A Organização Internacional
para Padronização (ISO), já publicou 43 documentos relacionados a re-
gulação de nanomateriais e nanotecnologia, como por exemplo a ISO/
TR 27628 – Ambientes de trabalho, ISO/TS 27687 – Nanotecnologia.
Terminologia e definições para nanoobjetos. Nanopartículas, nanofibras
e nanoplacas; ISO/TR 12885 – Nanotecnologias. Práticas de saúde e
segurança em ambientes ocupacionais relevantes para a nanotecnologia.
Embora essas regulamentações sejam relativamente antigas, ainda não
existe no mundo nenhum tipo de guideline legal que se aplica ou se refira
especificamente para nanomateriais. Portanto, a avaliação de segurança
e os riscos de nanocompostos no ambiente industrial será um tema de
extrema relevância para os higienistas na indústria do futuro.

Conhecendo a exposição e seus indicadores


No início dos anos de 1980, com o desenvolvimento da química
analítica e os métodos de separação cromatográfica e detecção, os indi-
cadores biológicos tornaram-se instrumentos valiosos no monitoramento
e consequentemente, na avaliação da exposição ocupacional e ambien-
tal, possibilitando a determinação de compostos em concentrações mui-
to baixas nas diversas matrizes biológicas. Após a conclusão do projeto
Genoma, em 2003, houve uma evolução rápida da Biologia Molecular
e da Genômica, trazendo novas abordagens para a caracterização dos
indicadores de exposição, com uma maior compreensão dos mecanismos
moleculares, através de metodologias como o sequenciamento gênico.
O sequenciamento do genoma humano abriu portas para uma era
de descrições holísticas sobre a saúde humana. No passado, as pesquisas
científicas estiveram muito focadas nas doenças e em como restabelecer
a saúde humana após estas enfermidades. Hoje em dia, os estudos estão
focados na prevenção das doenças, com uma abrangência a uma ampla
faixa de áreas, desde níveis moleculares até o estudo do corpo como um
todo. Enquanto o foco da genética era tradicionalmente reducionista,

HIGIENE
OCUPACIONAL 167
dissecando um organismo com genes específicos e mutações, a Biologia
dos Sistemas vem trazendo uma visão mais global, tentando juntar as
partes para compreender o sistema de forma integrada. Com isso, a partir
da “Era Genômica”, outras “ciências” começaram a surgir, tais como a
Transcriptômica, a Proteômica, a Metabolômica e mais recentemente, a
Exposômica. Todas essas ciências “ômicas”, em conjunto, constituem a
chamada Biologia dos Sistemas. Recentes avanços no estudo da Biologia
dos Sistemas determinam uma trajetória para as pesquisas futuras, garan-
tindo uma melhora das condições de saúde, individuais e das populações.
A Biologia dos Sistemas pode ser definida como a ciência que visa identi-
ficar os elementos em um sistema e analisar suas interações, objetivando
entender o todo.
O conceito da Exposômica foi introduzido pela primeira vez em
2005 como a “ciência” que visa estudar a totalidade das exposições am-
bientais ao longo da vida de um indivíduo, incluindo fatores como dieta,
estresse, estilo de vida, uso de drogas, químicos ambientais e infecções.
A exposômica oferece um novo olhar para os estudos relacionados a
exposição ocupacional, com base na biomonitoração, monitoramento
ambiental, fatores psicossociais e qualidade de vida, trazendo uma visão
mais profunda dos fatores de risco que acometem o indivíduo.
Para projetarmos esse novo olhar que a exposômica propõe aos
estudos relacionados a exposição ocupacional, a definição de “Saúde
Ocupacional” precisa se expandir para uma visão mais globalizada, in-
cluindo uma gama mais ampla de fatores relacionados ao bem-estar no
local do trabalho, programas de apoio à saúde, com remuneração e be-
nefícios, análise psicossocial, auxílio às famílias e principalmente, enga-
jamento da indústria nesses novos moldes, passando a ser vista de forma
mais abrangente, indo muito além da saúde física ou da falta de doença.
Portanto, buscando essa nova abordagem, os novos modelos de pesquisa
devem permitir definições mais inclusivas, estimando o peso do trabalho
na saúde e no bem-estar do indivíduo, integrando essas múltiplas di-
mensões de exposição, a métricas que incorporam estresse, apoio social,
ergonomia, atividade física, entre outros.
168 Gestão de Programas de Qualidade de Vida
Figura 3 Exposômica: Exemplos de correlação global com fatores de exposição.
Fonte: Adaptado de Patel e Manrai, 2015

Desde 1980 até os anos atuais, muitos avanços aconteceram com


relação ao desenvolvimento de novas tecnologias para minimizar a ex-
posição ocupacional, contudo enquanto não houver uma nova visão da
saúde ocupacional, ainda nos depararemos com sérios desafios a serem
vencidos, especialmente na área da saúde. Essa necessidade de mudança
está bem fundamentada em estudos científicos que evidenciaram que a
exposição a esses fatores potencialmente nocivos podem levar a ocor-
rência de má formação fetal, deficit no desenvolvimento neurológico,
aumento do risco de cânceres e outras condições patológicas, tais como
doenças cardiovasculares, asma, diabetes, obesidade, bem como desen-
cadear o risco de doenças psicosomáticas. Além disso, a exposição crôni-
ca de indivíduos a produtos químicos tóxicos e outros estressores endó-
genos, podem levar a modificações epigenéticas que são transmitidas às
futuras gerações. Desta forma, informações provenientes do monitora-

HIGIENE
OCUPACIONAL 169
mento da exposição ambiental ou ocupacional, favorecendo a detecção
precoce de uma exposição perigosa, possibilitam a implantação de medi-
das de prevenção e controle apropriados, diminuindo significativamente
a ocorrência de efeitos adversos na saúde.
O termo “exposição” denota o contato com qualquer fator que
possa ser relevante para a saúde do indivíduo, sejam fatores ambientais,
biológicos ou relacionados à situação psicológica e socioeconômica, atu-
ando isoladamente ou em interação com fatores genéticos. São situa-
ções nas quais os indivíduos estão expostos à determinada substância ou
mistura de substâncias, que aumentam o risco de incidência de diversas
patologias, como doenças crônicas e neoplasias malignas.
A exposição pode ser avaliada através da medida da concentração
do agente químico em amostras ambientais, como o ar (monitoramento
ambiental), ou pela medida de parâmetros biológicos (monitoramento
biológico), denominados indicadores biológicos ou biomarcadores. O
monitoramento ambiental baseia-se na determinação da concentração
do agente tóxico no ambiente, utilizando como critério de aceitabilidade
os valores máximos admissíveis. Já o monitoramento biológico ou bio-
monitoração, fundamenta-se na medida de substâncias ou metabólitos,
também chamados de indicadores biológicos, em vários meios biológicos,
como sangue, urina, ar exalado entre outros, com o objetivo de determi-
nar níveis que a substância foi absorvida, transformada em um metabóli-
to ativo, acumulada em órgãos depósito ou alvo, tecidos ou células, como
consequência da exposição ocupacional ou ambiental. Esse monitora-
mento fornece informações valiosas sobre a exposição e seus possíveis
efeitos na saúde, sendo de grande utilidade na identificação preventiva
de riscos. Além disso, complementa o monitoramento ambiental servin-
do de base para a adoção e avaliação de políticas ambientais e adequação
aos padrões legais.

170 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Indicadores Biológicos ou Biomarcadores
Os indicadores Biológicos ou Biomarcadores são parâmetros bio-
lógicos que podem estar alterados como consequência da exposição, ou
seja, da interação entre o agente e o organismo. Desta forma, biomar-
cador compreende toda substância ou seu produto de biotransforma-
ção, assim como qualquer alteração bioquímica precoce, cuja determi-
nação quantitativa destes parâmetros nos fluidos biológicos, tecidos ou
ar exalado, avalie a correlação entre a intensidade da exposição e/ou o
efeito biológico da substância e o risco à saúde.
De forma mais cartesiana, os biomarcadores podem ser classifica-
dos em 3 tipos: Biomarcadores de Exposição, Biomarcadores de Efeito
e Biomarcadores de Suscetibilidade, independente da finalidade e suas
aplicações (Figura 4).
Os Biomarcadores de Exposição são caracterizados por uma
substância ou seu metabólito, que é mensurado em um comparti-
mento dentro do organismo. Esses compostos conseguem estimar a

Figura 4 Tipos de Indicadores Biológicos ou Biomarcadores e suas ações


Fonte: Adaptado de Schulte P.A, 2012

HIGIENE
OCUPACIONAL 171
dose interna, através da determinação da substância química ou de
seu produto de biotransformação em fluídos biológicos, como sangue,
urina, ar exalado e outros, possibilitando quantificar a substância no
organismo. Eles refletem a distribuição da substância química ou seu
metabólito através do organismo, por isso identificada como dose in-
terna. Consequentemente, a dose externa se refere à concentração do
agente químico presente no ambiente em contato com o organismo.
Um exemplo dessa relação está no que se faz nas mensurações atuais,
tais como a quantificação do benzeno no sangue, do ácido hipúrico na
urina e da 2,5 hexanodiona na urina, refletindo apenas a exposição
recente indivíduo ao benzeno, tolueno e n-hexano, respectivamente,
após exposição ambiental. Teoricamente, a distribuição da substân-
cia no organismo pode ser traçada através de vários níveis biológicos,
como tecidos e células até seu alvo definitivo. Por isso, a escolha dos
biomarcadores de exposição deve ser criteriosa e novos estudos devem
ser feitos para que tenhamos moléculas com grande especificidade para
a substância química a ser testada, fazendo dessas medidas uma grande
utilidade para a avaliação de risco.
Os Biomarcadores de efeito são definidos como parâmetros bio-
lógicos, medidos no organismo, os quais refletem a interação da subs-
tância química com os receptores biológicos. Muitos biomarcadores de
efeito são usados na prática diária para confirmar um diagnóstico clíni-
co. Mas, para o propósito da prevenção, um biomarcador de efeito con-
siderado ideal, é aquele que mede uma alteração biológica em um está-
gio ainda reversível (ou precoce), quando ainda não representa agravo
à saúde. Geralmente, as alterações bioquímicas são consideradas como
uma fonte potencial de indicadores biológicos de efeito. Se conside-
rarmos que estas alterações precedem um dano estrutural, a detecção
destas alterações biológicas permite a identificação precoce de uma ex-
posição excessiva e intervenção para prevenir um efeito irreversível, ou
seja, a doença. Esta estratégia é baseada na identificação das alterações
bioquímicas precoces e reversíveis que são indicadores sensíveis e espe-

172 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


cíficos de uma resposta do organismo à exposição. A extensão em que
estes biomarcadores vão predizer uma resposta mais avançada (como
doença ou risco de doença) requer necessariamente mais pesquisas e
evidências através de estudos epidemiológicos e mecanicistas. Em ge-
ral, um marcador precoce no progresso de uma resposta do organismo
tem uma associação menor com o dano; no entanto é mais útil a sua
aplicação com o propósito de prevenir a doença. Alguns indicadores
biológicos de efeito possibilitam a avaliação da ação de uma substância
química no órgão alvo (ou sítio crítico), a partir da medida da alteração
biológica associada a esta ação.
Dentre os indicadores biológicos de efeito que usualmente são me-
didos após exposição ocupacional, tem-se a carboxiemoglobina, a ativi-
dade da enzima colinesterase eritrocitária, níveis de enzimas e intermedi-
ários da biossíntese do HEME, de proteínas na urina, entre outros. Cada
um apresenta características diferentes segundo a sua especificidade.
Alguns exemplos:
• Carboxiemoglobina (COHb): a COHb, apesar de ser um bio-
marcador de efeito, apresenta uma correlação muito significa-
tiva com a exposição ambiental ao monóxido de carbono, e
reflete a dose interna desta substância tóxica ligada ao tecido
alvo;
• Colinesterases: a determinação da atividade das enzimas coli-
nesterase eritrocitária e colinesterase plasmática em indivídu-
os expostos aos inseticidas organofosforados e/ou carbamatos
é utilizada também para o diagnóstico e o tratamento das in-
toxicações. Entretanto, não apresenta correlação muito signi-
ficativa em exposições ambientais e/ou ocupacionais leves ou
moderadas a estes inseticidas. Ainda assim, é considerado o
indicador biológico de escolha.
• Enzima ácido delta amino-levulínico (ALA-D) nos eritrócitos:
esta enzima é altamente sensível à inibição pelo chumbo. Em
uma concentração de chumbo na faixa de 5 a 40 mg/dL já é

HIGIENE
OCUPACIONAL 173
possível observar uma correlação negativa entre a ALA-D e
o Pb/sg. Por isso, representa um adequado indicador de efeito
para exposição ambiental ao chumbo.
• Ácido delta amino-levulínico (ALA) na urina: devido à inibi-
ção da ALA-D pelo chumbo, o ALA se acumula nos tecidos e
é excretado em grande quantidade na urina. No entanto, este
biomarcador apresenta correlação com concentrações de Pb/
sg acima de 40ug/dL, mostrando uma sensibilidade diferente
da enzima. Por isso, é considerado mais adequado para avaliar
a exposição ocupacional a este metal.

No entanto, esta medida pode ter como limitação a dificuldade


de acesso a certos tecidos do organismo. Embora sejam parâmetros im-
portantes para prevenir possíveis efeitos nocivos à saúde, não são, em
sua maioria, específicos para as substâncias químicas envolvidas, e por
isso, requerem pesquisas com o propósito de validação dos mesmos.
Diante de toda essa análise, podemos dizer que os biomarcadores
tanto de exposição como de efeito, podem “predizer” muitas das enfer-
midades que acometem os indivíduos, mas faz-se necessário pensarmos
em uma pergunta simples: Por que alguns indivíduos adoecem e outros
não?
Para respondê-la, os estudos em higiene ocupacional precisam ser
mais amplos e transversais, levando em conta análises de predisposição
genética e fatores externos, tais como idade, dieta, estilo de vida, que
são sabidamente conhecidos por influenciar/afetar a suscetibilidade de
indivíduos expostos a substâncias químicas. Embora alguns indivídu-
os experimentem exposição ambiental similar, diferenças genéticas, no
metabolismo e psicológicas podem produzir respostas marcadamente
diferentes na célula ou tecido alvo e, consequentemente, níveis dife-
rentes de resposta. Até mesmo quando as doses críticas da “substância”
de exposição são similares, respostas diferentes podem ser notadas nos
indivíduos devido a variações na suscetibilidade biológica.

174 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Os biomarcadores de suscetibilidade podem refletir fatores ge-
néticos ou adquiridos que influenciam na resposta do organismo a
uma determinada exposição química. Estes são fatores pré-existentes
e independem da exposição. São predominantemente genéticos, em-
bora a patologia, alterações fisiológicas, medicamentos, exposição a
outros agentes ambientais e fatores psicossociais também possam al-
terar a suscetibilidade individual. Os biomarcadores de suscetibilidade
identificam aqueles indivíduos na população que têm uma diferença
genética ou adquirida, na suscetibilidade para os efeitos da exposição
a substâncias químicas. Os biomarcadores de suscetibilidade indicam
quais os fatores podem aumentar ou diminuir um risco individual no
desenvolvimento da resposta do organismo, decorrente da exposição
aos agentes químicos ambientais.
Adicionalmente, considerando que um número expressivo dos
biomarcadores utilizados se baseiam em vias enzimáticas, ou produtos
metabólicos, problemas de falta de especificidade ou correlação são fre-
quentemente observados. O campo da pesquisa de novos biomarcado-
res é ainda vasto, com grande potencial para a higiene ocupacional e
toda a saúde ocupacional.

1. Biomarcadores e Nanotecnologia
Os avanços na área de nanotecnologia na última década trouxe-
ram uma oportunidade para um vasto conhecimento das propriedades
fisicoquímicas de materias e suas “nanoaplicações”. Esta recente ciência
vem trazendo importantes avanços em diferentes áreas de atuação. Em
2007, 1.300 empresas, de 76 setores, em diversos países, com investi-
mentos de US$ 14 bilhões, realizavam pesquisas nas áreas de eletrônica,
engenharia, máquinas, vestuário, defesa, veículos, agricultura, alimenta-
ção, nutrição, medicina, odontologia, cosméticos, entre outros, utilizan-
do a nanotecnologia como base para o desenvolvimento de seus produ-
tos. O uso desses nanomateriais estão sendo explorados para remediação

HIGIENE
OCUPACIONAL 175
de solo e água, bem como na medicina para propósitos terapêuticos ou de
diagnóstico. Na área de saúde ocupacional, a nanotecnologia ainda é no-
vidade, e os métodos tradicionais de análise de biomarcadores ainda são
uma realidade. Os métodos “tradicionais” para análise de nefrotoxicida-
de (dosagem de creatinina sérica e β2 microglobulina), hepatotoxicidade
(dosagem de enzimas como aminotransferases e reativos intermediários
do sistema citocromo P450), neurotoxicidade, entre outras, são aqueles
considerados “padrão ouro”, abrangendo uma série de métodos analíti-
cos, imunológicos e moleculares. Contudo, a grande desvantagem desses
ensaios, em sua maioria, está na morosidade no resultado e sua análise.
Métodos baseados na conjugação de biomarcadores com nanocompostos
já estão sendo bastante estudados, e em breve, serão uma realidade. A
rapidez na detecção dos biomarcadores será de extrema valia para os
estudos em saúde ocupacional, podendo trazer grandes avanços na área.
A conjugação de nanocompostos com biomoléculas, permite uma
biofuncionalidade que auxilia no reconhecimento de biomarcadores na
superfície dos nanomateriais. Esses nanomateriais podem ser conjuga-
dos com partículas de ouro, auxiliando na detecção de bactérias, vírus e
toxinas; com partículas de sílica, auxiliando na detecção de substâncias
químicas; com partículas magnéticas, auxiliando na detecção de analitos
do meio ambiente; com carbono, auxiliando na confecção de bionanos-
sensores por sua alta condutividade elétrica e biocompatibilidade. Como
exemplo, existem várias pesquisas no sentido de desenvolver nanobios-
sensores, dispositivos compostos de um elemento biológico (biomarca-
dor), um detector ou transdutor de sinal, e um aparelho para leitura. A
interação entre um elemento biológico (biomarcador) de interesse e o
elemento biológico do biossensor produz uma variação nas propriedades
físico-químicas do nanobiossensor (px: pH, calor, massa, entre outros)
que são detectadas pelo transdutor. Já existem alguns nanobiossensores
sendo aplicados, como por exemplo: bionanossensores de Glicose, biona-
nossensores de DNA (diagnóstico clínico de doenças hereditárias). O si-
nal resultante indica a presença do analito de interesse e a sua concentra-

176 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


ção. Estes sensores utilizam métodos de mensuração mais baratos, diretos
e rápidos, além disso, permitem a medição simultânea de vários biomar-
cadores, quando comparamos com os métodos tradicionais de análise.
Uma das patologias mais estudadas, associada à exposição ocupa-
cional, é o câncer. O câncer tem uma etiologia multifatorial, podendo
ser causado inclusive por diferentes compostos químicos, por consequ-
ência, estar associado com diferentes biomarcadores de exposição, efei-
to e susceptibilidade. Uma das estratégias que está sendo utilizada no
diagnóstico do câncer são as nanopartículas de ouro, com sua superfície
funcionalizada para indicar a presença de biomarcadores produzidos/li-
berados por células tumorais através de sua agregação a esses compos-
tos. Adicionalmente, nanopartículas utilizadas como pontos quânticos,
que emitem luz de cores diferentes dependendo do seu tamanho, podem
permitir a detecção simultânea de múltiplos marcadores. Os sinais de
fotoluminescência de pontos quânticos revestido de anticorpos, pode-
riam ser usados para triagem de certos tipos de câncer. Diferentes pontos
quânticos coloridos seriam acompanhados de anticorpos para biomarca-
dores, permitindo a discriminação de células cancerígenas e saudáveis,
de acordo com o espectro de luz que emitem.

2. Indicadores moleculares (do genoma ao epigenoma)


Se o genoma é o conjunto de genes de um organismo, o epigenoma
é o conjunto de modificações químicas que ocorrem no próprio genoma
e na cromatina. Esse código “epigenético” é quem dá instruções ao geno-
ma de quando e onde os genes devem ser expressos. Além disso, os pa-
drões epigenéticos podem ser afetados por fatores ambientais, tais como
alimentação, exercício físico, stress, uso de drogas, produtos químicos
etc. Durante a gravidez, por exemplo, esses fatores podem influenciar os
mecanismos epigenéticos do embrião/feto. Os miRNA são sequências de
aproximadamente 22 nucleotídeos de RNA dupla fita não-codificante.
Eles atuam na regulação da expressão de genes específicos, geralmen-

HIGIENE
OCUPACIONAL 177
te inibindo a produção proteica por afetar a tradução e/ou estabilida-
de do RNA mensageiro (RNAm) alvo. Essas moléculas desempenham
importantes papeis biológicos, estando associadas a muitas funções do
ciclo celular, expressão gênica neuronal e perfil sináptico, podendo ser
caracterizados como Indicadores Moleculares, correlacionados com vá-
rias patologias de natureza multifatorial, incluindo cânceres de origem
ocupacional.
Com a conclusão do projeto genoma em 2003, as pesquisas acerca
das alterações na expressão de determinados genes alvo para diferentes
patologias cresceu de maneira drástica. Apesar do conhecimento acerca
do microRNA (miRNA) ter ocorrido em 1993, pesquisas envolvendo
esses indicadores moleculares tiveram explosão na última década.
Sabe-se que diversos genes em nosso genoma estão associados com
a supressão de tumores, participando da regulação da divisão celular e de
outros processos vitais para a célula. Contudo, a mutação de um gene su-
pressor tumoral pode propiciar o surgimento de câncer; da mesma forma,
a metilação de um desses genes teria o mesmo efeito. Existe um interesse
crescente em analisar o papel dos microRNAs (miRNAs) como fato-
res epigenéticos funcionais. Os miRNAs são excelentes biomarcadores
epigenéticos para estudar modificações pontuais, pois são expressos de
forma ubíqua em tecidos, fluidos corporais, incluindo sangue, urina e
saliva; são liberados para a corrente sangüínea dos tecidos alvo (cérebro
e fígado) e pode refletir os perfis do tecido alvo; são altamente estáveis​​
e resistentes a atividade da enzima RNAse (enzima degradadora), bem
como efeitos de pH e temperatura em amostras armazenadas ao longo
do tempo.
A maioria dos miRNA são biomarcadores confiáveis ​​para classifi-
car tumores e identificação de lesão tecidual. Embora publicações com
estudos clínicos associando a expressão de miRNA e exposição ambien-
tal ainda seja limitada, alguns estudos propõem miRNA como uma pro-
messa na prevenção de patologias associadas a exposição ocupacional.
Foi demonstrado que a exposição pré-natal ao arsênico estava associada

178 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


a expressão diferencial de miRNA no sangue do cordão umbilical. Outro
estudo, demonstrou maior incidência de doenças inflamatórias, em indi-
víduos expostos a poluição do ar, caracterizado por diferença na expressão
de miRNA, quando comparado a indivíduos não expostos. Investigando
a sensibilidade e confiabilidade dos ensaios utilizando a análise de miR-
NA, pesquisadores da área chegaram a conclusão que os miRNAs de
amostras sanguíneas, são bioindicadores sensíveis na exposição aos com-
postos orgânicos voláteis (VOCs), bem como a outros compostos tóxi-
cos ambientais e ocupacionais. Em geral, o campo da pesquisa ambiental
envolvendo RNAs não-codificantes e outras marcas epigenéticas estão
se desenvolvendo rapidamente, e esses biomarcadores moleculares têm
ótimos potenciais para biomonitorização, diagnóstico e compreensão dos
mecanismos de regulação do gene-ambiente.
Os adutos de DNA são caracterizados como produtos de reações
químicas que resultam na adição de grupos químicos ao DNA e podem
gerar diversas consequências, desde mutações proto-oncogenes ou for-
mação de genes supressores de tumor até a iniciação de um processo de
carcinogênese. Os adutos de DNA podem ser utilizados como biomar-
cadores de exposição, uma vez que sua formação está diretamente rela-
cionada com a carga de exposição que o indivíduo está submetido, e sua
detecção e quantificação se torna essencial para promover a vigilância
em saúde do indivíduo exposto. Os métodos mais comumente utilizados
para a detecção e quantificação desses biomarcadores são os imunoen-
saios, marcação com fósforo radioativo (32P- Postlabelling) e HPLC/MS/
MS. Esses perfis de adutos foram caracterizados em relação à exposição
ao benzeno, acrilamida e outros contaminantes ambientais.
Apesar dos indicadores de exposição serem químico-específicos,
eles podem não traduzir o amplo potencial tóxico das substâncias quí-
micas, pois substâncias genotóxicas e/ou carcinogênicas podem exercer
danos ao material genético, mesmos em doses muito baixas, não tendo
exposição segura para as mesmas. Por isso, a crescente utilização de bio-
marcadores de efeito genotóxico ou de genotoxicidade, os quais podem

HIGIENE
OCUPACIONAL 179
avaliar os danos causados ao material genético. Por sua vez, a avaliação
dos mecanismos epigenéticos, em conjunto com a avaliação das altera-
ções no DNA, se faz necessária para uma compreensão mais ampla e
realista das exposições a diferentes agentes químicos. A aplicação de téc-
nicas proteômicas pode ampliar o ponto de vista da pesquisa, permitindo
estudar possíveis correlações entre indicadores de exposição, indicadores
de genotoxicidade, polimorfismos responsáveis pela maior suscetibilida-
de individual, facilitando o entendimento das possíveis correlações des-
ses fatores com o perfil proteômico. Portanto, o biomonitoramento com
a utilização de diversas técnicas de avaliação dos efeitos genotóxicos, epi-
genéticos, de susceptibilidade e proteômicos, juntamente com a utiliza-
ção de indicadores de exposição, parece ser um caminho promissor para
uma ampla mensuração e interpretação da relação dose-efeito na avalia-
ção da exposição e do risco de populações expostas ocupacionalmente.
Isso nos traz à temática da Biologia dos Sistemas e da Exposômica, sendo
de fundamental importância esse novo olhar para os estudos em saúde
ocupacional, fornecendo informações valiosas sobre a exposição e seus
possíveis efeitos na saúde do trabalhador.

Perspectivas e da higiene ocupacional na


indústria do futuro

A ascensão e maior participação dos países asiáticos na econo-


mia mundial, com base no modelo de Industrialização Orientada para
Exportação (IOE) de bens duráveis, levou a migração das indústrias de
manufatura dos países desenvolvidos para o Oriente. A Alemanha visan-
do recuperar a participação no valor agregado da indústria global elabo-
rou um plano estratégico lançado em 2011 na feira de Hannover com o
propósito de desenvolver alta tecnologia para a indústria de manufatura
no país. Assim, nasceu o termo Indústria 4.0 (conhecida também como
a 4ª revolução industrial) (Figura 2), que conceitualmente é a transfor-

180 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


mação completa de toda a esfera da produção industrial através da fusão
da tecnologia digital e da internet com a indústria convencional. Hoje, o
conceito alemão da Indústria 4.0 se expandiu para outros países do mun-
do, surgindo como uma tendência tecnológica mundial. Estima-se que
a Indústria 4.0 irá influenciar consideravelmente a economia mundial,
com potencial de gerar ganhos de eficiência de produção entre 6% e 8%.
Ao contrário das outras revoluções industriais que foram obser-
vadas e diagnosticadas a posteriori, a Indústria 4.0 está sendo prevista e
organizada previamente. Assim, tanto a organização dos processos quan-
to a previsibilidade dos acontecimentos adversos devem ser mapeados
agora, como forma de otimizar os processos e prevenir eventos adversos.
Embora seja consenso que a tecnologia das informações e da conectivi-
dade irá proporcionar melhorias na qualidade do ambiente de trabalho,
prevê-se também novos desafios no âmbito da saúde ocupacional. O sur-
gimento de novos paradigmas na cadeia de produção trará impactos na
atividade de vários segmentos industriais, a citar: o grande volume de in-
formação a processar, a conectividade que permitirá que um funcionário
possa ficar 24 h conectados ao trabalho, os sistemas virtuais que tendem
a levar o indivíduo ao isolamento social além de outros fatores sociais. O
higienista precisa se adaptar e se antecipar com uma visão mais holística
dos novos desafios que irão surgir com a consolidação desta 4ª revolução
industrial.
A higiene ocupacional e as áreas de pesquisa correlatas estão em
processo contínuo de evolução devido, principalmente, aos avanços
científicos nas últimas duas décadas na área de toxicologia ocupacio-
nal, segurança e saúde do trabalhador. O maior conhecimento dos riscos
intrínsecos às diferentes atividades laborais gera maior conscientização
sobre a saúde do trabalhador, tanto da parte do empregado quanto do
empregador, além dos órgãos regulatórios que aprimoram cada vez mais
as normas de regulamentação tornando-as mais restritivas. Em uma pers-
pectiva futura, os novos desafios da Higiene Ocupacional para a indús-
tria, estarão diretamente relacionados as mudanças das organizações e

HIGIENE
OCUPACIONAL 181
dos trabalhadores que serão influenciadas diretamente pelas tendências
do mundo moderno, como os avanços tecnológicos, o trabalho virtual, a
globalização e o envelhecimento da força de trabalho.
Os avanços tecnológicos geralmente estão ligados ao bem-estar,
aumento de performance, aumento de produtividade e ao crescimento
econômico. Entretanto, existem alguns problemas relacionados que tem
sido alvo de estudos na área de higiene ocupacional como: a crescente
dependência da tecnologia da informação com longas horas gastas atrás
de computadores e diminuição da interação humana, danos sobre a saú-
de física e psicológica em pessoas que trabalham com tecnologia, mani-
pulação de crescente volume de informação que elimina as barreiras de
tempo e espaço gerando estresse e o acesso em tempo real a informação,
em muitos casos, desvincula a atividade a um local e horário específico
podendo o trabalhador ficar conectado ao trabalho 24 horas por dia ge-
rando um novo problema para os higienistas.
Os avanços tecnológicos permitiram também a criação do trabalho
virtual que consiste em qualquer interação entre pessoas em um relacio-
namento interdependente, como por exemplo uma teleconferência, com
pouca ou nenhuma interação face a face. Estudos apontam prejuízos para
produtividade e satisfação no trabalho de trabalhadores que desempe-
nham essas tarefas, incluindo até mesmo o isolamento social. Entretanto,
ainda não há um consenso a respeito do real problema de pessoas que se
isolam devido ao trabalho virtual.
O envelhecimento da população no âmbito mundial é um outro
grande desafio da atualidade, e também para os higienistas, devido a um
aumento da população ativa com idade mais avançada. A expectativa de
vida tem aumentado significativamente, principalmente nos países de-
senvolvidos. Por exemplo, cerca de 2/3 das pessoas que alcançam a idade
de 65 anos estão vivas. Essa “transição demográfica” como denominado
por alguns autores, tem implicações significativas na área de saúde ocu-
pacional que vai desde as limitações físicas, até o bem-estar psicológico,
com impacto direto sobre a produtividade. Entretanto, uma tendência

182 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


negativa, do ponto de vista da higiene ocupacional, tem chamado a aten-
ção de pesquisadores: trabalhadores mais velhos (embora vivendo sau-
dáveis e por mais tempo) tem abandonado o trabalho mais cedo, mesmo
contrariando os interesses econômicos e psicossociais. Empresas que bus-
cam se adequar ao envelhecimento da força de trabalho ainda são pou-
cas, mas é um assunto de extrema importância para um futuro próximo.
Em um contexto socioeconômico e político, e sobre as tendências
nas relações comerciais e de trabalho, surgiram alguns temas transversais
que precisam também serem levados em conta na indústria do futuro.
Alguns autores sugerem que a atual organização do trabalho –
menor prevalência das relações empregado-empregador mais estáveis
e crescente número de contratos temporários, parciais e terceirizados –
afeta profundamente a saúde ocupacional. Este novo arranjo na relação
de trabalho está ligado ao aumento de acidente ocupacional, aumento de
presenteísmo, redução na satisfação do trabalhador e aumento de doen-
ças mentais. Foi reportado que as várias formas de contratos temporários
e de regime terceirizado aumenta a rotatividade de empregos, em perío-
dos relativamente curtos de tempo, fazendo com o que o indivíduo fique
menos familiarizado com os perigos inerentes a atividade naquele posto
de trabalho, bem como menos acostumado com as práticas de seguran-
ça e equipamentos, fazendo com que a susceptibilidade a acidentes seja
muito maior.
Outro fator que tem mostrado mudanças, e é uma tendência a se
considerar nos próximos anos são as mudanças demográficas na força
de trabalho em relação a idade, gênero, raça e etnia e particularmente
natividade (imigrantes). Por exemplo, os imigrantes representam cerca
de 16% da força de trabalho nos EUA (contra 5% na década de 1970).
Ganham menos que o cidadão nativo, trabalham em atividades de maior
risco (na maior parte das vezes devido a limitação na comunicação e
com o nível educacional) e, consequentemente, são mais vulneráveis
acidentes de trabalho e óbito. Imigrantes provenientes de áreas de con-
flito e em situação de perigo são particularmente mais suscetíveis devido

HIGIENE
OCUPACIONAL 183
a menor percepção de perigo e relaxamento dos procedimentos de segu-
rança. Outra grande alteração observada na força de trabalho, e que vem
crescendo, é o aumento da prevalência de obesos, diabéticos e portado-
res de doenças crônicas. As despesas médicas e perda de produtividade
afeta diretamente, tanto o empregado, quanto o empregador, e possui um
impacto grande na economia, sugerindo uma abordagem mais holística
para o cuidar da saúde do trabalhador. Portanto, os higienistas necessi-
tam de um olhar também nas mudanças socioeconômicas e políticas que
afetam as relações de trabalho.
Vivemos hoje uma quebra de paradigma científico devido a mescla
de várias metodologias multi- e interdisciplinares, com um olhar mais
holístico sobre o indivíduo. Em um futuro próximo não será suficiente
pensar de maneira isolada sobre segurança, ergonomia, estresse e saúde
física e fisiológica; mas sim, entender o trabalhador como uma interco-
nexão entre mente, corpo, ambiente e os aspectos sociais inerentes. A
pesquisa em higiene ocupacional no futuro não irá se preocupar somente
com os aspectos negativos, como doença cardiovascular, estresse, depres-
são, mas também irá focar nos benefícios do bem-estar, entusiasmo, com-
prometimento. Ao invés de cuidar somente dos aspectos que diminuem
produtividade e a saúde do trabalhador, o higienista irá focar também
nos aspectos que aumentam a produtividade melhorando a qualidade de
vida do indivíduo, o engajamento e entusiasmo. E para isso a abordagem
será cada vez mais multidisciplinar envolvendo médicos, psicólogos, so-
ciólogos, administração e engenharia.
A melhoria contínua das condições de saúde no trabalho, bem-
-estar dos trabalhadores aliada ao aumento da competitividade e produ-
tividade industrial se apresenta como um grande desafio. Isto torna-se
possível através de investimentos no desenvolvimento científico e tec-
nológico. A pesquisa aplicada à higiene ocupacional e industrial surge
então como um fator preponderante para que a competitividade e produ-
tividade industrial aumentem à mesma medida que a saúde ocupacional
e bem-estar dos trabalhadores.

184 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Sob o ponto de vista da indústria do futuro, uma série de novas
ideias e conceitos passam a ser levados em conta para que a higiene ocu-
pacional acompanhe os novos paradigmas desta indústria. Vem se ob-
servando, nos últimos tempos, profundas modificações na natureza do
trabalho e na compreensão da saúde dos trabalhadores, que podem ser
resultado das novas forças econômicas, sociais, técnicas e políticas. Isto,
per se, já fundamentaria uma profunda revisão da saúde ocupacional.
Melhoria dos registros e maior vigilância de acidentes e doenças
ocupacionais, as novas organizações do trabalho, a globalização, o con-
ceito holístico de bem-estar, tecnologias de investigação emergentes,
políticas regionais e globais, novas abordagens regulatórias, mudanças
climáticas e populações vulneráveis fazem parte deste conjunto de novas
ideias e conceitos que a indústria do futuro começa a discutir.
Sob este ponto de vista, empresas e governos dispostos a investir
em tecnologia e inovação terão significativo diferencial competitivo ga-
rantindo sustentabilidade – na visão mais ampla – que inclui, sem dúvi-
da, grandes ganhos no bem-estar para seus trabalhadores.
Como exemplo, e considerando aspectos tecnológicos de última
geração, a higiene ocupacional pode contar com novas oportunidades
para coletar e analisar dados de exposição e saúde em escalas múltiplas
sem necessariamente fazer uma distinção clara entre os riscos no traba-
lho e os que estão fora do trabalho. Isto significa um grande diferencial
no sentido de um entendimento mais profundo entre os reais riscos
associados à ocupação. Técnicas como metabolômica e proteômica
permitem a coleta de dados sobre indicadores biológicos de exposição
e / ou condições de saúde que podem ser comparadas entre populações
em risco. Do mesmo modo, sensores de baixo custo, sensoriamento ele-
trônicos distribuído, e tecnologias de comunicação têm o potencial de
identificar riscos e efeitos entre grandes populações, tanto no trabalho
como fora dele. O conceito de exposômica, que visa integrar a soma
das exposições ao longo da vida de todas as fontes, é outra direção que

HIGIENE
OCUPACIONAL 185
promete um amplo desenho para fatores ambientais, incluindo os riscos
ocupacionais, bem como, para caracterizar as disparidades de saúde.
Esses avanços tecnológicos proporcionam uma oportunidade
para melhorar a vigilância das exposições no local de trabalho e suas
lesões e doenças resultantes e promover o estudo de estressores am-
bientais múltiplos na totalidade dos ambientes de trabalho e fora dele.
Este conjunto de tecnologias conduzirão a novos modelos para a
higiene ocupacional e, por sua vez, para a saúde ocupacional como um
todo, completamente preparados para o apoio sustentável da indústria
do futuro.
A Higiene Ocupacional, como já mencionado anteriormente, é
a ciência que antecipa, reconhece, controla e previne os riscos ocupa-
cionais com potencial para afetar, de forma holística, o bem-estar dos
trabalhadores. Dentre eles, a antecipação do risco é, tradicionalmente,
um dos maiores desafios dos higienistas ao longo dos tempos. É possível
acreditar que em um futuro próximo que a antecipação dos riscos será
entendida de modo substancialmente diferente, já que entenderemos
os riscos e exposição de uma forma integral. Isto corrobora, inexoravel-
mente, para a construção de um novo entendimento de bem-estar, que
deixará de ser ocupacional para ser verdadeiramente integral.

186 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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192 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE
Eloisio Andrey Bergamaschi
Fernanda Vargas Amaral
Greice Bordignon
Luciano Caminha Junior
Marcela Purificação
Rodrigo Bastos Fernandes
Viviane Coelho Lourenço
Marcelo Benedet Tournier

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 193
R
ecursos tecnológicos para agilizar o diagnóstico de doenças, we-
arables (dispositivos “vestíveis”) para monitoramento contínuo
de pacientes críticos, sistemas de gestão de prontuários online,
big data para auxiliar na realização de diagnósticos e tratamentos, in-
terfaces entre cérebro e computador (BCI - brain-computer interface) e
exoesqueletos. Estes são apenas alguns exemplos das verdadeiras revolu-
ções tecnológicas promovidas na área da saúde neste e no último século,
que modificaram a forma de gerir e produzir recursos; coletar, analisar e
armazenar dados; de trocar informações e até mesmo a forma como as
pessoas se relacionam na sociedade.
Num brevíssimo resumo sobre a origem e desenvolvimento da tec-
nologia, identifica-se que essa palavra tem suas raízes em duas palavras
gregas: techné e logia. A primeira refere-se à técnica, ou à arte de fabri-
car, construir, modificar, enquanto a segunda refere-se à razão, ao estudo
(VERASZTO et al. 2008). Combinando as duas referências temos tecno-
logia como: o estudo da técnica ou o estudo dos processos de modifica-
ção, construção e fabricação.
Apesar de sua etimologia grega, o termo evoluiu com o passar dos
anos e, conforme diferentes sociedades foram se organizando no decorrer
dos séculos, assumiu sentidos mais amplos. Para Verazto e colaboradores
(2008), tecnologia é o “conjunto de saberes inerentes ao desenvolvimento
e concepção dos instrumentos (artefatos, sistemas, processos e ambientes)
criados pelo homem através da história para satisfazer suas necessidades
e requerimentos pessoais e coletivos”.
Ao longo da história, as tecnologias impulsionaram e foram impul-
sionadas pelas ambições humanas, sendo promotoras de mudanças na

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 195
forma como as sociedades se organizaram, na forma como o ser humano
interage com o mundo e como se relaciona com os seus pares. Agora, na
atualidade, uma nova revolução se apresenta e devemos vivenciar, em
breve, mudanças significativas que impactarão em todas as esferas de
nossa sociedade. Neste capítulo, nosso foco são as mudanças na saúde e
segurança no trabalho nessa nova era.

A 4ª revolução industrial e os
paradigmas para a saúde

Estamos imersos à quarta revolução industrial, a chamada Indústria


4.0, que se refere à digitalização e à integração de cadeias de valor e pro-
dutos ou serviços de TI (tecnologia da informação). Máquinas e seres
humanos conectados, interagindo em tempo real, criarão oportunidades
de manter ou ampliar o relacionamento com os clientes, mas também
tornarão mais intensa a concorrência por eles.
Enquanto a terceira revolução industrial focava na automatização
do processo mecânico, a quarta revolução foca, além da digitalização de
ativos físicos, na integração de escalas digitais e em valor agregado na
cadeia de parceiros (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016). Na saú-
de, há uma crescente utilização de recursos tecnológicos, como weara-
bles para diagnóstico e monitoramento. Já na segurança, as tendências
apontam para tecnologias como realidade aumentada e exoesqueletos
aplicados à indústria para facilitar tarefas de produção, reduzir erros e au-
mentar a produtividade, além do uso de tecnologias para a supervisão de
normas internas e de segurança – como EPI (Equipamentos de Proteção
Individual) e EPC (Equipamentos de Proteção Coletiva).
Em ambos os casos, para gerar receitas adicionais, às indústrias
agregam ao seu portfólio produtos com funcionalidades digitais e intro-
duzem serviços inovadores de data analytics. As áreas de genética, inteli-
gência artificial, robótica, nanotecnologia, impressão 3D e biotecnologia

196 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


estão em pleno desenvolvimento. Além disso, essa revolução irá causar
mudanças tanto de maneira individual, nas empresas, como também nas
dinâmicas de marketing e no aumento do alcance das indústrias tanto em
países desenvolvidos como em mercados emergentes (GEISSBAUER;
VEDSO; SCHRAUF, 2016a). Para entender melhor o paradigma da
quarta revolução industrial na saúde e na segurança, é importante saber
que a Indústria 4.0 é dirigida pelos seguintes preceitos:

1. Digitalização e integração na cadeia vertical e horizontal de


valor, suportada pelo aumento real e otimização integrada do
network.
2. Digitalização das ofertas de serviços dos produtos, adicionan-
do sensores existentes ou a comunicação de dispositivos que
podem ser usados como ferramentas analíticas, assim como a
criação de novos produtos digitalizados com foco na completa
integração de soluções.
3. Modelos de negócios digitais e acesso do consumidor baseados
em dados do consumidor e plataformas integradas.

Na saúde, a tecnologia tem sido usada tanto para reabilitar quanto


para aprimorar a capacidade das funções humanas, isto é, cognição, au-
dição, visão e mobilidade. Nesse setor, o principal objetivo dos dispositi-
vos health widgets é restaurar funções prejudicadas ou mesmo aprimorar o
nível atual de capacidade humana. O uso dessas tecnologias pode ser de
forma não-invasiva ou invasiva. As tecnologias não-invasivas são indo-
lores e não requerem aplicação de ferramentas ou técnicas que propor-
cionem desconforto para o usuário. Como exemplos tem-se as já citadas
interfaces entre cérebro e computador, os wearables e exoesqueletos. As
tecnologias invasivas incluem nootrópicos (suplementos que melhoram
a memória e a cognição) e eletroquímicos. Estes envolvem administração
local de drogas ou implantação de neuroestimuladores no corpo huma-
no. Embora a maioria destes procedimentos seja indolor, a implantação

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 197
de neuroestimuladores requer intervenções cirúrgicas que podem não ser
bem toleradas por todos os indivíduos (FROST; SULLIVAN’S, 2016).
Em um futuro próximo, o paciente receberá cuidados coordena-
dos, concentrados em suas necessidades específicas ao invés de ter que
buscar diferentes profissionais de saúde por conta própria. Haverá uma
maior conscientização sobre fatores de risco genéticos e serão encoraja-
dos cuidados preventivos a partir de diagnósticos precoces. Assim, será
possível prevenir estados de doença avançados e reduzir o tratamen-
to ineficaz. Em breve, tecnologias inovadoras poderão potencialmente
curar doenças como a hemofilia através da terapia de genes. O crescente
conhecimento do genoma humano, o advento dos medicamentos bioló-
gicos, a digitalização dos cuidados de saúde, o avanço nas ciências dos
materiais e o big data são algumas das tecnologias que contribuíram para
que as áreas médica e farmacêutica avançassem mais rapidamente em
prol da saúde humana nas últimas décadas. Os pacientes também terão
possibilidade de monitorar a própria saúde usando aplicativos móveis e
registros de saúde eletrônicos. (RUIZ, 2017).
A interface cérebro-computador é um exemplo de categoria de
tecnologia de reabilitação ou aprimoramento humano que foi inicial-
mente desenvolvida para aplicações de assistência médica. É um sistema
de comunicação que converte frequência de sinais emitidos pelo cérebro
em modos de controle realizados pelo computador. Esta tecnologia pode
ser usada para ajudar pessoas que sofrem de várias deficiências mentais,
como epilepsia, acidente vascular cerebral, transtorno de déficit de aten-
ção e hiperatividade (TDAH) e outros distúrbios neurodegenerativos.
Um dos avanços mais recentes inclui o uso dessas interfaces para jogos,
que se tornou possível devido a melhorias tecnológicas que levam a uma
melhor análise e interpretação dos dados obtidos pelo cérebro, coletados
em ambientes do mundo real (FROST; SULLIVAN’S, 2016).
A indústria dos dispositivos vestíveis, como monitores de atividade
física e cardíaca, cresce aceleradamente e deve alcançar US$ 53,2 bi-
lhões em 2019, segundo a Juniper Research (2017). Para os anos seguin-

198 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


tes, a disseminação destes equipamentos promete aumentar exponen-
cialmente a quantidade de dados de saúde gerados no mundo. Alguns
especialistas projetam que a partir de 2020 a quantidade desses dados
duplicará a cada 73 dias, e um ser humano comum produzirá algo em
torno de 1 milhão de GigaBytes de dados de saúde ao longo de sua vida
(MESKÓ, 2015). Existem wearables especializados em monitorar sinais
fisiológicos, como pulso cardíaco, resposta galvânica da pele, frequência
respiratória e até mesmo ondas cerebrais, acompanhando o estado do
usuário por longos períodos de tempo, incluindo o sono. A expectati-
va com estas tecnologias é que em breve profissionais de saúde sejam
capazes de fornecer diagnósticos mais precisos e personalizados a partir
do conhecimento do histórico de cada indivíduo, além de permitir que
doenças sejam diagnosticadas em estágios muito mais precoces. Em um
futuro um pouco mais distante, os dados individuais serão analisados por
inteligências artificiais, trabalhando conjuntamente aos profissionais de
saúde em intervenções e diagnósticos ainda melhores.
Os exoesqueletos, ou robôs wearables, são projetados para serem
usados ​ao lado de membros humanos que podem ou não substituir a
ação e função desses membros. Um exoesqueleto geralmente é uma tec-
nologia que aumenta, complementa, substitui ou melhora a capacidade
e funções humanas. Estes dispositivos mecânicos se encaixam no corpo
do usuário e trabalham em conjunto com os movimentos do usuário.
Esta tecnologia é amplamente pesquisada na parte da robótica espacial
para ajudar a melhorar a função intestinal e da bexiga, melhorar a saúde
mental e física, melhorar o sono, diminuir a gordura corporal e a dor e, o
mais importante, melhorar a postura e o equilíbrio. A “ReWalk Robotics”
atualizou recentemente o seu produto “ReWalk Exoskeleton” para sua sex-
ta geração. Esse exoesqueleto é um sistema leve, alimentado por bateria,
com motores nas articulações do quadril e do joelho. Ao medir mudan-
ças sutis no centro de gravidade do paciente, o exoesqueleto controla o
movimento do corpo (FROST; SULLIVAN’S, 2016).

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 199
Já os dispositivos eletroquímicos podem ser definidos como produ-
tos e técnicas que modificam as funções do corpo humano através de esti-
mulação elétrica ou de outra forma. Essas técnicas podem ser empregadas
tanto para o alívio da dor, através de implantes que visam nervos especí-
ficos, como para melhorar a gama de funcionalidades do corpo humano.
Os eletroquímicos podem ser categorizados como neuroestimuladores e
neuroprotéticos. Ambas as categorias são áreas separadas e possuem um
mercado considerável em seus segmentos, além de um imenso potencial
para tratar uma área de doenças variadas (FROST; SULLIVAN’S, 2016).
Dentro dos neuroestimuladores existem algumas tecnologias que já estão
sendo utilizadas nos Estados Unidos e foram aprovadas pelo Food and
Drug Administration - FDA, a exemplo da estimulação Nervo Sacral,
para o tratamento da incontinência urinária. Os nervos sacrais contro-
lam a veia, o movimento intestinal e as funções anais. A estimulação dos
nervos sacrais com corrente elétrica normaliza o movimento desses mús-
culos e estabiliza o controle do intestino e da bexiga. Entre as tecnologias
emergentes estão a estimulação cortical, que é feita através da estimula-
ção elétrica direta do córtex cerebral, onde regiões específicas do cérebro
são direcionadas principalmente para tratar condições como a epilepsia,
e a estimulação carotídea, que é capaz de tratar hipertensão estimulan-
do eletricamente a artéria carótida. Vários receptores no cérebro já são
estudados por pesquisadores. Esses receptores interagem com drogas ou
nootrópicos que resultam em aprimoramento da cognição, a exemplo
dos receptores de acetilcolina, receptores adrenérgicos e receptores de
canabinoides (FROST; SULLIVAN’S, 2016).
A detecção não-invasiva de sinais cerebrais combinada com avan-
ços tecnológicos na miniaturização de dispositivos e comunicação sem fio
impulsionará o mercado nos próximos 10 anos. Demandas de tecnolo-
gias assistivas, independentes para as pessoas que sofrem com distúrbios
debilitantes das extremidades inferiores e afetadas pela paralisia ou he-
miparesia, são soluções cada vez mais exigidas que podem melhorar sua
qualidade de vida, através da assistência na caminhada ou na melhoria

200 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


do padrão de marcha. Este é um dos principais impulsionadores das
aplicações BCI (as interfaces cérebro-computador), especialmente em
exoesqueletos e próteses que trazem a normalidade de volta à vida do
paciente (FROST; SULLIVAN’S, 2016).
No campo da melhoria da performance humana, já há no mercado
uma série de ferramentas que podem ser usadas para reduzir sistemati-
camente a chance de erro humano. Essas ferramentas podem ser vis-
tas como veículos para fortalecer as habilidades mentais e sociais, que
complementam as habilidades técnicas do trabalhador para promover o
desempenho de tarefas de forma mais segura e eficiente, como reduzir o
tempo da tomada de decisão durante o trabalho, em particular durante
suas etapas mais críticas (MUSCHARA, 2012).
Além disso, uma tendência ascendente são as soluções portáteis
para maior penetração de aplicativos, os dispositivos que podem ser co-
nectados a telefones celulares de forma transparente e que possuem uma
aplicação para rastrear sua atividade e fornecer análises detalhadas. O
aprimoramento cognitivo poderia ser na forma de melhores habilidades
lógicas, melhor atenção e foco em acadêmicos, aprimoramento da me-
mória, do alerta, da vigília e do desempenho em vários campos. Espera-se

Figura 1 Ilustrações sobre Tecnologias assistivas


Fonte: Meskó (2015)

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 201
que a tendência cresça rapidamente nos próximos cinco anos, já que a
maioria dos medicamentos atuais que melhoram a cognição são apenas
prescritos e não estão disponíveis (FROST; SULLIVAN’s, 2016).
O cuidado com a segurança no ambiente de trabalho agora virá
com um certo grau de individualização, graças aos métodos mais preci-
sos de tomada de decisão computadorizados. A crescente sofisticação
de computadores e softwares deve permitir que a tecnologia da infor-
mação desempenhe um papel vital na redução de risco, por meio da ra-
cionalização de cuidados, captura e correção de erros, auxiliando a to-
mada de decisões, e fornecendo feedback sobre o desempenho (BATES;
GAWANDE, 2003).
Na segurança do trabalho, as principais classes de estratégias
para prevenir erros e eventos adversos incluem ferramentas que podem
melhorar a comunicação e tornar o conhecimento mais acessível. Essas
ferramentas disponibilizam informações importantes, ajudam nos cálcu-
los, realizam verificações em tempo real, auxiliam no monitoramento e
fornecem apoio à decisão (BATES; GAWANDE, 2003). Neste sentido,
os autores Gonçalves e Grilo (2010) propõem uma abordagem sistêmica
para uma “nuvem de serviços” que permitirá um acesso universal aos
modelos de construção da informação, por qualquer sistema, aplicação
ou usuário que estejam conectados à web.
Sistemas avançados de segurança do trabalho começam a basear-
-se em padrões comportamentais (por exemplo sistemas capazes de an-
tecipar os comportamentos e suas consequências) e sistemas capazes de
cobrir corretamente barreiras organizacionais (ou seja, deficiências do
sistema de gerenciamento) que inibem a ocorrência de atos seguros e,
portanto, podem provocar acidentes (WACHTER; YORIO, 2014). Na
construção civil, por exemplo, vem sendo introduzido um modelo de in-
formação de construção, em inglês Building Information Modeling (BIM).
Com ele, é possível fazer com que todas as partes interessadas recuperem
e gerem informações do mesmo modelo, fazendo com que funcionem de
forma coesa (ČUŠ; PODBREZNIK; REBOLJ, 2010). O sistema otimiza

202 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


o desempenho numa obra, já que em condições de mudança contínua,
as regras de tomada de decisão para avaliar se um componente indivi-
dual é considerado de boa qualidade, ou se um local de construção é
seguro, também variam conforme a construção progride (DING; ZHOU;
AKINCI, 2014).
Neste contexto de maior relacionamento e concorrência mais
intensa, uma estratégia da indústria 4.0 será a cocriação e a customi-
zação dos produtos para aprofundar o relacionamento com clientes. A
integração digital com o cliente e novas oportunidades tecnológicas que
aproximam o processo de produção, como a impressão 3D, permitirão
uma maior adequação e personalização dos produtos (GEISSBAUER;
VEDSO; SCHRAUF, 2016b). Para os clientes haverá um maior empo-
deramento, já que eles estarão no centro da cadeia de valor dos servi-
ços. Os produtos, sistemas e serviços irão aumentar a customização de
acordo com as necessidades dos clientes. Neste sentido, a quarta grande
revolução também representa uma nova maneira de fazer negócios. Essas
mudanças irão transcender as fronteiras das empresas e, provavelmente,
ampliarão os mercados consumidores e os países onde são feitos os negó-
cios (GEISSBAUER; VEDSO; SCHRAUF, 2016a).

Tecnologias para saúde no ambiente de


trabalho

Comportamentos não saudáveis e inseguros, sob a ótica do am-


biente de trabalho, podem provocar custos onerosos às organizações em
termos de absenteísmo, já que as faltas ao trabalho, quando motivadas
por doenças ou acidentes, são um indicador tradicional de impacto na
produtividade, e também em termos de presenteísmo (pouca concentra-
ção no trabalho, o que ocasiona baixa produtividade). Em muitos países,
os maiores custos com saúde corporativa estão ligados aos fatores de ris-
co (obesidade, sedentarismo, estresse, problemas músculo-esqueléticos,

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 203
entre outros). Ou seja, trabalhadores não saudáveis ​​e trabalhadores que
não costumam tomar medidas de segurança podem realmente levar a
maiores custos de substituição da mão de obra. Além disso, existem
os custos associados a reivindicações de invalidez de longo prazo e de
curto prazo. Dependendo do país, alguns desses custos de invalidez são
legalmente exigidos, podendo ser substanciais para a empresa. Há ain-
da custos associados a tratamentos médicos e a medicamentos (ELLER
EXECUTIVE EDUCATION, 2015).
A promoção da saúde e a prevenção de doenças são consideradas
soluções viáveis para reduzir o alto custo com a assistência médica nas
empresas. A construção de modelos assistenciais com foco na promoção
da saúde e diminuição de riscos passou a ser um nicho importante para
os prestadores de serviço de saúde. Essa é uma tendência reforçada pela
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que tem atuado no
sentido de criar incentivos às operadoras a desenvolverem programas de
promoção da saúde e prevenção de doenças (KLEIN; HOSTETTER;
MCCARTHY, 2014).
Podemos observar os custos associados ao volume de negócios e
os custos dos trabalhadores que saem devido a ambientes de trabalho
insalubres. Estas são coisas que nos custarão perda de produtividade e
perda de conhecimento quando esse trabalhador sair pela porta, além do
impacto social resultante. Normalmente, as pessoas restantes, que ficam
quando o trabalhador sai, tem de fazer mais e, assim, acabam ficando
sobrecarregadas e estressadas. Isso tem custos. Há custos de treinamento
para as substituições e no recrutamento e contratação. Dependendo do
nível do empregado em uma organização, o custo médio do volume de
negócios varia de cerca de 40 a 200% do seu salário anual. Então, para
cada empregado que se perde, o custo para substituí-lo fica nessa faixa,
quando somados todos esses custos associados ao volume de negócios
(ELLER EXECUTIVE EDUCATION, 2015).
Em contrapartida, os benefícios de criar um local de trabalho
saudável associado ao recrutamento e retenção, influenciam em uma

204 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


redução do custo de recrutamento. O aumento da retenção leva a um
benefício associado a locais de trabalho saudáveis. Maior desempenho,
maior criatividade, maior cidadania ou comportamentos saudáveis são
realmente próprios de trabalhadores que estão progredindo e indo além.
Para a empresa, sugere-se que a organização, a reputação e o risco po-
dem ser associados a custos mais elevados de seguro de saúde, maio-
res custos de compensação de trabalhadores, multas legais, honorários
legais, maiores despesas de pessoal. Do lado dos benefícios, criar locais
de trabalho saudáveis e seguros pode
​​ resultar em uma redução desses
custos, assim como em benefícios associados ao aumento da produtivida-
de, aumento da inovação e retenção de talentos (ELLER EXECUTIVE
EDUCATION, 2015).
Nesse sentido, constatamos que o setor de saúde privada no Brasil
apresentou crescimento acelerado nos últimos anos, não somente pelo
aumento do poder aquisitivo da população, que busca melhores serviços
de saúde, mas também pela disponibilidade de recursos para o desenvol-
vimento de inovações tecnológicas (por exemplo, produtos para agilizar
o diagnóstico de doenças, wearables para monitoramento contínuo de
pacientes críticos, sistemas de gestão de prontuários online, big data para
a identificação de diagnósticos e tratamentos). Com a disseminação de
recursos mobile (smartphones e tablets) e a permeabilidade da internet,
tornou-se possível a realização de tratamentos online, uma tendência
emergente no setor de saúde (KLEIN; HOSTETTER; MCCARTHY,
2014).
A computação em nuvem deve facilitar, por exemplo, o crescimen-
to das plataformas interoperáveis em Saúde (HIE – Health Information
Exchange), possibilitando uma sensível redução de custos. Assim a tec-
nologia proposta beneficia a indústria por manter seus trabalhadores
mais saudáveis, bem como por reduzir em médio prazo seus custos com
tratamento de doença e afastamentos. Ainda, reforça igualmente sua
imagem de responsabilidade social junto aos seus fornecedores, clientes
e concorrentes. Com essa nova maneira de fazer gestão em saúde e segu-

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 205
rança, será possível a criação de uma outra economia de saúde, com base
no aumento da eficiência das pessoas que trabalham nessas áreas, que
serão capacitadas para serem responsáveis por sua própria saúde e segu-
rança. Assim, as empresas terão um valor agregado maior aos olhos dos
seus consumidores. Os empresários devem estar mais informados sobre
as oportunidades de lucros nestas áreas, bem como o potencial para cau-
sar impacto social com a criação de ferramentas que melhorem o aten-
dimento de populações de alta necessidade e vulnerabilidade (KLEIN;
HOSTETTER; MCCARTHY, 2014).

Tecnologias para saúde em prol do


comportamento seguro e saudável do
trabalhador

O processo de globalização, o avanço e a redução nos custos de im-


plantação tecnológica vem, a passos largos, contribuindo para a moder-
nização de máquinas, equipamentos e instalações. Contudo, esse avanço
não está, necessariamente, acompanhado da capacitação das pessoas
quanto a conhecimentos específicos que permitam mitigar a ocorrência
de acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais. Neste mesmo cená-
rio, os clientes passaram a exigir que os produtos e serviços estejam con-
dizentes com aspectos éticos e de responsabilidade quanto à proteção à
integridade física e saúde de seus trabalhadores (CHAIB, 2005). A partir
disto, a indústria passou a demonstrar maior preocupação com a gestão
da Segurança e Saúde do Trabalho (SST) para melhorar sua imagem
diante dos sindicatos, empregados, comunidade, clientes e acionistas.
Como resultado dessa preocupação, as empresas obtiveram aumento de
produtividade e redução das faltas ao trabalho.
As tecnologias de SST disponíveis no mercado brasileiro abran-
gem, majoritariamente, softwares de Gestão de SST e sistemas web para
treinamentos e verificação de conformidade legal (check-list de Normas

206 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Regulamentadoras). Alguns exemplos de soluções que utilizam essa
abordagem são:

• SST Fácil​, aplicativo da Fundacentro que tem por objetivo


disponibilizar informações e boas práticas de SST por meio de
uma série de perguntas (no modelo de um jogo ou quiz) rela-
cionadas aos temas: Introdução à SST; Transporte; Educação
em SST; Ergonomia e Segurança Química.
• Moblean​, aplicativo que permite monitorar e gerenciar as ro-
tinas de segurança do trabalho em campo, relacionadas aos
requisitos das Normas Regulamentadoras (NR).
• Safework é um sistema voltado para concessionárias de ener-
gia elétrica para suporte à gestão das inspeções de segurança
do trabalho, visando a verificação da aplicação das normas e a
prevenção de acidentes.
• SafetyTec​, empresa desenvolvedora de soluções tecnológicas
que auxiliam em rotinas de qualificação à distância e gestão de
Equipamentos de Proteção Individuais - EPIs.
• dataSEESMT, um sistema que possibilita a gestão e emissão
de documentos de SST, controle e gestão de riscos, cadastro e
gerenciamento dos eventos do eSocial.

Entre essas soluções, é possível notar as linhas voltadas para qua-


lificação à distância, auxílio à gestão e cumprimento de normas e gestão
de EPIs.
Dentre as tecnologias que têm recebido crescente atenção e ado-
ção estão os wearable devices, aplicados na indústria com a finalidade de
facilitar tarefas de produção, reduzir erros e aumentar a produtividade,
uma vez que essa tecnologia disponibiliza informações mesmo diante da
passividade do usuário. Uma companhia do setor aeroespacial procurou
por muitos anos uma solução tecnológica para facilitar as atividades de
montagem dos conjuntos de sistemas elétricos dos aviões, com a finali-

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 207
dade de reduzir erros e melhorar as condições de trabalho. Em 2008, em
parceria com a Google, passou a utilizar o wearable Google Glass para
substituir o método convencional de instrução (manual físico) e consta-
tou que o tempo de produção caiu em 25%, além de cortar pela metade
a taxa de erros.
Uma outra iniciativa utilizando wearable como ferramenta para
promover segurança no ambiente de trabalho foi realizada pela minera-
dora Vale em 2012. A empresa iniciou um projeto piloto em novembro de
2012, em Itabira (MG), para testar a eficiência da tecnologia de identifi-
cação por radiofrequência (RFID) como instrumento para dar agilidade
e eficiência no controle de sua política de segurança no trabalho. Antes
do sistema RFID, a fiscalização sobre a adequação de cada funcionário
aos procedimentos e regras necessários para a manutenção da segurança
era realizada manualmente, por meio de papéis impressos e verificações
um a um, processo que demandava tempo e poderia levar a falhas na
verificação do cumprimento das agendas de treinamentos e exames por
parte dos trabalhadores. Com a implantação do RFID, a empresa obteve
ganhos importantes no acompanhamento individualizado com mais efi-
ciência e dinamismo. Estes dois exemplos mostram a busca das indústrias
por soluções tecnológicas que facilitem o acompanhamento e monitora-
mento das ações de SST diariamente de forma eficiente e dinâmica.

A gestão em saúde por meio das


tecnologias

A tecnologia digital promete revolucionar a produção industrial,


reduzindo custos e ampliando as oportunidades de receita. É uma trans-
formação que traz grandes desafios para as empresas. Entretanto, ao con-
trário do que muitos pensam, o maior desafio desta revolução industrial
não são as tecnologias, mas sim as pessoas. Além do investimento de ca-
pital exigido, será preciso investir no desenvolvimento de novas compe-

208 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


tências e de uma cultura digital na organização. Enquanto as tecnologias
industriais são implementadas de maneira rápida e fácil, o sucesso dessa
transformação irá depender de como os líderes (os CEOs das empresas,
por exemplo) irão dirigir este processo migratório na forma como as ta-
refas são executadas pelos trabalhadores. As pessoas deverão estar mais
capacitadas e ganhar mais conhecimentos. Por este motivo, as empresas
terão que investir no treinamento dos trabalhadores e saber conduzir
estas mudanças organizacionais (GEISSBAUER; VEDSO; SCHRAUF,
2016a).
As tecnologias de saúde digital, que vão desde sensores e tecno-
logias de diagnóstico portáteis até ferramentas de telemedicina e apli-
cativos de cuidados de saúde móveis, têm o potencial de transformar o
sistema de gestão em saúde ao capacitar os consumidores a desempenhar
um papel ativo em seus cuidados e definir quais serviços são importantes
para eles. Essas tecnologias também estão modificando o modo como
empresas, prestadoras de serviços de saúde, seguradoras e outras for-
mas de gestão em saúde analisam um crescente número de dados para
identificar necessidades reais não atendidas, assim como para medir os
resultados dos tratamentos e adaptar as intervenções que devem ser fei-
tas nos pacientes. Esse tipo de tecnologia possibilita restringir os gastos
com cuidados de saúde e pode desempenhar um papel nos modelos de
pagamento que responsabilizam os prestadores de serviços de saúde pela
qualidade e pelos custos operacionais do tratamento. Por meio do uso de
tecnologia também é possível analisar os dados eletrônicos sobre as expe-
riências clínicas para identificar as necessidades que não foram satisfeitas
e os resultados dos tratamentos (KLEIN; HOSTETTER; MCCARTHY,
2014).
Fechar as lacunas de conhecimento entre consumidores, desen-
volvedores, empresários, executivos de cuidados de saúde e investidores
pode encorajar todas as partes a se concentrar em soluções que visam
os problemas de saúde mais graves do sistema. Os médicos também pre-
cisam de novas tecnologias para lidar com as complexas interações hu-

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 209
manas, correções de cursos de tratamento, monitoramento contínuo e
outras atividades que tornam a medicina uma arte e uma ciência. Uma
abordagem promissora encorajada pelo Vale do Silício e o setor de cui-
dados de saúde é a criação de hackathons médicos, maratonas para bus-
car soluções tecnológicas envolvendo grupos de tecnologia, agências
governamentais, hospitais ou universidades. O objetivo dos hackathons
não é resolver problemas em questão de dias, mas provocar ideias e
colaborações entre parceiros que de outra forma poderiam não ocorrer
(KLEIN; HOSTETTER; MCCARTHY, 2014).
Estima-se que os líderes do setor industrial no mundo invistam 5%
da sua receita anual na digitalização de funções essenciais das cadeias
vertical e horizontal de suas empresas, o que corresponde a um total de
US$ 907 bilhões por ano até 2020. A maior parte desses investimentos
será em tecnologias digitais com sensores ou dispositivos de conectivi-
dade, assim como softwares e aplicações, como sistemas de execução de
manufatura. Para isso, as companhias industriais deverão desenvolver
uma estrutura organizacional robusta que suporte os dados analíticos
com capacidade de nível empresarial. No Brasil, apenas 9% das empre-
sas se classificam como avançadas em níveis de digitalização, mas elas
apostam em um crescimento acelerado nessa área nos próximos anos.
Em 2020, a expectativa é que o percentual salte em cinco anos para 72%
das empresas brasileiras (GEISSBAUER; VEDSO; SCHRAUF, 2016a).
As mudanças provocadas pelos avanços nas tecnologias de infor-
mação e comunicação para as indústrias de arquitetura, engenharia e
construção, por exemplo, onde é vital o respeito à segurança do trabalho,
devem ser acompanhadas de outras mudanças nos processos de geren-
ciamento. Por isso a necessidade de uma abordagem unificada do geren-
ciamento de projetos que envolva a definição de um conjunto de visões
comuns amplamente aplicáveis sobre as informações do projeto, definin-
do explicitamente as inter-relações entre as informações nestas visões
diferentes e modificando ferramentas e procedimentos de gerenciamento
de projetos para trabalhar com essas visões integradas (FROESE, 2010).

210 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Nessa perspectiva, Samuel et al. (2009) desenvolveram um sistema de
gestão de produção pré-moldado utilizando a tecnologia RFID, mobi-
lizando informações como a quantidade da produção, a quantidade de
materiais, inspeção de controle de qualidade e de inventário e gestão de
informações de transporte.
O gerenciamento automatizado na segurança do trabalho tende a
detectar e eliminar as causas do erro humano (e, portanto, acidentes ou
eventos) no local de trabalho, tanto das perspectivas de gerenciamento
de segurança quanto mecanismos comportamentais dos trabalhadores
(WACHTER; YORIO, 2014). No caso da construção civil, por exemplo,
a gestão eficiente da segurança dos profissionais que trabalham nas obras
de uma construtora pode ser apoiada por uma solução tecnológica espe-
cializada no segmento de construção civil, que registra e controla infor-
mações para ajudar a cumprir os prazos e oferecer condições de trabalho
seguras em todas as obras que for realizar. A solução deverá ser capaz
de realizar o acompanhamento da saúde dos trabalhadores, armazenar e
cuidar de todos os detalhes e ser uma aliada e tanto da construtora quan-
do o assunto for segurança no canteiro de obras, assegurando o controle
efetivo de todas as atividades rotineiras e o cumprimento de prazos, assim
como protegendo a integridade física dos trabalhadores (CONSTRUCT,
2016).
Quando comparadas ao nível global, as empresas brasileiras ainda
estão abaixo no que se refere ao processo de digitalização. Entretanto,
elas pretendem fortalecer o desenvolvimento de novos produtos e servi-
ços digitais para clientes, através do aumento significativo da capacidade
de responder de forma flexível e mais rápida às demandas, além de ante-
cipar essas demandas. Para isso, a maioria das empresas brasileiras (56%)
espera que, em cinco anos, o uso do Google Analytics para agrupar a base
de dados dos clientes leve a avanços significativos no relacionamento
com eles e na inteligência sobre os clientes ao longo do ciclo de vida do
produto. Com isso haverá uma melhor integração de dados entre fabri-
cantes e clientes, podendo gerar novas oportunidades de colaboração.

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 211
Tanto na indústria como na área da saúde, o maior foco dos investimen-
tos estará em tecnologias digitais, como dispositivos de conectividade ou
sensores, além de softwares e aplicações, como sistemas de execução de
manufatura (MES) (GEISSBAUER; VEDSO; SCHRAUF, 2016b).
Para que as empresas cresçam e aproveitem as novas oportunida-
des, precisarão estimular o desenvolvimento de talentos e pensar a força
de trabalho de maneira estratégica. As empresas não podem mais ser
consumidoras passivas de capital humano pré-fabricado. Embora a mu-
dança iminente seja uma grande promessa, os padrões de consumo, pro-
dução e emprego criados por ela também representam grandes desafios
que exigem adaptação pró-ativa, tanto por parte das corporações quanto
dos governos e indivíduos (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016).

Figura 2 Necessidade de evolução quanto ao capital humano nas empresas


Fonte: Adaptada de World Economic Forum (2016)

212 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Com tantas mudanças, é preciso pensar também em confiança di-
gital. Os ecossistemas digitais só irão funcionar de maneira eficiente se
todas as partes envolvidas puderem confiar na segurança dos seus dados
e da propriedade intelectual. A confiança digital é uma questão comple-
xa e deve ser baseada em três pilares: transparência, legitimidade e efi-
cácia (GEISSBAUER, VEDSO & SCHRAUF, 2016a). O fortalecimento
da confiança do público na segurança da informação e o desenvolvimen-
to de campanhas de informação sobre compartilhamento de dados de
saúde e uso indevido desses dados também serão vitais. Isso implica não
apenas investir em ativos de segurança físicos e digitais, mas também em
medidas de segurança digitais que salvaguardem a confidencialidade dos
dados de saúde, estabelecendo procedimentos operacionais padrão para
gerenciamento seguro de dados e formação de pessoal para aplicá-los
adequadamente (RUIZ, 2017).
A criação de bancos de testes - ambientes dedicados a desenvol-
ver e aperfeiçoar ferramentas de saúde digitais - em sistemas de entrega
integrados, centros médicos acadêmicos ou outros locais - pode ajudar
a validar o impacto das tecnologias sobre os custos e a qualidade dos
cuidados, bem como sobre os aspectos clínicos. Os centros médicos aca-
dêmicos têm recursos regionais que os tornam um cenário ideal para a
inovação na prestação de cuidados de saúde, incluindo uma infraestru-
tura de pesquisa, os conhecimentos dos clínicos que estão na vanguarda
de seus campos e dados extensivos sobre as experiências dos pacientes e
resultados. Os sistemas de saúde com contratos baseados em valores ou
sistemas de entrega integrados, que incluem um plano de saúde, também
oferecem um terreno fértil para desenvolver e testar inovações, pois pos-
suem os meios para avaliar e perceber os benefícios financeiros dessas
melhorias. Isso permite que os desenvolvedores ultrapassem a simples va-
lidação da funcionalidade para determinar se novas ferramentas podem
incentivar uma mudança de comportamento, ajudar em um diagnóstico
ou alertar alguém para um problema potencial (KLEIN; HOSTETTER;
MCCARTHY, 2014).

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 213
Segue o exemplo de um passo a passo para o sucesso na gestão em
negócios digitais nas áreas da saúde e segurança:

1. Mapear sua estratégia para a Indústria 4.0: avalie a sua própria


maturidade digital hoje e defina metas claras para os próximos
cinco anos, priorizando medidas que trarão mais valor para o
seu negócio e garanta seu alinhamento com a estratégia global
2. Criar projetos-piloto: use projetos-piloto para estabelecer pro-
vas de conceito e demonstrar o valor gerado para o negócio,
sabendo que nem todo projeto terá sucesso, mas eles ajudarão
você a trabalhar em uma abordagem interfuncional e ágil com
clientes e parceiros de tecnologia. A partir disso, adote uma
concepção pragmática para compensar normas ou infraestru-
turas ainda não existentes.
3. Definir e mapear detalhadamente as capacitações de que você
precisa para realizar a sua visão: mostre como fatores que pro-
movem a Indústria 4.0 (ex.: uma infraestrutura de TI ágil) po-
dem melhorar todos os seus processos de negócio. Lembre-se
de desenvolver estratégias para atrair pessoas e melhorar pro-
cessos, bem como para implementar novas tecnologias. Torne-
se um expert em dados. Use dados dos consumidores para me-
lhorar os produtos e sua utilização em campo a fim de fornecer
e construir novas ofertas de serviços.
4. Planejar uma abordagem ecossistêmica por meio do desenvol-
vimento de produtos e serviços completos para seus clientes:
os verdadeiros avanços no desempenho acontecem quando
você entende o comportamento do consumidor e pode or-
questrar o papel da sua empresa no futuro ecossistema de par-
ceiros, fornecedores e clientes. Nas fases iniciais, utilize par-
cerias ou se alinhe a plataformas, se não puder desenvolver
uma oferta completa internamente (GEISSBAUER; VEDSO;
SCHRAUF, 2016b).

214 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


No futuro breve, investimentos significativos em inovações em to-
dos os campos da biotecnologia, nanotecnologia, tecnologia da informa-
ção, medicamentos inovadores e tecnologias relacionadas para melhorar
o gerenciamento e tratamento de doenças se tornarão imprescindíveis.
Assim, é preciso mudar a perspectiva sobre quem representa a “força
de trabalho”, para refletir os diversos profissionais que operam em um
espectro de doenças, segurança e bem-estar no ambiente de trabalho
(RUIZ, 2017).

Tecnologias e modelos preditivos


 
A grande complexidade das indústrias, no que tange às áreas de
saúde e da segurança, requerem decisões mais inteligentes e tomadas
de decisão mais precisas, de forma a alcançar os melhores resultados,
com base na dinâmica do mercado, no aumento da regulamentação dos
setores, e na maior exigência dos consumidores atuais. O aumento do
número de informações e dados disponibilizados pelas novas tecnologias,
gera a necessidade do uso de meios que possibilitem uma mineração de
dados, de forma eficiente. Neste sentido, métodos estatísticos têm sido
desenvolvidos na forma de modelos preditivos, que funcionam por meio
de aprendizagem dos dados gerados e por este motivo, aumentam sua
eficiência com o tempo e com aumento das informações disponibilizadas.
Os modelos preditivos são desenvolvidos, por meio de análises
avançadas capazes de fornecer algoritmos para avaliações complexas de
dados estruturados ou não. Essas análises permitem verificar o que está
acontecendo de modo mais profundo, que não poderia ser visto com uma
análise superficial. Essa habilidade de utilizar dados, análises e raciocí-
nio sistemático para conduzir a um processo de tomada de decisão mais
eficiente é referida como “analytics”.  Assim, “analytics” é a forma de
utilização sistemática de dados e insights desenvolvidos, por intermédio
de disciplinas analíticas aplicadas (como a estatística, por exemplo) para

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 215
facilitar o processo de tomada de decisão, para realizar um melhor plane-
jamento e uma melhor gestão (DAVENPORT et al., 2013).
Existem vários tipos de análises que compõem o termo “analytics”
como por exemplo: a Modelagem Estatística, a Previsão (Forecasting), o
Data Mining, Otimização, Delineamento de Experimentos entre outras.
As análises mais avançadas incluem modelos sofisticados de estatísti-
ca, machine learning, otimização, redes neurais, métodos de previsão,
análises comportamentais, análises avançadas de texto e outras técnicas
sofisticadas de data mining. Atualmente busca-se utilização efetiva de
melhores práticas de business intelligence. Uma das práticas mais utiliza-
das é a Big Data onde técnicas de mineração de dados são aplicadas em
um grande volume de dados, visando identificar padrões de modo a gerar
informações e conhecimentos (OLIVEIRA, 2017).
Essas análises são conhecidas como análises ou modelos preditivos
porque buscam entender o que vai acontecer e permitem a identifica-
ção dos resultados mais significativos para estabelecer planos de ação

Figura 3 Análise preditiva enquanto estratégia para estabelecimento de plano de ação


e tomada de decisão
Fonte: Adaptada de PREDICTIVE ANALYTICS TODAY (2014)

216 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


(DAVENPORT et al., 2013).  As análises preditivas contam com cada
vez mais segurança e consolidação para descobrir padrões e avaliar a pro-
babilidade de um resultado ou acontecimento futuro. Para isso, este tipo
de análise é realizado através do uso de dados, algoritmos estatísticos e
técnicas de machine learning, que visam identificar a probabilidade de
resultados futuros, tendo como base o histórico dos dados (WANSINK,
2017).
O objetivo deste tipo de tecnologia/ferramenta é ir além da esta-
tística dos relatórios sobre o que aconteceu para fornecer uma avaliação
mais precisa sobre o que vai acontecer e gerar insights que levem a uma
tomada de decisão mais adequada e às melhores ações. Os modelos pre-
ditivos utilizam os resultados conhecidos, por meio dos dados relatados,
para desenvolvimento de um modelo que possa ser usado para prever va-
lores de dados diferentes ou novos. Deste modo, o resultado deste novo
modelo estabelecido com a análise preditiva representa a probabilida-
de da ocorrência da variável estudada (WANSINK, D., 2017). Quanto
maior for número de dados depositados, maior será o aprendizado da
ferramenta e maior será a confiabilidade dos dados gerados.

1. Tecnologias e modelos preditivos na saúde


O novo paradigma para saúde é caracterizado pela coleta contínua
de sinais vitais com processamento em tempo real, de forma a possibi-
litar tomadas de decisões mais rápidas e efetivas (VISWANATHAN;
CHEN; POMPILI, 2012). Com a grande quantidade de dados de saúde
disponíveis aos provedores de saúde, muitas empresas buscam descobrir
como usar todas essas informações, de forma a reduzir custos e identifi-
car novas pesquisas e tratamentos, com o uso mais eficiente dos dados.
Dentro das informações de saúde, podem se considerar dados de históri-
cos de consultas e tratamentos, resultados de exames clínicos, pesquisas
médicas, dados extraídos de dispositivos wearables, além de outras bases
de dados que possam estar relacionadas. Considerando estes fatores, a

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 217
utilização de análises avançadas pode fornecer insumos e técnicas para
lidar com a complexidade do tema e com essas bases de dados, necessá-
rias para aplicação das metodologias preditivas, que habilitem a criação
de uma estrutura de tratamento mais personalizada (SILVA, 2016).
As tecnologias de análise preditiva aumentam a precisão dos diag-
nósticos e auxiliam na medicina preventiva e na saúde pública, já que
com os milhões de documentos e estudos médicos existentes, é huma-
namente impossível atuar sem a ajuda digital. Neste sentido, modelos
preditivos podem salvar muito tempo cruzando essa enorme quantidade
de dados, economizando, inclusive, recursos que poderiam ser gastos no
atendimento médico (MESKO, 2015).  Isto porque essas tecnologias são
capazes de fornecer aos empregadores e aos hospitais as previsões rela-
tivas aos custos gerados com a saúde da pessoa. Assim, as empresas que
oferecem benefícios de saúde para os funcionários podem inserir infor-
mações de perfis de funcionários em um algoritmo de análise preditiva,
para obter informações de custos médicos e ocupacionais futuros.
Os modelos preditivos, desenvolvidos pela utilização de análise
avançadas, permitem identificar padrões existentes em dados correspon-
dentes, que podem incluir variáveis demográficas e comportamentais do
paciente. Os modelos resultantes identificam, não só os segmentos de
uma população de pacientes que são prováveis candidatos de alto custo,
como também identificam os possíveis fatores que levam os pacientes
a terem o perfil de custo elevado. Por meio de modelos preditivos, ain-
da é possível realizar previsões de taxas de internação, probabilidade de
infecções e doenças, assim como predição de potenciais pacientes para
programas de saúde e bem-estar (SILVA, 2016). Deste modo, é possí-
vel diminuir custos nos sistemas públicos e privados de saúde, busca-se
prever a ocorrência de doenças, ao invés de focar somente no diagnós-
tico e na causa, quando a patologia já se faz presente (SNYDERMAN;
YOEDIONO, 2008).
Para a indústria, este modelo permite determinar a oportunidade
de avaliar o nível de utilização dos serviços de saúde. Esse tipo de análise

218 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


permite que os gestores tenham melhor entendimento do comportamen-
to da utilização dos planos, tendo em vista o estado de saúde dos pa-
cientes (DAVENPORT et al., 2013). Um foco de esforços e recursos em
pessoas saudáveis pode identificar fatores de predição mais robustos de
saúde e doenças, identificar intervenções mais eficazes para aperfeiçoar a
qualidade e a duração da saúde e traduzir esse conhecimento para popu-
lação de maneira eficiente, com custo razoável (SILVA, 2016). A partir
deste modelo ainda é possível identificar os indivíduos responsáveis pelo
maior custo a partir dos gastos atuais e previstos em saúde. Além disso,
as análises preditivas permitem direcionar intervenções para os grupos de
maior risco e o direcionamento correto de recursos.
No Brasil, já existe o Registro Eletrônico de Saúde que é um siste-
ma completo para registro de todas as etapas de atendimento de pacien-
tes. Este sistema permite a criação e arquivamento do histórico clínico, e
também que cada prestador de serviço tenha um Prontuário Eletrônico
do Paciente (PEP). Este prontuário possui todos os procedimentos rea-
lizados naquele local, bem como as informações básicas do usuário cen-
tralizadas em um único local. No futuro, a tendência é que cada pessoa
tenha um Registro Pessoal de Saúde, onde estarão todas as suas informa-
ções médicas registradas ao longo de sua vida, nos mais diversos pontos
de atendimento nos quais tenha passado. Atualmente, já existem ope-
radoras de saúde e redes hospitalares que agregam informações indivi-
dualizadas de seus usuários no PEP e pedem que os próprios usuários
preencham informações pessoais como hábitos alimentares e práticas
físicas, para, por meio de seu engajamento, entender seu comportamen-
to e traçar previsões. Assim, quanto mais dados estiverem estruturados,
mais informações estarão disponíveis para serem trabalhadas dentro dos
modelos preditivos na saúde (MV GESTÃO EM SAÚDE, 2017).

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 219
2. Tecnologias e modelos preditivos na segurança do
trabalho

Na segurança do trabalho a tecnologia se desenvolve no sentido


das próprias máquinas conectadas serem capazes de sinalizar quando for
necessária qualquer intervenção. Isso será possível graças as análises dos
dados históricos e ao uso de técnicas estatísticas para prever possíveis fa-
lhas. Este processo é conhecido como manutenção preditiva industrial, a
qual possibilita fazer manutenção antes de um defeito acontecer, evitan-
do assim, possíveis acidentes e gastos desnecessários na produção. Essa
capacidade de conectar máquinas de trabalho, meios de transporte, we-
arables devices e até mesmo meio de transporte se conectarem via web é
conhecido como internet das coisas (Internet of Things- IoT). Por meio
da IoT além de controlar os objetos de forma virtual, é possível conectar
informações de forma remota, atuando assim, como um ponto de acesso
físico à internet (MATTERN; FLOERKEMEIER, 2010).
Kevin Ashton foi um dos criadores do termo Internet of Things
após desenvolver pesquisas no centro de Auto Identificação do Instituto
de Tecnologia de Massachusetts (Massachusetts Institute of Technology -
MIT) (SARMA; BROCK; ASHTON, 2000). Para ele, os computadores
devem ter seus próprios meios de obter informações, para que eles pos-
sam ver, ouvir e cheirar o mundo por eles mesmos, sem a necessidade da
entrada de dados pelos humanos (ASHTON, 2010). Estima-se que 8,4
bilhões de objetos que se encontram atualmente conectados via web em
2017 esse número aumente para 20,4 bilhões até 2020 (INOVE, 2017)
Essa transformação tecnológica proporciona uma mudança no pa-
pel dos técnicos, uma melhora na eficiência do serviço e um reforço na
segurança tecnológica. A manutenção preditiva chega como uma forma
de revolucionar o serviço em campo, já que a IoT melhora a eficiência na
solução de problemas ao incorporar dispositivos inteligentes no campo,
enviar sinais de serviço e registrar dados de desempenho em tempo real.
Assim, é possível que as máquinas informem os técnicos sobre as ocor-

220 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


rências, facilitando o diagnóstico e a resolução de problemas antes que
aconteçam (INOVE, 2017).
Isso acontece porque a IoT permite fazer um monitoramento wi-
reless para enviar ou receber informações que podem servir tanto para
prevenção de acidente de trabalho, quanto na ação de emergência caso
ele ocorra. Um coordenador de equipe pode saber, por exemplo, onde
está cada colaborador em tempo real. Deste modo, caso ocorra um aci-
dente será possível saber onde estão todos os funcionários e conferir se
todos realmente se deslocaram ao ponto de resgate. Ou ainda, se existem
colaboradores perdidos, imóveis, presos ou acidentados em determinadas
áreas, direcionando assim um socorro mais eficiente aos locais críticos
(CARVALHO, 2016).
Na indústria da construção, por exemplo, a forma de planejamento
tradicional poderá ser substituída, por processos de automação, que tem
por objetivo facilitar a integração de equipamentos por meio de robôs,
que no futuro devem se tornar baratos e com interfaces de fácil uso, ca-
pazes de trabalhar juntamente com operários e auxiliar na segurança dos
mesmos (ARASHPOUR et al., 2015). Um exemplo de modelagem predi-
tiva que possibilita revolucionar esse tipo de indústria é o “glue logic”. O
“glue logic” comunica dados com diversos agentes para geração de novos
dados de forma eficiente. Quando um objeto com chip, operário ou má-
quina, passa por um local de monitoramento, é determinado de que se
trata, o momento e o estado de operação que se encontra. A partir destas
informações, o sistema irá gerar um evento e uma corrente de ações, caso
nessa corrente de ações haja alguma situação de risco, ocorrerá a noti-
ficação de todo que possam estar envolvidos, possibilitando assim uma
ação mais precisa e eficiente (DAGAN; ISAAC, 2015).

TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 221
CONSIDER AÇÕES FINAIS

O desenvolvimento de novas tecnologias possibilita a inovação em


saúde e segurança no trabalho, uma vez que a tecnologia digital promete
revolucionar o processo de produção industrial, em termos de impacto,
escalabilidade, redução dos custos, aplicabilidade e ampliação das opor-
tunidades de receita, sobretudo quanto aos modelos preditivos, enquan-
to solução para a gestão em saúde nas empresas brasileiras.
Para que a indústria 4.0 atue em prol da promoção da saúde e
segurança e saúde no trabalho (SST), como forma de promover vanta-
gem competitiva e resultados sociais, é necessário um investimento de
capital, tanto na parte do desenvolvimento de tecnologias, sobretudo
quanto ao desenvolvimento de capital humano, tendo por objetivo a in-
ternalização de conhecimentos específicos e novas competências para o
desenvolvimento de uma cultura digital na indústria.
Em conclusão, é possível que as tecnologias para saúde e segurança
no local de trabalho, se tornem um investimento, à medida que podem
ser rentáveis no que diz respeito ao tempo e dinheiro otimizados, por
meio da inteligência gerada, os quais se traduzam em resultados positi-
vos, tanto para as empresas, quanto para os trabalhadores.

222 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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224 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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TECNOLOGIAS
PARA SAÚDE 225
ECONOMIA
PARA SAÚDE E
SEGURANÇA
Francisco Cláudio Patrício Moura Filho
Haidinne Fernandes Coelho
Juliana de Albuquerque Souza
Kassandra Maria de Araújo Morais
Luciana Cavalcanti Costa

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 227
INTRODUÇÃO

A
s empresas, não apenas em períodos de recessão e de crise eco-
nômica, buscam melhorar sua competitividade e visam à ma-
nutenção do seu mercado e à sustentabilidade da sua marca.
Alcançam por meio da análise de dados e gestão do conhecimento, in-
formações disponíveis para uma gestão mais assertiva dos recursos, além
do direcionamento das ações com maior valor agregado e retorno sobre
os investimentos.
Os custos das empresas com saúde, de acordo com a 27ª
Pesquisa Anual de Benefícios Corporativos 2015 (MERCER-MARSH
BENEFÍCIOS, 2015), encontram-se abaixo somente das despesas com
folha de pagamento, portanto, a gestão dos custos com saúde nas em-
presas carece de atenção para que os gastos desnecessários não ocorram,
mas, sejam (re)significados como investimentos, na visão dos gestores.
Neste sentido, alguns questionamentos são fundamentais para o suces-
so do negócio, tais como: Qual o valor de um funcionário sadio para a
empresa? Qual o custo do funcionário doente para a empresa? Qual o
custo do absenteísmo/presenteísmo para a empresa? As ações de saúde
e bem-estar desenvolvidas pelas empresas retornam em produtividade e/
ou valor para a marca? Qual o impacto na retenção dos seus talentos?
A análise do impacto dos custos com a saúde e as ações utilizadas
para mitigá-los refletem a importância de conhecê-los e de geri-los com

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 229
efetividade. Os investimentos em saúde nas empresas precisam ser vis-
tos de forma estratégica e sistêmica, visando sempre obter: aumento da
produtividade, diminuição do turnover, redução de afastamentos, e pre-
venção e controle de doenças crônicas, além do bem-estar da população
dos trabalhadores. Isso é possível a partir da comprovação de que o valor
investido em saúde retorna financeiramente por intermédio de dados
mensuráveis e ativos intangíveis, ou seja, informações de valor.
O paradigma da saúde visto como custo precisa ser quebrado, mas
a legislação brasileira complexa e burocrática, a visão limitada do im-
pacto das atividades de saúde desenvolvidas nas empresas e a falta de
orientações efetivas, dificultam a aceleração desse processo. O investi-
mento em saúde deve ser considerado como elemento competitivo e es-
tratégico, propiciando benefícios para todos os stakeholders, além de um
diferencial de valor agregado para a empresa. Uma boa gestão da saúde
é sempre revertida para a melhoria da produtividade, uma vez que seus
trabalhadores são bem assistidos, motivados e com saúde física e mental.
Este capítulo aborda questões que estão diretamente relacionadas
ao impacto dos custos da saúde nas empresas, fatores que são de extrema
importância para a equipe de líderes e gestores conhecer, dentre os quais:
doenças crônicas não transmissíveis, saúde suplementar, retorno e va-
lor sobre investimento, absenteísmo e programas de promoção da saúde
e qualidade de vida. É perceptível que os temas citados neste capítulo
são interligados e todos giram em torno da saúde e impacto dos investi-
mentos corporativos em saúde. Portanto, faz-se necessário compreender
como essas variáveis impactam na vida financeira de uma instituição.
De modo significativo, o gestor que conhece tais fatores faz a diferença
no gerenciamento das demandas de saúde, toma decisões sobre questões
de saúde e segurança do trabalhador de forma consciente e assertiva, e
embasa de maneira consistente as justificativas para a implementação de
programas de promoção da saúde e qualidade de vida.
Ferramentas e metodologias devem ser desenvolvidas e validadas
para servir de direcionador estratégico para tomadas de decisões cons-

230 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


cientes concernentes a investimentos em saúde, segurança e bem-estar,
e ainda para proporcionar o conhecimento aos gestores de como a dinâ-
mica funciona. Deve-se buscar preencher uma lacuna, vista como neces-
sária para a sustentabilidade da empresa, valorizando os investimentos
realizados pela empresa e, ao mesmo tempo, cuidando do maior bem que
a empresa possui: capital humano.

Impacto das doenças crônicas não


transmissíveis

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), as do-


enças crônicas não transmissíveis (DCNT) são a maior causa de morte
em todo o mundo. Dentre as quais, as mais relevantes são as doenças car-
diovasculares, responsáveis por 48% das mortes no grupo, seguidas pelo
câncer (21%), doenças respiratórias crônicas (12%) e diabetes (3%),
(WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011). Fatores de risco como
altos níveis de pressão arterial, colesterol, massa corporal e açúcar no
sangue aumentam a possibilidade de desenvolvimento de doenças crôni-
cas não transmissíveis.
A OMS afirma que são necessárias ações mais eficazes para o con-
trole dos fatores de risco e combate àquelas doenças. De acordo com o
novo relatório da OMS, medidas são necessárias para alcançar as me-
tas mundiais que objetivam a redução do número de Doenças Crônicas
Não Transmissíveis (DCNT), bem como a prevenção de 16 milhões de
mortes prematuras causadas por essas enfermidades (antes dos 70 anos),
óbitos que poderiam ter sido evitados. “Dos 38 milhões de vidas perdidas
em 2012 por DCNT, 16 milhões, ou seja, 42% eram prematuras e evitá-
veis, um aumento de 14,6 milhões mortes em relação a 2000”. (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2011). A prevenção das mortes prematu-
ras baseia-se na redução do consumo do tabaco, da ingestão excessiva de
álcool, sedentarismo e dietas pouco saudáveis.

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 231
As DCNT dificultam o alcance dos objetivos de desenvolvimento
sustentável numa escala geral.

Quando as pessoas adoecem e morrem no auge de suas vidas, a


produtividade diminui. E o custo do tratamento de doenças pode
ser devastador - tanto para o indivíduo quanto para o sistema de
saúde do País. De 2011 a 2025 as perdas econômicas acumuladas
em um cenário comum nos países de baixa e média renda estão
estimadas em 7 trilhões de dólares. A OMS estima que o custo de
reduzir a carga global DCNT é 11,2 bilhões de dólares por ano:
um investimento anual de 1-3 dólares per capita. As altas taxas de
morte e adoecimento, particularmente nos países de baixa e média
renda são o reflexo de investimentos inadequados em intervenções
custo-efetivas para DCNT. A OMS recomenda que todos os pa-
íses partam para a ação estabelecendo metas nacionais e imple-
mentando as “medidas ideais” a partir de 2015. (LINDMEIER;
GARWOOD, 2017).

De acordo com orientações da OMS, atualmente, existem qua-


tro pilares a serem trabalhados com mais afinco quando o assunto diz
respeito a doenças crônicas não transmissíveis: diabetes, doenças car-
diovasculares, câncer, e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).
Por isso é necessário que as organizações busquem mensurar o número
de fatores de riscos na população de funcionários da empresa, com foco
em conhecê-los e mapeá-los, estabelecendo a premissa de que o maior
cuidado deverá ser direcionado à população de baixo risco, uma vez
que, se não controlado, irá compor futuramente a população de médio
e alto risco. Aqui cabe a máxima: “prevenir é melhor do que remediar”.
Os reflexos das ações serão percebidos na redução dos custos e para
evitar perdas de produtividade.
Chaker et al. (2015), por meio de uma revisão sistemática, abor-
daram o impacto global das doenças crônicas não transmissíveis sobre

232 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


a produtividade macroeconômica, tendo como principais medidas de
resultados: o impacto das DCNT selecionadas sobre a produtividade,
medidas em DALYs (estudo da carga de doença), custos de produtivi-
dade e participação no mercado de trabalho, incluindo desemprego,
retorno ao trabalho e atestados médicos.
As DCNT selecionadas para a revisão foram: doenças cardiovas-
culares, acidente vascular encefálico (AVE), câncer de colo de útero,
câncer de mama, cânceres em geral, DPOC, doença renal crônica e
diabetes mellitus. Em resumo, os estudos disponíveis indicam que as
principais DCNT geram um grande impacto na produtividade macro-
econômica nos países submetidos às regras da OMS. No entanto, essa
evidência é heterogênea, de qualidade variável e não distribuída geo-
graficamente de maneira uniforme. Os dados dos países de baixa e mé-
dia renda, em transição econômica e epidemiológica são praticamente
ausentes. Trabalhar ainda mais para quantificar de forma confiável o
impacto global absoluto das DCNT na produtividade macroeconômica
e os DALYs é urgentemente necessário. (CHAKER et al., 2015).
Estudos realizados nos últimos anos comprovaram que a hiper-
tensão não tratada e a hipertensão sem controle correto do uso das
medicações impactam negativamente na produtividade, consequen-
temente, afetam a sustentabilidade no mercado e as estratégias para
equalizar as finanças das empresas. A baixa adesão aos regimes de me-
dicamentos anti-hipertensivos prescritos foi associada a uma redução
na produtividade do trabalho.
Os programas para apoiar a aderência à medicação anti-hiper-
tensiva podem apresentar oportunidades econômicas para os empre-
gadores, reduzindo o comprometimento da produtividade do trabalho.
(WAGNER et al., 2012). Já Unmuessig (2016), mesmo com limitações
nos estudos, inicia a tentativa para comprovar ganhos financeiros quan-
do funcionários têm tratamento adequado à hipertensão arterial. O
estudo apresenta valor particular para os empregadores, formuladores
de políticas públicas e privadas de saúde interessados em compreender

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 233
o impacto da hipertensão na produtividade no local de trabalho e para
projetar planos de saúde direcionados especificamente para promover
cuidados preventivos, melhorar a adesão à medicação e ao estado de
saúde, eventualmente, reduzir o peso da perda de produtividade.
A Sociedade Americana de Cardiologia afirma que diz respeito
à doença que mais motiva consultas ao sistema de saúde, gerando um
impacto econômico significativo, ressaltando-se, aqui, a melhor forma
de tratar a hipertensão é preveni-la.
Em outra revisão sistemática da literatura, Kamal et al. (2017)
fazem referência aos custos relacionados à produtividade de pacientes
com câncer em tratamento e de seus cuidadores. A revisão acrescenta
3 aspectos interessantes ao assunto:

• Fornece uma revisão da diversidade de estudos existentes so-


bre o efeito do tratamento do câncer sobre a produtividade do
trabalho em pacientes e seus cuidadores e recomenda pesqui-
sas adicionais usando medidas padronizadas e quantificação de
custos indiretos para melhor compreender o ônus econômico
total do câncer e o valor dos tratamentos.
• A maioria dos estudos centrados no paciente encontrou um
efeito negativo geral do tratamento do câncer sobre a produ-
tividade do paciente por causa de efeitos adversos ao trata-
mento que levaram à falta ao trabalho, deficiências cognitivas
e desafios para levantar cargas pesadas e manter o ritmo de
outras pessoas no trabalho.
• Para os cuidadores, os fatores associados à perda de produtivi-
dade foram: o tratamento intensivo do câncer, a viagem para
o tratamento, os custos associados ao tratamento e à mudança
de horário de trabalho durante o tratamento.

A partir do exposto, as campanhas de prevenção, detecção pre-


coce e de correto tratamento para os cânceres, têm suma importância

234 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


quando são considerados como impactos financeiros, desta nosologia,
para a sociedade, indivíduo e empresas, as políticas de saúde necessitan-
do, assim, do apoio de todos.
Mesmo sendo responsável por apenas 3% das DCNT, o diabetes
causa um impacto financeiro desproporcional ao valor da prevalência,
por esse motivo, a relação entre o diabetes e a produtividade também
já está no “radar” dos pesquisadores de saúde pública e ocupacional.
Shelton Brown III publicou um trabalho em 2011, cuja conclusão infere
que, para se evitar perdas de produtividade associadas ao diabetes, os re-
cursos devem ser direcionados à sua prevenção ao invés de direcionar os
recursos para acompanhamento da Hemoglobina Glicada, porção A1C.
(BROWN III, 2011).
A pesquisa utilizou dados de comunidades com alta prevalência
de diabetes, verificando se os efeitos no mercado de trabalho foram in-
fluenciados pelo diabetes em si ou ainda se dependiam do grau em que
a diabetes estava sendo controlada através do gerenciamento dos níveis
de açúcar no sangue.
Foram observados os seguintes fatos:

• Diabetes teve um impacto claro sobre os resultados no merca-


do de trabalho.
• A gestão do diabetes não parece ter um impacto claro nos re-
sultados do mercado de trabalho a curto prazo.
• A diminuição da produtividade feminina foi associada ao
“pré diabetes” de acordo com a nova definição da American
Diabetes Association (níveis de hemoglobina glicosilada entre
5,7% e 6,4%).

Concomitantemente com a transição demográfica de urbanização


da população e também a evolução tecnológica, acontece a transição
epidemiológica, que é definida como a redução dos casos de doenças
infectocontagiosas e, consequentemente, aumento dos casos de doenças

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 235
crônico-degenerativas. Consideradas como uma consequência de hábi-
tos de vida com prevalência de alimentação de alto valor calórico, inati-
vidade física, sobrecarga de trabalho, estresse, o acometimento por essas
doenças crônicas é relevante em países emergentes como Brasil, Rússia,
China, Índia e África do Sul, que, juntos, formam o BRICS. Atualmente,
mais de 20 milhões de vidas em idade produtiva são perdidas nesses pa-
íses, por ano, devido às doenças crônicas, (BEAGLEHOLE et al., 2017;
WHORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011).
O Mapa Assistencial publicado pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS, 2016) informa que, em 2016, os procedimentos mé-
dicos com internação hospitalar aumentaram em 6% em relação a 2014,
com um total de 7,8 milhões de procedimentos. Dentro desta estimativa,
destaca-se o número de cirurgias bariátricas, que cresceu em 20% por mil
beneficiários. A partir dos dados, fica clara a necessidade de implementa-
ção de ações de saúde para redução de peso e da obesidade na população
de usuários dos planos de saúde que englobam, também, a população de
usuários das empresas, bem como estimulam hábitos saudáveis de vida,
exemplos são uma alimentação balanceada e prática de atividade física.
(ANS, 2016).
Segundo informações da ANS, a obesidade configura-se como um
problema mundial. Em 2015, 30% da população estavam com sobrepe-
so ou eram obesos. Nesse cenário, 57% dos brasileiros estavam acima
do peso ou eram obesos. Conforme dados da “Vigilância de Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico” (VIGITEL), no período de 2008 a
2014, a obesidade em beneficiários de planos de saúde aumentou de
12,7% para 16,8%. E afirma que, entre os beneficiários de planos de
saúde, a prevalência de obesidade dos homens é sempre superior à das
mulheres. Entre os adultos, a obesidade passou de 8,7%, em 1980, para
22,6%, em 2015; enquanto a taxa de sobrepeso avançou de 25,7% para
35,2%, (INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE SUPLEMENTAR,
2017c).

236 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


De acordo com Rabacow (2015), atualmente, percebe-se uma ca-
rência de estudos no Brasil que abordem temas relacionados a estilo de
vida, gastos com saúde e absenteísmo. Constata-se que, a maioria dos es-
tudos que abordam essas temáticas é realizada em países desenvolvidos,
porém, mesmo diante do fato relatado, nota-se que tem crescido uma
tendência para a realização desses tipos de estudos em nosso país.
A utilização de programas e políticas eficazes de saúde no local
de trabalho pode reduzir os riscos para a saúde e melhorar a qualidade
de vida dos trabalhadores. Como resultado, muitos empregadores estão
adotando programas de saúde no local de trabalho para ajudar os fun-
cionários a reduzirem o risco de desenvolver doenças crônicas. (LANG,
2017).

Impacto do absenteísmo

O absenteísmo consiste na falta ou ausência do trabalho. Autores


como Quick e Lapertosa (1982) classificam o absenteísmo em cinco clas-
ses: voluntário, compulsório, por doenças, legal, por acidentes de trabalho
e doenças do trabalho. Caracteriza-se por ser um fenômeno complexo e
multifatorial. Segundo Bandini; Maciel e Lucca (2015), numa empresa, a
dinâmica do absenteísmo pode ser determinada por fatores organizacio-
nais, de ordem pessoal e por condições de trabalho, bem como questões
socioeconômicas e culturais relacionadas à saúde.
A ausência do colaborador ao trabalho acarreta consequências de
largas dimensões, provocando impactos financeiros, que, de modo geral,
representam um custo anual de mais de milhões de dólares para as em-
presas, conforme afirma Santana (2006). O absenteísmo está relaciona-
do, principalmente, a problemas de saúde do trabalhador, doenças ocu-
pacionais e acidentes de trabalho. Segundo a Organização Internacional
do Trabalho (OIT), cerca de 270 milhões de acidentes de trabalho e de
dois milhões de mortes ocorrem por ano em todo o mundo. Estima-se

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 237
que, 4% do Produto Interno Bruto (PIB), sejam perdidos por doenças e
agravos ocupacionais, o que pode aumentar para 10% quando se trata de
países em desenvolvimento.
Um estudo de referência realizado por Bandini; Maciel e Lucca
(2015) e que objetivou entender o cenário de absenteísmo no ambiente
de trabalho, em nível Brasil e mundial, reuniu a análise de artigos publi-
cados nos últimos 20 anos sobre a temática. Após triagem metodológica,
87 artigos foram analisados. A partir de então foram elencadas as prin-
cipais causas de absenteísmo, cuja literatura aponta: doenças crônicas
(diabetes, hipertensão arterial, dislipidemia, doenças respiratórias e gas-
trointestinais), fadiga, obesidade, gênero e predominância entre as mu-
lheres, trabalhos em turnos e noturnos, condições ambientais de risco,
doenças osteomusculares, fatores psicossociais, percepção de estresse e
transtornos mentais e comportamentais, bullying e assédio moral.
Pesquisas mostram que o estado de saúde dos trabalhadores reflete
economicamente nos custos das empresas devido ao absenteísmo, perda
de produtividade, afastamentos prolongados e aposentadoria precoce.
Deve ser levado em consideração não apenas o ônus causado pela au-
sência do funcionário, mas também, o reflexo sobre a produtividade em
equipe, tendo-se, então, a preocupação em substituição do funcionário
na atividade, pois tais situações podem influenciar negativamente o cli-
ma organizacional. (BANDINI; MACIEL; LUCCA, 2015).
Andreyeva; Luedicke e Wang (2014) relacionaram a obesidade
com seus custos atribuídos ao absenteísmo nos Estados Unidos. Os re-
sultados sugeriram que a obesidade está associada a um aumento signi-
ficativo do absenteísmo entre os trabalhadores americanos, que custa à
população cerca de US $ 8,65 bilhões por ano.
A obesidade também impõe um encargo financeiro considerável
aos estados, representando 6,5% -12,6% dos custos totais do absenteís-
mo no local de trabalho. Curiosamente, esses resultados são quase idên-
ticos aos dados sobre o papel da obesidade nas despesas com cuidados
de saúde. Especificamente, estima-se que, 9,3% de todos os custos de

238 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


absentismo entre funcionários americanos de 18 anos e mais foram atri-
buídos à obesidade em 2012. Ao mesmo tempo, os gastos com cuidados
de saúde relacionados à obesidade em adultos foram estimados em 9,1%
no ano de 2006.
Andreyeva; Luedicke e Wang (2014) destacam, ainda, um papel
igualmente importante de custos econômicos indiretos, como o absen-
teísmo, a necessidade de ampliar as discussões políticas e a avaliação de
iniciativas, além da drenagem financeira direta da obesidade no setor de
cuidados de saúde.
A consequência do absenteísmo interfere no planejamento orça-
mentário das empresas, tanto quando consideradas as doenças comuns
quanto consideradas as doenças relacionadas ao trabalho, uma vez que
seu aumento causa reflexo nos tributos pagos pelos empresários ao gover-
no, pelo fato de o trabalhador requerer benefícios acidentários.
Conforme a Resolução nº 1.316, de 31 de maio de 2010, o Fator
Acidentário de Prevenção (FAP), instituído pela Lei 10.666/03, é um
multiplicador aplicado sobre a contribuição do grau de incidência de
incapacidade laborativa decorrente dos Riscos Ambientais de Trabalho
(GIIL-RAT), que é devido aos empregadores pelo Seguro de Acidente
do Trabalho (SAT) (art. 22, Lei 8.212/91), variando entre 1%, 2% e 3%,
incidindo sobre a folha de pagamento, podendo resultar em uma majo-
ração ou redução dessa contribuição. (BRASIL, 2010; BRASIL, 2003).
O FAP pode variar em um intervalo contínuo de 0,5 a 2,0. Assim,
de acordo com redação dada pela Resolução 1.316, de 31 de maio de
2010, com o FAP, as empresas com mais acidentes e acidentes mais gra-
ves em uma subclasse - Classificação Nacional de Atividades Econômicas
(CNAE) passarão a contribuir com um valor maior, enquanto as empresas
com menor acidentalidade terão uma redução no valor da contribuição.
O presenteísmo é a presença do funcionário no trabalho, porém,
acometido por alguma questão de saúde resultando em redução da sua
capacidade laboral, seja ela física ou mental. Em estudo feito por Collins
et al. (2005), os autores apresentaram o seguinte resultado: os custos com

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 239
o presenteísmo foram maiores do que os custos com o absenteísmo, numa
proporção de custos de 1,0% com o absenteísmo e 6,8% com o presen-
teísmo, para 10,1% da força de trabalho nos Estados Unidos, em 2002.
Alguns benefícios inquestionáveis dos programas de promoção da
saúde e qualidade de vida são responsáveis pela redução do absenteísmo,
dos acidentes de trabalho, de adoecimentos, do presenteísmo e dos cus-
tos com assistência médica. Os líderes empresariais já percebem a saúde
dos trabalhadores como um verdadeiro patrimônio para a empresa e que
o valor despendido com a prevenção da saúde é um investimento, pois
custa menos do que o valor gasto com indenizações, ações trabalhistas,
afastamentos e acidentes de trabalho.
A legislação trabalhista brasileira é bastante abrangente, bem como
a tributação associada à legislação previdenciária, gerando impactos sig-
nificativos para a gestão das empresas. A realidade é que os empresários
precisam conhecer as bases dessas regulamentações, pois as penalidades
e tributações estarão diretamente ligadas à necessidade de um planeja-
mento estratégico das ações de saúde e segurança da empresa.
Nos dias atuais, são exigidas das empresas atuação e visão mais
abrangentes, que possam ir além do seguimento dos requisitos legais.
Uma remuneração justa, condições dignas de trabalho, capacitações e
desenvolvimento, oportunidade de crescimento profissional, acrescidos
da compatibilidade com atividades pessoais e familiares do trabalhador,
são aspectos exigidos das empresas do século XXI (SIMURRO; OGATA,
2015).

Impacto na saúde suplementar

Em suas pesquisas, o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar


(IESS, 2017) infere sobre a importância do uso racional dos planos de
saúde pelos beneficiários, visando à redução de custos sem prejuízo da
qualidade assistencial, que envolvem medidas como mudança na forma

240 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


de pagamento dos prestadores de serviço e aumento da transparência
para reduzir erros e fraudes. Este ano, o IESS citou que um estudo do
Advance Medical Group apresenta mais uma solução para esse proble-
ma, que é o uso racional do serviço de pronto-socorro, pois 51% das idas
dos beneficiários ao pronto-socorro poderiam ser resolvidas através de
plataformas de orientação médica especializada, por meio de serviços de
triagem e identificação dos cuidados corretos.
A condição do uso racional dos planos de saúde perpassa pela
consciência do usuário quanto à utilização correta desse benefício, para
tanto, é necessário conhecimento por parte dele sobre o custo dos pro-
cedimentos oferecidos e o impacto que causa no valor de pagamento do
plano, quando o recurso é utilizado de forma indiscriminada. Esse reflexo
se estende a todos os usuários. A consciência do uso correto, geralmen-
te, surge na hora do pagamento e não no momento da contratação do
serviço. De acordo com dados do (IESS, 2017) os episódios agudos de
doença, com uso indiscriminado do serviço de pronto-socorro e realiza-
ção excessiva de exames complementares, são os maiores “vilões” para a
sustentabilidade da saúde suplementar.
Dados do Mapa Assistencial de 2016 publicado pela Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS, 2016), apresentam aumentos
significativos no número de exames complementares realizados. Em um
comparativo entre os anos de 2014 e 2015, houve um aumento de 12%
na realização desses exames, entre os mais realizados estão a ressonância
magnética (aumento de 25,2%) e a tomografia computadorizada (au-
mento de 21%).
O Índice de Variação dos Custos Médico-Hospitalares (VCMH),
divulgado pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS,
2017a), é o mais importante indicador utilizado pelo mercado de saúde
referente a custo. Segundo dados do IESS, esse indicador registrou alta
de 19,4% durante os 12 meses e encerrados em setembro de 2016. Desde
2007, é a maior variação registrada para o período. Vale comparar com
a inflação geral do país, medida pelo Índice de Preço ao Consumidor
Amplo (IPCA), que ficou em 8,5% no mesmo período.
ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 241
A inflação médica crescente no nosso país, nos últimos anos, tem
afetado, de maneira significativa, os custos com a assistência em saúde
nas empresas que oferecem planos de saúde aos seus funcionários e de-
pendentes. Gestores de saúde das empresas devem ter em mente que,
nesse contexto da saúde suplementar, a perspectiva do controle do custo
ultrapassa a alçada de suas ações planejadas nos programas de saúde e
qualidade de vida, a curto prazo. Desta forma, o reflexo das ações dos
programas contribuirá para um controle em médio e longo prazo dos cus-
tos. (SIMURRO; OGATA, 2015).
A conjuntura econômica de retração que o Brasil encontra hoje
não intimida o aumento dos gastos assistenciais no setor de saúde. O que
se presencia é um aumento nas despesas desse setor, o que diretamen-
te representa risco à sustentabilidade da saúde suplementar. A inflação
médica no país é uma das maiores do mundo. Segundo dados do IESS,
no Reino Unido, a taxa de crescimento do gasto per capita com saúde
recuou 3,4 pontos percentuais (p.p.) entre 1995 e 2013, enquanto a taxa
de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) per capita caiu 1,4 p.p. Já
no Brasil, entre 2001 e 2013, enquanto a taxa de crescimento do PIB per
capita recuou 0,8 p.p., a dos gastos assistenciais por beneficiário avançou
2,5 p.p. (INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE SUPLEMENTAR,
2017b).
Normalmente, o que acontece é uma redução na taxa de cresci-
mento dos gastos em saúde juntamente com a redução da taxa de cres-
cimento da economia, pois se torna possível correlacionar os gastos com
saúde per capita e PIB per capita. Porém, as tendências das duas taxas no
Brasil são diferentes. Faz-se necessário conhecer a fundo o que causa
essa divergência. A sustentabilidade da Saúde Suplementar está relacio-
nada ao entendimento das causas dessa divergência, frente ao padrão de
correlação positiva entre renda e gasto com saúde observada em demais
países, como Reino Unido e França. O IESS aponta a inflação médica
como a maior “vilã” da divergência nas taxas. Os fatores para o aumento
da inflação estão ligados à incorporação de novas tecnologias, ao en-

242 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


velhecimento populacional, ao desperdício de material e ao modelo de
pagamento de hospitais que predomina no Brasil, o fee-for-service, que
paga por unidade sem verificar a eficiência dos serviços ou a qualidade
da assistência hospitalar.
Uma das formas de diminuir os custos com a saúde suplementar é
a adoção de outras maneiras de pagamentos dos serviços médicos, espe-
cíficas e mais direcionadas. Como exemplo, há o modelo de remunera-
ção chamado Diagnosis Related Groups (DRG) ou Grupos de Diagnóstico
Relacionados. Esse modelo permite a categorização dos tratamentos por
grupos com necessidade de recursos semelhantes, baseado no histórico
de valor do custo médio e pode contribuir para frear o aumento de cus-
tos da saúde no Brasil. De acordo com o IESS, em países como Estados
Unidos e Alemanha, esse modelo de remuneração já está sendo aplicado
há décadas, apresentando sucesso e bons resultados. A Alemanha apre-
sentou uma redução de 25% do orçamento hospitalar entre o período de
2005 a 2009. Pesquisadores norte-americanos verificaram que, em um
período de 3 anos, a remuneração baseada em DRG pode reduzir custo
médio das internações em até 50%, assim como, pode reduzir o custo
médio de internações agudas de longa duração em 24%. (INSTITUTO
DE ESTUDOS DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2017d).
Nessa conjuntura, o conhecimento por parte dos setores estraté-
gicos das empresas, inclusive pelos empresários, a respeito das variáveis
ligadas à saúde suplementar favorece a gestão assertiva dos custos liga-
dos diretamente ao plano de saúde. Trata-se de uma complexidade de
variáveis que devem ser bem geridas, visando à saúde orçamentária da
empresa, que também é impactada com o aumento constante da inflação
médica em nosso país. Mais uma vez deve-se frisar a importância da im-
plementação de programas de promoção da saúde nas instituições como
uma estratégia para a diminuição da sinistralidade, direcionados tanto
para o trabalhador como, se possível, para o dependente, com o intuito
de conscientizar os colaboradores quanto ao uso correto do benefício.

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 243
Compreendendo ROI e VOI

Criado em 1977, pela Gartner, uma empresa de Tecnologia da


Informação (TI), o ROI - return on investment ou retorno do investimen-
to, foi disseminado e amealhou popularidade no mercado de TI na déca-
da de 90 e, a partir dos anos 2000, foi se popularizando para outras áreas,
como Contabilidade, Economia, Educação e Saúde.
ROI, simplesmente, é a quantificação monetária do retorno finan-
ceiro produzido por qualquer ação de intervenção realizada em uma das
esferas de estudo, avaliando, por fim, se o investimento a ser firmado ou
que foi feito é economicamente viável e importante.
Segundo o Dr. Alberto Ogata, diretor técnico da Associação
Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), o “despertar” da busca pelo
retorno sobre o investimento em programas de promoção da saúde, qua-
lidade de vida e prevenção, surgiu nos últimos anos, principalmente a
partir da influência norte-americana. Ogata (2017b) aponta que, nos
Estados Unidos, 77% das empresas possuem programas de qualidade de
vida, no entanto, algumas com poucas ou apenas uma iniciativa, e outras
com programas maiores e mais completos. A questão é que cinco requisi-
tos básicos são necessários para a configuração dos programas: ações em
educação básica, ambiente de suporte, integração das ações e do progra-
ma à estrutura da empresa, e avaliação do nível de saúde dos colaborado-
res. Entretanto, poucas empresas nos Estados Unidos realizam, de fato,
ações integradas e efetivas, conforme afirma Ogata (2017b).
Uma pesquisa online realizada pela KPMG LLP, empresa de audito-
ria, fiscalização e consultoria dos Estados Unidos, entrevistou 296 gesto-
res de saúde quanto ao retorno sobre os investimentos em programas de
saúde populacional. Como resultado, observou-se que, mais da metade
dos gestores espera retorno sobre os investimentos em programas de saú-
de dentro de três a quatro anos, 20% acreditam que os investimentos
em tecnologia da informação de saúde e ferramentas de dados e análises
serão pagos em um a dois anos, 36% indicaram que o período de recupe-

244 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


ração dos investimentos pode levar até três ou quatro anos, mostrando
que uma maioria espera recuperar seus custos dentro desse prazo.
De acordo com a pesquisa on-line da KPMG, entre os gestores de
saúde e executivos entrevistados, 36% afirmaram que o maior benefí-
cio clínico derivado da gestão da saúde da população virá de cuidados
preventivos, 23% defendem que seria o desenvolvimento de protocolos
clínicos evidenciados para melhorar a eficiência do atendimento e 21%
que seria o gerenciamento de doenças crônicas. Ainda sobre a pesquisa,
24% dos entrevistados classificam suas próprias capacidades de gerencia-
mento de saúde da população como “maduras”, 38% como em estágios
elementares, quase 15% como “inexistentes” e 23% em sua “infância”.
A questão dos custos também foi abordada com os gestores entrevista-
dos durante a pesquisa, 42% consideram os custos como o maior desafio
na implementação de programas de saúde, 25% apontam a dificuldade
de conseguir profissionais médicos com abordagem para programas de
saúde, 19% a interoperabilidade com outros provedores e 14% a con-
cordância com os novos relacionamentos do pagador. Um dos integran-
tes consultivos da KPMG afirma que os gestores de saúde e executivos
entrevistados:

veem os benefícios dos programas de gerenciamento de saúde da


população como parte da solução para reduzir custos e variabi-
lidade médica evitáveis. Os cuidados preventivos recebem uma
grande prioridade nesses programas, uma vez que proporcionam
melhorias em cuidados eficientes e eficazes com um alto grau de
envolvimento do paciente. (BORDEN, 2017).

Uma das razões pelas quais os gestores de programas de promoção


da saúde e qualidade de vida das empresas são cobrados pelo retorno
sobre esses investimentos, seria o aumento constante, ano após ano, dos
preços com a saúde, devido a: incorporação de tecnologias avançadas
e aumento na incidência das doenças crônicas não transmissíveis que

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 245
demandam tratamentos longos, complexos e de alto custo. Assim, parte
do interesse da empresa ter o conhecimento do retorno sobre o investi-
mento em saúde, principalmente o quanto de custo será evitado como
gasto da empresa em médio e longo prazo.
Nesse contexto, Ogata (2017b) complementa que,

talvez um dos fatores que tenham levado a algum descrédito dos


programas de saúde e qualidade de vida e a exigência da compro-
vação de algum retorno financeiro seja a utilização de ações pon-
tuais, sem o planejamento adequado e meramente motivacionais.
Portanto, faz-se necessário que os programas sejam bem estrutu-
rados, baseados em boas práticas corporativas e em evidências
científicas.

Segundo Roemer e Goetzel (2017), cientista sênior da Universidade


John Hopkins nos Estados Unidos, o valor sobre o investimento (VOI),
talvez seja hoje visto como mais importante que o retorno sobre o in-
vestimento (ROI). O ROI sozinho avalia o retorno financeiro de pro-
gramas que, talvez, não apresentem retorno significativo. Porém, irá
depender da visão de valor do empresário, da filosofia da empresa, quan-
to à importância de investir em programas de promoção da saúde que
não apresentem ROI positivo, mas que gerem valor significativo para
mudanças de hábitos de vida dos funcionários.
Diversas variáveis influenciam o sucesso de um programa de pro-
moção da saúde numa empresa que gere valor e impacto significativo
para os trabalhadores, podendo contemplar a importância do apoio da
gestão e dos líderes, o investimento financeiro da empresa e a incorpora-
ção dessas ações como valores e missão institucional. Tais ações refletirão
numa mudança de cultura da saúde dos funcionários com a prática de
hábitos de vida saudáveis, maior engajamento, retenção de talentos e a
experiência de desempenhar um trabalho com propósito, não se limitan-
do apenas em receber um salário. (ROEMER; GOETZEL, 2017).

246 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


A abordagem do VOI requer das empresas uma avaliação da saúde
organizacional, o que vai além do ato de medir individualmente a saúde
dos trabalhadores. Envolve outra perspectiva em relação à importância
da implementação dos programas de saúde numa empresa, extrapolando
o foco de cortar custos. (ROEMER; GOETZEL, 2017).
Segundo Roemer e Goetzel (2017), uma mudança de cultura com
relação a programas de promoção da saúde nas empresas parte do princí-
pio de que é necessário controlar os gastos desnecessários de investimen-
tos em saúde e acidentes de trabalho evitáveis. Em pesquisa publicada
por Roemer e Goetzel (2017), foram entrevistados 275 empregadores, os
quais relataram outras questões vantajosas relacionadas à implementa-
ção de programas de saúde, que não apenas reduzam custos, mas também
melhorem a satisfação e o ânimo dos funcionários, diminuindo o absen-
teísmo e o presenteísmo, retendo talentos e gerindo os afastamentos por
incapacidade.
O pesquisador ainda afirma que as grandes, médias e pequenas
empresas estão (re)direcionando os esforços em promoção da saúde com
ênfase na mudança do ROI para o VOI. Classifica que o VOI pode ser
medido em quatro grandes categorias, quais sejam: medições de negócios
(performance e lucratividade, atração e retenção de talentos); medições
de saúde e de cuidados com a saúde (reivindicações médicas e custos,
alegações de incapacidade e custos, segurança, comportamento relacio-
nado à saúde), medições de produtividade (absenteísmo e presenteísmo)
e medições humanísticas (ânimo, satisfação no trabalho, nível de ener-
gia, relacionamento com colegas, engajamento e satisfação no progra-
ma). (ROEMER; GOETZEL, 2017).

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 247
Benefícios tangíveis e intangíveis do
investimento em saúde e segurança

Os Programas de Promoção da Saúde e Qualidade de Vida devem


ser percebidos como estratégicos para a organização. Investir em progra-
mas estruturados, com indicadores claros, mensuração de impacto finan-
ceiro e valor, é primordial nos dias atuais e de acirrada competitividade.
Devido à necessidade de atrair e manter talentos, otimizar inves-
timentos em saúde e reduzir custos evitáveis, as organizações precisam
investir em programas, mas sempre de forma assertiva. Em muitos casos,
além da remuneração, a permanência de talentos numa organização está
aliada ao estilo de vida e ao bem-estar que encontram em seu dia a dia
de trabalho. Promover a qualidade de vida como valor na organização é
um investimento estratégico nos dias atuais.

Segundo a OMS, a qualidade de vida no trabalho

representa a percepção do indivíduo sobre sua posição na vida,


no contexto de sua cultura e sistema de valores em que ele vive
em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e conceitos.
Trata-se de um conceito amplo, que inclui a saúde física, o estado
psicológico, as crenças pessoais, as relações sociais e suas relações
com o ambiente. (CHIAVENATO, 2014, p. 154).

Percebemos no conceito acima, que a qualidade de vida envolve


um escopo abrangente, cujos investimentos econômico e financeiro se
fazem necessários, conforme a capacidade da empresa. Quando bem re-
alizadas, as ações podem abranger duas necessidades:

1. A necessidade dos trabalhadores por um ambiente que propor-


cione bem-estar e satisfação, motivando-os para dar os melho-
res resultados.

248 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


2. A necessidade das empresas em potencializar sua produtivida-
de e reduzir os custos com acidentes, absenteísmo, impostos e
seguros saúde.

O problema é que, muitas empresas não conseguem perceber o


valor do investimento em qualidade de vida e consideram “custos des-
necessários”, porém elas precisam entender que desprendem muito mais
esforço e capital devido ao não investimento. Trabalhadores motivados,
saudáveis e capacitados são muito mais produtivos e inovadores e podem
potencializar e retornar o capital neles investidos. O investimento em
qualidade de vida pode resultar em elevação da motivação para o traba-
lho, adaptabilidade para mudanças, aumento da criatividade e vontade
de inovar, agregando, assim, um maior valor para a organização em que
trabalha.
Os programas de promoção da saúde dentro das empresas são
uma oportunidade de desenvolver a saúde corporativa e individual dos
funcionários. O local de trabalho também é visto como um espaço para
promoção e manutenção da saúde, pois como citado na Constituição da
Organização Mundial de Saúde (1946), saúde é a condição em que um
indivíduo, ou grupo de indivíduos, é capaz de realizar suas aspirações,
satisfazer suas necessidades e mudar ou enfrentar o ambiente. A saúde é
um recurso para a vida diária, e não um objetivo de vida.

Pessoas saudáveis são fundamentais para as organizações. Segundo


Chiavenato (2014, p 104):

as organizações não existem sem as pessoas. Apesar de todos os


seus recursos organizacionais – como máquinas, equipamentos,
instalações, capital financeiro, tecnologias –, as organizações se
baseiam em pessoas para poderem operar e funcionar adequada-
mente em um ambiente competitivo e carregado de oportunidades
e ameaças. Na verdade, as pessoas são o começo, o meio e o fim

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 249
das organizações. São elas que fundam e iniciam as organizações;
são elas que impulsionam; e também são elas que levam as orga-
nizações ao sucesso ou à bancarrota, dependendo da sua atuação
positiva ou negativa, cooperativa ou conflitiva.

Segundo Lang (2017), a redução dos riscos para a saúde e a melho-


ria da qualidade de vida dos trabalhadores estão intrinsecamente ligadas
à implementação de programas e políticas eficazes no local de trabalho.
A manutenção da saúde dos funcionários impacta na redução de cus-
tos institucionais com assistência médica e com o absenteísmo, em con-
trapartida reflete no aumento na produtividade. Essas são algumas das
vantagens que a empresa alcança ao implementar um programa de pro-
moção da saúde. Vale ressaltar que os custos com absenteísmo também
englobam as horas extras reduzidas para cobrir o funcionário ausente e as
horas de treinamento de colaboradores para substituição.
O benefício da implementação de programas de promoção da
saúde vai além quando alcança também a família e a comunidade. A
Organização Pan-americana da Saúde recomenda que as ações de saúde
de uma empresa sejam extensivas a familiares e à comunidade. O traba-
lhador envolvido em ações de saúde na sua empresa consegue, ao longo
do tempo, adquirir hábitos de vida saudáveis que acabam influencian-
do em seu ambiente familiar e na comunidade em que vive. A empre-
sa se torna, então, agente de mudança da cultura local por uma saúde
sustentável.
Para se instituir um programa de promoção da saúde na empresa,
antes de tudo, é necessário conhecer o perfil de saúde dos funcionários,
bem como os riscos ocupacionais que a atividade expõe. Esse levanta-
mento de informações irá nortear a escolha de programas que serão im-
plementados para que seja alcançada uma real eficácia nas ações, direcio-
nando os esforços para uma causa justificada. Assim, o ponto de partida
é padronizar na instituição o conceito do programa que será executado
e entender os motivos pelos quais serão usados recursos financeiros, hu-

250 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


manos, logística e instalações para a iniciativa. (SIMURRO; OGATA,
2015).
Frente ao empregador, é necessário que o agente ou o setor respon-
sável pela promoção da saúde da empresa argumente a implementação
dos programas. Gerenciamento de custos, produtividade, redução da si-
nistralidade e um bom lugar para se trabalhar são justificativas relevan-
tes. (LANG, 2017). Até pouco tempo atrás, o motivo de implementação
de programas de saúde pelas empresas era o fato de ser a coisa certa a se
fazer. Hoje, frente à realidade econômica e social, a aplicação e imple-
mentação dos programas precisam apresentar objetivos bem definidos
e possuir um planejamento bem estruturado. (SIMURRO; OGATA,
2015).
Em um artigo publicado nos Estados Unidos, partindo da revisão
de diversos estudos sobre programas de saúde no local de trabalho apre-
sentou que, quando bem implementados, os programas de saúde podem
levar a 25% de redução dos custos das empresas com sinistralidade de
planos de saúde, assistência médica, causas trabalhistas e absenteísmo.
(CHAPMAN, 2005).
O cuidado com a saúde e bem-estar dos funcionários no local de
trabalho gera satisfação aos colaboradores, por serem percebidos como
um valor para o empregador e por fazerem parte de uma instituição que
investe nessas premissas. O funcionário motivado por trabalhar em uma
empresa saudável produz mais e permanece por mais tempo na organiza-
ção. Empregadores evoluídos veem a melhoria no ambiente de trabalho
como uma estratégia de gestão, de investimento em capital humano, de
retenção de talentos, bem como a possibilidade de obtenção de novos
talentos, como recurso para alcance das metas estabelecidas, além de
tornar a empresa mais competitiva frente ao mercado concorrente.
A integração dos programas de promoção da saúde com os pro-
gramas de saúde e segurança pode potencializar o sucesso das ações e
aumentar a participação ativa dos funcionários, evitando ações pontuais
e individuais, abrangendo a organização de forma ampla.

ECONOMIA
PARA SAÚDE E SEGURANÇA 251
Nesse contexto, surge a importância dos Programas de Promoção
da Saúde para combater o problema, principalmente dentro das empre-
sas. Organizações com investimentos em políticas de bem-estar e de pro-
moção da saúde apresentaram crescimento cerca de 5% superior, quando
comparadas a outras. A implementação desses programas dentro das em-
presas proporciona não só à saúde para os colaboradores, como também
trata a saúde econômico-financeira das organizações, conforme aponta
Ogata (2017a). Segundo ele, existem evidências de que os programas
de saúde trazem retorno financeiro positivo, todavia, não é imediato,
contudo, nenhum dos estudos sobre a temática apresentou um retorno
sobre o investimento no primeiro ano. A partir do terceiro ano pós-im-
plementação do programa, é que foi possível identificar diminuição nas
internações, melhor controle das doenças crônicas não transmissíveis,
além de contribuir para um clima organizacional saudável e, automati-
camente, o engajamento dos funcionários. Nessa máxima, é relevante
integrar os programas de promoção da saúde com os programas de saúde
e segurança da empresa, uma vez que os funcionários que têm um estilo
de vida saudável diminuem o seu risco ocupacional.
As decisões relativas à saúde, segurança e qualidade de vida no
trabalho, bem como a escolha e o acompanhamento de indicadores de
impacto relativos ao tema, devem ser elevados a uma posição estratégica
nas empresas, para que se perceba o valor desses investimentos.

252 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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ECONOMIA
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256 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


FATORES
PSICOSSOCIAIS
Gabriela Hermann Cibeira
Graziela Alberici
Letícia Lessa da Silva Silveira
Luciana Mercês de Lucena
Roberta Cristina Sawitzki

FATORES
PSICOSSOCIAIS 257
PANOR AMA DOS FATORES
PSICOSSOCIAIS RELACIONADOS AO
AMBIENTE DE TR ABALHO

A
Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho (PNSST),
introduzida pelo Decreto nº 7.602/2011, pauta-se pelos seguin-
tes objetivos: promoção da saúde, melhoria da qualidade de
vida do trabalhador, e a prevenção de acidentes e de danos à saúde ad-
vindos, relacionados ao trabalho ou que ocorram no curso dele, por meio
da eliminação ou redução dos riscos nos ambientes de trabalho.
No final da década de 1970, a Organização Mundial da Saúde
(OMS), realizou um fórum interdisciplinar em Estocolmo, com o obje-
tivo de discutir a influência dos fatores psicossociais na saúde, formular
medidas e propor políticas de saúde inclusivas baseadas nesses fatores.
Em 1980, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a OMS
publicaram documento em que chamavam a atenção dos efeitos ad-
versos dos fatores psicossociais relacionados ao trabalho (Organização
Internacional do Trabalho, 1986). Segundo esse documento, ambas as
organizações internacionais concordavam que “(...) o crescimento e pro-
gresso econômico não dependiam apenas da produção, mas também das
condições de vida e trabalho, saúde e bem-estar dos trabalhadores e seus
familiares”. O documento citava que não apenas os riscos físicos, quími-

FATORES
PSICOSSOCIAIS 259
cos e biológicos tinham importância na saúde do trabalhador, mas vários
riscos psicossociais presentes no trabalho.
De acordo com a OIT, na Europa, o estresse ocupa a segunda po-
sição entre os problemas de saúde relacionados ao trabalho, afetando
cerca de 40 milhões de pessoas. Ainda de acordo com a OIT, 50 a 60%
de todos os dias de trabalho perdidos no continente estariam ligados a
esta condição.
No Brasil, de acordo com a Previdência Social, os transtornos
mentais e comportamentais ocupam a terceira causa de incapacidade
para o trabalho, considerando a concessão de auxílio-doença e aposen-
tadoria por invalidez, constatado no período de 2012 a 2016.
Com esta breve introdução pode-se perceber que os impactos dos
fatores psicossociais relacionados ao trabalho, embora abordados por
organizações de reconhecimento nacional e internacional como OIT e
OMS já há algumas décadas, é assunto relativamente recente no Brasil, o
que denota uma necessidade de se falar e conhecer mais a respeito.
Assim, para se mostrar um panorama amplo sobre os fatores psi-
cossociais relacionados ao trabalho, este capítulo está estruturado em
quatro temas principais:
1. transformações no mundo do trabalho;
2. a importância de se abordar os fatores psicossociais no trabalho;
3. o cenário da saúde mental no Brasil e no mundo, e,
4. necessidades futuras em gestão de riscos e/ou de fatores
psicossociais.

O primeiro tema aborda as transformações do trabalho e traça um


panorama mundial quanto às questões legais que embasam ações e políti-
cas em Segurança e Saúde no Trabalho (SST). O segundo tema discorre
sobre os fatores psicossociais e a relevância de se abordar essa temáti-
ca. O terceiro retrata, em linhas gerais, alguns efeitos na saúde e efeitos
na organização, apresentando índices de adoecimentos e afastamentos
por transtornos mentais e comportamentais. Já o quarto tema desenha

260 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


possibilidades e necessidades futuras em gestão de riscos e/ou de fatores
psicossociais. O capítulo encerra com as considerações finais.

Transformações no mundo do trabalho


e riscos ocupacionais

Nas últimas décadas, as mudanças significativas que ocorreram no


mundo do trabalho, tais como desenvolvimento tecnológico, inovação,
digitalização; novas formas de organização e reestruturação do trabalho,
assim como de relações de trabalho; maiores exigências de trabalho e
carga de trabalho; envelhecimento e alterações demográficas na força
de trabalho; desequilíbrio entre trabalho e vida privada; crise econômica
global e recessão gerando desemprego, insegurança no emprego e pre-
carização do trabalho (EU-OSHA, 2007, 2010; GIL-MONTE, 2012;
ILO, 2016; JIMÉNEZ, 2011; SAUTER et al., 2002; SILVA; FERREIRA,
2013), fizeram emergir novos riscos ocupacionais em relação a fatores
físicos, químicos e biológicos, com adição de outros fatores que se en-
contram presentes no ambiente, porém, não tão visíveis aos olhos, e que
possuem potencial de causar dano, denominados riscos psicossociais.
Em função de tais mudanças, percebe-se um aumento cada vez
maior da ocorrência de transtornos mentais e comportamentais associa-
dos ao trabalho. Jacques (2000, p.46), refere que “Reconhece-se, hoje,
uma série de fatores associados ao trabalho como responsáveis por sofri-
mento e por alterações na saúde mental, desde fatores pontuais como
a exposição a determinados agentes tóxicos até a complexa articulação
de fatores relativos à organização do trabalho (...). Embora o trabalho se
constitua em um importante elemento de inserção social pelo seu valor
econômico, cultural e simbólico, são necessários alguns requisitos no seu
exercício para que possa proporcionar prazer, bem-estar e saúde. Quando
esses requisitos estão ausentes, as consequências transparecem no sofri-
mento e na doença”.

FATORES
PSICOSSOCIAIS 261
De maneira mais ampla, cabe destacar que a prevenção de riscos
psicossociais e a proteção à saúde mental dos trabalhadores podem ser
abordadas por meio de:

1. Instrumentos jurídicos vinculativos, tais como:


a. Normas Internacionais do Trabalho - são os instrumentos
jurídicos da OIT que estabelecem princípios e direitos fun-
damentais no trabalho;
b. Normas Regionais - declarações, diretivas e outros instru-
mentos adotados pelas instituições regionais;
c. Legislação nacional - Códigos de Trabalho, Leis de SST,
Atos de SST, regulamentações específicas de SST;
d. Acordos coletivos - Acordos dos parceiros sociais que com-
plementem ou ultrapassem a legislação nacional em bene-
fício dos trabalhadores representados nas negociações.
2. Normas e instrumentos não vinculativos que promovam uma
ação harmonizada na prevenção e controle dos riscos psicosso-
ciais e do estresse relacionado com o trabalho a nível nacional
e empresarial (normas técnicas, orientações, protocolos, ins-
trumentos de intervenção, materiais de formação).

Assim, é possível notar que junto às mudanças no mundo do tra-


balho e ao surgimento dos riscos emergentes, surgiu também uma maior
preocupação no estabelecimento de condutas legais que conduzam as
organizações à proporcionarem aos trabalhadores uma melhor adequa-
ção dos ambientes de trabalho às atividades laborais, ou seja, ambientes
que promovam uma maior segurança e saúde para o trabalhador, bem
como ambientes que previnam o aumento desses riscos ou o surgimento
de novos riscos.

262 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Abordagem dos fatores psicossociais no
ambiente de trabalho

Nas últimas definições da Organização Mundial de Saúde (OMS),


a saúde vincula-se a uma visão integral, considerando-a como um esta-
do de completo bem-estar físico, psicológico e social, não apenas como
ausência de doença ou enfermidade, concepção anteriormente adotada.
Na mesma linha, nas últimas décadas, observa-se um movimento mun-
dial em torno da discussão sobre os fatores psicossociais e sua relação
com a saúde da população. Um exemplo foi o workshop interdisciplinar,
First WHO Interdisciplinary Workshop on Psychosocial Factors and Health,
que a OMS promoveu, na década de 1970, com o propósito de refletir
sobre a influência dos fatores psicossociais na saúde, definir medidas e
estabelecer políticas de saúde que levassem em consideração tais fatores
(WHO, 1976). Na década seguinte, a OIT e a OMS divulgaram um re-
latório no qual enfatizavam os efeitos desfavoráveis dos fatores psicosso-
ciais relacionados ao trabalho, atribuindo aos riscos psicossociais a mes-
ma importância que historicamente é dada aos riscos físicos, químicos e
biológicos no que tange a saúde do trabalhador (OIT, 1986).
A OIT refere-se aos fatores psicossociais no trabalho como a influ-
ência mútua entre o meio ambiente (condições de trabalho, condições
organizacionais, carga e ritmo de trabalho, conteúdo do trabalho entre
outros) e as características do trabalhador (individuais, familiares e so-
ciais) que podem afetar a saúde, o desempenho e a satisfação no traba-
lho, a partir de suas percepções subjetivas e de suas experiências (vide
Quadro 1).
Esta definição ressalta que há uma interação dinâmica entre o am-
biente de trabalho e os fatores humanos que, por um lado, quando nega-

FATORES
PSICOSSOCIAIS 263
A OIT definiu os fatores psicossociais (perigos) em 1984, em termos de “inte-
rações entre e no ambiente do trabalho, o conteúdo do trabalho, as condições
organizacionais e as capacidades, necessidades, cultura e considerações pesso-
ais extra emprego que podem, através de percepções e experiências, influencias
Saúde, desempenho no trabalho e satisfação no trabalho”. (ILO, 2016)

Quadro 1 Fatores Psicossociais

tiva, pode levar a distúrbios emocionais, problemas comportamentais, al-


terações bioquímicas e neuro-hormonais, apresentando riscos adicionais
de doença mental ou física. Por outro lado, quando há equilíbrio entre
as condições de trabalho e os fatores humanos, o trabalho cria um sen-
timento de domínio e autoconfiança; aumenta a motivação, capacidade
de trabalho e satisfação; e melhora a saúde (ILO, 2016).
A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho apre-
senta abordagem semelhante, e resume os principais fatores de riscos à
saúde mental como decorrentes de deficiências na concepção, organiza-
ção e gestão do trabalho, bem como de um contexto social de trabalho
problemático. Cita, também, algumas características das condições de
trabalho que conduzem a riscos psicossociais:
• Cargas de trabalho excessivas;
• Exigências contraditórias e falta de clareza na definição das
funções;
• Falta de participação na tomada de decisões que afetam o
trabalhador e falta de controle sobre a forma como executa o
trabalho;
• Má gestão de mudanças organizacionais, insegurança laboral;
• Comunicação ineficaz, falta de apoio da parte de chefias e
colegas;
• Assédio psicológico ou sexual, violência de terceiros.

264 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Assim, os fatores psicossociais são ocorrências que podem afetar a
resposta psicológica do trabalhador ao trabalho, e às condições do am-
biente de trabalho, que compreendem conteúdo da tarefa, sobrecarga e
ritmo de trabalho, horas de trabalho, participação e controle, desenvol-
vimento de carreira, status e salários, esquema de pagamento de benefí-
cios, papel na organização, relações interpessoais, cultura organizacional
e nível de equilíbrio entre a vida particular e a profissional.
Além disso, os riscos psicossociais no trabalho (vide Quadro 2)
são compreendidos como os riscos para a saúde física, mental e social
que decorrem de deficiências na concepção do trabalho, assim como de
problemas na organização e na gestão do trabalho (LEKA; COX, 2008),
incluindo carga de trabalho e ritmo de trabalho excessivo; insegurança
no emprego; horários de trabalho rígidos e/ou irregulares, imprevisíveis
ou fora do horário normal; relações interpessoais insatisfatórias; falta
de participação nas decisões da organização; baixo controle sobre o seu
próprio trabalho; indefinição da função a desempenhar na organização;
comunicação deficiente; poucas perspectivas de crescimento na carreira;
exigências contraditórias; demandas inadequadas que causam desequilí-
brio entre a vida profissional e familiar (EU-OSHA, 2013; 2014b).
Vale ressaltar que estes riscos não se encontram presentes em todos
os ambientes organizacionais, alguns deles são encontrados em determi-
nadas organizações, e sua identificação pode se dar através de avaliações
regulares. No entanto, mesmo que estes sejam identificados e geridos,
ainda assim há a necessidade de monitoramento e de novas avaliações,

Riscos psicossociais no trabalho são compreendidos como os riscos para a saúde


física, mental e social que decorrem de deficiências na concepção do trabalho,
assim como de problemas na organização e na gestão do trabalho.

Quadro 2 Riscos Psicossociais


Fonte: Leka e Cox, 2008

FATORES
PSICOSSOCIAIS 265
pois, à medida que os locais de trabalho evoluem e se modificam, pode-
rão também emergir novos riscos (COX, 1993).
Mais recentemente, em decorrência dos altos índices de problemas
de saúde relacionados às condições de trabalho na Europa especialmente
aos problemas de doença que dizem respeito aos adoecimentos mentais,
a OMS convocou países membros da Comunidade Europeia a proporem
um modelo de prevenção, gestão e intervenção que promovesse maior
bem-estar e, consequentemente, menor adoecimento dos trabalhado-
res: o Guia de Orientações do Modelo Europeu para Gerenciamento de
Riscos Psicossociais - PRIMA-EF (LEKA; COX, 2008). Considera-se
que o adoecimento associado aos fatores psicossociais tem distintas etio-
logias, condicionado por diferentes elementos, levando em conta que a
natureza desses fatores é complexa e multicausal, pois abrange questões
associadas ao gênero, idade, estado civil, escolaridade e estilo de vida, so-
madas às características do meio ambiente e do trabalho (LEKA; COX,
2008).
Para finalizar, ressalta-se que os fatores psicossociais têm poten-
cialidade de gerar consequências negativas para a saúde, em sua maioria
mais duradouras do que as LER/DORT, embora possam não ser tão facil-
mente identificados ou relacionados ao trabalho quanto os acidentes de
trabalho. Manifestam-se através de problemas tais como: absenteísmo,
presenteísmo, rotatividade de pessoal, estresse relacionado ao trabalho,
assédio moral, assédio sexual, transtornos depressivos, transtornos an-
siosos, transtornos de humor, transtornos mentais e comportamentais
devido ao uso de substâncias psicoativas e álcool, esquizofrenia, dentre
outros. Diante do exposto, a próxima seção tratará do cenário da saúde
psicossocial no Brasil e no mundo.

266 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Cenário da saúde mental no Brasil e no
mundo

A relação que se estabelece entre trabalho e saúde/doença mental


tem sido crescente, assim como as estatísticas comprovam o número cada
vez maior de afastamentos causados por transtornos mentais e comporta-
mentais no Brasil e no mundo. Segundo a OMS, os transtornos mentais
e comportamentais são universais, frequentes e atingem ¼ (um quarto)
da população em algum momento da sua vida, afetando pessoas de todas
as nacionalidades e sociedades, faixa etária, gênero, classe social, setor
industrial, alcançando populações tanto de zonas urbanas quanto rurais.
Impactam economicamente as sociedades e afetam o padrão de vida das
pessoas e de suas famílias. Para se ter uma dimensão do problema, cerca
de 10% da população adulta sofre de algum transtorno mental ou com-
portamental (WHO, 2002a).
Segundo a OMS (WHO, 2002b), aproximadamente 1 em cada
5 doentes atendidos por profissionais de saúde apresentam um ou mais
transtornos mentais e comportamentais. Isso significa que as famílias po-
derão ter pelo menos um membro com um transtorno mental ou com-
portamental, precisando dar não só apoio físico e emocional, mas tam-
bém suportar o impacto econômico, assim como o peso do estigma e
da discriminação (WHO, 2002b). Até 2020, prevê-se um crescimento
desses transtornos em até 15%, chegando a ocupar a segunda causa de
afastamento do trabalho no mundo. Os transtornos comuns, que geral-
mente causam incapacidade grave, abrangem transtornos depressivos,
transtornos causados pelo uso de substâncias psicoativas, esquizofrenia,
epilepsia, doença de Alzheimer, atraso mental e perturbações da infância
e da adolescência. A prevalência, a manifestação e a progressão destes
problemas estão associadas ao nível econômico-social, gênero, idade,
conflitos e catástrofes, graves doenças físicas e o ambiente familiar e so-
cial (WHO, 2002a).

FATORES
PSICOSSOCIAIS 267
De acordo com a OIT, e como dito no início deste capítulo, o es-
tresse ocupa a segunda posição entre os problemas de saúde relacionados
ao trabalho, afetando cerca de 40 milhões de pessoas. Ainda de acordo
com a organização, entre 50 e 60% de todos os dias de trabalho perdidos
no continente estariam ligados a esta condição. No Brasil, os transtornos
mentais e comportamentais foram a terceira causa de incapacidade para
o trabalho, considerando a concessão de auxílio-doença e aposentadoria
por invalidez, no período de 2012 a 2016 (Sistema Único de Benefícios
– SUB).
O impacto do estresse pode variar de acordo com a resposta indi-
vidual, no entanto, é preciso atentar para o fato de que níveis elevados
de estresse podem contribuir para o desenvolvimento de deficiências re-
lacionadas à saúde (tais como doenças cardiovasculares, distúrbios mus-
culoesqueléticos, burnout, depressão, ansiedade e suicídio) e comporta-
mentos de coping (enfrentamento) danosos à saúde (tais como abuso de
álcool e drogas, maior uso de tabaco, dieta insalubre, insuficiente ativi-
dade física e distúrbios do sono).
A OMS (WHO, 2002a) trata o estresse como um problema de
saúde pública reconhecido como uma questão global que afeta todas
as profissões e todos os trabalhadores, tanto nos países desenvolvidos
quanto nos países em desenvolvimento. Em função deste quadro, no
ano de 2016 a OMS lançou como tema da campanha do Dia Mundial
da Segurança e Saúde no Trabalho, celebrado dia 28 de abril: “Estresse
no trabalho: um desafio coletivo”. O relatório chama a atenção para as
tendências globais atuais sobre o estresse relacionado com o trabalho e
seus impactos, visando aumentar a sensibilização para a magnitude do
problema no novo contexto do mundo do trabalho (ILO, 2016).
Em levantamento realizado pela OMS, identificou-se que o estres-
se ocupacional é determinado pela organização, pelo design e pelas rela-
ções de trabalho e ocorre quando as demandas do trabalho não estão em
acordo ou excedem as capacidades, recursos ou necessidades do indiví-
duo de lidar com elas. Ou, ainda, quando o conhecimento ou as habili-

268 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


dades de uma pessoa, ou de um grupo, para dar conta dessas demandas
não são compatíveis com as expectativas da cultura organizacional de
uma empresa (ILO, 2016).
No Relatório Mundial da Saúde de 2001 da OMS (OMS, 2001),
“Saúde mental: nova concepção, nova esperança”, a depressão grave era
apontada como a principal causa de incapacitação em todo o mundo,
ocupando o quarto lugar entre as dez principais causas de patologia, a
nível mundial. As projeções em 2001 apontavam para um cenário em
que a depressão, em 2020, alcançasse o posto de segunda das principais
causas de doenças no mundo. Outro dado alarmante do mesmo relatório
diz respeito à dependência do álcool, chegando a afetar 70 milhões de
pessoas em todo o mundo. Adicionalmente, a mesma pesquisa indicava
que, aproximadamente, 50 milhões sofrem de epilepsia, 24 milhões de
esquizofrenia; entre 10 e 20 milhões tentam suicidar-se e um milhão de
pessoas cometem suicídio anualmente.
A Comissão Europeia (2010) identificou que, dentre os proble-
mas de saúde relacionados com o trabalho, os trabalhadores referiram
o “estresse, depressão ou ansiedade” como fatores mais graves (referido
14% dos inquiridos). Já o 5º Inquérito Europeu sobre as Condições de
Trabalho, apontou que quase metade dos trabalhadores (45%) relatou
que, durante os últimos três anos, tinham vivenciado alguma mudan-
ça organizacional que havia afetado o seu ambiente de trabalho, e 6%
mencionaram trabalhar com prazos apertados (EUROFOUND, 2012).
Interessante que as diretorias e gestores estão cientes deste problema,
conforme identificado no Inquérito Europeu às Empresas sobre Riscos
Novos e Emergentes - ESENER (EU-OSHA, 2010a), que aponta uma
preocupação de quase 80% dos quadros dirigentes europeus com o estres-
se nos seus locais de trabalho. Embora os dados apontem preocupação,
mais de 70% das organizações na Europa não dispõem de procedimentos
para identificar e gerir o estresse ocupacional, o assédio e a violência de
terceiros no local de trabalho. Esse mesmo relatório (ESENER) identi-
ficou que mais de 40% dos gestores europeus consideram que os riscos

FATORES
PSICOSSOCIAIS 269
psicossociais são mais complexos de gerir do que os tradicionais riscos de
saúde e segurança no trabalho (EU-OSHA, 2010a).
A EU-OSHA (2014a) ressalta que enfrentar o estresse e os riscos
psicossociais pode custar grandes somas às organizações. No entanto, ig-
norá-los pode resultar em custos ainda maiores, afetando o desempenho
e levando ao presenteísmo e absenteísmo. Ainda, enfrentar longos perí-
odos de estresse pode desencadear sérios problemas de saúde, tais como
doenças cardiovasculares ou musculoesqueléticas, aumentando ainda
mais os custos incorridos. Vale ressaltar que há custos para os indivíduos
(deficiência de saúde, menor renda e qualidade de vida reduzida), para
as organizações (absenteísmo, presenteísmo, produtividade reduzida, ou
alto turnover de pessoal) e para a sociedade (custos com despesas mé-
dicas, seguridade social, as baixas por doença, perda de produtividade
devido à morte prematura, perda de anos de vida em relação à esperança
de vida e efeitos na economia).
Os custos diretos e indiretos apenas começam a ser quantificados.
Ainda assim, alguns países desenvolvidos avaliam o impacto econômico
do estresse ocupacional, padrões comportamentais associados e distúr-
bios de saúde mental. Por exemplo, na Europa, em 2002, o custo estima-
do do estresse ocupacional ultrapassava a marca de 20 milhões de euros
por ano. Já os custos na Europa com depressão relacionada com o tra-
balho, segundo a Executive Agency for Health and Consumers (MATRIX,
2013), era de 617 milhões de euros por ano (dados de 2013), o que inclui
os custos para os empregadores de absenteísmo e presenteísmo (272 mi-
lhões de euros), perda de produtividade (242 milhões de euros), custos
com assistência médica (63 bilhões de euros) e os custos do bem-estar
social sob a forma de pagamentos de benefícios por invalidez (39 milhões
de euros).
No Brasil, o Anuário Estatístico da Previdência Social - AEPS
(PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2015) divulgou dados sobre auxílios-do-
ença urbanos ativos no Brasil em 2015 de acordo com a Classificação
Internacional de Doenças (CID-9 e CID-10). Quando codificados com

270 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


base no CID-9, os transtornos mentais despontavam como a primeira
causa. Quanto à quantidade e valor de auxílios-doença urbanos ativos,
por sexo do segurado, segundo os capítulos da CID, posição de dezembro,
os dados extraídos do AEPS de 2015 do site do Ministério do Trabalho e
Previdência Social (MTPS) indicam 835 auxílios pela CID-9, totalizan-
do R$ 762.000 (vide Tabela 1).
Já de acordo com o CID-10, os transtornos mentais aparecem como
a terceira causa entre os auxílios-doença urbanos ativos no Brasil em
2015. Quanto à quantidade e valor de auxílios-doença urbanos ativos,
por sexo do segurado, segundo os capítulos da CID, posição de dezembro,
os dados extraídos do AEPS de 2015 do site do MTPS indicam 1.032.959
auxílios pela CID-10, correspondendo R$ 1.267.595.000 (vide Tabela 2).

Quantidade de auxílio-doença urbano ativos-codificados com base na CID-9


1º V – Transtornos mentais e comportamentais 24%
2º XIII – Doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo 19%
3º VII – Doenças do aparelho circulatório 17%
4º VI – Doenças do sistema nervoso 10%
5º XVII – Lesões e envenenamento 10%

Tabela 1 Auxílios-doença concedidos em 2015 por CID 9


Fonte: AEPS (PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2015)

Quantidade de auxílio-doença urbano ativos-codificados com base na CID-9


1º XIII – Doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo 30%
2º XVII – Lesões e envenenamento 19%
3º V – Transtornos mentais e comportamentais 14%
4º VII – Doenças do aparelho circulatório 10%
5º II – Neoplasias 8%
6º VI – Doenças do sistema nervoso 4%

Tabela 2 Dados extraídos do AEPS 2015 do site do MTPS


Fonte: AEPS (PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2015)

FATORES
PSICOSSOCIAIS 271
Como pode se observar na Tabela 3, se comparado ao custo mé-
dio anual de afastamento por transtornos mentais e comportamentais de
2013, o aumento em termos de quantidade foi de 1,22% (de 2013 para
2014), já em relação a valores a diferença foi de 6,84% em (2014) a mais
do que no ano anterior (2013). Em 2015 houve diminuição de 3,95%
da quantidade de auxílios-doença urbanos com relação a 2104, porém o
valor aumentou 2,36%.
É preciso lembrar que esta realidade pode mudar dentro de alguns
anos, pois cada vez são maiores as estatísticas acerca dos transtornos
mentais e comportamentais relacionados ao trabalho, e mesmo os que
não têm relação direta, acabam por interferir direta ou indiretamente no
trabalho, como nos casos de absenteísmo e afastamentos. Sabe-se que os
transtornos mentais e comportamentais ocupam a terceira posição entre
os adoecimentos que mais afastam (MENDES; GHIZONI; ARAÚJO,

QUANTIDADE VALOR (R$ Mil)


Capítulos da CID Anos Total Masculino Feminino Total Masculino Feminino
V – Transtornos 2013 232 106 126 185 88 97
Mentais (CID-9) 2014 218 103 115 184 91 93
2015 201 91 110 183 88 95
V – Transtornos 2013 147.582 70.110 77.742 172.190 90.633 81.557
Mentais e Comporta- 2014 149.400 62.296 80.104 183.978 94.529 89.449
mentais (CID-10)
2015 143.513 65.214 78.299 188.327 95.031 93.296
Somatório CID-9 e 2013 147.814 70.216 77,598 172.375 90.721 81.654
CID-10 2014 149.618 69.399 80.219 184.162 94.620 89.542
2015 143.714 65.305 78.409 188.510 95.119 93.391
Percentual (%) 2013/2014 1,22% -1,16% 3,38% 6,84% 4,30% 9,66%
em relação ao ano
anterior 2014/2015 -3,95% -5,9% -2,25% 2,36% 0,52% 4,29%

Tabela 3 Quantidade e valores de auxílios-doença urbanos ativos (CID-9 e CID-10


somados)
Fonte: AEPS (PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2015)

272 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


2011; SILVA; BARRETO, 2012), no entanto, esse número pode estar
subestimado, visto que ainda há dificuldade por parte dos médicos do
trabalho de notificação adequada, assim como, o nível de estigma ainda
é muito elevado, aspectos que interferem no diagnóstico e, consequen-
temente, na correta contabilização dos custos. Dentre as notificações já
realizadas, os “episódios depressivos” ocupam o primeiro lugar dentre os
afastamentos motivados por transtornos mentais e comportamentais. Em
segundo lugar aparecem os “outros transtornos ansiosos” e, em terceiro
lugar, os “transtornos depressivos recorrentes”.

Principais causas de afastamento acima de 15 dias no Brasil


Lesões e traumatismos 62,33%
Doenças osteomusculares 26,34%
Transtornos mentais e comportamentais 3,88%

Tabela 4 Principais causas de afastamento acima de 15 dias no Brasil


Fonte: MPS/INSS (MENDES; GHIZONI; ARAÚJO, 2011)

Neste contexto complexo, o local de trabalho é ao mesmo tempo


uma fonte importante de riscos psicossociais e o local ideal para abordá-
-los com intuito de proteger a saúde e o bem-estar dos trabalhadores
através de medidas coletivas. Sem um bom nível de saúde no trabalho, o
indivíduo não pode contribuir para a sociedade e tampouco alcançar seu
próprio bem-estar. Se a saúde no trabalho é ameaçada, não há base para
emprego produtivo e desenvolvimento sócio econômico. Uma organiza-
ção saudável é aquela que valoriza e pratica a facilitação do bem-estar e
da saúde do trabalhador assim como a melhoria do desempenho e pro-
dutividade organizacional. Partindo desta compreensão, a próxima seção
tratará de discorrer sobre possibilidades de intervenção.

FATORES
PSICOSSOCIAIS 273
Necessidades futuras em gestão de
fatores psicossociais: conceito e
tendências

Os contextos de trabalho podem atuar como fonte de saúde ou de


adoecimento tanto no que diz respeito à saúde em geral quanto à saúde
mental. O trabalho pode, por um lado, fortalecer a saúde mental ou, por
outro, pode vulnerabilizá-la e mesmo gerar distúrbios que se expressam
coletivamente ou individualmente (SELIGMANN-SILVA, 2011).
Uma perspectiva de mudança desse quadro se dá quando áreas de
conhecimentos diferentes convergem seus estudos para focar a atenção
no processo saúde-doença no trabalho de maneira multidisciplinar, abran-
gendo não só áreas clássicas como a Medicina do Trabalho, Psicologia
do Trabalho, Psicopatologia do Trabalho, Toxicologia e Ergonomia, mas
áreas advindas do campo das Ciências Humanas e Sociais. Essas discipli-
nas estudam as determinações sócio-históricas, políticas, econômicas e
culturais que se refletem nos processos e situações humanas de trabalho
no interior das empresas. Tal aspecto se faz importante lembrar quando o
assunto diz respeito aos riscos e acidentes de trabalho. Vale destacar que
ainda há a prevalência de ações focadas no trabalhador, individualmen-
te, dando pouca atenção para os aspectos coletivos e organizacionais.
Várias organizações internacionais, instituições regionais e autori-
dades nacionais atuam na prevenção e gestão de riscos psicossociais, na
promoção da saúde mental no trabalho através da pesquisa, defesa de
direitos e implementação de iniciativas específicas. Em diversos países,
as auditorias legais do trabalho desenvolveram orientações para ajudar
os auditores na avaliação das medidas de gestão de riscos psicossociais
adotadas pelo empregador durante a sua visita ao local de trabalho (ILO,
2016).
Exemplos de iniciativas implementadas, a nível nacional pelos mi-
nistérios do trabalho e outras autoridades de SST, instituições de seguri-

274 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


dade social, institutos de investigação, parceiros sociais e associações de
profissionais, são:
a. inclusão de riscos psicossociais nas estratégias e políticas na-
cionais de SST ou adoção de estratégias nacionais específicas
sobre saúde mental;
b. organização de campanhas de sensibilização sobre estresse e
saúde mental no trabalho;
c. desenvolvimento de pesquisas sobre riscos psicossociais e es-
tresse relacionado ao trabalho;
d. elaboração e publicação de diretrizes e protocolos para a pre-
venção e gestão de riscos psicossociais e estresse relacionado
ao trabalho;
e. criação de ferramentas específicas de avaliação e gestão e inter-
venção do risco (ILO, 2016, OMS, 2001; EU-OSHA, 2013).
Segundo o ESENER (EU-OSHA, 2010), as medidas de gestão de
SST e de Gestão de Riscos Psicossociais possuem maior probabilidade de
eficácia nos locais de trabalho em que existe representação dos traba-
lhadores e, em particular, onde essa representação é combinada com um
alto grau de comprometimento da direção para com a segurança e saúde.
O mesmo inquérito aponta que um número considerável de pesquisas
científicas indica a utilização do modelo de gestão de riscos (vide Figura
3) para gerir eficazmente os riscos psicossociais. No entanto, ainda se faz
necessária uma melhor compreensão do conceito de riscos psicossociais
e riscos conexos para avaliá-los e reduzi-los eficazmente.
Embora não livre de dificuldades na implementação do modelo de
gestão dos riscos psicossociais, esta proposta parece possibilitar melhores
resultados do que intervenções laborais mais restritas e outras ferramen-
tas, como por exemplo, os de avaliação de estresse.
O relatório da OIT (ILO, 2016) destaca que as abordagens coleti-
vas para prevenir e controlar os riscos psicossociais relacionados com o
trabalho devem ser priorizadas, focando desde a implementação de me-
didas coletivas de avaliação e gestão do risco para os riscos psicossociais,

FATORES
PSICOSSOCIAIS 275
276
Gestão de Programas de Qualidade de Vida
Figura 3 Um modelo para a gestão de riscos psicossociais
Fonte: adaptado de COX (2000)
tal como já é realizado com outros riscos no local de trabalho; passando
pela adoção de medidas de prevenção e controle coletivas e individuais
com envolvimento dos trabalhadores e seus representantes na sua imple-
mentação (vide Tabela 5).
Adicionalmente, ressalta-se que é importante melhorar a capa-
cidade de enfrentamento dos trabalhadores, aumentando seu controle

Tabela 5 Medidas coletivas para prevenir o estresse relacionado ao trabalho


Fonte: ILO (2012)

MEDIDAS COLETIVAS PARA PREVENIR O ESTRESSE RELACIONADO AO TRABALHO


Controle Garantir a quantidade adequada de pessoal;
Permitir que os trabalhadores opinem sobre como realizar seu trabalho
Carga de Avaliar regularmente os prazos de tempo e delimitar datas limites razoáveis;
trabalho Garantir que as horas de trabalho sejam previsíveis e razoáveis
Apoio social Permitir o contato social entre os superiores e os trabalhadores;
Manter um lugar de trabalho livre de violência física e psicológica;
Garantir que existam relações de apoio entre os superiores e os trabalhadores;
Oferecer uma infraestrutura organizacional em que o pessoal de supervisão assu-
ma responsabilidade sobre os demais trabalhadores e exista um nível adequado
de contato;
Convidar os trabalhadores para discutir qualquer conflito entre as exigências do
trabalho e da família;
Reforçar a motivação destacando os aspectos positivos e úteis do trabalho.
Adaptando o Garantir que o trabalhador corresponda com as atitudes físicas e psicológicas do
trabalho e o trabalhador;
trabalhador Garantir que haja utilização adequada de competências.
Formação e Proporcionar a formação adequada para garantir a adequação entre as capacida-
educação des do trabalhador e do trabalho;
Fornecer informação sobre os riscos psicossociais e o estresse relacionado com o
trabalho e sobre como os prevenir
Transparência Garantir que as tarefas sejam claramente definidas;
e justiça Atribuir funções claras, evitando conflitos e ambiguidades entre estes;
Oferecer segurança no emprego, dentro do possível;
Fornecer uma retribuição adequada pelo trabalho desempenhado;
Garantir transparência e equidade nos procedimentos para atender e tratar as
reclamações.

FATORES
PSICOSSOCIAIS 277
sobre suas tarefas; melhorar a comunicação organizacional; permitir a
participação dos trabalhadores na tomada de decisões; construir sistemas
de apoio social para os trabalhadores no local de trabalho; considerar as
inter-relações entre as condições de trabalho e de vida privada; avaliar
as necessidades da organização, levando em consideração as interações
organização/indivíduo e indivíduo/organização ao avaliar os requisitos de
saúde dos trabalhadores. A OMS recomenda a inclusão de uma combi-
nação de gestão do risco psicossocial e promoção da saúde para que se
alcance uma eficaz promoção da saúde mental. Esse patamar é alcançado
à medida que é proporcionado apoio social, sentimento de inclusão e de
realização de um trabalho com significado, encontrar sentido no trabalho
realizado, ter condições para tomar decisões no trabalho e ter condições
para organizar o trabalho de acordo com o seu próprio ritmo, para citar
alguns.
Um exemplo de modelo de gestão de riscos psicossociais que leva
em conta esses fatores é o Modelo europeu para gestão de riscos psi-
cossociais – PRIMA-EF (Psychosocial Risk Management Excellence
Framework). Este modelo, no nível empresarial, apresenta os aspectos-
-chave e as etapas na gestão de riscos psicossociais no trabalho, forne-
cendo uma base para a elaboração de políticas relevantes, indicadores e
planos de ação focados na prevenção e na gestão de riscos psicossociais
que incluem o estresse ocupacional, a violência, o bullying e o assédio
moral e sexual no local trabalho (WHO, 2008). A aplicação do PRIMA-
EF às empresas segue o exposto na figura 4. No modelo proposto são
incorporados cinco elementos importantes:
i. Foco explícito em uma determinada população de trabalhado-
res (grupo, local de trabalho ou conjunto de operações);
ii. Avaliação de riscos para se obter um panorama que possibi-
lite a compreensão da natureza do problema e de suas causas
subjacentes;
iii. Concepção e implementação de ações dedicadas a extinguir
ou diminuir os riscos;

278 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


FATORES
PSICOSSOCIAIS
Figura 4 Modelo PRIMA-EF: Nível das empresas
Fonte: PRIMA-EF (2008)

279
iv. Avaliação das ações implementadas e lições aprendidas;
v. Gestão ativa e atenta do processo.

Em se tratando de tendências para a área, a recente publicação


da OIT, “Estresse no trabalho: um desafio coletivo” (ILO, 2016) chama
atenção para pontos que merecem um estudo aprofundado:
a. embora haja identificação de situações de trabalho semelhan-
tes nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, as aborda-
gens para lidar com elas são diferentes;
b. existência de políticas e legislação fragmentadas, focando os
comportamentos de enfrentamento e consequências para a
saúde, embora o desenvolvimento da legislação específica re-
lacionada tenha aumentado nos últimos anos em vários países;
c. nos países em desenvolvimento, há insuficiência de dados
nacionais sobre a magnitude do problema. As preocupações
recaem sobre o fato de que tais dados poderiam influenciar
políticas públicas. Adicionalmente, os dados globais não estão
disponíveis e os poucos dados regionais que estão disponíveis,
não são comparáveis;
d. há um maior interesse no estresse relacionado ao trabalho nos
países em desenvolvimento, particularmente na pesquisa e na
intervenção no local de trabalho;
e. percebe-se confusão entre os termos “estresse” e “risco psicos-
social” em alguns países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Estresse relacionado ao trabalho é, muitas vezes, considerado
como um distúrbio ou doença e não como o primeiro sinal de
um problema;
f. identificação de abordagem abrangente para a prevenção de
riscos psicossociais, no entanto, a conscientização sobre seu
impacto na saúde dos trabalhadores ainda não é generalizada e
adequadamente abordada no local de trabalho.

280 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


Tais orientações, se levadas em conta pelas organizações, podem
propiciar um salto em termos de gestão, aprendizagem e desenvolvimen-
to organizacional, responsabilidade social e promoção da qualidade de
vida no trabalho. É possível identificar a existência de ferramentas para
cada um dos níveis de intervenção, assim como um número grande de
instrumentos para se realizar diagnóstico dos fatores psicossociais. Para
intervenções de primeiro nível, as abordagens coletivas e em nível or-
ganizacional são as mais recomendáveis, por seus efeitos positivos e que
favorecem um maior número de trabalhadores. Sobre estas, é importante
também incluir a elaboração de um inventário de opções que já foram
aplicadas e avaliadas, bem como a geração de novas intervenções com
base em resultados de pesquisa.
Vale destacar que várias estratégias conjuntas desde as diversas
perspectivas envolvidas (saúde pública, saúde ocupacional, desenvolvi-
mento organizacional) são desejáveis para o avanço de uma eficaz ges-
tão desses fatores e, consequentemente, da saúde dos trabalhadores e do
desempenho organizacional. Os avanços neste campo (dos fatores psi-
cossociais relacionados ao trabalho) passam pelo entendimento da pro-
blemática que se pretende enfrentar (considerando as necessidades das
organizações produtivas, a saúde dos trabalhadores e as possibilidades
de ação, recursos e políticas financeiras, entre outros); pelo desenho de
um plano de ação; pela utilização, adaptação e / ou desenvolvimento de
instrumentos específicos consistentes com o plano desenvolvido e, por
fim, pelo monitoramento e reavaliação dos planos implementados, le-
vando em conta as lições aprendidas em cada ciclo finalizado. O alcance
de resultados satisfatórios em termos de gestão de riscos psicossociais e/
ou de fatores psicossociais passa por uma gestão organizacional eficaz e
sistemática.

FATORES
PSICOSSOCIAIS 281
CONSIDER AÇÕES FINAIS

O adoecimento mental tem um impacto importante no bem-estar


das pessoas, pois reduz as perspectivas de emprego e salário, tendo um
efeito prejudicial sobre o rendimento das famílias e da produtividade das
empresas, com altos custos diretos e indiretos para a economia. Em fun-
ção disso, percebe-se um aumento da atenção de pesquisadores e formu-
ladores de políticas sobre os efeitos dos riscos psicossociais.
A prática de SST avançou para além do seu âmbito tradicional
(ligado aos riscos físicos, químicos, biológicos e mecânicos) e passou a in-
corporar uma perspectiva de Medicina do Trabalho mais ampla, com con-
tribuições advindas da Psicologia do Trabalho e da Saúde do Trabalhador,
reconhecendo assim, a importância das pessoas levarem uma vida laboral
mais saudável como fator competitivo para as empresas.
Conforme abordado neste texto, já há uma gestão sistemática do
risco psicossocial em muitas organizações, mas a prevalência desta abor-
dagem, bem como a sua extensão e profundidade varia significativamen-
te de país para país. Existe agora um bom esboço da temática que possi-
bilita alicerçar os avanços de atuação em gestão de fatores psicossociais
de acordo com as necessidades e possibilidades nacionais. Resta investir
em ações e programas de saúde e segurança no trabalho que deem conta
de considerar todos os elementos em sua relação com os fatores psicosso-
ciais, ou seja, atentar para o fato de que a gestão dos riscos psicossociais
relacionados ao trabalho se faz instrumento diferencial de competitivida-
de para a indústria.

282 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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284 Gestão de Programas de Qualidade de Vida


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FATORES
PSICOSSOCIAIS 285
Expediente

SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA - SESI

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - CNI IEL - Núcleo Central


Robson Braga de Andrade Paulo Afonso Ferreira
Presidente Diretor-Geral

Diretoria de Educação e Tecnologia - DIRET Paulo Mól Júnior


Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti Superintendente
Diretor de Educação e Tecnologia
Unidade de Saúde e Segurança na Indústria - USSI
Serviço Social da Indústria - SESI Emmanuel de Souza Lacerda
João Henrique de Almeida Souza Gerente-Executivo de Saúde e Segurança na Indústria
Presidente do Conselho Nacional
Gerência de Promoção de Saúde
SESI - Departamento Nacional Antonio Eduardo Muzzi Machado
Robson Braga de Andrade Gerente de Promoção de Saúde
Diretor
Augusto Luís Nicézio Borges
Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti Fabio Henrique Cordeiro
Diretor-Superintendente
Georgia Antony Gomes de Matos
Gina Marini Vieira Ferreira
Marcos Tadeu de Siqueira
Diretor de Operações Luciana Merces de Lucena
Thiago Yhudi Taho
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial Viviane Coelho Lourenço
- SENAI Viviane Pereira Macedo
Robson Braga de Andrade Equipe Técnica
Presidente do Conselho Nacional
DIRETORIA DE SERVIÇOS CORPORATIVOS - DSC
SENAI - Departamento Nacional Fernando Augusto Trivellato
Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti Diretor de Serviços Corporativos
Diretor Geral
Área de Administração, Documentação e
Julio Sergio de Maya Pedrosa Moreira Informação - ADINF
Diretor-Adjunto Maurício Vasconcelos de Carvalho
Gerente-Executivo de Administração, Documentação e
Gustavo Leal Sales Filho Informação
Diretor de Operações
Alberto Nemoto Yamaguti
Instituto Euvaldo Lodi - IEL Normalização
Robson Braga de Andrade
Presidente do Conselho Superior

Expediente 287
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE QUALIDADE DE VIDA - ABQV
Presidente
Eloir Edilson Simm

Vice-Presidente
Sâmia Aguiar Brandão Simurro

Diretores de Eventos
Cecilia Cibella Shibuya
Silvia Teresa da Silva Santos Marchetti

Diretoria Técnica
Alberto José Niituma Ogata

Diretoria Administrativo-Financeira
Leandro Buso

Diretoria de Relacionamento e Comunicação


Ercy Aparecida Paschoal

Equipe Técnica
Cleber Gonçalves Pereira Dutra
Evelyn Muniz Amaral

288 Gestão de Programas de Qualidade de Vida

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