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resistência escolar
Coordenação da coleção
Leituras sobre educação:
Celia Giglio e Melvina Araújo
conselho editorial
Ana Paula Torres Megiani
Eunice Ostrensky
Haroldo Ceravolo Sereza
Joana Monteleone
Maria Luiza Ferreira de Oliveira
Ruy Braga
Educação e
resistência escolar
Daniela Finco
Adalberto dos Santos Souza
Nara Rejane Cruz de Oliveira
(organizadores)
Copyright © 2017 Daniela Finco/ Adalberto dos Santos Souza/ Nara
Rejane Cruz de Oliveira
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
E26
Formato: ebook
Requisitos do sistema:
Modo de acesso: world wide web
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7939-484-3 (recurso eletrônico)
Daniela Finco
Adalberto dos Santos Souza
Nara Rejane Cruz de Oliveira
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Educação e resistência escolar 15
ser alvo não apenas da discriminação sexista, mas também poderá so-
frer com as consequências sobrepostas da lesbofobia,4 do racismo, do
regionalismo e do classismo. Elas se igualam enquanto mulheres, mas
se diferenciam enquanto outras categorias socialmente marcadas. Da
mesma maneira, dois homens gays podem experimentar discrimina-
ções diversas se um deles for “afeminado” e o outro não – inclusive por
parte de outros gays que sejam misóginos e valorizem o padrão vigente
de masculinidade. Ou ainda uma jovem afrodescendente que mante-
nha os cabelos crespos poderá ter maior dificuldade de se inserir num
mercado de trabalho que valoriza a cor branca e os cabelos lisos como
padrão de beleza e “boa aparência” femininas. Portanto, a interseccio-
nalidade e articulação5 dos marcadores sociais da diferença impressos
nos vários sujeitos e grupos sociais permite produzir maior diversidade
através de processos de diferenciação e, consequentemente, diversificar
os tratamentos desiguais e as formas de discriminação que incidem so-
bre esses sujeitos e grupos.
É comum culpabilizarmos as pessoas discriminadas pela própria
discriminação e situação de desigualdade – e até mesmo violência –
às quais estão submetidas. Os exemplos são numerosos, cotidianos e
conhecidos por todas/os nós: garotas que alegadamente foram estupra-
Cultura e diversidade
Embora já criticada por autores como Adam Kuper e Roy Wag-
ner, a noção de cultura ainda é uma das chaves para compreender-
mos o fenômeno da diversidade humana e da existência de tantas e
diferentes formas de pensamento, expressão e organização da vida
coletiva de grupos sociais, que variam no tempo e no espaço. Como
conceito da Antropologia e das Ciências Humanas e Sociais, a noção
de cultura se consolidou no princípio do século XX, num momento
Educação e resistência escolar 23
fins do século XIX, que pressupunha que era possível acelerar a evolução
humana através de intervenções e controles científicos sobre os corpos,
selecionando características tidas como positivas e superiores, e elimina-
do características tidas como negativas e inferiores. O objetivo era chegar
rapidamente ao que se supunha ser o ápice da evolução da espécie, apli-
cando estratégias de seleção social que seriam mais rápidas e eficazes que a
seleção natural. As teorias eugênicas tiveram grande impacto nas políticas
nacionalistas até meados do século XX, e deram fundamento tanto às polí-
ticas nazistas na Alemanha, quanto às políticas socialistas na União Sovié-
tica e liberais nos EUA. No Brasil também tivemos propostas não concreti-
zadas de implantação de políticas eugenistas após o advento da República,
quando o controle da população, da miscigenação racial e da imigração era
visto como necessário dentro do projeto de construção da nação. Sobre o
impacto das teorias eugenistas nas políticas de Estado na Europa e EUA,
há o documentário Homo Sapiens 1900, de Peter Cohen (1998). Sobre o
debate e influências eugenistas no Brasil e no mundo, temos as obras de
Lilia Schwarcz (1993) e Pietra Diwan (2007).
Educação e resistência escolar 25
A diversidade cultural
Como já apontado nas discussões anteriores, a diversidade cultu-
ral é um fenômeno que caracteriza a experiência humana em todas
as partes do mundo. Se a cultura é um fenômeno determinado pela
capacidade que temos de produzir e atribuir significados diversos às
nossas ações e experiências através do tempo e do espaço, parece claro
que a diversidade de culturas que a humanidade produziu e produz é
uma consequência lógica dessa nossa condição e capacidade de pro-
duzirmos diferenças. Também como já apontado anteriormente, essa
diversidade não diz respeito apenas às diferenças entre povos distintos,
mas está também presente em contextos complexos e multiculturais,
nos quais diferentes referenciais culturais convivem e interagem, mar-
cando diferenças internas entre grupos e segmentos que compõem es-
ses contextos. Esse é o caso do Brasil.
Como também já foi apontado, nem sempre essas diferenças cul-
turais são valorizadas e respeitadas, o que gera conflitos e situações
de discriminação, e impõe o desafio de lidarmos com a diversidade
cultural de forma positiva e inclusiva. Esse desafio é cotidianamente
enfrentado por educadoras e educadores nas nossas escolas, e impõe a
reflexão e a elaboração de formas de atuação promovam o respeito e o
reconhecimento das diferenças dentro dos nossos ambientes escolares.
Contextos muitas vezes tomados como culturalmente homogêne-
os apresentam diferenças internas que são significativas para seus sujei-
tos, e que devem ser reconhecidas por nós. Esse é caso de continentes
como a Europa e a África, por exemplo, que tomamos muitas vezes
como unidades culturalmente homogêneas, mas que são compostos
por nações e grupos culturalmente bastante diversos entre si, que se
reconhecem e demandam serem reconhecidos enquanto tais. Quando
nos referimos a esses povos como simplesmente “europeus” e “africa-
nos”, corremos o risco de invisibilizar e desconsiderar importantes dife-
Educação e resistência escolar 29
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Educação e resistência escolar 47
Cláudia Vianna
Fernando Birri
8 Tal análise teve como ponto de partida o Informe Brasil – Gênero e Educa-
ção, produzido no marco da Campanha Educação Não Sexista e Antidiscri-
minatória pela Organização Ação Educativa, com a colaboração da ecos –
Comunicação em Sexualidade, do cnrv – Centro de Referência às Vítimas
de Violência do Instituto Sedes Sapientiae e da Relatoria Nacional para o
Direito Humano à Educação da Plataforma dhesca Brasil, em 2011. Em
2013 o Informe foi atualizado a partir dos dados da pnad de 2011 e do Censo
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Educação e resistência escolar 65
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Educação e resistência escolar 69
Eduardo H. Galeano
Portanto não se trata de não falar sobre sexo, porém sobre o que
e como falar. Assim, a sexualidade está na grade curricular vinculada
à disciplina de biologia e é abordada não pelos prazeres e desejos, mas
somente em seu aspecto reprodutivo (quando não das doenças trans-
missíveis sexualmente) e, desta forma, apresenta o padrão “normal”, o
sexo entre pessoas heterossexuais, pois como a relação sexual entre pes-
soas do mesmo sexo não há reprodução,2 logo não pode ser “natural”,
além, claro, de somente se expressar com termos científicos – e exigir
o mesmo das/dos estudantes.
A partir desse preâmbulo, no qual se procurou mostrar que as di-
ferenças sociais baseadas nas diferenças sexuais são fruto da construção
social de toda e qualquer sociedade, podemos agora tratar das relações
sociais de gênero. Tal conceito foi construído a partir dos estudos teóricos
feministas e dos estudos sobre as mulheres pelas ciências sociais com o
objetivo de se opor às explicações que relacionavam as diferenças físicas
e biológicas ligadas ao sexo que serviam – e ainda são utilizadas, vale
lembrar – para justificar as diferentes hierarquizações de poder e direi-
tos entre os sexos – classificando as pessoas a partir de sua apresentação
corporal. Dessa forma, gênero é uma categoria relacional e, embora essa
seja uma construção contemporânea, organismos internacionais, como
a Organizações das Nações Unidas (ONU) e suas agências, continuam a
relacionar o termo gênero como sinônimo de mulheres, em decorrência
da história do movimento feminista. A conhecida “primeira onda” do
feminismo, remonta ao século XIX, principalmente na Europa e nos
2 Para fins didáticos e como muitas vezes é ensinado na escola, aqui se está
referindo somente à reprodução/fecundação por meio de intercurso se-
xual, descartando a possibilidade de intercurso entre homem transexual e
mulher transexual que não tenham feito cirurgia de redesignação sexual.
Educação e resistência escolar 77
Tabela adaptada das tabelas 2.3; 2.9; 2.13; 2.18; 2.22; 2.26; 2.30; 2.35;
2.40; 2.46; 2.52 da Sinopse Estatística da Educação Básica anos 2013,
2014 e 2015, disponível em http://portal.inep.gov.br/basica-censo-esco-
lar-sinopse-sinopse
Reverberações na sociedade
Nas seções anteriores se apresentou como aqui são compreen-
didas as relações sociais de gênero e alguns exemplos de como estas
relações reverberam na escola, tanto entre estudantes como entre do-
centes, e que, portanto, por mais que setores conservadores insistam
que o “gênero” não pode ser abordado na escola, ele está presente co-
tidianamente porque faz parte das nossas próprias relações sociais. Por
meio delas, aprendemos representações sociais baseadas nas diferenças
entre os sexos biológicos em “doses homeopáticas”, diuturnamente por
meio de permissões e interdições, nas socializações nas quais todos nós
somos envolvidos desde a mais tenra idade, e que criam disposições,
modos de agir e pensar que reproduzimos “sem pensar”, na maioria
das vezes, com tal naturalidade a ponto de ser entendida como consti-
tutiva do próprio sujeito.
Como exemplo das reverberações na sociedade, pode-se elencar
que as mulheres recebem, em média, 74,5% do rendimento de tra-
balho dos homens (pnad, 2015), ou quando jovens são agredidos na
rua por serem homossexuais – como demonstram algumas notícias de
jornais11 –, ou quando mulheres lésbicas, bissexuais e transexuais so-
cia/2011/07/nao-pode-nem-abracar-o-filho-diz-homem-que-teve-orelha-
-cortada.html; http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/jovem-filho-de-
-casal-gay-e-espancado-ate-morrer-em-sao-paulo,4c4d6a4f0d40c410Vgn-
CLD200000b2bf46d0RCRD.html; http://noticias.r7.com/cidades/fotos/
crueldade-tio-e-suspeito-de-matar-adolescente-a-paulada-e-pedradas-por-
-ser-homossexual-15062015#!/foto/1, por exemplo.
12 http://agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/reportagem-especial-mos-
tra-o-crescimento-do-estupro-corretivo/
13 Resultados disponíveis no sítio eletrônico: http://thinkolga.
com/2013/09/09/chega-de-fiu-fiu-resultado-da-pesquisa/. Último acesso
em 05/02/2017)
Educação e resistência escolar 97
que você fez pra provocar o homem, ele não colocou o pau pra
fora à toa”. Depois disso, nunca mais contei nenhum episódio
de assédio, abuso ou qualquer outra coisa pessoal que aconte-
ceu comigo (faria, 2013).
Ecoando
Procurou-se nesse texto contribuir para o debate atual sobre a
pertinência e a presença da temática de gênero na escola, princi-
palmente no seu desdobramento para a sociedade. Como apontado,
tal temática está presente cotidianamente na escola, porque se refe-
re às nossas relações sociais, como somos criados, educados e como
educamos. Dessa forma, ao debater na escola como socialmente são
construídas as feminilidades e masculinidades, está-se procurando a
reflexão sobre a nossa própria sociedade e sua organização. Será que
essa estrutura atual é capaz de garantir uma sociedade na qual os
direitos são assegurados para todas e todos? Será que se está forman-
do pessoas para respeitarem homens e mulheres independentemen-
te de suas orientações sexuais do desejo e identidade de gênero, ou
para manterem a discriminação e opressão? A aptidão para os estudos
estão mesmo vinculados aos cromossomos e hormônios ou há uma
construção social sobre as diferenças sexuais que também têm inci-
dência sobre a escolha e carreira de meninas e meninos? Não se trata,
portanto, de ensinar a ser homossexual ou a por em risco a existência
da família,15 mas refletir se as desigualdades entre direitos sociais e
civis de homens e mulheres podem ser atribuídas somente a partir de
diferenças biológicas e até de quais características biológicas podem
ser elencadas para justificar a desigualdade.
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100 Daniela Finco • Adalberto Souza • Nara Rejane de Oliveira (orgs.)
(...) o sujeito não decide sobre o sexo que irá ou não assumir;
na verdade, as normas regulatórias de uma sociedade abrem
possibilidades que ele assume, apropria e materializa. Ainda
que essas normas reiterem sempre, de forma compulsória, a
heterossexualidade, paradoxalmente, elas também dão espaço
para a produção dos corpos que a elas não se ajustam. Esses se-
rão constituídos como sujeitos “abjetos”- aqueles que escapam
da norma (louro, 2013b, p. 45,46).
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134 Daniela Finco • Adalberto Souza • Nara Rejane de Oliveira (orgs.)
Marcos Internacionais
de Educação em Sexualidade
Entre os Marcos internacionais temos a Conferência Internacio-
nal sobre População e Desenvolvimento (cipd) (Cairo, 1994), IV Con-
ferência Internacional sobre a mulher (Pequim,1995) e os Princípios
de Yogyakarta (2007) destacam-se enquanto Marcos Internacionais de
proteção aos direitos humanos e sexuais.
A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento
(cipd) (Cairo, 1994) conhecida como Conferência do Cairo, que entre
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Educação e resistência escolar 139
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