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GEOLOGIA DE ENGENHARIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
GEOTECNIA/UFOP

FREDERICO GARCIA SOBREIRA

AULA 10 – MACIÇOS ROCHOSOS


INTRODUÇÃO

Maciço rochoso - conjunto de blocos de rocha justapostos e


articulados.

Rocha (matriz do maciço) - rocha intacta


Superfícies que limitam os blocos - descontinuidades

Objetivo - Previsão adequada do comportamento mecânico


dos maciços rochosos em relação às solicitações a que
serão submetidos.

Características de interesse na Engenharia:


- Deformabilidade - Resistência
- Permeabilidade - Estado de tensão natural
CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICA

No estudo de maciços rochosos com fins geotécnicos é


necessário evidenciar os atributos que, isoladamente ou em
conjunto, condicionam o seu comportamento ante as
solicitações impostas.

Classificação Geomecânica – hierarquização das


características em grupos ou classes de forma que se
possa associar os comportamentos diferenciados do meio
rochoso para as solicitações consideradas (tipo de obra).

Nas fases de um projeto de Engenharia as investigações


devem proporcionar dados em níveis progressivos de
detalhamento.
CARACTERIZAÇÃO DA ROCHA INTACTA (MATRIZ)

1) Classificação litológica - Mineralogia, textura e fábrica


dos materiais, além da gênese.

Maciços calcários  Grutas, vazios


Materiais gipsíferos  Solubilidade, expansão
Materiais graníticos  Boa resistência, dificuldade de
escavação

2) Estado de alteração - Determinante da qualidade do


material.

A alteração reduz a resistência, aumenta a


deformabilidade, a porosidade e a permeabilidade.
Classificações baseadas em métodos expeditos de observação
3) Resistência (compressão simples)

A - Resistência
Branda  C  35 Mpa (1 MPa = 10kg/cm2)
Resistente  35  C  137 MPa
Muito resistente C  137 MPa

B - Deformabilidade
Elásticas - Não apresentam fluência a 50% de C
Viscosas - apresentam fluência

C - Ruptura
Frágil - ruptura se dá repentinamente
Plásticas - ruptura por fluxo (25% da deformação é permanente
antes da ruptura).
(Fluência - deformação sob carga constante)
Ensaio de Compressão Simples
Ensaio de Carga Pontual (Point Load Test)
As rochas podem ser classificadas também quanto à
coerência, definida com base em propriedades de
tenacidade, dureza e friabilidade das rochas
CARACTERIZAÇÃO DAS DESCONTINUIDADES

Agregado de blocos de material rochoso, separados entre si


por superfícies de descontinuidades (qualquer entidade
geológica que interrompa a continuidade física do maciço).

As descontinuidades conferem ao maciço um caráter


compartimentado:
- Anisotrópico
- Heterogêneo
- Descontínuo

Foliação, acamamento, estratificação, fraturas, contatos,


falhas.

Descrição - afloramentos, testemunhos de sondagens e


fotografias terrestres.
 Falhas - estudadas individualmente devido ao
número reduzido das que têm importância geotécnica e
pela diferença de propriedades físicas.

 Outras descontinuidades - associadas em famílias


que se agrupam em sistemas.

 Juntas ou fraturas - principal tipo de descontinuidade


e por isto tomadas como base para o estudo.

- Alívio de tensão
- Cisalhamento (esforços tectônicos)
- Resfriamento (rochas ígneas)
- Secagem (sedimentos)
- Dobramentos (dissipação de tensões residuais)
PARÂMETROS DESCRITIVOS

- Orientação espacial (atitude)


- Espaçamento
- Persistência (extensão)
- Rugosidade
- Resistência das paredes
- Abertura
- Preenchimento
- Percolação
- Número de famílias
- Tamanho dos blocos
1) Orientação espacial
Estudo estatístico das atitudes predominentes:
- Dados colhidos em campo (bússula geológica)
- Tratamento em projeções estereográficas
- Definição famílias e sistemas principais
2) Espaçamento
- Distância entre descontinuidades de uma mesma família
- Condiciona o tamanho dos blocos individuais de rocha intacta
- Influencia a permeabilidade e percolação
- Representado em histogramas de freqüência
3) Persistência

- Extensão exposta do plano de descontinuidades


- Representada em histogramas de tamanho e comprimento
4) Rugosidade

- Importante na resistência ao cisalhamento

- Influência diminui com preenchimento e abertura da juntas

- Caracterizadas através de ondulações que podem ser de


1a (dilatância) ou de 2a ordem (ruptura no cisalhamento)

- É medida em perfis lineares na direção potencial de


movimentação, quando são acessíveis e típicas

- Pode ser descrita e analisada também através de perfis de


rugosidade
5) Resistência das paredes

- Importante componente na resistência ao cisalhamento e


na deformabilidade (sem preenchimento)
- Desintegração mecânica e decomposição química
- Esclerômetro de Schimidt – estimativa de resistência da
paredes e subsequente cálculo da resistência ao
cisalhamento (em conjunto com a rugosidade)

- Fresca Grau I
- Levemente alterada Grau II
- Moderadamente alterada Grau III
- Altamente alterada Grau IV
- Completamente alterada Grau V
- Solo residual Grau VI
Exemplo:
Densidade da rocha = 26 kNm3
Ensaio na horizontal, resistência = 40
σc = 85 MPa
(1MPa – 10Hgf/cm2)
6) Abertura

- É a distância que separa as paredes de uma


descontinuidade.
- Importante no estudo da percolação.
- Grandes aberturas são resultantes de deslocamentos
cisalhantes de descontinuidades com apreciável
rugosidade (ondulação) ou por dissolução.
7) Forma e natureza dos preenchimentos

- Material que separa as paredes da descontinuidade,


causando grade variedade de comportamento da mesma.
- Condiciona a condutividade hidráulica e a resistência ao
cisalhamento.
- Influência depende da mineralogia, tamanho das partículas,
existência de água, resistência do preenchimento,
espessura, etc.
Formas de preenchimento
de fraturas
A amplitude da rugosidade e a espessura do preenchimento
pode ajudar a indicar o deslocamento cisalhante necessário
para as paredes entrarem em contato.
8) Percolação (conectividade entre as descontinuidades)

- Representada pela percolação, ou o fluxo através da


descontinuidade (permeabilidade secundária)
- Em rochas sedimentares a persistência pode conectar
hidraulicamente grandes áreas
- Feições persistentes impermeáveis ou muito permeáveis
(diques, falhas, preenchimentos argilosos) são de
importância (irregularidade do NA, perda de água, fluxo
direcional)
- A determinação do NA, do caminho preferencial de
percolação e apressão de água auxiliam na previsão de
problemas de instabilidade ou dificuldades na construção
9) Número de famílias

- Controla o comportamento mecânico e a “aparência” do


maciço

- Determina o quanto o maciço pode deformar-se sem


provocar o fraturamento da rocha intacta

- Pode determinar o grau de sobre escavação

- Um grande número de famílias pouco espaçadas podem


dar ao maciço um comportamento de material granular,
passando o modo potencial de ruptura de translacional ou
tombamento para um movimento rotacional

- Famílias de juntas sistemáticas (persistentes) e não


sistemáticas
10)Tamanho dos blocos

- É função do espaçamento, da persistência e do número


de famílias
- O número de famílias e a orientação destas determinam
as formas resultantes dos blocos
- A combinação tamanho dos blocos e resistência ao
cisalhamento determinam o comportameno do maciço sob
um dado estado de tensão

- Estimativa do tamanho dos blocos (contador volumétrico


de juntas) - soma do número de juntas por metro para
cada família de juntas, contados ortogonalmente ao plano
da família principal (5 a 10 m).

Jv = 6/10 + 24/10 + 5/10 + 1/10 = 3,6/ m3


RQD = 115 - 3,3 Jv
CLASSIFICAÇÕES GEOMECÂNICAS

- São sistemas simples, relativamente baratos e práticos.

- Caracterização dos maciços rochosos através de um


conjunto de propriedades identificadas por observação
direta e ensaios realizados in situ ou em amostras
recolhidas em sondagens.

- Interesse - Sistematização do conjunto de elementos


. geotécnicos que interessa caracterizar num determinado
maciço rochoso.

- Estimativa do comportamento complexo do maciço.


- Correlacionam características de um local com
características e experiências de outros locais.
- Fornecem o tipo e a quantidade de suporte necessário
para estabilizar a escavação subterrânea (empírico).

- Inicialmente concebidas para escavações subterrâneas,


foram estendidas para aplicação em taludes e fundações

Há inúmeras classificações geomecânicas na literatura,


porém poucas são usualmente aplicadas
A mais aplicadas atualmente são:
- Bieniawski (Sistema RMR)
- Barton (Sistema Q).
CLASSIFICAÇÃO DE BIENIAWSKI (Sistema RMR)

Bieniawski publicou esta classificação em 1976, tendo por


base uma vasta experiência colhida em obras
subterrâneas.

O Sistema RMR (“Rock Mass Rating”) é atualmente muito


divulgada e tem sido sucessivamente refinada à medida
que são incluídos os resultados de análises de um maior
número de casos práticos.

Atenção especial o caso das obras subterrâneas

Neste texto será apresentada a versão de 1989.


Atribuição de pesos aos seis parâmetros considerados mais
significativos para o comportamento dos maciços rochosos:

1. Resistência à compressão uniaxial da rocha intacta;


2. RQD (“Rock Quality Designation”);
3. Espaçamento das descontinuidades;
4. Condição das descontinuidades;
5. Influência da água;
6. Orientação das descontinuidades (fator de correção).

O somatório dos pesos atribuídos a cada um destes


parâmetros constitui um índice, usualmente designado por
RMR, ao qual corresponde uma das cinco classes de
qualidade de maciços
A orientação das descontinuidades em relação à orientação
da escavação traduz-se num peso (6) que constitui um fator
corretor do somatório

Classificação de um maciço rochoso:

- Divisão deste em várias regiões estruturais (zonas) a


serem classificadas separadamente.
- As fronteiras destas regiões coincidem usualmente com as
estruturas geológicas principais (falhas ou contatos)

No mesmo tipo de rocha, com mudanças significativas das


características destas - subdivisão do maciço rochoso num
maior número de regiões estruturais de menor dimensão.
Abertura no sentido da inclinação da descontinuidade

Abertura contra a inclinação da descontinuidade


Ábaco para determinação do período de estabilidade sem revestimento
CÁLCULO DO ÍNDICE DE QUALIDADE DO MACIÇO (RMR)
B1 B2
CONSISTÊNCIA ÍNDICE RQD ÍNDICE
RMR = B1 + B2 + B3 + B4 + B5 + A
R6 20 97-100 15

R5 16 84-96 14

R4 8 71-83 12 CONDIÇÃO DA SUPERFÍCIE DA DESCONTINUIDADE


B4 = E1 + E2 + E3 + E4 + E5
R3 5 56-70 10

R2 3 44-55 8 Persistência Abertura Rugosidade Preenchimento Alteração


R1 1 31-43 6 E1 E2 E3 E4 E5
R0 0 17-30 4 <1m Nenhuma Muito Rugosa Nenhum Inalterada
6 6 6 4 6
04-16 2
1-3m <0,1mm Rugosa Preenchimento Levemente
00-03 0 duro <5mm Alterada
4 5 5 4 5
3-10m 0,1-1.0mm Levemente Preenchimento Moderadamente
Rugosa duro >5mm Alterada
B3 2 4 3 2 3
FRATURAMENTO FRATURAMENTO (m) ÍNDICE 10-20m 1-5mm Lisa Preenchimento Muito Alterada
mole <5mm
F1 < OU IGUAL A 1 25
1 1 1 2 1
F2 2-5 20
>20m >5mm Espelhada Preenchimento Decomposta
F3 6-10 10 mole <5mm
F4 11-19 5 0 0 0 0 0
F5 >20 0
CONDIÇÃO DE ÁGUA
Condição Geral (Pressão de Água na Junta) / B5
(Tensão Principal Maior)
Seca 0 15
Úmida <0,1 10
Molhada 0,1 - 0,2 7
Gotejamento 0,2 - 0,5 4
Fluxo >0,5 0

AJUSTE DEVIDO À ORIENTAÇÃO DA DESCONTINUIDADE


Condição da orientação da descontinuidade Diferença Ajuste
mais crítica em relação a direção da escavação de ângulo A
Muito Favorável 90º 0
Favorável 70º -2
Razoável 45º -5
Desfavorável 20º -10
Muito Desfavorável 0º -12

RM R e Classes de M aciço
RM R C lasses

100 - 80 I - M uito Bom

80 - 60 II - Bom RMR = B1 + B2 + B3 + B4 + B5 + A
EX: RMR = 3 + 14 + 20 + 17 + 15 + 0
60 - 40 III - Regular
RMR = 69 (Classe II)
40 - 20 IV - Pobre

< 20 V -M uito Pobre

- V I - Solo Estruturado
Correlações

O valor do índice RMR dá indicações do tempo médio de


auto-sustentação para vãos não revestidos em túneis.

Auto-sustentação - períodos de tempo durante os quais


deverá ser colocado o suporte sob pena de ocorrer o
colapso previsível da abertura.

São também dadas estimativas relativas às características


resistentes do maciço rochoso, principalmente a coesão e o
ângulo de atrito.

O índice RMR tem sido correlacionado com o valor do


módulo de deformabilidade (E) do maciço rochoso.
CLASSIFICAÇÃO DE BARTON (Sistema Q)
A partir da observação de um grande número de escavações
subterrâneas, Barton, Lien e Lund, do Norwegian
Geotechnical Institute, propuseram, em 1974, uma
classificação geotécnica para maciços rochosos.

O índice de qualidade Q baseado na análise de 6 fatores


considerados relevantes para a caracterização do
comportamento dos maciços rochosos.

O valor numérico do índice Q apresenta um largo campo de


variação, entre 10-3 e 103, e é determinado pela expressão
seguinte:
Q = (RQD/Jn).(Jr/Ja).(Jw/SRF)

• RQD - espero que todos já saibam


• Jn - quantidade e a maneira com que as fraturas
se correlacionam.
• Jr - rugosidade das fraturas.
• Ja - grau de alteração das fraturas.
• Jw - considera a pressão de água.
• SRF - considera as tensões no local.
􀂾
􀂾 RQD/Jn – avalia o tamanho dos blocos.

􀂾 Jr/Ja – avalia a resistência de cisalhamento


entre os blocos.

􀂾 Jw/SRF – avalia as tensões.


1. RQD / Jn - Idéia genérica da dimensão dos blocos
estrutura do maciço rochoso e constitui uma medida do
bloco unitário deste;

2. Jr / Ja caracteriza as descontinuidades (preenchimento,


rugosidade e do grau de alteração);

3. Jw / SRF representa o estado de tensão no maciço


rochoso (SRF caracteriza o estado de tensão no maciço
e Jw representa a pressão da água).
RQD - Designação da qualidade da rocha (Q.1)
J n - Índice das famílias de juntas (Q.2)
J r - Índice de rugosidade das juntas (Q.3)
J a - Grau de alteração das descontinuidades (Q.4)
J w - Índice das condições hidrogeológicas (Q.5)
Com base no sistema de classificação Q são propostas
recomendações quanto ao tipo de suporte necessário à
estabilidade de maciços rochosos na construção de túneis.

Um gráfico proposto por Grimstad e Barton (1993) que


permite estimar o tipo de suporte em função do valor
designado por Dimensão Equivalente, De, da escavação

Esta grandeza é obtida dividindo o vão, diâmetro ou altura


da escavação por um índice, ESR (Excavation Support
Ratio), que constitui um fator de segurança definido em
função do tipo de obra.
Correlação entre RMR e Q:

Um total de 111 casos da Escandinávia, África do Sul,


Europa, Austrália, EUA e Canadá foram analisados
resultando na seguinte equação:

RMR = 9.ln Q + 44

Comparações entre Q e RMR:

O RMR enfatiza a orientação das descontinuidades e


considera a resistência da rocha diretamente nos seus
parâmetros ao contrário do sistema Q.

O Q leva em consideração as tensões da rocha ao contrário


do RMR.

RMR é claramente mais simples.


Correlações entre os índices RMR e Q.
Outras correlações RMR-Q

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