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Ayahuasca ou Santo Daime

Outros nomes: yajé, caapi, vinho de deus (vine of gold), natema, pindé, kahi, mihi, dápa,
bejuco de oro, vine of the spirits, vine of the soul e a transliteração para a língua portuguesa
resultou em hoasca. Também é conhecida amplamente no Brasil como "chá do Santo Daime" ou
"vegetal". Na linguagem Quéchua, aya significa espírito ou ancestral, e huasca significa vinho ou
chá (Luna & Amaringo, 1991; Grob et al., 1996).

O QUE É?
O Daime (ou Ayahuasca, Uasca ou Santo Daime) é uma mistura de duas plantas (Cipó Mariri
e Chacrona) que, depois de cozidas, resultam num chá alucinógeno que normalmente evoca
visões e imagens religiosas (a chamada "miração"), costumando por vezes provocar vômitos em
quem
toma (por isso os locais onde a beberagem é consumida são equipados de algum tipo de
"vomitório").

A ORIGEM
A ingestão ritual de Ayahuasca por parcelas da população urbana inicia-se no Brasil, na década
de 30, em Rio Branco, Acre, com o culto ao Santo Daime, sistematizado por Raimundo Irineu
Serra, que atribuiu à Ayahuasca a denominação "Santo Daime" e fundou o "Centro de
Iluminação Cristã Luz Universal - CICLU Alto Santo". No final da década de 60, em Porto Velho,
Rondônia, José Gabriel da Costa organizou outro grupo ayahuasqueros, denominando-o "União do
Vegetal", visto que nele a ayahuasca é chamada de vegetal. O processo de
divergências e de desdobramentos dos núcleos originais propiciaram a expansão das religiões
ayahuasqueros por grande parte do território nacional e mesmo pelo exterior.
As religiões ayahuasqueros estão atualmente polarizadas em duas "linhas":
Uma a do Mestre Irineu, fundador da seita. Não admitem incorporação, praticando estritamente o
xamanismo, e não aderem e nem mesmo toleram o uso de outros psicoativos que não a
Ayahuasca.
Outra a do Padrinho Sebastião Mota, do CEFLURIS (dissidência do CICLU). Esse grupo atraiu
acadêmicos, jornalistas, artistas, estudantes e diferentes categorias de profissionais liberais
empenhados em torná-lo objeto de estudo, notícia ou modo de vida.
Algumas conseqüências decorreram dessa aliança, entre elas a adoção pela "linha" de Sebastião,
de muitos dos costumes e crenças dos jovens urbanos, a exemplo do controvertido uso "ritual" da
Cannabis sativa (Maconha, que é chamada por eles de "Santa Maria") e Cocaína (conhecida
como "Santa Clara").
Fica aqui o alerta aos pais: se seu filho (a) enveredar em qualquer uma dessas, procure ir com
ele, mesmo que não beba o chá. Procure conhecer as práticas, e principalmente os
freqüentadores destes locais. Um grupo que se reúne regularmente pra tomar alucinógenos NÃO
PODE atrair boa gente, mesmo que o objetivo deles seja bom. Do uso da Ayahuasca para
drogas mais pesadas é um pulo! Tanto isso é verdade, que mesmo na linha de Irineu, que não
permite outras drogas, já teve membros presos no exterior por tráfico de drogas. Trust no one.
Lázaro explica:
"No contexto xamânico de vários povos as ervas são usadas em eventos com conotação
espiritual, visando uma determinada iniciação dentro daquele nível. Já no contexto urbano, pode
ser usado como fuga da realidade. Conheço vários casos assim: as pessoas usavam porque não
agüentavam conviver com um nível de realidade duro como a vida física na Terra. A substância
acelera o acesso ao inconsciente, com tudo de bom ou de doentio que estiver ali. Pode ser
interessante para alguns, sagrado para outros. Mas como tudo que tira a consciência do normal,
e/ou altera abruptamente os estados cerebrais, tem seus preços. Neurológicos e, principalmente,
psicológicos.
A mente tende sempre à compensação. O uso excessivo de Prozac, por exemplo, leva a pessoa à
depressão. Café demais excita, e quando passa o efeito, você se sente cansado. Cocaína deixa a
pessoa entusiasmada, mas a compensação disso a faz insegura quando não usa a substância.
TUDO na mente humana é assim, e o preço do acesso "espiritual" do daime é CARÍSSIMO, em
termos psicológicos posteriores. A não ser, claro, que a pessoa tome mais, para ter de novo o
acesso e miração, e assim sucessivamente. Dependência psicológica. E depois, sem o "espiritual"
miraculoso, a vida "comum" passa a ser mais e mais vulgar. E começa tudo outra vez. Com o
agravante de que até mesmo as formas de contato espiritual parecerão fúteis, afinal, como
comparar com o barato do daime? Então, essa é uma droga que rouba do dependente até
mesmo o seu direito à conexão espiritual...".

História
As origens do uso da Ayahuasca na bacia Amazônica remontam à Pré-história. Não é possível
afirmar quando tal prática teve origem, no entanto, há evidências arqueológicas através de potes,
desenhos que levam a crer que o uso de plantas alucinógenas ocorra desde 2.000 a.C.
No século XVI, há relatos de que os espanhóis e portugueses detentores das florestas do Novo
Mundo observaram a utilização de bebidas na cultura indígena e recriminaram-na: " quando
bêbados, perdem o sentido, porque a bebida é muito poderosa, por meio dela comunicam-se com
o demônio, porque eles ficam sem julgamento, e apresentam várias alucinações que eles
atribuem a um deus que vive dentro destas plantas" (Guerra, 1971).
O uso destas plantas foi condenado pela Santa Inquisição em 1616, o cerimonial persistiu de
forma escondida dos dominadores Europeus. Os padres jesuítas descreveram o uso de "poções
diabólicas" pelos nativos do Peru no século XVII.
A história moderna da Ayahuasca começa em 1851 quando o botânico inglês R. Spruce noticia o
uso de bebidas que intoxicam entre os índios Tukanoan, no Brasil. Estes convidaram-no a
participar de uma cerimônia que incluía a infusão que eles chamavam "caapi". Spruce apenas
tomou uma pequena quantidade daquela "nauseous beverage", mas não se deu conta dos
profundos efeitos que ela teve sobre seus amigos. Os Tukanoans mostraram a Spruce a planta da
qual caapi derivava, e ele coletou espécies da planta e das flores. Spruce chamou-a de Banisteria
caapi, e estudos posteriores levaram-no a concluir que caapi, yajé e ayahuasca eram nomes
indígenas para a mesma poção feita daquela videira. A Banisteria caapi de Spruce foi
reclassificada como Banisteriopsis caapi pelo taxonomista Morton em 1931.
Em 1858, Spruce encontrou a mesma planta sendo usada na tribo Guahibo, na margem superior
do rio Orinoco, na Colômbia e Venezuela, e, no mesmo ano, entre os Záparos dos Andes
Peruanos, que denominavam-na Ayahuasca.
Simson's, em 1886 foi quem primeiro observou a mistura das plantas na confecção da
Ayahuasca.
Apesar da coleta e identificação da Ayahuasca datar de 1851, os alcalóides já eram conhecidos
desde a primeira metade do século XIX, o que se deve à facilidade de extração dos mesmos, bem
como aos possíveis usos clínicos: logo, a Harmalina foi isolada da Peganum harmala em 1840.
Sete anos depois, a Harmina foi identificada. A "telepatina" – harmina - foi identificada na "yajé"
em 1905 (Zerda e Bayon).
O começo do século vinte foi marcado por mais confusão do que esclarecimentos acerca da
Ayahuasca, muitos identificaram-na, equivocadamente, do ponto de vista da botânica. Até que,
em 1939, Chen & Chen descobriu que tanto a caapi, yajé e ayahuasca eram a mesma bebida.
Foram estes mesmos pesquisadores que confirmaram que a harmina, telepatina e banisterina
eram a mesma substância.
Em 1957, Hochstein and Paradies encontraram, além de Harmina, também Harmalina e
Tetrahidroharmina.
Em 68, identificou-se a N,N dimetiltriptamina (DMT) como outro alcalóide deste chá. Este já havia
sido sintetizado em 1931, porém só foi identificado como substância natural em 1955, na planta
Piptadenia peregrina (Anadenanthera peregrina).
Os princípios da ação farmacológica da Ayahuasca foram traçados na década de 60 e sugeriam
a interação das beta-carbolinas presentes na Banisteriopsis e do DMT proveniente da P. viridis.
O estudo de Rivier & Lindgren identificou os alcalóides presentes na decocção em 1972, isto é:
Harmina, Harmalina, Tetrahidroharmina e Dimetiltriptamina.
Antropologia e uso da Ayahuasca
Plantas com propriedades alucinógenas vem sendo utilizadas com finalidades místicas e religiosas
em diferentes culturas primitivas (Andritzky, 1989; Callaway, 1996; Desmerchelier, 1996; Luna, 1984). Há relatos do uso
das poções em toda a Amazônia, chegando à costa do Pacífico no Peru, Colômbia e Equador, bem
como na costa do Panamá, sendo que foi reconhecida em pelo menos 72 tribos indígenas, com
pelo menos 40 diferentes nomes.
Entre as diversas tribos da bacia Amazônica, a Ayahuasca é percebida como uma poção mágica
inebriante, de origem divina, que "facilita o desprendimento da alma de seu confinamento
corpóreo", voltando ao mesmo conforme a vontade e carregada de conhecimentos sagrados.
Entre os nativos é usada para propósitos de cura, religião e para fornecer visões que são
importantes no planejamento de caçadas, prevenção contra espíritos malévolos, bem como contra
ataques de feras da floresta.
Antes da colonização européia, postula-se que as plantas inebriantes eram amplamente usadas
com fins de bruxaria, rituais religiosos, cura e contato com forças sobrenaturais (Dobkin de Rios, 1972;
Harner, 1973).
Entre os Tukanoans, o yajé é responsável pela arquitetura da tribo, pois as imagens geométricas
induzidas pelo efeito do chá desempenham um importante papel na estrutura da vida cultural
desta tribo, sendo que as experiências relacionadas à Ayahuasca pertencem a uma realidade
mais nobre que a ordinária (Spruce, 1908).
Para os Cashinahua o uso da ayahuasca só deve ser feito em condições extremas, pois é
considerada uma experiência desagradável e amedrontadora. Os índios Jivaro do Equador relatam
que a experiência com Ayahuasca é a vida real, ao passo que a realidade cotidiana é apenas
uma ilusão. As visões são guiadas e manipuladas pelos xamãs, o que resulta em visões grupais
sintônicas, que são incluídas dentro dos rituais religiosos próprios destas culturas.
O uso da Ayahuasca sobreviveu aos ataques das culturas dominadoras e pouco a pouco se
espalhou para os mestiços chegando enfim às pequenas cidades da região Amazônica. Nestas
cidades o uso da bebida foi redimensionado, sendo que os xamãs da Amazônia Peruana referem-
se a si mesmos como vegetalistas. Estes "plant-doctors" ajudam as pessoas das áreas rurais e as
populações pobres da área suburbana que geralmente não têm outras opções em situações
críticas na esfera da saúde física, mental e em "problemas sobrenaturais" (Luna, L. E., 1984).
Tais vegetalistas apresentam a tendência a especializarem-se em algumas poucas plantas e usam
estes "ensinamentos" em sua prática. Assim, há tabaqueiros que usam tabaco, "toeros" que
usam várias espécies de Brugmansia species; "catahueros" que usam resinas da catahua (Hura
crepitans), "perfumeros" que usam diversas espécies de plantas com aromas fortes e por fim os
"ayahuasqueros" que se utilizam da ayahuasca em seus rituais.
Os Xamãs usam a bebida em um contexto de cura. Eles tomam a Ayahuasca para melhor
diagnosticar a natureza da doença do paciente. Vegetalistas podem receber o dom da cura por
meio de espíritos da floresta e seu papel é o de, muitas vezes, intermediar a transmissão do
conhecimento médico para o mundo dos humanos, possibilitando assim a cura.
Os espíritos "plant teachers" são responsáveis por ensinarem aos xamãs algumas músicas
sobrenaturais chamadas "icaros", tanto dentro das sessões de ayahuasca quanto durante os
sonhos que se seguem. Os "plant teachers" dão estas canções mágicas aos xamãs ou vegetalistas
então estes podem cantá-las ou sussurrá-las durante a sessão de cura. Segundo a explicação dos
xamãs, quando uma pessoa se torna doente, seu "padrão energético torna-se distorcido". Sob a
influência da Ayahuasca, o xamã pode ver a distorção e corrigi-la através de massagens, sucção,
plantas medicinais, hidroterapia e restauração da alma do doente.
A similaridade entre estes métodos xamãs e as técnicas orientais podem ser notadas. De forma
interessante, os xamãs escolhem plantas medicinais baseados em características visuais, como
formas e cores. Por exemplo, uma planta que produz flores de formas semelhantes a uma orelha
pode e deve ser usada para tratamento de doenças relacionadas à orelha e audição. Parte do
treinamento dos xamãs, logo, envolve a prática de reconhecer e aprender a respeito dos poderes
das plantas e dos animais e suas "virtudes escondidas".
É digno de nota o fato de que muitos xamãs não usam os ensinamentos da Ayahuasca com
pessoas que estejam doentes mentalmente.
Outra tentativa de uso curativo da Ayahuasca foi empreendido na província de San Martin, no
Peru, na década de 80, por um grupo misto de médicos franceses e peruanos, na tentativa de
facilitar o tratamento da dependência química à pasta de cocaína, sendo que não se conhece
nenhum estudo científico controlado, que possa corroborar este resultado (Mabit, 1996).

Preparo
O Chá do Santo Daime ou Vegetal é preparado do cipó do Jagube ou Mariri (Banisteriopsis
caapi) e da folha da Rainha ou Chacrona (Psycotria viridis) - naturais da região amazônica. A
bebida - também conhecida como Ayahuasca ou Yajé pelos índios e xamãs do noroeste do
Brasil e das regiões a leste dos Andes - é certamente oriunda da tradução espiritual dos Incas.
Os métodos de preparo variam conforme a tradição de cada local e da ocasião em que o consumo
se dá. De qualquer maneira, o processo é longo e leva quase um dia para o preparo. As diversas
beberagens geralmente contêm talos socados do cipó caapi (Banisteriopsis caapi) mais as folhas
da chacrona (Psichotria viridis).
Este nome, tanto se aplica à bebida preparada por meio da mistura da Banisteriopsis caapi e da
Psichotria viridis, quanto à primeira das plantas. Apesar das variações acerca das plantas usadas,
farmacologicamente, boa parte delas são similares. Nesta revisão, o termo ayahuasca será
usado para designar a bebida resultante da decocção destas duas plantas combinação.
As diversas preparações geralmente contêm talos socados da Banisteriopsis caapi ou espécies
correlatas mais às folhas da Psichotria viridis. As plantas adicionadas à Ayahuasca ajudam a
maximizar as experiências de estimulação visual e as sensações de contato com forças e locais
sobrenaturais e divinos. Os métodos de preparo variam conforme o grupo, como um chá quente
ou amassando-se junto à água fria, deixando-se em descanso por aproximadamente 24 horas. É
um processo longo que leva quase um dia para o preparo, o que torna a "tecnologia" de
produção insuficiente para a produção de grandes quantidades (Karniol & Seibel, Parecer do Grupo de Trabalho,
1986).

OS EFEITOS
Algumas vezes pode ocorrer, associada à limpeza (vômitos), uma experiência de intenso
sofrimento: a "peia", uma surra do Daime. A peia está associada também a outros processos
fisiológicos incômodos ou aparece, ainda, sob forma de pensamentos ou sensações. Apesar de
extremamente desagradável — incluindo visões aterradoras de monstros, vermes, trevas,
sensação de morte ou medo intenso, enfim, toda classe de tormentos conhecidos ou não — a
peia produziria efeitos benéficos, didáticos e transformadores.
Os defensores da planta dizem que ela provoca uma limpeza física ou energética do canal ou
instrumento que a usa, "pois luz não habita em templo sujo". Então, se você estiver com
problemas, numa baixa vibração, ou tiver ingerido carne ou comida pesada, vai vomitar
copiosamente, ter diarréia de se acabar, ficar enjoado, etc. Só que qualquer pessoa com um
mínimo de conhecimento de biologia sabe porque o organismo expulsa e rejeita certas
substâncias estranhas, quando ingeridas...
Existem denúncias de que o uso deste chá faz mal, a longo prazo, tendo como um dos efeitos
adversos o eventual retorno da "miração" nas horas mais inadequadas, e os mais puristas até
alegam que o chá apresenta riscos para a tela búdica dos usuários, ou seja, pode fazer mal até
nas próximas encarnações.
O chá contém dimetiltriptamina, ou DMT, uma substância controlada. O governo dos EUA afirma
que seu uso é perigoso mesmo sob supervisão médica. Seu uso é proibido em países que
possuem legislação anti-drogas, mas foi liberado no Brasil
(http://www.estadao.com.br/agestado/noticias/2004/nov/08/177.htm) para uso religioso.
Advogados da União do Vegetal (UDV) dizem que especialistas atestaram que o chá é inofensivo.
"A DMT (dimetiltriptamina) é naturalmente excretada pela glândula pineal, e
que desempenha um papel no processo de sonhar e possivelmente nas experiências próximas à
morte e em outros estados místicos. A mistura das duas plantas potencializa a ação das
substâncias ativas, pois o DMT é oxidado pela enzima Monoaminoxidase (MAO), a qual está
inibida pela harmina, acarretando um aumento nos níveis de serotonina, o que causa impulsão
motora para o sistema límbico no sentido de aumentar a sensação de bem-estar do indivíduo,
criando condições de felicidade, contentamento, bom apetite, impulso sexual, equilíbrio
psicomotor e alucinações".
Ou seja, você está ingerindo uma dose cavalar de uma substância que deveria ser naturalmente
produzida pelo corpo, afetando uma parte importantíssima como o cérebro.
Lázaro, da lista Voadores (www.voadores.com.br), explica o processo:
"Há uma aceleração vibracional desordenada, onde cada chacra entra num estado vibracional de
freqüência diferente. Não sei se isso é bom ou mal, se vale à pena ou não (essa resposta
depende de cada um, e do que conseguirá com o processo), mas me parece um método
estranho, que, alterando as freqüências vibracionais / conscienciais das corpóreas e cerebrais, só
pode mesmo levar a uma saída (expulsão) do corpo físico. Além do mais, encontrei exatamente o
que imaginava encontrar, do lado de lá; com detalhes de controle, e influências
tanto projetivas reais quanto oníricas aceleradas pelo uso do FORTÍSSIMO alucinógeno”.
O chá de Santo Daime é um alucinógeno. Tal propriedade se deve à presença nas folhas da
chacrona de uma substância alucinógena denominada N, N-dimetiltriptamina (DMT). O DMT é
destruído pelo organismo por meio da enzima monoaminaoxidase (MAO). No entanto, o caapi
possui uma substância capaz de bloquear os efeitos da MAO: a harmalina. Desse modo, o DMT
tem sua ação alucinógena intensificada e prolongada.
Outras plantas amazônicas também possuem DMT e são utilizadas por diversas tribos indígenas
como um modo de experiência religiosa. Entre estas estão a jurema (Mimosa hostilis) e o yopo
(Anadenanthera colubrina). A jurema é consumida na forma de chá, enquanto as sementes do
yopo são maceradas e seu pó, consumido pela via intranasal (cheirado).

Ayahuasca e religião
No século passado, além do consumo da mistura entre as populações indígenas, várias igrejas
adotaram o uso da ayahuasca em rituais sincréticos, especialmente no Brasil, onde os efeitos
psicoativos são acoplados a conceitos das doutrinas Judaica, Cristã, Africana entre outras. As
principais religiões deste módulo incluem a UDV (União do Vegetal), CEFLURIS (Santo Daime),
Barquinha e o Alto Santo (Labilgalini Junior, 1998).
O uso da hoasca dentro de tais contextos religiosos foi oficialmente reconhecido e protegido pela
lei no Brasil em 1987. Tais seitas incluíram a Ayahuasca em seus rituais de comunhão como um
simbolismo comparável ao "pão e vinho". Estas igrejas argumentam que a poção ajuda a
promover concentração pronunciada e contato direto com o plano espiritual. Segundo a União do
Vegetal, a beberagem é o "veículo, meio" da ação religiosa e não o fim.
Calcula-se que o número de pessoas que fazem uso regular da Hoasca (i.e., aproximadamente
1x/mês), na América do Sul, excluindo-se as populações indígenas, poderia chegar a 15.000, isto
em 1997 (Luna, L. E., 1997).
A primeira destas igrejas começou a ser formada na década de 1920 no Brasil, e hoje dois
grupos, a União do Vegetal (UDV or 'Herbal Union') e o Santo Daime, continuam em amplo
processo de crescimento. Estas igrejas neocristãs espalham-se pelas áreas urbanas das grandes
cidades, em rituais que se repetem em geral uma vez por semana ou quinzena. Os membros da
igreja cultivam as plantas necessárias ao feitio do chá, supervisionam seu preparo e estocagem.
Em algumas religiões não é incomum que membros da seita, dado a longa duração dos cultos,
tomem várias doses durante o curso de uma noite.
A UDV é a maior e mais organizada destas religiões e não permite o uso de Ayahuasca por
pessoas que não sejam membros já efetivos da seita. É também contrária a uso de drogas bem
como ao uso da Ayahuasca fora do contexto religioso, pois a considera "inadequada ao uso
indiscriminado por parte de pessoas não-iniciadas e sem a orientação de um dirigente religioso".
Enquanto o uso regular da Ayahuasca ocorre raramente entre os indígenas - mesmo que a
considerável porcentagem destes tenham-na experimentado em alguma fase de suas vidas -
entre os membros das igrejas o consumo é estável numa base semanal ou quinzenal, dentro dos
contextos cerimoniais.
Dentro da perspectiva religiosa, o potencial de expansão das seitas que usam ayahuasca é
largo. Através da incorporação de uma substância psicoativa de tal peso em cerimônias religiosas
podem ser alcançados efeitos nas práticas religiosas antes inexeqüíveis.
O relator do processo de investigação, Domingos Carneiro de Sá, explicou que o fato
fundamental para a liberação da bebida foi o comportamento dos daimistas e a seriedade dos
centros que utilizam o chá em seus rituais.
Desde o início do século, nos contatos culturais entre seringueiros e índios, a Ayahuasca
passou a ser conhecida e usada pelos migrantes nordestinos, que colonizaram a Amazônia
ocidental. Destes contatos surgiram diversos grupos que sincretizaram o uso da bebida a um
contexto religioso cristão-espírita, dos quais a União do Vegetal, no estado de Rondônia, o
Santo Daime e a Barquinha, no Acre, são os maiores expoentes.
Paralelamente ao crescimento dos dois grupos e à expansão do uso religioso e terapêutico da
Ayahuasca, uma forte resistência dos setores conservadores da sociedade brasileira se formou,
pressionando o Conselho Federal de Entorpecentes (Confen) para embargar o funcionamento
destas instituições nos grandes centros metropolitanos.
“Não foram observadas atitudes anti-sociais dos participantes dos cultos, ao contrário, podemos
constatar os efeitos integrados e reestruturantes do Daime com indivíduos que antes de
participarem dos rituais apresentavam desajustes sociais ou psicológicos”.
Coroando o processo de legalização, as entidades religiosas que utilizam a bebida, sem
prejuízo de suas identidades e convicções, comprometeram-se a adotar procedimentos éticos
comuns em torno do uso do chá, firmando uma carta de princípios. Neste documento, elaborado
durante o I Congressso Internacional da Ayahuasca, ocorrido em novembro de 92 em Rio Branco,
no Acre, os centros decidiram: vetar a comercialização da bebida, sua mistura com outras
substâncias, a prática de curanderismo e estabeleceram regras para divulgação. Também ficou
definido que a participação de menores de idade nos rituais só seria possível mediante a
autorização dos pais e responsáveis; e que, sob nenhuma condição, seriam admitidos deficientes
mentais, pessoas sob o efeito de álcool ou de outras substâncias psicoativas.

O RITUAL
O Santo Daime preserva o caráter sagrado da festa e da dança, oriundo do catolicismo popular.
Convivem no seu panteão mítico Deus, Jesus, a Virgem Maria, os santos
católicos, entidades originárias do universo afro-brasileiro e seres da
natureza. Também são louvadas as figuras do Mestre Irineu, identificado com
Jesus Cristo, e do Padrinho Sebastião, "encarnação de São João Batista" — de
onde são derivadas algumas concepções messiânicas e apocalípticas. Do espiritismo
kardecista são reelaboradas noções como as de karma e reencarnação.
Os indivíduos possuem dentro de si elementos de uma "memória divina"; ao mesmo
tempo, podem, através do próprio comportamento, alterar seu carma, "evoluindo
espiritualmente" em direção a sua "salvação". Em consonância com os sistemas
xamânicos, verifica-se a existência de uma "guerra mística" entre os homens e os
seres espirituais. Os daimistas são concebidos como os "soldados do Exército de
Juramidam", empenhados numa "batalha astral para doutrinar os espíritos sem
luz".
Todo o ritual está permeado por um espírito militar com ênfase na ordem, na disciplina.
A cerimônia consiste basicamente em beber o chá e ficar descansando em cadeiras, esperando a
"miração". Enquanto isso entoam cânticos coletivos ou ouvem músicas selecionadas,
consideradas "revelações do Astral" para criar um clima propício a ter boas
mirações. Os trabalhos espirituais realizados pelos daimistas são de concentração
(com períodos de meditação) ou bailado (execução de uma coreografia simples),
podendo chegar a produzir um verdadeiro êxtase coletivo. Há também trabalhos de
missa (para os mortos) e rituais de fardamento (momento em que o indivíduo adere
oficialmente ao grupo, passando a usar suas vestimentas). Recentemente, vêm
ganhando força alguns ritos onde ocorre incorporação de espíritos, produto das
influências crescentes da umbanda nesta instituição.
A União como entidade
O sincretismo religioso do Santo Daime - o maior dos grupos que alia uma concepção cristã-
espírita às influências indígenas pré-colombianas - tem um ritual bastante simples: os
participantes se posicionam em filas formando um quadrilátero, com as moças e as mulheres de
um lado e os homens e rapazes do outro, ao redor de uma mesa. Nas festas oficiais, os homens
usam ternos brancos e gravatas azuis, e as mulheres, camisa e saias branca com uma jardineira
verde com fitas coloridas e usam uma coroa prateada. Ao centro, o Santo Cruzeiro (a cruz de
caravaca) e a Estrela do Oriente (o selo de Salomão com uma águia sobre uma lua minguante).
Após rezarem um terço do Rosário, todos tomam uma dose do chá e entoam cânticos em
louvor a Deus, à Virgem Maria e a Jesus Cristo. Além do canto, há também uma dança -
chamada de “bailado” - que consiste em deslocar o corpo no compasso da música, em conjunto
com todos, para a direita e para a esquerda de forma alternada, em uma espécie de ‘ciranda
estática’. Esta corrente de voz e movimento é ritmada por maracás, pequenos chocalhos de lata
que quase todos usam. A doutrina é transmitida através das músicas e a estrutura do ritual se
assemelha a muitas festas populares do interior do Brasil, provenientes da forte tradição oral das
culturas Ameríndia e Afro-brasileira, tais como o Reizado e o Catimbó. “Os hinários” , como os
adeptos chamam as cerimônias, começam, geralmente, com o pôr-do-sol para só terminar na
manhã seguinte. Os adeptos do culto vêem neste processo uma representação do sofrimento,
morte e ressurreição do Cristo. Os hinos, cantados no decorrer da noite, são recebidos
mediúnicamente e ensaiados com antecedência para a apresentação durante o ritual. As idéias
básicas transmitidas pelos hinos são as de solidariedade humana, consciência ecológica e de
espiritualização - trovas poéticas entoada em melodias simples e repetitivas, que funcionam como
‘mantras’. “Um hinário reflete o aprendizado da pessoa que o recebeu, que é novamente vivido
por todos aqueles que o cantam durante os rituais” - explica Alex Polari, um dos dirigentes do
CEFLURIS (Centro Eclético da Fluente da Luz Universal Raimundo Irineu Serra) - “o Hinário do
Cruzeiro, recebido pelo Mestre Irineu, fundador da doutrina, por exemplo, é um conjunto de 129
cânticos que expressa sua biografia espiritual, com as provas e experiências que ele enfrentou
durante o decorrer de sua vida”. Além disso, cada hinário também se caracteriza pelos
ensinamentos de um santo em particular, segundo as características espirituais do guia que
orienta seu receptor. Assim, o hinário do Padrinho Sebastião, O Justiceiro, reflete os
ensinamentos de São João Batista; o hinário de seu filho, Alfredo Gregório, expressa os
ensinamentos do Rei Salomão. No caso do hinário do fundador, Mestre Irineu, por ser o primeiro,
encontram-se os ensinamentos de Jesus Cristo.
O efeito da bebida do Santo Daime promove uma expansão na consciência que, sem a
perda da capacidade de ação voluntária, permite que se observe os próprios sentimentos e
pensamentos com maior clareza. No decorrer do ritual, o estado de consciência intensificada pelo
chá amplifica as situações recorrentes da vida cotidiana, revelando contradições existenciais e
processos interiores que se repetem inconscientemente em diversos níveis. Esses processos
involuntários são compreendidos pela consciência intensificada dos participantes, através da
corrente formada pelo bailado e pelos hinos, que sugerem sempre uma solução positiva para os
problemas. Segundo os participantes do culto, o ritual é “uma auto-análise”. O processo vivido
sobre o efeito da bebida, abrindo as portas do subconsciente e ação condicionante do hinário
(hinos + bailado) leva a um exame crítico de nossas ações cotidianas, com base nos princípios
cristãos.
Porém não se pode resumir o Santo Daime ao psicológico, nem reduzir seus efeitos à
simples conjunção da expansão química da consciência a mecanismos de auto-sugestão hipnótica
da doutrina cristã. Há um inegável aspecto espiritual nos rituais, com incorporações conscientes e
fenômenos ligados à vidência e à cura. A presença de seres de luz, bem como de obsessores,
desencarnados, é claramente sentida no salão. Existem, inclusive, adeptos do Santo Daime no
município fluminense de Nova Friburgo que aliam o uso do chá à incorporação de entidades da
linha da Umbanda, desenvolvendo um rico relacionamento entre as duas modalidades de
trabalho espiritual.
Porém, para eles, o aspecto espiritual é indissociável do psicológico, uma vez que “os hinos
tanto servem para doutrinar os desencarnados como para, simultaneamente, apontar as falhas e
os defeitos morais dos participantes, desmascarando a sintonia existente entre o que as pessoas
pensam e o que acontece no mundo espiritual”. Neste duplo processo, de autodesenvolvimento
psicológico e desobsessão espírita, os participantes sofrem as “peias” e têm as “mirações”. A
“peia” representa uma difícil prova cármica a ser vencida ou o castigo necessário ao perdão dos
pecados, o “sofrimento purificador” - que pode se manifestar na forma de vômitos, choro
convulsivo, diarréia e mal-estar generalizado. Já a “miração” é uma visão mística, semelhante ao
sonho, que mescla a revelação divina com os símbolos do inconsciente, muitas vezes
coincidentes com a temática e os personagens dos hinos.
Além de Jesus Cristo ser freqüentemente sincretizado com o Sol, a Virgem Maria é
associada à Lua, ao Mar e à Floresta, e as presenças de São João Batista e do Patriarca São
José são constantemente lembradas nas canções do Santo Daime. Outra imagem freqüente é a
do “Divino Pai Eterno”, afirmação do princípio monoteísta da doutrina, que impera sobre uma
“Corte Celestial de Todos os Seres Divinos” - que engloba, no manto panteísta da Rainha da
Floresta, entidades que vão dos Devas Orientais aos Orixás africanos. Porém, a entidade
central do ritual do Santo Daime é Juramidam, o “Mestre Império”. Este ser é quem,
segundo os hinos e os participantes do culto, preside os rituais e é identificado como o próprio
espírito da bebida ingerida nas cerimônias.
Os hinos do Santo Daime também versam sobre uma transformação nas condições de vida
da humanidade - “o fim dos tempos”, “o Apocalipse”, “o balanço” - e sobre o advento da utopia
social, a “Nova Jerusalém”, “o Reino de Deus na Terra”. Em relação a este ideal de utopia social,
os participantes dos rituais afirmam que “a vida comunitária é um aspecto fundamental na
doutrina do Santo Daime. Através dela aprendemos e construímos na prática o significado da
União, que cantamos nos hinários”. Para eles, “quando tomamos Daime e cantamos hinos
estamos apenas acelerando e intensificando conflitos e relações interpessoais que se
desenvolvem no nosso cotidiano comunitário”. O objetivo em longo prazo, ao que prece, é
conquistar no dia-a-dia uma união material tão sólida quanto à união mística alcançada nas
cerimônias. “Assim”, concluem, “realizamos o ideal da Nova Jerusalém”. Desta forma, a União,
metáfora da comunidade e símbolo da utopia social, é uma das entidades centrais dos rituais e
da filosofia da doutrina do Santo Daime.

Caráter religioso e sintomatologia


Seu consumo está associado a práticas religiosas e parece ser utilizada por tribos indígenas da
Amazônia desde 2000 a.C. As seitas religiosas mais conhecidas no Brasil são o Santo Daime e a
União do Vegetal. Os efeitos, desse modo, estão bastante relacionados aos rituais religiosos
onde se dá o consumo, baseados na crença da possibilidade de contato com outros planos
espirituais. Há semelhança entre os efeitos da ayahuasca e alucinógenos, como o LSD.
Seu uso após a era pré-colombiana teria se difundido entre várias tribos indígenas, das quais se
tem razoável conhecimento antropológico. Ingerindo o chá, os índios absorviam o espírito da
planta e, em transe, tinham experiências psíquicas e vivenciavam fenômenos paranormais, tais
como a telepatia, a regressão a vidas passadas, contatos com os espíritos dos seus antepassados
mortos, presciência e visão à distância. Vários relatos apontam ainda que alguns feiticeiros e
xamãs usavam a bebida para descobrir qual era a doença de seus pacientes e saber como tratá-
la.
Diversos antropólogos, inclusive, tomaram o chá e descreveram seus efeitos parapsíquicos.
Ainda hoje, várias tribos praticam rituais com o uso da Ayahuasca no Brasil, como as dos
Kampas e dos Kaxinawás, localizadas perto da fronteira com o Peru.
Porém, no dia dois de junho de l992, o conselho decidiu liberar definitivamente a utilização do
chá para fins religiosos em todo o território nacional. Segundo a então presidente do Confen,
Ester Kosovsky, “a investigação, desenvolvida desde l985, baseou-se numa abordagem
interdisciplinar, levando em conta o lado antropológico, sociológico, cultural e psicológico, além de
análises fitoquímicas”.

Riscos à saúde
Pode haver sensação de medo e perda do controle, levando a reações de pânico. O consumo do
chá pode desencadear quadros psicóticos permanentes em pessoas predispostas a essas doenças
ou desencadear novas crises em indivíduos portadores de doenças psiquiátricas (transtorno
bipolar, esquizofrenia).
Ayahuasca e a expansão do consumo
É crescente o uso da Ayahuasca, inclusive nas Américas e Europa (Callaway & Grob, 1998) o que se
deve a vários fatores: o volume de publicações literárias de impacto bem como a mídia do
depoimento de pessoas famosas (Cazenave, 2000); os "Works" da seita Santo Daime em diferentes
países; a facilidade de aquisição de pacotes de turismo, o que por muitos é conhecido por "drug
tourism" onde os usuários, em busca de experiências novas, aventuram-se por expedições
floresta adentro onde são realizados rituais em que é convidado a beber a Ayahuasca,
geralmente não inclusa no preço inicial. Tais pacotes podem girar por volta de U$1100 a 1300, o
que não é tão caro se comparado a uma sessão de Ayahuasca que pode sair por U$800 no
"underground" norte americano, conforme aferidos na internet. Alguns destes sites dizem que o
pacote não inclui o uso da beberagem e que não se trata de "Ayahuasca tourism", no entanto,
recomendam, paradoxalmente, que as pessoas se abstenham de alimentos que possam levar a
interações medicamentosas com os IMAO.
O crescente número de indivíduos que vem experimentando a Ayahuasca de maneira
descontextualizada, visitas a seitas com o único intuito de conhecer a bebida, e a atual
possibilidade de se usar a Pharmahuasca: combinação sintética dos ingredientes psicoativos da
Ayahuasca (Ott, J. 1994; Ott, J. 1999). Outra forma crescente de se usar a combinação de ingredientes
ativos da Ayahuasca é por meio da "Anahuasca", (Ayahuasca borealis), ou seja, combinação de
plantas que produzem resultados semelhantes: esta possibilidade leva a incontáveis combinações
de plantas que poderiam produzir, em diferentes graus, o "Efeito Ayahuasca" (Ott, J; 1999).

Dos Incas ao sincretismo cristão


Para a maioria das culturas pré-colombianas o uso de plantas e ervas com substâncias de
efeito psíquico era sagrado. Através delas estes povos entravam em contato com o Divino. As
‘drogas’ eram, neste contexto, um fator de integração coletiva e de evolução individual.
O uso ritual das “plantas de poder” nas Américas hoje em dia pode ainda ser observado em
vários cultos e religiões sincréticas provenientes desta antiga tradição cultural de nosso
continente: o peyolt nos EUA, a Jurema na caatinga nordestina, o San Pedro e a Coca na
Bolívia e no Peru, as inúmeras sementes mexicanas (Ololiuhqui/Tlitlietzen, Mescal Beans e as
Colorines) e os diversos tipos de cogumelos alucinógenos e espécies de Datura (Solanácea) são
alguns dos exemplos mais conhecidos do uso religiosos e/ou iniciático das drogas hierobotânicas
em comunidades ameríndias.

Mitologias:
Segundo uma lenda, com a invasão espanhola, o príncipe Atahualpa se rendeu e foi
escravizado, mas o príncipe Ayahuasca refugiou-se na floresta amazônica e o uso do chá
permaneceu sendo divulgado no Peru, na Bolívia e no Brasil.

Depoimento: eu bebi o Santo Daime


RICARDO FELTRIN
Calculo ter tomado Santo Daime cerca de 50 vezes em minha vida. A primeira experiência foi
em agosto de 1990. A última, em janeiro de 2000. Sempre tive, desde pequeno, interesse por
religiões. O daime me atraiu porque eu estava cansado de ouvir supostos mestres me dizendo
como agir e viver. Além disso, cada religião costuma criar seu sistema filosófico. Nas religiões que
conheci e visitei, pelo menos, sempre foi assim. Só que, pela doutrina do daime, o verdadeiro
mestre é a bebida.
Claro que há os padrinhos e madrinhas em cada igreja, que em tese detêm o conhecimento.
Suas palavras têm poder na comunidade e são eles que comandam os rituais. Mas até mesmo os
líderes estão submetidos ao poder da bebida.
É muito difícil descrever os efeitos do daime. Sempre li e ouvi vários relatos em que
predominavam casos de enjôos, vômitos e até diarréia, provocados nas horas seguintes à sua
ingestão.
Esses relatos decerto são verdadeiros: vi pessoas esgoeladas de tanto vomitar, pálidas, às vezes
até meio "esverdeadas" devido às reações. Também ouvi relatos de pessoas que conseguiram
uma garrafinha de daime e o beberam, misturados a álcool e rock. Jamais faça isso: os efeitos
serão devastadores, traumáticos e, segundo a doutrina, merecidos: lugar de tomar daime é na
igreja, repetem sempre os seus adeptos.
Bem, mas seja lá qual for o motivo, jamais tive qualquer reação negativa com o daime. Claro,
sempre há um enjôozinho aqui ou ali, mas nada que me levasse às "vias de fato".
Curioso é que em todas as vezes que bebi, fui preparado para levar "peia". É o nome usado
quando alguém passa muito mal nos rituais. Nunca tive "peia". Seja lá qual for o motivo dessa
benção, nunca passei mal. Talvez por sempre ter obedecido ao conselho de, desde três dias antes
de tomar o daime, me abster de bebidas alcoólicas, sexo e carne.
Nunca tive nem sequer uma má experiência. Pelo contrário: só tive sensações e visões
maravilhosas, que não são possíveis de descrever (escrever). Vi "coisas" inenarráveis e ouvi sons
diferentes de tudo que já conhecia; também recebi muitas "respostas" para minhas muitas
dúvidas existenciais durante os rituais.
É isso: o daime parece "disparar" algum mecanismo que joga parte de nosso lado mau para
fora. Julgar o próximo, a violência mental que todos nós temos, a agressividade, às vezes até
tristezas e fobias, traumas antigos... Tudo isso surgia para mim nos rituais, na forma de imagens
e sensações. Na verdade, eu sentia que estava sendo feito algum tipo de "faxina" em
minha alma ou mente.
Em mais de uma vez, aliás, me senti tão bem após 12 horas de ritual que queria mais. Era um
estado de graça, uma sensação de felicidade que se prolongava por horas após os rituais. Acho
que, como tive formação cristã e o daime é eminentemente cristão, me sentia muito à vontade.
E a "limpeza" também era física: nos três dias seguintes à ingestão da bebida ia com uma
freqüência muito maior ao banheiro. Nada de desarranjo. Limpeza intestinal mesmo. Chegava a
perder até três quilos após os rituais (logo recuperados com uma alimentação cronicamente
incorreta).
Eu já bebia daime e participava de rituais esporadicamente, como convidado, desde 90. Mas em
99 decidi entrar de fato para a igreja. Apresentado por um membro fardado da igreja, Oswaldo
Guimarães (que hoje mora em plena floresta amazônica, no Céu do Mapiá, Acre), fui recebido na
igreja Céu de Maria, que fica próxima ao pico do Jaraguá, em SP. Tornei-me um adepto "oficial",
ou um "soldado da rainha", como os fiéis costumam dizer.
Durante esse ano fiz praticamente todos os rituais e "concentrações" (rituais menores, de três ou
quatro horas, celebrados a cada 15 dias). Calculo ter bebido uns 5 litros de daime em 12 meses.
A verdade é que em janeiro do ano passado tomei a bebida pela última vez. Seja pelas
exigências de minha vida profissional, pela dificuldade de horários ou por alguma mudança
interior até hoje imperceptível, acabei me afastando. Hoje só tenho boas lembranças e muita
gratidão, desse período.

PARTO COM DAIME


Na Colônia Cinco Mil impressionava-me o fato das crianças pequenas e também as mulheres
grávidas tomarem o Daime. Ajudar as crianças a nascerem num parto com Daime foi para mim
uma experiência marcante.
O parto se realiza da seguinte maneira; o Daime é servido à parturiente em doses de um pouco
mais de meio copo e em quantidade menor para as duas ou três mulheres que acompanham o
trabalho.
Imediatamente as acompanhantes começaram a cantar o hino Sol, Lua, Estrela do Mestre Irineu
até se completar o nascimento, quando o bebe é colocado sobre a barriga da mãe até que o
cordão umbilical para de pulsar para que seja cortado. Para a placenta sair, é rezando uma
oração específica acompanhada de uma massagem na região da barriga.
Estive presente em casos em que a criança estava sentada e não conseguia nascer e quando a
mãe tomava o Daime, a criança desvirava e nascia na posição correta. Outra mulher, que se
tornou muito minha amiga, Vera Viana, teve duas filhas de cesariana e grávida do terceiro filho
optou por um parto normal. Depois de três dias tomando Daime, Vera foi recompensada com um
belo garoto, considerado o filho do milagre, porque os médicos consideravam impossível e de alto
risco um parto normal. Judá, nome que o menino recebeu de uma miração que seu pai teve com
o Santo Daime, foi batizada pelo Padrinho Sebastião.
Todas essas vivências me incentivaram a tentar em mim mesma o parto normal com o Daime,
quando estava morando em Boca do Acre no Amazonas e era Diretora da Casa da Cultura do
Município, colaborando na administração geral do seringal Céu do Mapiá.
Há 14 anos atrás fiz uma cesariana de minha filha Luciana; os médicos achavam que eu tinha a
bacia muito estreita, que não dava passagem para um nascimento normal. Sofri muito com a
anestesia, além de não participar em nada do sucesso de ser mãe.
Relato agora o que para mim se tornou a experiência mais importante e emocionante que tive
com o Santo Daime.
No dia 22 de dezembro de 1986, exatamente às cinco horas da manhã, me surpreendi ao
acordar e notar que a bolsa de água tinha arrebentado. Tínhamos combinado, eu e Marco, meu
marido, que tomaríamos o Daime, mas devido aos meus antecedentes e por precaução iríamos
para o hospital, por sinal o único que existia no local.
Comecei a ingerir o líquido às sete horas da manhã, e a partir daí de meia em meia hora uma
nova dose. Lembro que tomei quase um litro, sempre deixava um pouco no copo, no que
obrigava Marco a tomar comigo todas as doses.
Sentia as contrações se acelerarem paulatinamente, nunca tinha sentido aquilo, de forma que as
duas horas da tarde, já sofrendo muito, me aliviava com as mirações. Tinha a impressão de que
iria abandonar o corpo e não voltar mais, a visão de várias pessoas da minha família que já
tinham morrido e principalmente meu pai falecido há 26 anos, me assombrava com medo da
morte. O consolo veio ao me lembrar do que o Mestre Irineu dizia:
Mulher que toma Daime não morre de parto.
O daime parecia que tinha reunido as pessoas certas para me darem assistência, a começar
pelo médico Dr. José, diretor do Hospital, pessoa espiritualizada e competente, a amiga Dorinha
que muito me massageou, Sônia, a dentista do hospital que em minhas mirações parecia irradiar
raios laser pelos seus olhos azulados, sua assistente Benízia que ficou de prontidão desde as
primeiras horas de sofrimento, e naturalmente meu incansável companheiro Marco, que sempre
me encorajava a tomar mais Daime, a fim de levarmos a experiência até o fim.
As enfermeiras do hospital olhavam assustadas ao me verem tomar aquele líquido de cor
amarelo-pardo. Naquele dia o Hospital estava deserto nenhum doente dando entrada, nem
mulher para dar a luz; a festa era só para mim. Às 16:00hs. O médico já não acreditava que o
Daime resolvesse o parto, ele conversou com Marco para me preparar para uma cesariana.
Marco então não vacilou, chegou para mim com uns três dedos de Daime e disse:
- Vera se você não tomar, vai entrar na faca.
Nessa hora eu já não agüentava mais as dores e disse que era impossível, pois estava mirando
demais, os objetos dançavam na minha frente e tudo brilhava. Ao mesmo tempo as palavras de
"entrar na faca" me transportaram para 14 anos atrás o horror da cesariana, mas não tinha
coragem de tomar nem mais uma gota. Nesse momento tive uma miração com Nossa Senhora
me entregando o copo e dizendo:
Tome minha filha, que é a sua última dose.
Acreditando no que via e ouvia, peguei o copo e tomei. Logo em seguida entrei em trabalho de
parto e a criança começou a coroar. Era chegada à hora, Marco cantava o hino Sol, Lua, Estrela,
queria me ajudar, mas só dependia de mim. Havia uns ferros perto de minhas pernas e a
orientação era puxar os ferros e fazer força na hora que viesse a dor. Na primeira tentativa
vomitei o Daime que saiu como um jato pela boca e nariz, logo me retraí sentindo a cabeça da
criança indo e vindo.
A miração aumentava: vi a sala se enchendo de gente (espíritos), e uma legião de anjos
flutuando. Eu me encontrava presente e distante ao mesmo tempo, me sentia equilibrando numa
corda fina que puxava para lados opostos, de um lado a vida e do outro a morte, alguém me
soprava no ouvido :
- Dê a vida, vamos, é agora!
Naquele instante prometi tudo a Nossa Senhora da Conceição, imagem que me acompanhava,
pedia para ter força para atravessar, pois toda a vez no meio da contração forte, vomitava o
Daime e me retraia.
De repente a sala se encheu de luz, parecia que o próprio Sol nascia ali dentro. Outra vez ouvi:
É dessa vez, vamos!
Então botei força e lá veio a dor rasgando por dentro, impressão de que meus ossos estavam
quebrando. Era um momento doloroso e maravilhoso, principalmente quando senti a cabeça da
criança sair, estimulada pela voz do Dr. José, que me parecia "atuado", conduzindo o pequeno ser
pelas suas mãos:
Atenção que teu filho está nascendo é o teu filho que está chegando, mais um pouco de força,
Vera, ela está nascendo!
Foi o tempo de vomitar o último Daime para a criança vir ao mundo, nesse momento vi que
todos os espíritos que estavam me assistindo se perfilaram e assistiram o espírito que ia
encarnar na criança, um facho de luz invadiu tudo e o neném chorou, senti uma felicidade
indescritível, estava em harmonia total com o mundo, flutuando em nuvens de luz. Assim nasceu
Veraluz.
Marco emocionado fotografava tudo e assim que a criança saiu da sala, pingou gotinhas de
Daime em sua boca, conforme costume do Povo Juramidam. Fiquei em estado de graça por dois
dias, não tinha fome ou sono, tinha a sensação de plenitude e a certeza de que o daime
realizava verdadeiros milagres no parto das mulheres.
Posteriormente travei amizade com Frederico Arruda, professor de farmacologia da Universidade
do Amazonas que juntamente com a psicóloga Luíza Garnello e outros membros de sua equipe,
realizaram experiências com o Daime em ratinhas prenhas. Verificaram que de fato, as ratinhas
que tomavam Daime tinham um parto mais rápido e os filhotes nasciam mais espertos do que as
ratinhas que não tomavam Daime. Naturalmente isso não me surpreendeu, mas comprovou
cientificamente os efeitos benéficos do Daime no caso de gravidez.

Chá do Santo Daime 'ameaça combate ao narcotráfico', diz governo Bush


Alberto Gonzáles
Para Gonzáles, chá ameaça combate internacional ao narcotráfico.

O governo americano considera o chá do Santo Daime "um alucinógeno que altera o
funcionamento da mente e ameaça causar danos irreparáveis aos esforços internacionais de
combate ao tráfico de narcóticos transnacional".
A afirmação foi feita no texto de um recurso apresentado nesta quinta-feira pelo secretário da
Justiça, Alberto Gonzáles, à Suprema Corte - segundo a agência de notícias Associated Press.
No documento, Gonzáles pede que a Suprema Corte proíba o uso da ayahuasca, chá do Santo
Daime importado do Brasil, que havia sido liberado anteriormente por tribunais em vários
estados.
O governo americano está travando desde 1999 uma batalha legal com a representação
americana do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal, baseado no Brasil, que possui
cerca de 140 membros nos Estados Unidos.
Liberdade religiosa
Os fiéis da seita argumentam que o chá é um componente indispensável de seus rituais religiosos.
Em novembro, o grupo obteve a vitória mais recente, no tribunal de recursos de Denver.
Segundo a decisão, a liberdade religiosa garantida pelas leis americanas possibilita ao centro
utilizar o chá em seus ritos.
Mas o governo Bush não desistiu no caso, e, em dezembro, conseguiu que a Suprema Corte
suspendesse uma autorização que permitia que o chá fosse usado pelos fiéis da seita logo após
vitórias na Justiça.

Fontes: História da Ayahuasca - Profª Drª Ana Cecília Marques e Hamer Nastasy Palhares
Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo
Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD) da Universidade Federal de São Paulo
Equipe Álcool e Drogas sem Distorção
http://www.uol.com.br/folha/mundo/2001-religiao-santo_daime-depoimento.shtml
Artigo do Dr. Luiz Otávio Zahar http://www.ippb.org.br/modules.phpop=modload&name=News&file=article&sid=3890
Considerações sobre Ayahuasca na Lista Voadores - www.voadores.com.br
A ayahuasca como terapêutica para o uso de drogas - http://www.unir.br/~cei/artigo22.html;
Plantas de poder - http://www.terramistica.com.br/index.phpadd=Artigos&file=print&sid=253 ;
The Scientific Investigation of Ayahuasca - http://www.erowid.org/chemicals/ayahuasca/ayahuasca_journal3.shtml ;
Descrição e efeitos das substâncias químicas na planta - http://www.adroga.casadia.org/news/usoritual.htm ;
Guia basica sobre la Ayahuasca - http://www.ideaa.org/it/guia_basica_sobre_ayahuasca.htm

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