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ESPIRITUALISMO ECUMÊNICO UNIVERSAL

Uma doutrina de vida

Senhor da Yoga
(Estudo do Bhagavad Gita)

“Assim, quando o corpo mortal se vestir com o que é imortal e quando o que morre se vestir com o que
não pode morrer, então acontecerá o que as Escrituras Sagradas dizem: a morte está destruída; a vitória
é total”

(Paulo – Carta aos Coríntios 1 – Capítulo 15 – versículo 54).

Este livro contém textos de palestras espirituais realizadas por incorporação pelo
amigo espiritual JOAQUIM DE ARUANDA e organizados por FIRMINO JOSÉ
LEITE.e MÁRCIA LIZ CONTIERI LEITE

Os ensinamentos deste livro seguem as bases da Doutrina Espiritualista Ecumênica Universal.


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Capítulo II – O caminho do discernimento

11. Estiveste lamentando-te por aqueles que não o merecem. Todavia,


pareces falar como um sábio. Só que os verdadeiros Sábios não se
lamentam nem pelos vivos nem pelos mortos.

O Bhagavad Gita conta a conversa entre Sri Krishna e Arjuna no campo de batalha, onde este
último iria confrontar-se com seus parentes pela disputa do trono que havia sido roubado dele por sua
parentela.

Arjuna inicia o diálogo com o mestre (capítulo 1 e parte do 2) expondo a Krishna o porque não
queria lutar contra seus parentes. Alegava que não seria justo derramar sangue de por coisas materiais,
que a vitória não traria nada de “bom” a não ser posses materiais.

Ou seja, Arjuna se lamentava dizendo seria infeliz se tivesse de lutar como Krishna o incitava a
fazer. Em resposta o mestre afirma: você esteve lamentando-se e quando o fez parecia um sábio, mas o
verdadeiro sábio não lamenta nem pelo vivo nem pelos mortos.

Para entendermos este ensinamento que o “Bendito Senhor” passa ao discípulo pergunto: o que
é lamento, o que é lamentar-se pelos outros?

Participante: Primeiro é não concordar. E em não concordando dizer que aquilo


não deveria acontecer.

Perfeito. Lamentar-se é uma queixa. Mas, além da queixa, o lamento traz consigo a sensação de
sofrimento.

O lamento, portanto, é uma queixa que se faz de uma situação onde se tem a sensação de
sofrimento. É uma declaração da constatação de uma injustiça que causou um ferimento. Lamentar-se é
declarar que alguém é vítima porque foi ferido por uma injustiça.

Krishna afirma que quem age assim parece um sábio. Por que quem lamenta parece um Sábio?

Participante: Porque quem lamenta denota um conhecimento do que é justo.

Este é o primeiro detalhe no lamento. Aquele que se lamenta é considerado por si e pelos outros
como sábio porque sabe o que aconteceu. Na verdade quem se lamenta apenas acha que sabe, mas
iludido pelo ego tem a plena convicção de que sabe.

Se alguém afirma alguma coisa sobre outra pessoa, objeto ou acontecimento, o ser humanizado
agirá com sua suposta sabedoria afirmando que tem certeza de que o ego lhe diz é verdadeiro, é real. É
neste “conhecimento”, que é ilusório mas que o ser humanizado imagina que é real, que se fundamenta
o lamento.
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Portanto, qualquer lamento nasce de uma sabedoria. O mundo inteiro lamentou o avião que
bateu nas torres e as destruíram. Por que? Porque o mundo inteiro sabe que não se pode fazer aquilo,
que é “errado” matar.

Este é o primeiro aspecto que leva ao lamento humano: a sabedoria cultural. Todo lamento surge
de uma verdade humana, de uma cultura humana.

Você não se lamenta pelo que não sabe. Você só se lamenta quando raciocina sobre um
acontecimento e chega a uma conclusão e nela constata um sofrimento originado numa injustiça.

Por isso parece sábio quem se lamenta, mas o mestre diz que o verdadeiro sábio não se
lamenta. Vamos chegar neste aspecto, mas antes precisamos nos aprofundar mais na sabedoria que
leva ao lamento.

Há uma outra sabedoria humana envolvida no lamento que precisamos compreender antes de
entender o ensinamento do “Bendito Senhor”. Para compreendê-la, pergunto: se você passar frente a
uma pessoa passando fome e não se lamentar o que dirá a sociedade sobre você?

Participante: Que eu sou frio, que não tenho sentimentos.

Ou seja, existe um padrão emocional que lhe é cobrado pela humanidade frente a determinados
acontecimentos.

Portanto, além da sabedoria cultural (ter conhecimento das coisas) o ser humanizado também
possui um saber emocional. Sábio emocionalmente é aquele que sofre quando a humanidade acha que
deveria sofrer e que se alegra quando isto for cobrado pelos padrões humanos.

O lamento, então, além de ser fruto de uma sabedoria cultural também nasce de um saber
sentimental. Ou seja, dos padrões sentimentais do planeta.

Compreenda que existem situações onde você, mesmo não querendo, é obrigado a sofrer para
poder ser considerado como um ser humano. Aquele que sofre, que vê sofrimento nos acontecimentos
onde a humanidade exige que assim o seja, é, então, considerado um sábio, porque ele sabe a cultura
do planeta.

Agora, eu faço uma pergunta. Se você vê uma criança com fome na rua o que pode fazer para
ajudá-la?

Participante: Abrigá-la, alimentá-la, dar carinho e proteção.

Tudo isso realmente ajuda a resolver o “problema” daquela criança. Mas o seu sofrimento, em
que pode ajudar aquela criança? Nada. Pelo contrário, piora.

Digo isso porque quando alguém está sofrendo e outro “joga” mais sofrimento sobre ele, a dor
aumenta. E você sabe disso. Sabe que quando está sofrendo e alguém se lamenta ao seu lado a sua
dor piora, mas não consegue deixar de agir assim com os outros.

Então veja. Esta sabedoria sentimental (sofrer quando os padrões exigem) é simplesmente um
conceito do planeta, mas que não traz nenhuma “melhora” para o próximo.

Você tem que sofrer ao ver uma pessoa mutilada? Por que? Tem que cuidar dela, ajudá-la,
encaminhá-la a um médico, mas não precisa sofrer.
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Lembra-se da parábola do “Bom Samaritano”? O sacerdote e o levita se apiedaram do homem
que tinha sido agredido, mas nada fizeram. O samaritano ao contrário, pôs mãos à obra e socorreu
quem estava ferido e por isso foi considerado como “exemplo” por Cristo.

A piedade ou sofrimento com a dor dos outros não ajuda em nada a pessoa que está passando
por uma vicissitude negativa em sua existência. Pelo contrário, atrapalha.

Quer um exemplo? Quando você está “por baixo” e chega uma pessoa e diz “coitadinho, como é
azarado, injustiçado, perseguido...”, você não piora? Agora, quando alguém lhe “levanta a moral”
incitando-o a sair daquela situação chamando-o para passear, se divertir, esquecer a mágoa, não
melhora?

É por isso que Krishna diz que o verdadeiro sábio não se lamenta por nada, nem pelo vivo nem
pelo morto, porque ele não sofre ao ver uma cena onde a sabedoria (cultural e emocional) do planeta diz
que ele tem que sofrer. Pelo contrário ele age. Como o bom samaritano da parábola ensinada por Cristo
age buscando auxiliar, resolver o problema e não perde tempo sofrendo.

Mas, como deixar de sofrer onde se imagina que se tem que sofrer? Como agir em auxílio ao
próximo sem sofrimento? Entendendo os desígnios de Deus.

O que é uma criança passando fome? Para vocês é um acontecimento, um fato.

Para o ser humanizado todos os fatos da vida são gerados no momento presente, ou seja, são
vivenciados sem ligações a coisas do passado. Um acontecimento, um fato, para vocês algo que surge
do nada ou do azar, da sorte, da casualidade, que são nada, pois não existem.

No entanto, tenha a certeza: não existe neste planeta acontecimento que não se vincule a fatos
anteriores na existência do espírito. Nada que se sucede na vida do ser encarnado é um acontecimento
sem vínculo anterior. Isto porque a vida é uma sucessão de carmas, ou reações a ações anteriores e não
formada por acontecimentos ou fatos sem precedentes que levem a eles.

O que você esta passando hoje foi originado no que você mesmo causou antes, ou seja, é
apenas a reação a uma ação anterior, o efeito perfeito gerado por uma causa. Buda ensina assim: quer
saber quem foi você ontem? Veja quem é hoje. Quer saber quem será você amanhã? Veja o que faz
hoje.

Portanto, aquela criança não está ali por uma ação externa. Ela não está ali por negligência do
governo, por falta de caridade da sociedade, mas está ali por um carma do espírito. Aquilo é o que o ser
universal precisa e merece passar.

Esta cultura, entretanto, não lhe leva a não ajudá-la, mas lhe leva a compreender a situação.
Quando esta nova compreensão estiver presente na humanidade, ao invés de sofrer porque a criança
está passando a fome, todos louvarão a Deus por estar dando ao espírito a oportunidade da elevação
espiritual.

Mas não será por isso que a humanidade deixará de socorrer aquela criança . Cada um fará a
sua parte ajudando-a, mas fará amorosamente, com felicidade por participar do amor de Deus e não
participando de um acontecimento errado, de um ferimento, de uma mágoa, onde teria que sofrer.

A humanidade ajudará o espírito encarnado na criança, mas terá a consciência que aquela fome
foi escolhida pelo próprio ser universal antes do nascimento como raiz do seu “livro da vida”. Ao
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abandonar o padrão humano e vivenciar o espiritual, a humanidade terá consciência do que está
ensinado em O Livro dos Espíritos: o espírito escolhe antes do nascimento a natureza da sua prova.

Por isso viverá o acontecimento com uma nova cultura, ou seja, o ser que anima aquela criança
escolheu antes de nascer vencer algumas coisas e para que a vitória ocorresse, Deus escolheu a fome
como instrumento da provação.

Atingido este padrão cultural, o lamento extingue-se, ou seja, o padrão emocional não será mais
o do sofrimento, mas o da vivência da glória de Deus, da emanação do Senhor dando a quem precisa o
que necessita. É isto que ensina Krishna quando afirma que o verdadeiro sábio não se lamenta nem
pelos vivos nem pelos mortos.

Agora, volto a repetir, isso não pode lhe levar à inação, ou seja, passar por uma criança e
apenas dizer que o espírito precisa e merece, pois se você está passando por ali, você também precisa
e merece ver aquilo e é o seu carma ajudar aquela criança. Esta criança é um espírito que pode já ter lhe
ajudado muitas vezes na eternidade e agora, pela graça divina, chegou a oportunidade de retribuir.
Portanto, o acontecimento também é uma prova para você.

A única coisa que a consciência espiritualizada (aquela que compreende a “vida carnal” como
instrumento da realização espiritual) lhe tira é a obrigação de sofrer, mais nada. O ser espiritualizado
ajuda o próximo, leva a criança para casa, dá banho, comida, educação ou até a cria como sua filha,
mas em momento algum sofre ou lamenta pela situação que o espírito encarnado está vivendo.

Ele faz o que quiser ou puder fazer, mas não sofre, porque sabe que quando se lamenta com
alguma coisa está acusando Deus de ter cometido um ferimento através de uma injustiça.

É por isso que Krishna diz que o verdadeiro sábio não se lamenta por nada, mas se regozija com
o Pai em todas as situações. “Louvado seja Deus porque hoje eu não tenho comida para comer”...
“louvado seja Deus que o ladrão entrou na minha casa e me roubou”.... “louvado seja Deus que o que eu
tenho para viver hoje é isso”.

Nunca afirmei que o ser espiritualizado deve parar de trabalhar materialmente, de buscar comida
ou até desistir de querer as coisas materiais, pois isso seria uma ilusão. O que sempre afirmei é que
quando o ser se espiritualizar passará a compreender toda a vida a partir de Deus e, com isso, deixará
de se lamentar pelas coisas da vida.

Aprenda que o seu lamento é a declaração expressa de que você não concorda com a situação
que Deus fez com todo amor e carinho para que você pudesse evoluir.

Participante: Na teoria isso é muito bonito, mas na prática é muito difícil. Chega na
hora nos deixamos levar pelo sofrimento e pelo lamento...

Por que você se deixa levar pelo lamento?

Participante: Não sei dizer. Estamos ouvindo estes ensinamentos há algum tempo,
mas chega na hora...

Deixe-me criar um exemplo que lhe explique o que está passando. Crie um passarinho dez anos
aprisionado numa gaiola e um belo dia abra a porta da gaiola e veja se ele voará. Com certeza não, pois
os passarinhos que vivem a vida inteira no cativeiro nem sabem que estão presos, por isso não buscam
a saída, mesma que ela esteja aberta.
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É por isso que chega na hora não consegue por em prática: você nem sabe que está presa.
Você nem sabe que é uma prisioneira.

Você é uma prisioneira da humanidade do planeta Terra, ou seja, prisioneira da sabedoria


cultural e sentimental do planeta. Imagina que a cultura que vive é sua e que as emoções que vivencia
nascem no seu interior, mas isso é ilusão.

Se a verdade do planeta lhe diz que não pode gostar de determinada coisa passa a não gostar
imaginando que isto é “certo” para você, mas não entende que, na verdade, é uma escravidão a padrões
pré-fabricados, que já existiam muito antes de você nascer e aos quais se subordinou. Eles não foram
gerados por você, criados como fruto do seu entendimento, mas adquiridos por osmose, por se achar
humano.

Participante: Acho que já estamos tendo consciência de que somos prisioneiros,


mas é que o padrão está tão arraigado dentro de nós, que chega na hora não
conseguimos estancar o fluxo da emoção. Hoje acho que já consigo sofrer menos,
mas ainda não consigo parar de me lamentar.

Por isto este ensinamento. Se você hoje já consegue constatar que não deveria sofrer, o próximo
passo é, então, parar de lamentar-se.

12. Sabe, Arjuna, que nunca houve tempo em que eu (SER) deixasse de
existir, nem tu, nem esses reis, e jamais deixaremos de existir no futuro.

O espírito é eterno. Este é o ensinamento que todo aquele que acredita no ser universal acredita.
O espírito é gerado por Deus e ‘viverá’ por toda eternidade.

Vocês sabiam disso? Então, eu pergunto: porque vivem a encarnação com a pressa em realizar
alguma coisa? Se vocês acreditam no ser universal como eterno deveriam saber que possuem toda
eternidade para alcançarem aquilo que desejam e, por isso, não deveriam ter pressa em realizar nada...

Participante: Concordo com o senhor que vivemos com pressa em realizar, mas
algumas realizações que buscamos podem ser consideradas ‘boas’, como por
exemplo a busca da elevação espiritual, não?

O que importa, como já vimos, é a intenção com que se vive e não o ato em si. A sua pressa em
buscar a elevação espiritual não se fundamenta no desejo de interligar-se amorosamente com Deus,
mas no medo da morte, medo do ‘julgamento’, medo do que sucederá se não realizar a elevação
espiritual. Por isso, mesmo esta pressa não pode ser considerada válida.

Aliás, o espírito humanizado tem pressa em conquistar coisas durante a vida material, mesmo
que ela não esteja ligada à sua Realidade espiritual, justamente por isso: por ter medo da morte. Quer
conquistar elementos materiais porque acha que o tempo está passando. Acredita que precisa
rapidamente conquistar os bens materiais porque a sua ‘vida’ tem um limite.

O ser humanizado, mesmo aquele que acredita na existência eterna, quer conquistar
rapidamente o bem material porque acredita na morte, ou seja, vive com a certeza de que sua ‘vida’
chegará ao fim. Mas, a existência do espírito não acabará nunca, pois não há fim para a vida do ser
universal.
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Participante: Acho que neste caso entra aquilo que já estudamos: a busca do
prazer. Temos pressa em realizar coisas para poder aproveitar o máximo possível
essa ‘vida’ tendo todo prazer que puder.

Exatamente. A pressa em realizar-se materialmente é para gozar a coisa material, o prazer


material, a felicidade material. Esta é a pressa do ser humanizado.

Mas, por que há esta inconsciente pressa?

Participante: Por causa do medo da morte?

Não, isto é consciente. Todos buscam entrar no gozo de determinados prazeres o mais
rapidamente possível porque imaginam que a vida se extinguirá. Não é disto que estou falando, mas de
uma motivação inconsciente que existe no ser universal para que ele tenha pressa em locupletar-se com
o bem material.

Portanto, volto a perguntar: por que, inconscientemente, o ser humanizado tem pressa de
conquistar os desejos oriundos das paixões geradas pelo ego?

Porque sabe que isto é ‘errado’, é contrário à elevação espiritual. O ser universal sabe que
desfrutar do bem material (a satisfação de ver seus desejos atendidos) não o leva a aproximar-se Deus,
mas não quer abrir mão deste prazer. Por isso tem pressa em realizar-se como humano: ‘vamos gozar
logo porque senão amanhã chega a morte (o fim da encarnação) e eu tenho que me contentar em ser
feliz incondicionalmente’.

Sabe por que você está renascendo, ou seja, está preso à roda de encarnações? Para poder
gozar o prazer, que é caracterizado pela satisfação de seus desejos, que são frutos das paixões que o
ego cria e às quais você está aprisionado.

O espírito, liberto da ação do ego, pede com consciência a elevação espiritual, mas, mesmo na
erraticidade, no seu inconsciente, existe ainda o apego ao mundo material, o desejo do prazer. Mesmo
liberto da ação do ego, o ser universal de posse da sua consciência espiritual está apegado à satisfação
de seus desejos e, por isso, deseja renascer sempre.

Enquanto o ser universal não eliminar este desejo, ele estará agindo no inconsciente. Isto ocorre
quando ele está encarnado (ligado a um ego) ou não, porque o espírito é sempre o mesmo. Por isso
todos os mestres ensinaram que o caminho para se atingir a Deus passa pelo desapego às coisas
materiais, a renuncia ao prazer.

Sabe por que vocês não aproveitam a encarnação para a realização da evolução espiritual?
Porque o que querem mesmo nesta ‘vida’ é gozar o prazer. Esta é a realidade da grande maioria dos
seres encarnados, mesmo daqueles que dizem querer elevar-se, mas que ainda aplicam valores
(paixões) às coisas do mundo material. E, para conseguir a realização deste desejo que está no
inconsciente de cada um, precisam estar encarnados.

Vocês se lembram dos momentos de ‘sofrimento’ de suas ‘vidas’? Claro que não. Sempre se
lembram dos momentos ‘bons’ da vida, ou seja, do prazer que amealharam.

Mas, sabem que há muito mais a se aproveitar, no sentido da elevação espiritual, no momento
da contrariedade do que o da satisfação? Sim, sabem, pois todos os mestres ensinaram que os
momentos de contrariedade são como o fogo que, se bem trabalhado, forja o aço.
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Repare que não estou falando em masoquismo, em querer sofrer, mas em aprender a lidar com
as situações de contrariedade como uma oportunidade de libertar-se do desejo do prazer. Este,
segundo todos os mestres, é o caminho para chegar a Deus e, por isso, o momento de contrariedade é
tão importante para aquele que busca aproveitar a encarnação.

Mesmo assim, mesmo sujeitando-se à perder tão importante instrumento da elevação espiritual,
preferem esquecer os momento ‘ruins’ das suas existências. A não ser quando o espírito tem prazer no
sofrimento. Aí ele quer relembrar para poder sofrer a vontade e, com isso, alcançar o prazer.

A busca constante do prazer torna-se, então, uma obsessão para o espírito e, por isso, surge a
pressa em viver suas paixões.

Mal os seres encarnados entram na adolescência querem se tornar adultos. A primeira


preocupação é em conseguir um emprego; quando isso ocorre quer se casar.

Quando consegue esta ‘realização’, ou seja, o prazer e ter se casado se extingue, cria logo outro
desejo e começa, então, a sonhar em ter um filho. Realizado este novo ‘sonho’ surge logo a pressa em
conseguir um emprego melhor para garantir o sustento do seu rebento.

Neste novo emprego busca ascensão e principalmente estabilidade, pois já começa a sonhar
com a aposentadoria para poder parar de trabalhar e começar a ‘curtir’ os filhos e netos. Tudo vivido ‘fora
de tempo’, tudo feito apressadamente.

E qual o preço desta pressa? Quanto você ‘paga’ por esta pressa?

Participante: Não viver o momento presente...

Exato, você deixa de viver.

Digo isso porque você só tem um segundo para viver. O anterior não mais existe porque já
passou e o próximo só se tornará realidade quando este acabar.

Mas você o vive ‘presente’, o momento de agora, a única oportunidade que tem para viver
atrelado ao passado ou ao futuro. Vivendo desta forma jamais consegue vivenciar o agora.

Ou seja, você passa a encarnação inteira fugindo da vida: vivendo um passado e um futuro que
não existem. E tudo isso por quê? Porque está obcecado em conquistar seus desejos, porque tem
pressa de sentir o prazer antes que a encarnação acabe.

Você troca o ‘presente’, aquilo que existe, que é real, pelo futuro que não existe. Ou seja, deixa
de vivenciar o que existe para viver o que não existe: este é o preço que paga por ter pressa em gozar o
prazer.

Se agora é o seu momento de sair, passear, divertir-se, não se preocupe com emprego,
problema de casa, carreira profissional. Tudo isso deve ser deixado para amanhã, para o momento em
que for presente em sua existência.

Quando o amanhã chegar você viverá estas situações, não agora, mesmo que este amanhã seja
apenas daqui à uma hora ou dez minutos. Hoje, agora, a sua vida se resume àquilo que você está
participando e nada mais.
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Estamos falando em viver um segundo de sua existência por vez, a cada segundo. Este é o
ensinamento que surge quando se entende a eternidade do espírito. O espírito não tem pressa em viver.
Ele não se preocupa em viver o futuro, mas em bem viver cada segundo.

E o que é bem viver cada segundo que Cristo nos ensinou? Guardar bens no céu. Portanto, o
espírito não se preocupa em alcançar rapidamente os acontecimentos da vida para poder buscar o
prazer, mas ‘curte’ cada segundo da sua existência amealhando bens celestes, ou seja,a felicidade
incondicional, a felicidade sublime.

Portanto, você vive ‘bem’, no sentido espiritual, cada segundo da sua existência quando, a cada
um deles, mantém o seu estado de espírito de felicidade incondicional, permanece em paz e harmonia,
existe na graça de Deus.

E, aquele que consegue compreender e vivenciar isso, ou seja, liberta-se do desejo inconsciente
da busca da satisfação através da realização de seus desejos, não tem pressa de que esse momento se
encerre, pois tudo o que ele quer está presente neste segundo.

Aquele que consegue atingir a consciência espiritual vive cada segundo em toda a sua
intensidade. Apesar de ter toda eternidade ele vive profundamente cada segundo.

Parece incongruência dizer que o espírito, que tem toda eternidade para existir, vive
profundamente todo segundo. Parece até algo sem nexo. Quem tem toda a eternidade para existir não
deveria prestar tanta atenção ao momento presente que é tão fugaz, mas, garanto que aquele que
possui a consciência espiritual vive cada segundo como se fosse uma vida inteira, tal a profundidade que
ele o vivencia.

E, exatamente por viver tão profundamente cada segundo, o tempo é sempre ‘curto’, tudo é
sempre rápido, para aquele que vive com a consciência espiritual

Agora, para vocês que estão sempre em busca de viver o futuro, falar em eternidade é falar no
amanhã que está perto. A demora de apenas alguns dias ou mesmo minutos para a realização daquilo
que é desejado, já se constitui numa eternidade.

Isto porque o ser aprisionado à realização de seus desejos tem a ânsia de que o ‘tempo’ corra,
para que ele possa conseguir realizar o máximo possível de suas aspirações e, assim, ter mais prazer.

O ser liberto do vício do prazer não tem ânsia de chegar em lugar nenhum porque ele já é tudo
que pode ser e já está onde quer estar: com e em Deus.

13. Assim como o ser encarnado tem a sua infância, juventude e velhice,
assim também tal ser ressurge como outro corpo. Os sábios nunca se
confundem a respeito disso.

O espírito reencarna diversas vezes e, cada vez que isso acontece, ocorre um aprendizado que
se traduz em uma etapa da vida espiritual. Este é o ensinamento que os espíritas e os espiritualistas
conhecem, mas dele podemos tirar uma outra lição que nem sempre é entendida.
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O Espírito da Verdade ensinou através de Kardec: a natureza não anda em saltos. Levando-se
este ensinamento para o tema desse texto (evolução em etapas) posso afirmar que você precisa
compreender que terá que trilhar o seu caminho de evolução espiritual passo a passo.

Ou seja, de nada adianta você estar aqui hoje e querer estar em outro lugar no momento
seguinte. Para chegar lá será preciso percorrer um caminho, realizar e vivenciar diversas coisas.

A compreensão da necessidade da caminhada é de suma importância para os seres espirituais


que pretendem buscar a elevação espiritual, pois, como vimos no texto anterior, eles têm pressa, querem
tudo para ontem.

Os seres humanizados querem sentir toda a ‘felicidade do mundo’ de uma vez só, mas não
compreendem que ela precisa ser conquistada aos poucos. Não compreendem que para serem felizes
na totalidade dos momentos de sua existência precisam ir conquistando tal estado de espírito passo a
passo trilhando a sua caminhada, ou seja, vivendo a sua vida momento a momento com felicidade,
independente do que esteja acontecendo.

Aquele que depende do acontecimento de amanhã para ser feliz, sempre acabará sofrendo. Isso
porque aquilo com que se sonha para amanhã tem hora certa para acontecer e não ocorre quando o ser
humanizado quer.

Vou explicar melhor. Cite uma nota de dinheiro que tenha valor para você.

Participante: Cinqüenta reais.

Se você pegar esta nota e colocar na mão de um bebê o que ele irá fazer?

Participante: Colocar na boca, rasgar, estragar...

Ou seja, não dará o valor que aquilo tem. Por isso, você não daria uma nota na mão do bebê,
mesmo que ele chorasse e esperneasse para tê-la, não?

Portanto, aprenda: a hora de receber algo ocorre apenas quando quem vai receber souber dar
valor ao que está recebendo e não apenas porque ele quer. Esta é uma verdade do Universo que se
aplica ao mundo carnal, mas também ao espiritual.

Assim como você, Deus não dá uma nota de cinqüenta reais para um bebê porque ele não
saberá valorizar o que está recebendo. Ou seja, o Pai não lhe dará aquilo que você quer enquanto não
souber valorizar o que está recebendo.

Não porque Deus seja ruim, não goste do seu filho ou porque queira vê-lo sofrer, mas Ele não
faz isso porque sabe que aquele espírito irá ‘estragar’ o que estará recebendo porque não sabe dar o
real valor à Sua dádiva. Assim como o pai material que preserva a nota em seu poder para poder
transformá-la em algo útil para o bebê (comprar fraldas, roupas, brinquedos) dando ao filho somente o
que ele precisa no momento, Deus também age da mesma forma com os seres humanizados, os
espíritos que são seus filhos.

Desta forma, o ser humanizado precisa compreender que na sua existência receberá de Deus
tudo que precisa e que pode aproveitar no momento, mas nada será concedido que não tenha utilidade
para o futuro desse filho. Ou seja, Ele dará sempre o que for útil para a sua existência (aproveitável no
sentido da elevação espiritual) e não se sujeitará aos desejos ou caprichos do filho.
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Compreendendo esta máxima universal, o ser humanizado deve, então, aproveitar cada dádiva
do Pai e permanecer feliz com o que recebe, ao invés de resmungar ou chorar (ranger de dentes) por
aquilo que não recebe. Vivendo desse jeito ele caminhará passo a passo, ou seja, se tornará apto para
receber mais coisas.

NOTA: Este é o ensinamento que o Espírito da Verdade traz na resposta à


pergunta 115 de ‘O Livro dos Espíritos’ a respeito da ‘Progressão dos Espíritos’.

115. Dos Espíritos, uns terão sido criados bons e outros maus? ‘Deus criou todos
os Espíritos simples e ignorantes, isto é sem saber. A cada um deu determinada
missão com o fim de esclarecê-los e de os fazer chegar progressivamente à
perfeição pelo conhecimento da verdade, para aproximá-los de si. Nesta perfeição
é que eles encontram a pura e eterna felicidade. Passando pelas provas que Deus
lhes impõe é que os Espíritos adquirem aquele conhecimento. Uns aceitam
submissos essas provas e chegam mais depressa à meta que lhes foi assinalada.
Outros só a suportam murmurando e, pela falta em que desse modo incorrem,
permanecem afastados da perfeição e da prometida felicidade.

Tem muito ser humanizado que, por exemplo, vive numa situação angustiosa e culpa o
desemprego pelo seu sofrimento. Acredita que, se conseguir empregar-se todo o seu sofrimento
acabará. Por isso ora a Deus pedindo a Sua intercessão para que lhe consiga uma ocupação.

Pois bem, ele consegue um emprego. O que acontece depois? Em dois ou três meses já está
brigando com o patrão pedindo aumento salarial. Ou seja, para poder ganhar mais coloca em risco o
próprio emprego recém conseguido.

Realmente este ser humanizado não estava pronto para receber a dádiva do trabalho, pois não
valoriza o seu salário, mesmo que ele seja reduzido.

Sua intenção não era realmente conseguir um emprego, uma fonte de sustento, mas a
realização de um desejo, de uma vontade. E, quando o ser humanizado está preso aos desejos oriundos
das paixões ditadas pelo ego, ele jamais se satisfaz com qualquer coisa que receba do Pai.

Isso se comprova facilmente pela simples constatação de que mal consegue realizar uma
pretensão, ela não é suficiente para fazê-lo feliz. Sempre nova condicionalidade para ser feliz surgirá e
este ser humanizado se deixará levar pelo novo desejo que o ego criará e se imaginará ‘um grande
sofredor’ e justificará tal sofrimento no salário que recebe.

Tem seres humanizados que querem acabar com a doença. Quando acamados rezam a Deus
pedindo saúde. Mas, logo assim que a recebe do Pai, retiram os ‘freios’ da sua vida entregando-se
novamente às causas da doença.

Por isso Deus não pode dar àquele que não está pronto para receber. Se você está
desempregado, tenha certeza de que apenas quando aprender a valorizar um emprego sem se entregar
gananciosamente às paixões que o seu ego lhe induz, poderá receber; se está doente, saiba que apenas
quando souber conter os ímpetos das paixões humanas que, muitas vezes, criam carmas relativos à
saúde física, poderá ser curado.

Portanto, aprenda a confiar em Deus, ou seja, compreenda que o Pai não dá nada antes da
hora, e trabalhe a si mesmo para libertar-se da sensação de ‘sofrimento’ que o ego lhe dá. Vivendo
felicidade incondicional oriunda da fé (confiança e entrega) em Deus, o ser humanizado compreenderá o
real valor do que está recebendo (o desemprego, a doença) e, assim se tornará apto a receber mais.
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Se o ser humanizado não compreender que o seu sofrimento é apenas fruto de um desejo não
realizado (‘queria um emprego, não tenho e por isso sofro’) jamais poderá alcançar a universalidade,
pois estará sempre preso a um individualismo: à vontade gerada pelo ego. Se Deus lhe realizasse esse
desejo fortaleceria o seu individualismo e, conseguintemente, impediria a sua universalização (elevação
espiritual).

Sendo assim, o ser humanizado precisa, para alcançar os objetivos da encarnação, entender
que a vida é formada de etapas, momentos, condizentes com o seu grau de universalização.
Aproveitando cada uma destas etapas como uma oportunidade de por em prática o amor universal, ele
se tornará sempre apto a mais receber.

Mesmo que você não entenda a relação ser feliz incondicionalmente/elevação espiritual, lembre-
se de um ditado popular dos seres humanizados: não há bem que sempre dure, nem mal que nuca
acabe. Portanto, se você hoje está passando por uma situação de sofrimento, não se desespere, pois
ela acabará.

Mas, quando ela acabará, é a pergunta que os seres humanizados sempre fazem quando se
toca nesse assunto. Ou seja, até onde vai durar o seu sofrimento? Eu respondo: enquanto você não
estiver preparado para receber a situação ‘boa’.

Se você estiver pronto para receber a situação que considera ‘boa‘, ou seja, aprender a libertar-
se do gozo do prazer quando houver coincidência entre o que quer e o que estiver acontecendo, o ‘mal’
acaba. Mas se você não estiver preparado, ou seja, se ainda espera que o mundo satisfaça seus
desejos (egoísmo, individualismo), o ‘mal’ não poderá acabar, senão você não saberá lidar com o ‘bem’
que está recebendo de Deus e começará de novo outro processo de sofrimento.

Participante: O que o senhor está dizendo tem muito a ver com o próximo
versículo, não? (‘tudo tem origem e fim e, em verdade, são aparências
transitórias’).

Tem, mas, quando nós abordarmos o próximo versículo falaremos de novos aspectos da vida
carnal e não da realização dos desejos. Mas, podemos aproveitar agora e usarmos o texto final dele
(suporta isso com equanimidade) e continuarmos falando da felicidade incondicional.

A felicidade que citei anteriormente (universal, incondicional) não se traduz em uma euforia ou
numa risada de piada. Ela se caracteriza pelo estado de espírito de paz, de tranqüilidade.

No entanto, a paz e a tranqüilidade que me refiro não são aquelas que os seres humanizados
conhecem, pois estes estados de espíritos, na concepção humana, ainda estão ligados a realizações por
partes deles. Ou seja, quando ocorre o que o ser humanizado quer, ele alcança a paz e a tranqüilidade.

A felicidade incondicional nasce da equanimidade, ou seja, da não alteração de ânimos. Para


que isso aconteça é preciso que a paz e a tranqüilidade não sejam condicionadas a nenhuma realização.

Sendo assim, posso afirmar que a felicidade incondicional pode ser entendida por vocês como
uma ‘apatia’. Quando o que está acontecendo não lhe afeta o ânimo, ou seja, quando tanto faz, como
tanto fez, você não perde a sua paz e a sua tranqüilidade, ocorreu, então a felicidade incondicional.

A felicidade que falo que é a resultante do trabalho espiritual é essa: tanto faz , como tanto fez o
que está acontecendo, o seu estado de espírito de paz e tranqüilidade não é abalado
Página 14 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Ou seja, se você vai onde gostaria de ir ou se não acontece o que quer e, por causa disso, não
perde a sua paz e tranqüilidade, seja com a euforia ou com a dor, encontrou a felicidade espiritual.
Agora, quando exultar com o que vivenciou (‘eu queria e fui’ ou ‘eu não queria ir e não fui’) não terá
havido uma felicidade, mas um prazer, uma satisfação de ter tido um desejo individualista (vontade)
atendido.

Esta felicidade não é universal porque o individualismo atendido caracteriza um egoísmo, um


amar a si acima de todos. A felicidade surgida da apatia com os acontecimentos do mundo é universal,
pois ela se traduz num estado de espírito destituído de individualismo, pois existe a harmonia com o todo
ou seja, com o que está acontecendo e há a paz (não acusação).

Esta felicidade também é conhecida por diversos nomes. Cristo a chamou de ‘bem-aventurança’,
os apóstolos a chamaram de estado de graça e, mais recentemente, ela foi definida como ‘estado zen’.
Ou seja, quando você vivencia qualquer acontecimento do mundo, independente do seu querer
individual, como se estivesse relaxado, ouvindo uma música em um ambiente defumado... Isso é
felicidade; o resto é prazer ou dor.

Mas para se alcançar este estado é preciso ter a confiança e a certeza de que o ‘mal’ vai acabar.
O ‘mal’ não, a situação que você está passando e que o ego está interpretando como ‘má’, porque fere
as paixões e os desejos gerados por ele.

Quando esta confiança e certeza acontecem você se torna apto a receber o benéfico de Deus.
No entanto, esta recompensa esperada não mais será traduzida na esperança de ter um desejo
atendido, mas sim na própria felicidade. Quem coloca a felicidade em tudo que ganha de Deus, se torna
apto a receber mais felicidade do Pai.

Mas, se tornar apto? O que irá lhe habilitar a receber mais felicidade?

Participante: Aceitar tudo que acontece?

Não. Você pode aceitar, mas estar em sofrimento. Ou como vocês chamam: resignadamente. O
que poderá lhe tornar apto à viver em felicidade incondicional?

Participante: Paciência, esperança...

É preciso realmente ter paciência, esperança, mas sem fé nenhum desses atributos pode ser
alcançado.

Agir com fé: só isso pode lhe tornar apto a ser feliz de verdade e, assim, conseguir a elevação
espiritual. Ou, como Cristo ensinou: ‘Por acaso algum de vocês, que é pai, será capaz de dar uma pedra
ao filho que pedir pão? Ou lhe dará uma cobra quando ele pedir peixe? Vocês, mesmo sendo maus,
sabem dar coisas boas aos seus filhos. Quanto mais o Pai que está no céu dará coisas boas aos que
pedirem’ (Mateus – 7,9-11).

‘É, estou passando por este momento, mas Deus é meu Pai. Ele me ama tanto que e tem tanta
atenção comigo que me trata como filho único. Se eu estou passando por essa situação agora é porque
ele sabe que preciso disso para me tornar apto para outras coisas. Louvado seja o seu nome’.

NOTA: O presente ensinamento lembra uma história.


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 15
Conta-se que Cristo foi visitar um homem que vivia numa fazenda retirada de
qualquer comunicação com o mundo exterior. Ao ir embora orientou àquele que
homem que todo dia ele empurrasse uma grande pedra que estava fincada ao
solo na frente de sua casa.

Depois de mais de vinte anos onde o homem diariamente fazia esse exercício, o
diabo foi visitá-lo. Ao ver a sua atividade perguntou: porque empurra esta pedra?

O homem então contou da visita de Cristo e da orientação que o mestre lhe deu e
falou com orgulho da quantidade de tempo em que vinha empurrando a pedra.

O diabo então lhe perguntou: E daí? Quanto ela andou nesse tempo? Nada. Todo
seu esforço foi em vão. Não está vendo que você foi enganado. Esta pedra não se
locomoverá nunca...

O homem então reparou que todo seu esforço tinha sido inútil. Vinte anos
empurrando a pedra e ela não se mexera um só milímetro. Ficou, então, com raiva
de Cristo, por achar que ele tinha lhe feito realizar um esforço inútil, sem proveito.

Tão logo o diabo foi embora Cristo veio visitar o homem. Recebendo o seu
visitante o homem descarregou toda a sua frustração. Xingou, reclamou e
protestou contra o seu esforço em vão.

Foi neste momento que o mestre pediu que ele se olhasse no espelho. O homem,
que quando da primeira visita de Cristo era franzino, raquítico, com o exercício
tinha se transformado em uma pessoa musculosa. Por causa disso, mesmo sem
se dar conta, hoje conseguia trabalhar a terra com maior proveito e, por isso, tinha
colheitas melhores.

Como diz o amigo espiritual Joaquim que nos ministrou esta palestra, os seres
humanos têm um ditado que diz que Deus escreve certo por linhas tortas, mas ele
está errado. Na verdade, Deus escreve certo por linhas certas: nós é que lemos
torto.

14. Ó filho de Kunti... as noções que tens a respeito do quente e do frio, do


prazer e da dor, essas nascem do contato dos sentidos com os objetos;
tudo isso tem origem e fim e em verdade, são aparências transitórias.
Suporta isso com equanimidade, ó Bhârata!

O que é o mundo para os seres humanos?

Participante: Aquilo que ele consegue perceber a através das suas percepções.

Sim, o mundo para o ser humano nada mais é do que aquilo que ele persegue o através dos
sentidos. Uma cadeira, para o ser humano, é o que ele vê, cheira, prova o sabor, houve ou sente pelo
corpo.

Na verdade, uma cadeira não existe. O que existe é um conjunto de percepções que o ser
humano chama de cadeira. Este conjunto é formado pela forma, pelas sensações, ou seja, pelas
Página 16 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
sensações o que se sente frente a cadeira, pelas percepções dos órgãos dos sentidos, pelas formações
mentais, o raciocínio e também pela consciência, ou seja, pelo que fica armazenado na memória.

É destas cinco coisas, que o Buda chama de cinco agregados, que o mundo se forma para o ser
humano. Mas o mundo não é isto...

Eu tenho feito muito este teste: pegue o seu braço. Normalmente as pessoas põem a mão em
cima do braço. Mas colocar a mão em cima do braço não é pegar o braço, mas causar uma percepção.

Tente pegar o braço sem colocar a mão em cima dele... Consegue? Não... Então, braço não é
braço, mas apenas a percepção de haver um braço... O braço não existe: o que existe é percepção de
um braço.

Deixe-me dar um exemplo melhor. Já repararam que a pessoa surda também é muda? Ela não é
muda porque não sabe falar, mas sim porque não conhece o som, porque nunca percebeu um som...

O som que você ouve é uma percepção e não uma realidade. O som que você ouve não é real:
ele é alguma coisa que você percebe através dos cinco agregados. Se esta pessoa jamais ouvir o som,
jamais pronunciará palavras...

Se uma pessoa for cega e não tiver sensações pelo corpo (tato), jamais saberá o que é um
corpo. Esta pessoa não acreditará que ela tenha um braço porque ela nunca o percebeu... Você só sabe
que tem braços os percebe...

Ficou bem claro que o mundo não existe, mas que eles são apenas percepções que você tem? A
partir do momento que compreender isso, pode, então, trabalhar as suas percepções. Enquanto achar
que um braço é um braço, não poderá mudar as idéias sobre o braço; mas, quando compreender que
um braço não existe, mas que se trata apenas de uma percepção que você espírito está tendo, poderá
alterar as idéias sobre aquilo.

Krishna nos ensina neste trecho: as percepções que você tem sobre as coisas são passageiras.
Hoje você tem uma percepção sobre alguma coisa, mas amanhã poderá de ou outra.

Isto porque a percepção é dada por Deus. É Ele lhe diz o que perceber através dos órgãos dos
sentidos.

Nós cantamos um ponto nas giras de umbanda que diz assim: filho de Umbanda quando está no
Reino que o vento venta e que a chuva molha, não tem querer. O vento ventar não existe, é só uma
percepção... Por isso se fala no mundo onde o vento venta, ou seja, onde existe a percepção disso
acontecer.

O molhar da água também é uma percepção... Isto porque se você não tiver sensação pelo
corpo jamais sentirá sensação de molhado.

Mas porque é importante se conhecer isso? A resposta está na segunda parte do ensinamento
de Krishna: vive equanimemente com as suas percepções... Vou falar sobre isso...

Destruir as percepções não é deixar de tê-las. Você, enquanto humanizado, não poderá, por
exemplo, deixar de sentir frio. O que você pode é, a partir do momento que entender que o frio é apenas
uma percepção, vivenciá-lo com equanimidade.

EQUANIMIDADE – Igualdade de ânimos, moderação (MIni Dicionário Aurélio).


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 17
Você pode passar pelo frio, sem morrer de frio; passar pelo calor, sem morrer de calor. Pode
passar pelo calor sem desejar o frio e vice-versa.

O problema das percepções, com relação à elevação espiritual, não está em tê-las, mas sim na
vivência sentimental das incontáveis sensações a respeito delas que o ego cria para lhe incitar
constantemente na busca desenfreada do prazer.

Tem hora que se molhar é muito “bom”, mas em outros momentos é “ruim”, diz o ego. Quando
está calor você quer água, mas porque quer molhar-se neste momento? Para ter o prazer de se
refrescar.

Mas o que é se refrescar? Uma percepção... A sensação de se refrescar é uma percepção e não
uma realidade... Então, o ego cria o calor para induzi-lo a comprometer-se sentimentalmente com a
busca do refresco e poder ter o prazer.

Mas, só que o refresco não está na água, mas sim no espírito. Precisar viver a percepção da
água sobre o corpo para sentir-se refrescado é viver a matéria, porque isto é uma percepção que está no
ego. O espírito não precisa se molhar, mas o ego cria a idéia dele estar se molhando para ter poder
liberar a sensação de frescor e a de prazer.

Na hora que você aprender a controlar a vivência das suas percepções, mesmo que o calor suja,
por estar ligado no espírito, não precisará da água para sentir refrescado.

Participante: O corpo é um elemento do carma, por isso precisamos conservá-lo.


Se eu pegar a minha mão e colocá-la sobre o fogo, ela irá se queimar. Se eu não
ligar para esta sensação, estarei destruindo o corpo que eu preciso para ter
carma. Como então desprezar as sensações?

Você não preserva corpo algum... Onde está Deus neste seu raciocínio?

Participante: Mas se eu puser o dedo...

Você não coloca dedo algum... Se o dedo for colocado, foi Deus quem fez isto. Ao fazer isso,
está gerando o seu carma...

Sendo assim, você não pode preservar ou destruir corpo algum. Isto não depende de você.
Praticar esta ação não depende das suas percepções, porque você pode ter todas elas e só se dar conta
de que está queimando o dedo quando ele já estiver queimado.

Esta primeira questão, mas há outros tópicos a se falar...

Será que colocar a mão sobre o fogo queima? Desculpe, mas tem hindu que anda sobre o fogo
com os pés descalços e não se queima. Não estou falando em não sentiu dor, mais em não queimar e
não fazer bolhas. A ciência consegue explicar este fenômeno. Sabe por quê? Porque a ferida e as bolhas
não são feitas pelo fogo, mas surge do espírito.

Então veja: você tem que preservar este corpo, mas precisa compreender que a melhor
preservação começa quando você vencer o carma e não quando cuidar dele. Como Cristo ensinou, nós
viemos aqui para vencer o mundo e se o mundo para você são as suas percepções, você vem aqui para
vencê-las e não para entregar-se a elas.

Só que esta vitória nem você nem nenhum outro espírito encarnado conseguirá por si mesmo:
Deus dará... Os seres humanos não conseguem nada...
Página 18 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Será Deus que lhe dará a vitória sobre as percepções. Mas, quando será isso?

Participante: Quando tiver o merecimento disso...

Certo, mas quando você terá este merecimento? Quando fizer o que Krishna ensina aqui:
enquanto tiver percepções, trate-as com equanimidade...

Deus lhe dará percepção de frio, mas você não deve vivê-la morrendo de frio. Viver assim não é
ser equânime, não é alcançar o caminho do meio, não é estar equilibrado. Vivenciar este tipo de situação
com esta sensação, não é harmonia nem paz, mas entrega a percepção.

Então, a você, compete sentir o frio que Deus cria, mas, manter-se ao mesmo tempo equânime.
Se conseguir vestir um casaco, viva uma sensação, mas se não conseguir vestir, mantenha a mesma
sensação. Este é o trabalho que o espírito pode fazer: sentimento. A partir da busca de não viver o frio e
o calor, Deus dá então a paz e a harmonia com a percepção.

Portanto, não queira não sentir frio: não sofra ao sentir frio. Não queira não sentir o calor, apenas
não se entregue a sensação de quente vibrando calor.

Quando você realizar sua parte, Deus fará Dele. Não é assim que está na bíblia: faça a sua parte
que eu lhe ajudarei? Qual é a sua parte? Não se entregar às sensações geradas a partir de percepções
pelo ego. Quando fizer isso, Deus fará parte Dele.

Desta forma posso dizer que a luta do espírito que busca a elevação espiritual é pela e
equânime idade. Estando ou calor, feliz ou infeliz, bom ou mal, fica sempre equânime. A partir disso Deus
faz acontecer tudo mais...

Participante: A partir do que tenho ouvido do senhor, tenho tentado praticar. Por
exemplo: às vezes tenho uma dor de cabeça e procuro não ligar para ela. Quando
consigo, ela acaba a sumindo. O engraçado é que consigo fazer isso com a dor,
que aparentemente é uma coisa difícil de ser superada, mas, quando vejo fios de
cabelo branco, não consigo deixar para lá...

Você está falando de dois trabalhos completamente diferentes. Um é o trabalho junto à


percepção, o outro nas sensações.

O que lhe perturba não é o branco do cabelo, mas sim a vaidade. Ou seja, a perturbação não
surge do ver o cabelo branco, mas do orgulho próprio ferido...

Neste caso, não se trata de ficar a equânime com a percepção do cabelo branco, mas sim com a
sensação da vaidade.

Participante: É isso que estou falando. A dor, que é uma coisa que aparentemente
mais difícil de lidar, não judia tanto quanto a vaidade...

A dor não é pior coisa, porque ela é resultante da vaidade. O mais difícil para o espírito
encarnado não é vencer a percepção, mas sim uma sensação.

A sensação é tão importante que a própria percepção nasce dela. Quem tem sensação de
vaidade, vive percepções que falam de feiúra, de defeitos, mesmo quando outros têm, na mesma cena,
a sensação de beleza...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 19
Voltando à questão das percepções, falei muito do frio, mas este ensinamento vale para todas
elas. Por exemplo: não existe mal cheiro... O que existe é a percepção de um odor que vem
acompanhada do adjetivo mal e da sensação de não gostar...

O cheiro não existe: é uma percepção que Deus lhe dá e ao mesmo tempo lhe propõe a idéia de
que ele é mau. Isto para que você espírito opte pela equanimidade, demonstrando assim o seu amor a
Deus acima de todas as coisas...

Mas, quando você vencer a percepção e a sensação de mal, o que acontecerá? Será que irão
acabar todos os cheiros? Claro que não... O que irá terminar é a sensação de mau.

Participante: Então, não tenho que fazer força para nada. Estou vendo o rato
morto e não preciso me preocupar em me sentir bem, pois isto só acontecerá
quando Deus fizer. É isso?

Não, você não precisa se preocupar em ficar bem frente ao cheiro ou à figura de um rato morto,
mais sim não sofrer por causa disso...

Pense assim: eu estou aqui, estou sentido esse cheiro, meu ego está dizendo que ele é mal,
mas eu não posso me sentir mal por causa disso. Ou seja, a única coisa que você não pode fazer, como
já falamos, é ficar se lamentando porque está ali naquele momento frente aquele cheiro.

Não se esqueça que estamos estudando uma conversa de Krishna com Arjuna e que o mestre já
havia dito que quem lamenta parece sábio, mas que o verdadeiro sábio não se lamenta por nada.

15. Ó tu, o melhor dos homens, somente aquele que não se aflige por tais
modificações e é equânime tanto no prazer como na dor, realiza a
Imortalidade.

Foi o que acabei de dizer agora: aquele que não se aflige em nenhuma situação. Quando você
não se afligir nem com frio nem com o calor, torna-se equânime e mantém-se em paz e harmonia com o
mundo em que vive.

16. O irreal jamais existe; o Real nunca é inexistente. Os sábios percebem


claramente esta Verdade!

O que é irreal? O que é uma coisa irreal? O que não é real. Isto quer dizer que o irreal não
existe, pois ele não é real...

Mas, o que é real no Universo? Deus e Sua ação... Isto é a única coisa que existe no Universo.
Todo o resto é irreal...

Calor não é calor: é a ação de Deus... Espírito não é espírito: é a ação de Deus...
Página 20 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
É isso que vocês precisam compreender: o que é irreal jamais existe e a única coisa que é real
neste Universo – e deixe-me dizer que não existe outro antes que vocês me perguntem sobre isto – é
Deus e Sua ação. Tudo aquilo onde você não encontrar Deus e Sua ação é irreal e nunca existiu.

Nunca existiu, mesmo que você acredite ao contrário, porque o irreal não existe. Só Deus e Sua
ação é realidade...

Porque só Deus e sua ação é real? Porque o resto das coisas não existe? É preciso
compreender isso para poder viver com Deus e Sua ação...

Participante: Porque só Deus tem condições de gerar qualquer coisa no


Universo...

Mas, porque só Deus tem condições de gerar qualquer coisa no Universo? Pergunto isso porque
quando você me responde desta forma está dando um poder a alguém pelo próprio poder. Isso não
existe no Universo. O poder, universalmente falando, é conferido a alguém por elevação moral e não por
Ele ser poderoso...

Volto a perguntar: porque só Deus e Sua ação é realidade? Vou lhes responder...

Pegue diversas gotas de água e as olhe que no microscópio. Você irá perceber que os a átomos
destas gotas estão em perfeitas combinação: H2O. Qualquer que seja a água que observe, irá encontrar
a mesma coisa.

Além disso, irá ver que os átomos de qualquer gota estão dispostos de maneira igual. Se por um
acaso deles não estiver na mesma posição, o que você terá não será mais água. Poderá ser qualquer
outra coisa, mas não mais água...

É preciso compreender isso: qualquer apesar desarmonia ou desorganização nos elementos que
compõem um todo altera o produto final.

Voltando à nossa questão, posso dizer, então, que qualquer desarmonia no Universo, quando
qualquer dos seus componentes faltar ou sobrar ou estiver em posição errada, mudaria o Universo que
conhecemos e isto acabaria o ele.

O universo é perfeito: é o equilíbrio perfeito, a harmonia perfeita. Na hora que isso for quebrado,
o Universo acaba. Poderá ser qualquer outra coisa, menos Universo.

Por isso Deus e Sua ação é a única realidade. É a ação de Deus que faz o equilíbrio do
Universo, pois ele é a Inteligência Suprema...

Se Deus não agir e em seu lugar qualquer outro elemento universal agisse, ria desequilibrar o
Universo e aí não seria mais Universo. Isto porque qualquer modificação dos componentes altera o
produto.

Deus e Sua Ação é a única coisa real no Universo, porque Ele é o único capaz de manter o
universo em perfeito equilíbrio eternamente. Sendo Deus a Inteligência Suprema, ele é o único com
capacidade perfeita de análise da realidade para dar, através da Sua ação, a cada um segundo a suas
obras, ou seja, manter a justiça sempre presente.

Se você deixar um átomo da água livre, seus componentes irão se embaralhar e com isso não
será mais água. Se você deixar o Universo na mão de alguém que não possa manter a Justiça Perfeita,
ele acabará...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 21
Participante: Li uma reportagem em que falava exatamente disso. Se deixarmos
um átomo de hidrogênio, por exemplo, livre, ele pode causar uma explosão
destruidora.

Sabe do que você está falando? Da bomba de hidrogênio... A bomba de hidrogênio existe a partir
do desequilíbrio de um átomo hidrogênio em um todo...

Por isso lhe repito: se Deus não for a única ação do Universo, ele pode explodir, porque qualquer
desequilíbrio nele acabaria com ele. A simples ação de dizer para a alguém que ele é bobo, se não
executada dentro do princípio de Justiça Perfeita, acabaria com o Universo. Foi isso que Cristo quis dizer
quando afirmou que se você apenas chamar outra pessoa de boba, terá que apresentar seu tribunal.

Até isto, que aparentemente parece um comentário sem maiores implicações, se feito por livre
vontade de alguém que não possua a capacidade perfeita de análise da realidade, destruiria o Universo.

Participante: O equilíbrio ao qual o senhor se refere vem depois?

Depois do que? Depois do desequilíbrio? Depois do desequilíbrio só poderá vir o nada, porque,
ao desequilibrar, o Universo acabou...

Participante: Eu não consigo entender isso... Eu não consiga imaginar esta ação...

Porque você como ser humano, não consegue ver nada além da suas percepções. Não
consegue ter a idéia do todo onde Deus age.

Participante: Então Deus tenta eternamente manter o equilíbrio?

Não, Deus não procura manter: mantém. Vocês tentam manter-se equilibrado, mas Deus, que
sabe o que faz, sempre o mantém.

Participante: Era isso que eu queria saber. Ele reequilibra o Universo?

Não, ele não reequilibra porque o universo não se desequilibra. Para que o equilíbrio esteja
sempre presente, Deus age antes.

Não se esqueça que Ele tudo sabe, por isso, age antes para que o desequilíbrio não aconteça.
Ele sabe qual será a próxima reação do espírito e já comanda uma ação que mantenha o equilíbrio
frente a esta reação.

Você, quando vê uma coisa que considera errada, acredita que ali há um desequilíbrio. No
entanto, este algo está na verdade equilibrando o Universo. Deus, que comandou esta ação sabia que a
opção do espírito poderia criar um desequilíbrio e agiu antes para que isto não acontecesse...

Perceba que estamos falando em equilíbrio e não em certo. Se todas as coisas fossem certas ou
amorosas, não haveria equilíbrio. Para que o equilíbrio exista, o aparente amor e desamor precisam
existir em quantidades iguais.

Deus, que sabe a reação de cada espírito aos acontecimentos da vida antes dela acontecer, cria
o futuro para que jamais o Universalismo e o individualismo existam em proporções desiguais.

Participante: Mas o Universo tem uma tendência a se desequilibrar em algum


momento, não?
Página 22 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Afirmar que existe uma tendência desequilibrar, é algo que você imagina que exista. Não se
esqueça que de Deus sabe que se pudesse haver alguma coisa que tivesse a tendência a desequilibrar
o Universo, Ele agiria antes, evitando assim o suposto desequilíbrio.

O desequilíbrio nunca ocorre e nem é iminente, porque Deus retroage, ou seja, age antes da
ação do espírito para que o equilíbrio jamais se perca. Só que quando Ele age, já está sabendo a reação
de todos os espíritos do Universo e, por isso, é capaz de agir de tal forma que o produto final jamais se
altere.

É por isso que só Deus e Sua ação é a realidade, pois só Ele pode manter coeso e equilibrado o
Universo... Se entregássemos a causa primária na mão de outro espírito – e repare que não estou
falando apenas nas nossas, mas na mão de Cristo, por exemplo – acabaria com o Universo num
micronésio de segundo. Na mão de Cristo, governador-geral deste planeta, a causa primária explodiria o
Universo.

Por quê? Porque ele não é a Inteligência Suprema. Ele não possui a capacidade suprema de dar
a cada um segundo a sua obra.

17. Compreende que aquele que interpenetra tudo isso é imortal. Ninguém,
nem nada podem destruir esse Princípio Imutável!

Aquele que interpenetra tudo isso... Interpenetra o que? O real. Que interpenetra o que? A ação
de Deus...

Aquele que interpenetra tudo isso, ou seja, ao invés de estar ouvindo palavras está vendo a ação
de Deus, se torna imortal, porque entra na realidade...

O que é a realidade? É a ação de Deus... Sem a ação de Deus o Universo não existiria, seria
estático. Deus é o supremo comandante dos carmas e por isso “movimenta” o Universo a partir da Sua
ação.

Todas as coisas possuem movimentação a partir da ação de Deus. Nada se movimenta por
vontade própria, mas apenas reagindo a uma ação de Deus. Então, a movimentação de qualquer coisa é
a ação de Deus...

Onde quer que você esteja fazendo o que estiver fazendo, na hora que interpenetrar no
acontecimento como sendo apenas a ação de Deus, estará frente a Deus. Isto porque qualquer ação
representa Deus.

O ser “Deus” está estático no Universo, mas apesar disso, Ele gera a movimentação, o pulsar do
universo através da Sua ação. Sendo assim, como Cristo falou no evangelho de Tomé, não é preciso ir
aos céus para encontrá-Lo, pois Deus está em você, porque você é Deus... Na verdade não há um
“deus” dentro de você, mas sim a ação de Deus.

Quando se convive com esta verdade, se está frente a Deus, porque se está frente a ação Dele,
não importando onde quer que se esteja, o que esteja se fazendo...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 23
Este ensinamento e é muito importante para os religiosos que idolatram o Deus. É um
ensinamento importante para que eles que buscam um Deus ser, um Deus material, físico, seja de que
matéria for, para idolatrar.

Isto porque esta idolatria poderia causar um desequilíbrio no Universo. Quando alguém se sente
inferior ou superior a outro, mesmo que seja ao ser Deus, acaba com a igualdade universal. Se Deus
não agisse antes, como já vimos, para equilibrar o Universo, este se desequilibraria e com isso deixaria
de ser o que é...

A harmonia daquele que alcança elevação espiritual não deve ser com o Deus, mas sim com a
Sua ação, que é a realidade que você vive.

Repare na aquela pessoa ali; ela se levantou? Não, porque ela nunca esteve sentada...

O corpo estava numa posição e agora está em outra, mas isso quer dizer que ela se levantou?
Não, houve uma ação de Deus que vocês chamam de levantar. Quando você diz “eu levantei”, não
interpenetrou na ação de Deus, porque a realidade foi a ação Dele e a ilusão foi acreditar que você
levantou...

Como responder, então, se alguém lhe perguntar se você levantou? Sua resposta: “não sei”...
Se perguntarem novamente “o que aconteceu”, responda: Deus agiu... Alguém muito insistente lhe
perguntaria outra vez: mas como Deus agiu? Sua resposta: não sei... Quando agir assim, você terá
interpenetrado no Universo...

Interpenetrar na ação de Deus, no universo, é não reconhecer a existência de mais nada a não
ser a ação de Deus... Ter a plena consciência de que só Ele age...

Interpenetra no Universo aquele que sabe que só Deus age e por isso, não acredita no raciocínio
que descreve uma ação e dá um agente a ela. Aquele que sabe que a interpretação da matéria é uma,
mas que a realidade é outra...

A interpretação que o humano faz da ação de Deus nunca é correta. Isto porque no exemplo que
usamos vocês dizem que houve um levantar, mas se a ação de Deus é sempre amar, Deus não
levantou, amou...

Este sentir-se amado ao invés de sentado é a interpenetração no Universo, porque é a realidade,


a ação de Deus... Como esta ação é sempre amar, quem se sente amado entra na realidade...

Então, não existe sentar, andar, levantar, tomar banho: existe o amor de Deus agindo. É o
humano que não interpenetra na realidade do Universo que diz, quando está debaixo do chuveiro, que
está tomando banho... Mas, na realidade do universo, não é isso que está acontecendo: é Deus amando
o espírito...

Portanto, a ação individualizada (eu faço) não existe, porque a única coisa que é real e Deus e
sua ação. E Deus não levanta, não senta, não anda, não toma banho: ama. Por isso afirmo que quando
você diz que está fazendo alguma coisa, está sendo individualista.

Esta é a realidade que pode lhe levar a imortalidade. Isto porque enquanto achar que toma
banho irá precisar de um banheiro, de um chuveiro e de água, coisas que fora da matéria densa, não
existem. Quando sair da carne, o desejo, a vontade, de banhar-se permanecerão, mas não haverá como
fazer isso. Como será que você viverá então?
Página 24 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Quem quer unir-se a Deus, compreende que tem a percepção de ter um corpo, que este o corpo
está banhando-se, mas que tudo isso é apenas uma percepção porque, na verdade, sabe que o que
está acontecendo é Deus agindo. Este se une ao Pai porque compreende a verdade do Universo. Com
isso, está liberto das percepções, apesar de continuar a tê-las...

Este é o conhecimento mais profundo que um ser pode ter no Mundo de Provas e Expiações:
tudo é ação de Deus. Nada existe, tudo é uma ilusão, ou melhor, tudo é uma percepção que Deus dá
sobre o seu amar, que é ele mesmo...

Apesar de falar assim, saiba que este ser que convive com você através das suas percepções,
não é o “ser Deus”, mas o próprio universo, o amor de deus.

Compreenda isso... Compreenda que não existe sapato, mas uma sensação de estar calçado...

Na verdade o sapato não é sapato, mas o amor de Deus. Compreendendo isso, outras
percepções podem acabar como, por exemplo, o mau cheiro. O amor de Deus não fede, não dá chulé...

O amor de Deus é a única realidade do Universo e é também a forma de comunicação entre os


seres inteligentes universais. Deus se comunica conosco através do amor e é por este mesmo modo que
nós nos comunicamos com ele. Ele enviando amor puro, universal que nós desvirtuamos aplicando o
individualismo sobre ele.

Esta é a realidade do universo. Qualquer outra visão sobre a vida, é prisão à matéria. Lembre-se
que por este caminho não se chega a Deus, porque o Senhor não tem nada de material. Ele é imaterial
como ensinaram todos os mestres...

Por isso Krishna ensina: passe pelas suas percepções, ou seja, pelo amor que Deus lhe dá, sem
individualizá-las através de percepções.

As percepções são formadas através da lógica material, mas a ação que as origina é espiritual,
porque é o amor de Deus. Tudo que você percebe é o amor de Deus que o ego codifica como
percepção, sensação, forma, formação mental e memória... Tudo é amor de Deus, mas como este amor
não é entendido pelo ego, ele o decodifica para uma lógica que possa entender.

Então, Deus lhe ama, manda amor para você e o ego o decodifica através dos cinco
agregados...

18. Estes corpos, nos quais habita o Eterno Ser, imortal e incomensurável,
têm fim; por conseguinte, luta, ó descendente de Bhârata!

Se lembrem que Arjuna não queria entrar nesta guerra, não queria lutar, porque imaginava, que
ao ferir o corpo dos seus parentes, ia matá-los. Mas acontece que de qualquer forma este corpo terá fim.

Sendo assim, qual o problema do corpo acabar hoje ou amanhã? Um dia ele vai acabar, mas
qual será o dia que ele acabará?

Participante: no dia que acontecerá morte.


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 25
Você está completamente fora do Universo... Onde está Deus na sua frase? Onde está a ação
Deus nela?

Participante: A morte ocorrerá na hora que Deus precisar que ela ocorra...

Deus não precisa de nada... A hora da morte ocorrerá quando o equilíbrio universal precisar e
você merecer que isto aconteça.

Mas quando será percebida por você a hora da sua morte? Quando o amor de Deus for
decodificado pelo seu ego desta forma. Se tudo é Deus e sua ação e se esta é sempre decodificada pelo
ego de uma determinada forma, tudo o que acontece é o amor de Deus decodificado daquela forma.

Para que exista um corte num corpo é preciso a ação Dele. Mas, o que é esta ação? O que pode
matar e desintegrar um corpo? O amor de Deus...

Sendo assim, jamais um corpo acabará sem que Deus crie esta ação e Ele jamais a criará fora
do seu carma. Isto porque Ele é o Sublime Administrador dos carmas.

Tudo é carma e tudo é o amor de Deus em ação, porque o amor de Deus em ação se chama
carma... Carma é o amor de Deus, porque a ação Dele é a única coisa que existe no universo.

Mas, para que serve este ensinamento para nós? O conhecer desta Verdade eu chamo de
técnico, mas o mais importante não é ter este conhecimento, mas entender para que ele serve na
prática, ou seja, como se coloca este ensinamento na prática?

De que serve saber que o corpo não morre, mas que há uma modificação de aparência?
Compreender que Deus está lhe amando e você está sofrendo.

Quando se conhece a Verdade do Universo (Deus age constantemente amando os espíritos e os


egos decodificam esta ação sob diversas formas) deve-se ter a consciência que Deus lhe amou naquele
momento enquanto o seu ego lhe diz que foi acusado, vilipendiado, abandonado, etc.

Participante: Então, o problema é sempre o sofrer?

Sim, o problema é sempre o sofrer...

Veja o que diz Krishna no item 11 deste estudo: Estiveste lamentando-te por aqueles que não o
merecem. Todavia, pareces falar como um sábio. Só que os verdadeiros Sábios não se lamentam nem
pelos vivos nem pelos mortos.

Quando você está lamentando-se pela ação que vivenciou, parece uma pessoa sabia, mas não
é. Se você morreu, isto não foi um ato de maldade, mas sim o amor de Deus que foi percebido pelo seu
ego desta forma.

É isso que venho dizendo a muito tempo para vocês: não se importem com nada do que façam...
Isto porque vocês não fazem nada: são instrumentos do amor de Deus, o “sal da terra”.

Sendo assim, qualquer ato que vocês pratiquem, é o amor de Deus em ação. Já o seu
sofrimento ao participar de qualquer ação, é uma visão individualista do amor de Deus.

Participante: Se é assim, quando matei um rato hoje o envenenamento terrível


que ele sofreu fez parte do carma dele?
Página 26 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
“Envenenamento terrível” é uma percepção que você está tendo sobre o amor de Deus e não
uma realidade... Além do mais, você tem a percepção disso ter acontecido, não sabe se o rato tem
igual...

Saiba que mesmo que você tenha uma percepção sobre as coisas, isso não quer dizer que
todos os outros seres, principalmente os de classe diferente da sua, também as tenha. Lembre-se que,
apesar do estômago ser o mesmo em todo os seres humanos, existem coisas que você come e passa
mal e outras que outras pessoas comem e não passam. Isto porque a dor é uma percepção dada por
Deus e não uma realidade do corpo físico.

Apesar de afirmar que o rato pode não ter sentido nada que você imagina que ele sentiu, posso
garantir que se ele passou por tudo isso, foi Deus quem criou isso, foi a ação Dele. Portanto, foi amor em
ação...

Agora, a individualização, ou seja, sentir que o rato sofreu, é que lhe tira da interpenetração no
Universo... A interpenetração no Universo acontece quando você tem a consciência de que não matou
rato algum: Deus amou.

É isso que vocês precisam compreender. Se Deus é o Supremo Administrador dos carmas, você
não pode fazer nada que um rato não mereça. Não se esqueça, que as sensações de uma existência,
não importam de que forma, sempre servem para futuras encarnações. Então, ao morrer por um
“envenenamento terrível”, o espírito que habitava o rato teve uma lição que levará para eternidade.

A vida na matéria é uma escola, um gerador de informações para a vida eterna. Ela não é
castigo, não é punição. Não é carma punitivo...

Como é que você pode saber qual a sensação e a percepção de tomar um choque elétrico?

Participante: Tomando choque...

Então tomar choque é “bom” ou “mal”? Não é “bom” nem “mau”: é aprendizado.

Será “bom” se você passar a gostar de toma choque; será “mal” se você não gostar. Mas, de
qualquer jeito, você só poderá saber o que sentirá pelo ato de tomar um choque quando o tomar.

Ao tomá-lo aprende alguma coisa... Se me basear pela lógica humana, posso dizer que você
aprende a não por mais à mão ali...

Por isso afirmo que qualquer das situações que espírito passe, seja no mundo racional ou não,
não é punição, mas sim aprendizado. Nada em qualquer existência é punição, mas exercício de escola,
aprendizado. Sendo assim, é um ato amoroso, pois proporciona uma oportunidade de aprendizado...

Está vendo o que faz não interpenetrar na realidade do Universo? Você passa a chamar o amor
de Deus de punição...

Interpenetrar na realidade não é mudar atos, atitudes, mas sentir-se constantemente amado pelo
Pai.

Tem muitas pessoas que se culpam por suas ações durante a existência carnal. Algumas já
vieram até conversar comigo sobre isso...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 27
Eu nunca as acusei de nada... Sempre disse que não me importava com o que elas faziam, mas
demonstrei preocupação com a capacidade de sofrer que elas tinham ao vivenciar o “errado” que viam
nelas ou nos outros durante as ações. Isto porque a eu sei que elas nada fazem de errado.

Tudo o que elas fazem é o amor de Deus em ação; são elas servindo de instrumento a Deus. O
problema não está no que fazem, mas no que elas sentem enquanto servem de instrumentos o Senhor,
ou seja, a forma como retribuem o amor de Deus...

Sendo assim, se você brigar com alguém, não sofra por que brigou. Tenha a consciência de que
se brigou era porque tinha que brigar e acabe com os pensamentos sobre aquele acontecimento naquele
momento. Não fique racionalizando posteriormente aquele momento; não fique preocupado com os
acontecimentos futuros que poderão advir dele; não fique se acusando por ter participado daquela ação
como um suposto agente dela.

Interpenetrar o Universo é viver a realidade. Esta é dinâmica, ou seja, se altera


constantemente... Se você discutiu com uma pessoa num determinado momento, este já acabou.

O momento presente é outro... A pessoa com quem você discutiu já não está nem mais presente
à sua frente... Então, para que ficar racionalizando e se lembrando do que aconteceu?

Esta é uma fonte de sofrimentos... Não há necessidade de ficar vivenciando aquele


acontecimento por outros momentos. Isto porque ao recriar o momento, você também recria o
sofrimento...

A angústia, a revolta ou a culpa de agora, são criações atuais do que já tinha acontecido. Não se
tratam de sofrimentos ligados ao passado, mas sim criados agora... Na hora que você discutir com uma
pessoa, quando acabar este momento não mais o vivencie, ou seja, não aceite mais as criações do ego
a respeito dele...

Mas para chegar a viver a vida desse jeito, é preciso trabalho. Este não é um tipo de
acontecimento que ocorre de uma hora para outra. Portanto, caminhe devagar. Não há pressa...

O importante é você entender que a luta daqueles que querem se unir a Deus não é no sentido
de lutar contra sua forma de agir, porque ela faz parte do Universo. Você não deve lutar contra a sua
forma de agir, pois ela não é sua: é a forma do amor de Deus agir através de você. Ou seja, é um papel
que você desempenha para que o Universo esteja sempre equilibrado.

Portanto, ao invés de lutar contra isso, louve a Deus por você ser do jeito que é, pois se isso não
acontecesse, o Universo estaria desequilibrado. Sabia que você, não importa como seja, é o ponto de
equilíbrio do Universo?

Aquela imagem do santo puro que não faz mal a ninguém é ilusão... Leia a vida carnal dos
santos que entenderá o que quero dizer...

Mesmo depois de conseguir a santidade, São Francisco de Assis brigava com os homens para
proteger os animais, ou seja, quebrava o próprio ensinamento. Gandhi, o pacifista, lutava, mesmo que
sem armas, contra o domínio do império britânico.

Mas isso não quer dizer que eles estavam errados, mas sim que esta forma de agir era a função
deles naquelas vidas. Santa Agostinho, em seu livro “Confissões” fala claramente disso: na hora que agi
era instrumento de Deus...
Página 28 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Sentir-se instrumento do amor de Deus é alcançar a consciência universal; é a interligação com
o Universo...

Vamos esquecer padrões... “Ah, o ser universal não mata”: este é um padrão que o ser humano
criou e não uma verdade universal...

Nós estamos estudando um livro dito sagrado onde Arjuna não quer matar, mas o mestre insiste
que ele deve fazer isso. E diz mais: se você não for matar, não conseguirá sua elevação.

Através dos ensinamentos, Krishna está deixando bem claro a Arjuna que ele precisa servir o
próximo e que, no caso dele, o serviço é matar seus parentes. Mas, para orientá-lo a ter sucesso na
elevação espiritual ao praticar este serviço, o mestre lhe diz que deve matar sem raiva, culpa ou prazer.

Mais tarde neste estudo iremos entender que Krishna diz a Arjuna ajuda que o está incitando a
matar por um dever devocional. o que é um dever devocional? É a prática de ações com subordinação a
Deus.

Deus lhe faz dizer a outras pessoas o que elas têm que ouvir. Você, se quiser aproximar-se Dele,
precisa se subordinar a esta determinação e amá-Lo por ter lhe feito um instrumento para aquela
determinada ação, ao invés de querer ser outra pessoa, fazer outra coisa...

Na hora que a sua consciência lhe disser que a sua ação, não importa qual seja, é o amor de
Deus escoando através de você, alcançará o serviço devocional...

Cada um na sua função, vivendo o seu papel dentro da peça “divina comédia humana”, agindo
tendo a consciência de que é o amor de Deus escoando através dele, sem achar nada sobre o
acontecimento: este é o mundo onde Deus é o Senhor...Já falamos isso diversas vezes com outras
palavras, mas acho que usar este termo que Krishna usa (serviço devocional) deixou mais claro o que
queria dizer.

Querer viver um padrão de santidade para se considerar santo é um serviço devocional a você
mesmo. Isto porque você está se entregando ao seu patrão de santidade.

Quem disse para você que um ser elevado espiritualmente não briga com ninguém? Cristo só
brigou com todo mundo... Só que quando ele brigava não tinha raiva e dos outros, não sofria porque
tinha brigado nem teve o prazer de brigar ou de sentir-se o “certo”.

Ele fazia como serviço devocional a Deus porque tinha consciência que não era ele quem falava,
mas que Deus agia através dele.

19. Aquele que pensa que este ser mata e aquele que pensa que este ser é
morto, os dois são ignorantes porque pensam, raciocinam. O ser não
mata nem morre.

Não houve comentários sobre este texto...


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 29
20. Esse ser não nasce nem morre e tampouco reencarna; o ser não tem
origem; é eterno, imutável, o primeiro de tudo e todos e não morre
quando matam o corpo.

Neste trecho temos um novo ensinamento de Krishna: o ser não reencarna. Vamos falar sobre
isso...

Na verdade o ser não reencarna no sentido de ter uma carne nova. A encarnação do ser deve
ser vista como o assumir uma nova identidade e não um novo corpo.

Não é a carne que marca um período da vida do espírito, mas sim a identidade. Atribuir a
reencarnação e existência de uma nova carne é dizer que a vida existe por causa da carne. Isso não é
verdade...

Tem gente que sai da carne e não perde a sua última consciência humana. Ele é o humano, está
vivo como humano que foi, mas não tem carne.

Então, quando Krishna fala que o espírito não reencarna, o faz neste sentido: o ser humano não
existe por causa da carne, mas sim por causa da individualidade (identidade) criada para aquela etapa
da vida espiritual.

Ligar a idéia de encarnação a uma matéria carnal é subordinar a vida carnal à carne. É por
causa da crença de que a encarnação é marcada pela existência da carne que se diz que a encarnação
acabar com a morte, com o desligamento do espírito com o corpo físico. Mas, isto também não é
verdade...

A vida não acaba com a morte, mas sim com o fim da identidade. Só quando o espírito deixar de
ter a identidade que teve na sua última existência carnal ele terá desencarnado...

Sendo assim, na verdade não deveríamos dizer que há reencarnações, mas “reidentificações”...

As diversas encarnações são identidades diferentes das quais fazem parte o corpo. Ele é
apenas uma parte da identidade. O corpo físico, as sensações e a história formam uma encarnação, ou
seja, uma identificação que o espírito vivencia a durante a sua jornada terrestre.

Se subordinarmos a existência da vida material apenas aos que estão com carne, não
poderíamos acreditar em fantasmas, porque ao morrer, aquela identidade estaria acabada. Mas não é
isso que acontece: na verdade acaba a carne e o espírito continua na mesma encarnação, pois ainda
acredita ser a mesma identidade.

Mas Krishna ainda fala mais neste capítulo. Ele diz: o ser é o primeiro de tudo de todos.

Para entender isso pergunto: o que é o Universo? É o campo de desenvolvimento dos espíritos...
Então, o Universo existe para nos servir.

Portanto nós somos os primeiros. O universo não serve às coisas materiais, mas tudo que existe
e todos que existem estão aí para nos servir e para nós servirmos a eles...
Página 30 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
21. Ó filho de Prithâ... como pode morrer ou causar a morte de outro aquele
que sabe vivenciadamente que este ser é indestrutível e abandona seu
velho corpo e faz-se outros novos.

Não houve comentários sobre este texto...

22. Assim como alguém costuma deixar suas roupas gastas e bota outras
novas, assim o ser corporificado e humanizado abandona seu velho
corpo e se faz outros novos.

Não houve comentários sobre este texto...

23. As armas não o cortam, o fogo não o queima, a água não o molha e o
vento não o seca.

Não houve comentários sobre este texto...

24. A este ser não se lhe pode cortar, nem queimar, nem molhar, nem secar; é
eterno, onipresente, estável, imóvel e primordial.

Temos que compreender que nada pode afetar ao ser, a não se que ele se afete. Nada pode lhe
cortar, queimar, entristecer, preocupar, a não ser a preocupação, o corte, a queimadura ou o sofrimento
que você mesmo crie para você.

Este é o ensinamento que Krishna traz: nada pode lhe atingir... Apesar disso, se eu pegar uma
faca agora corto o seu corpo físico, não é mesmo?

Participante: Sim...

Apesar desta sua resposta continuo insistindo no que Krishna falou: nada pode lhe atingir, nem
mesmo nas coisas físicas... Vamos entender isso...

Mostre-me o seu braço... Este é o seu braço? Não, este não é o seu braço. Isto porque esta
forma não é a menor partícula que compõe o que você chama de braço.

Dentro desta forma que você está me mostrando e chamando de braço, há carne, osso, veia,
sangue, músculos e terminais nervosos. Estes elementos é o braço...

O que você olha e vê, não é o seu braço, porque aquilo que você chama de braço é um
somatório de coisas. Todo seu corpo é um somatório das coisas que listamos, mas estas ainda são
formadas por outras: as células...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 31
Sendo assim o seu braço não é isso que você mês mostrou, mas cada uma das células que
compõem esta forma... A partir daqui podemos ir mais longe no ensinamento de Krishna.

Se eu abrir um buraco no seu braço estarei cortando a célula dele? Não, estarei seccionando,
separando elementos do braço, mas não o estarei cortando.

Eu não posso cortar o seu braço porque não posso cortar uma célula que compõe qualquer dos
seus elementos... Eu posso separar moléculas, não cortá-las.

Então, não é só o espírito que não é cortado, mas o corpo também não...

Participante: Acho que o seu raciocínio não condiz com a realidade nossa...

Está certo: não condiz com a sua realidade... Por quê? Porque vocês não vão além do que
vêem... Você está vendo um braço, mas dentro dele tem coisas. Este é o tema que quero abordar a
partir deste ensinamento de Krishna...

Este não é um mundo real, mas sim um mundo de percepções. Na verdade, o braço não existe:
ele é uma percepção que você tem ao olhar para um determinado grupo de células. Esta realidade serve
tanto para o mundo espiritual como para o material, porque, na verdade, este membro é um conjunto de
células que você chama de braço.

Agora, se você tivesse uma visão mais aprofundada, se pudesse ver mais microscopicamente,
chamaria outras coisas de braço e não o que chama hoje. Isso porque você não veria esta forma, mas
sim a carne, os músculos, as veias e o sangue correndo, da mesma forma que vê estes elementos no
microscópio...

Participante: Apesar disso, ele não deixa de ser um braço...

Quando você não mais se prender a forma e compreender que ela é formada por outras coisas,
terá que dar um novo nome a estas coisas, pois braço é o conjunto que percebem hoje e não o que está
dentro...

Então, é a percepção, o seu olho que cria o braço... Na verdade ele é um conjunto de células
que você chama de braço.

Outro conjunto você chama de perna. Para você, são dois elementos diferentes, mas se
observamos o interior, veremos que eles são iguais.

A perna e o braço são formados pelos mesmos elementos (células). Por que você distingue um
do outro? Porque só consegue ver a perna e o braço pela sua forma compacta e não pelo que eles
realmente são: as células...

Se você não visse o braço e a perna pelas suas formas compactas, diria que é tudo igual... Veria
que na realidade os dois conjuntos são formados pelo mesmo elemento e, portanto, são iguais.

Disso nos sai a certeza de que a realidade do mundo, do Universo, é muito mais além do que as
percepções que vocês têm. Por isso afirmo: tudo que o ser humanizado conhece é apenas uma
percepção e não a realidade...

Além do que vocês vêem, sentem, provam o sabor, do que cheiram ou ouvem, existe muito mais
coisa. Ou melhor: existem coisas que compõem o que vocês vêem e vocês não vêem estas coisas...
Página 32 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Participante: Uma forma de se desligar do macro seria a meditação?

Uma forma de se desligar do mundo das percepções é compreender que tudo é percepção...

Na hora que compreenderem que um braço é apenas uma percepção e não uma realidade,
vocês estarão buscando algo mais do que percebem. Mas, enquanto acreditarem que o que vêem é
realidade, conviverão com a percepção como se ela fosse real...

Participante: Tenho tentado me desligar das percepções, mas não tenho


conseguido. Tem como viver sem elas frequentemente?

Não estou falando em viver sem percepções, mas estar acima dela. Deixe-me dar um exemplo...

Os orientais falam muito da terceira visão. Mas, o que é a terceira visão? Uma visão além da
percepção do olho. Perceba que eles não falam em trocar uma visão por outra, mas em alcançar algo
que veja além do olho humano.

Sendo assim, quando você alcançar esta visão, que é dita como espiritual, continuará tendo as
percepções que hoje tem pelo olho. O que acontecerá é que você terá a consciência de que a sua visão
de hoje é apenas uma percepção.

Com esta consciência poderá, então, buscar através da meditação ou de qualquer outro trabalho
de elevação espiritual superar o mundo perceptivo. Neste momento poderá receber de Deus a terceira
visão, ou a compreensão de que existe algo que você não percebe, mas que está compondo o que vê...

Participante: Um desligamento das percepções?

Não um desligamento delas, mas a percepção além do sentido da carne...

Participante: A meditação pode ser um exercício para isso?

Na verdade não há um exercício para se receber esta consciência: ela será recebida de Deus...
Pela busca espiritual, pelo trabalho da reforma íntima, você poderá merecer receber...

Participante: Então não é negar a percepção, mas negar que ela é a realidade...

Sim. Negar que a percepção é real. Gosto de laranja estragada, por exemplo. Não existe isso:
existe um gosto que você chama de laranja estragada.

É preciso estar além do mundo perceptivo... Para isso é preciso ter a consciência de que não
existe um gosto de laranja estragada, mas uma criação perceptiva que o ego chama desta forma. A partir
desta consciência, você poderá ficar além do gosto criado pelo ego e poderá, então, receber de Deus o
“sabor universal”.

Então, quando Krishna diz que o ser humanizado não pode ser cortado, é porque o ser humano
se corta, se molha ou se queima.... Ou seja, tem a percepção de que isso acontece, mas na realidade
isso não ocorre...

Á partir deste ensinamento, aqueles que buscam entrar em unidade com Deus precisam
compreender que este é um mundo de percepções. Além disso, precisam saber que um mundo
perceptivo não é um mundo real, mas um mundo individual...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 33
Este mundo, por ser perceptivo, é apenas o que você percebe e compreende restritamente. Por
causa das suas restrições você acredita que a água molha, mas isso não é real, porque o sentir-se
molhado é apenas uma percepção que você está tendo.

O espírito precisa se desligar deste mundo perceptivo porque se ficar preso à percepção como
realidade, viverá preso à reencarnação, ao processo reencarnatório ou de reidentificação. Isto porque as
percepções estão presas às sensações de prazer e dor...

É por isso que Buda diz: você não pode ter paixão pelas suas percepções. Não adianta se
apaixonar por uma percepção porque isso só lhe prende ao mundo do nasce e morre. Esta prisão
acontece porque no Universo não existem estas percepções...

Quando falo em paixão, falo de positiva ou negativa: querer ou não querer.

25. Diz-se que este ser é não manifesto, que é impensável e imutável; se
sabes e sentes que assim é, não deves te lamentar.

Este ser é impensável... O que quer dizer isso? O que quer dizer Krishna quando fala que o ser
universal é impensável? Que o conhecimento sobre o ser universal jamais será alcançado pela lógica
humana, ou seja, pelos conhecimentos da Terra.

O máximo que você humano pode fazer sobre este ser é uma figura, uma imagem, que não é a
realidade. Isto porque o pensamento contém elementos do planeta e não do Universo.

Veja... Para analisar alguma coisa, você utiliza de conhecimentos que já estão presentes na
memória. Quando humanizado, estes conhecimentos pertencem exclusivamente à realidade material e
esta não pode definir o espiritual.

Além disso, mesmo a realidade material não é uníssona: ela depende de regiões do planeta ou
ainda de grau de instrução do ser humanizado. Se fossemos falar, por exemplo, do corpo humano como
falamos agora a pouco para pessoas analfabetas elas não compreenderiam, porque não sabem nem o
que é uma célula.

Outro fator que não deixa o ser humanizado entrar na realidade é que a compreensão das coisas
é diferente dependendo de cada povo. Por exemplo: se um brasileiro for falar sobre saudade com um
habitante de qualquer outro país, não conseguira se explicar, porque este termo não existe em outras
línguas...

Então, o pensamento não possui elementos que possam descrever o ser. Se você tentar
compreender – e por isso digo sempre para não compreenderem o que falo – os ensinamentos através
do seu conhecimento material, da sua lógica, das coisas do planeta, não conseguirá.

Este ser é impensável, no sentido de que os seres humanizados não conseguem descrevê-lo ou
compreendê-lo através dos elementos do planeta. Para poder compreendê-lo é preciso ir além das
coisas da matéria.

Mas, para se falar nisso, é preciso deixar bem claro o que é matéria e o que não é, porque vocês
também não sabem o que não é material. Vocês acreditam que material é tudo que vocês podem pegar
ou ver. Mas, agora a pouco disse que a percepção é algo material e vocês não podem pegá-la ou vê-la...
Página 34 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Material é tudo que compõe o mundo da matéria, ou seja, tudo o que você compreende através
da razão. Sendo assim, você não pode, enquanto humanizado, jamais conhecer o ser universal, pois só
que lhes passa pela razão existe...

O ser universal só poderá ser entendido quando tudo que for material estiver anulado... Ou seja,
quando toda a sua razão humana estiver anulada – anulada no sentido de não ser vivenciada como
realidade.

Este é um conhecimento profundo e essencial para quem busca unir-se a Deus, ao Universo.
Veja por exemplo o caso de Cristo...

Para vocês ele é um elemento material, ou seja, um corpo com dois braços e duas pernas...
Mas, será que ele é assim? Garanto que enquanto vocês viverem com um Cristo homem não
conseguirão entender os ensinamentos dele...

Outro exemplo? Deus... Tem gente que faz a imagem de Deus como um homem velho, barbudo,
possuidor de um corpo... Lembro-me que numa palestra disse a uma pessoa que acreditava num Deus
com forma humana se ela emprestava a tesourinha para Deus cortar as unhas Dele...

Falei assim, porque vocês fazem Deus sob uma forma humana, como um ser humano, mas isso
não é real... Deus não é isso nem é nada do que você possa compreender, porque o mundo espiritual é
impensável para o ser humanizado.

Não adianta você buscar querer saber quem é Deus (se é uma energia, isso ou aquilo), porque
Ele não é nada do que você possa compreender. Tudo que você imaginar que é um ser (Deus, Cristo ou
qualquer outro) será apenas seu pensamento, porque o espírito é impensável.

Isso quer dizer que a elevação espiritual é uma entrega a Deus, Cristo ou qualquer outro, sem
raciocínio, sem compreensão...

Enquanto você estiver compreendendo a quem se entrega, não estará se entregando à


espiritualidade, mas sim ao seu pensamento. Àquilo que você criou no seu pensamento...

26. Todavia, ó tu de braços poderosos! Se pensas que este ser a todo


momento nasce e morre, mesmo assim não deverias afligir-te por isso.

Não houve comentários sobre este texto...

27. Pois, para aquilo que nasce, a morte é certa e inevitável, e para o que
morre, o renascimento é coisa certo. Não te lamentes, portanto, pelo que
é inevitável.

Estes dois textos nos levam novamente ao assunto morte.


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 35
Outro dia falamos deste tema a partir da visão espiritual (o ser não morre). Mas, vamos supor
que existisse morte, vamos imaginar que existisse morte como os humanos querem que exista...

Por que evitá-la? Um dia todos morrerão inevitavelmente... Um dia todos deixarão de ser esta
identidade que estão vivendo hoje... Um dia todos sairão da carne, morrerão... Isso é inevitável.

A partir desta constatação da inevitabilidade da morte, eu faço três perguntas; para que se
preocupar com isso? Por que viver com medo da morte? Por que buscar atrasá-la?

Antes de continuar deixe-me deixar bem claro que não estou falando em suicídio em massa. Não
estou falando em adiantar a morte, mas em não querer atrasá-la...

De que adianta viver preocupado em atrasar a morte se, como já vimos em outros
ensinamentos, você morrerá na hora que tiver que morrer?

NOTA – Refere-se ao estudo da pergunta 853a de O Livro dos Espíritos.

“Assim, qualquer que seja o perigo que nos ameace, se a hora da morte ainda não
chegou, não morreremos? Não; não perecerás e tens disso milhares de exemplos.
Quando, porém, soe a hora da tua partida, nada poderá impedir que partas”.

Então, não adianta lutar para botar a morte para depois, porque você morrerá na hora que tiver
que morrer. Não existe como adiar esta hora...

Além do mais, morrerá do jeito que Deus já sabia que você ia morrer... Não adianta querer
alterar isso...

NOTA – Refere-se novamente à mesma questão de O Livro dos Espíritos.

“Deus sabe de antemão de que gênero será a morte do homem e muitas vezes o
espírito também o sabe, por lhe ter sido revelado, quando escolheu tal ou qual
existência”.

A partir destes ensinamentos, pergunto novamente: para que esta busca desesperada de fugir
de uma coisa que tem data, hora e forma marcada? Para que o culto ao corpo se ele no melhor estado
que esteja – vamos fingir que você possa melhorar o estado dele – no dia pré-acertado vai parar?

Volto a dizer: não estou dizendo para se entregar à morte, mas perguntando para que a
preocupação com ela...

Imortalidade vocês sabem que não existe, não é mesmo? Então, por que esta busca e
preocupação em estar saudável?

Esta é uma pergunta que eu gostaria que vocês respondessem, pois esta busca que lhes faz
sofrer. É o desespero e a angústia de querer a cada dia atrasar mais a morte que lhes faz sofrer...

Esta busca lhe cria um estado permanente de tensão... “Hoje tenho que fazer a minha
caminhada; tenho que tomar meus remédios”... Por que isso? Será que se não caminhar hoje irá morrer
amanhã do coração? Não irá, a não ser que o amanhã seja o dia pré-determinado para o coração parar.
Mas, se for, de que adiantou caminhar hoje? Será que a sua caminhada pode mudar o que Deus, o
Onisciente, já sabia?

É isso que Krishna está ensinando a Arjuna...


Página 36 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Volto a repetir: não estou dizendo que é para viver a vida buscando a morte, mas sim vivê-la livre
da morte. É muito diferente...

Uma coisa é você agir naturalmente, outra é agir obcecadamente em um sentido. A vida vivida
em perseguição do estender a vida, além de ser sofrida, é – vou usar a palavra que Krishna usa – uma
atitude idiota. Por quê? Porque a sua obsessão não acrescentará um segundo a sua vida...

Por isso Krishna incita Arjuna a ir lá e cumprir o seu dever devocional.

28. Ó Bhârata!... os seres passíveis de se conhecer no início são imanifestos;


no meio, se manifestam; e, no fim, voltam a ser imanifestos. Então,
porque te afliges por isso?

Qual o ser passível de conhecer? O ser humano... O ser espiritual, já dissemos que vocês não
podem conhecer...

O ser humano, aquele que é passível de se conhecer pela razão, no início é imanifesto, pois é
um espírito. No meio torna-se manifesto, porque é percebido pelo corpo que utiliza. No fim, torna-se
novamente imanifesto, porque se liberta do corpo em que viveu...

29. O ser, alguns o consideram como algo maravilhoso; outros falam dele
maravilhados; outros mais, ouvem falar dele com assombro e existem
ainda aqueles que, mesmo que ouçam falar dele, o desconhecem.

Para podermos compreender bem o ensinamento de Krishna neste trecho, vamos ver cada uma
das suas falas. A primeira: alguns o consideram como algo maravilhoso...

Alguns consideram o ser como algo maravilhoso. O que quer dizer isso? Alguns acham o ser, o
espírito como algo maravilhoso e por isso vivem com a intenção de vivenciar o ser, o atma, o mundo
espiritual, pois eles acham maravilhoso este tipo de vida.

Segunda frase de Krishna: outros falam dele maravilhados... Quem são estes? São aqueles que
conhecem o mundo espiritual, o acha muito bom, mas não deixam de viver a vida carnal pelos valores
materiais...

Terceira frase: outros mais ouvem falar dele com assombro... Alguns,quando descobrem a
existência do mundo espiritual, se assombram com o que descobrem. Na verdade esses não estão
buscando nada, a não ser satisfazer a sua curiosidade. No entanto, este é o princípio da caminhada.

Assombrar-se com as coisas espirituais é o início do caminho de todos aqueles que buscam a
Deus. É a partir deste caminho do assombro que o ser humanizado poderá, posteriormente, se
maravilhar ou só falar dele maravilhado.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 37
O assombro do ser humanizado é o início do caminho. É quando ele descobre a existência do
Universo além da percepção. A partir do momento que ele descobre a existência do Universo extra
perceptivo pode buscar a maravilha ou falar maravilhado do que descobriu.

Quarta frase de Krishna: existem aqueles que, mesmo que ouçam falar dele, o desconhecem...
Nesta o mestre fala que existem aqueles que possuem apenas o conhecimento material sobre o atma,
porque ouvem falar dele, mas o desconhece.

Portanto, neste trecho, Krishna nos fala das formas de contato que o ser humanizado pode ter
com o mundo espiritual. Aqueles que se assombram com as coisas do mundo espiritual, depois deste
primeiro contato, podem maravilhar-se com este novo mundo ou apenas falar dele maravilhado. Estes
últimos falarão dele, mas não o conhecerão... Estes são aqueles que se prendem a uma imagem
humana do mundo espiritual.

Como já dissemos não se pode imaginar o mundo espiritual pelos valores materiais. Mas,
existem muitos se relacionam com o atma deste jeito. São aqueles que querem descobrir os segredos
científicos do mundo espiritual, querem aprender técnicas ditas espirituais.

Só que este conhecimento do atma é irreal, não é real. Qualquer coisa que o ser humanizado
possa compreender pela razão a respeito do mundo espiritual não é real, pois ele é impensável. Estes
são os últimos sobre os quais Krishna fala: aqueles que têm muita cultura sobre o atma, mas que só
possuem cultura material sobre ele.

Mas, como já disse, isto é caminho. Este ser, depois de se deslumbrar com o mundo espiritual,
começa a falar dele deslumbrado. Este falar, no entanto, ainda não é a realização, pois o ser
humanizado que imagina conhecer o atma pela razão ainda está preso ao prazer e dor.

Este ser fala maravilhado do mundo espiritual, fala da maravilha que é o universalismo, mas
ainda busca ganhar sempre durante a vida carnal, ainda busca satisfazer seus desejos e vontades. Só
depois que ele entra na última etapa, quando se entrega à maravilha que é o mundo espiritual e desliga-
se tanto do conhecimento quanto da busca da realização dos desejos é que o ser humanizado alcança a
unidade com Deus.

Estas são as etapas de evolução de um ser humanizado. É isto que Krishna está ensinando a
Arjuna neste trecho.

Todos os seres humanizados no planeta Terra estão distribuídos nestas quatro faixas. Todos
podem nascer e morrer (reencarnar) na mesma faixa constantemente...

A reforma íntima consiste-se justamente em mudar de posição dentro destas faixas: passar do
assombro para a busca cultural; ultrapassá-la quando começar a falar maravilhado; e, por fim, entregar-
se totalmente à maravilha...

É preciso você descobrir onde está nesta escala, para poder buscar alcançar a próxima fase. Se
você ainda está na fase cultural, a próxima será falar maravilhado e não viver na maravilha. Isso é
inexorável, pois, ninguém pula de faixa. Já dissemos isso: a natureza não anda em saltos...

Apesar de não poder ultrapassar nenhuma fase, é importante que você saiba que existe todo
este caminho a ser percorrido. Isto porque, quem entra numa faixa imagina que já alcançou tudo o que
poderia alcançar... Aquele que se assombra, quando descobre o conhecimento racional sobre o atma
diz que nada mais há para ser conhecido; quando começa a falar maravilhado vê que ainda faltava
alguma coisa, mas acha que agora conquistou tudo o que havia para ser conquistado...
Página 38 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
É isso que Krishna está ensinando a Arjuna e ao mesmo tempo perguntando a ele: que tipo de
devoto é você? Que tipo de ser em evolução é você?

30. Ó Bhârata, este ser que mora em todos os corpos é sempre indestrutível;
portanto, não deverias afligir-te por nenhuma criatura.

Não houve comentários sobre este texto...

31. Ainda que tivéssemos que encarar a tua existência desde o ponto de
vista do dever moral que te rege, não deverias vacilar, pois não há nada
mais elevado para um guerreiro do que uma guerra justa.

Vamos tentar entender este ensinamento de Krishna. Existem duas formas de se fazer coisas: a
forma justa e a individualista, egoísta... Vamos explicar...

A forma justa é aquele que não traz conforto nem satisfação. É aquele que você exerce sem
buscar auferir lucros pessoais. Esta é a forma justa de se participar de uma ação. Já a forma
individualista é exatamente ao contrário: quando você participa das coisas com paixão, positiva ou
negativa. Quando você coloca paixão no que faz...

Então, o problema não é o que se faz, mas sim a intenção com que se vivenciam os
acontecimentos.

Quando se fala em fazer alguma coisa, para vocês existem duas espécies de atos: os que
podem ser feitos e os que não podem. Ao invés de separarem as ações pela intencionalidade, as
separam por regras e normas que ditam o que pode e o que não pode ser feito.

Mas, Krishna, o sublime Senhor diz a Arjuna: não se aflija com a obrigação, mas se preocupe
com a intencionalidade. Preocupe-se se a ação é justa. Preocupe-se em não levar vantagens individuais.

O ser humanizado não está acostumado a este tipo de separação das ações. Como vocês
seguem normas, criam obrigações: a de fazer o que a norma diz que deve ser feito e a de não fazer o
que norma diz que não deve ser feito. Seguir estas obrigações, no entanto, cria uma intencionalidade
que acaba com a justiça de qualquer ação que participem...

É por isso que Cristo ensina que não é necessário nem praticar o ato: se houver o desejo, já
aconteceu o pecado. Isto porque você já teve uma intenção.

Sendo assim, não matar uma pessoa porque é proibido matar, é prender-se a uma intenção: não
querer matar porque acha que não deve matar... Isto é individualismo, é egoísmo, gera um tipo de
carma... Agora, se você mata e não sabe por que fez aquilo e nem se o outro ou você merecia passar
por aquilo, está gerando um carma diferenciado – não quero falar em positivo ou negativo, por isso digo
carma diferenciado.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 39
É por isso que Krishna está incitando Arjuna a participar da batalha, mas que o faça sem
intenção alguma... Ele faz isso porque sabe que o serviço devocional, o cumprimento da lei de Deus é
vivenciado com intenções ou não. Quando um ser age preso a intencionalidades recebe um tipo de
carma, quando age liberto delas, recebe outro. Mas, a lei sempre se cumprirá...

É o caso, por exemplo, daqueles que precisam morrer assassinados nesta encarnação por
causa de um planejamento carmático. Para que isto aconteça é necessário que haja alguém que
cumpra este papel na peça. Este agente da lei só receberá um carma desmerecedor se vivenciar esta
situação preso a intencionalidades geradas pelo ego...

Participante: Krishna fala em ser justo ao guerrear...

Você está pensando na justiça a partir do que? Da sua justiça?

Participante: Não, na justiça ensinada por Krishna...

Mas será que você pode ter Krishna sempre ao seu lado para lhe dizer quando é justo guerrear?
Claro que não... Então, vamos entender a justiça de Krishna...

Ele diz assim: você é um guerreiro e a sua função neste mundo é guerrear... Para você entender
a justiça de Krishna, precisa compreender que cada um tem um papel na divina comédia humana que
precisa exercer.

Vou dar um exemplo: um advogado. Os profissionais que atuam na defesa dos direitos dos seres
humanizados acham que deveriam vencer todas as causas em que atuam. No entanto, tem muitas
vezes que eles não conseguem lograr êxito no desempenho de sua função.

Participante: Depende do infringir a lei ou não...

Errado. Tem muitos que não infringiram a lei que os advogados não conseguem tirar da cadeia,
mas tem outros que com certeza a infringiu que nenhum advogado consegue prender...

Por que isso? Porque o papel do ser humanizado advogado é advogar e não prender ou soltar, o
que faz parte da lei maior, do planejamento carmático da existência daquele outro ser. Portanto, cumpra
o seu papel sem intencionalidade, ou seja, advogue sem esperar soltar ou prender ninguém... Faça o
melhor de si, mas não espere resultados, ou seja, não tenha intencionalidades...

Se o advogado se prendesse às leis espirituais como conhecidas no planeta, ou seja, pela falsa
benevolência, ele teria que ter a intenção de soltar quem ele acha inocente. Mas, agindo assim, apesar
de o aspecto humano dizer que este é uma pessoa boa, ele teria sido injusto, porque colocou uma
intencionalidade na ação, quando ele é um mero instrumento de uma história pré-escrita.

É isso que Krishna está dizendo a Arjuna: se você é guerreiro, lute, mas o faça sem
intencionalidade de matar ou poupar alguém, para que a sua luta seja justa.

Lutar é a função de um guerreiro, por isso todos que vivenciam este papel precisam guerrear.
Não querer participar das ações que são inerentes ao seu papel em nome de qualquer coisa, mesmo
aquelas que humanamente são consideradas sublimes, é juntar vivenciar a situação com seu interesse
pessoal.

Por isso Krishna ensina: não se prenda a palavras, não se prenda a leis, mas alcance a
consciência de fazer sem intencionalidade. Isso se chama consciência amorosa...
Página 40 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I

32. Ó filho de Prithâ... em realidade, afortunados são os guerreiros, aos quais


se lhes apresenta, sem que a busquem, como uma porta que se abre para
o céu, uma guerra justa como essa.

Não houve comentários sobre este texto...

33. Mas se tu não tomares parte nesta guerra justa, faltando com teu dever e
honra, cometerás o pecado.

Não houve comentários sobre este texto...

34. Além do mais, as pessoas sempre falarão mal de ti e para um indivíduo


de reputação, a desonra é pior que a própria morte.

Não houve comentários sobre este texto...

35. Todos estes grandes guerreiros em seus respectivos carros pensarão


que te retirastes da batalha por medo. E aqueles mesmos que antes te
tinham honrado com respeito e admiração depois com desdém te
tratarão.

Não houve comentários sobre este texto...

36. Teus inimigos falarão coisas indizíveis ou muito desagradáveis contra ti;
rir-se-ão do teu valor e coragem. Para um guerreiro, pode haver algo mais
doloroso do que isso?

Não houve comentários sobre este texto...


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 41
37. Se morreres na batalha, ganharás o céu; se alcanças a vitória,
desfrutarás a terra. Por isso, ó filho de Kunti, levanta-te decidido a lutar.

Não houve comentários sobre este texto...

38. Considerando iguais o prazer e a dor, a vitória e a derrota, o lucro e a


perda, aceita luta. Desse modo, o pecado não te manchará.

Não houve comentários sobre este texto...

39. Já te ensinei a necessária atitude que manterás no que diz respeito ao


entendimento do ser. Escuta agora, ó filho de Prithâ, o que te direi a
respeito do caminho da ação (ou Yoga), graças a cujo entendimento
libertar-te-ás da maléfica ação personificada ou intencional e respectiva
conseqüência.

Não houve comentários sobre este texto...

40. Neste sendeiro da ação (ou Yoga), nenhum esforço se perde, por mais
incompleto que seja, nem se produzem resultados maus ou menos
contraditórios. Até mesmo uma prática mínima desta Yoga libera o
homem de um grande perigo e temor.

Até aqui vimos os aspectos iniciais da conversa de Krishna com Arjuna. Agora começaremos a
estudar o trabalho da elevação espiritual chamado de caminho da yoga ou o sendeiro da ação, que é a
mesma coisa...

Para começar o bendito Senhor nos diz que: nenhum esforço se perde, por mais incompleto que
seja; não se produzem resultados mais ou menos contraditórios; e, finalmente, que a prática mínima
deste caminho libera o homem do perigo e temor. Vamos ver isso...

Nenhum esforço se perde... O que quer dizer isso? Todos os atos que são feitos, mesmo aqueles
considerados “maus”, são válidos para a elevação espiritual...

Não estou falando apenas de atos físicos. Mesmo quando você escolhe um sentimento
individualista (egoísta) para vivenciar os atos da vida, esta forma de proceder é válida para a elevação
espiritual.

Por quê? Porque é a vida do espírito...


Página 42 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Na existência do espírito nada se perde: tudo vira lição. Quando o ser universal humanizado opta
por um sentimento egoísta para vivenciar uma situação da vida material, é mais um ensinamento que
aprende e com isso uma nova oportunidade de elevação se apresentará.

Então, quando você opta em determinadas situações por sentimentos individualistas, não se
desespere, pois isto é válido para a sua elevação espiritual. Claro, melhor seria se você optasse pela
universalização, pois avançaria mais. Mas, saiba que mesmo quando opta pelo egoísmo, algo foi feito no
sentido da sua aproximação de Deus...

Portanto, aí está o primeiro conhecimento necessário da prática do caminho da yoga: nunca se


lastime por nada...

Jamais se arrependa do que fez ou deixou de fazer. Jamais qualifique o que fez de “bom” ou
“mau”, porque aquilo é útil à sua elevação espiritual. Jamais se contrarie com o que aconteceu ou que
deixou de acontecer...

Ou seja, não se lastime por nada, porque tudo que você faz vale alguma coisa para a sua
elevação espiritual. A forma de reagir a determinados acontecimentos faz parte da sua caminhada, do
seu aprendizado. Se você perde tempo parado no passado se lastimando, ou seja, culpando a si ou a
outro pelo que aconteceu, parou no tempo.

Na vida do espírito, como já dissemos, não existe passado ou futuro: a única coisa que existe
para ele viver é o presente. Só que ele tem que viver o presente olhando para frente. Olhando para o
que ainda pode acontecer e não para o que passou.

O ser humanizado deve vivenciar a sua existência carnal sem se amarrar as coisas que
passaram e ficar lamentando-se delas. Vivendo assim, o ser se prende o passado e com isso não vive o
presente e nem terá futuro, já que o futuro é construído no presente.

Este é o primeiro grande ensinamento; este é o primeiro grande aviso: não se lastime por nada.
Tudo vale alguma coisa e quando você fica lá atrás se lastimando, perdeu uma nova oportunidade de
realizar algumas coisas.

41. Neste caminho, ó descendente de Kuru, existe uma única determinação


que se dirige somente a um objetivo. No entanto, tu sabes muito bem que
os propósitos das mentes irresolutas são inúmeros e desencontrados.

Segundo aspecto da yoga ou do caminho da libertação: ele é totalmente dirigido à realização do


ser...

O que quer dizer isso? Ele não é dirigido para que você tenha alguma coisa, ganhe ou participe
de algo, mas toda vida onde se busca a elevação espiritual tem uma única preocupação: se auto-realizar
no ser.

O que é esta auto-realização no ser? É alcançar a paz interior, a harmonia com o Universo e a
felicidade incondicional. Esta é a estrada da libertação ou da elevação espiritual. O ser humanizado
yogue é aquele que vive para a sua auto-realização nestes três aspectos.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 43
O ser que caminha por esta estrada se preocupa sempre em estar harmonizado com o Universo,
por isso não vive procurando motivos para discordâncias. Quando estes motivos por acaso surgem em
sua mente, ele os mata. Ele mata estas idéias porque o objetivo dele não é difamar o próximo ou ser
superior a ele (estar “certo”), mas sim harmonizar-se com o próximo.

O yogue não faz guerra contra ninguém, não aponta erro dos outros, não julga nem critica
porque está sempre objetivando a paz, está sempre preocupado em viver em paz. Por isso, ao invés de
lutar contra o outro para provar que está “certo”, ele luta contra si mesmo: briga consigo para calar a
crítica que surge através do ego...

O ser humanizado yogue não vê motivos de sofrimento, porque não tem nada para perder, fazer
ou ser. A única coisa que ele objetiva nesta vida é alcançar a verdadeira felicidade, aquela que não
depende de realização alguma. Por isso luta contra os desejos para que a felicidade dele não seja
condicionada a alguma coisa.

Este é o verdadeiro yogue. Ele pode ser chamado assim porque tem a mente em paz. Já aquele
que possui a mente perturbada por milhares de objetivos nada consegue com relação à elevação
espiritual, pois não tem como objetivo a harmonia, a paz e a felicidade verdadeira...

O ser humanizado que não caminha pelo caminho da elevação espiritual no trabalho tem um
objetivo, em casa, na rua ou na escola outros. Ou seja, ele tem diversos objetivos e acaba se perdendo
nesta montanha de vontades e desejos.

Quando vai para casa esquece o objetivo que tinha no trabalho e passa a se dedicar a outro. Sai
de casa e seus objetivos mudam... Ao viver assim esquece que cada vez que altera o objetivo, a razão
de estar vivendo, deixa de se realizar, de sentir-se pleno...

É por isso que os ser humanizado jamais se realiza durante a sua existência. A existência desta
multiplicidade de objetivos a serem alcançados para poder levar o ser ao gozo da plenitude da felicidade
cria a necessidade de que ele fosse um super-homem: alguém capaz de realizar tudo...

É por isso que os ser humanizado sofre, não consegue harmonizar-se com o mundo e não vive
em paz: por colocar estas realizações na dependência de alcançar seus múltiplos objetivos
individualistas. Para ser feliz ele teria que inverter o processo, ou seja, ao invés de colocar estes
elementos (paz, felicidade e harmonia) como dependentes de vontades, os transformar em objetivos de
vida...

Sendo assim, posso dizer que reforma íntima é colocar a paz, a harmonia com o mundo e a
felicidade incondicional como objetivo de vida.
Página 44 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
42, 43 e 44. Ó Partha... os tolos, cuja mente está cheia de desejos e que
consideram a vida celestial (ou paraísos relativos e pensados) como a
sua meta mais alta, os quais estão submissos aos penegíricos védicos
(no ocidente, submissos à letra morta dos versículos bíblicos) e que
consideram isso algo muito superior, esses ignorantes, ó Arjuna, falam
com os costumeiros termos floridos a respeito das diversas classes de
cultos védicos, cultos esses que originam os nascimentos, as ações e
seus resultados, como meios para o prazer e a dor. Aqueles que se ligam
a esses néscios e se deixam levar por toda essa fraseologia enfeitada,
jamais lograrão a determinação única, que conduz o homem à absorção
espiritual.

Vamos entender isso, porque apesar de parecer muito complicado porque tem algumas palavras
difíceis, este texto é importante para quem quer realizar-se no ser.

Na verdade o que Krishna diz é o seguinte: alguns ensinam o reino do céu através da letra fria.
Antes de buscar o entendimento, uma observação: ligo aqui o ensinamento de Krishna ao reino do céu
(ensinamento bíblico) porque, apesar do texto falar em livros védicos, os “Vedas” são os livros sagrados
hindus, assim como a Bíblia o é dos cristãos. Portanto, em essência eles são a mesma coisa: o
instrumento usado pelos religiosos para buscarem a elevação espiritual.

Sendo assim, o alerta serve para elementos de qualquer religião: não procure a elevação
espiritual preso apenas à fraseologia enfeitada de um livro sagrado, porque quem assim age jamais logra
alcançá-la. Vamos compreender isso...

Os católicos, por exemplo, pela prisão à letra fria, acreditam que, depois do desencarne,
“dormirão” até o dia do juízo final. Por isso, para eles, o ideal é morrerem, ou seja, “dormirem” depois do
desencarne. Os espíritas são levados a acreditar na existência das cidades espirituais. Por causa deste
apego à letra fria, ao saírem da carne, buscam uma cidade espiritual.

Os mulçumanos acreditam que Alá fez no reino do céu uma grande tenda onde haverá um
harém cheio de virgens para eles. Os budistas sonham com o Nirvana, ou seja, com um jardim muito
bonito, com lindas plantas, borboletas... Por isso estes religiosos sonham com a chega a estes lugares.

Mas, Krishna está nos ensinando que não devemos nos apegar a estas coisas. Por quê? Porque
estas coisas foram apenas figuras criadas através de determinadas palavras que os mestres usaram
para simbolizar a felicidade plena...

Aqueles que buscam a felicidade a partir da satisfação, ou seja, precisam de determinadas


coisas para ser feliz, na verdade não alcançam lugar algum, porque só alcançaram a realização dos
seus desejos. Como o que surge quando isso acontece é o prazer, estes terão que reencarnar para
realizar o trabalho da reforma íntima, pois ainda estão presos aos desejos e paixões humanizados.

É isso que Krishna está nos ensinando. O caminho da yoga, da libertação, é o caminho do fim do
desejo de tudo. É chegar ao mais alto poder de harmonização com o Universo, ou seja, ser feliz
incondicionalmente. É isso que pode e lhe levará à elevação espiritual.

É por isso que ele fala que quem se liga a esses néscios (ignorante, incapaz – Mini Dicionário
Aurélio) se prende à vida carnal, mesmo depois de desencarnado. Ele está preso à roda de encarnações
e por isso terá que novamente voltar à condição de humanizado.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 45
O verdadeiro buscador de Deus precisa ouvir as palavras, mas precisa também ir além do
sentido humano delas. Compreender, por exemplo, que o mestre não podia dizer que o céu era uma
tenda no meio do deserto cheio de virgens, porque se fizesse isso, estaria decretando que mulher não
entra no reino do céu, a não ser para servir os homens...

Na verdade, o texto sagrado dos mulçumanos prendeu-se a elementos daquela época, onde a
mulher não era levada em consideração. Por isso o texto foi escrito para chamar a atenção de homens e
não de mulheres...

É isso que estou querendo dizer. Na verde o que Krishna nos ensina é que temos que buscar a
felicidade incondicional. Esta felicidade que o mestre fala está acima de qualquer figura que possa ter
sido criada pelos textos sagrados de cada religião.

Na verdade ela está no interior de cada um, no coração... Por isso, para alcançá-la, é preciso se
desligar de toda e qualquer imagem (paixão) e dos desejos e vontades que surgem através da mente.

Para eliminar as idéias que temos sobre o que é viver no reino do céu, pergunto: o que é o reino
do céu? É um estado de espírito onde, esteja você onde estiver, tendo quem quer que seja ao seu lado,
você viva em perfeita harmonia com o Universo e em felicidade.

Isto é o reino do céu... Não importa se você está na carne ou não: na hora que estiver vivendo
assim estará no reino do céu...

45. Nossos Vedas tratam dos três gunas, que são Sattva, Rajas e Tamas. Ó
Arjuna, liberta-te desses três gunas relativos, liberta-te dos pares de
opostos e, sempre equilibrado, ficarás lvre dos pensamentos de
aquisição e posse, estabelecendo-te no ser (ou Atma).

NOTA: Sattva – qualidade da bondade; Rajas - qualidade da atividade e da


paixão; Tamas – qualidade da inércia e do obscurantismo.

Antes de qualquer coisa vamos entender o que é “guna”: propriedades do pensamento... Gunas
são direcionamentos que estão embutidos nos pensamentos humanos.

O primeiro guna que Krishna cita é o sattva. Este é o guna da bondade, ou seja, da sua forma de
pensar as coisas com bondade. O que você acha que é bondade é formado pela ação do guna sattva
presente no seu ego e não uma verdade por si mesmo.

Apesar deste guna parecer algo “bom”, porque humanamente se acha que pensar com bondade
é “bom”, Krishna nos diz que o buscador de Deus precisa se libertar deste padrão. Isto porque, se você
estiver preso (acreditar como real) nos padrões de bondade que existem na sua razão, automaticamente
também acreditará nos padrões de maldade que existirão por causa do dualismo.

O bendito senhor ensina isso porque sabe que a prisão aos pensamentos formados pelo guna
sattva prende o ser universal ao prazer, ou seja, condiciona a felicidade. Isso porque nasce o desejo de
vivenciar o que é considerado bondoso e o desejo de não vivenciar o que não é assim considerado.
Deste desejo de vivenciar o que se quer nasce o condicionamento à felicidade e, com isso, a desarmonia
com o Universo.
Página 46 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Vou dar um exemplo: a mãe espera que o filho faça determinadas coisas (estude, trabalhe,
cresça materialmente). Esta forma de pensar é considerada como bondosa pela humanidade. Por
acreditar nisso, o ser que se humaniza como mãe vivencia esta criação da razão como real e “certa”.
Mas, quando o filho, por seu próprio carma, não age assim, ela sofre... Esta desarmonia com o Universo
(aquilo que ela vive) não lhe deixa alcançar a elevação espiritual...

Na verdade este ser não se elevou por culpa do filho – porque ele a fez sofrer – mas, por sua
própria culpa. Deixou de unir-se a Deus (entrar no gozo da felicidade plena) não por culpa do filho, mas
por sua própria, pois colocou a realização dos seus desejos como condicionamento à felicidade.

Segundo guna que Krishna cita: rajas. Esta é a propriedade da mente humana que insere nos
pensamentos o gostar de alguém, do que deve ser feito, do que precisa ser realizado...

Esta é a qualidade do pensamento que cria as paixões. É a partir destas paixões, positivas
(gostar, fazer) e negativas (não gostar, não fazer), que nascem os desejos que condicionam a
felicidade...

Terceiro guna: tamas. Este é o guna que confere ao pensamento direcionamentos no sentido de
omitir-se, de esperar as coisas realizarem por si só.

Um destes três direcionamentos está sempre presente em cada formação mental criada pelo
ego. São eles que servem de base ao ego para a criação dos pensamentos. É por existirem estes três
direcionamentos que nascem as suas paixões e delas surgem, então, os desejos que condicionam a
felicidade, ou seja, lhe afasta da realização no ser...

Mas, estes direcionamentos jamais poderão deixar de existir... Enquanto você estiver preso a um
ego humanizado estará sujeito as formações mentais e elas sempre estarão fundamentadas em um
destes três gunas. Por isso Krishna diz: seja equânime...

Ou seja, trate com igualdade os três impulsos que a formação mental usar para decretar o que
você tem que fazer ou deixar de realizar. Ou seja, se ela lhe diz que você deve agir, não se prenda a isso
como realidade; se ela disser que deve omitir-se, não acredite sentimentalmente nisso; se ela lhe disser
que tal coisa é “certa” moralmente de ser feita, não creia nisso...

Na hora que o ser humanizado buscar a yoga, ou seja, o caminho da libertação, terá
obrigatoriamente que abrir mão dos seus gunas. Se não abrir mão destes padrões que compõem o
pensamento não conseguirá jamais a equanimidade necessária para que evolua.

Participante: É tão simples assim... Basta abrir mão destes impulsos?

Sim, a elevação espiritual é simples...

Mas, não pense que este ensinamento é primazia dos hindus. Cristo ensinou a mesma coisa: se
os seus olhos lhe faz pecar, arranque seus olhos porque é melhor entrar no reino do céu sem um olho do
que ir para o inferno com os dois. Ao ouvir isso os discípulos perguntaram ao mestre: o senhor está
dizendo que somos pecadores? Cristo respondeu: se dizem que podem ver, são...

Na verdade este ensinamento cristão é a mesma coisa que acabamos de ver com palavras
diferentes. Isso porque tudo que você percebe através da visão leva à formação de um pensamento
onde estão presentes as características dos gunas.

Portanto, se você abrir mão de tratar o que vê como real estará eliminando a ação do guna...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 47

46. Para um autêntico brâmane, vivenciador da Verdade, todos os livros


sagrados ou Vedas são de pouca valia. Tais livros assemelham-se a um
pequeno tanque de água que perde a sua utilidade quando, como numa
inundação a água (ou vivência) se espalha por todas as partes.

Este é um ponto que já tinha comentado diversas vezes. Já havíamos falado dele quando
estudamos os ensinamentos de Buda.

Lá dissemos que o ensinamento é como um barco que lhe leva do porto da ignorância ao da
sabedoria. Só que quando se chega o destino é preciso desembarcar (esquecer o ensinamento). O
problema é que tem muita gente que acha o barco bonito (imagina que o ensinamento é muito profundo)
e fica navegando eternamente dentro do barco. Com isso não realiza nada...

Na verdade, todos os ensinamentos não valem de nada: eles são apenas culturas. O que você
precisa alcançar é a sabedoria, ou seja, a cultura na prática...

Enquanto você tiver cultura apenas, este saber lhe parecerá um oásis: sentir-se realizado por ter
alcançado uma verdade, uma coisa importante que você deve saber e ensinar aos outros. Mas, isso não
leva à lugar algum: o que você precisa é praticar o que aprendeu...

Quando você transfere a cultura para a sabedoria, transfere para a vivência, tudo o que soube
torna-se automático em você. Na verdade, você se inunda com o saber e aí não mais consegue ver um
oásis, mas faz parte dele. Enquanto apenas sabe, você consegue distinguir a água da terra...

O ser que alcança a sabedoria, ou seja, consegue a realização do que sabe, não mais se prende
ao ensinamento, porque passa a ser o próprio... É isso que Krishna está ensinando... Aliás, a mesma
coisa que estudamos em Buda, Cristo, em O Livro dos Espíritos, ou seja, um ensinamento universal.

Por isso compreenda: cultura é uma coisa, uma tina com água; sabedoria é aprender a viver
dentro da água...

47. Ó Arjuna... como ser manifesto e pensante somente tens direito à ação,
nunca aos frutos do que crês fazer. Portanto, que tua ação jamais seja
motivada pelos frutos. De outro lado, não te apegues à inação.

Vocês não podem criar nada que vai acontecer, pois tudo já está escrito e é realizado pelo faça-
se (emanação) de Deus... Vocês só têm, portanto, o direito de agir agora dentro do que está pré-escrito...

Por isso quando agirem agora, não junte a esta ação nenhuma vontade (intenção) de que ela
resulte em determinada coisa. Isto é perda de tempo, porque o futuro, ou seja, o que decorrerá da ação
de agora, já está escrito. Você não vai criar o futuro agora...

Não falo apenas da ação física, mas também da sentimental... Não participe das ações
esperando sentimentalmente receber alguma coisa... Jamais participe dos acontecimentos da vida com o
sentimento de espera de receber alguma coisa ou com medo do que possa vir a acontecer...
Página 48 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Ao contrário, participe do mundo de hoje, o agora, apenas de uma maneira perfeita e clara:
amando a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Esta é a única coisa que você
pode fazer (amar ou não a Deus, amar ao próximo ou a si mesmo) e isso não altera os acontecimentos
futuros, os seus carmas futuros... Portanto, não se preocupe com o futuro: ele acontecerá dentro do seu
plano carmático.

Ao contrário, concentre-se em saber se está amando o próximo ou não. Preocupe-se em ver se


está amando a Deus acima de todas as coisas ou não... Esqueça todo o resto, porque você não tem
comando sobre as coisas que sucederão este momento...

Esta é uma coisa que você, ser universal humanizado, pode realizar: amar. Só que quando o ser
humanizado tem notícia de que o futuro está pré-escrito, faz exatamente ao contrário: imagina que deve
cair na inação...

O que é inação? Não agir, não fazer nada, inércia... Quando um mestre fala nisso, o ser
humanizado, que está preso à ilusória capacidade de agir acredita que ele está falando em não agir
fisicamente. Mas, acontece que como futuro está pré-escrito esta ação acontecerá inexoravelmente e no
sentido que tiver que acontecer...

O mestre, como nós já vimos neste estudo até aqui, sabia disso. Por que, então, ele orienta
Arjuna a não se apegar à inação? Porque ele está falando da inação espiritual, do não agir
espiritualmente...

O ser universal humanizado pode agir sentimentalmente. Como disse anteriormente, ele pode
escolher entre amar a Deus e ao próximo ou amar a si mesmo. É sobre esta ação que Krishna está
orientando aos buscadores de Deus que não se entreguem à inação: não deixem de estar sempre
fazendo uma opção sentimental...

Ação é escolha sentimental através do livre arbítrio; a inação, ou inatividade espiritual, neste
caso é não escolher a cada segundo entre amar a Deus ou amar a si. Agindo dentro desta inação, o ser
humanizado entrega-se constantemente ao que o ego diz que é verdade...

Como já salientei em outras oportunidades, o ser humanizado deixou de racionar


sentimentalmente. Ele sabe através dos ensinamentos dos mestres que deve amar a Deus acima de
todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, mas não se preocupa em realizar isto. Por isso se deixa
levar pelas sensações que o ego cria.

O ego cria a idéia de que determinas pessoas são fofoqueiras. Cria, também, a sensação que
não se deve gostar delas por este motivo. Neste momento o ser universal pode agir amando a Deus e ao
próximo e, com isso, libertando-se desta sensação. Mas, ele não faz isso: entrega-se à inação, ou seja,
não realiza a opção e segue placidamente o que o ego diz que ele tem que sentir...

Chegou à inação... O ser humanizado não age mais... Se a única coisa que ele pode agir é
sentimentalmente, quando usa a sensação que o ego cria, não mais usou o seu livre arbítrio, não mais
agiu...

Se alguém um dia lhe der uma pisada, nunca mais será seu amigo, pois o ego criará sempre a
sensação de desconfiança para este ser e você, que não realiza a única ação que pode, a vivencia... Isto
é parar de raciocinar sentimentalmente... Isto é inatividade, inação...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 49
O espírito, a coisa mais magnífica do Universo, nasceu para ação: para exercer o livre arbítrio...
Quando se humaniza, se entrega às sensações criadas pelo ego, jogando fora assim o grande dom que
Deus lhe deu: a capacidade de optar pelo amor, ou seja, amar...

Nosso trabalho, que também é a yoga, o caminho da libertação, é ensinar aos seres
humanizados a exercer o livre arbítrio novamente. É isso que Krishna fala no início deste texto quando
diz que todos os livros védicos, ou seja, todo conhecimento trazido por ordem de Deus é no sentido
voltar a utilizar o livre arbítrio. De mostrar a importância de optar entre vivenciar os acontecimentos do
Universo amando ou se deixar ser guiado pelos gunas do ego...

Todos os mestres ensinaram isso. Cristo foi um mestre na arte de raciocinar espiritualmente, de
optar pela entrega a Deus e ao próximo acima de si mesmo. Por isso, todos os que querem unir-se a
Deus precisam retornar a esta atividade (exercer uma opção através do livre arbítrio sentimental) ao
invés de entregar-se à inação, ou seja, viver a vida seguindo placidamente o que os gunas criam...

Falo em libertar-se da inação do raciocínio espiritual, porque do exercício do raciocínio material


os seres humanizados não abrem mão. Apesar de todos os mestres ensinarem que Deus é a Causa
primária de todas as coisas, os seres humanizados não abrem mão de dizer que são eles que escolhem
se uma pessoa é bonita ou feia. Não abrem mão de realizar esta ação, mas por outro lado, não dão à
mínima ao livre arbítrio espiritual...

Utilizar-se do livre arbítrio do ser universal é o grande bem que o espírito perdeu quando deixou
de viver para Deus e entregou-se ao mundo material como independente do Universo... Por isso Cristo e
todos os mestres vieram ensinar isso...

48. Ó Dhananjaya... abraça essa forma de agir ou estabelece-te nessa yoga e


renuncia ao apego. Sê indiferente ao sucesso e ao fracasso e assim
comporta-te. Esta equanimidade é a própria Yoga.

O que é a própria yoga?

Participante: A equanimidade...

Que surge do que? Do desapego e da indiferença ao sucesso e ao fracasso... Ou seja, da não


busca da fama individual...

O ser humanizado deixou de raciocinar e por isso convive com os seus conceitos como verdades
puras, cristalinas. Mas, ao fazer isso, não entende que não está vivendo consigo mesmo, porque estes
conceitos não são dele. Na verdade são conceitos que lhe são impostos, pois foi sua mãe, pai, tia,
mulher, ou seja, a humanidade que os criou.

Quando o garoto é pequeno a mãe ensina a não andar descalço. De tanto ela repetir isto, o ser
humanizado toma como sua esta verdade e nunca mais anda descalço. Se andar, cria
inconscientemente a culpa que pode se transformar em doença...

O ser humanizado trocou toda a arte de pensar, de escolher seu próprio caminho, pela busca da
fama, ou seja, para mostrar ao mundo que ele conhece e segue as verdades do mundo... Este ser não
anda calçado porque quer, mas para poder dizer que aprendeu a verdade que é aceita como “certa” pela
humanidade...
Página 50 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
É a isso que Krishna está se referindo neste trecho: a busca do elogio, da fama, do ser
considerado humanamente “certo”. Por conseguinte, fala também do medo da crítica, ou seja, do medo
de ser repreendido por não estar agindo “corretamente”.

Dentro do nosso exemplo, se o ser humanizado gosta ou não de andar descalço para ele isso
não tem importância, porque ele anda sempre para provar que conhece as verdades do Universo e por
medo de ser considerado alguém que destoa do mundo... Na verdade cada ser humanizado passou, por
comodismo, por inação, não por maldade, a agir de acordo com as verdades que lhe foi dada, para
buscar a fama...

Por isso Krishna falou anteriormente que o ser humanizado precisa voltar a raciocinar. A
raciocinar espiritualmente (escolher sentimentos) e não deixar levar-se pelos gunas que dão
características aos pensamentos...

O ser humanizado precisa voltar a discutir consigo mesmo. Será que ao criticar o próximo está
amando-o? Será que se ao acusar o próximo está amando-o? Será que ao desejar uma coisa a ponto de
sofrer se não consegue está amando mais a Deus do que a si mesmo?

Realizar estes questionamentos no seu mundo sentimental é o caminho da yoga, o caminho da


elevação. Aqueles que entram neste caminho, entram nesta prática: voltar a raciocinar espiritualmente.
Com isso o ser humanizado volta a realmente viver, pois hoje ele não vive: conta tempo, passa pela vida.
Isso porque apenas repete conceitos sentimentais sem exercer o livre arbítrio, exercício esse que
caracteriza o existir...

Salomão, o Sábio, dá um grande conselho neste sentido: será que você pode fazer alguma coisa
que ninguém fez? Veja que tudo que um ser humanizado pode fazer, já foi feito por outro. Sendo assim,
o ser não cria nada: apenas repete o que alguém já fez.

É importante entender isso porque se a elevação é caracterizada por uma reforma íntima, é
preciso reformar o nosso íntimo. Ninguém se reforma apenas repetindo o que todos fazem...

Se alguém bebe, o ser humanizado logo vibra na acusação chamando-o de alcoólatra... Acha
que este conceito é ele que está criando, mas não vê que é apenas uma repetição do que o mundo, a
sociedade, a humanidade acha...

Será que você vibrar dentro da sensação que acompanha a denominação de alguém como
alcoólatra é sinal de amor? Ou amá-lo não seria dar a ele o direito de beber até morrer, se assim
quisesse? Claro que sim, pois desta forma estaria utilizando o sentido de liberdade que está embutido no
amor.

Para que você ame o outro deve conceder a ele a liberdade absoluta, ou seja, dar o direito dele
fazer e ser o que quiser. Esta forma de viver respeita o direito à individualidade que todos querem ter e
que, por conseguinte, devem dar aos outros para amá-los segundo o Espírito da Verdade.

NOTA: Refere-se a uma pergunta de O Livro dos Espíritos onde o Espírito da


Verdade afirma que a expressão máxima do amar é dar ao próximo o que deseja
para si. Neste caso, se alguém quer ter o direito de não beber, deve dar ao outro o
direito de fazê-lo.

O ser humanizado não tem nada a ver com a vida do outro, porque não a vive. Apesar disso, não
consegue viver sem criticar a quem bebe, pois precisa mostrar que conhece as leis morais do planeta
(beber não é “certo”) para poder assim, ser reconhecido como uma pessoa “boa”...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 51
É isso que Krishna fala neste texto. Ele fala que, apesar da ação dos gunas que criará no
pensamento o sentido de criticar o outro (ele é um bêbado, não presta), o verdadeiro yogue busca
raciocinar do ponto de vista sentimental: eu amo essa pessoa?

Não estou falando de amor humano, daquele que tem condições para existir. Estou falando do
amor universal, aquele que é incondicional. Quando o ser humanizado ama universalmente alguém, o
acolhe em seu coração sem críticas, bêbado ou são...

O amor universal não tem dualismos: existe numa hora e não existe na outra. Por isso, não
importa se a pessoa deixou de beber, está bebendo ou já está bêbado, ele existe...

49. Ó Arjuna, qualquer obra que se cumpre movida pelo desejo é bastante
inferior à que se cumpre com a mente não perturbada pelos resultados
almejados. Portanto, refugia-te na Yoga do reto entendimento. Infelizes
são aqueles que sempre se movem em busca de um resultado.

Por que a obra cumprida com desejo é inferior à outra?

Participante: Porque o ser imagina que é capaz de fazer alguma coisa, mas tudo
já está escrito...

Sim, mas há outro motivo. Quem cumpre uma obra motivado pelo desejo encontra o quê como
resultado?

Participante: O que ele esperava acontecer ou o que não esperava...

Certo... Agora, se ele encontra o que não esperava sofre, mas se encontrar o que esperava, ele
terá felicidade. Como, então, Krishna fala que todos que se movem em busca de um resultado são
infelizes? Porque esta felicidade é falsa...

Participante: Porque é felicidade baseada num desejo...

Sim, felicidade com tempo marcado...

A felicidade alcançada quando a realidade e o desejo são iguais é falsa porque ela é
momentânea, relativa... Pela característica impermanente que a vida humana possui certamente a
situação que hoje satisfaz os desejos irá mudar. Quando isso acontecer o ser humanizado sofrerá...

Por isso Krishna diz que não importa se você alcança o que quer ou não, você é um infeliz... Ele
fala assim porque sabe que, mesmo alcançando o que desejava, esta conquista será tão fugaz, tão
rápida, que logo depois você sofrerá...

Por isso ele aconselha: refugia-se na yoga, no caminho reto. O que é refugiar-se? Proteger-se...

Krishna lhe aconselha a buscar amparo na yoga, porque o caminho reto lhe ampara, lhe protege.
Do quê? Do sofrer...
Página 52 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Proteger contra o sofrimento: este é o objetivo do ensinamento de Buda, Krishna e de Cristo.
Tudo o que os mestres ensinaram tem como objetivo proteger o ser humanizado da vida. Ou melhor,
protegê-lo dos sofrimentos da vida.

Aquele que se refugia, que busca amparo na yoga, no caminho reto, este jamais sofrerá, pois
este caminho não conduz a uma intencionalidade. Por isso não lhe expõe ao prazer e a dor...

50. Quando alguém vivencia esta tranqüilidade mental, ainda que nesta
mesma vida, liberta-te das noções do bem e do mal. Por conseguinte,
consagra-te a esta Yoga. Karma Yoga significa habilidade na ação e
ausência de propósitos pessoais.

Krishna fala algo interessante neste texto: a yoga ou caminho reto tranqüiliza a mente... O que é
tranqüilizar a mente?

Primeiro: acabar com as dúvidas... O caminho reto, o caminho onde não há intencionalidade
acaba com qualquer dúvida que o ser humanizado tiver sobre qualquer coisa. Ele não terá mais
pensamentos investigativos sobre se é ou não é, se gosta ou não, se quer ou não.

Isso por si só já tira um peso imenso do ombro de vocês, pois passam o dia inteiro investigando
as coisas. Vocês investigam os acontecimentos do mundo para proteger suas verdades, seus conceitos,
seu prazer...

Isso traz uma perturbação mental, pois por mais que investiguem, não conseguem compreender
perfeitamente o que está acontecendo. Não conseguem chegar a uma conclusão final sobre qualquer
assunto. Por isso têm sempre que investigar mais...

Mesmo assim, tem horas que o ego diz que chegou a uma conclusão sobre o tema, mas aí vem
a impermanência e transforma tudo... Aí vocês são obrigados a investigar novamente o assunto...

A segunda coisa que acaba com a ausência de intencionalidade é o medo. A yoga, o reto
caminho, acaba com o medo, porque o ser humanizado não tem mais expectativas, desejos. Por isso
não tem mais medo.

O medo é o segundo grande peso que vocês carregam o dia inteiro: o medo de ser ferido, o
medo de ser contrariado...

A dúvida que leva ao investigar constante e o medo do sofrimento são os elementos que
transformam o viver em algo pesado, difícil, cansativo... A yoga traz a paz para a mente porque ela
acaba com estes tipos de pensamentos.

Na hora que você vive a vida sem querer saber se quer ou não, se gosta ou não, ou seja, sem
intencionalidade, a sua mente e os seus pensamentos ficam em paz: sem dúvidas e sem temores.

Participante: É possível alcançar isso?

Sim... Basta sempre perguntar a você mesmo: eu estou participando desta ação querendo ou
esperando alguma coisa?
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 53
Participante: O problema é que sempre quero alguma coisa...

É isso que você tem que lutar contra. Tem que lutar contra o seu querer e não entregar-se a ele,
pois ele não é seu...

O desejo, como nós já vimos no estudo dos ensinamentos de Buda, nasce como poluição
adventícia, ou seja, como elemento material que serve como instrumento carmático para a sua reforma
íntima...

Viver por viver e não viver para alguma coisa: esta é a realização do yogue... Mas, para isso é
preciso voltar a raciocinar a vida e não simplesmente entregar-se às sensações criadas pelos gunas do
ego...

51. O sábio dotado de entendimento está mentalmente tranqüilo, por isso se


afasta dos frutos de suas ações; liberta-se dos laços que o pensamento
forja a respeito do nascimento, crescimento e morte e vivencia um estado
que está mais além de qualquer mal ou dano.

O grande pedaço deste trecho é: o sábio dotado de entendimento liberta-se dos laços que o
pensamento forja a respeito do nascimento, crescimento e morte.

Tudo o que você pensou até hoje que é vida, deve ser alvo de uma libertação. Isso porque tudo
o que você pensou foi condicionado ao seu querer.

Em determinada época, viver para o ser humanizado é apenas brincar. Depois o viver
transformou-se em realizar-se nos estudos para poder ter futuramente uma profissão e ganhar dinheiro.
Mais tarde passa a ser vivenciar o casamento e a educação dos filhos...

Liberte-se de tudo isso. Não coloque objetivos nas diversas etapas da vida, porque você não
nasceu para realizá-los.

Você não nasceu para realizar objetivos materiais, mas para realizar sua reforma íntima e
alcançar a elevação espiritual. Para isso, é preciso que você liberte-se destes desejos.

Ou seja, você nasceu com um único objetivo: ter estes desejos e provar a si mesmo que é capaz
de libertar-se da ação deles... O ser humaniza-se justamente para provar a si mesmo que é capaz de
libertar-se da prisão aos conceitos materiais que o ego cria ao longo daquilo que vocês chamam de vida
carnal...

Esta é o grande trecho deste texto. Com relação a acalmar a mente já havíamos conversado.
Mas, esta informação foi novamente inserida porque não foi dito anteriormente que para se acalmar a
mente é preciso haver a libertação destes objetivos padrões que se alteram ao longo da existência
humana. É preciso se libertar das obrigações humanas que a sociedade cobra de cada um para poder
ser considerado como um ser humano “certo”, “bom”...

Cristo ensinou assim: eu venci o mundo...


Página 54 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Vencer o mundo é exatamente isso: vencer os padrões do mundo... Libertar-se dos padrões, das
obrigações de ser, estar e fazer. É alcançar a mais pura liberdade: a liberdade ser você mesmo e não
apenas um repetidor de padrões...

É isso que é o caminho da yoga. O resultado para quem trilha o caminho reto é a liberdade dos
padrões e obrigações mundanos. Este não é mais atingido pelos elogios e críticas do mundo...

52. Quando a tua compreensão superar o valor dos conceitos ilusórios e do


espelhismo que eles provocam, ficarás indiferentes tanto em relação ao
que já ouviste (memória) como ao que terá que ouvir (imaginação).

Da compreensão dos ensinamentos deste trecho surge uma palavra que temos usado muito:
apatia, indiferença...

Aquele que alcança a elevação espiritual se torna apático, indiferente ao mundo. Ele não dá
valor às coisas deste mundo porque ele sabe que, como Krishna diz, todas as coisas deste mundo são
maya, ou seja, ilusão...

O yogue completo sabe disso. Sabe que tudo que ele acha e todos os desejos que têm são
criados pela ilusão de ter, ser e poder. Isso é que estamos ensinando...

A mesma ilusão que Krishna chama de maya, por nós é definida com outras palavras: o mundo é
irreal, não existe. Nada do que você vivencia existe. Quando sair desta encarnação tudo isso ficará para
vocês, espírito, num passado remoto, perdido... É só começar uma nova encarnação que tudo isso ficará
perdido no tempo...

Vocês já tiveram notícias de espíritos que voltaram a reencarnar junto com os mesmos familiares
de encarnações anteriores. Quando isto aconteceu estes seres não tinham a mínima consciência de já
haver vivido junto com aqueles. Não possuem a mínima consciência do sentimento familiar que em uma
encarnação viveram tão intensamente como realidade...

O espírito que reencarna não tem a mínima noção do que fez em outras vidas. Mesmo que tenha
notícias de coisas que foram realizadas em uma determinada encarnação que tenha vivenciado – refiro-
me àqueles que viveram encarnações cujas histórias pertencem ao passado histórico do planeta – não
sabe que foi ele quem fez... Isto porque tudo é ilusão...

Ter, ser, querer, fazer, o que disseram, o que você fez, o que deixou de fazer: tudo isso acaba
com a morte. Por isso é que é ilusão... Somente Deus e o Universo são reais...

O ser precisa a partir desta consciência da ilusão do mundo ser apático ele. Só quando ele é
indiferente ao mundo consegue ser atento ao Universo, à realidade espiritual...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 55
53. Quando se aclarar o teu entendimento perplexo, por causa das mais
diferentes opiniões vigentes e te estabeleceres n samadhi (ou na
absorção espiritual, na vivência do Absoluto), somente então vivenciará a
Yoga Suprema.

Foi o que acabei de falar: é preciso calar a mente perplexa para poder se concentrar em Deus...

Arjuna perguntou:

54. Ó Krishna... quais são as características de um homem dotado de firme


entendimento e reta compreensão e estabelecido no samadhi? Aquele
que obteve a consciência de Deus, como caminha, como se senta, como
fala um homem assim de conhecimento tão firme?

Arjuna quer saber como o yogue senta, fala, caminha... Ele quer saber se aquele que tem a reta
compreensão age de forma diferente do ser humanizado que ainda está preso aos seus desejos...

O bendito Senhor disse:

55. Ó Partha... quando o homem está satisfeito no ser, pelo próprio ser em si
e despojou-se por completo de todos os anseios da mente, então diz-se
que tam homem possui uma sólida sabedoria.

Não houve comentários sobre este texto...

56. Aquele que fica imperturbável na adversidade e tampouco anela a


felicidade, aquele que não tem apego, nem medo, nem ira, esse é um
muni (sábio que se mantém silencioso) de firme sabedoria.

Não houve comentários sobre este texto...

57. Aquele que se mantém desapegado em todas as situações, que não se


regozija com o bem estar nem se desespera diante do mal, esse é dotado
de firme sabedoria.

Não houve comentários sobre este texto...


Página 56 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I

58. E quando afasta completamente sua sensorialidade dos respectivos


objetos (pensados), tal como a tartaruga esconde os membros de seu
corpo na carapaça, então seu entendimento se consolida.

Não houve comentários sobre este texto...

59. Os objetos se desprendem daquele que os deixa de anelar; todavia, o


desejo de gozo ainda persiste no íntimo do homem desatento. Portanto,
aquele que realiza ou vivencia o Ser Supremo, até desse desejo se liberta.

Não houve comentários sobre este texto...

60. Ó filho de Kunti... os sentidos contaminados tornam-se turbulentos e


arrastam para um mau caminho a mente de um homem preso ao senso
comum; quanto mais a mente daquele que luta para se aperfeiçoar!

Não houve comentários sobre este texto...

61. O homem de firme sabedoria, meditando em Mim, controla a turbulência


de seus pensamentos. Sem dúvida, o entendimento daquele que
controlou seus sentidos não vacila nunca.

Não houve comentários sobre este texto...

62. Pensando a respeito dos supostos objetos sensíveis, o homem fica


ligado a eles; dessa ligação nasce o desejo e do desejo frustrado nasce a
cólera.

Não houve comentários sobre este texto...


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 57
63. Da cólera nasce a ilusão; com a ilusão ou obnubilação, perde-se a
lucidez. A perda da lucidez conduz a capacidade de discernir à ruína e,
com a ruína desta faculdade, o homem perece como escravo do ego.

Até aqui Krishna explicou que quando o ser humanizado pensa sobre alguma coisa nasce o
desejo. Ele prende o ser à necessidade do alcançar o que deseja. Quando isto não é realizado, nasce a
cólera, a raiva, que são sofrimentos.

64. Mas aquele que dominou a si mesmo, auto conhecendo-se e com isso
alcançou a tranqüilidade interior, esse se move imperturbado entre os
objetos, graças a um sentir incontaminado, livre de todo anelo.

Aqui começa a resposta de Krishna à Arjuna...

No item cinqüenta e quatro Arjuna pergunta: como anda, senta, se porta fisicamente o homem
elevado? Krishna responde aqui: de uma forma não perturbada...

A única diferença entre um ser elevado e não elevado é mental. O ser não elevado anda entre as
coisas de uma forma perturbada: será que aquilo está no lugar, será que vai acontecer determinada
coisa? Será que é certo fazer isso? Aquele cuja mente funciona com este tipo de pensamento é o
homem perturbado.

Já o homem não perturbado transita entre as coisas sem ver nada. Não sem olhar, mas sem
perturbação: se está deste jeito está, se está desta forma está bom... Ele não se perturba com nada.
Nada lhe perturba.

Desta conclusão podemos, então, chegar à resposta de Krishna a pergunta sobre a diferença do
andar ou sentar entre o homem sábio e o não sábio? Nenhuma...

Ele não tem diferença no andar, mas na atenção entre as coisas pelas quais anda é que está a
diferença entre aquele que tem a sabedoria de verdade e o que apenas se considera elevado (possui
cultura)...

Esta é a modificação que acontece com quem transforma cultura em sabedoria: ele não muda a
vida, mas muda de vida... O ser elevado continua vivenciando todas as suas situações, mas não mais as
vivencia de uma forma perturbada, mas sim na reta tranqüilidade...

Ele está sempre tranqüilo com tudo que está acontecendo. Ele se senta igual a outro, mas
quando faz isso não se preocupa se o chão está seco ou molhado, sujo ou limpo, enquanto o ser
perturbado se preocupa com isso, busca limpar o lugar antes de sentar, etc.

É essa perturbação que é a diferença entre o ser elevado e o humano. Por isso estamos dizendo
há muito tempo: viver não é um ato material, mas mental ou sentimental...
Página 58 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
65. Graças à paz interior, terminam todas as misérias da existência aparente
e a mente, pacificada, prontamente se estabelece na Reta Sabedoria.

Não houve comentários sobre este texto...

66. Para os intranqüilos, a sabedoria não surge, nem eles conseguem


meditar. Para quem não medita, não pode haver paz. E como podem ser
felizes os que não têm tranqüilidade interior?

Krishna é claro: quem vive na tranqüilidade não medita...

Participante: Meditar em que sentido?

No sentido de repensar seus pensamentos...

Este ser age de acordo com os conceitos da humanidade que estão na sua memória. Ele não
medita, ou seja, não raciocina... Ele não raciocina como ele vive: sai passando pela vida. Fica velho e
um dia pergunta o que fez da sua vida... Justamente por não meditar sobre a vida é que o desejo surge e
tem força para comandar o seu estado sentimental.

O desejo é, como já vimos, um condicionante à felicidade. Se o ser humanizado parasse para


meditar sobre as coisas da vida não mais se entregaria o desejo ou intencionalidade.

O ser perturbado não raciocina sobre o perigo que é não meditar. Ele diz que quer ser feliz, mas
por estar ligado às coisas do mundo tem pensamentos que expressão desejos de que outra pessoa faça
ou aja de determinada forma. Vamos meditar sobre isso?

Por que a pessoa tem que fazer o que eu quero? Por que sou eu que sei o que é certo e não
ela? Por que ela, que é uma individualidade, tem perder a sua verdade para fazer do jeito que eu quero?

Esta meditação, ou seja, o raciocínio do raciocínio que acaba com o desejo. Isto porque na hora
que começar a se perguntar vai ver que não é “certo” o que está fazendo, mas um ato de soberba. Quem
medita sobre o desejo da pessoa fazer ou ser do jeito que ele quer, repara que está se colocando como
Deus (quem sabe o “certo” e o “errado”), como dono da verdade, um deposta...

Quem raciocina o raciocínio pode matar o desejo de que aquela pessoa faça aquilo. Quando isso
acontecer o que ela fizer já não mais lhe incomodará, não lhe perturbará e aí poderá realmente haver a
felicidade incondicional.

Então, a mente perturbada é aquela que não raciocina os seus próprios raciocínios, não medita.
Ela não busca saber de verdade de onde tirou aquilo que diz que é verdade. A mente perturbada não vê
a sua própria perturbação e acha que tudo que lhe perturba é normal, é o “certo”...

Este é o segredo: meditar... Na hora que você medita, ou seja, raciocina o pensamento, alcança
a tranqüilidade porque chega à conclusão que está querendo ser senhor de escravo. Está querendo
muar o mundo para aquilo que você quer...

Por isso alcançar a tranqüilidade é impossível para a mente perturbada. Para aquele cuja mente,
como foi dito antes, está presa aos objetos pensados, ou seja, externos a ela, é impossível ser feliz
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 59
incondicionalmente. Para que isso acontecesse era preciso que este ser tivesse a mente voltada para
dentro, para si mesmo, para as formações mentais que o ego cria.

É isso que Krishna está ensinando que, aliás, é a mesma coisa que Buda ensinou, como já
vimos...

67. A mente, identificando-se aos sentidos (pensantes, pensados), sempre


errantes e desordenados, perde o reto entendimento e a consciência
indevidamente personificada passa a ser arrastada de lá para cá como um
barco sobre a água é empurrado pelo vento.

Sentidos pensantes: o que você vê... Sentidos pensados: o que você acha que é...

Já falamos sobre isso, mas nunca é demais repetir...

Participante: O que é consciência personificada?

O espírito encarnado que acha que é o ser humano. O espírito quando vira pessoa...

Está consciência está presa entre o que vê e o que acha que do que vê, ou seja, sentido
pensante e pensado.

O que é aquilo ali?

Participante: Uma cadeira...

Você me responde deste jeito porque está presa entre a forma que percebe e os conhecimentos
que estão na sua memória que dão este nome àquele objeto. A cadeira lá fora é o objeto pensante; a
que existe na sua mente é o objeto pensado...

Participante: Krishna fala que este pensamento é sempre errante e desordenado...

Sim, este pensamento está sempre errante e desordenado. Isto porque ele está sem ordem, sem
valores certos...

Uma cadeira é uma cadeira. Ela não é uma cadeira branca, bonita, desconfortável, limpa,
daquela forma determinada. É isso que é um objeto errante e desordenado: o que aplica diversos
valores e formas ao mesmo objeto...

Participante: Ele fala também que pensando desse jeito a consciência errante
para a ser arrastada de lá para cá como empurrada pelo vento...

Sim... A cadeira uma hora está suja, outra está limpa; num minuto é bonita, noutro é feio; uma
hora presta, na outra não...

Esta multiplicidade de pensamentos a respeito de um mesmo objeto que se imagina existir é que
garante a perturbação da mente...
Página 60 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I

68. Por isso, ó tu de braços poderosos, aquele cujos sentidos estão bem
controlados diante dos objetos, esse alcançou um conhecimento firme.

Sentido bem controlado... O que é isso?

Participante: Controlar o que sente, o que vê, o que ouve, o que apalpa...

Exatamente: o controle das sensações e das percepções criadas pelo ego...

Mas, o que é controlar estas coisas? É controlar as idéias que se formam na mente...

Uma cadeira é uma cadeira, não uma cadeira branca, que você gosta ou não, que está limpa ou
suja...

Controlar é por ordem. Você deve por ordem na sua casa... Se o seu ego diz que a cadeira é
bonita ou feia, você deve não aceitar esta verdade. Deve ter a consciência de que é apenas uma
verdade do seu ego, algo relativo e não absoluto.

O que você pensa não é verdade, não é realidade: é apenas uma verdade relativa eu serve ao
espírito de provação...

69. Sabe, ó Arjuna, que aquilo que os seres comuns chamam noite é dia para
o homem de reto entendimento e auto controle. E o dia dos homens
comuns é noite para o vivenciador do ser. (O homem vulgar ignora o
conhecimento supremo, o qual só é alcançado pelo homem de
autocontrole. A consciência do homem comum, intranqüila por descuido
e condicionada pelo mundo, é uma falsa consciência, uma consciência
contaminada. O Sábio está totalmente livre dessa espécie de “estar-
consciente”).

O que é noite? Uma etapa onde você não percebe nada. Escuridão...

Sabe, tudo aquilo que você chama de escuro, negativo, que tem medo, que teme o futuro, para o
homem de reto entendimento é dia, ou seja, claridade, luz. Isto porque é exatamente onde é noite para
você que está a solução para o ser de reto entendimento...

Tudo onde o ser perturbado vê problemas, o ser de reto entendimento vê solução. Isto porque
ele sabe que exatamente nestes momentos está uma grande provação que pode, se suplantada, lhe
aproximar de Deus...

Mas Krishna diz mais: E o dia dos homens comuns é noite para o vivenciador do ser. Tudo que
você diz que é claro, óbvio, lógico, reto e líquido, tem certeza absoluta, para o ser é uma incógnita...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 61

70. Assim como o oceano permanece calmo e inalterado quando as águas


dos rios deságuam nele, da mesma maneira o sábio que se dominou a si
mesmo fica indiferente quando os desejos nele se levantam. Somente um
muni em perfeito silêncio mental alcança a paz e não aquele que anela os
objetos do desejo.

Tem uma palavra importante neste trecho: silêncio mortal. Isto porque se fala que o verdadeiro
yogue não deve falar, abrir a boca. Mas, não é esse o ensinamento de Krishna...

O ensinamento de Krishna é sobre o silêncio mental, ou seja, o silêncio sobre ficar raciocinando
o que você e o outro fala, sobre o que você vê. É este o silêncio que o yogue alcança: o silêncio
interno... O silêncio externo (não falar), o yogue sabe que não pode alcançar se não for a missão dele
neste planeta.

É por isso que digo há muito tempo: eu não me preocupo com o que vocês dizem, falam, ou
fazem... Eu sei que a forma como agem é a missão de vocês, os seus trabalhos para a obra geral.

Mas, ao realizar suas missões, vocês devem calar a voz da consciência. A voz do raciocínio que
quer saber se vocês estão certos, se o outro é ou não alguma coisa. Calem isso, porque é isso que lhes
fazem sofrer...

Participante: Se tivesse um botãozinho para apertar e desligar...

Se não tem, lute contra. Quando o pensamento vier, diga: cala a boca... De tanto você repetir
isso um dia o ego cala... Agora, se entregar o raciocínio é que lhe deixa perturbado...

Este é o ensinamento de Krishna: o silêncio mental ou dos pensamentos. Não raciocinar as


coisas do mundo; não querer dar valor às coisas do mundo.

Sei que às vezes vocês me acham estranho porque, em muitos momentos que vocês se culpam
por terem sido egoístas, terem feito fofocas, eu nunca os critiquei. Nunca me expressei sobre estas
situações porque sei que cada um estava cumprindo a sua parte na obra global, mas sempre deixei bem
claro que sou contra a vocês se acusarem por ter feito qualquer coisa... Isto porque, isto é sinal de uma
mente perturbada...

71. Alcança a paz que, abandonando todos os desejos, atua sem atrações
nem anelos e está livre de qualquer noção de “eu e meu”.

Não houve comentários sobre este texto...


Página 62 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
72. Ó Partha... este é o estado de realização de Brahman, alcançado o qual,
não sobram mais ilusões. Ainda que o indivíduo alcançasse esse estado
no momento de morrer, o homem vivenciaria Brahman Nirvana, o que
equivale a identificar-se com o Absoluto.

Repare neste pequeno texto: Ainda que o indivíduo alcançasse esse estado no momento de
morrer, o homem vivenciaria Brahman Nirvana. Ou seja, ainda que o homem alcance este estado
apenas na hora de morrer, ele alcançaria Deus...

Se na hora de morrer, no último minuto, você conseguir libertar-se da ação dos desejos,
encontrará Deus...

Participante: Quem vai se lembrar disso na hora de morrer?

Poucos se lembrariam, mas o ensinamento vai mais além do que do último minuto. Por ele
podemos entender que Krishna está ensinando que não se precisa viver uma vida inteira dentro do reto
entendimento.

Não há idade mínima para se por em prática, não há falta de tempo para se realizar: não importa
quanto tempo de sua existência você consiga colocar em prática os ensinamentos, ele será o
suficiente...

É o que Cristo disse: um segundo de vida do tamanho de um grão de mostarda apaga a multidão
dos pecados...

Ainda que no último segundo o ser humanizado consiga se converter, valeu o esforço da vida
inteira. Ela sai da carne com a plena consciência espiritual...

Este ensinamento é importante para vocês pararem de se culparem ou de dizer que não têm
jeito que nada conseguirão... Esta perfeição que vocês querem, este proceder constantemente dentro de
um padrão determinado por Krishna, nada mais é do que um conceito...

Participante: Mas, aí fica igual ao barco que foi falado anteriormente: vai e vem...

Não, porque quando você não realiza não retroage... Por isso, posso dizer que algumas vezes
vocês vão e em outras ficam parados...

Quando vocês aceitam a crítica que o ego cria é que acabam, ilusoriamente, voltando... Mas,
quando não a aceita, continua avançando...

A crítica e o elogio são o vai e vem da mente perturbada, mas a não realização por parte do
espírito não o traz de volta a lugar algum...
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 63

Capítulo III – O caminho da ação

01 – Ó Janardana, ó Keshava! Se consideras que o caminho da sabedoria é


superior ao sendeiro da ação, porque me induzes a que cumpra essa
terrível ação (guerra?

02 - Com palavras aparentemente contraditórias, pareces confundir meu


entendimento – pois, as vezes elogias a obra, outras a sabedoria.
Portanto, dize-me com clareza quais dos caminhos terei que seguir para
alcançar o Absoluto?

Arjuna está perguntando qual é o caminho para chegar a Deus: é a ação ou a sabedoria (cultura
em ação)?

O bendito senhor disse:

03 - Ó impecável, como já te disse, neste mundo dois são os caminhos a


seguir: ou o Sendeiro da Sabedoria (ou Jnana-Yoga), que é para os
meditativos, ou o Sendeiro da Ação Impessoal (ou Karma-Yoga), que é
para os ativos.

Krishna responde que existem dois caminhos: um caminho para aqueles que levam a vida na
meditação – se isolam, vão para o meio do mato e lá, eles com eles mesmos conseguem se elevar a
Deus – e um caminho para aqueles que vivenciam sua vida normalmente, para aqueles que levam uma
vida normal.

Hoje muito poucos são escolhidos para o primeiro caminho. A maioria – pela época atual, pelos
carmas presentes – precisa vivenciar o segundo caminho, ou seja, viver em coletividade. Esta forma de
vivência Krishna chama de Karma-Yoga, ou a Ação sem Intenção.

Então, segundo o bendito Senhor, existem dois caminhos que levam a Deus: a vida afastada da
coletividade e a vida na coletividade, desde que vivenciada sem intenções.
Página 64 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I

04 - Um homem não consegue libertar-se da ação só porque resolve não


cumpri-La; tampouco pela simples renúncia à ação se logra a perfeição.
(A verdadeira não-ação é aquela em que, ao cumprir-se, toda e qualquer
motivo pessoal ou intenção está ausente)

Agora o bendito senhor está falando de atos, ações. Ele diz: o homem jamais poderá deixar de
fazer alguma coisa. Isto é o que ele fala primeiramente. Vamos estudar isso...

Você não pode fugir das ações pré-programadas para sua existência; você não pode se negar a
praticar atos que estejam escritos no seu livro da sua vida. Tal compreensão deve nos levar a entender
que as pessoas não fazem e não nem podem fazer nada ‘errado’. Ninguém jamais poderá deixar de
fazer aquilo que esteja fazendo ou que você fez. Isso porque quando alguém age está sempre
cumprindo a determinação de Deus para aquela ação.

Agora, ao fazer a ação, o ser humano pode anexar a ela uma paixão, positiva ou negativa.
Paixão positiva é o prazer: ‘eu gostei’ do que fiz’, ‘eu queria fazer isso’, ‘eu fiz o que acho certo’, ‘eu fiz o
que eu acho bonito’, ‘eu estou me sentindo bem porque fiz aquilo’. A paixão negativa é a culpa: ‘eu não
devia ter feito aquilo’, ‘eu não gostei do que fiz’, ‘eu acho que aquilo não deveria ter sido feito’.

Todas as duas não levam a Deus, não são caminhos para a universalidade. Isso porque todas as
duas formas de vivenciar a ação levam o ser humano à dependência do seu querer, do seu achar, da
sua paixão.

O sendeiro que leva a Deus, a Yoga perfeita acontece quando o ser humano vivencia a ação
sem intencionalidade, sem paixão: ‘estou fazendo porque estou fazendo’, ‘não estou fazendo porque
gosto, porque quero’ ou ‘não estou fazendo porque não gosto, porque não quero’. Esta forma de
vivenciar a ação leva ao universalismo porque este ser está perfeitamente sintonizado com aquele
momento, com o universo.

Ficou claro isso? Não importa o que você está fazendo. O que importa é que você está fazendo
aquilo. Isso é uma verdade fria. Agora se desta ação universal você tirar um lucro próprio, seja ele
positivo ou negativo, seja um prazer ou a culpa, não participou daquela ação dentro do sendeiro da
elevação espiritual.

Participante: Eu não entendo. Se os atos são dados de acordo com os nossos


sentimentos, de repente, por causa de um determinado sentimento, pode
acontecer um que não é o melhor pra gente apenas como consequência de um
sentimento?

Todo ato que lhe acontece, mesmo que você não goste, é o melhor sempre.

Quando você fala ‘não é o melhor pra mim’ está dizendo que Deus está lhe punindo. Isso só
poderia acontecer se Ele não fosse o amor sublime.

Participante: Eu não diria punindo, diria que estaria dando de acordo com meu
merecimento por causa do sentimento?
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 65
Dar o que não é melhor para você só poderia acontece se Deus não fosse o amor sublime.
Suponhamos que tenha tido raiva e Deus tenha redirecionado a sua raiva para aquela outra pessoa.
Vamos estudar este exemplo.

Você teve raiva porque escolheu raiva. Deus direcionou seu pensamento para que esta raiva
fosse aplicada para aquela pessoa. A partir daí você pratica um ato raivoso contra ela. Está certo o meu
raciocínio dentro do que tenho dito?

Participante: Sim...

Acontece que se Deus direcionou a raiva que você escolheu ter para aquela determinada pessoa
é porque ela precisava e merecia receber aquela raiva. Ele não agiu desta forma porque aquela pessoa
era a que estava mais perto ou por qualquer outro motivo.

Portanto, apesar de você ter escolhido raiva, este acontecimento não ocorreu isoladamente
dentro do Universo. Deus usou o que você escolheu para dar a outra pessoa o que ela precisava e
merecia. Assim, a sua escolha sentimental, apesar de aparentemente ‘errada’ ajudou Deus na obra
geral: o campo de provas para evolução dos espíritos.

Para que você prejudicasse os outros com sua escolha sentimental seria necessário que eles
não merecessem receber aquilo. Neste caso, eles estariam sendo injustiçados e Deus, neste caso, não
poderia mais ser a Justiça Perfeita...

Participante: E a questão da culpa?

Não existe culpa. O que existe é uma situação que você não gosta e por isso se culpa. A culpa
pela prática do ato não existe: ela só acontece dentro de você porque você que não gostou do que fez...

Participante: Por causa desse sentimento de culpa eu deixo de fazer atos para
outras pessoas?

Não necessariamente. O que você deixa é de ser protagonista de outros atos, fundamentados
em outros sentimentos. Passa a ser protagonista apenas daqueles que precisam e merecem receber a
sua culpa...

05 - Em realidade, ninguém fica inativo um instante sequer, porque os gunas


ou as qualidades nascidas da "Prakriti" (mente-matéria ou natureza
psicofísica) obrigam o homem a agir sem cessar.

Isso porque nós só pensamos que ação é ato. Mas, o pensamento também é um ato.

Portanto, ninguém fica inativo. Você está agindo a cada segundo, pois está tendo um
pensamento. Este pensamento é uma ação e a ação de pensar é o seu momento de trabalho na busca
da elevação espiritual. A cada pensamento você tem que lutar contra as idéias que lhe surgem para tirar
delas todas as intencionalidades: tudo o que acha, todo o que quer, tudo o que gosta.

Neste trecho, portanto, Krishna está dizendo claramente: ação não é só ato, mas também o
pensar é ação. Diz mais: os seres humanos precisam agir no pensamento e não na atitude. Esta é a
Karma-Yoga, este é o caminho da ação...
Página 66 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Viver é um trabalho mental, não um trabalho físico. Os seres humanos para considerarem-se
vivos precisam agir sobre os pensamentos, lutando para retirar deles a intencionalidade.

06 - Aquele que pensa ter controlado externamente os órgãos da ação, mas


que mentalmente continua preso aos objetos (pensados) dos sentidos,
esse é um hipócrita.

O que o bendito Senhor diz neste texto é o seguinte: eu não deixo de dar um tapa em outra
pessoa porque me acho mais fraco e tenho medo da reação dele ou porque eu acho que não devo bater
na cara dos outros; deixo de bater apenas porque deixei de bater. Todo discurso que dá razões aos atos
são apenas intencionalidades de cada um e não realidades...

Mas, Krishna chama os que acreditam nos motivos porque praticaram ou não as ações (pensam
ter controlado externamente os órgãos da ação) de hipócritas. Por que isso? Porque se alguém tiver a
intenção de dar um tapa em alguém, já o fez, mesmo que não pratique o ato.

Na verdade, esse ensinamento de Krishna é igual ao de Cristo: só o desejar já é pecado...

Além disso, é preciso observar neste texto mais uma coisa: novamente o bendito Senhor volta a
dizer que os seres humanos não devem se preocupar com os atos externos, pois eles não são passíveis
de controle. Ao contrário, ele orienta os seus seguidores para que se preocupem todo tempo em estar
observar seus atos mentais para ver se eles contêm intencionalidades.

Viver para aquele que busca a elevação espiritual é isso: estar constantemente vigilante ao
pensamento para libertar-se das intencionalidades que ele contém.

07 - Mas, ó Arjuna!, aquele que, graças a um reto discernimento mental,


controla seus sentidos e sem ligar-se nem identificar-se segue a Karma-
Yoga (caminho da ação impessoal que conduz à Libertação), esse é
estimado.

Tanto faz você colocar a mão no coco quanto colocar a mão no mel; tanto faz olhar uma coisa
que gosta como uma que não gosta. É assim que vive aquele que vivencia a Karma-Yoga.

Por isso o bendito Senhor ensina: controle os seus sentidos para olhar tudo sem gostar ou
desgostar de alguma coisa; controle seu sentido para usar o que gosta e o que não gosta sem alteração
de ânimo. Quem vive assim é o apreciado por Krishna, é aquele que está no caminho da elevação, pois
está tirando toda intencionalidade do seu pensamento, está tirando todo individualismo fabricado pelas
verdades desse mundo.

Outro dia alguns vegetarianos me disseram assim: coitada da vaca, ela morre e tem sofrimento
só pra nos alimentar... Eu respondi você quer matar quem, a planta? O processo é o mesmo: a morte de
um para a subsistência do outro...

Ah! Matando a planta você também mata o oxigênio que lhe mantém a cada segundo.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 67

08 - Cumpre, pois, as ações justas e obrigatórias, pois a ação é superior à


inação. Se não agisses, nem sequer a existência corporal seria possível.

Então, é preciso que você aja e cumpra as ações justas e obrigatórias. Qual a ação justa e
obrigatória que você precisa cumprir? Xingar quem estiver xingando, bater em quem estiver batendo,
matando, como no caso de Arjuna, quem tiver que morrer, elogiando quem estiver elogiando...

Participante: Aí é que está... Como vou cumprir se não sou eu que faço?

Vivenciando a ação se culpar ou gozar ela. Cumpre sua ação de uma forma justa, ou seja, faça o
que está fazendo, que é o que tem que ser feito, mas não acrescente a essa ação uma satisfação
individual ou uma culpabilidade - uma paixão.

Toda ação do ser humano é justa porque cada um serve de instrumento para dar ao próximo o
que ele precisa e merece (Deus dá a cada um de acordo com suas obras). Portanto, faça o que você
fizer contra quem fizer, a ação foi justa.

Sua ação é obrigatória porque você foi o instrumento apto a praticar aquilo. Se uma pessoa
precisa receber uma ação raivosa, quem pode praticar essa ação? Aquele que tem raiva. Sendo assim,
você que está com raiva é a pessoa que é obrigada a praticar aquela ação. Na verdade, são carmas
entrelaçados: um está no padrão vibracional necessário para praticar a ação que o outro, por carma,
precisa receber.

Então, toda ação é justa e obrigatória: justa porque é o merecimento de cada um e obrigatória
porque quem pratica está no padrão vibracional que o leva a ser instrumento do carma do outro.

Saiba de uma coisa: se os carmas não estiverem relacionados, jamais alguém praticará nem
receberá a ação...

09 - Neste mundo, as pessoas comuns se enlaçam por ações que diferem


daquelas que são cumpridas por amor a "yajna" (que é um sacrifício, uma
oblação, um culto ou orações a Vishnu, o próprio Deus). De forma que, ó
Kounteya!, atua sem apego, somente por amor a "yajna".

As pessoas estão ligadas por ações que não são sacrifícios: é isso que diz o bendito Senhor.
Vamos compreender essa questão do sacrifício, do sacrificar a Deus.

O que você tem que sacrificar a Deus, numa ação? Para entendermos isso temos que observar
que Krishna fala em dois tipos de vivência de ação: aquele onde pessoas se relacionam dentro do
sacrifício a Deus e outro onde não há este sacrifício a Deus.

Será que você pode sacrificar, ou seja, deixar de ter, a prática da ação? Pelo que ouvimos de
Krishna até aqui eu diria que não. Portanto, repito a pergunta: o que você tem que sacrificar a Deus
numa ação? O controle sobre ela: o resultado e a autoria dela.
Página 68 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Quem segue o reto caminho sacrifica tanto o controle sobre o resultado da ação como a autoria
dela a Deus. Por exemplo. Quem busca o reto caminho diz assim: ‘eu briguei com aquela outra pessoa,
mas não fui eu que briguei; eu fui instrumento de Deus. Ele me deu a ação’ Mas diz mais para si mesmo:
‘o que vai acontecer a partir disso eu não sei; só Deus sabe...’

O yajña é o sacrifício do ‘eu’ durante a vida. É o sacrifício da sua capacidade de agir por desejo
próprio, é o sacrifício da intencionalidade na ação. É também, o sacrifício do resultado da ação a Deus:
‘Deus, está fazendo, por isso só Ele sabe no que vai dar; eu sou apenas o instrumento da Sua vontade’.

Aquele que busca o reto caminho sacrifica durante as suas ações a autoria e qualquer
intencionalidade que tenha. Por exemplo: se o pensamento sobre determinada pessoa é fruto de uma
raiva, aquele que busca o reto caminho não se frustra se não conseguir a exprimir, nem se culpa se
conseguir fazer.

Ainda dentro do mesmo exemplo, aquele que busca o reto caminho também não fica
especulando pelo resultado da ação. Se conseguir praticar o ato raivoso não se preocupa com a reação
do outro nem se vangloria por ter praticado a ação. Se não praticar, também não se culpa por não ter
feito...

Participante: Quer dizer que tudo que falamos, por pior que seja a besteira...

... você foi instrumento de Deus para quem precisa ouvir aquilo.

Participante: Mas, se isso se reflete num ato aparentemente, vamos dizer assim,
contra nós?

O ato só refletirá – terá como consequência – aquilo que Deus queira. Neste caso, lembre-se do
que falamos: Deus não faz nada contra ninguém...

A sua pergunta seria mais ou menos assim: ‘eu faço alguma coisa, mas não foi eu que fiz.
Porque acontece um resultado negativo a mim e na a Deus que foi quem o praticou’? Vamos entender
bem essa questão...

No momento que você ‘falou’ aconteceu um presente. Ele foi daquele modo porque o carma dos
envolvidos levou ao acontecimento ocorrer daquela forma. No momento em que houver uma reação será
um novo presente que também será criado pelos carmas de cada um.

Isso quer dizer que se você receber de Deus uma reação, ela não foi motivada pela sua ação,
mas porque você tinha o carma que tornou justo e obrigatório recebê-la. Se você não tivesse aquele
carma, mesmo que praticasse ação, jamais receberia tal reação.

Sendo assim, não existe o que vocês acreditam: porque eu fiz uma coisa aconteceu isso; porque
fiz aquilo recebi tal resposta. Todos os acontecimentos do mundo são completamente independente um
do outro. Eles estão sempre vinculados ao carma daquele momento.

Por exemplo. Vocês imaginam que foram demitidos de empregos porque fizeram tal coisa. Isso
não é real. A demissão já estava escrita no livro da vida de quem a recebeu. A partir disso posso dizer o
seguinte: você não foi demitido por causa do que fez, mas fez o que fez para ser demitido. Ou seja, a
consequência é causa da ação e não o contrário...

Voltando ao texto quero dizer o seguinte: talvez aqui esteja o maior ensinamento do Krishna. O
sacrifício da autoria e da intencionalidade – sacrificar o ‘eu’, sacrificar as suas paixões, vontades, culpas,
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 69
intencionalidades, a repercussão da ação – é, dentro do caminho da elevação espiritual, a atitude que
mais pode ajudar.

Participante: Falam que o cansaço é energia negativa, mas o cansaço também


não pode ser Deus agindo para que alguma coisa aconteça ou não, para que se
faça ou não?

Sim, o cansaço pode servir de intencionalidade para o acontecimento ou não de uma ação. Mas,
preste bem atenção: você não deixa de fazer nada porque está cansada...

Quando você, por exemplo, acredita que o seu dia não rendeu nada porque estava cansada,
ainda está presa em você mesmo: no que acha que está sentindo. Aquele que pratica a yajña diz assim:
‘hoje o dia não rendeu porque não rendeu’. Se perguntarem a ele porque não rendeu, aquele que pratica
o sacrifício a Deus responde: ‘porque não era pra render...’

É isso que se está falando em sacrificar a Deus: sacrificar o que você acha. Se você acha que
não está produzindo porque está cansada, sacrifique sua intenção a Deus. O seu cansaço não pode
atrapalhar o seu rendimento porque este é dado por Deus e isso acontece independentes do que você
está sentindo, pois o que tem que acontecer, vai acontecer.

Sabe de uma coisa: ninguém morre de câncer porque fuma; fuma para morrer de câncer; não
adianta se combater o cigarro. Ou seja, o que você acha que é efeito, é a causa.

Sacrificar a Deus o ‘eu’ não é simplesmente abandonar a intencionalidade: é sacrificá-la a


Deus...Você pode achar que fez alguma coisa errada, mas em sacrifício ao Senhor, mata o seu errado e
só diz assim: eu fiz.

Essa é a verdadeira oração, o verdadeiro amor a Deus acima de todas as coisas. O sacrifício da
sua intencionalidade é na verdade, o cumprimento do primeiro mandamento da Lei que Cristo ensinou:
amar a Deus acima de todas as coisas. Isso porque só quando você sacrifica seu individualismo a Deus
O ama acima de si mesmo.

Esse, volto a dizer, é o ensinamento mais forte de Krishna. Todo resto do ensinamento de
Krishna está em Lao Tsé, todo o resto dos ensinamentos de Krishna está em todos os outros mestres.
Mas, essa visão do sacrifício a Deus do seu individualismo, só o Krishna tem.

10 - No início, o Senhor das criaturas, tendo criado o gênero humano,


juntamente com "Yajna" (sacrifício, oblação, culto, orações) disse: "Por
este 'Yajna' vos multiplicareis, ,por este 'Yajna' prosperareis e alcançareis
todos os fins desejados, como (se lidásseis com) 'Kamadhuk' (a vaca
simbólica que possui a extraordinária qualidade de dar ao leiteiro tudo
quanto deseja.)

O ‘gênero humano’ significa o Espírito, ‘no início’, significa Adão e Eva. A partir daí pergunto:
onde podemos achar o sacrifício na história de Adão e Eva? ‘Vocês podem comer os frutos de todas as
árvores, menos dessa aqui; sacrifiquem o desejo de comê-la a Mim’. O fruto da árvore proibida é o fruto
do conhecimento: o saber...
Página 70 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
O espírito não ouviu o que Deus disse e por isso até hoje ainda quer saber as coisas. Quer
conhecer a autoria de cada ação, quer saber o que está acontecendo, quer saber o resultado de cada
acontecimento. Com isso, ao invés de praticar o yajña recomendado, entregou-se ao seu individualismo,
ao seu prazer de comer a fruta que parecia gostosa.

11 e 12 - Com este 'yajna' (sacrifício) nutrireis aos devas (seres celestiais,


duendes, elementais) e eles vos nutrirão a vós. Nutrindo-vos mutuamente,
ambos alcançareis o bem supremo. Sendo nutridos pelo 'yajna', os devas
vos darão os objetos que desejardes. É um verdadeiro ladrão aquele que
peleja pelos objetos que os devas outorgam, sem fazer a eles as devidas
oferendas.

Com o sacrifício do individualismo a Deus você se nutre espiritualmente, ou seja, recebe amor.

Quando você quer ganhar, recebe ‘o ganhar’, quando tem raiva de perder, recebe a ‘raiva’,
quando tem mágoa pelo que foi lhe feito, recebe ‘mágoa’. Só através do sacrifício do individualismo é
que você entra no amor perfeito, na conjunção perfeita do amor com Deus.

É um ladrão aquele que quer ter alguma coisa sem sacrificar algo. Você quer ter a felicidade,
mas não quer sacrificar a sua visão do acontecimento; quer estar harmonizado com o Universo, mas não
quer sacrificar a Deus o que você acha do outro.

Para receber do Pai, você precisa sacrificar a Deus seus rituais, seus atos, suas vontades, seus
desejos. Precisa sacrificar tudo isso a Deus para poder receber algo Dele.

Sem dar algo, não se recebe nada. Cristo ensinou que “é dando que se recebe”. Dar em
sacrifício o individualismo para poder receber o amor de Deus.

13 - Os justos, comendo os restos do "yajna" (sacrifício, oblação), libertam-


se de todos os pecados, mas os injustos (ou os que não fazem
oferendas), os que cozinham só para si, comem pecados.

Os ‘restos’ citados por Krishna são os resultados da ação. Por exemplo: você agiu gritando com
uma pessoa, mas conseguiu vivenciar esta situação fazendo o sacrifício a Deus. O ‘resto’ desta ação
será a consciência da presença do amor de Deus. Agora, praticou a mesma ação sem se sacrificar a
Deus, certamente o outro vai gritar com você também, pois este foi o resultado da sua postura durante a
ação.

Para poder receber a justa recompensa de Deus, você precisa sacrificar a Ele as suas intenções.
Se ao invés disso ainda se sente vitoriosa por ter ganhado a discussão com ele ou sente-se culpada por
ter agido daquela maneira receberá o que sobrou daquela ação: o prazer ou a dor.

O resto (resultado) é o que sobra da ação.


Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 71

14 - Os seres corpóreos nascem do alimento, o alimento provém da chuva, a


chuva vem de "yajna" (das rezas, dos rituais, das oblações) e o "yajna"
vem da ação ou "karma".

O que precisa sacrificar vem do seu carma, vem das suas ações interiores anteriores. Se você
grita com alguém é porque se desgostou com o que ele disse ou fez. Mas, antes de se desgostar você
teve certeza de que ele disse o fez determinada coisa. Ou seja, você não praticou o sacrifício a Deus
naquele momento.

Com isso gerou para si um carma. Durante este novo acontecimento que está vinculado ao
carma anterior é preciso que pratique o yajña para poder gerar para si outro tipo de carma.

15- Sabe que o Karma ou a ação tem sua origem nos Vedas (sim porque os
antigos arianos passavam a agir de acordo com os ensinos e
recomendações dos versículos védicos) e que os Vedas provêm do
Imortal. Por isso, a onipresente Verdade (Brahman) está sempre
estabelecida em "Yajna".

Todos os mestres ensinaram o sacrifício a Deus.

Os carmas são gerados a partir das normas (ensinamentos) dos mestres. Por exemplo: Cristo
disse que ‘não se deve desejar a mulher do próximo’. Portanto, ele disse que você deve parar de
desejar. Mas, alguém consegue? Não, quando se vê o desejo já está presente. Então, como não
desejar? Sacrificando o desejo a Deus: ‘Senhor eu gostaria de ter aquela mulher, mas não vou ficar
preso a isso; se o Senhor me der está bom, se o Senhor não me der, também está bom’...

A Onipresente Verdade está sempre do lado do sacrifício da intencionalidade. Deus nunca estará
onde você acha que Ele está, nem estará do lado de quem você acha que deva estar. Ele está onde
está; Ele faz o que faz... Toda motivação que você coloque na ação de Deus será sempre fruto de sua
intencionalidade e não da do Pai.

Mesmo quando você disser que faz alguma coisa porque Deus quis que fosse feito assim, não
estará do lado da Verdade. A Verdade só aparecerá quando você não souber de nada. Para isso é
preciso sacrificar ao Senhor o seu entendimento: ‘só Deus sabe porque isso aconteceu’...

16 - Aquele que aqui (mundo) não segue a esta roda que foi posta em
movimento vive em pecado e em sensualidade; esse vive em vão, ó
Partha!

‘Pecado’ é viver contra Deus; ‘sensualidade’ são as percepções do corpo.


Página 72 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Toda vez que você tem intencionalidade em alguma coisa é porque vive pra si, para o que acha,
para o que sabe, e isso não leva a lugar nenhum, muito menos à elevação espiritual, que é caracterizada
pelo abandono de tudo isso.

17 - O homem que vive consagrado ao SER, que está satisfeito com o SER e
está contente somente com o SER, esse já não tem mais deveres.

'SER' significa 'Espírito'.

Para aquele que se consagra ao espírito todos os deveres, toda a obrigação se encerra, porque
ele sabe que o Espírito não tem obrigação. Sim, o ser universal não é obrigado a fazer nada porque tem
o livre arbítrio de fazer qualquer coisa.

Sendo assim, é preciso se compreender que a vida não pode ser movida pela obrigação. Depois
de compreendido isso, aquele que quer alcançar o reto caminho deve, então, dedicar-se a utilizar o
livre-arbítrio para acabar com as obrigações. Isso se faz automatizando o controle do pensamento para
que ele não se forme a partir de regras e normas pré-concebidas. Para automatizar o controle do
pensamento, o ser que busca o reto caminho deve atingir a consciência amorosa.

Enquanto o espírito não alcança a consciência amorosa e participa das ações preso às
obrigações de fazer ou não, ainda possui intencionalidades. Quando ele atinge a consciência amorosa,
ou seja, participa da ação com o amor universal (felicidade, compaixão e igualdade) não mais terá
intencionalidades.

Este ser jamais irá ferir alguém, porque o que pode ferir o outro não é o que se pratica contra
ele, mas a intenção que o agente da ação coloca no que pratica. Este ferimento existe porque a
intencionalidade é presa ao individualismo e este pode ferir, mas a ação jamais.

Individualismo é sentimento usado como fruto do livre-arbítrio. Aquele que vive para o ser, que o
consagra, que se realiza no próprio ser atinge a consciência amorosa e para este não existem mais
obrigações a serem cumpridas.

18 - Neste mundo, esse nada tem a ganhar pela ação, nada perde se não
atua, nem precisa depender de algo ou de alguém mais para alcançar
seus propósitos.

Aquele que vive para o ser espiritual é o elevado. Para ele tanto faz fazer ou não fazer, ter ou
não ter, ganhar ou perder, pois ele não se realiza por essas coisas. Ele realiza-se nas conquistas
espirituais e não nas materiais.

Na verdade, o que o auto realiza , são as coisas espirituais. Apenas sabendo-se ser um ser
universal ele já se sente realizado. Não precisa de mais nada, de coisa alguma, seja essa coisa algo
material , sentimental ou moral.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 73

19 - Assim que, mantendo-te desapegado, cumpre com teu dever. Em


verdade, atuando sem apego, o homem vivencia o Supremo.

Cumprir o seu dever é fazer o que você tem que fazer. Todos os carmas dos seres
humanizados estão inter-relacionados. Cada um que encarna com a programação de conviver junto com
outra pessoa já possui os seus carmas acertado previamente antes da encarnação.

Portanto, sem apego ou sem intenções, faça o que fizer (brigue, abrace, chore, ame
materialmente) não sinta prazer nem culpa. Por isso é importante se retirar da vivência da ação toda a
intencionalidade e o apego, pois com isso se cumpre o pré-determinado sem a busca do bem individual.

Não pense em deixar de cumprir o que foi combinado, pois isso é impossível. A elevação de
cada um depende das ações praticadas. Se fosse possível a alguém deixar de cumprir o seu trabalho, tal
atitude afetaria todos os que dependem daquela ação. Por isso não se culpe: todos recebem o que
precisam e merecem. Mas, também não se vanglorie por causa do que fez, pois você está apenas
cumprindo a sua obrigação: viver a vida que escreveu junto com as pessoas que estão no seu meio.

20 - O rei Janaka e outros alcançaram a perfeição graças à ação,


simplesmente. Tens que atuar, pois, nem que seja só para servir de
exemplo aos demais.

O que cada um pratica é apenas a lei do carma em ação e, por isso não deve servir de júbilo
para ninguém. Para servir de exemplo, mais do que praticar uma determinada ação, é preciso participar
dela desapaixonadamente.

21 – O que um homem superior faz é copiado pelos demais; aquilo que ele
exterioza em seu ato é seguido pelas pessoas.

22 - Ó Partha! Eu não tenho nenhum dever a cumprir. Nada há nos três


mundos que já não tenha alcançado ou que ainda falte por alcançar; e, no
entanto, continuo atuando.

Krishna usa a si mesmo nesta frase porque é um espírito elevado. Os três mundo que ele cita
são: o mundo ilusório da matéria densa, o mundo ilusório da matéria não-densa e o mundo real onde a
matéria não é confundida com realidade.

Assim como Krishna, muitos outros espíritos não teriam nada que estar fazendo neste mundo
ilusório de matéria densa aqui. Não estão aqui porque precisam ganhar nada, porque precisam se
elevar, mas porque o fundamento da vida no Universo é servir ao próximo.
Página 74 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Sendo assim, compreendam que a elevação espiritual tem como finalidade servir ao próximo
praticando ações sem intencionalidade, seja brigando, seja discutindo ou amando materialmente.
Precisamos desmascarar o que a humanidade entende como serviço ao próximo. Servir ao próximo não
é só dar o que o próximo quer, mas muitas vezes é servir de instrumento para o que o próximo não quer
mas precisa para a elevação do próximo.

Pensando assim, afirmo: Judas foi muito mais apóstolo que os demais...

23 Ó Partha!, se alguma vez Eu deixasse de atuar, o que faço sem descanso,


as pessoas Me imitariam ou acompanhariam Meus passos.

24 Se não atuasse perpetuamente, estes mundos pereceriam; Eu Me tornaria


uma causa para a confusão das castas (ou espécies) e uma causa de
destruição destes seres.

É por isso que Deus age o tempo todo.

25 - Oh Bhârata! com o mesmo zelo com que os ignorantes apegados


trabalham para si mesmos, os Sábios desapegados têm de trabalhar para
os demais.

O que se entende fazer com zelo é buscar realizar as coisas que precisam ser feitas da
melhor forma possível. Por isso Krishna utiliza este termo aqui.

Ele quer dizer o seguinte: da mesma forma que o ser humanizado que vive para sua
humanidade, ou seja, aquele que está preso às suas paixões, sempre busca ganhar, não importa o
que seja, mesmo quando diz que está ajudando o outro, o sábio luta para não vivenciar paixões
durante os acontecimentos da vida. Os primeiros vivem zelando por si mesmo; o segundo está
zelando pela coletividade, pelo bem comum. Os primeiros se preocupam em amar a si acima dos
outros; o sábio se preocupa em amar ao próximo como a si mesmo...

É preciso ser zeloso durante a sua vida carnal com as coisas espirituais. Não adianta dizer:
'eu não consigo. Pensar assim denota apenas falta de zelo. É preciso zelar pelo espiritual na luta
contra as suas formações mentais, contra a sua vontade de que o mundo mude para lhe agradar.

Saibam de uma coisa: ao não zelar pelo universalismo, automaticamente você está zelando
pelo individualismo.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 75
26 - O Sábio não deveria turbar a mente do ignorante, que está ligada à ação
intencional; ao contrário, ele próprio, trabalhando assiduamente, tem que
ocupar o ignorante na ação justa. (O conhecimento vulgar se purifica pela
ação inegoísta, tornando-se entendimento. O egoísmo, que é o maior
obstáculo contra o progresso espiritual, cresce muito mais na indolência
ou na falsa não-ação do que na Ação Pura.

O verdadeiro sábio não ensina nada a ninguém. O sábio deve participar da ação sem
intencionalidade, inclusive com a de ensinar alguma coisa aos outros: 'olha, eu sei, eu sou sábio,
você não pode fazer desse jeito'. Ao contrário, o verdadeiro sábio zela para pensar desse jeito:
'você acha que é melhor pôr isso ali, eu vou por'; 'você acha melhor fazer isso, eu vou fazer'; ' você
queria que eu fosse a tal lugar, eu vou'; 'você não quer que eu vá ali , eu não vou'; 'você acha que
isso que acredita está certo, então está'.

O verdadeiro sábio luta para se libertar das suas formações mentais que afirmam que ele é
superior aos outros, que sabe mais e que por isso tem que impor sua vontade e verdade aos outros.
Ele busca libertar-se de pensamentos como este: 'você não pode querer que eu vá onde você quer,
porque ao querer isso está agindo intencionalmente'. Ele luta para libertar-se de tal pensamento
porque sabe que se prender-se a ele estará também agindo intencionalmente.

O verdadeiro sábio age sem intenção alguma e por isso não ensina ao outro que não se
pode querer, ter ou ser alguma coisa...

27 - De qualquer maneira, seja qual for o caso, são os gunas da "Prakriti" (ou
são as dualidades inerentes à mente, matéria ou à psicofisicalidade) os
que atuam. Só naquele cuja mente está iludida pelo egoísmo e egotismo
se levantam pensamentos do tipo:"sou eu (ego) quem atua".

A frase 'são os gunas da Prakriti que atuam' significa que a realidade que você vive o mundo é o
que você acha e não a Realidade Real. Não importa de que momento da vida esteja participando, a sua
realidade será sempre o que você está achando que é não a Realidade Real.

28 - Porém, ó tu de braços poderosos! Sabe que os Sábios discernem


corretamente a verdade relacionada à distinção dos gunas e do Karma
(ou ação intencional e sua consequência). Percebem claramente como os
gunas, em seu papel de sentidos (pensantes pensados), se pousam sobre
os mesmos gunas, mas agora em seu papel de objeto (pensado, gunas
esses que são a falsa dualidade psicofísica sobreposta), e graças a essa
reta percepção o Sábio jamais se apega a nada.

O sábio sabe que tudo que tudo que vive como realidade é fruto da sua intenção. Ao ter esta
consciência o sábio, ao invés de declarar que aquilo é verdade, luta contra a sua formação sacrificando o
fruto da sua intencionalidade a Deus. Ele não sacrifica a prática da ação, mas o fruto dela.
Página 76 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Os sábios percebem que as qualidades que aplica as coisas surge do seu individualismo e por
isso busca sempre a intenção universal. Por exemplo. Um banco, conforme a percepção de cada um,
pode ser sujo, bonito, feio etc. A intenção universal, no caso, é saber que está percebendo um banco; já
as qualidades creditadas ao banco, desde a forma até sua limpeza e estado de conservação, estão
fundamentadas no individualismo de cada um.

Agora, engana-se aquele que pensa que o sábio não tem formações mentais que afirmem que o
banco não é limpo. Ele tem, mas sacrifica a qualidade que a formação mental criada pelo guna a Deus.
Ele zela para pensar desta forma: 'ali existe um banco, já a sujeira que estou vendo nele é coisa da
minha cabeça, do meu individualismo'.

O que Krishna está dizendo neste trecho é que o sábio sabe quando sua percepção repousa
sobre a Realidade Real ou não. Por exemplo: o que é sua esposa? O sábio diria apenas que é um
instrumento do seu carma; o aprisionado ao seu individualismo diria que é sua companheira, a
qualificaria como bonita ou feia, afirmaria se gosta ou não dela, etc.

Quando há uma desavença entre o casal, o sábio, ao invés de culpar a esposa pelo que fez, zela
para pensar desta forma: 'eu acho que ela não deveria ter feito isso, mas se fez, tinha de fazer'. Com
isso ele está sacrificando o seu achar a Deus.

Com isso o sábio denota o seu zelo pelas coisas espirituais. Já o não sábio critica a esposa
porque zela pelo seu individualismo, pela sua vontade de estar certo. Para sustentar esta vitória ele está
sempre atento em descobrir erros nos outros para poder criticá-los.

Para se alcançar a verdadeira sabedoria é só estar atento ao pensamento e zelar para vivenciar
o universalismo, para viver para o ser.

29 - Alucinadas pelos gunas que constituem as qualidades da "Prakriti", as


pessoas se apegam ao sentir (pensante) e ao que esse sentir
supostamente capta (ou ao dado pensado); em outras palavras, se
apegam aos supostos sentidos e às suas funções. O homem de sabedoria
perfeita não deve perturbar as pessoas de pouco entendimento e
compreensão imperfeita. (Nem todos têm o mesmo grau de compreensão
ou a mesma capacidade de assimilação e transformação; por isso, os
ensinos espirituais devem ser administrados e temperados com muito
carinho e paciência. e principalmente para cada caso, de forma individual.
.. A ação impessoal ou inegoísta, mais a vivência intuitiva são a base de
qualquer progresso ou simplificação e purificação mental.)

É o seu sentido visão que está vendo poeira; é o seu guna que diz que poeira é sujeira.
Fundamentado nisso você se apega à realidade de que aquilo está sujo e que precisa ser limpo. Neste
momento cria uma condição para ser feliz: 'aquilo tem que estar limpo'.

Participante: Lembrei-me de um coisa... Às vezes o pessoal da faxina no meu


trabalho, ao invés de passar pano, varre. Nós não ficamos sabendo se fazem uma
coisa ou outra. Quando começo a trabalhar, espirro sem parar. Quer dizer, eu não
sei se foi varrido, mas percebo pelo cheiro de poeira no ar. Neste caso, meus
sentidos estão reagindo a uma provocação externa?
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 77
Você não sabe conscientemente o que foi feito no ambiente, mas seus sentidos já perceberam,
como você mesmo disse. Quando o cheiro é percebido, sua mente que está condicionada, diz: 'tenho
que espirrar'.

É o que Krishna fala: você está preso aos gunas que criaram a ilusão de existir alguma coisa.

Participante: E quando é uma criança?

A mesma coisa...

Na verdade não é você que espirra: é Deus que faz você espirrar. Mas, Ele faz você espirrar
porque você está aprisionada à materialidade como realidade, porque você acredita que é alérgica...

Participante: Não seriam os conceitos ao invés de percepções?

É a mesma coisa...

Você não percebe coisa suja? Então...

Na verdade nem é a percepção, é a formação mental, é o processo de raciocínio que nasce da


percepção.

Participante: 'e ao que sentir, supostamente capta' – comente, por favor...

Você olhou e constatou que tem poeira: isso é um fato. Dizer que ter poeira é estar sujo é a sua
alucinação. É a prisão aos seus gunas, é a prisão aos seus conceitos.

Eu já expliquei aqui uma vez: vocês dizem que entrar com sapato sujo de terra é sujeira, mas
tudo que existe no planeta é terra...

30 - Oferecendo todos os teus atos e supostos frutos a Mim, e fixando a


mente no SER interior, despoja-te dos anelos que tens pelos resultados e
liberta-te de toda noção de "eu" e "meu"; só depois disso, ó Arjuna,
poderás lutar sem a febre mental.

'Oferecendo' significa sacrificar a intencionalidade do ato: o querer e o não querer. 'Fixando a


mente no ser interior' significa fixar a mente em você espírito, se concentrar no espiritualismo, no
ecumenismo e no universalismo.

Portanto, Krishna recomenda que você deve estar concentrado o tempo inteiro em obter bens no
céu; tem que estar concentrado o tempo inteiro em atingir a consciência amorosa da prática da ação;
tem que estar concentrado o tempo inteiro em se harmonizar com o Universo. Ela aconselha isso porque
os seres humanizados estão concentrados no 'eu externo', ou seja, no ser humano. Estão sempre
procurando o que é bom para o ser humano; estão sempre procurando sempre seguir os seus códigos
de leis; estão procurando superar o próximo. Este é o problema.

Espiritualismo, ecumenismo e universalismo tem que ser objetivo de vida. Se vier à mente de um
sábio que ele não gosta de ver você descalço, ele, como está concentrado no Ser interior, no
universalismo, ao invés de aceitar esta ideia cria pela mente, procura se harmonizar com você, amando-
Página 78 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
lhe com e sem sem sapato. Ele não se harmoniza com a ideia de ter que lhe criticar, obrigá-la a colocar o
sapato porque ele gosto, porque quer. Esse é o comportamento do sábio...

Na hora que vocês viverem para amar ao próximo, ou seja, para se harmonizar com o outro, a
vida vai mudar. Só que vocês vivem o tempo inteiro querendo domesticar o próximo. Não se assustem
com a palavra, é essa mesmo: você vivem querendo domar o outro, subordiná-lo aos seus desejos...
Vocês vivem pensando assim; 'não gosto de quem não usa sapato, então tenho que comentar isso com
ele, tenho que fazê-lo entender a importância de andar de sapato'.

A harmonia nasce não quando um tem que ser igual ao outro. Para que haja harmonia é preciso
que você se harmonize com o outro como ele está. A igualdade que pregamos, não aquele que é
caracterizada por um ser cópia um do outro, mas sim aquela que se fundamenta no direito de cada um
ser diferente.

Se o outro gosta de fumar, o que você tem a ver com isso? O problema é dele... Se o cigarro dá
câncer, quem vai morrer é ele... Porque que você acha que tem o direito de obrigá-lo a parar de fumar?
Isso é uma violência contra o outro, contra os direitos dos outros...

Vocês ficam muito impressionado quando eu falo de estupro, mas vocês estupram o outro a
cada segundo: estupram a vontade, o desejo, estupram o direito do outro ser ele mesmo, ser quem
quiser ser...

Quem quer fumar, que fume! Quem é você para acusá-lo de qualquer coisa ou achar que tem o
direito de comandar a vida alheia? Por acaso é o dono da verdade, o salvador da humanidade, aquele
que conhece todas as verdades?

Participante: Na verdade até hoje aprendemos que ajudar ao próximo é levá-lo


para o bom caminho. Agora essa questão de que nem todos que fumam tem
câncer ou que alguns fumam para ter câncer tem que falar em Deus Causa
Primária e tem que falar em livro da vida e muita gente não acredita nisso.

Não precisa se falar em Deus Causa Primária nem em livro da vida. O argumento que você pode
usar para os outros é mais simples...

Quem disse que o certo é ficar vivo? Você não vai morrer? Então porque não morrer de câncer?
Este é um argumento que você pode usar para falar aos outros e nem precisa entrar na questão da
fatalidade...

Mais argumentos. Porque se defende a vida se a morte é certa? Quem lhe deu a posição de juiz
da vida do outro? As pessoas rebaterão: 'ah, mas, eu sou amigo dele'... Sim, você é amigo dele, mas
não é seu dono...

Perceba que com a insistência da crítica – que vocês chama de conselho - você quer tomar
conta do outro, quer dizer o que ele tem que fazer, a hora, o jeito e o que deve ser feito. Isso é querer
dominar, é querer ser senhor do outro.

Veja, eu não falei em Deus Causa Primária, em livro da vida ou em qualquer tema que envolva a
fatalidade. Aliás, não falei nem em religião. Eu falei o seguinte: se você acha que você tem o direito de
fazer o que você quer, dê ao próximo esse direito também.

Participante: Ah, mas você está me prejudicando fumando perto de mim...

Certo, então ele vai fumar longe de você. Mas, mesmo quando faz isso, quando retorna para o
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 79
seu lado começa a crítica: 'já foi fumar de novo?' Ele respeitou o seu direito de não fumar, mas quando
volta ainda tem que ouvir crítica. Compreendeu?

Não precisa de falar em Deus como Causa Primária de todas as coisas. É só dizer: 'se você
acha alguma coisa, ache, mas me deixe em paz com o que eu acho... Se você gosta de andar arrumado,
ande; eu não gosto; eu gosto de andar assim. Porque tenho que andar igual a você? Você é o juiz do
mundo? Você detém a verdade do mundo?

Essa é a liberdade que nós temos que nos dar: a liberdade de não seguir os padrões dos outros.
Mas, se queremos esta liberdade, temos que dar ao outro o direito fazer o que quer e não obrigá-lo a
fazer o que você quer.

Essa é a base do amar ao próximo como a você mesmo que Cristo nos ensinou: dar o direito ao
próximo de ele fazer o que quer.

Participante: É, mas aí você perde o amigo.

Se isso acontecer, você não perdeu nada: perdeu apenas uma falsidade. Você achava que ele
era seu amigo, mas na primeira desavença ele deixou de ser seu amigo. Isso quer dizer que nunca
amizade, mas uma falsidade...

Essa é a concentração perfeita no Ser, no Espírito e não no ser humano: estar constantemente
se preocupando em sacrificar os seus desejos e verdades a Deus para poder dar ao próximo o direito
dele ser o que ele quer ser. Saiba que se você não der esse direito ao próximo não tem direito algum.

Com a perda do seu direito vem o carma, a ação carmatica. Quando ela chega trazendo coisas
que vocês não gostam de vivenciar sofrem. Mas, por que sofreram? Porque querem ter o direito de ser,
estar e fazer o que querem, mas deixam os outros serem o que querem. Plantando restrições ao próximo
só podem colher restrições a si mesmo... É isso que gera um determinado tipo de carma, aquele onde
você sofre.

Agora, se você liberta-se de tudo (os seus conceitos de certo e errado, bonito e feio) irá transitar
entre as coisas sem estar apegado a elas. Esta forma de vivenciar os acontecimentos da vida lhe gera
um carma diferente...

Mas, ouça bem: libertar-se dos conceitos não lhe tira o direito de agir. Se você entra aqui e
percebe que está sujo, limpe, se limpar. Isso você pode fazer, se fizer. Agora, não reclame de alguém se
ele não limpou.

Uma vez você me disse que mandou seu filho arrumar o quanto. Passado um tempo ele disse
que já tinha arrumado. Depois você foi ao quarto e disse que ainda estava uma bagunça. Acha isso
certo? Você tem que dar a ele o direito de achar que ele arrumou., mesmo que para você não esteja...

Mas, dar a ele este direito não retira o seu de mudar a arrumação que ele fez. Você não precisa
deixar do jeito que está. Se quiser vá lá e arrume do seu jeito, mas não critique-o por que você achou
que a arrumação dele não estava como você achava que devia estar.

Não estou falando que você deva deixar de fazer. Estou dizendo apenas que deve dar ao outro o
direito de ele querer ser quem é, de achar que o que ele fez foi uma arrumação. Essa é a concentração
do eu no Ser necessária para quem busca a elevação espiritual: o tempo inteiro estar preocupado em
harmonizar-se com o mundo do jeito que ele está e não querer trocar o mundo para o que você acha
certo.
Página 80 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Participante: Então eu não tenho que fazer nada?

Depende... Se você quiser fazer alguma coisa faça: vá lá pegue o que acha que está fora de
lugar e guarde onde imaginar que é o certo de se guardar. Se quiser, também, pode deixar tudo do jeito
de que está...

Você pode fazer muitas coisa, mas a única coisa que você não pode fazer é acusar, criticar,
sofrer, o que, aliás, é só o que vocês humanos fazem neste caso, não?

Compreendam uma coisa: não adianta brigar que nada vai mudar. Será que vocês ainda não
repararam que por mais que se esforcem em mudar os outros eles nunca mudam? A única que sai
perdendo com tudo isso é você: perde a sua paz, a sua harmonia, a sua tranquilidade... Só quem perde
é você.

31 - Aquele que livre das elucubrações (discurso mental) e cheio de fé ou


"sraddha" (atitude mental que se manifesta como sinceridade, humildade,
respeito), constantemente põe em prática estes conselhos, esse também
se liberta das ações contaminadas e seus resultados (ou karma).

O que é uma ação contaminada? É aquela que é vivenciada com intencionalidade. O que
contamina uma ação não é o ato que se pratica, mas você vivenciá-la com o seu querer ou não, ou seu
gostar ou não, o seu achar ou não.

Toda ação é justa, pura e perfeita porque ela vem de Deus. É como um rio que cruze uma cidade
grande: ele nasce puro, perfeito e ao longo do seu caminho ele se contamina. Deus cria a ação pura,
limpa e perfeita; quando ela passa pelos seres humanizados é agregada uma intenção. Neste momento
ela tornou-se contaminada...

3.33 - Inclusive o próprio Sábio age de acordo com sua própria natureza;
todos os seres seguem sua natureza. Que pode fazer em contrário o
simples controle intencional? (O nosso estar consciente ou o
conhecimento que temos sobre nós mesmos é constituído pelos frutos
ou efeitos de nossas ações passadas e pelo que estamos pensando
agora. De forma que o simples controle intencional dos órgãos da ação -
atuo mal; quero atuar bem – não muda a índole mental consciente. Tal
controle deve vir acompanhado pela superação dos desejos e pela
purificação do conhecimento, agora transformado em Entendimento
dinâmico.)

O que é 'sua natureza'? É o que veio com você: todas as suas tendências, tudo o que compõe
a sua personalidade. Se você veio nervoso, vai ser nervoso... Mas, isso não pode servir de desculpa
('eu sou assim mesmo') nem pode atribuir culpa do seu estado emocional aos outros.

Sempre que vocês agem dentro da sua natureza ou se desculpam dizendo que são assim
mesmo ou culpam o outro afirmando que foi ele que lhe deixou nervoso. Saiba de uma coisa: ninguém
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 81
faz nada a ninguém... Cada um escolhe uma forma emocional de vivenciar o que os outros estão
fazendo.

Quando você olha a roupa do seu filho espalhada, quem ficou nervosa foi você. Não foi ele que
lhe deixou nervosa... Isso porque se você tivesse escolhido outra emoção diferente para viver aquele
momento não ligaria pra bagunça e arrumaria a roupa sem reclamar.

Sim, cada um age de acordo com sua personalidade que já vem montada, mas esta pode ser
alterada paulatinamente ao longo da vida quando se concentra no ser..

Márcia: Essa mudança também já é planejada pelo livro da vida?

Falar desta mudança é algo complicado... Eu diria que ela é prevista pelo livro da vida, mas que
precisa ser conquistada paulatinamente. Se você busca viver para o ser, pode ir se acalmando aos
poucos. Krishna não disse que se no último segundo de vida o homem abandonar suas paixões ele já
sai da carne santo?

Ao invés de você plantar a semente da sujeira, plante a semente de que aquilo é apenas poeira
e não sujeira...

Nota: Aqui o amigo espiritual refere-se a um ensinamento antigo. Segundo Buda,


todas as emoções existem dentro de cada um na forma de sementes e nos
momentos da vida nós escolhemos qual plantar e deixar germinar. Joaquim está
fazendo a mesma figura com as verdades.

Enquanto você não discutir consigo mesmo para combater essa qualidade sujo que é aplicada
ao pó que está em cima do banco, nada muda.

Um outro exemplo: depois que você diz algo e verifica que não gostou do que disse, se
arrepende e promete a si mesmo que da próxima vez não fará isso. Fará sim; todos fazem... Então, de
que adianta acreditar nesse fingimento de que quer fazer o bem? Na verdade você não consegue
porque apenas se arrependeu do que disse, mas não mudou a verdade que o levou a dizer aquilo...

O que estou falando é muito mais do que simplesmente arrependimento. O que estou falando é
de matar verdades, crenças, obrigações. Enquanto você não matar a verdade que está em sua
memória, enquanto não matar seus padrões (belo e feio, certo e errado) vai continuar qualificando as
pessoa e as coisas por eles.

Não adianta você querer amar o próximo possuindo padrões que conceitue as coisas. O
próximo sempre vai agir pelos seus próprios padrões e com isso quebrará os seus. Quando isso
acontecer, não haverá amor que resista. Você vai sentir-se obrigado a criticá-lo porque ele feriu seu
padrão.

Portanto, o problema não é se arrepender ou não fazer: o que realmente pode lhe salvar é viver
voltado para o ser para poder lutar contra os padrões que estão em você. Na hora que esta luta for
constante o processo se automatizará e a luta ficará mais branda.

Pergunto uma coisa: se acabássemos com todos os códigos de leis do país de vocês, alguém
poderia mais ser julgado?
Página 82 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Participante: Não..

Então, se você acabar com seus códigos de leis você não vai julgar mais ninguém. Enquanto
você souber o que é banheiro arrumado a roupa do seu filho vai lhe incomodar.

34 - O apego ou a aversão (pensados) dos sentidos baseiam-se na falsa


impressão que tens em relação aos objetos conhecidos e pensados
(sensibilidade deturpada). Que ninguém fique escravo do apego ou
mesmo da aversão. Esses dois, mais a falsa impressão que tens dos
objetos pensados, são inimigos terríveis.

O apego ou aversão é o gostar e o não gostar. Além de achar o banco sujo porque tem poeira
você chama esta percepção de não gostar. Tem gente que está vendo poeira, sabe que é sujeira, mas
não se importa. Portanto, além da interpretação de que poeira é sujeira, existe a sua intencionalidade
pessoal que é o gostar ou não – é a paixão positiva (apego) ou paixão negativa (aversão).

Tornar-se escravo é depender disso para ser feliz (a escravidão é a dependência). Apesar de
vocês não acharem isso, essa dependência é igual à que pessoas têm do tóxico: você começa a
precisar daquilo...

Quando você se apega à ideia de que banco bom é o sem poeira, você começa a precisar que
esta condição seja satisfeita para ser feliz. Apegada a esta verdade e servindo ela como
condicionamento para o seu prazer, que vocês chamam de felicidade, vai cada vez mais ver sujeira para
poder limpar e, com isso, ter o prazer de ver sua verdade contentada.

Na verdade, a cada dia você vai tornando a sua percepção mais sensível. Se hoje um dedo de
poeira é sujeira para você, amanhã apenas um micro pó também será considerado sujeira... Isso porque
você precisa limpar o banco para ter prazer...

Ou seja, o que antes não era sujo agora passa a ser, pois sem sujeira você não terá limpeza. O
mesmo serve pra tudo pelo que os seres humanos brigam, quando brigar lhes traz prazer. Não é a
mesma coisa com o toxicômano? Ele não necessita sempre de doses maiores para poder ser feliz?

A aversão e o apego são inimigos terríveis do ser, pois elas transformam o julgamento e a crítica
que fazemos aos outros e às coisas em vícios que usamos pra alcançar o prazer. Com isso cada vez
mais nos tornamos críticos e juízes, achando que estamos fazendo a melhor coisa do mundo....

35 - É sempre melhor cumprir o próprio dever, ainda que pareça mau, que
cumprir bem um dever que não te corresponde É preferível morrer,
cumprindo o próprio dever; o dever que cabe a outros está cheio de
perigos, pois corresponde à natureza deles.

Cumprir bem o dever é cumprir sem intencionalidade. Contudo ninguém cumpre um dever que
não lhe corresponda.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 83

Arjuna perguntou:

3.36 – Oh, Krishna! (ou Varsneya, descendente dos Vrishni), que poder é
esse que impele um homem a pecar, mesmo contra a sua própria vontade,
como se obrigado por uma força?

O Bendito Senhor disse:

3.37 - É o desejo, é a ira, nascidos da qualidade rajásica (ou ativa) da


"Prakriti" (mente-matéria ou psicofisicalidade). O desejo é como uma
fome insaciável e a ira que se levanta quando ele se frustra é muito
pecaminosa. Neste mundo considera isso como teu pior inimigo. (O
desejo e a cólera são inseparáveis; a cólera se levanta quando um desejo
é obstaculizado. . . )

O que lhe impulsiona fazer pecados? Pecado é tudo o que você faz com sofrimento, tudo que
você faz contra Deus, quando você não ama a Deus acima de todas as coisas, ou seja não tem
intencionalidade.

O que lhe impulsiona a agir com intencionalidade é a paixão, o desejo, a vontade. E o que é
isso? É o individualismo, o egoísmo... Egoísmo: é isso que impulsiona vocês.

Os humanos são pecadores porque vivem para satisfazer seus desejos, suas vontades, suas
intencionalidades próprias.

Pergunto: alguém conscientemente faria alguma coisa que lhe prejudicasse?

Participante: Não, por minha vontade não. Busco seguir minhas vontades, e
muitas vezes alcanço o prazer, mas logo em seguida vem o prejuízo...

Sim, tem que vir o prejuízo porque já teve o lucro: o prazer...

Mas, insisto: alguém faria conscientemente algo que lhe prejudicasse se isso não lhe trouxer
algum lucro? Por exemplo: uma pessoa pergunta quem escreveu determinada coisa errada. Se você
sabe que foi você e sabe ainda que respondendo sim será prejudicado, se entregaria?

É claro que não... Enquanto a pressão não for muito grande ninguém se entrega, não é mesmo?
Por quê? Porque ninguém quer perder nada, de jeito algum.

A força que impera no ser humano e o faz pecar é a vontade de ganhar sempre. É a
intencionalidade, o individualismo, o lucro individual, o prazer, a fama, o elogio. É isso que impulsiona os
seres humanos a pecar.

Muitos vão a centros, igrejas e templos e ouvem belas palavras sobre a vida dirigida para
alcançar o bem celeste. Saem dali convictos de que a prática do que foi ouvido é importante e prometem
a si mesmo que a partir do dia seguinte vão colocar em prática o que ouviram... Mas, na primeira
oportunidade onde eles possam perder alguma coisa, pecam.
Página 84 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Isso ocorre porque o sentimento de buscar o bem celeste é envolvido pela prakriti, pela lógica do
raciocínio. Os gunas criam uma historia para justificar o seu individualismo e você acredita nela. Por
exemplo, eles dizem: 'se aquela pessoa faz o que quer, então eu vou fazer o que quero também'; 'não
posso aceitar que alguém passe por cima de mim (me contrarie), porque eu sei que estou certo'.

As ideias que os gunas criam estão sempre voltadas para criar uma defesa do eu material, do
ego. Por causa disso eles não lhe deixam ser ser apontado como errado. Mesmo que você tenha errado,
os gunas inventam ideias alternativas que afirmem que você não é o errado.

Mas, se você errou, qual é o problema de alguém saber que você fez errado? O problema é que
amanhã vão lhe criticar, você pode perder a sua fama (ser considerado 'o certo) e você vai sofrer com
isso.

Nota: O amigo espiritual está se referindo ao ensinamento chamado 'Quatro


âncoras: vontade de ganhar e medo de perder; busca do prazer e medo do
desprazer; procura da fama e medo da infâmia; vontade de receber elogios e
medo da crítica. Segundo Joaquim estes quatro elementos fundamentam o
raciocínio do ser humanizado e são expressões do egoísmo que é nato no ser
humano.

Com isso, parecem válidas e certas as ideias que justificam sua ação. Você prefere acreditar
nelas porque elas não lhe levam a perder, ter desprazer, receber a infâmia nem a crítica. Elas mantém
para você mesmo a ideia de que é bonzinho, maravilhoso. Por isso não assumem a culpa.

Saiba de uma coisa: o lhe impele a pecar o individualismo. Você quer ganhar sempre e o mundo
que se dane.

Enquanto houver o desejo, ou seja, a condição para ser feliz, você vai sofrerá. Deste sofrimento
nascerá a frustração, a desilusão. Como o sofrimento, a frustração e a desilusão são ações contra deus,
enquanto houver padrões, desejos e vontades, você vai pecar .

Portanto, não adianta nada dizer que a partir de hoje não vai ter mais raiva, que não vai ser mais
nervoso, que não vai mais ficar estressado. Vai ficar porque você não tirou o mal pela raiz: o desejo. É do
desejo que vem a ação silenciosa e implacável da necessidade de que os acontecimentos estejam
dentro dos seus padrões de certo e bom. Permanecendo o desejo de nada adianta você ter boa vontade,
pois não chegará a lugar nenhum. O pecar, ou seja, o sofrer é consequência natural de se ter desejos...

Portanto, o caminho para não mais pecar é libertar-se dos desejos. Mas, o que é o desejo se não
uma intencionalidade? Tudo que você faz porque quer é porque deseja o resultado; tudo que você faz
porque gosta é porque deseja o resultado. Sendo assim, você precisa eliminar o mal pela raiz: precisa
cortar os desejos. A partir do momento que não houverem mais desejos, a felicidade estará sempre
presente...

De nada adianta você lutar contra o que o outro está fazendo. O que precisa é lutar contra o que
esperava que o outro fizesse. É isso que poderá levar você à consciência reta, à felicidade: parar de
esperar que o mundo seja igualzinho ao que você quer.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 85

38 - Assim como o fogo pode ficar coberto pelo fumo, o espelho coberto pelo
pó, e o feto é coberto pelo ventre materno, assim este SER, (nas
aparências), fica encoberto pelo desejo, pela ignorância e pela ira, que
são Maya (ou ilusão e aparências).

O ser 'encoberto' significa o espírito que tem sua consciência espiritual, os seus entendimentos
espirituais da vida ficam encobertos pelos desejos. Mas, Krishna diz mais: esta consciência está
encoberta por maya, pela ilusão. Esta ilusão é o que o ser humano imagina estar vendo, o que ele
imagina saber.

Ou seja, o ser perde a visão espiritual do momento e passa a ter uma compreensão material
daquele momento. Exemplo, você está de calça? Mas não existe calça... Enquanto você estiver
encoberto por esse maya (a compreensão da percepção pelos valores humanos), vai achar que há calça
participará deste momento materialmente falando.

Nota: O amigo espiritual ao dizer que não existe calça está se referindo ao
ensinamento do Espírito da Verdade que afirma que todas as coisas que existem
são formadas a partir de uma molécula universal. Por isso não existe calaça: o
que existe é esta molécula universal.

Agora saiba de uma coisa: para se libertar da ilusão que encobre a sua consciência espiritual de
nada adianta lutar contra o seu olho (ver), contra seu nariz (cheirar) ou contra a sua mão (tato). Isso não
resolve nada.. O que você precisa lutar é contra o desejo de pegar alguma coisa, contra o desejo de ver
alguma coisa, contra o desejo de querer saber o que são as coisas...

39 - Ó Kounteya (filho de Kunti)!, a suprema sabedoria da vivência pura está


coberta por esse fogo insaciável do desejo, esse inimigo constante de
todo e qualquer homem.

A 'vivência pura' é viver com seu irmão de encarnação como se ele fosse seu filho. Isso só
acontecerá quando você não desejar mais saber as coisas...

40 - Diz-se que os sentidos (pensantes-pensados), a mente personificada e o


intelecto são sua morada. Manobrando com eles, o desejo alucina o
homem e distorce a possibilidade de compreender.

A 'mente personificada e o intelecto' significa a morada dos desejos, o não-coração. Ela distorce
toda compreensão que você diz ter sobre as coisas...
Página 86 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
Por exemplo, você é espírita, acredita na vida depois da morte, vive no meio espírita, trabalha
com os espíritos; sua mãe morre e você chora a morte dela. Isso parece contraditório, não?

Na verdade não é contraditório, porque você trabalha com os espíritos fundamentado em


verdades materiais e não da vida espiritual. Você é espírita dentro da visão materialista e não
universalista.

Você chora porque, apesar de dizer que acredita em espíritos e na vida depois da morte ainda
vivencia os acontecimentos da vida de uma forma materialista. Vivendo desta forma a figura da mãe, por
causa do apego que ela gera, precisa estar presente para você ser feliz. Você precisa pegar a mãe,
beijá-la, falar com ela para acreditar que ela existe.

Caso você já tivesse superado seus apegos que geram tais desejos, ou seja, estivesse vivendo
a vida com uma visão universalista, não iria chorar porque ela morreu. Isso porque teria a compreensão
de que a diferença entre vivo e morto é que você vê a pessoa quando viva e morta não. O resto continua
igualzinho.

3.41 - Portanto, ó tu, o mais poderoso da raça Bhârata!, graças ao reto


entendimento, purifica e controla primeiro o Sentir em ti; depois,
abandona essa ignorância-desejo que destrói e mata a Sabedoria e o
conhecimento do próprio Ser.

Isso: a ignorância-desejo mata o, conhecimento do próprio mundo espiritual, da própria realidade


espiritual. Ela mata a consciência espiritual, acaba com a espiritualidade do espírito e cria a humanidade
do Espírito.

O que é um ser humano? É um ser espiritual encoberto pelo desejo que vivencia a humanidade.
E o que é humanidade? É o que você acha que está acontecendo.

Portanto, o ser humano é o espírito que vive fora da realidade espiritual. É um maluco (vive fora
da realidade), espiritualmente falando.

42 - Diz-se que os sentidos (mesmo que contaminados) são superiores ao


corpo, e que a mente é superior aos sentidos, e que o intelecto é superior
à mente, e que aquilo que é superior ao intelecto é Ele (o SER ou a Alma
Suprema).

A mente é superior aos sentidos, porque o que você vivencia é o que a mente lhe diz e não os
sentidos... Exemplo: o pegar alguma coisa pode ser vivenciado de uma forma agradável ou
desagradável. O sentido só constata a presença das coisas materiais; quem dá a agradabilidade ou não
é a mente. É ela que vai dar valor às coisas, que vai tornar o momento agradável ou não...

O sentido é superior ao corpo porque ele é cria o que existe externamente. Se você não pegar,
cheirar, ouvir, sentir ou ver aquilo não exite. Mas, a mente é superior aos sentidos porque é ela que cria a
realidade que você está vivendo. Mas, o intelecto está acima de todos porque é nele (memória) que
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 87
estão as descrições, os padrões (frio, quente, peludo, etc.) e as qualidades que foram usadas pela
mente (raciocínio) para criar definitivamente a realidade que você vive.

Tal conhecimento é útil pra você ir mudando seu padrão de vivência dos acontecimentos. Ou
seja, de nada adianta lutar contra o que percebe sem lutar contra o que raciocinou quando percebeu; de
nada adianta lutar contra o que você raciocinou se não lutar contra o seu intelecto (os padrões
guardados na sua memória). Enquanto você tiver armazenado na sua memória que tal sensação é
desagradável, ela vai influenciar o pensamento que vai ditar o que é percebido.

Mas Krishna diz mais: o ser (atma, espírito) é superior ao intelecto. Vamos entender isso...

De onde nascem as verdades que você têm? Porque está escrito no seu intelecto que é
desagradável pegar cocô? Por causa do seu carma...

Dentro de você existe uma verdade que classifica que sentir pegar cocô é desagradável. Esta
verdade forma um pensamento (ideia) que é aplicada quando existe a percepção deste pegar. Isso
ocorre para que você possa lutar contra a verdade, ou seja, libertar-se do que acha nojento ou não. Ou
seja, tudo isso acontece para que você possa elevar-se...

Na verdade tudo acontece desta forma para que você possa libertar-se de suas verdades. Só
que, como você não consegue atingir a visão espiritual da situação, ou seja, nem sabe que é o ser e vive
coberto pela poeira dos desejos, apega-se ao que a mente lhe dá.

Só quando conseguir libertar-se das verdades e desejos poderá agir no ser. Enquanto não o fizer
estará preso à ideia que a mente está criando.

Repare que eu falei em libertar-se e não em mudar-se. Não se trata de do cocô, mas de deixar
de desgostar dele...

43 - Ó tu, o de braços fortes!, comungando com aquele que é superior ao


intelecto, e subjugando o (falso) ser (personificado) pelo SER, destrói a
esse inimigo na forma de desejo, tão difícil de vencer!

'Comungando com aquele que é superior ao intelecto' é o mesmo que comungando com o Ser. É
amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Comungar com o espírito é viver na
felicidade de estar participando do mundo de Deus, não importando o que esteja acontecendo.

'Minha mãe morreu, mas eu amo a Deus acima da morte da minha mãe'. Quem vive deste jeito
está comungando com o seu espiritual, com a sua consciência espiritual. Para este a mãe não morreu,
porque nem mãe ele tinha. Ele sabe que tanto ele como a suposta mãe são espíritos filhos de Deus, ou
seja, irmãos...

É a questão que já falamos neste estudo: o zelo. É a questão do direcionamento que você dá
para sua vida. Você só vai conseguir vencer nesse processo quando a sua busca for amealhar bens no
céu e não na Terra. Isso porque o bem terrestre é o fruto do individualismo. É o prazer: eu quero, eu
gosto e acontece, sou feliz.

É isso que Krishna está falando: você só vai subjugar a paixão e o desejo quando abrir mão da
felicidade material. Quando você não tiver mais motivos pra ser feliz e for feliz com tudo que está
Página 88 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
acontecendo terá realizado alguma coisa na busca da elevação espiritual. Você só será terá realizado
alguma coisa na elevação espiritual quando ao receber um tapa na cara permanecer feliz porque ama a
Deus acima de todas as coisa e ama o agressor como se fosse você mesmo. Mas, enquanto viver como
real, certo, o seu lado humano que diz que é errado apanhar, terá que reagir e perderá a felicidade.

Portanto, quando lhe disserem 'você não sabe', responda: 'não sei mesmo'. Não siga o que a
sua mente diz: 'quem é ela pra me dizer alguma coisa, eu sei muito mais do que ela'. Quando alguém lhe
disser 'eu tenho certeza' deixe-o ficar com a certeza dele e mantenha sempre a sua dúvida... Não se
preocupe em contestar, em ensinar. Mantenha-se unido a Deus e liberte-se da necessidade de vencer,
de provar que está certo, de ter que dobrar o outro ao seu saber...

A comunhão com o espiritual é o universalismo; é participar do Universo harmonicamente. Se o


Universo para você agora é receber um tapa na cara, louve a Deus. Assim estará harmonizado com
Deus... Comungar com o espiritual é viver o ecumenismo, ou seja, a consciência amorosa nessa vida e a
ligação direta com Deus.

Sem o espiritualismo (a vida fundamentado no valor espiritual) sem o ecumenismo (a fusão de


todas as verdades em uma) e sem o universalismo (harmonizar-se com o Universo) não há comunhão
com o espírito.

Em 1999 foi fundado o Espiritualismo Ecumênico Universal, mas só agora vocês conseguem
compreender porque escolhemos esse nome. Ele reúne as três coisas básicas da vida para quem quer
realizar a elevação espiritual. Sem espiritualismo, ecumenismo em universalismo não há comunhão
espiritual. O que existe é a satisfação pessoal, mesmo quando pretensamente se realiza uma obra para
o Universo.

Enquanto vocês estiverem me acompanhando porque querem, porque gostam ou achando que
estão ganhando com o aprendizado, estão andando para a elevação espiritual, mas a passos lentos.
Isso porque vêm pelo prazer e quando não consegues vir sofrem.

É necessária a comunhão com o Espírito para subjugar o ser humano, mas só a vivência da
ação com espiritualismo acaba com o materialismo; só a vivência da ação com ecumenismo acaba com
as leis ditatoriais do ser humano; só a vivência da ação com universalismo acaba com o individualismo.
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 89
Página 90 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I

Livro original

Capítulo II – O caminho do discernimento..................................................................................................................3

11. Estiveste lamentando-te por aqueles que não o merecem. Todavia, pareces falar como um sábio. Só que
os verdadeiros Sábios não se lamentam nem pelos vivos nem pelos mortos................................................................3

12. Sabe, Arjuna, que nunca houve tempo em que eu (SER) deixasse de existir, nem tu, nem esses reis, e
jamais deixaremos de existir no futuro............................................................................................................................ 7

13. Assim como o ser encarnado tem a sua infância, juventude e velhice, assim também tal ser ressurge
como outro corpo. Os sábios nunca se confundem a respeito disso............................................................................10

14. Ó filho de Kunti... as noções que tens a respeito do quente e do frio, do prazer e da dor, essas nascem
do contato dos sentidos com os objetos; tudo isso tem origem e fim e em verdade, são aparências
transitórias. Suporta isso com equanimidade, ó Bhârata!.............................................................................................15

15. Ó tu, o melhor dos homens, somente aquele que não se aflige por tais modificações e é equânime tanto
no prazer como na dor, realiza a Imortalidade..............................................................................................................19

16. O irreal jamais existe; o Real nunca é inexistente. Os sábios percebem claramente esta Verdade!.....................19

17. Compreende que aquele que interpenetra tudo isso é imortal. Ninguém, nem nada podem destruir esse
Princípio Imutável!......................................................................................................................................................... 22

18. Estes corpos, nos quais habita o Eterno Ser, imortal e incomensurável, têm fim; por conseguinte, luta, ó
descendente de Bhârata!.............................................................................................................................................. 24

19. Aquele que pensa que este ser mata e aquele que pensa que este ser é morto, os dois são ignorantes
porque pensam, raciocinam. O ser não mata nem morre.............................................................................................28

20. Esse ser não nasce nem morre e tampouco reencarna; o ser não tem origem; é eterno, imutável, o
primeiro de tudo e todos e não morre quando matam o corpo.....................................................................................29

21. Ó filho de Prithâ... como pode morrer ou causar a morte de outro aquele que sabe vivenciadamente que
este ser é indestrutível e abandona seu velho corpo e faz-se outros novos. ..............................................................30

22. Assim como alguém costuma deixar suas roupas gastas e bota outras novas, assim o ser corporificado
e humanizado abandona seu velho corpo e se faz outros novos. ...............................................................................30

23. As armas não o cortam, o fogo não o queima, a água não o molha e o vento não o seca....................................30

24. A este ser não se lhe pode cortar, nem queimar, nem molhar, nem secar; é eterno, onipresente, estável,
imóvel e primordial........................................................................................................................................................ 30

25. Diz-se que este ser é não manifesto, que é impensável e imutável; se sabes e sentes que assim é, não
deves te lamentar.......................................................................................................................................................... 33

26. Todavia, ó tu de braços poderosos! Se pensas que este ser a todo momento nasce e morre, mesmo
assim não deverias afligir-te por isso............................................................................................................................34

27. Pois, para aquilo que nasce, a morte é certa e inevitável, e para o que morre, o renascimento é coisa
certo. Não te lamentes, portanto, pelo que é inevitável. ..............................................................................................34
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 91
28. Ó Bhârata!... os seres passíveis de se conhecer no início são imanifestos; no meio, se manifestam; e, no
fim, voltam a ser imanifestos. Então, porque te afliges por isso?.................................................................................36

29. O ser, alguns o consideram como algo maravilhoso; outros falam dele maravilhados; outros mais, ouvem
falar dele com assombro e existem ainda aqueles que, mesmo que ouçam falar dele, o desconhecem....................36

30. Ó Bhârata, este ser que mora em todos os corpos é sempre indestrutível; portanto, não deverias afligir-
te por nenhuma criatura................................................................................................................................................ 38

31. Ainda que tivéssemos que encarar a tua existência desde o ponto de vista do dever moral que te rege,
não deverias vacilar, pois não há nada mais elevado para um guerreiro do que uma guerra justa.............................38

32. Ó filho de Prithâ... em realidade, afortunados são os guerreiros, aos quais se lhes apresenta, sem que a
busquem, como uma porta que se abre para o céu, uma guerra justa como essa......................................................40

33. Mas se tu não tomares parte nesta guerra justa, faltando com teu dever e honra, cometerás o pecado..............40

34. Além do mais, as pessoas sempre falarão mal de ti e para um indivíduo de reputação, a desonra é pior
que a própria morte....................................................................................................................................................... 40

35. Todos estes grandes guerreiros em seus respectivos carros pensarão que te retirastes da batalha por
medo. E aqueles mesmos que antes te tinham honrado com respeito e admiração depois com desdém te
tratarão.......................................................................................................................................................................... 40

36. Teus inimigos falarão coisas indizíveis ou muito desagradáveis contra ti; rir-se-ão do teu valor e
coragem. Para um guerreiro, pode haver algo mais doloroso do que isso? ................................................................40

37. Se morreres na batalha, ganharás o céu; se alcanças a vitória, desfrutarás a terra. Por isso, ó filho de
Kunti, levanta-te decidido a lutar................................................................................................................................... 41

38. Considerando iguais o prazer e a dor, a vitória e a derrota, o lucro e a perda, aceita luta. Desse modo, o
pecado não te manchará............................................................................................................................................... 41

39. Já te ensinei a necessária atitude que manterás no que diz respeito ao entendimento do ser. Escuta
agora, ó filho de Prithâ, o que te direi a respeito do caminho da ação (ou Yoga), graças a cujo entendimento
libertar-te-ás da maléfica ação personificada ou intencional e respectiva conseqüência.............................................41

40. Neste sendeiro da ação (ou Yoga), nenhum esforço se perde, por mais incompleto que seja, nem se
produzem resultados maus ou menos contraditórios. Até mesmo uma prática mínima desta Yoga libera o
homem de um grande perigo e temor........................................................................................................................... 41

41. Neste caminho, ó descendente de Kuru, existe uma única determinação que se dirige somente a um
objetivo. No entanto, tu sabes muito bem que os propósitos das mentes irresolutas são inúmeros e
desencontrados............................................................................................................................................................. 42

42, 43 e 44. Ó Partha... os tolos, cuja mente está cheia de desejos e que consideram a vida celestial (ou
paraísos relativos e pensados) como a sua meta mais alta, os quais estão submissos aos penegíricos
védicos (no ocidente, submissos à letra morta dos versículos bíblicos) e que consideram isso algo muito
superior, esses ignorantes, ó Arjuna, falam com os costumeiros termos floridos a respeito das diversas
classes de cultos védicos, cultos esses que originam os nascimentos, as ações e seus resultados, como
meios para o prazer e a dor. Aqueles que se ligam a esses néscios e se deixam levar por toda essa
fraseologia enfeitada, jamais lograrão a determinação única, que conduz o homem à absorção espiritual................44

45. Nossos Vedas tratam dos três gunas, que são Sattva, Rajas e Tamas. Ó Arjuna, liberta-te desses três
gunas relativos, liberta-te dos pares de opostos e, sempre equilibrado, ficarás lvre dos pensamentos de
aquisição e posse, estabelecendo-te no ser (ou Atma)................................................................................................45

46. Para um autêntico brâmane, vivenciador da Verdade, todos os livros sagrados ou Vedas são de pouca
valia. Tais livros assemelham-se a um pequeno tanque de água que perde a sua utilidade quando, como
numa inundação a água (ou vivência) se espalha por todas as partes........................................................................47
Página 92 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
47. Ó Arjuna... como ser manifesto e pensante somente tens direito à ação, nunca aos frutos do que crês
fazer. Portanto, que tua ação jamais seja motivada pelos frutos. De outro lado, não te apegues à inação.................47

48. Ó Dhananjaya... abraça essa forma de agir ou estabelece-te nessa yoga e renuncia ao apego. Sê
indiferente ao sucesso e ao fracasso e assim comporta-te. Esta equanimidade é a própria Yoga..............................49

49. Ó Arjuna, qualquer obra que se cumpre movida pelo desejo é bastante inferior à que se cumpre com a
mente não perturbada pelos resultados almejados. Portanto, refugia-te na Yoga do reto entendimento.
Infelizes são aqueles que sempre se movem em busca de um resultado....................................................................51

50. Quando alguém vivencia esta tranqüilidade mental, ainda que nesta mesma vida, liberta-te das noções
do bem e do mal. Por conseguinte, consagra-te a esta Yoga. Karma Yoga significa habilidade na ação e
ausência de propósitos pessoais.................................................................................................................................. 52

51. O sábio dotado de entendimento está mentalmente tranqüilo, por isso se afasta dos frutos de suas
ações; liberta-se dos laços que o pensamento forja a respeito do nascimento, crescimento e morte e
vivencia um estado que está mais além de qualquer mal ou dano...............................................................................53

52. Quando a tua compreensão superar o valor dos conceitos ilusórios e do espelhismo que eles provocam,
ficarás indiferentes tanto em relação ao que já ouviste (memória) como ao que terá que ouvir (imaginação).
....................................................................................................................................................................................... 54

53. Quando se aclarar o teu entendimento perplexo, por causa das mais diferentes opiniões vigentes e te
estabeleceres n samadhi (ou na absorção espiritual, na vivência do Absoluto), somente então vivenciará a
Yoga Suprema............................................................................................................................................................... 55

Arjuna perguntou:.......................................................................................................................................................... 55

54. Ó Krishna... quais são as características de um homem dotado de firme entendimento e reta
compreensão e estabelecido no samadhi? Aquele que obteve a consciência de Deus, como caminha, como
se senta, como fala um homem assim de conhecimento tão firme?............................................................................55

O bendito Senhor disse:................................................................................................................................................ 55

55. Ó Partha... quando o homem está satisfeito no ser, pelo próprio ser em si e despojou-se por completo de
todos os anseios da mente, então diz-se que tam homem possui uma sólida sabedoria............................................55

56. Aquele que fica imperturbável na adversidade e tampouco anela a felicidade, aquele que não tem
apego, nem medo, nem ira, esse é um muni (sábio que se mantém silencioso) de firme sabedoria. .........................55

57. Aquele que se mantém desapegado em todas as situações, que não se regozija com o bem estar nem
se desespera diante do mal, esse é dotado de firme sabedoria...................................................................................55

58. E quando afasta completamente sua sensorialidade dos respectivos objetos (pensados), tal como a
tartaruga esconde os membros de seu corpo na carapaça, então seu entendimento se consolida............................56

59. Os objetos se desprendem daquele que os deixa de anelar; todavia, o desejo de gozo ainda persiste no
íntimo do homem desatento. Portanto, aquele que realiza ou vivencia o Ser Supremo, até desse desejo se
liberta............................................................................................................................................................................. 56

60. Ó filho de Kunti... os sentidos contaminados tornam-se turbulentos e arrastam para um mau caminho a
mente de um homem preso ao senso comum; quanto mais a mente daquele que luta para se aperfeiçoar!..............56

61. O homem de firme sabedoria, meditando em Mim, controla a turbulência de seus pensamentos. Sem
dúvida, o entendimento daquele que controlou seus sentidos não vacila nunca.........................................................56

62. Pensando a respeito dos supostos objetos sensíveis, o homem fica ligado a eles; dessa ligação nasce o
desejo e do desejo frustrado nasce a cólera.................................................................................................................56

63. Da cólera nasce a ilusão; com a ilusão ou obnubilação, perde-se a lucidez. A perda da lucidez conduz a
capacidade de discernir à ruína e, com a ruína desta faculdade, o homem perece como escravo do ego.................57
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 93
64. Mas aquele que dominou a si mesmo, auto conhecendo-se e com isso alcançou a tranqüilidade interior,
esse se move imperturbado entre os objetos, graças a um sentir incontaminado, livre de todo anelo........................57

65. Graças à paz interior, terminam todas as misérias da existência aparente e a mente, pacificada,
prontamente se estabelece na Reta Sabedoria............................................................................................................58

66. Para os intranqüilos, a sabedoria não surge, nem eles conseguem meditar. Para quem não medita, não
pode haver paz. E como podem ser felizes os que não têm tranqüilidade interior?.....................................................58

67. A mente, identificando-se aos sentidos (pensantes, pensados), sempre errantes e desordenados, perde
o reto entendimento e a consciência indevidamente personificada passa a ser arrastada de lá para cá como
um barco sobre a água é empurrado pelo vento..........................................................................................................59

68. Por isso, ó tu de braços poderosos, aquele cujos sentidos estão bem controlados diante dos objetos,
esse alcançou um conhecimento firme......................................................................................................................... 60

69. Sabe, ó Arjuna, que aquilo que os seres comuns chamam noite é dia para o homem de reto
entendimento e auto controle. E o dia dos homens comuns é noite para o vivenciador do ser. (O homem
vulgar ignora o conhecimento supremo, o qual só é alcançado pelo homem de autocontrole. A consciência
do homem comum, intranqüila por descuido e condicionada pelo mundo, é uma falsa consciência, uma
consciência contaminada. O Sábio está totalmente livre dessa espécie de “estar-consciente”)..................................60

70. Assim como o oceano permanece calmo e inalterado quando as águas dos rios deságuam nele, da
mesma maneira o sábio que se dominou a si mesmo fica indiferente quando os desejos nele se levantam.
Somente um muni em perfeito silêncio mental alcança a paz e não aquele que anela os objetos do desejo.
....................................................................................................................................................................................... 61

71. Alcança a paz que, abandonando todos os desejos, atua sem atrações nem anelos e está livre de
qualquer noção de “eu e meu”...................................................................................................................................... 61

72. Ó Partha... este é o estado de realização de Brahman, alcançado o qual, não sobram mais ilusões.
Ainda que o indivíduo alcançasse esse estado no momento de morrer, o homem vivenciaria Brahman
Nirvana, o que equivale a identificar-se com o Absoluto. .............................................................................................62

Capítulo III – O caminho da ação............................................................................................................................... 63

01 – Ó Janardana, ó Keshava! Se consideras que o caminho da sabedoria é superior ao sendeiro da ação,


porque me induzes a que cumpra essa terrível ação (guerra?.....................................................................................63

02 - Com palavras aparentemente contraditórias, pareces confundir meu entendimento – pois, as vezes
elogias a obra, outras a sabedoria. Portanto, dize-me com clareza quais dos caminhos terei que seguir para
alcançar o Absoluto?..................................................................................................................................................... 63

O bendito senhor disse:................................................................................................................................................. 63

03 - Ó impecável, como já te disse, neste mundo dois são os caminhos a seguir: ou o Sendeiro da
Sabedoria (ou Jnana-Yoga), que é para os meditativos, ou o Sendeiro da Ação Impessoal (ou Karma-Yoga),
que é para os ativos...................................................................................................................................................... 63

04 - Um homem não consegue libertar-se da ação só porque resolve não cumpri-La; tampouco pela simples
renúncia à ação se logra a perfeição. (A verdadeira não-ação é aquela em que, ao cumprir-se, toda e
qualquer motivo pessoal ou intenção está ausente).....................................................................................................64

05 - Em realidade, ninguém fica inativo um instante sequer, porque os gunas ou as qualidades nascidas da
"Prakriti" (mente-matéria ou natureza psicofísica) obrigam o homem a agir sem cessar.............................................66

06 - Aquele que pensa ter controlado externamente os órgãos da ação, mas que mentalmente continua
preso aos objetos (pensados) dos sentidos, esse é um hipócrita.................................................................................66
Página 94 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
07 - Mas, ó Arjuna!, aquele que, graças a um reto discernimento mental, controla seus sentidos e sem ligar-
se nem identificar-se segue a Karma-Yoga (caminho da ação impessoal que conduz à Libertação), esse é
estimado........................................................................................................................................................................ 67

08 - Cumpre, pois, as ações justas e obrigatórias, pois a ação é superior à inação. Se não agisses, nem
sequer a existência corporal seria possível...................................................................................................................67

09 - Neste mundo, as pessoas comuns se enlaçam por ações que diferem daquelas que são cumpridas por
amor a "yajna" (que é um sacrifício, uma oblação, um culto ou orações a Vishnu, o próprio Deus). De forma
que, ó Kounteya!, atua sem apego, somente por amor a "yajna".................................................................................68

10 - No início, o Senhor das criaturas, tendo criado o gênero humano, juntamente com "Yajna" (sacrifício,
oblação, culto, orações) disse: "Por este 'Yajna' vos multiplicareis, ,por este 'Yajna' prosperareis e
alcançareis todos os fins desejados, como (se lidásseis com) 'Kamadhuk' (a vaca simbólica que possui a
extraordinária qualidade de dar ao leiteiro tudo quanto deseja.)..................................................................................70

11 e 12 - Com este 'yajna' (sacrifício) nutrireis aos devas (seres celestiais, duendes, elementais) e eles vos
nutrirão a vós. Nutrindo-vos mutuamente, ambos alcançareis o bem supremo. Sendo nutridos pelo 'yajna',
os devas vos darão os objetos que desejardes. É um verdadeiro ladrão aquele que peleja pelos objetos que
os devas outorgam, sem fazer a eles as devidas oferendas........................................................................................71

13 - Os justos, comendo os restos do "yajna" (sacrifício, oblação), libertam-se de todos os pecados, mas os
injustos (ou os que não fazem oferendas), os que cozinham só para si, comem pecados..........................................71

14 - Os seres corpóreos nascem do alimento, o alimento provém da chuva, a chuva vem de "yajna" (das
rezas, dos rituais, das oblações) e o "yajna" vem da ação ou "karma".........................................................................72

15- Sabe que o Karma ou a ação tem sua origem nos Vedas (sim porque os antigos arianos passavam a
agir de acordo com os ensinos e recomendações dos versículos védicos) e que os Vedas provêm do
Imortal. Por isso, a onipresente Verdade (Brahman) está sempre estabelecida em "Yajna"........................................72

16 - Aquele que aqui (mundo) não segue a esta roda que foi posta em movimento vive em pecado e em
sensualidade; esse vive em vão, ó Partha!................................................................................................................... 73

17 - O homem que vive consagrado ao SER, que está satisfeito com o SER e está contente somente com o
SER, esse já não tem mais deveres.............................................................................................................................73

18 - Neste mundo, esse nada tem a ganhar pela ação, nada perde se não atua, nem precisa depender de
algo ou de alguém mais para alcançar seus propósitos...............................................................................................74

19 - Assim que, mantendo-te desapegado, cumpre com teu dever. Em verdade, atuando sem apego, o
homem vivencia o Supremo.......................................................................................................................................... 74

20 - O rei Janaka e outros alcançaram a perfeição graças à ação, simplesmente. Tens que atuar, pois, nem
que seja só para servir de exemplo aos demais...........................................................................................................74

21 – O que um homem superior faz é copiado pelos demais; aquilo que ele exterioza em seu ato é seguido
pelas pessoas................................................................................................................................................................ 75

22 - Ó Partha! Eu não tenho nenhum dever a cumprir. Nada há nos três mundos que já não tenha alcançado
ou que ainda falte por alcançar; e, no entanto, continuo atuando................................................................................75

23 Ó Partha!, se alguma vez Eu deixasse de atuar, o que faço sem descanso, as pessoas Me imitariam ou
acompanhariam Meus passos....................................................................................................................................... 75

24 Se não atuasse perpetuamente, estes mundos pereceriam; Eu Me tornaria uma causa para a confusão
das castas (ou espécies) e uma causa de destruição destes seres.............................................................................75

25 - Oh Bhârata! com o mesmo zelo com que os ignorantes apegados trabalham para si mesmos, os Sábios
desapegados têm de trabalhar para os demais............................................................................................................76
Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I Página 95
26 - O Sábio não deveria turbar a mente do ignorante, que está ligada à ação intencional; ao contrário, ele
próprio, trabalhando assiduamente, tem que ocupar o ignorante na ação justa. (O conhecimento vulgar se
purifica pela ação inegoísta, tornando-se entendimento. O egoísmo, que é o maior obstáculo contra o pro-
gresso espiritual, cresce muito mais na indolência ou na falsa não-ação do que na Ação Pura..................................76

27 - De qualquer maneira, seja qual for o caso, são os gunas da "Prakriti" (ou são as dualidades inerentes à
mente, matéria ou à psicofisicalidade) os que atuam. Só naquele cuja mente está iludida pelo egoísmo e
egotismo se levantam pensamentos do tipo:"sou eu (ego) quem atua".......................................................................77

28 - Porém, ó tu de braços poderosos! Sabe que os Sábios discernem corretamente a verdade relacionada
à distinção dos gunas e do Karma (ou ação intencional e sua consequência). Percebem claramente como
os gunas, em seu papel de sentidos (pensantes pensados), se pousam sobre os mesmos gunas, mas agora
em seu papel de objeto (pensado, gunas esses que são a falsa dualidade psicofísica sobreposta), e graças
a essa reta percepção o Sábio jamais se apega a nada..............................................................................................77

29 - Alucinadas pelos gunas que constituem as qualidades da "Prakriti", as pessoas se apegam ao sentir
(pensante) e ao que esse sentir supostamente capta (ou ao dado pensado); em outras palavras, se apegam
aos supostos sentidos e às suas funções. O homem de sabedoria perfeita não deve perturbar as pessoas
de pouco entendimento e compreensão imperfeita. (Nem todos têm o mesmo grau de compreensão ou a
mesma capacidade de assimilação e transformação; por isso, os ensinos espirituais devem ser
administrados e temperados com muito carinho e paciência. e principalmente para cada caso, de forma
individual. .. A ação impessoal ou inegoísta, mais a vivência intuitiva são a base de qualquer progresso ou
simplificação e purificação mental.)...............................................................................................................................78

30 - Oferecendo todos os teus atos e supostos frutos a Mim, e fixando a mente no SER interior, despoja-te
dos anelos que tens pelos resultados e liberta-te de toda noção de "eu" e "meu"; só depois disso, ó Arjuna,
poderás lutar sem a febre mental.................................................................................................................................. 79

31 - Aquele que livre das elucubrações (discurso mental) e cheio de fé ou "sraddha" (atitude mental que se
manifesta como sinceridade, humildade, respeito), constantemente põe em prática estes conselhos, esse
também se liberta das ações contaminadas e seus resultados (ou karma).................................................................82

3.33 - Inclusive o próprio Sábio age de acordo com sua própria natureza; todos os seres seguem sua
natureza. Que pode fazer em contrário o simples controle intencional? (O nosso estar consciente ou o
conhecimento que temos sobre nós mesmos é constituído pelos frutos ou efeitos de nossas ações
passadas e pelo que estamos pensando agora. De forma que o simples controle intencional dos órgãos da
ação - atuo mal; quero atuar bem – não muda a índole mental consciente. Tal controle deve vir acompa-
nhado pela superação dos desejos e pela purificação do conhecimento, agora transformado em
Entendimento dinâmico.)............................................................................................................................................... 83

34 - O apego ou a aversão (pensados) dos sentidos baseiam-se na falsa impressão que tens em relação
aos objetos conhecidos e pensados (sensibilidade deturpada). Que ninguém fique escravo do apego ou
mesmo da aversão. Esses dois, mais a falsa impressão que tens dos objetos pensados, são inimigos
terríveis.......................................................................................................................................................................... 84

35 - É sempre melhor cumprir o próprio dever, ainda que pareça mau, que cumprir bem um dever que não
te corresponde É preferível morrer, cumprindo o próprio dever; o dever que cabe a outros está cheio de
perigos, pois corresponde à natureza deles.................................................................................................................85

Arjuna perguntou:.......................................................................................................................................................... 85

3.36 – Oh, Krishna! (ou Varsneya, descendente dos Vrishni), que poder é esse que impele um homem a
pecar, mesmo contra a sua própria vontade, como se obrigado por uma força?.........................................................85

O Bendito Senhor disse:................................................................................................................................................ 85

3.37 - É o desejo, é a ira, nascidos da qualidade rajásica (ou ativa) da "Prakriti" (mente-matéria ou
psicofisicalidade). O desejo é como uma fome insaciável e a ira que se levanta quando ele se frustra é
Página 96 Senhor da Yoga – Estudo do Bhagavad Gita – Livro I
muito pecaminosa. Neste mundo considera isso como teu pior inimigo. (O desejo e a cólera são
inseparáveis; a cólera se levanta quando um desejo é obstaculizado. . . )..................................................................85

38 - Assim como o fogo pode ficar coberto pelo fumo, o espelho coberto pelo pó, e o feto é coberto pelo
ventre materno, assim este SER, (nas aparências), fica encoberto pelo desejo, pela ignorância e pela ira,
que são Maya (ou ilusão e aparências)......................................................................................................................... 87

39 - Ó Kounteya (filho de Kunti)!, a suprema sabedoria da vivência pura está coberta por esse fogo
insaciável do desejo, esse inimigo constante de todo e qualquer homem...................................................................88

40 - Diz-se que os sentidos (pensantes-pensados), a mente personificada e o intelecto são sua morada.
Manobrando com eles, o desejo alucina o homem e distorce a possibilidade de compreender..................................88

3.41 - Portanto, ó tu, o mais poderoso da raça Bhârata!, graças ao reto entendimento, purifica e controla
primeiro o Sentir em ti; depois, abandona essa ignorância-desejo que destrói e mata a Sabedoria e o
conhecimento do próprio Ser......................................................................................................................................... 89

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