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E COMUNICAÇÃO.
Texto de Sonia Regina Lunardon Vaz*
Sócrates: “Assim, portanto, naquele que não sabe, existem, acerca dessas
coisas que acontece ele não saber, pensamentos verdadeiros sobre as próprias
coisas que não sabe?”
Introdução
Para nós, psicoanalistas, o fato psicológico é tudo aquilo que podemos contar para
resgatar junto ao paciente, suas potências soterradas na inconsciência, na medida em
que é o fato psicológico que nos assegura conhecer a realidade psíquica do indivíduo.
A realidade psíquica de maneira instintual cria uma série de tensões internas para se
expressar.
Este também passa a ser um fato psíquico. Uma realidade psíquica que nos imbui de
curiosidade e muitas vezes nos faz aventurarmos por outras camadas psíquicas.
Tentar perceber o que está mais além só é conseguido por etapas e pela conjunção de
várias linhas de estudo, além de observação, relações e enfim, da soma de experiências.
Conhecer a realidade total é impossível, se não, indesejável. Mas, conhecer a sua
própria realidade psíquica é essencial para ser sujeito e não um mero objeto.
Dentre os sinais da realidade mais abrangente que um sujeito não pode conceber,
existem os sintomas, delírios, os sonhos, o complexo psíquico autônomo inconsciente; o
arquétipo.
O arquétipo não pode tornar-se consciente porque sua essência é psicóide. E somente
com a técnica aplicada da imaginação ativa que, básicamente, utiliza-se de uma cisão
entre o sintoma e o indíviduo é que é possível conhecer o aspécto arquetípico que
influencia o ego e que o faz fazer coisas de que o proprio sujeito julgou ser incapaz.
Desse modo, os instintos participam nas expressões de ações e reações tanto quanto no
modo como formulamos aquilo que imaginamos. Afora que são eles, os instintos, os
responsáveis por nossas sensações e afetos.
Os instintos levam o homo sapiens a repetir certas manifestações que podem ser
observadas através do tempo entre todos os povos.
O princípio de individualidade faz parte da natureza do homo sapiens. Tendo isso como
verdade lhe é instintual buscar a diferenciação. Há um empenho natural em se adquirir
individualidade e para lutar contra a igualdade inicial. Lembremos: no princípio era o
caos.
Não é raro encontrarmos pacientes nitidamente incapazes de discernir aquilo que deseja
do desejo do outro, ou mesmo, distinguir qual é o seu desejo ou ainda, incapaz de
verbalizar a emoção que sente frente a algum acontecimento ou mesmo nesse seu
presente momento. Faça o teste: o que você está sentindo agora¿ E não vale como
resposta algum tipo de justificativa, a resposta a essa pergunta deve ser emocional, ou
seja, dizer qual é a emoção que está sentindo. Se caso não estiver sentindo qualquer tipo
de emoção, melhor consultar o seu pulso para ver se ele ainda pulsa, pois todos nós que
estamos vivos estamos também afetando e sendo afetado por alguma emoção.
Esta dinâmica de energia psíquica que atravessa todo o aparelho psíquico tem seu
agente de veiculação tanto no social, quanto no individual no arquétipo-Anima/ Animus
que significam respectivamente a idéia de mulher na psiqué do homem e a idéia de
homem na psiqué da mulher.
O Processo de Individuação
Estar atento e abrir-se para compreender e acolher tal dinamismo são o que Jung chama
de processo de individuação. Por isso, este processo não pode ser um processo de
individualização, mas de individuação (indivíduo + ação), porque nele está contida
tanto a preocupação com fatos do meio social quanto com os fatos do meio psíquico
para a elaboração da identidade.
São estes “esquemas” a base de formação da imaginação, eles estão para o imaginário
assim como o esqueleto está para o corpo.
Como diz Sartre em seu texto L´Imagination, o esquema surge como aquele que
“presentifica” os gestos e a pulsões inconscientes.
Estes gestos e pulsões em esquemas, em contato com o ambiente natural e social vão
determinar os grandes arquétipos tal qual C.G. Jung definiu em Tipos Psicológicos.
Por assim dizer,os arquétipos constituem as substantificações dos esquemas. Jung busca
esta noção do arquétipo em Jakob Burkharedt e a traduz em imaginário de “origem
primordial”, de “protótipo”.
Para Jung, o arquétipo possui um trajeto antropológico, vendo neles o estádio
preliminar, a zona matricial da idéia e sublinha a importância essencial dos arquétipos
como constituintes do ponto de junção entre o imaginário e os processos racionais.
Essa ligação pode ser percebida em duas possíveis conexões entre as imagens e os
pensamentos: agrupam-se várias imagens em uma idéia, ou, uma imagem suscita várias
idéias. De forma que o conceito acabaria sendo constituído por uma espécie de indução
arquetipal.
“Os arquétipos se ligam a imagens muito diferenciadas pelas culturas e nas quais
vários esquemas vêm se imbricar.” - Gilbert Duran in: As estruturas do imaginário.
A roda, por exemplo, é um arquétipo de esquema cíclico. Por outro lado, a serpente é
apenas um símbolo do ciclo, por que a serpente é polivalente em matéria de simbologia,
enquanto a roda só pode ser associada ao cíclico, não se percebe que outros significados
podem dar à roda, já a serpente tem vários significados.
O arquétipo está mais voltado à idéia enquanto o símbolo traduz mais um substantivo.
O símbolo indica algo desconhecido, um mistério. Veicula um significado vivo e
subjetivo que exerce sobre o indivíduo uma poderosa atração ou fascinação. Age como
um mecanismo de liberação e de transformação de energia psíquica.
Os símbolos penetram no ego que se identifica com eles e com eles trabalha de forma
inconsciente ou passam para o ambiente externo, através de projeções, o que leva o
indivíduo a ficar fascinado e envolvido com o objeto que sustenta a projeção.
Diz Jung que o mais importante é diferenciar o consciente dos conteúdos inconscientes.
É preciso, isolar os conteúdos inconscientes e para tal, Jung criou a técnica da
“Imaginação Ativa”. Através dela personifica-se o conteúdo que chega à consciência
através de sonho, fantasia ou projeção, estabelecendo depois, junto com a consciência,
um contato com estes personagens internos.
Deste modo se despotencializa o conteúdo psíquico para que não mais exerça seu poder
sobre a consciência.
Como os conteúdos psíquicos possuem certa autonomia pode-se dizer que com a
personificação destes conteúdos estamos em uma inter-relação com o inconsciente
mediante cisão ego/conteúdo.
Vimos que existe um instinto de individualidade que busca se diferenciar do caos, que
busca ser diferente das massas. Porém, em compensação, existe os instintos gregários,
que busca estar junto à coletividade.
A psicologia social não pode prescindir da tendência à imitação. Sem ela seriam
impossíveis as organizações de massa, onde a base da ordem social não é a lei, e sim a
imitação, conceito este que abarca sugestionalidade e contágio mental. Advém daí a
rigidez individual em determinada “pose”, características, atividades e desejos.
É neste processo que se revelam forças instintuais que foram reprimidas e soterradas no
inconsciente, daí que a análise deverá decorrer da compreensão destes conteúdos como
categoria de força e não apreciados ou depreciados como categoria moral.
Toda verdade é sinuosa à medida que se leva em conta à subjetividade daquele que se
diz possuí-la.
“Só pela imaginação vislumbro as coisas que podem vir a tornar-se realidade, e
isso é o suficiente para levantar um pouco o terrível interdito. O suficiente para
que eu me abandone a ela sem receio de enganar-me”. André Breton, Manifeste du
Surréalisme
Conclusão
A psique inconsciente cria imagens que possibilita à consciência uma dada identificação
com a sua situação, e a partir daí ocorre todo um processo intelectivo onde respostas são
encontradas. No entanto, a imagem está impregnada de idéias e sentimentos, menos de
qualquer reflexão racionalista, por isso, Jung sugere serem tais imagens mais
aproximadas de visões artísticas que respondem ao mais profundo da natureza do
indivíduo ou coletividade.
É natural que o problema subjacente apresentado na imagem, seja esta arquetípica ou
não, tenha suas raízes tanto nos processos instintivos quanto nas aspirações mais
idealistas, porque naturalmente, o indivíduo ou a coletividade tem se ocupado
apaixonadamente daquela questão.
O inconsciente reage aos conteúdos conscientes e apesar de sua reação ser rica em
significado, não é ele que possui a iniciativa e nem dá continuidade ao processo. Cabe
ao ego, a consciência, utilizar a energia dos conteúdos inconscientes para instalar
racionalmente e conduzir todo o processo de individuação.