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“ENSAIO SOBRE A PSICOLOGIA


DA INFANTARIA”

TENENTE CORONEL
BOUCHACOURT

REIMPRESSÃO DA OBRA PELO CURSO DE INFANTARIA DA


AMAM EM PARCERIA COM O CLUBE MILITAR

TRÊS CORAÇÕES
2014
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PREFÁCIO

Quando eu ainda era um jovem capitão, li, pela primeira vez, a obra do tenente-
coronel Bouchacourt, denominada ENSAIO SOBRE A PSICOLOGIA DA
INFANTARIA. Era ele um oficial francês que comandou um regimento da infantaria na
2ª Guerra Mundial. Identificamos, imediatamente, em seu livro diversos pontos comuns
e úteis que deveríamos aprender e aplicar em nossa própria infantaria.
O conhecimento que Bouchacourt nos traz é extremamente útil para o
desenvolvimento da capacidade de liderança do jovem oficial, fazendo-o prestar atenção
a aspectos fundamentais do comando, da liderança e da convivência com pessoas em
grupos hierarquizados, onde é preciso fazer o subordinando obedecer ao comandante,
sem que seja preciso empregar medidas coercitivas a todo momento.
A historia militar mostra, e o livro em pauta reafirma mais uma vez, que a
liderança militar, através dos tempos, sempre foi o alicerce das tropas coesas, motivadas
e aguerridas. Com tudo, indica, também, as dificuldades encontradas pelos comandantes
na condução de seus soldados em combate.
Neste ponto, cabe uma pergunta instigante:
- É fácil comandar grupos humanos em uma instituição fortemente hierarquizada?
Há os que acreditam que sim e sempre apontam como exemplo as forças
armadas, organizadas dentro de padrões impostos pela hierarquia e pela disciplina, de
acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nas quais todas as ordens emitidas pelas
autoridades legais seriam cumpridas sem relutância, inclusive tornando a liderança coisa
supérflua.
Assim sendo, em um exercito, instituição com hierarquia estabelecida em vários
níveis, as ordens emitidas pelos comandos superiores seriam automaticamente
obedecidas, devido à disciplina ensinada e exigida de todos os seus integrantes. Mas a
historia militar é rica em exemplos que demonstram claramente que esta obediência
poderá não ocorrer automaticamente.
Nas situações de normalidade, quando o grupo militar e as pessoas que o
integram não estão sob pressão, geralmente as ordens dos comandantes são cumpridas.
Entretanto, nas crises e principalmente no combate, quando está presente o risco de vida
e o soldados sofrem penúrias de todo tipo, os indivíduos só obedeceram
voluntariamente às ordens se confiarem em seus comandantes.
Por tanto, quando a hierarquia e a disciplina estão inseridas em um quadro onde
os comandantes estabeleceram sólidos laços de liderança com os Subordinados, mesmo
havendo pressões, riscos e extremas dificuldades, raramente ocorreram casos de
desobediência.
Em uma pesquisa realizada em 1944 com tropas de infantaria no teatro de
operações do mediterrâneo, pediu-se aos entrevistados que apontassem as principais
características do melhor combatente que conhecem pessoalmente. As respostas foram
separadas por grupos hierárquicos: convocados (cabos e soldados), sargentos e oficiais.
Quando os entrevistados responderam que o melhor militar que conheciam era um
oficial, a liderança que exerciam foi citada um numero de vezes que chegou quase ao
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dobro das características coragem e agressividade. Esse exemplo mostra com clareza
que os soldados esperam que seus oficiais e sargentos os liderem efetivamente.
Por isso, muitos exércitos passaram a desenvolver projetos voltados para a
formação de lideres e inseriram esta preocupação no fatores básicos do preparo, que são
as providencias fundamentais que devem ser tomadas para que um exercito se torne
instrumento eficaz de combate. São elas:
1) Dotar a instituição de organização e estrutura adequadas.
2) Buscar permanente modernização da doutrina
3) Buscar permanente modernização do material de emprego militar
4) Formar pessoal de alta capacitação
5) Formar quadros com elevada capacidade de liderança
6) Realizar o treinamento adequado com as organizações militares
operacionais
Por tanto, a iniciativa do Curso de Infantaria do Corpo de Cadetes da Academia
Militar das Agulhas Negras, que providenciou a edição deste ENSAIO DA
PSICOLOGIA DA INFANTARIA, fica completamente justificada. A leitura deste livro
elevara a capacidade de liderança dos jovens aspirantes e contribuirá para o
aprimoramento de nossa infantaria.

BRASIL ACIMA DE TUDO

Mario Hecksheh Neto – Cel Inf e Estado-Maior (Reserva)


Chefe da Seção de Doutrina e Liderança do Corpo de Cadetes.
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ENSAIO SÔBRE A
PSICOLOGIA DA INFANTARIA
5

MINISTERIO DA GUERRA
BIBLIOTECA DO EXERCITO

REORGANIZADOR:
General V. Benício da Silva

COMISSÃO DIRETORA DE PUBLICAÇÃO

Coronel Pedro da Costa Leite (Diretor)


Ten-cel. Salm de Miranda
Ten-cel. Jaime Ribeiro da Graça
Major I. E. Deoclécio De Paranhos Antunes
Cap. Carlos de Meira Matos
Dr. Luiz Edmundo
Dar. Carlos Maul
Dr. Joaquin Tomaz de Paiva

ADMINISTRAÇÃO:
Cap. José Ribamar Leão e Silva (Secret. e Fiscal Adm)
Cap. I. E. Lourival Açuçena de Araújo (TES)

- SEDE –
EDIFICIO DO MINISTÉRIO DA GUERRA

Terceiro pavimento
Praça da Republica
RIO DE JANEIRO
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BIBLIOTECA DO EXERCITO
VOLUME 157

ENSAIO SÔBRE A
PSICOLOGIA DA INFANTARIA

(Obra premiada pela Academia Francesa)

TENENTE CORONEL BOUCHACOURT

TRADUÇÃO DO
MAJOR IRACILIO IVO DE FIGUEIREDO PESSOA
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A presente tradução foi feita do francês “ESSAI SUR LA PSYCHOLOGIE DE


L’INFANTARIE”, publicado em 1933 pelos editores: CHARLESLAVAUZELE & CIE,
124, Boulevard Saint-Germain.
PARIS
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NOTICIA SOBRE O AUTOR


Nascido em 1884, o general Bouchacourt, que concluiu em 1906 o curso da
famosa Escola Militar de Saint-Cyr, fez a maior parte da sua carreira militar no
comando da Infantaria. Profundo conhecedor de sua Arma, exerceu o comando do 22º
Batalhão de Caçadores Alpinos durante cinco anos e foi, durante dois anos e meios,
Comandante do 131º Regimento de Infantaria.
Além de suas atividades de comandante de tropa foi, durante vários anos,
professor de Tática de Infantaria no Centro de Estudos de Infantaria, em Versailles; foi
Chefe da 3ª Seção do Estado Maior da 3ª Divisão de Marcha sobre o Marrocos, em
seguida integrou o Estado Maior do Comando Supremo das Tropas de Marrocos, em
Rabat, Durante as operações contra Abd-el-Krim e, finalmente, Chefe do Estado Maior
da Região de Fez.
Antes da guerra de 1914-1918, fez a campanha de Marrocos, em 1913, como
tenente do 2º Regimento da Legião Estrangeira. Regressando à França no inicio da 1ª
Guerra Mundial participou, como capitão do 3º Regimento Misto Zuavos-Atiradores,
das operações na Bélgica e no norte da França. Restabelecido de ferimentos que sofrera,
foi incluído no 94º Regimento de Infantaria e promovido a major, sendo, então, um dos
mais jovens desse posto no Exército Francês. Como Comandante de Batalhão participou
das principais batalhas da guerra de 1914-1918, particularmente em Verdun e nas
grandes ofensivas finais. Três vezes ferido, foi feito Cavaleiro da Legião de Honra no
campo de batalha de Saillisel, no Somme e condecorado com a Cruz de Guerra, com 7
citações, das quais 4 em Ordem do Dia do Exército.
Durante a guerra de 1939-1940, o general Bouchacourt comandou a Infantaria da
42º Divisão, que operava em Metz. Depois de ter comandado os destacamentos
avançados na frente da Linha Maginot, tomou parte na Batalha da França, sobre o
Aisne, de 9 a 13 de junho de 1940, na região de Reims. Após 5 dias e 5 noites de
ininterrupta batalha encarniçada, a 42ª Divisão foi vencida e completamente desbaratada
e o general Bouchacourt foi aprisionado com os últimos sobreviventes de sua tropa.
Cumpriu seu cativeiro na Alemanha, no campo de Lubeck, sendo o mais graduado desse
campo, de 28 de outubro de 1942 a 2 de maio de 1945. Durante esta campanha o
general Bouchacourt foi citado em Ordem do Dia do Exército, ascendeu ao grau de
Comendador da Legião de Honra e finalmente, por excepcionais serviços de guerra, foi
elevado à dignidade de Grande Oficial da Legião de Honra.
Ao general Bouchacourt devem-se os ensinamentos que reuniu em duas obras
notáveis. A primeira ele a escreveu quando major e tem por titulo: “A infantaria na
batalha”. A segunda, que ora apresentamos em português, graças a gentileza do autor e
da Editora Charles-Lavauzelle & Cie, que dispensaram qualquer vantagem por direitos
autorais, escreveu-a quando tenente-coronel e mereceu as honras de um premio da
Acamedia Francesa.
Pareceu-nos que ao agradecer ao autor os ensinamentos que nos proporciona
nenhuma homenagem seria mais significativa do que abrir este trabalho com uma
noticia sobre o glorioso soldado que o escreveu
O TRADUTOR
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INTRODUÇÃO
Quando um chefe reuniu os meios necessários ao desenvolvimento de uma
operação de guerra, isto é, os efeitos e o material , já fez muito para que ela tenha êxito.
Quando, em seguida, tomou decisões judiciosas e deu ordens conformes com os
princípios de arte militar e, sobretudo, deu-lhes a marca pessoal e nova que é própria do
gênio ou apenas do talento, fêz - ou quase fez –tudo o que lhe era possível.
Mas se a Infantaria- se não a rainha das batalhas, pelo menos a principal obreira
- não se empenha com iodo coação e todo heroísmo no ataque; senão se mantém com a
energia feroz e admirável espírito de sacrifício na defesa, é preciso renunciar à vitória e
isso quer dizer derrota e talvez desgraça.
É mister que o chefe saiba empregar sua Infantaria e saiba fazê-la lutar .Para isso
é-lhe indispensável conhecer a psicologia da infantaria e ser capaz de explorar-lhe os
princípios .Poderá ,então ,comandar vitoriosamente.
A destruição material, que alias seria impossível de realizar até o aniquilamento
total, é apenas um meio para vencer o inimigo. O que se precisa realizar é a
desorganização. É essencialmente a vontade do adversário que se deve procurar abater.
E ainda ai é uma questão de psicologia e de psicologia da Infantaria¹. Porque,
quando a Infantaria traz a única verdadeira guardiã do terreno – tiver suas linhas
atravessadas , as portas do inimigo estarão arrombadas bem depressa os canhões
inimigos , incapazes de se defender sozinhos ,serão apresados e se tornaram troféus e o
mesmo acontecerá com os campos de aterragem e as esquadrilhas de aviões ,com as
cidades ,os estados maiores e os próprios chefes .Arrancadas as armaduras depois de
arrombadas as portas ,estará completado o aniquilamento.
Eis duplamente exposto porque é preciso ensaiar a compreensão da psicologia da
Infantaria, uma das bases dos conhecimentos militares muito pouco estudada
metodicamente.

____________________________
¹ - Não se deve tomar em pouca nem em demasiada conta o material Certamente este, considerado
como meio de transporte da Infantaria, como auxiliar e mais uma parcela considerável de poder para
essa Arma, será mais e mais necessário, com a condição de não se lhe exagerar a dosagem, pois
consome muito dinheiro e grandes efetivos imobilizados a seu serviço fora do campo de batalha. Mas
imaginar-seque ele substituíra a Infantaria, que com alguns milhares de carros rápidos, algumas
centenas ou milhares de aviões transportando toneladas de explosivos, até mesmo (e com que
dificuldades, longe ainda de serem resolvidos!) uma divisão inteira com seus capitães... imaginar-se que
se poderá obter assim a decisão, é iludir-se, é não tomar na sua verdadeira extensão o imenso que é
uma guerra nacional. U´a nação que conheça a doutrina e os meios de guerra de massas humanas, não
se deixará deprimir por um “raid” feliá sobre a sua capital ou sobre pontos sensíveis de seu território;
por uma ação de surpresa sobre as retaguardas, que será forçosamente limitada. Se seus exércitos são
bem comandados, sua massa de Infantaria vencerá com certeza. A vitória, lenta talvez mais inevitável,
chegará com a penetração da Infantaria em uma invasão completa. E se o inimigo teve a covardia de
atacar a população civil, é a ameaça de represálias terríveis. Pode-se dizer que a guerra, a grande guerra,
tem sido e continua à base de Infantaria.
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PRIMEIRA PARTE

A TROPA

PISCOLOGIA DA TROPA
PISCOLGIA DO CAMPO
DE BATALHA
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CAPITULO 1

Característicos da psicologia da Infantaria - Nem a psicologia individual nem a


psicologia individual das massas – A Infantaria é massa particular por sua composição,
sua organização, pelos sofrimentos e perigos obrigatórios a que se destina,por sua
finalidade de destruição metódica e por seu armamento – traços característicos que
descorem dessas particularidades.

Não se poderia tratar dos estudos de uma psicologia coletiva sem pensar nos
notáveis trabalhos de Gustavo Le Bom. Não se pode falar da alma da Infantaria sem
recorrer a Ardant du Picq e ao general de Mand’huy².
Por isso, se é preciso estudar o homem para compreender o infante, - (o homem
é o primeiro instrumento, do combate), din Ardant du Picq, “estudemos, então, o
homem no combate, porque ele é a força que o realiza”,-Este estudo não basta para
conhecer a Infantaria .
A Infantaria é a massa psicológica, no sentido muito geral adotado por G. Le
Bon. Deve se admitir, também para ela, a verdade do principio fundamental
estabelecido por Le Bon, não poderiam aplicar, sem grandes modificações, a psicologia
da infantaria.
Muitos desses princípios mantêm-se verdadeiros, no caso particular. É inútil
repetir aqui e seria desnecessário fazer nova demonstração depois da que tão
magistralmente foi feita na obra citada. Vamos, pois, apenas determinar os
característicos especiais e principais dessa massa particular que é a tropa de Infantaria.
Pode-se admitir que difere essencialmente das outras massas por:
-Sua composição
-Sua organização
-perigos e sofrimentos a que obrigatoriamente se destina
-sua finalidade de destruição metódica e seu armamento permanentemente
aperfeiçoado
Vejamos o que existe de característico em sua composição.
Mesmo na Infantaria francesa, que queremos estudar mais especificamente, não e[é
sempre idêntica .Há, com efeito, regimentos de raças muito diferentes :franceses
,nativos de todos s países ,estrangeiros europeus .Não nos deteremos, de momento,
nessas diferenças de raça. Sua importância, é frequentemente grande em psicologia
coletiva, mas é aqui atenuada pela semelhança de organização ,de finalidade de
comando por chefes franceses. Menos ainda no deteremos diante das diferenças
individuais de inteligência, religião, opinião, idade, etc. São diferenças comuns na
composição de todas as massas. Mas deve-se reter, como particularidade essencial da
massa “tropa de Infantaria”, que ela não compreende se não homens cheios de vida,
com exclusão de mulheres, e que sua composição tem um caráter privilegiado de
estabilidade e permanecia.
A primeira particularidade (homens cheios de vida e ausência de mulheres) tem

² - A psicologia das multidões, por G. Le Bom – Etudes sur Le combat, pelo coronel Ardant Du Picq –
Infanterie, pelo coronel de Mand´huy.
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como consequência diminuir consideravelmente o impulso, a mobilidade e a


irritabilidade, características fundamentais das outras massas. A emotividade, a
sensibilidade, digamos os sentimentos falsos ou exagerados comuns nos agrupamentos
populares habituais estão, aqui mais ou menos suprimidos.
A fixidez da composição, isto é, o fato de que um regimento permanece durante
meses composto exatamente dos mesmos homens, ao passo que nas massas ordinárias
muitos indivíduos mudam em cada reunião, tem consequências ainda maiores.com
efeito, tal massa permanente tem um passado e um futuro comuns; seus elementos se
conhecem e sua sorte é, por muito tempo, a mesma. Dai uma personalidade coletiva
mais acentuada e mais estável e para seus membros, um forte sentimento de
solidariedade. Cada um sabe que não poderia subtrair-se a coletividade, mesmo se
deixa-se de desejar fazer parte dela. Resulta daí, também, que o comandante dessa
massa livra-se de um dos principais cuidados dos dirigentes que é o de procurar
convencer, sem cessar, aqueles que queiram guiar e utilizar como força coletiva, da
necessidade de permanecerem unidos e de se manterem acordes uns com os outros.
A estabilidade da formação permite o nascer e o desenvolvimento do orgulho
coletivo. Se não fosse preciso, em psicologia, evitar-se rigorosamente os números,
poder-se-ia dizer que uma tropa de Infantaria suscetível de ver o seu valor aumentar em
progressão geométrica por efeito de elogios coletivos. Quando uma unidade se torna ou
crê que se tornou uma tropa de elite, é capaz de esforços mais duros, de um rendimento
muito maior. E o leve desprezo que gosta de demonstrar para com os vizinhos menos
felizes, lisonjeia o traço de caráter mais comum e mais útil de toda tropa como de todo
homem: o amor-próprio. É preciso, vê-lo-emos mais tarde, explorar esta qualidade –
sim, qualidade – que vale mais que o interesse, o apetite do ganho, do dinheiro, que é o
principal aguilhão de tantos outros tipos de humanos.
A tropa de Infantaria é massa organizada. Ai esta uma particularidade de tal
maneira importante que, de bom grado, algumas pessoas concluiriam que, ela deixa, por
isso mesmo, de ser uma massa. Seria exata essa conclusão, se reservasse o nome de
massa às simples multidões, mas a designação de massa psicológica é mais geral.
Aplica-se também as tribos, aos partidos políticos, as aglomerações religiosas que tem,
todos, pelo menos um embrião de organização que procuram sempre ampliar. Trata-se,
com relação a tropa militar, de uma organização muito mais detalhada, mais completa e
mais forte. É uma coletividade que, como já se viu, não foi reunida acidentalmente, nem
momentaneamente. Seus membros recebem instrução e treinamento individuais, que
modificam certos caracteres iniciais.
Ela se fraciona em unidades que tem composição fixa. Cama duma tem sua
parte, conhece o vizinho, é conhecido por ele e dos chefes. Desta forma, para os
membros dessa coletividade, desaparece o anonimato e ressurge o sentimento de
responsabilidade individual, o que é excelente.
Há quadros permanentes que instruem, dirigem e atendem estas unidades. São
constituídos escalões sucessivos de comando, permitindo uma harmoniosa e equilibrada
repartição das tarefas, tornando possível exigir e obter uma execução minuciosa e exala.
O estabelecimento de uma hierarquia, de regulamentos, de sanções, torna a tropa
de Infantaria dependente de ordens firmes, das quais não escapa. Como se está distante
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daquela massa a qual é indispensável e difícil convencer mesmo das ideias mais simples
e da qual apenas esperamos, como reação, atos imediatos e imperfeitos.
Finalmente, a frente a cada tropa de Infantaria, encontra-se um chefe que ela não
escolheu nem elegeu e do qual depende completamente, dentro dos limites dos
regulamentos e das ordens que o próprio chefe recebe, mas com limitações que lhe
deixam um poder considerável.
Não escolheu e é forçada a obedecer-lhe. Nisso não há duvida. Mas ela o segue
bem ou mal, obedece-lhe com maior ou menos entusiasmo, executa-lhe as ordens com
maior ou menos devotamento e abnegação, de acordo com o que pensa dele. Ela se
interessa, pode-se dizer, de forma vital, por seu valor intelectual e por suas qualidades
de chefe. Estuda-o apaixonadamente e, como o vê sob todos os aspectos, de perto e de
baixo – observatório – que, no caso particular, é o melhor, - conhece-o geralmente bem
e sua apreciação – não as apreciações individuais, que dependem frequentemente de
interesses particulares, mas a apreciação coletiva – geralmente não é justa.
Quer encontrar naquele que a comanda, condições de superioridade. E tem
razão. Não será com seus galões que ele a comandara, mas com o cérebro e suas
qualidades físicas e morais. Deseja, tal como aconteceu a Joana D’Arc reconhecendo
Calos VII em maio a seus cortesãos vestidos como ele, reconhecer seu comandante sem
precisar olhar-lhe os galões. Felizmente é frequente acontecer isso. Sob este ponto de
vista a tropa de Infantaria é, talvez, mais exigente que certas tropas técnicas, as quais
admitem que uma grande especialização teórica, exigindo longa permanência em
gabinetes de estudo, prejudique a aparência física sem quebra do prestigio. Quer
encontrar em seu comandante um físico marcial. Ri-se da beleza, naturalmente, e até de
certa compleição física, mas gosta de ter a sua frente um homem de aparência enérgica e
máscula, bem conformado e que, afina, seja capaz de fazer aquilo que ordena que se
faça. Não se pense que ela desdenha a distinção e as boas maneiras. Detesta a pose mas
também o vulgar e nunca confunde com simplicidade. Não deseja que ele, mesmo
moralmente, se lhe nivele. Um chefe, um comandante, não é igual.
É também perfeitamente capaz, sobretudo coletivamente, de perceber a
superioridade intelectual e de reconhecer o espírito de justiça e a bondade.
Se estima a bondade, se pensa poder exigi-la, tem horror a fraqueza. Esta é, para
quem comanda, uma baixeza e um erro. Aquele que é fraco com seus subordinados não
sabe defende-los nem contra o inimigo, nem contra a indisciplina e a desordem, nem, eu
ia dizer contra os chefes superiores, mas quero dizer apenas contra as decisões mal
esclarecidas de alguns chefes. E se o militar se alegra, a principio, por poder fazer tudo
que quer, depressa se apercebe que essa liberdade cria desordem e desorganização, traz-
lhe muito mais aborrecimentos que a observância das regras estabelecidas, causa-lhe
perigos e perdas na guerra, porque o comandante que não é enérgico, merece e encontra
a derrota.
Dessa forma, quando uma tropa de Infantaria julga um chefe digno de comanda-
la, quando ele procura compreende-la e resolver-lhe as necessidades legitimas, ela se
interessar-se e dedicar-se. Não creio que se possa, nas outras atividades (de operários,
de crianças, mesmo infelizes asilados, etc.) encontrar mais fácil e mais frequentemente a
suprema recompensa de quem tem alma bem formada e comanda estimando os que lhe
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estão sob suas ordens: - a estima dos subordinados. Quem, tendo feito a guerra da
Infantaria, não guarda recordações tocantes, capazes de provocar lagrimas? Quantos
soldados deram a seus estimados chefes, provas de dedicação, pode-se dizer, trágicas!
Quantos deram a vida para recolher seu oficial morto ou ferido! Quantos até arriscaram
a vida para dar-lhe um prazer! Pode-se citar muitos legionários – e entre eles legionários
alemães, ordenanças de oficiais franceses – que saíram de seus acampamentos, em
Marrocos, expondo-se a serem presos ou mortos, para recolher num cantil, gota a gota,
de uma fonte longínqua, água mias pura e mais fresca para seu oficial, a fim de que este
pudesse dispor de água melhor do que a que estava a disposição de todos mais era pior
na qualidade como no gosto. Quantos - isso é tão belo e de tal forma generoso que em
caso semelhante à oferta é, geralmente, recusada – quiseram, durante marchas
extremamente penosas através dos desertos pedregosos – os hamadas, como se diz ali, -
dar a seu tenente a ultima porção de dágua, deixar para ele sozinho a sombra da única
arvore encontrada por milagre durante uma etapa de quarenta quilômetros, sob um sol
de chumbo, quase um sol de morte!
Isto nos leva a tratar da terceira particularidade essencial da tropa de Infantaria: -
seu único aspecto de miserai. Ela se destina, obrigatoriamente, a sofrimentos e perigos
excepcionais.
O general – então coronel – de Mand’huy intitulou as duas principais partes de
sua obra:¹ “A infantaria em luta com a fadiga” e “A Infantaria em luta com o medo”.
Teve muita razão ressaltando, na segunda, os perigos especiais a que se expõe esta
Arma, si bem que – não tendo naquela época participado da Grande Guerra – não
tivesse percebido o caráter de grande tragédia existente nas tarefas que cabem ao
infante, o qual tem por zona de ação na batalha, poder-se-ia dizer, o próprio reino do
terror. Seus camaradas caem-lhe em torno de milhares. É necessário que ele viva - e
frequentemente por não muito tempo -, é necessário que ele viva no meio da trajetórias
das metralhadoras, das explosões dos obuses, dos gases. E, ainda que o público se
atemorize mais com a lembrança dos gases o infante, que sabe que é possível garantir-se
com as mascaras, e que não tem que escolher senão entre as gradações do pior, prefere-
os aos obuses enormes que podem despedaça-lo e, sobretudo, as metralhadoras que não
perdoam nunca! E não é impressionante e reveladora esta ordem de preferência? E
depois de tudo é preciso afrontar de perto, quando vitoriosamente atacado, a destruição
certa pelas armas do combate aproximado: a granada de mão e a baioneta. Sem querer
diminuir os perigos a que se expõem as outras Armas (notadamente a aviação), não se
pode deixar de reconhecer que neste assunto o quinhão da Infantaria é singular. A
percentagem de perdas é terrivelmente eloquente e da à Infantaria, por enorme diferença
o pouco invejável primeiro lugar.
Perigos excepcionais, portanto, tal é o quinhão obrigatório da Infantaria. São-
lhes reservados, também – e por vezes sem que o comando nada possa fazer - os
maiores sofrimentos. O coronel de Mand’huy, em seu livro, quase não se refere, além
dos perigos, senão as fadigas. Cita a marcha como a principal prova da Infantaria,
acrescentando que “fora a marcha, as fadigas da Infantaria são mais ou menos as

¹ - Infantaria, pelo coronel de Mand´huy.


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mesmas que as das outras tropas”. Sob o ponto de vista de fadiga, podemos admiti-lo.
Mas, infelizmente, as marchas e as fadigas são apenas uma pequena parte dos múltiplos
sofrimentos que torturam a Infantaria. A guerra bem o provou. E não é que se reservar
para esta Arma, sistematicamente, tão triste privilegio. Mas isso faz parte de suas
atribuições especificas. Isolados ou quase isolados (quando outros, como os artilheiros
de acompanhamento¹, ficam próximos deles, partilham a sorte, méritos e psicologia) os
infantes ocupam a zona mais batida pelos projeteis, zona onde não só tudo é mais
perigoso, mas onde tudo é menos confortável, mais difícil e onde, mesmo as coisas mais
necessárias são momentaneamente de todo irrealizáveis. Os reaprovisionamentos são
por vezes impossíveis, mesmo a noite: - é a fome e a sede. As comunicações são
penosas e difíceis e muitas vezes suprimidas: - e é o agravar de sofrimentos para os
feridos, algumas vezes até a morte daqueles que se salvariam se fossem socorridos. Não
se pode, tão junto do inimigo e em região em que todos lutam encarniçadamente,
construir abrigos aceitáveis, nem rapara-los: - é a vida de muitos dias em desvãos e em
buracos que não seriam utilizados nem por animais selvagens, é a impossibilidade, por
longas semanas, de tomar um banho, d trocar de roupa ou de calçado; a obrigação de
permanecer molhado, ou sobre lama, ou sobre neve, o risco de ser tragado por estas,
morte horrível que deixa bem longe a queda mortal do aviador ou seu desaparecimento
em pleno céu.
Aqueles que não passaram por isso e assim não conseguem apreender bem
quanto há de espantoso nessa sorte e aos quais ela parece impossível de ser suportada a
sangue frio, por certo não negam a essa pobre massa que é a tropa de Infantaria, a
particularidade capital a que nos vimos referido: - é destinada a sofrimentos e perigos
excepcionais e obrigatórios.
Dai resulta que, se tem de aceitar de qualquer maneira os perigos e os
sofrimentos característicos da Arma, não se quer outros e se tem o direito de exigir que
aqueles não apareçam senão na ocasião necessária. Dessas considerações conclui-se que
um dos primeiros traços característicos da infantaria, aquele que talvez sobreleve todos
os demais e que de maneira alguma será impunemente ignorado, é a necessidade da
justiça. Podemos proibir-lhe quase tudo, impor-lhe quase tudo, reprimir-lhe quase tudo,
se proibimos, se exigimos e punimos igualmente e a todos, sem exceções injustificadas.
Ao contrário, sobrecarreguem-se alguns, favoreçam-se outros, por pequenas que sejam
as diferenças, por pouco importantes que sejam na aparência e ver-se-á, em pouco
tempo, nascer o descontentamento e a indisciplina surgir. Não é razoável que se tenha
que exigir justiça quando a injustiça, aqui ainda mais que alhures, pode ter tanjas e tão
graves consequências.
Se cada tropa de Infantaria deve suportar os sofrimentos que lhe cabem, deseja,
legitimamente aliás, e como todas as outras, que tudo se faça para diminuí-los.
Destinada às maiores provações, necessita do máximo cuidado de quem a comanda.
Dispendendo grandes, energias físicas, precisa alimentar-se bem. Frequentemente, após
exercícios violentos, o infante volta exaurido; é-lhe necessário um repouso completo,

¹ - Observadores avançados (NT)


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até mesmo de algumas horas além do repouso normal da noite sempre que
possível. Gosta que seus chefes façam tudo que as circunstâncias permitam para
melhorar seus alojamentos habituais. Aquele que não sabe ocupar-se dos alojamentos e
da alimentação de seus homens, que não procura apaixonadamente, com os magros
recursos de que possa dispor e malgrado as dificuldades inevitáveis do
aprovisionamento em campanha, dar-lhe a mais abundante e a melhor alimentação
possível, não é digno de comandar a Infantaria.
Com boa alimentação, repouso, “sossego” – que tantos chefes não sabem dar – e
licenças (esta grande alavanca, ouso chamar, ou simplesmente este incomparável meio
de conseguir o que se deseja e de recompensar), tem o chefe quase esgotado tudo o que
pode fazer para alegrar seus homens. Realmente. O soldado ignora, quase sempre, o
prazer da leitura. Não se lhe pode dar a família. Não é de gostos delicados e muito
poucos apreciariam a arte e o luxo de bem estar que se lhes desse. E de qualquer modo,
quantos apreciariam isso? Que edição rara de Montaigne valeria, para esse infante
fatigado e sedento, um copo de bom vinho tinto? Não se tem nem que julgar, nem que
criticar, - e seguramente não se tem que satisfazer a todos os gostos – é necessário,
simplesmente, achar e dar o que for possível e o que alegre àqueles a quem se quiser
satisfazer.
A Infantaria sabe muito bem que se pode exigir muito dela. É preciso obter um
resultado antecipadamente, estabelecido, cumprir u’a missão. Sabe disso. Isso pode ser
caro. Ela pagará. Mas não quer pagar exageradamente. E quem obtiver o êxito pelo
menor preço, quem cumprir inteira e vitoriosamente sua missão, exigindo um esforço
mínimo, não expondo e não perdendo senão o menor número de homens, será mais bem
seguido, mais estimado e poderá mesmo pedir muito mais no dia em que for preciso, do
que aquele que, vendo apenas o fim, não leva em conta os riscos, não evita as fadigas
inúteis, não procura e não sabe descobrir tudo que, sem prejudicar os resultados, pode
ser poupado àqueles a quem se chama de um modo um pouco impróprio “os
executantes”.
Este termo é impróprio porque toma facilmente um sentido pejorativo,
contrastando a concepção e a execução¹, a primeira implicando a inteligência, a segunda
só exigindo qualidades secundárias, aplicações quase mecânica do material.
E isto nos anima a destacar, ainda, uma outra diferença fundamental entre a
psicologia da Infantaria e a psicologia das massas em geral.
Estas segundo Le Bom, são absolutamente insensíveis a razão: “Na enumeração
dos fatores capazes de impressionar a alma das massas, -escreve, - poder-se-ia dispensar
inteiramente de mencionar a razão ,se não fora necessário apontar o valor negativo da
influência”. A afirmação, a repetição, constituem, - repete constantemente, - os únicos
processos a empregar para convencer as massas. Chega a escrever: “O guia pode ser
algumas vezes inteligente, mas isso é geralmente mais prejudicial do que útil”.

¹ - Sabe se o que teria de complexa uma comparação, mesmo sob o ponto de vista dos dores
espírito. Separar, sobretudo opor, aqueles que colaboraram seria falso e odioso. Quando se deixa de ser
executante? O general em chefe não é, acaso, o primeiro executante, pois que deve realizar diretivas
precisas do poder central?
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Sem discutir o que possa haver de exagerado nessa teoria quando se trata das
massas em geral, é possível afirmar que a tropa de Infantaria tem necessidade,
frequentemente, de que lhe explique de modo rápido o porque de um esforço a ser
exigido. A afirmação não basta àqueles que tem constantes provas de enganos. E não
fiará impune o chefe que disser a uma tropa aguerrida que os obuses não rebentam e as
metralhadoras não matam, mesmo que o afirme peremptória e frequentemente. Ao
contrario, há de explicar-lhe com clareza como, empregando certos processos, se
diminuirá a eficiência da artilharia inimiga, utilizando, por exemplo, certos
caminhamentos, progredindo em certos momentos favoráveis, explorando a contra
bateria; como, pelas disposições tomadas, evitar-se-á cair sob o fogo das metralhadoras.
E é certo que a Infantaria será melhor empregada quando tiver compreendido que
encontrará, em seu deslocamento e na execução das ordens recebidas uma diminuição
dos riscos com maiores possibilidades de sucesso.
Pode-se acrescentar – o que é mais importante – que a coletividade constituída
pela tropa de Infantaria compreende, muitas vezes, melhor e mais depressa do que faria
individualmente a maior parte dos elementos que a compõe. Assustamo-nos, as vezes,
com o tempo exigido para explicar uma coisa muito simples a um soldado – ainda mais
simples. Entretanto é comum que o mesmo homem integrando a tropa que nos recebe na
posição de sentido e a qual dirigimos poucas e simples palavras, faça depressa, também
ele, sinais de cabeça e de olhos que não enganam e provam que compreendeu. Haverá
uma transmissão de inteligência, semelhante a transmissão de sentimentos que se
verifica nas massas, segundo Le Bon? É possível que sim. É possível também, que a
transmissão de sentimentos determine a inteligência, com o instinto e a sugestão
precedem, por vezes, o raciocínio. Em todo caso, se o que se diz não é apresentado
logicamente, por faltaram provas (isto às vezes acontece e a gente o sente bem), “não
pega”, como eles dizem, não se obtém a adesão indispensável.
Seria necessário descermos a exposições complicadas, lentamente deduzidas?
Evidentemente não. Mas, imaginar-se que basta afirmar ou repetir algo a uma tropa de
Infantaria para convencê-la e conduzi-la, é comprometer sua autoridade moral. Aqueles
a quem é preciso fazer aceitar fadigas, sofrimentos e perigos, sem proveito pessoal, são
mais difíceis de convencer e menos dispostos a se contentar com provas aparentes, do
que as massas as quais os guias oferecem, geralmente proveitos e vinganças sem
grandes riscos.
Afinal, a quarta particularidade essencial da coletividade da tropa de Infantaria é
que ela se destina, tem por meta exclusiva, a violência, a procura e a realização da
destruição do inimigo e que dispõe permanentemente de um armamento individual
completo e aperfeiçoado.
Não há duvida que, a ação da maior parte das massas termina por destruições. Le
Bon diz mesmo que “elas só tem força para destruir”. Mas não é parar isto que elas são
geralmente reunidas, ligadas, exaltadas. Pelo contrario. Os argumentos habituais, na
maioria das vezes, são argumentos de falsa sensibilidade e de bondade. É sempre para
acabar com uma “tirania”, para “libertar” alguns infelizes – geralmente, em ultima
analise, prisioneiros de direito comum, colocados fora de atividade – que os guias as
põem em ação. Mas, se tem uma força enorme e geralmente vitoriosa, se experimentam
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um sentimento quase sempre justificado de “força invencível”, é porque elas não


combatem senão indivíduos ou pequenos grupos que se defendem mal ou não se
defendem.
A Infantaria, pelo contrario, instrumento de guerra, só é posta em ação por
motivos de força maior. É criada, instruída, organizada e comandada para a destruição.
Essa a sua finalidade. Mas, - coisa curiosa – esta força considerável, bem mais
considerável que a das outras massas, não lhe dá – por isso mesmo – o sentimento de
um poder invencível. É que ela não combate adversários desprevenidos, mas forças
correspondentes, também poderosamente armadas ou mias bem armadas que ela
mesma. Uma vez a ação decidida e iniciada (o que exige, para todas as massas, um
impulso inicial), não é mais em acalma-la, em limitar-lhe estragos que possa causar,
como para as outras massas, que o chefe deve empenhar-se; mas em dirigir sua ação, em
desenvolver seu poder aniquilador, em contornar e vencer obstáculos muitas vezes de
resistência crescente. E intervém aqui, o estudo de uma psicologia mais complicada e
mais desenvolvida, pois compreende a luta de duas psicologias coletivas, dirigidas uma
contra a outra, enquanto diante das outras massas, não há, geralmente, senão indivíduos.
Outra diferença considerável. Le Bon, depois de afirmar o poder de destruição
das massas, acrescenta: “Seu domínio representa sempre uma fase de desordem”. Se
assim acontecesse com a Infantaria, seu domínio teria bem curta duração e em pouco se
transformaria em derrota. Veremos adiante que, manter a ordem, mesmo na fase mais
critica de destruição, deve ser uma das mais constantes preocupações do chefe e é
também das mais difíceis de realizar.
Esta finalidade de destruição e a dificuldade de realiza-la ante um adversário coletivo
extraordinariamente forte, exigem q a tropa de Infantaria – e aí esta, felizmente, uma
outra diferença das outras massas – disponha permanentemente de um armamento
individual completo e sempre aperfeiçoado.
Nesse caso, se o chefe não é capaz de orientá-la e dominá-la teremos ai massa
particularmente perigosa. Perigosa, talvez, para seus chefes, contra os quais é suscetível
de se revoltar, total ou parcialmente. Perigosa para as pessoas ou coletividades não
armadas, contra as quais pode ser tentada a aplicar uma força que se torna, então, odiosa
e injusta. É a pilhagem. São os assassinos de prisioneiros e civis.
Surge, assim, a necessidade desta quantidade essencial, primordial, -- e tão particular
para a massa -, indispensável à tropa de Infantaria: a disciplina minuciosa, rigorosa,
permanente.
Vamos agora – porque estes estudos psicológicos têm essencialmente, um fim de
utilização prática – estudar em detalhe a Infantaria, em suas diferentes partes (tropa
propriamente dita e quadros) e verificar como desenvolver suas qualidades e seu
rendimento, mantendo-nos sempre sobre o terreno psicológico e moral, com exclusão
das questões de armamento e tática.
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Capitulo II

Como melhorar o valor moral de uma tropa de infantaria – treinamento físico e cuidadosa
instrução militar influem sobre a disciplina moral – a robustez e a distinção no trajar
geram, muitas vezes, a robustez e a distinção morais – O espírito do corpo – Cerimônias
militares – conseguir bom êxito.

Todos reconhecem a necessidade da disciplina: “constituindo a disciplina a força


principal dos exércitos...”, diziam um tanto solenemente os nossos antigo regulamentos.
Uma tropa nada vale se não for disciplinada. Quanto a isso não resta dúvida. Toda
organização militar repousa sobre a hierarquia que a comanda, regras a que todos
respeitam e sanções que exigem obediência. Poder-se-ia dizer, então, que é inútil
conhecer a psicologia da infantaria para utilizá-la e que basta comandar de
conformidade com os regulamentos, exigindo que eles sejam fielmente cumpridos.
Muitos pensam assim e assim fazem, mas não obtêm êxito no comando. Alguns,
que não parecem inquieta-se em auscultar a alma de sua tropa, agem por uma espécie de
instinto ou pela lembrança do que viram fazer chefes que conheceram, e empregam
processos que, pelo menos em parte, satisfazem. Outros, aprenderam empiricamente
certos princípios que viram empregar ou que empregaram antes, e aplicam-nos com
sucesso, mas não refletem bem sobre o que fizeram e quando imaginam imaginam te
apenas ter roçado exteriormente a alma da tropa já a atingiram em cheio e ai é que esta a
verdadeira razão dos resultados obtidos.
Porque não experimenta a racionalização de certas praticas tradicionais em todos
os exércitos, porque não observar o que a de psicológico nos resultados obtidos? Feito
isso talvez se venha a fazer o que já se vinha fazendo, mas com o conhecimento de
causa e não visando apenas as aparências. Preservar-se-á o comando, em qualquer
escalão do desprezo --- e o que seria ainda pior – do desrespeito que provocam certas
maneiras de fazer exames superficiais, ou o desejo de não aborrecer a tropa, ou a
preocupação de restringir a instrução do infante, tornando-a de tal modo curta que,
algum dia, poderia ser julgado inútil.
Quantos – gente jovem e jovens oficiais – dizem com sorriso desdenhoso: “ que
se formem infantes flexíveis ágeis e fortes”. Que se lhes ensine a atirar e a servir-se de
suas armas. Esta certo. Mas perdesse um tempo precioso com o manejo de armas
aborrecesse e embrutecesse homens com exercícios de ordem unida, exigências de
posições rígidas de continências todo um formalismo caduco isso não. Isso era bom
para exércitos de profissionais aos quais não se sabia o que ensinar ao longo tempo de
serviço; era bom para exércitos de parada e guardas reais”.
Sem duvida, não convém eternizar-se nas rotinas do quartel, no treinamento do
soldado sem arma e nos exercícios de ordem unida. Há outras coisas para ensinar a um
soldado moderno. Mas aqueles que descuram ou abandonam esses exercícios
pormenorizados, não só tem unidades apresentando-se mal, mas pouco disciplinadas.
É que, efetivamente a obediência q se poderia se chamar física, tem influencia
sobre a obediência moral pela repetição de ordens claras e bem conhecidas seguidas de
uma execução rápida seca e precisa, mesmo que maquinal cria se o reflexo da
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obediência. É preciso, por assim dizer, que nada se interponha, nem mesmo a reflexão,
entre a ordem e a execução. Convém, não hesitemos em proclamá-lo, que o soldado – e
entendendo por soldado o subordinado militar de todos os graus hierárquicos – aprenda
a obedecer, mesmo que a miúdo não chega a compreender explicar-se-á quando se possa
– que já foi indicado no capitulo anterior o q isso ajudara à inteligência e representara
para a execução – mas nem sempre se quererá ou se poderá fazê-lo.
Quantas ordens particulares fazem parte de um plano de conjunto muito extenso
para explicar ou, mesmo, perigoso de expor, pelo interesse que há em mantê-lo em
segredo! E quantas minúcias de execução não seriam necessárias se fosse preciso ouvir
sempre as objeções ou os pedidos de explicação de cada um!
É, pois, aumentar o valos moral da tropa o dar-lhe o reflexo da obediência e isso
se consegue pela execução repetidas e frequente de pequenas coisas simples, pela
obediência imediata e exigências minuciosas.
Terá o exercito o privilegio dessa maneira de agir? Que se veja o que acontece
nas escolas onde o professor, pela repetição maquinal ou cantos em conjunto, faz entrar
no cérebro das crianças, também ele, o reflexo de obediência com os rudimentos de
ensino. Que se considere o que ocorre nos conventos de religiosos. Os superiores
exigem particularmente dos mais noviços, a aplicação de regras exatas, às vezes de
aparência pueril. Quebrem, por sistema, a vontade daqueles que aceitaram submeter-se à
regras, pois que toda ação de conjunto, todo poderio coletivo, exige frequentemente
uma obediência de máquina.
A transformação do aspecto exterior acarreta, também, uma transformação
moral. A tesoura dos religiosos, seu habito simples e deselegante – livremente aceitos,
aliás, desde o princípio – desenvolvem neles a submissão e a humildade, dando-lhes
uma alma de pobres e os preparam para todas as renúncias.
Quando se exige do soldado o asseio corporal, a limpeza física e a correção na
maneira de andar e de e de se vestir, não é só o aspecto exterior que se deseja melhorar,
é também a correção moral que se procura obter. Um homem habitualmente sujo e mal
trajado, talvez não seja sempre um homem de alma suja, mas um operário limpo, como
um soldado limpo, tem geralmente a alma limpa. E sobretudo, uma tropa que mantém
limpo seu fardamento e seu alojamento, é menos capaz que outra de desordem, de
pilhagem, de baixezas mesquinhas e covardes.
Tudo isso, bem entendido, não é absoluto, mas basta que a limpeza física
acarrete a limpeza moral, para que a procuremos. E os ingleses, que conhecemos tão
bem sob esse aspecto, não tem uma palavra –para a qual é lamentável não se encontrar
nenhum tradução francesa exata – que exprime ao mesmo tempo limpeza física e
limpeza moral quando dizem: um gentleman? E se lhe falta uma ou outra, seja ele
príncipe ou operário... não será um gentleman.
Um dos meios mais poderosos de aumentar o valor moral de uma tropa, é dar-
lhe o espírito do corpo.
O que é o espírito de corpo? Quais são as suas manifestações? Quais os
processos para cria-lo?
O espírito de corpo é esse orgulho coletivo que faz crer a uma tropa que ela é
superior a sua vizinha. É o apego às suas tradições, ao seu passado, como a uma nobreza
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coletiva. É uma tendência comum de pensar de acordo uns com os outros. É um desejo
intenso – que conduz por vezes o sacrifício – de tudo fazer pela grandeza, pela
reputação e pela gloria da unidade.
Os caçadores, os legionários, tem espírito de corpo. Toda tropa pode ter esse
espírito de corpo.
Como cria-lo? É necessário encontrar e explorar, ou então criar tradições,
particularidades de apresentação, de maneiras, de denominação, de conduta. Não
importa que seja pela lentidão, como no caso dos legionários, ou pela rapidez de seu
passo cadenciado, como no caso dos caçadores, que uma tropa de infantaria venha a
distinguir-se. O essencial é que ela se distinga e que qualquer um, vendo-a, diga com
segurança: “Estes que avançam, são os legionários!” ou “Estes que passam, são os
caçadores!”. E isto que, a primeira vista, parece curioso (e que penas é normal, sendo a
maneira de andar de um homem, como sua escrita, expressão de sua personalidade), é
que essas duas maneiras de andar, uma lenta e a outra viva, correspondem ao caráter
particular de cada uma dessas duas subdivisões da Arma de Infantaria. A legião é uma
tropa é uma tropa de soldados na maioria idosos, lentos, excelentes na defesa e
admiráveis, antes de mais nada, por sua solidariedade. Uma tropa, também, desabusada
e cuja grandeza é feita mais de resignação do que de entusiasmo. A lentidão extrema de
sua progressão, como é de tradição para a partida de Tonkin, aos sons da “Marche des
Bonnes à poil”(Marcha dos veteranos), exprime verdadeiramente e de maneira
emocionante esta alma complexa e triste. Os caçadores, ao contrário, mais jovens,
geralmente pequenos, alegres, ruidosos e despreocupados, exprimem bem, por sua
cadência viva e agitada nos sons de suas fanfarras alegres, ardente e nervosamente
conduzidas, suas qualidades tradicionais de jovialidade, ação e energia.
A maneira de andar no passo cadenciado é apenas um exemplo do modo de
proceder. Sempre com a mesma finalidade de tornar reconhecidos os homens
pertencentes à unidade e distingui-los dos outros, é indispensável um uniforme especial
ou, se não se pode tê-lo, inventar (sem cair no ridículo) uma insígnia particular, botões
diferentes, um brazão darmas bem escolhido. Pode-se fazer usar a cobertura de modo
um pouco diferente, tolerar, ou mesmo aprovar, algumas singularidades pouco
importantes da ordem unida.
O assunto é delicado. Deve-se evitar, de início, fugir aos regulamentos militares,
que são obrigatórios para todos e dos quais não nos podemos afastar sem prejuízo da
disciplina geral do exército. Por outro lado é necessário evitar o ridículo, fácil de se
verificar em assuntos como este.
Contornados, porém, esses dois obstáculos, conseguir-se-á resultados
verdadeiramente consideráveis. Por bem pequenos meios, dirão alguns. Talvez. Mas que
importa, se os resultados são grandes? Acaso não vale mais obter resultados grandes
com pequenos meio, do que pequenos resultados com grandes meios? Se pudermos
conseguir um soldado geralmente mais limpo e mais ardoroso, dando-lhe um uniforme
azul ferrete e chamando-o caçador, por que renunciar a essas vantagens tão pouco
onerosas?
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Não falta gente, entretanto, que faça objeções e queira suprimir essas coisas. Não
me entenderei sobre os ataques um tanto surpreendente contra os caçadores do coronel
Ardent du Picq, porque está grade autoridade, sob o ponto de vista de psicologia militar,
não podia ignorar e não nega em seu livro, os superiores resultados obtidos pelas tropas
de elite. Faz, porém, uma censura – que hoje não seria, mas justificada – as tropas de
elite: é a de serem formados em detrimento das outras tropas, das quais são tirados, em
proveito próprio, os melhores elementos. Ele tem razão. Haveria inconvenientes para os
outros, em selecionar os melhores elementos para formar as unidades de caçadores. Para
os legionários, a questão não era a mesma: a seleção física e obrigatória para o
engajamento, mas as dificuldades médicas para inclusão de recrutas e a seleção moral
são, geralmente... negativas. Deve-se conseguir criar o espírito de corpo em uma
unidade e por esse meio aperfeiçoar o valor moral de uma tropa, utilizando matéria
prima análoga àquela de todas as outras tropas. Se fizesse uma repartição desigual dos
contingentes ajudaríamos, talvez, certos chefes a criar esse espírito de corpo – si bem
que eles não deviam ter necessidade dessa vantagem inicial – mas prejudicaríamos
gravemente o valor moral das outras unidades. Enquanto colocando cada um em igual
situação de partida, tem-se probabilidade de melhorar a moral de todos, pela emulação.
Para evitar os principais inconvenientes do espírito de corpo e das tropas
chamadas de elite (sempre haverá algumas, mas quão inferiores aos benefícios relativos
recebidos para se formarem) alguns tropeços devem ser evitados oficiais dessas
unidades.
Uma tropa de elite, como tudo que é elite e superioridade, é invejada e facilmente
criticada. Os pequenos meios de qual falei mais acima, são aplicáveis sobretudo as
praças. Os oficiais devem observar, para com estas, constante preocupação de
integridade moral, das mais rigorosa correção de conduta e o desejo de adquirir uma
superioridade verdadeira. É-lhes necessária muita camaradagem, muita união, muito
respeito às tradições particularistas sem cair em infantilidades. Erguer a cabeça sobre os
esforços excepcionais a realizar, mas reservar elogios para as ocasiões próprias, ser
muito acolhedores para com os oficiais dos outros corpos, prestar toda atenção para não
chocá-los, despir-se não só de desdém, que seria inadmissível, mas mesmo de qualquer
indício de crença em sua superioridade.
E mais que tudo, uma tropa de elite deve dar provas de sua qualidade excepcional.
Os maiores perigos, os maiores sofrimentos, as maiores fadigas, cabem-lhe por direito.
Deve aceitá-los, reclamá-los até. E, se seu valor moral é verdadeiramente superior ao
das outras, deve superá-los melhor que as outras. São as recordações glorificadas desses
bons êxitos superiores, que forjam substancialmente o espírito de corpo e o tornam
fecundado.
Tal como a Igreja, o Exército tem suas cerimônias solenes, pois também ele
precisa alimentar a fé e o entusiasmo. Desde os tempos mais antigos, os Exércitos
fizeram desfiles, formaturas para condecoração, manifestações de pompa exterior. Não é
preciso multiplicá-las, nem prolongadas, porque depressa provocam fadiga
insuficientemente justificada, e assim serão verdadeiro pesadelo para a tropa. Mas
quando se propõem a um fim bem escolhido (entrega de condecorações ou de
distintivos, comemoração de um ato memorável para o país ou para a unidade, saudação
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aos mortos na guerra, etc.), quando bem preparadas, brilhantes, curtas e quando
alcançam sua finalidade e impressionam o espírito do soldado, as cerimônias militares
são um meio útil para elevar a energia moral da tropa.
Não se fazem cerimônias impressionantes sem música, menos ainda no Exército
do que nas igrejas. E é por isso que a supressão das bandas de música e fanfarras, ou
mesmo sua diminuição, tão frequentemente pedida como economia útil para um país
insuficientemente povoado e que necessita manter seus efetivos combatentes, é erro
grave. Quando se suprime a banda de música de um corpo, arrebata-se-lhe o penacho,
um motivo de orgulho, priva-se-lhe da maneira de fugir da vulgaridade, da poeira ou da
lama quotidianas, para se entusiasmar alguns instantes com o ideal, usufruir um pouco
de beleza e de dignidade patentes.
Não é de surpreender que as bandas de músicas fossem mais energeticamente
proibidas depois da guerra do que eram antes? Não impressionante que tosos
combatentes de infantaria fizeram a guerra, queira conserva seus músicos, mesmo
quando têm uma tendência - às vezes exagerada – de querer a supressão do maior
número de militares que não tenham uma arma nas mãos e não tomem parte pessoal na
batalha?
Para melhorar o valor normal de sua tropa é preciso torna-la justamente orgulhosa
de si mesma e confiante em si. Exigindo esforços raros mais intensos, pode-se obter
muito sem fadiga nem exaustão.
Diga-se de passagem que quando se recebeu uma certa missão ,é preciso fazer de
tudo pra cumpri-la. E conseguir êxito, em tal caso, não é somente um meio psicológico
de engrandecer a tropa. É um dever profissional escrito a cumprir e cabe simplesmente
ao chefe sair –se bem pelo menor preço.
Mas não é isso. Por sistema, por método de educação moral, é preciso
gradativamente procurar e achar tarefas cada vez mais difíceis, num evitar cuidadoso de
fracasso. Não procede assim o cavaleiro que treina o cavaleiro que treina seu cavalo
para um concurso hípico? Obstáculos fáceis de inicio depois obstáculos mais difíceis
evitando pedir demasiado prematuro ao cavalo, para livra-lo de uma queda desgosta que
desgosta e às vezes desencoraja por muito tempo. E o cavalo, pouco a pouco, adquire
confiança em seus meios, desenvolve-os e salta cada vez mais alto.
Do mesmo modo, uma tropa de infantaria que se tenha feito, progressiva e
prudentemente, sair-se bem, evitando as causas e derrota e forçando, ás vezes de
propósito, o poder dos meios, alcançara, a poucos importa, confiança e si e terá
aumentadas suas possibilidade. Não importe se, de início, durante a caminhada muito
longa, falseiam-se um pouco de dados do problema, desequipando completamente os
homens. Estes guardarão a lembrança do número de quilômetros percorrido e do
número de horas de marcha. Eles se gabarão da façanha, só conservando a lembrança do
bom êxito. E se poderá, em breve, fazê-los repetir, com a mochila cheia, desta vez, o
mesmo percurso com sucesso e ainda com maior êxito.
A montanha, com o relevo de certos caminhos, com a facilidade relativa de
percursos mais longos sem fadigas excessivas, devido à temperatura mais fresca e ao
fato de não serem sempre nem os mesmos os músculos das pernas que trabalham
continuadamente, nem as mesmas as partes dos pés que sofrem contacto prolongado
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com o solo, oferece grandes recursos, sob esse ponto de vista ,para quem sabe explorá-
la .E sua dura escola faz ir de encontro ,mesmo em tempo de paz, a adversários reais ,
pondo-os, frequentemente em presença da apreensão e do perigo. Quando aí se alcança
a vitória com a tropa, aumenta-se-lhe seu valor, o orgulho e ímpeto.
Na guerra, é ainda mais importante sair-se bem, porque qualquer ato de
arrebatamento é mais difícil. E, mesmo sem partilhar da opinião dos otimistas, afastados
dos campos de batalha, que acreditam que uma tropa se entusiasma com um ataque
coroado de êxito e não deseja senão prosseguir --- isso lhe custará muito caro e cada um
só tem uma única existência ---, pode-se, com certeza, afirmar que, muitas vezes é
possível erguer o moral de uma tropa de momento abatida por um revés e restaurar-lhe
o prestígio, facilitando-lhe um sucesso relativamente fácil por meios apropriados e a
escolha de um objetivo limitado e que se sabe estar mal defendido.
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Capítulo III

O comando de uma boa Infantaria – Apelo ao amor próprio – Pedir o mais difícil –
Recompensar com inteligência – Nunca esquecer de poupar particularmente os
melhores.

Quando se tem a sorte e a honra de dispor de uma boa Infantaria, é preciso saber
reconhecê-la, desde logo ,não temer dizer-lhe, tratá-la e comandá-la diferentemente de
uma tropa regular e medíocre.
É assim que, por um apelo frequente ao amor próprio, se exploram as melhores
qualidades de boas tropas.
Aquele que permitir, uma única vez, ser desprezado, nada mais terá a perder.
Não levará mais em consideração o maior ou o menor perigo, a maior ou a menor fadiga
para se decidir. Veremos, no capítulo seguinte como se pode tentar utilizar-se desse
grave estado de espírito, sem chegar aos usos das sanções que os regulamentos
permitem.
Mas, com as boas tropas não se dá o mesmo. Orgulhosas dos sucessos passados,
orgulhosas de sua reputação, dessa espécie de auréola que as rodeia e dos olhares que a
admiram ao passarem – e os dos olhos femininos não são os menos apreciados – os
soldados que as compõem não estão mais livres para escutar a voz do menor esforço ou
do medo.
Quem experimentou a embriaguez da glória não pode esquecer o seu sabor.
Mais simplesmente, quem se beneficiou com as vantagens do primeiro lugar, não
deseja mais deixa-lo, mesmo que para isso deva dispender grandes esforços e correr
grandes riscos.
Lembro-me de um batalhão da legião de Marrocos, fortemente experimentado
em operações anteriores e estando com efetivo muito reduzido, fora designado para
servir de escolta ao comboio de um marcha retrógada. Recordemos que nessa época, as
colunas se deslocavam isoladas em país inimigo, com seu comboio no meio do
dispositivo, escoltado pela tropa menos brilhante; e que o lugar privilegiado, isto é, o
mais perigoso, aquele confiado à tropa mais valorosa, era a retaguarda da marcha
retrógada. Era em 1914, após a tomada de Khenifra, e uma das colunas que participa da
operação, devia regressar para Ito, em busca de grande quantidade de víveres, para
construir em seguida, o aprovisionamento do novo posto citado. As tribos inimigas,
muito aguerridas – os famosos Zaians às ordens de Moha - ou – Ahmou – não podiam
manter-se diante de nossas tropas na marcha para a frente, mas tinham o hábito de se
lançarem em malta encarniçada, logo que o ataque lhes parecia possível, sobre os
últimos elementos que recuavam e os quais o movimento retrógrado deixava
frequentemente isolados.
Furiosos e humilhados com o que consideraram como prova de desconfiança,
espécie de afronta semelhante à colocação no fim da mesa daquele que sabia que
deveria sentar-se à direita da dona da casa, simples legionários e oficiais do batalhão
manifestarão seu descontentamento. E foi necessário que seu comandante se dirigisse ao
general, para expor-lhe as reivindicações dos legionários e lhe pedisse o lugar de honra
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ao qual eles pensavam ter direito. Foi-lhes satisfeita a exigência, apesar do seu pequeno
número (que fôra a causa da disposição inicial); e isso lhes custou muito caro no
desfiladeiro de Foumteguett. Mas, não obstantes aos terríveis momentos que passaram
as suas pesadas perdas, nenhum lamentou não estar no lugar desprezado e menos
perigoso da guarda do comboio.
Depois desse episódio maravilhoso e raro (pois a maior parte daqueles que se
queixam de não ter sido designados para o perigo, só o fazem depois dele ter passado –
o que é infinitamente menos meritório !)pode-se citar a sentença bem conhecida do
general Négrier às unidades da Legião que enviava um dia um dia a uma morte quase
certa: “Legionários! Sois soldados para morrer e eu vos envio para a morte”. Trágica e
sobre-humana prova de estima, que ficou como um dos títulos de glória de que a legião
mais se orgulha.
Tropas sublimes, as que se pode empregar com argumentos como esse!
Eis aí, em sua forma mais exaltada, o apelo ao amor próprio que age tão
poderosamente sobre as boas tropas.
Sem ir até o excesso, pois poucas tropas são capazes de tais exaltações heroicas,
pode-se pedir a uma Infantaria de reputação firmada, as tarefas mais difíceis,
salientando havê-las reservado para ela, em virtude de suas qualidades.
Entretanto é preciso, depois, quando o bom êxito for alcançado, saber
recompensar sem mesquinhez. Nada é pior, nesse caso, do que essas decisões tão
frequentes de chefes ignorantes da psicologia ou injustos – porque a injustiça não é a
igualdade – que, depois da ação, repartem igualmente o numero de medalhas, sem levar
em conta a diferença das dificuldades vencidas e das tarefas realizadas¹.
Sob esse ponto de vista a criação dos distintivos com grau fora uma invenção
genial se, apouco a pouco, não se tivesse querido dá-los a todos os regimentos.
Felizmente não se foi até o fim com essa generosidade mal compreendida e, se foram
dados muitos distintivos manteve-se, apesar disso, o alto valor dos de grau mais
elevado.
Que grave erro, também, o dessas cruzes de guerra completamente distribuídas,
em citações vagas, a tanta gente talvez merecedora e capaz, mas sempre longe dos
perigos da linha de frente. E foi dado um prazer momentâneo a esses beneficiados, se
eles foram injustamente apontados à admiração e à estima dos civis da retaguarda, fez –
se surgir contra eles, essa lamentável antipatia dos combatentes, os quais, não tendo
compreendido a necessidade imperiosa, mesmo sem seu beneficio, de serem certas
_________________________
¹ - Diz-se as vezes que é muito difícil saber quem teve mais méritos.
Recordo-me de um ataque em grande estilo que teve lugar e certa zona, realizado por dois regimentos, um
atrás do outro. O segundo – o da retaguarda – tendo menos preocupações imediatas e menos trabalho que
o primeiro – o da vanguarda – tinha aparentemente multiplicado o numero de suas proezas, marcando
com giz, com o numero de seu regimento, todos os canhões deixados no campo pelo inimigo, ao passo
que o ataque progredia. Os dois regimentos foram citados em o Ordem do Dia do Exercito em termos
bem semelhantes; e o comandante da Infantaria Divisionária, concedeu a cada um, pouco mais ou menos,
a mesma quantidade de prêmios. Seria acaso muito difícil descobrir que a tarefa do primeiro tinha sido
infinitamente mais dura e meritória que a do segundo?
27

funções exercidas com menor exposição ao perigo, estigmatizaram todos os que


trabalhavam abrigados – e se teve a inverosímel falta de habilidade de recompensar
como a eles – com qualificativo depreciativo de `` emboscados ´´.
Se convém saber recompensar as boas tropas, e recompensa-las de um modo
inteligente e excepcional, sem outra limitação que a do valor dos serviços prestados,
também é preciso poupa-las.
Uma boa tropa, que como tal é tratada, compreende que se lhe reservem as
tarefas mais difíceis e mais perigosas. Mas também precisa de repouso. É indispensável
proporcionar-lho. Compreendeu-se isso, frequentemente por necessidade, durante a
guerra. Conviria nunca esquecer isso. Nem importa que outros murmurem – aqueles que
se expõem menos e tem tarefas mais fáceis, - que achem que se lhes dá acantonamento
menos agradável, períodos de repouso menos prolongados. Se querem o mesmo
tratamento privilegiado, sob esse ponto de vista, que reclamem os mesmos perigos e os
mesmos esforços e, se tornarem iguais aos melhores, que se lhes deem as mesmas
vantagens.
Conheci, todos nós conhecemos durante a guerra, os especialistas em missões
perigosas – as ``verdadeiras´´, não as das citações complacentes, - homens e tropas de
elite da Infantaria, sempre prontos para o golpe audaciosos, para ação perigosa e
delicada. Certos chefes, - para não dizer quase todos, - felizes por não terem de fazer
designações por escala, mais confiantes também nesses especialista do difícil e do
heroísmo, consentiam em utilizar sempre os mesmos, até o dia, ai deles! Em que eram
sacrificados. É conveniente pensar, ao contrario, em economizar seus melhores homens,
mesmo contra vontade deles próprios. Constituem uma reserva que se deve guardar. E
depois, o cavalo mais brioso, acaba, também ele, por ficar ovado se o faz, a miúdo,
correr muito.
Em suma, a boa tropa de Infantaria é um instrumento precioso e raro, - mais
raro do que se imagina, - pois o que se lhe pede é, as vezes terrível, as vezes quase
sobre-humano. Que imagine, quem ainda não passou por isso, o que representa de
vitória sobre si mesmo, o partir, friamente sem hesitação a uma hora H, ao alvorecer,
sobre metralhadoras que vão atirar, que se sabe estarem perto, e vão ceifar(sabemos por
experiência própria) e um instante, definitivamente, muitos daqueles, que, cheios de
vida, o espírito atento e o corpo retesado, vão lançar-se para a frente. E que se pense, em
comparação, no reflexo de fuga, ou ao menos no sobressalto, que agita um homem
medíocre, não habituado às armas, ao simples ruído de um tiro dado perto dele.
Lembremos que, na defesa, quando um fuzileiro atirador ou um atirador de
metralhadora foi submetido a um bombardeio de varias horas, que atingiu a sua
trincheira, quando ele próprio esteve, não raro, enterrado momentaneamente pelos
efeitos de um obus, quando sabe que a essa confusão, pior que um tremor de terra, vai
suceder um selvagem ataque dos infantes inimigos, e preciso encontrar em sua alma, a
energia e a lucidez para saltar ao posto de combate ao soar o tiro da artilharia, em pleno
terreno descoberto, para ele próprio atirar antes que sobre eles cheguem as granadas
inimigas. E é com realização desse ato quase instantâneo que pode sair-se com bom
êxito de sua missão.
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Sim, por certo quando se recorda do que é preciso pedir a uma boa Infantaria no
ataque e na defesa para alcançar o êxito, compreende-se que nada há como não
economizar provas de consideração, recompensas e períodos de repouso, e que se deve
saber poupar esse indispensável e admirável instrumento da Vitória.
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Capitulo IV

Emprego de uma infantaria medíocre - Missões relativamente fáceis- Fazer com eu


tenha facilidades e com menor perigo compreenda que desempenhar bem a missão, é
mais vantajoso do que fazê-lo mal – Procurar das primeiras felicitações justas -
Reanimar o amor próprio – As sanções - Perigos da rebelião e do fracasso coletivo -
Antes de tudo, dissociar a solidariedade na indisciplina.

Examinadas as virtudes que se exige das boas tropas de Infantaria, não ha por
que nos admiramos de que haja tropas medíocres. Como utiliza-las? É certo que não
será como as boas, pois que elas não são!
Nossos regulamentos – será vergonha de reconhecer o fato de que elas existem
ou será, apenas, a recusa de aceitar a existência? – nunca fazem diferença entre topas
boa e tropas medíocres. Nos tratados de tática e nos exercícios teóricos, nunca se
escolhe e nem se dosa o esforço pedido, pela qualidade da tropa.
Entretanto, tal como os homens, as unidades não são intermutáveis. Tive,
durante certo período de guerra, em meu batalhão, um comandante de companhia muito
conceituado, sempre pronto a atacar violentamente, mas que não sabia ler as cartas. A
cada ataque importante, qualquer que fosse a escala das unidades, eu conseguia deixar
sua companhia em reserva; e estava seguro de que tão logo permitisse, ele partiria como
um bólide e estaria, nessa situação, ao abrigo de erros grosseiros de direção e de ligação.
Assim ele, impulsionava um pouco as unidades que estavam a sua frente, e eu tinha
sempre pronto a tapar uma brecha na linha de frete e dar um novo impulso ao avanço do
batalhão por sua entrada em ação.
Por ocasião de um ataque, no fim da guerra, meu sucessor no comando do
batalhão, conhecendo menos as particularidades dessa companhia e de seu comandante,
ou mais preso as exigências do revezamento, pôs esse capitão em primeiro escalão. Ele
partiu como um louco, um pouco ao acaso quanto a direção, sem se preocupar de ser
seguido ou não e nem de manter a ligação. A companhia reserva não cerrou
suficientemente sobre ele. Em pouco ficou isolado e foi feito prisioneiro, depois de
ferido em condições apesar disto heroicas.
Cito este exemplo para mostrar que as tarefas variam com comas tropas e seus
chefes e também que não se deve colocar sempre na frente os mais bravos. Reservando-
os quando isso é possível, tem –se a dupla vantagem de estar seguro de poder lança, em
uma situação difícil, os melhores se for necessário, e também de economiza-los
vantajosamente se, como é o caso mais frequente, não houver necessidade de empregara
reserva.
Voltemos a nossa infantaria medíocre. Necessita-se inicialmente tratar de não
repeli-la em definitivo e, se possível de restituir-lhe confiança e diligencia. Tarefas
relativamente fáceis lhe devem, pois, ser reservadas. Não digo que obrigatoriamente as
menos perigosas.
O exemplo que acaba de ser citado, parece-me, dá bem ideia do que a miúdo é
preciso tentar.
Foi dito mais acima que certos soldados e certas tropas, tendo aceito serem
desprezadas, consideravam apenas, para se determinar, a maior ou menor fadiga, o
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maior ou menor perigo. Faz-se necessário conseguir persuadi-los – e para persuadi-los é


mister que isso seja verdade – que eles terão ais vantagem atuando bem do que atuando
mal. Assim colocando de vez em quando na frente, no inicio de um que, isto é, no lugar
mais perigoso, os menos bons e conservando em reserva os reputados como melhores,
far-se-a com que os primeiros aspirem(sobretudo se lhes foi prometido)passar a reserva
na vez seguinte, se derem prova, desta vez, da diligencia e do esforço que se exigem das
tropas aptas para serem empregadas como reserva.
Esse principio – o primeiro na utilização dos medíocres- devem ser a base de
comando deles; deve-se proceder de tal modo que, em caso dado, haja a vantagem e o
menor perigo em atuar bem do que em atuar mal. Assim, quando se emprega a barragem
rolante da Artilharia em um ataque , há menor perigo em ir para a rente, cerrando ao
muitos próximos arrebentamentos, do que ficar um pouco para trás. Efetivamente, sob
essa cortina de fogo que se desloca, o inimigo, enquanto esta coberto, fica imobilizado
em seu abrigo e não pode utilizar suas armas. Mas, desde que a cortina fez o seu lance
seguinte, de 50 ou 100 metros, atirador inimigo, saído desse aperto, vai poder voltar a
sua posição de tiro e agir. O assaltante que seguiu de perto a barragem, atinge o inimigo
antes que saia do seu abrigo. O seu assalto não é mais do chamávamos, durante a
guerra, pela palavra atroz: ``a limpeza´´, isto é, pode atirar e destruir o inimigo com uma
granada lançada em um abrigo ou no fundo de uma trincheira, antes ele tenha tempo de
se por em guarda para combater. Ao contrario, o soldado que se atrasa um pouco, não
chega sobre o atirador inimigo senão que este pode retomar sua posição de tiro. É para
ele, então, a morte quase certa.
Depois desse argumentos de interesse unicamente pessoal, poder-se-á, com mais
frequência, fazer, fazer apelo, dentro em breve, meios mais sumários.
Disse que os medíocres aceitavam definitivamente ser desprezados. Quase
sempre isso não é bem verdadeiro. E a prova disso é que, quando a tropa medíocre se vê
afastada de uma missão especial, mais penosa ou mais perigosa, tem com certeza e de
inicio um sentimento de satisfação ao ser livre de fadigas e perigos, mas não pode evitar
uma espécie de inveja frente aqueles que, substituindo-os, são distinguindo com a
missão. É desagradável ouvir gabar o vizinho, principalmente se a isso se acrescenta
uma comparação que vos é favorável. E então se chega ao ponto que desejar para si
mesmo, cumprimentos e felicitações.
E ai que surge, para o chefe, a oportunidade do que chamarei de ``procura da
primeira felicitação justa´´. Uma tropa, como um homem, sempre censurada, sempre
desdenhada, desce pouco a pouco a um declive perigo até o dia em que, surpresa – e a
miúdo bruscamente refeitas, - ela é, pela primeira vez, objeto de felicitações. OH! sem
duvida, isso é unicamente um patamar, não é ainda o alto da escada. Terá muito a fazer,
para chegar lá, se lá chegar. Mas já é um começo. Quando se recua, a parada é o
primeiro tempo da reação ofensiva. E á a prova – prova de um efeito extraordinário – de
que a derrota não é completa.
Mas, por desejável, que seja o primeiro cumprimento como meio psicológico de
levantar o moral, perderia seu valo, pior ainda, destruiria o valor de todos os outros do
mesmo chefe, se não fosse justificado. Certamente, dir-se-á, não é fácil, para Infantaria
medíocre que vós nos descreveis, por mis que se queira, dar-lhe cumprimentos quando
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merece tão pouco e na maioria das vezes se deve empregar as outras em seu lugar. Ela
merece pouco, é verdade; mas não peço muito a principio. Procuro um motivo apenas, e
justificado, é muito raro que o não encontremos. Assim, esta unidade, à qual se deu uma
tarefa relativamente fácil, mas de grande alcance, à qual se fez ver a vantagem pessoal
de seguir com ardor sua barragem rolante, realizou, apesar de tudo, se teve êxito, um ato
meritório e talvez mesmo grandioso. Não se lhe necessita recordar e que ela teria
preferido estar em outra parte e que talvez, outras teriam tido até melhor êxito. O
essencial é que o que ela fez, tenha sido verdadeiramente bem feito e que possa, sem
mentira dizer-lho.
Eis ai, então, uma troa medíocre, que já o é menos. Tem uma recordação gloriosa
própria e não pode nem se dar conta de que há vantagens morais e, as vezes, mesmo
materiais, em ser estimada ao envés de ser desprezada. É como o homem que, pela
primeira vez, provou álcool, e que tornara a beber.
Desperta-lhe o amor próprio, tal é a finalidade. Quando a primeira chama
aparece, é preciso soprá-la decentemente a fim de mantê-la. Depois deve-se avivar o
incêndio criando vários pequenos focos. Quero dizer necessário criar pequenas elites
cujo ardor levara os outros para diante. Mesmo em uma Infantaria medíocre, há alguns
bons elementos. Não hesitemos em separa-los momentaneamente dos outro, em agrupa-
los em pelotões especiais, em grupos livres, em seções de elite. Que importa o nome! É,
em embrião, o principio do espírito de corpo.
A esses pequenos grupos, utilizados a parte se obtiverem êxito, dar-se-lhes-ão
alguns distintivos, e não se perdera nenhuma ocasião para instala-los melhor, fazê-los
repousar com proveitos, se possível licencia-los excepcionalmente.
Serão a princípios invejados, talvez criticados, tentar-se-á diminuí-los. Mas
depois a emulação nascera, a começar pelas unidades melhor comandadas. Uma
companhia fará saber que ela também seria capaz de cumprir bem a missão. E quererá
prova-lo. Tomemo-la pela palavra. E então, bem a miúdo, todas as outras a seguirão. Eis
ai salva, uma Infantaria medíocre. Talvez venha a fazer tudo muito bem, algum dia e
será, então uma boa Infantaria.
Infelizmente, tais resultados nem sempre podem ser objetivos. E, o que é mais
grave, certos indivíduos, senão certas tropas, chegarão somente a executar mal a sua
missão e a nem cumprir com o dever.
O chefe estará, então, em presença de uma penosa mas grave obrigação: aplicar
punições e as vezes sanções muito serias.
Quando passou o perigo e a guerra já esta longe, muitos críticos discute e mesmo
condenam essa sanções. Dizem então ``como se pode puni-los tão severamente? Não é
desumano exigir dos homens ações tão difíceis? Talvez algum dos punidos tenha
abandonado seu posto em contato com o inimigo, mas em consequência de fraqueza
momentânea e explicável ´´.
De inicio, é preciso levar-se em conta que, nos exércitos modernos, a sensação
suprema é muito rara. Em mais de quatro a anos de guerra, sempre na Infantaria, nunca
vi uma única condenação à morte. Vi um certo numero de sanções menores; e os
Conselhos de Guerra são, o mais das vezes, uma jurisdição pouco rigorosa, diria um
tribunal fraco, acessível a todas as piedades. Mas há casos em que a piedade por um
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culpado torne-se em injustiça para outros, por vezes até um cumplicidade de assassínio.
Efetivamente, o tal homem que abandonou seu posto facilitou a ação do inimigo, sendo
substituído por um outro que foi morto. E se morrer em seu posto normal, em sua vez, é
um risco terrível, mas aceitável e muitas vezes inevitável na guerra, é monstruoso ser
morto porque um outro não cumpriu seu dever. Aquele que fez morrer um outro por sua
culpa ou e seu lugar é, de certo modo, uma espécie de assassino.
E, mais grave ainda, se não se reprimem impiedosamente os abandonos de
postos, as fugas diante do inimigo, quantos, ao cabo de algum tempo desse regime de
abdicação, seguirão seu chefe no ataque ou se manterão firmes na defesa? E então, serão
as unidades inteiras a serem destruídas, colocadas bruscamente em face de um
assaltante que elas pensavam que fora detido por aqueles que disso estavam encarregado
e que tinham possibilidade de o fazer. Será talvez, o ais mesmo que em resultado dessa
delinquência generalizada, ficara desprotegido diante da agressão e acabara arrasado.
Nesse caso a tropa de Infantaria se transformaria logo na turba organizada de Le
Bom, esse aglomerado inconsciente sujeito a todos os contágios e sobretudo ao contagio
do medo.
Eis porque as punições, e outras sanções, em guerra, não raro sanções imediatas,
devem manter-se. Por vezes é um freio para alguns que, geralmente bravos, possam ter
seu minuto de fraqueza, sobretudo se não sentem atrás de si mão firme que os mantenha
unidos. É principalmente ameaça de maior perigo para os covardes, os quais seriam
tentados a abandonar seus camaradas e cuja fraqueza desorganizara o conjunto.
Tais são, mesmo quando não se trata de sanção suprema, as mais duras
obrigações eu o dever impões ao chefe. Infelizmente, com frequência, ele pode evita-
las, em particular quando estamos certos de saberia, em caso de necessidade, aplica-la
impiedosamente.
Depois de descermos as tropas medíocres, chegamos as piores, aquelas que
seriam capazes de abandono da missão ou de revolução coletiva.
É mister, a todo custo, impedir que a totalidade se solidarize contra si. A
repressão da coletividade é muito difícil, muito mais dura e muito menos injusta.
Outrora, em certos caos raros dizimava-se uma tropa, isto é, matava-se um homem de
cada vez. Isso é terrível, e não se tem oportunidade de se castigar os mais culpados.
E são exatamente este que é preciso procurarmos, estes são os mentores que é
preciso prender e segregar. E que uma e pressão imediata e terrível corte pela raiz
contagio, desencoraje os cúmplices, os quais em tais casos, são quase sempre falhos de
energia, mesmo para fazer o mal, se não sentirem fortemente apoiados. Apliquem-se
punições nominais e bem escolhidas, que façam ver os outros que a volta ao dever os
salvara. E estabelecer-se-á a ordem. Mas nada de ameaças coletivas e vazias. Isso seria
repetir o erro bem conhecido de Robespierre, quando foi despojado de seus poder.
Deixemos esses tristes espetáculos, esses meios excepcionais de comando.
Felizmente se as tropas muito boas de Infantaria são raras, as muito, mas são mais raras
ainda. E um chefe experimentado, conhecedor da alma da Infantaria e que saiba dar
exemplo, e transforma depressa uma tropa comum ou mesmo uma tropa medíocre, em
um bom instrumento de combate, pronto a cumprir seu dever pela Pátria.
33

Capitulo V

Psicologia do campo de batalha – O ataque de Infantaria – Vencer é quebrar a


vontade do adversário e é agir sobre sua alma – É preciso conhecer sua psicologia no
campo de batalha – O momento da derrota é o da fraqueza moral – O assalto, meio de
decisão essencialmente psicológico – surpresa - No caso de preparação da artilharia,
há um crescendo nas manifestações de poder – o desborda mento – A inundação
humana – Uma boa tropa, no ataque, não foge nunca ao comando de seus chefes
imediatos, mesmo no momento derradeiro – Fisionomia do ataque de Infantaria, em
1918.

“Cem mil homens deixam 10.000 dos seus nos campos de batalha e se
confessam vencidos. Batem em retirada diante dos vencedores que tinham perdido outro
tanto ou mais. Em suma, nem uns, nem outros sabem, quando se retiram, nem o que os
perdera, nem quanto tinham perdido na frente.
Noventa mil homens vencidos se retiram ante 90.000 homens vencedores,
unicamente porque não querem mais, porque não creem mais na vitória, porque estão
desmoralizados, porque chegou ao fim sua resistência moral”. (General Cardot).
“O soldado e forte e vencedor, fraco e vencido, segundo o que ele crê que é”.
(Napoleão: Comentários, tomo VI)
“O combate é, em ultima instancia, uma luta moral”. (Regulamento dos
exércitos de Infantaria, 1992, 2 parte, pagina 49).
O que essas três altas autoridades afirmaram esta confirmada pela experiência
pessoal de cada um na guerra. E, por conseguinte, sobre a alma do adversário que se
deve agir para vencer.
Vencer e quebrar a vontade do adversário, e destruir no inimigo a fé em uma
possibilidade de resistência eficaz.
Obtém-se esse resultado pela batalha e agindo sobre sua Infantaria. Quando esta
– a única verdadeira detentora do terreno cede definitivamente, a porta esta forçada. Os
canhões inimigos se tornam troféus, os campos de aterragem são ocupados, as
esquadrilhas são capturadas como os estados-maiores e enfim, os chefes são desarmados
e seu poder se esvai. Toda a organização se desmorona sob o ímpeto irresistível da
Infantaria vitoriosa, apoiada pelas outras armas, diante de seu poder de massa, sua
imensa força de avalanche humana, seu poder de destruição que nada mais detém e suas
possibilidades de invasão ate o coração do pais.
Tudo isso não é resultado de um dia, nem mesmo de uma batalha. Mas também é
indiscutível que a hora da decisão é a hora do desfalecimento da Infantaria. Nada mais é
possível, em seguida, que o desenrolar das consequências, em condições relativamente
fáceis. E mesmo, e mais frequentemente, para não dizer sempre, o Alto Comando e o
Governo inimigo não esperavam a invasão torrencial, total, para se resignar ao
inevitável e capitular.
Para provocar, nas melhores condições, esse fraquejar do inimigo e poupar os
seus, conviria tratar de compreender a psicologia da Infantaria no campo de batalha.
Tentemos, por conseguinte, percebe-lhe os pontos capitais.
34

A surpresa produz sobre o inimigo, um movimento instintivo de recuo, uma


espécie de anestesia mais ou menos longa que retarda a defesa e, com mais forte
motivo, a reação. Durante esse momento de impotência, pode-se surpreender uma
pessoa ou uma tropa de tal modo que não se defenda ou se defenda mal.
Não se reduzem a isso os efeitos da surpresa. Não temos a pretensão de matar a
todos e nem o poderíamos fazer. Mas, como disse o General Cardot, essa destruição
total, que não é possível, também não e mais necessário para obter a vitória procurada.
Uma Infantaria surpreendida por um processo de combate novo, por um ataque em uma
direção imprevista, pela violência brutal dos golpes, tem seu moral enfraquecido, posto
em desequilíbrio. Esta próxima a acreditar em sua impotência. Aí temos a derrocada. É
a derrota.
A última guerra batizou as ações da artilharia que precediam os ataques, com um
nome muito justo: “a preparação”. Parece, em tempo de paz, singularmente modesto
chamar simplesmente preparação o fato de lançar, sobre uma Infantaria muito mal
protegida, toneladas de projeteis cujo simples deslocamento de ar dos arrebentamentos é
mortal. É entretanto perfeitamente exato e apropriado. Quantas vezes pessoalmente (e
tenho, ao escrever isto, duas recordações de grandes batalhas bem nítidas: uma de
Verdum, em abril de 1916, outra do Somme, em Saillisel, em outubro de 1916.)
observei, de minha posição momentaneamente indene, com a morte na alma, um
pelotão do meu batalhão ser, durante horas, em sua trincheira, alvo de um bombardeiro
medonho. Voltando a calma ia-se ver, havia perdas sem duvida, por vezes serias; mas o
pelotão estava longe de ter sido destruído, guardava um poder material quase intacto
para o ataque e a defesa eficazes.
Se não se pode esperar, com uma ação única, um efeito de depressão certo e
profundo, - e, contra tropas verdadeiramente aguerridas é esse o caso geral – deve-se
desistir de alcançar, em seguida, todas as suas possibilidades de violência. Quando uma
boa Infantaria suportar, sem ser destruída, um fogo de aparência arrasadora, e que a
intensidade deste diminui, ela diz, - o que e verdade – que quase nada do que e
humano e impossível de ser suportado pelo homem. E sua alma se afasta da fraqueza de
que se aproximou.
Se, ao contrario disso, vai-se aumentando a intensidade progressivamente, todos
os que estão da metralha sabem que escaparam ate aquele momento, mas tornam-se
conscientes de que estiveram muito perto da destruição. E, se imaginam não ter ainda
suportado senão uma parte do esforço inimigo, se sentem esse esforço crescer
gradativamente... sua fé na possibilidade de resistência enfraquece pouco a pouco, e
estão prontos, estão verdadeiramente “preparados” para a derrocada ante a Infantaria
inimiga que chegue.
Mas, guarda-se bem, por outro lado que nada de decisivo será obtido sem essa
ameaça pessoal e aproximada de destruição que representa o assalto. Não há Infantaria,
salvo o caso das de pior qualidade, que levante os braços em sinal de rendição, durante
ou depois de um bombardeio, por violento que ele seja. Ser atingido, ameaçado de
morte de longe, por mais potentes que sejam os meios destruidores em ação, é
suportável. Uma boa infantaria não abandona, por isso, a vontade de se defender.
Morre-se se chegada a vez; mas se não, sofre-se e espera-se.
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Mas chegue a granada de mão do inimigo vejam-se as “vagas” progredir, brilhe


a baioneta, “a arma branca”, entre as mãos dum assaltante visivelmente resolvido a
matar de perto, isto e, a matar inevitavelmente a todos os que não se renderem, e então a
fé na possibilidade de resistir esmaece, o defensor ergue os braços para se render e
acabar de uma vez com a situação, ou deixa-se matar sem resistir.
Vê-se é um meio de decisão essencialmente psicológico. E é isso que explica a
relativa pobreza do armamento empregado: uma pequena granada bem pouco eficaz em
comparação com os abuses, e uma baioneta que não se torna perigosa se não a alguns
centímetros do alvo. Mas esse armamento representa a ameaça aproximada da
destruição certa, muito mais assustadora par aquele que vai ser pessoalmente visado do
que todos os obuses, enormes que sejam, dos quais um só pode liquidar-vos, mas que
partem de uma distancia de vários quilômetros, que não vos procuram pessoalmente e
cujo tiro pode cessar sem que se tenha sido atingido. Como, ao contrario, esperar resistir
a vagas inumeráveis que vão chegando... escapar a essa avalanche humana vai
seguramente tudo submergir...
É assim que e preciso fazer agir a Infantaria no ataque. Depois da preparação da
Artilharia, a menos que tenha sido suprimida por motivos particulares (ausência de
obstáculos a destruir e possibilidade de uma surpresa completa) sob a proteção e ao
apoio de mascaras e de cortinas de fogo que vão permitir ao assaltante chegar à orla
exterior da posição de resistência inimiga, sem ser destruído, lançar o assalto, ou
melhor, os assaltos, que criem brechas ou submerjam a totalidade dos primeiros
defensores encontrados.
E depois, a avalanche humana que inundara tudo! Infantaria muito Infantaria.
Colunas fluidas e penetrantes que percorram toda a zona atacada da posição inimiga,
destruindo, desbordando a tudo que resistir, aniquilando dentro em pouco, toda a
resistência, como a água que venceu uma barragem, inundou uma área desagregada e
faz desabar tudo, apropriando-se em definitivo de toda uma região. Como para as águas
na inundação, o desbordamento, mais ainda do que o emprego das armas, é um dos
meios essenciais de decisão da Infantaria.
Como explicar a inegável eficácia desse processo? Parecerá, antes do mais, que
se uma unidade não estiver diretamente ameaçada, poderá resistir mesmo desbordada e
isolada. E não faltam ordens imperativas, de comandos países, para ordenar que
resistam, mesmo cercados. Salvos casos muito raros de defensores que fortificados em
todas as direções, fartamente aprovisionados e municiados, com um moral
excepcionalmente comandadas, isso é uma utopia. “O ruído do combate atrás de si
sempre desmoraliza as tropas”, diz Ardant du Picq.
E pensando um pouco, é fácil compreender a razão.
Há de início, sem dúvida, uma explicação fisiológica. O homem não tem olhos
para ver atrás. Estando já preocupado com o defender-se na frente, toda ameaça por trás
escapa aos seus meios de defesa e desorienta instintivamente.
Para este reflexo instintivo, não podem faltar conclusões lógicas. Se uma tropa é
cortada pela retaguarda, está separada de seus chefes, de reforços e de possíveis
socorros. É o isolamento, o terrível isolamento que priva o isolado do benefício de
poder defender-se no conjunto da organização. Está separado do todo. E existe ainda um
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todo? Até que ponto o inimigo levou a desorganização do conjunto? Privado de


esclarecimentos e “cogitando” esforçadamente sobre o que vê, - e que não é animador,
pois por todos os lados é o inimigo quem progride, - o homem se inquieta e antevê o
pior.
Além disso, para uma para uma pequena fração de tropa como para a grande
unidade, a liberdade da linha de comunicações é vital. Uma vez cortada nada mais se
pode esperar quantos aos suprimentos. Dai virá, bem depressa, a impossibilidade de
combate. Em breve não mais se poderá esperar o indispensável reaprovisiona-mento ...
E, cedo ou tarde, será o fim.
De fato, mesmo antes de ser cercado ou apenas ultrapassado simplesmente
durante o desbordamento, o infante se defende mal. Recorda-me que, diante dos
bosques de Saint-Pierre-Vaast, em 1916, a resistência de três metralhadoras que não
foram caladas, deteve completamente um regimento inteiro, que em poucos instantes –
instantes de silêncio trágico, porque durante êle muitos homens morreram sem que isso
causasse grande ruído – perdeu 1.700 praças e 33 oficiais! ao contrário, no ataque de 8
de agosto de 1918, diante do bosque de Moreuil, durante a progressão para o interior da
posição inimiga e o desbordamento de centenas de metralhadoras (soube-se o número,
pois que foram tomadas), que não formavam mais uma barragem de fogo contínuo,
ouvia-se o sibilar de inumeráveis balas em todos os sentidos. Mas poucos homens
tombaram, porque essas metralhadoras espalhadas, atuavam mal e atiravam para todos
os lados sem eficácia alguma.
Durante a crise do ataque, a Infantaria escapa, forçosamente, ao comando de
seus chefes imediato? Em que momento?
Sabe-se que esta pergunta foi uma daquelas que mais apaixonadamente
preocupam Ardant du Picq. Quando ele escreveu seu admirável livro Estudos sobre o
combate, não tinha participado da guerra e menos ainda de uma Grande Guerra. E caiu
mais tarde, mortalmente ferido, á testa de seu regimento, a 15 de agosto de 1870, no
início da campanha contra a Alemanha – trágico prêmio, sem dúvida, de uma atuação
ainda mais notável, por ter sido apoiada por uma experiência pessoal.
Não tendo feito a guerra e sentindo tão bem as realidades, queria os testemunhos
vividos. No questionário que ele enviou ás testemunhas autorizadas das guerras
anteriores com que se pode comunicar, havia sempre esta pergunta: “ Quando o soldado,
no ataque, escapa ao comando de seus chefes?”
Desejaria responder pessoalmente a essa pergunta, como se tivesse sido honrado
com seu interrogatório.
Para mim, e certamente para muitos dentre nós que tivemos ocasiao de fazer a
guerra em uma boa Infantaria, digamos em uma Infantaria muito boa, o soldado nao
deve escapar jamais ao comando de seus chefes, mesmo nos últimos momentos do
assalto.
Tenho presente em meu espírito, constantemente, a lembranca fascinante dos
olhos brilhantes e resolutos, mas calmos, de alguns oficiais durante a batalha ou
imediatamente, depois dela. Alguns estavam transfigurados. Recordo-me de um capitao
muito jovem, comandante de uma companhia de metralhadoras, que vi assim um dia em
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Verdum, e que parecia um jovem Deus brilhante, lúcido, comandante conciso e preciso.
Uma tropa nao escapa ao comando homens desses - nunca!
Citei algures, o nome dum tenente célebre no 94. Regimento de Infantaria por
sua decisao, sua energia e sua fria lucidez na batalha. Durante um ataque, depois de
numerosos assaltos parciais vitoriosos, encontra-se com sua tropa sob o fogo ajustado
de uma metralhadora inimiga. Com ordens breves, instantaneamente, divide sua secao
em tres grupos para atacar por tres lados. Ele próprio, com o grupo do centro, salta
sobre a metralhadora (sobre uma metralhadora atirando a queima roupa, imagine-se o
que isso significa) e domina os serventes junto de suas pecas. Uma tropa que executou
tal acao, escapou ao comando de seu chefe?
Algumas pessoas tem a idéia erronea sobre um ataque. Imaginam uma fugida
para a frente, uma excitacao, as vezes mesmo auxiliada pelo álcool. Que engano. É
preciso ao envés disso, - e é a única maneira de obter um bom exito, - considerar um
ataque como uma espécie de prova esportiva, terrivelmente perigosa e difícil, sem
dúvida, mas exigindo as mesmas qualidades de lucidez, de raciocínio frio, de presenca
de espírito, que um duelo por exemplo, que uma corrida ou um jogo de futebol. Aquele
que a disputa desatinadamente esta em péssimas condicoes para triunfar. E aqueles que
chamarei de arrebatadores da vitória, os comandantes de secao ou pelotao que tomam
decisoes minuciosas, arrastando consigo o sucesso geral, sao homens frios, aos quais a
tropa nao foge até o último momento.
Para apresentar em poucos tracos essa psicologia do campo de batalha da
Infantaria no ataque, queria tentar pintar, narrando um caso vivido, a fisionomia de um
ataque em 1918, tal qual é visto pelos infantes, ao correr de uma operacao de grande
envergadura coroada de um bom exito. Isso nao me parece inútil, pois dentro em breve,
no exército frances como nos outros haverá cada vez menos pessoas que tenham tido
ocasiao de participar de uma grande batalha. A ocasiao é, além disso, rara, porque a
derrocada extensa da Infantaria, que é o que procuramos, só podemos encontrar no fim
da guerra e na hora da decisao final.
Vou tomar como exemplo o ataque frances de 8 de agosto de 1918 (o dia de luto
do Exército Alemão, segundo Ludendorf), na região do bosque Moreuil. Sem nenhuma
preocupacao de tática, com ainda menor preocupacao de gloríola individual ou de
corpo, evitando mesmo narrar feitos darmas, vou registrar somente alguns instantaneos
do campo de batalha, algumas impressões, para procurar lembrar aqueles que vivera,
casos como esses, que facam compreender aos que não tiveram combatentes de
Infantaria, ao correr de um ataque poderoso e que teve exito, principalmente com a
esperanca de fazer ressaltar suas reacões de arma coletiva.
A noite de 7 para 8 de agosto de 1918 foi calma na frente do I Exército. Diz-se
que a véspera de um ataque é calma, quando não se ouvem mais que as poderosas
explosões da Artilharia, em tiros longínquos e, de certo modo, espaçados.
São os canhões de grosso calibre que cumprem metodicamente seu mister.
Destroem as redes de arame ou batem certos pontos que se lhes fixou antecipadamente,
considerados importantes. Mas não se ouve nenhuma dessas furiosas manifestações da
Artilharia de Campanha indicadoras de que as Infantarias estão em ação, preparando ou
realizando um ataque, para o que ela lhes dá seu apoio direto.
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O ataque é para as 4:20h, isto é, exatamente para o alvorecer. Nesse momento


cuidadosamente estudado nos dias anteriores, a escuridão, que permitiu os movimentos
para as zonas de reunião, nas melhores condições, vai cessar. Ao despontar do sol, vai
ser possível partir ao ataque em terreno desconhecido, tendo já uma leve claridade que
permitirá distinguir os objetos em redor.
Noite escura, ainda. Entretanto, cada um enxerga o suficiente para caminhar em
terreno conhecido, pois não há noite inteira, habituando os olhos a obscuridade e
distinguindo o suficiente de tudo que está próximo. Meia-noite. É tempo de se
deslocarem, certamente que ainda não para as linhas de partida (passou a moda, depois
de muito de fazer esses movimentos no terreno que o inimigo pode perceber), mas em
pleno campo, colado as redes de arame inimigas e em uma formação cerrada sobre a
testa. Vai ser preciso, realmente, saltar na hora H e penetrar no terreno inimigo antes que
sua barragem de deter tenha tido tempo de ser desencadeada.
Silenciosamente caminha-se na noite. Ás vezes bate-se contra uma estaca de
cerca de arama (contra as nossas, que estamos atravessando) e imediatamente
estacamos. Não conviria alertar o inimigo. Ele reagiria com seu fogo. É uma questão de
vida ou morte. A massa s3 forma silenciosamente, sem luz e sem barulho. Dar-se-ia
enorme monstro negro de movimentos lentos. A esquerda da divisão francesa, os
canadenses, menos disciplinados ou imprudentes, ascendem algumas lanternas portáteis
e pagam caro por com a chegada dos obuses.Felizmente ,entretanto, os alemães não
desconfiam do que os espera e creem nas rondas.
Chegamos às cercas de arame inimiga. As brechas, abertas com uma silenciosa
destreza de selvagens, estão bem feitas. Tudo bem...até aqui .É impressionante ver essas
massas sombrias , densas , agora imóveis. O regimento inteiro esta reunido num terreno
de 800 metros de largura por 250 de profundidade. Que imprudência, pensa-se. Se o
inimigo martelar esse bloco compacto de 3000 homens desabrigados, que hecatombe! E
verdade. Mas vai ser indispensável, em 3 a 5 minutos lançar toda essa gente sobre o
terreno inimigo. Essas três a cinco minutos são o escrito tempo que decorrerá,
verossimilmente, entre os foguetes de pedido de tiro os primeiros inimigos abordados e
a chegada, em massa dos obuses alemães. Uma vez desencadeado esse tiro, quem
passará esta barragem, durante o tempo que ela durar ? Além de que se pós escapar sua
zona de aplicação antes de seu desencadeamento, não somente se consegue escapar
dela, mas estarão terminados durante muito tempo os risco dos obuses inimigos. E isso
por que, sem informação precisas sobre a progressão do ataque, durante quase toda a
jornada artilheiro da defesa atirará, durante horas, sobre seus objetivos iniciais sobre a
base da partida do ataque. Nunca ousara agir no interior de seus que ainda resistam
imprudência, então esse amontoamento livre e a menos de 100 metros das sentinelas e
dos pontos de espera. Imprudência aparentemente quase louca, pode ser, mas
raciocinada. Se magnífico, nisto como em tudo obter um grande resultado sem armas
muito. E a experiência já mostrara e nesse dia mostraria novamente esse modo de
proceder da bom resultado frequentemente.
Não é maravilhoso ver compreendido um raciocínio tão audacioso e sutil, por
toda essa massa , vê-la aplica se, com perigo de vida uma tal precisão e tal silencio, vê-
la agir coletivamente, como grande felino que se esgueirasse , sem qualquer receio para
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ficar com a posição , pronta para saltar sobre a presa?


Como se esta longe das descrições supostamente extremas batalhas onde se viam
homens incapazes de compreender qualquer do que se passa, agindo estúpida ou
ruidosamente , exaltados ou vencedores quando o eram, sem nada terem feito para isso e
terem compreendido!
Cada qual olha seu relógio. São 4,10 hs. Dentro de onze minutos partiremos.
Vejamos - de longe e de um golpe de vista, erguendo-se apenas no seu próprio lugar,
pois não se pode pensar em uma revista reveladora- se todos estão a postos. E
procuremos imaginar o que pensa essa tropa.
O estado de alma coletivo dessa infantaria que vai, dentro de alguns momentos,
lançar-se nessa fornalha é, nesse momento, bastante simples, fazendo-se naturalmente
abstração dos pensamentos individuais que não nos interessam aqui. A ação parece a
todos bem preparada e é inevitável. Um espírito de corpo muito desenvolvido, soldou
em um conjunto único, depois de algum tempo, todos esses homem. A organização
dessa massa dá-lhe capacidade e eficiência. Com seus chefes a testa, cada um em seu
posto, em uma formação muito cerrada e muito regular, facilitando a segurança e o
exemplo , as unidades subordinadas tem missões precisas e , aqui , tudo se passou
exatamente como fora previsto. O armamento é poderoso e esta em bom estado. Os
métodos de combate são conhecidos e já deram prova de si. Vimos meios consideráveis
de infantaria e de artilharia dispostos para o esforço comum. A expressão do conjunto é
calmo, resoluta e confiante. Poucas circunstâncias, na guerra permitem esse grau de
condensação da alma coletiva de um regimento de infantaria.
4,20 hs. Bruscamente, clareia o horizonte a retaguarda. Vê-se uma barra de fogo
formidável que rasga a escuridão. Tem quilômetros de frente e quase nenhuma solução
de continuidade. São os clarões das bocas das peças de Artilharia que, se bem dispostas
em profundidade, parece, de longe, esta de linha. Depois, ouvi-se um estrondo terrível e
característico. O som caminha menos rápido que a luz, os obuses um pouco menos
depressa ainda, mais não muito. E de repente, todos esses canhões que a tiraram de uma
vez, criam uma abóbada de aço estridente por cima das massas que vão atacar. Tensos,
emparelhados uns aos outros uma precisão admirável, os obuses de 75 aniquilam as
primeiras linhas inimigas. Durante um minuto ha uma mistura de poeira, de terra e de
clarões sobre as trincheiras adversárias. É a barragem rolante que se estabelece e se fixa,
imóvel nos primeiros sessenta segundos para que se tenha tempo de cerrar sobre ela.
Todos os oficiais tem exatamente a mesma hora e estão com o relógio a mão. Por
telefone, durante a noite, a oficial foi passada a todos. É necessário não se enganar nem
em meio minuto para mais sobe pena de alerta muito cedo o inimigo e provocar a morte
dos camaradas vizinhos antes de sua partida. Meio minuto para menos, por outro lado,
poderá fazer apanhar pela barragem da artilharia inimiga os últimos elementos de sua
própria tropa.
4,21 hs. F a hora h fatídica, a hora do ataque.
Todos partem juntos cerrados sobre a testa, músculos prontos, os tendões
distendidos, a granada na mão. A testa das colunas, mas avançadas, os oficiais serram
afoitamente sobre a barragem rolante , que é sua couraça , afim de saltar sobre o inimigo
antes que ele tenha dito tempo de sair do abrigo e empregar suas metralhadoras.
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Ouve se tiros de metralhadoras inimigas. Não muitos. Quando se ouve numa ocasião
como essa o ruído de um número muito importante de balas inimigas, é sinal de que o
ataque falhou.
Seria infantilidade, tentar nesse momento, apenas com um escalão de fogo de
infantaria, dar apoio ao inicio do avanço. Não? Em um caso como este, toda esperança
de sucesso reside na submissão dos primeiros elementos inimigos, desde o primeiro
momento, desde que caem em primeiros tiros da nossa barragem rolante.
Realmente. A primeira linha inimiga esta rompida. Toda massa do regimento
penetrou como um bloco na posição inimiga. Agora a barragem da artilharia adversária
pode ser desencadeada. Foi atravessada deterá talvez as reservas divisionárias, mas
estas ainda estão longe e não intervirão se não, mas tarde.
Uff! Respira-se. Agora a batalha de infantaria, em condições relativamente boas,
vai começar. É o que chamamos a travessia da posição inimiga. Posição, não há
dúvidas recheada de centenas das metralhadoras, só na frente do regimento , mas defesa
descontínua devida as brechas que vão permitir infiltrar se desborda e inundar de infante
toda a posição.
É mister que o dispositivo ganhe novamente profundidade. Deixando os
primeiros elementos avançar colados a barragem rolante, em últimos elementos param.
Um dispositivo normal de ataque se constitui dois batalhões na frente: os 2 e 3 , um
batalhão em segundos o escalão: o 1°. Entre os batalhões entre as companhias dos
batalhões da frente retaguarda , as distâncias regulamentares são retomadas.
Agora o dia começa a despontar. Caminha-se, ia dizer tranquilamente, é um
pouco de exagero, mas posso dizer muito lentamente, na cadência da barragem rolante,
100 metros em 3 minutos, o quilômetro em meia hora. Em tempo de paz, num campo de
manobra, parece uma velocidade de lesma, absurda e perigosa. Entretanto é a boa
velocidade adotada depois de numerosas experiências. Efetivamente é pelo menos de
poder alcança-la novamente. Alguns trabalham duro neste momento, enquanto outros
fazem percursos mais fáceis. Deve se sucessivamente, desbordar, investir, assaltar,
reduzir metralhadora por metralhadora ninho de resistência por ninho de resistência...
Já chegam os primeiros prisioneiros. Praças, oficiais têm os braços erguidos. faz
se lhes sinal para irem para trás. Ninguém os acompanha; estão desarmados, talvez nem
todos, mas estão todos vencidos. A derrocada da infantaria os atingiu não tornarão a
erguer se para a luta; e o campo de batalha da retaguarda, esta cheio de tropas segundo
escalão que os vão prender, grupar encaminhar mais para a retaguarda.
Alguns incidentes. Um carro de combate (tanque) inglês vindo do setor vizinho,
tendo perdido a direção dirigi-se contra nos. Desce do carro um rapaz louro sem gorro,
cabelos jogados para trás como um jogador de tênis. Acabara de esmagar um soldado
francês que avançava quando seu carro passava por um talude pensa ele.
O inglês pergunta qual o caminho certo dizendo de maneira muito vaga.
Agradece sobe ao carro põe no em movimento e dai em diante passa ao ataque com os
nossos combatendo sozinho e sua própria conta.
Noticias. Não sabemos de onde vêm, pois ainda há relatos escritos. São muito
precisas. Os 2º e 3º batalhões quê são os do 1º escalão , progridem. Algumas perdas.
Não grandes. O pequeno Subtenete de Cazenove morreu. Passa numa padiola. É triste.
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Tão jovem fisicamente agradável e calmo, conduziu bem e energicamente sua seção,
mas parece que cerrou muito sobre a barragem rolante e um tiro mais disperso o
vitimou. Triste resgate de uma necessidade que poupou tantas vidas.Provavelmente
salvou muitas vidas de sua seção, fazendo com que, quase com os obuses, caíssem seus
homens sobre os infantes inimigos e permitindo – lhes até mesmo sem feri-los.
À esquerda desenrola um violento combate de trabalhadores. É o bosque Cécille
que resiste ao ataque do 2º Batalhão. Demora algum tempo. É mister descobrir,
contornar ou destruir essas metralhadoras. Descobre-se mais ou menos a direção de
partida das balas, ma erra-se em 500 metros de distância. Finalmente unia coluna
vizinha, do 3º Batalhão, por sua simples progressão faz cair a resistência ultrapassando-
a.
Tiros de morteiros, assaltos parciais, reorganização de dispositivos que os
capitães fazem junto a um desvão do terreno. Em suma, uma série de combates
particulares de assaltos particulares.
O segundo objetivo esta alcançado. Dispõem-se em profundidade além da orla
do Moreuil, as unidades que a atravessam. Uma companhia do batalhão da direita,
perdida no bosque não se reunia. Foi substituída por uma companhia do batalhão
reserva.
Durante uma hora e dez minutos faz-se uma longa parada. Nenhuma reação da
artilharia sobre nós. Não há mais inimigos em ação ou aprisionadas. Ao contrário,
agora, a barragem da Artilharia inimiga se desenvolve sem cessar. Pouco nos interessa,
está fixada há mais de dois quilômetros a nossa retaguarda, sobre a posição inicial, pelas
razões que expusemos anteriormente. Não recebemos seus obuses senão muito mais
tarde, em Mérziéres.
Caminha-se de pé, durante essa parada. Os oficias conversam como em
manobras que não aproveitassem bem o terreno. E por certo num caso desses, em
tempos de paz, o general diretor da manobra não deixaria de se indignar, na critica,
contra os oficiais que não se ditam no terreno descoberto e que “seriam seguramente
mortos na realidade”. Paciência, eles se entrincheirarão daqui a pouco, quando
retornamos e contata com o inimigo, em frente de Villare-Aux-Erables. Agora, não
recebemos nenhum projétil. E não se creia que o terreno é coberto. É um imenso declive
de dois quilômetros, ao sul do bosque de Moreuil. Já somente alguns raros montículos
de palha, constituindo bem pobre coberta. Felizmente o inimigo está longe. As tropas da
segunda posição, és posto de comando, as defesas, sobretudo as reservas deslocando-se
a toda pressa nesse momento ( saber-se-á depois), estão longe do nosso alcance e fora
das nossas vistas. Nesse momento, sempre que possível, conviria onde se está, informar-
se oralmente, reorganizar o dispositivo, voltar à ordem normal. Sabemos que vamos
retornar o ataque á hora H + 3,23 h (7,43 hs) prevista na ordem inicial e que nos iremos
chocar outra vez com as metralhadoras. Mas não teremos mais um dispositivo tão
contínuo, pelo menos tão denso como a princípio. Por outro lado, os que nada sofreram,
parece, não morrerão nesse combate. Porque não haveria de continuar assim? Um
sentimento muito curioso, feito de fatalismo e de uma confiança baseada sobre a sorte
tida no passado, faz com que muitos pensem sejam os tiros mortais para os vizinhos,
mas não para eles.
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Partimos novamente. A barragem rolante do ataque, que recomeçou, é


naturalmente bem menos densa do que antes. Muita munição foi consumida e os
deslocamentos da artilharia estão-se realizando, Um tiro de artilharia pesada amiga,
muito curto e mal apontado (erro de pontaria ou erro de cálculo), cai em cheio sobre a
10ª Companhia. Um oficial é lançado ao ar e cai mais adiante, felizmente sem nada
sofrer. Mas isso ocasiona um claro nas linhas atacantes, neste momento, já não tem
importância muita j grande. Vamos avançar dos dois lados da elevação. Aparece, depois,
a 153ª Divisão que se deve intercalar entre 42ª Divisão e sua vizinha de partida, a 37ª
Divisão, precedida de carros leves, vai estender pelo oeste, até Villers-Aux-Erables.
Longa parada diante de Villares-Aux-Erables, sobre uma lombada batida pelos
fogos das metralhadoras inimigas. À esquerda, pode-se progredir. Conquista-se uma
bateria inimiga e depois muita outras. Os serventes rendem-se. Seu comandante disse-
lhes, parece que 0resistissem e partiu sem dúvida como Ugolino, sacrificando seus
filhos, mas conservando-lhes um pai. Os canhões inimigos. Que não têm mais a
proteção da Infantaria na frente são presa fácil tomar de perto, pois não são perigosos
senão a partir uma certa distância. E os infantes, assaltando-os de vários lados,
aprisionam rapidamente os serventes.
Visto que podemos progredir pela esquadra, por lá e que covem encaminhar as
reservas. Lança-se lá o 1º Batalhão, o batalhão reserva regimental. Lá é que ocorre, nas
saídas sul de Villers-Aux-Erables, o incidente da metralhadora que aludimos acima: do
tenente que empenha três colunas os seus homens e por fim salta sobre os serventes, e
os captura.
Villers-Aux-Erables, envolvida pela direita e pela esquerda, penetrando pelo
centro, cai prisioneira. Sem parar, entra-se na povoação de Méziéres, 500 metros adiante
e que não é defendida. Sofremos aí os efeitos de obuses alemães e franceses que, com
intuitos diferentes provavelmente, martelam a povoação. Passamos depressa e deixamos
á essa artilharia adversária casas vazias para destruírem, como quiserem. Seria
impossível, nessa situação, suspender fogos franceses. Não se tem mais ligação,
praticamente, com a bateria aliadas e, no meio desses arrebentamentos, dessa poeirana,
desses destroços de povoação em chamas, nenhum sinal de foguete seria percebido.
Ao atravessarem a povoação, entretanto, alguns homens acham tempo para
desligar e levar aparelhos telefônicos alemães, como lembranças. Outros descobrem
café ainda quente, feito pelas telefonistas inimigas e que estes não tiveram tempo de
beber.
Passam sempre prisioneiros. Um oficial alemão atira um cigarro aos homens que
encontra, sem dúvida para torná-los menos rigorosos. Começa a explicar em francês que
morou muito tempo em Paris e procuram conhecimento comum com os oficiais
franceses encontrados. Estes a mandam para o diabo, para a retaguarda. Não há tempo
aqui para ocupar-se com eles. Atrás, outros menos ocupados poderão leva-los em
consideração e interroga-los. Sob as balas de suas próprias metralhadoras que atiram
sobre nós ele baixa a cabeça e se afasta correndo. É curioso como os prisioneiros tem
mais medo dos seus próprios projeteis do que dos assaltantes. É que a famosa derrocada
os atingiu. E depois, visto como já se submeteram, que se renderam, pensam, sem
dúvida, ter agora a vida salva.
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Após a conquista de Méziéres, está finda a tarefa do regimento da testa,


conquistada os objetivos que lhe cabiam. Os homens deitam-se no chão, em uma
formação em profundidade, prontos a deixar-se ultrapassar pelo regimento que deve
tornar à sua conta o prosseguimento do ataque, Começa-se a ver muitos cadáveres sobre
o terreno.
O 94ª Regimento de Infantaria é ultrapassado pelo 332ª que partira inicialmente
em segunda linha e deve atacar Fresnoy.
Parece não haver muitos inimigos mais, e a defesa está desorganizada. Mas a
tropa atacante parte, desta vez em pior ordem do que pela manhã. Também o seu
impulso é menos poderoso. Há, é verdade, 9 quilômetro de avanço da divisão dentro da
posição inimiga. Por outro lado, convenhamos, não se pode mais fazer questão, neste
momento do ataque, de um apoio de artilharia tão cerrado tão bem ajustado.
O combate torna-se confuso, lento, monótono. Essa tropa, com menos ordem
perdeu a coesão. Sua alma coletiva tem menos força, sua vontade de vencer não é tão
grande. Por isso, um inimigo relativamente bem fraco, mal organizado, composto de
reservas arranjadas ás pressas e instaladas sumariamente, mas ainda não atingida pela
derrocada, logo a detém. Entretanto é preciso chegar a conquista dessa Frenoy antes do
fim do dia. Enviando-se ordem lança-se reconhecimentos e são enviados pedidos de
apoio.
A artilharia e o Q. G. Divisionário mudaram suas posições. Monta-se um ataque
parcial, reforça-se enormemente a tropa organizada e aumenta-se os meios materiais
nessa frente, pois a Infantaria é menos boa, tendo nesse momento menos coesão moral.
Auxiliada por carros e um apoio pesado da artilharia, utilizando o
desbordamento e a penetração, o 332ª Regimento de Infantaria, o 16º Batalhão de
Caçadores a pé e os atiradores da 153ª Divisão acabam por se apossar de Fresnoy.
Outros agora vão substituir a 43ª Divisão, visto terem atingidos seus objetivos.
Mereceu repousar e como já tive ocasião de dizer, tem necessidade de repouso. Não
pede para continuar o ataque e, satisfeita com o dever cumprido, não experimenta essa
utópica embriaguez do sucesso que, segundo certos teóricos, deveria fazê-lo desejar
ardentemente outros sucessos e... Outros perigos.
Amanhã, outras divisões continuarão e desenvolverão o ataque. Haverá. À
direita, o envolvimento de Moreuil. Esforços laterais sucessivos aumentaram a brecha
para os lados.
Mas isto diz respeito a tática e fogos à exposição psicológica visada.
Tudo isto esteve desenvolvido um pouco confuso, como a realidade. As ações
improvisadas, não foram dissimuladas. Não procuramos uma exposição desta das fases
da operação, uma vista de conjunto que o combatente não pode ser no decorrer do
combate. São impressões sucessivas, insignificantes ou graves. Há momentos em que se
vê claramente a situação, outras em que se percebe ainda o que significam os ruídos e os
movimentos confusos percebidos.
Quisera que alguns dos suspeitos marcados que pretendi pintar fielmente,
dessem idéia exata da fisionomia psicológica dum dia de batalha durante um ataque de
Infantaria.
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Examinamos, penso, de passagem, a brutalidade o ataque, o desbordamento, as


avalanches humanas que penetra uma posição, o assalto. Percebemos a força da alma
coletiva e dos efeitos da manutenção da ordem e da organização, da coesão psicológica.
Vimos a sucessão de momentos de crise e de calma, a corrida para a morte e passeio, a
resistência e depois a derrocada da Infantaria inimiga, a Vitória.
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CAPITULO VI

Psicologia do campo de batalha – a defesa da infantaria – boatos do campo de batalha


– o exagero – o contagio do medo – as informações sobre o ataque inimigo iminente
fornecidas pelos desertores da noite precedente – a vontade de resistir e a coesão
psicológica são as principais forças morais da defesa – os vazios da linha de defesa –
apesar das destruições e dos avanços inimigos convém esforçar-se continuamente por
restabelecer a ordem e a confiança na defesa, de ressoldar as partes separadas do
conjunto defensivo – fisionomia da defesa da infantaria (Verdum, em 1916)

Passemos agora para o lado da defesa, da defensiva que quer triunfar, pois já
vimos, no capitulo anterior, estudando o ataque, algumas reações e alguns sentimentos
do defensor durante a derrota. E estudemos a psicologia do campo de batalha da
infantaria, na defensiva.
Os boatos do campo de batalha, frequentemente são exagerados e pessimistas no
ataque, são ainda mais aumentados na defensiva.
O exagero é seu primeiro característico. Propala-se que tal unidade foi
aniquilada e saber-se-á depois que não teve mais que perdas sensíveis, talvez mesmo
poucos mortos tudo que se pode saber, durante a ação, com relativa certeza, é isto: tal
unidade resiste em tal lugar outra se deu e não está mais em sua posição inicial. E mais
ainda, não se tem informações de todas as unidades. Fica-se muitas vezes, durante
horas, na ignorância absoluta do que se passa ou do que aconteceu mesmo em partes
importantes do dispositivo. A intensidade do tiroteio da artilharia inimiga, muito
poderosa por quanto o adversário ataca e está, portanto, com superioridade, torna muito
difícil e as vezes impossível o deslocamento dos estafetas ou agentes de ligação. Quanto
as linhas telefônicas, acham-se quase todas cortadas e só poderão ser reparadas a noite.
Como se transmitem esses boatos? Às vezes é muito difícil verificar. O mais
frequente é de um soldado para outro, pelo encontro de um ferido transportado, de um
agente de transmissão que passa somente a pouco e pouco, certas informações escritas
trazem alguma certeza e precisão.
Uma Outra particularidade dos boatos do campo de batalha é seu caráter
contagioso. Os boatos se difundem rapidamente e vão longe; como já dissemos, são
geralmente pessimistas, e propagam facilmente o medo. Como uma moléstia que se
espalhasse instantaneamente e com tanta mais intensidade quanto mais fraco estiver o
moral, vi o medo levando-nos a proximidade do pânico. Em momentos de crise desse
gênero mais ainda do que o raciocínio que se possa empregar ou dos encorajamentos
que se possam dar, é a voz calma do chefe que produz maior efeito e mais
decisivamente a calma. Frequentemente, alias, a desassossego, fuzilaria descoordenada
impedidos de tiros de artilharia sem que haja qualquer movimento, qualquer ação,
mesmo que por parte do inimigo.
Depois de um ataque fracassado é que os boatos alarmantes se propagam mais
facilmente e são mais suscetíveis de semear o pânico. As unidades ainda confusas,
muito provadas, sem chefes verdadeiramente qualificados (tendo sido a maior parte dos
titulares de comando mortos ou feridos), estacionam a noite, desamparadas, em contato
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com o inimigo que quebrou seu ataque. Felizmente em tais casos é muito raro que o
inimigo tenha meio para passa a ofensiva.
Recordo-me, durante a batalha do SOMME de uma noite dessas, a 26 de
setembro de 1916. Algumas passagens marcarão bem o estado moral da infantaria nessa
situação. Há 25 de setembro, o 94 regimento de infantaria atacou na frente de Rancourt
com entusiasmo tão magnífico que o coronel Moisson, comandante do regimento
vizinho, o 151º, que assistiu de um flanco a ação, escreveu ao comandante da 83ª
brigada para expressar sua admiração. Estamos, então, em presença de uma tropa que
tem, inicialmente um moral muito elevado. Infelizmente o ataque fracassou e as perdas
foram consideráveis. A maior parte dos oficiais foi morta ou ferida. Alguns batalhões
foram reduzidos a menos de 100 homens, e companhias passaram a comando de
sargentos.
Durante a noite de 25 para 26, o comandante do regimento, dois comandantes de
batalhão e um posto de socorro de batalhão se amontoam junto em um único abrigo que
existe e em que se poderiam ler ordens e ler informes a luz de uma vela. Pequenos fatos
particulares mostrarão a atmosfera reinante.
Os feridos chegam continuamente a esse posto de socorro¹. Se temos, por
exemplo, um tenente – atlético e magnífico exemplar humano – que agonizara no
campo de batalha o dia inteiro. Via-se o seu braço agitar-se no ar, entre as explosões de
granada, mas não se pudera ir recolhê-lo, de dia, pois caíra em uma lombada varrida por
metralhadora. Chega moribundo, em uma padiola; não se lhe dirá que seu irmão, como
ele oficial do regimento, mas de outro batalhão, morrera nesse mesmo dia!
O comandante do regimento que adormecera, vencido pela fadiga, ergue-se de
repente, agita os braços bradando: “as armas”. Nada mais que um pesadelo. Mas a
realidade não difere muito daquilo que ele sonhara... o telefone chama. Querem saber da
retaguarda se podem dar a medalha militar a um soldado ferido as porta da morte. Isto lá
era comum; mas o trágico era que se tratava do irmão de um comandante de batalhão
que tinha, ali mesmo seu posto de comando. Este, felizmente, tinha saído e se lhe
incumbira momentaneamente a triste nova. Ele sabia que seu jovem irmão estava ferido,
mas acreditava que ligeiramente atingido em um braço. Mas a verdade era que após
atingir a parte posterior de um braço, a bala atingira o coração.
Compreende-se que em ocasião assim, seja ampliado o menor ruído do inimigo.
Os tiroteios multiplicam-se, contínuos, na frente. Felizmente pouco se ouve a artilharia.
Mas corre o boato – agente de transmissão chegam e o espalham – de que o inimigo
atacou e penetrou profundamente em nossas linhas, e os homens começam a refletir...
Antes de dar ordens (e que ordens se poderá dar se o batalhão não tem reservas¿)
é preciso ir ver. Uma rápida volta pelo terreno, em companhia de uma agente de
transmissão, mostra que não ouve nem há no momento, ameaça alguma de ataque.
Apenas o contato é muito estreito – entre os destroços adversários, poder-se-ia dizer – e
_______________________
¹ É um procedimento deplorável, por todas as razões de ordem material e moral e de
possibilidades de serviço e de trabalho, reunir um posto de socorro e postos de comando. No caso em
foco, quiz-se, depois de um curto avanço, utilizar o único abrigo existente. Teria sido muito melhor fazer
instalar mais longe, mais à retaguarda, o posto de socorro.
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as metralhadoras dos dois lados atiram frequentemente. É tudo. Nenhuma progressão do


inimigo foi se quer perseguida.
Outro exemplo que nos mostra que, com frequência nestes momentos de moral
enfraquecida, os soldados e ate certos chefes nada sabem, e nada fazem para saber e
creem e ameaças inimigas sem que existam realmente nem inicio, vai narrado.
A 26 de agosto de 1917 em Verdum, depois de ataque limitado e coroado de
êxito, diante dos bosques Shaume e das fosses, um comandante de batalhão dando,
como é necessário fazer sempre que possível um giro por seu batalhão ao cair da noite,
foi obrigado a esclarecer pessoalmente ao comandante de pelotão cujo os homens
estavam aferrados ao solo, sobre a situação de seus vizinhos. Alguns desses estão,
entretanto, a menos de dez metros de distancia, mas eles lhes ignoram a presença, é
verdade que 10 metros na zona batida pelas metralhadoras, é por vezes, longe!
Entretanto, pelo menos ao escurecer, não é muito difícil levantar depressa a cabeça e
estabelecer comunicação pela vista.
Continuando seu giro, este comandante de batalhão, sem querer, atravessa a
primeira linha. Está-se em terreno conhecido e há no local, intervalos irregulares e
muito grandes entre os homens. O inimigo está tão pouco ativo que não se recebe
nenhum tiro da infantaria, apesar de o dia ainda não ter desaparecido completamente.
Quando, percebendo seu engano, volta para sua primeira linha, sempre de pé e andando
tranquilamente, seguido de agentes de transmissão, causará estupefação aos grupos mais
avançados de seu batalhão com sua chegada do lado do inimigo. Estes, passivos e
inquietos, aferrados ao solo, armas preparadas estavam a espreita como sobre a ameaça
imediata de um ataque inimigo.
Nesses caso, sempre se tem de admitir a densidade da primeira linha, repô-la em
ordem e de fazer retomar a profundidade a todo dispositivo.
Iminente a um ataque inimigo, quase sempre se esta prevenido e informado (pelo
menos durante a ultima guerra era assim) por desertores que atravessam as linhas, na
noite anterior a do ataque, vi não só praças varias vezes, como uma vez um oficial
alemão desertar nessas condições. Este último contou que se extraviara quando em uma
patrulha; mas, como estava sem armas e se rendeu prontamente, a explicação não
resistiu muito. É que a perspectiva de saltar, na manhã seguinte, à hora 11 sobre o
inimigo, é uma dura prova para o moral; e alguns preferem a desonra e o risco de uma
bala de um sentinela, ao perigo terrível das metralhadoras da manhã seguinte.
Felizmente, se há desses lamentáveis exemplos de fraqueza, tanto mais graves
quanto, pelas informações precisas dadas a respeito da hora e de pormenores do ataque,
esses infelizes serão causadoras da morte de muito dos seus camaradas da manhã
seguinte, pois evitam a surpresa, há também exemplos admiráveis, quase sobre-
humanos, de consciência e de espírito de dever, seja no ataque, seja na defesa. Vou citar
um que nos ajudara a compreender a mais essencial qualidade da infantaria na defesa,
qualidade mais importante ainda que o valor do armamento e a importância dos efetivos
sobreviventes. Quero dizer: a vontade de viver, a vontade de se defender, a vontade de
se reunir aos camaradas vizinhos. Coesão psicológica e vontade de lutar ate o fim, são
as principais forças morais da defesa. E, nesse caso, como no do ataque, o sucesso e, em
definitivo, uma vitória psicológica.
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A 31 de outubro de 1916, começa às 10:45 horas, um horroroso bombardeio ao


segundo batalhão do 94 regimento de infantaria, que ocupa as ruínas de Saillisel. Toda a
jornada, a preparação inimiga – ou coisa parecida – continua. À noite, um prisioneiro
alemão atravessa as linhas e rende-se conseguimos dele a certeza do ataque para a
manhã de primeiro de novembro, informação essencial que seria necessário, a todo
risco, fazer chegar ao conhecimento do comandante, na retaguarda como proceder? O
bombardeio cortou todas as comunicações telefônicas tentamos em vão repara-las. Dois
agentes de transmissão enviados não voltaram e nos os vimos desaparecer. A passagem
parece impossível. Entretanto é uma questão vital, não somente para o batalhão, mas
mesmo para a firmeza desse ponto essencial da defesa, obter reforços se possível, e, em
qualquer caso, uma ação poderosa e bem localizada da artilharia.
O comandante do batalhão dirige-se ainda a um agente transmissão e, depois
dele explica a importância da informação a levar e de lhe ter dado um papel com a
informação escrita, diz-lhe:”é evidente que esta missão que te dou é dura, mas é preciso
passar. Não te obrigo a partir agora. Escolheras a ocasião!”
Ao cabo de uma hora, ele ainda não partira. Foi então que um telefonista, o cabo
Mahieux, procurou o comandante do batalhão e lhe disse: “Meu capitão, X... não
partirá; é muito jovem, e não tem coragem, se o senhor quiser eu irei”. Essa não era uma
obrigação do cabo Mahieux, nem lhe cabia a vez de partir, pois já tinha percorrido suas
linhas telefônicas várias vezes tentando conserta-las. Mas não havia escolher; Era
preciso aceitar esse devotamento. O que torna tal ação ainda mais meritória é que o cabo
Mahieux que acabara de receber a medalha militar, nada tinha a ganhar pessoalmente,
correndo voluntariamente este risco terrível.
Por uma sorte inesperada, depois, pode-se imaginar, de esforços inauditos,
paradas, saltos nas crateras de obuses, uma espécie de corrida de obstáculos misturada
com caçada, ele passara, entregara a mensagem e regressara. E o magnífico resultado de
seu ato heróico será que, na jornada seguinte, ao amanhecer, o General comandante da
42ª Divisão poderá utilizar todos os seus fogos de artilharia, preparados para um ataque
parcial que deveria ser realizado algures, em uma barragem de deter colocada em cheio
sobre o ataque inimigo, no momento exato de sua partida sobre Saillisel.
Ao regressar, quando o comandante do batalhão agradecia ao cabo Mahieux,
apertando-lhe a mão, este, com lagrimas nos olhos, se contentou em responder:
“Obrigado, meu capitão; Será que mereci agora minha medalha militar¿!!” O admirável
soldado tinha sido tocado no furacão por um raciocínio algumas vezes justo, mas falso
em seu caso, exprimindo que os graduados e homens dos serviços gerais, mais perto do
coronel tinham, por vezes, mais facilmente recompensas que os simples homens de
fileiras.
Para fazer ressaltar, por ocasião dessa jornada o papel de vontade na defesa, direi
simplesmente que, ajudados pela artilharia de que falei acima e que foi eficaz apesar de
não ter impedida a partida dos assaltantes, foram mais ou menos 100 homens, com 3
metralhadoras, e 3 fuzis-metralhadores utilizáveis, que pararam o ataque alemão nesse
ponto, a 1 de novembro. Que efetivo e que armamento para um setor de batalhão! As
perdas devidas à preparação tinham sido terríveis e a maior parte das armas automáticas,
enterradas na lama pelo bombardeio, tinham-se tornado inutilizáveis, apesar das
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trincheiras e no meio dos obuses. E foi ali que um oficial, o tenente Massard, voltando-
se para seus homens que lhe mostravam, desesperados, seus fuzis-metralhadores que
não funcionavam, gritou-lhes, apanhando algumas do chão: “Não tem fuzis¿ Façam
como eu, atirem pedras!”
Felizmente para a defesa, quando os assaltantes inimigos chegam quase ao
contato, a artilharia inimiga é forçada a suspender fogo para não atingir os seus. E
frequentemente bastam algumas armas automáticas, algumas granadas nas mãos de
homens bravos e resolutos, para quebrar de ponto o ímpeto inimigo e destruir as
primeiras vagas e a miúdo deter todo o ataque inimigo, como aconteceu em 1 de
novembro de 1916, diante de Saillisel.
Mais que moral é preciso nessa ocasião, em uma situação dessas, para uma
infantaria não fraquejar e se reconhecer vencida! Não será o caso de se repetir, aqui, a
palavra de Napoleão: “o soldado é forte e vencedor, fraco e batido, segundo o crê¿”
Quando não se chega a deter o ataque inimigo sobre toda a linha desde o principio, o
que é preciso temer e consertar o mais cedo possível são as brechas abertas no
dispositivo defensivo, as brechas que permitem a penetração, a infiltração, o
desbordamento. Vimos, no capitulo anterior, seguindo as tropas de ataque, os efeitos da
desmoralização para os defensores.
Na batalha moderna, bem poucas vezes reflui-se para a retaguarda¹. As boas
tropas de infantaria – e mesmo as medíocres – aferram-se as suas posições, primeiro
pelo dever e pela ordem recebida, mas também pelos perigos da retaguarda. Todo o
terreno, até uma profundidade de vários quilômetros, está fortemente batido pela
artilharia do ataque. Os homens lutam, caem ou se rendem em suas posições. Mas não
podem ser postos em movimento senão com sérios esforços e por seus próprios chefes.
Não se pode mesmo quase nada fazer por aqueles que estão sob a pressão imediata do
inimigo, porque estão em toda parte unidos. Mas se pode fazer algo antes do ataque,
durante a preparação, por violenta que seja ou depois, durante as paradas momentâneas
da progressão inimiga, ou ainda – e principalmente – por aqueles que ainda não estão
engajados na luta aproximada.
Os esforços principais dos chefes devem tender continuamente para o
restabelecimento da continuidade da defesa, para restabelecer a ordem e a tranquilidade
no interior da posição e confiança na reorganização. São, mais ainda do que as outras,
questões de psicologia as que causam mais preocupações durante este período de crise,
período de belas previsões de emprego das armas, mas com frequência irrealizáveis, do
restabelecimento de planos de fogos teoricamente satisfatórios. São, sobretudo,
vontades que se batem e é preciso evitar as fraquezas. Unidades que não se deixaram
desbordar e cuja ligação com os vizinhos está mantida, defendem-se melhor, pois que
não se sentem isoladas. Unidades constituídas serão mais firmes, pois que melhor
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¹ - acontece, porem que há homens que recuam. Mas – salvo o caso da manobra em retirada,
manobra que alias degenera as vezes em derrota – São, geralmente, de tropas medíocres, más ou
desmoralizadas. Surge então um efeito de pânico coletivo, que atinge sobretudo as unidades de 2 escalão
e que deriva de rumores de ataque vitorioso e de desorganização das primeiras linhas, o qual é muito mais
desastroso do que o resultado direto do ataque inimigo, sobre a tropa recebe realmente o choque;
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comandadas. Enfim, uma organização menos confusa, mais clara, mais simples, sai-se
sempre melhor. Cada um compreende melhor seu papel e o dos vizinhos e os reforços
que se possam enviar, encontram mais facilmente seu lugar sem se dissociarem.
A experiência da guerra mostrou, não sem causar muita surpresa, que a ação das
reservas, parciais, durante uma defesa que cede ao ataque é muito mais eficaz nas
missões de tapamento de brechas que nas missões de contra-ataque. É que efetivamente,
a primeira e a mais essencial preocupação, deve ser a de manter uma ação de conjunto,
de soldar umas às outras as partes separadas, apesar das destruições, apesar do avanço
inimigo.
A alma coletiva da tropa de infantaria, que sustenta a resistência de cada um, que
multiplica o poder de resistência total por um coeficiente enorme, tem necessidade de
ligação material para se manter. Se não se tem mais que pedaços separados, não se tem
mais a massa organizada e, em breve, não se terá mais di que indivíduos incapazes de
resistir ao imenso esforço coletivo que lhes é imposto.
Para fazer ressaltar esta “luta pelas brechas”, isto é, no fundo, este ataque e esta defesa
do moral dos defensores, para evitar a derrocada que plana sobre todos e que se detém,
não raro por meios relativamente irrisórios, para dar, enfim, uma ideia da fisionomia da
defesa de infantaria em plena luta aproximada no interior da posição. O que poderíamos
chamar a baralhada moderna, vamos tomar para exemplo algumas cenas da batalha de
Verdun, durante as jornadas de 9, 10 e 11 de abril de 1916, na frente da 42ª divisão, nas
vizinhanças do célebre Mort-Homme.
A 9 de abril, após um terrível bombardeio – dizendo um bombardeio de Verdun,
dizemos tudo – o ataque inimigo foi desencadeado¹ entre 12:30h e 13:15h segundo a
parte da frente visada, numa largura importante, abrangendo notadamente os 8 batalhões
da primeira linha da 42ª Divisão, de Cumiéres às cercanias de Bethincourt, estando o
centro dessa linha marcado pelo Célebre Mort-Homme, que era mantido pelo
8º Batalhão de Caçadores a Pé e pelo 151º Regimento de Infantaria. Ataque violento,
selvagem, um dos mais duros e mais celebres da guerra.
Da esquerda para direita, a primeira linha é mantida por dois batalhões do 162º
Regimento de Infantaria, dois batalhões do 151º Regimento de Infantaria, quatro
companhias do 8º Batalhão de Caçadores a Pé (estas ultimas estavam de posse dos

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¹ – Ainda desta vez, o ataque havia sido anunciado por dois desertores (soldados do 6 batalhão
de caçadores, da reserva) aprisionados as 19h de 8 de abril e que declararam que um ataque em força era
provável para o dia seguinte, depois do meio-dia.
(1) – Basta lembrar que foi depois dessa operação que o general Petain, então
comandante do exercito de Verdun, baixou sua célebre ordem do dia:
“9 de abril foi um dia glorioso para nossas armas. Os assaltos furiosos do soldados do
KRONPRINZ foram quebrados em toda a parte. Os infantes, artilheiros, sapadores e aviadores
do 11 exercito rivalizaram em heroísmo.
“honra a todos!
“os alemães atacarão ainda, sem duvida. Que cada um trabalhe e vele para obter o
mesmo sucesso de ontem!
“coragem! Venceremos!”
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movimentos de terreno de cotas 286 e 295, que eram o Mort-Homme propriamente


dito), quatro companhias do 16° BCP e dois batalhões do 94° RI.
Em segunda linha, três batalhões: um batalhão do 162º RI, atrás do seu
regimento, um batalhão do 151° RI a um km ao sul de Mort-Homme; quatro
companhias dos 8° e 16º BCP, em Chattancourt.
Finalmente, um batalhão do 94º RT, como reserva da divisão, inicialmente
abrigado no bosque.
Sob uma poderosa preparação, parte das trincheiras da primeira linha estão,
pouco depois, completamente destruídas, mormente a esquerda (batalhão da esquerda
do 151° RI) e no centro (8º BCP). Mais adiante toda a primeira linha, muito aproximada
do inimigo e por isso no interior da zona de segurança necessária a primeira linha
alemã, pouco sofre, relativamente. As retaguardas estão completamente reviradas,
particularmente tudo que anteriormente existira como eixo de comunicações.
Sob o ataque violento dos infantes alemães que avançam correndo logo após
seus últimos arrebentamentos, criam-se as brechas quase imediatamente.
No posto de comando chamado de Mort-Homme, o coronel Diebohl,
comandando a 84 brigada, muito calmo, com a pouca luz fornecida por um mau
lampeão de querosene, recebe dentro em pouco mensagens e telefonemas alarmantes.
Um oficial de seu estado-maior, com a túnica desbotada e muito excitado, não pode nem
mesmo lê-las em voz alta e passa-as para ele.
“... Nada mais resta da 7ª e da 8ª companhia do 2º Batalhão do 162° RI..., etc...”
O coronel Diehbol lê dificilmente. “conviria que houvesse querosene,
principalmente nos dias de batalha”, diz ele curiosa mistura, de calma, e preocupação
domestica e de Drama!
Entra um artilheiro.
- Meu coronel, vimos infantes, baionetas caladas, atravessar correndo a redes de
arame!
- nossos? Inimigos?
- Não pudemos distinguir! Apenas vimos bem o brilhar das baionetas!
O coronel Diebohl medita sobre a situação com calma. Evidentemente ele não
tem ilusões quanto a nacionalidade dos soldados que atravessaram as redes de arame,
pois sua brigada esta na defensiva e não pensa em ir para frente.
Entretanto, timidamente murmura:
- Com duas companhias, posso apenas intervir na batalha.
Pensava nas duas companhias do 1º batalhão do 94º R.I., reserva da divisão, que
acabavam de lhe ser enviadas e que tinham sofrido as maiores dificuldades do mundo
para irem do bosque Bourru até lá, através do terreno revirado e dos obuses que caíam.
“Então, Chivot, disse ele voltando-se para o comandante desse batalhão, esta entendido.
Uma companhia à disposição do coronel Moisson, do 151º; outra à disposição do
coronel de Martharel, do 162º R.I. O mais cedo possível”.
As companhias partem sem saber bem para onde iam. Chegarão, entretanto.
Uma fechará a brecha que se formou à retaguarda do batalhão da esquerda do 162º, a
outra substituirá o batalhão reserva do 151º, que acabava de partir em contra ataque.
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Esse batalhão da esquerda do 162º (o batalhão Mayer) tinha sido completamente


dominado e abafado. Que se passara exatamente? Nada se pode dizer, a não ser que o
tenente Richard, comandando uma das companhias desse batalhão, completamente
isolado das duas companhias da esquerda, ouvia ainda uma fuzilaria, pelas 5 horas da
tarde, na direção das trincheiras ocupadas por elas. O capitão Braud, ajudante do
batalhão Mayer, foi visto ferido. O capitão Marescot teria sido morto. Um prisioneiro
alemão declarou que haviam sido feitos prisioneiros, na parte mais a esquerda dos
franceses, soldados do 162º.
Constituindo o centro da 84ª Brigada, o batalhão da direita do 162º e o batalhão
da esquerda do 151º R.I., mantinham-se firmes.
Mais a direita, a progressão inimiga parece ameaçar de cada lado o 8º B.C.P.,
que se dizia ter sofrido muito neste dia.
O major Savornin, com duas companhias da reserva de Chattancourt, partira
para contra-atacar pela retaguarda de seu batalhão, o 8º B.C.P. cujas quatro companhias
de primeira linha estão comandadas pelo capitão ajudante Surian. Morreu com a maioria
de seus homens, antes de atingir a primeira linha. Uma terceira companhia (a 7ª) do
segundo batalhão do 94º R.I. chegou felizmente a tempo de fechar essa brecha, pelo
menos momentaneamente, à direita do 8 B.C.P..
Duas companhias do batalhão reserva do 151º R.I., empregadas por volta das 15
horas, taparam com dificuldade a brecha entre o 8º B.C.P. e o batalhão da direita de seu
regimento. Contra-ataques com granadas de mão, conduzidos por tenentes, a pouco e
pouco fizeram com que tudo voltasse à situação inicial, no quarteirão defendido pelo 3º
batalhão do 94º R.I., próximo de Cumières, à direita da Divisão, no limite de sua zona
de ação.
Tinha-se a impressão de um dique fendido por violenta inundação e que fazia água
por quatro brechas, enquanto que incansáveis pedreiros, meio afogados, recolocavam
blocos de pedra nos lugares que cediam ou logo atrás deles.
...Cerca das 17 horas, a situação estabiliza-se.
Anoiteceu, finalmente. A calma se restabelece. “isso já passou”, caminha-se no
interior da posição, fora das trincheiras, quase que sem ouvir tiros. O telefone chama.
- “Estou num atoleiro, mas não deixarei meu lugar... As perdas são extremamente
pesadas, principalmente em oficiais... O Regimento esteve magnífico...”.
É o coronel Moisson, da 151º R.I., que faz seu relatório ao comandante da brigada.
Um oficial entra, é muito jovem e de ar inteligente. Brilham-lhe os olhos, os
gestos são expressivos, sua voz é tragicamente fria. Tem esse reflexo da batalha, difícil
de pintar, mas que é tão conhecido daqueles que viram alguém recém saído de uma ação
muito violenta, da qual escapou sem saber como.
“Não sei como estou aqui. X... morreu ao meu lado. Y...? Não sei. Deixei-o apenas
um instante. Quando voltei ao lugar em que estava, havia boches, com os quais lutei...”
... Fora, os foguetes brancos iluminativos, os foguetes vermelhos de pedidos de
tiro de artilharia, os verdes de pedidos de alongamento de tiro, cortam a noite sem
cessar. O canhão prossegue ainda, mas cansado. São seus últimos estertores. A batalha,
pelo menos por hoje, agoniza.
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Chegaram à noite, entretanto, as munições, os reabastecimentos, os reforços. Na


retaguarda, quem dorme de dia, a noite trabalha.
Tudo circula ao abrigo do manto protetor da escuridão. É a trégua. As
“salsichas” e os aviões são cegos. E depois, todos necessitam de calma e não excitam o
adversário. Amanhã nos encontramos novamente.
E de novo nos encontramos, realmente, a 10 de abril.
Durante a noite de 9 para 10, três batalhões da 69ª Divisão e territoriais foram
postos à disposição do General Deville, comandante da 42ª Divisão. Este os
encaminhou para a frente.
Mas nesse caos, sem conhecer o terreno, sem guias, toda essa gente perde tempo.
Entretanto o dia se aproxima. Não convirá caminhar a algumas dezenas de metros do
inimigo, quando clarear.
As unidades da primeira linha cavam trincheira. Felizmente, por mais fatigados
que estejam os homens cavam ferozmente. Aqueles que não estiverem abrigados quando
clarear que se acautelem...
É sobre o 8ºB.C.P., particularmente visado, na brecha mais larga e mais aberta,
que o inimigo vai fazer seu esforço principal, a 10 de abril. Bombardeia essa região
durante o dia inteiro. E, a partir das 21 horas, com muitas granadas, com líquidos
inflamáveis, realiza-se uma investida impetuosa empregando novos infantes, uma nova
e poderosa tentativa de travessia das nossas linhas.
O 8º B.C.P., reduzido a dois minguados grupos de cerca de sessenta homens com
dois oficiais, resistira ainda por toda a noite. Mas ao findar a noite, não haverá mais
nenhuma munição, nem viveres... atacado por todos os lados, esse punhado de heróis
sucumbe.
Apesar disso o inimigo não passara. Esgotado por uma lutar terrível, sem duvida
que um pouco em desordem, não conseguira que passe para a ravina de Courettes, senão
um numero reduzido de assaltantes, e mesmo esses uma metralhadora, colocada por um
oficial do 16º B.C.P., deterá fácil e definitivamente.
A 11 de abril, o assaltante renuncia definitivamente. Verifica, por certo, o total
das perdas. São terríveis. Muito pesadas, também, do lado dos defensores, pois é
durante os ataques em massa, que as perdas, dos dois lados, são mais consideráveis.
Enlameados, rotos, macilentos, mas soberbos, os homens da 42ª Divisão vão
desfilar, orgulhosos e magníficos no porte, pelas ruas das localidades destruídas da
retaguarda, finalmente substituídos em sua missão de sacrifício, para um repouso
reparador.
Quem nunca viu passar esses blocos de heróis com olhar de leão, não imagina o
que pode ser um desses espetáculos que ultrapassam em beleza os mais esplendidos
desfiles.
Negar-se-á, depois disto, a importância do valor psicológico da infantaria? Mas
ainda do guia uma luta de armamentos e de concepções táticas, a batalha de Verdun foi
uma luta épica de energia de vontade. A partir de um certo momento, sobretudo na
defesa, tudo repousa sobre a alma da tropa e dos chefes da infantaria. E estas, nos
vimos, não poderão conservar o terreno confiado à sua honra, mantê-lo sob os terríveis
bombardeios de artilharia, face ao ímpeto que o assaltante tudo faz para ser irresistível,
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se não conservarem, não direi intacto, mas pelo menos suficientemente viva, sua força
moral coletiva de resistência.
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CAPÍTULO VII

A ação psicológica sobre a Infantaria inimiga --- Como prepara sua derrocada na
batalha --- Preparação moral antecipada --- A ameaça pelo poderio e pelo caráter
inquietante de certos meios --- A surpresa estratégica, tática e intelectual --- As
realizações pelas destruições efetivas --- A esperança pelos oferecimentos tentadores
em troca do abandono da luta.

Acabamos de ver, estudando a psicologia do campo de batalha, como se age


sobre o moral dos combatentes de Infantaria, tanto amigos quanto inimigos, no ataque e
na defesa, nos momentos de decisão, isto é, na batalha.
Vimos que o que se precisa conseguir para vencer é a derrocada da Infantaria
inimiga e estudamos como se pode atuar, no combate, sobre seu moral.
Vejamos, da maneira mais geral, como se prepara e como se obtém essa
derrocada.
Comecemos por recordar que essa Infantaria que queremos calar é massa
humana e massa organizada. O que dificulta nossa ação é não podermos recorrer, por
certo, a processos de sedução, mas de muito longe; e não só isso, preciso também
renunciar a qualquer influência afetiva, a par de que devemos contar com o combate a
nossos argumentos, feitos de perto e por chefes que tem, pelo menos de inicio, a
confiança de sua tropa. Entretanto, se os meios agir sobre a imaginação simplista dessa
massa que se aha longe tem um caráter excepcional, lembremo-nos de qual tal ação
vimos no Capitulo I para a massa organizada e militar, que dá mais importância aos
fatos do que ás simples sugestões, o grande princípio de G. Le Bom permanece
verdadeiro. É sobre a imaginação das massas que se deve agir essencialmente e
impressionar com imagens que “as aterrorizem e seduzam”.
Mas, se a Infantaria inimiga é fundamentalmente massa organizada, pensemos
que o que buscamos, é sua desorganização, é sua desagregação. Procuremos também,
então, --- e em última análise, exclusivamente --- agir sobre os indivíduos.
Os meios de ação, sobre a moral da Infantaria inimiga são múltiplos e variados.
Parece, entretanto, que podemos grupa-los em cinco categorias principais que
estudaremos sucessivamente e se poderiam intitular:
 a preparação moral antecipada;
 a ameaça;
 a surpresa;
 as realizações;
 a esperança ou, se quiser, as tentações.
A preparação moral antecipada, extremamente ampla e, além disso, de efeito
limitado para os combatentes, compreende toda a sorte de propaganda especial que
procura influir sobre o moral da retaguarda: boletins lançados de avião, noticias de
jornais da retaguarda, comunicados oficiais que sempre transpõem as linhas, etc.
Em suas análises de combate antigo, Ardant Du Picq escreve:
“É inútil explicar novamente, como e porque, nos combates, a desmoralização e
depois a fuga começavam pelas fileiras mais detrás”. Pode-se generalizar e estudar
largamente essa observação colhida na experiência. A derrota alemã na ultima guerra,
como a derrota russa, começaram pela desorganização e enfraquecimento dos poderes
públicos e das populações do interior. No campo de batalha, o infante esta afastado da
opinião publica do seu país, não há duvida, mas não poderíamos negar que sua
resolução no ataque e principalmente na defesa, é por esta influenciada, fortemente.
Pelas licenças, pelas cartas, pelos jornais, até mesmo por essa misteriosa difusão das
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noticias a distancia, o soldado sempre sabe o que se passa a retaguarda, o que se pensa,
onde se julga que estão as possibilidades e a vontade de resistir do país.
Mais perto de suas preocupações pessoais imediatas, a crença em novos meios
de destruição que lhe estariam reservados impressiona sua imaginação. E é o caso de se
lembrar de que as noticias cheias de maravilha e de mistério são as que mais excitam, e
que é, sobretudo, assim como escreve Le Bon “a maneira como se apresentam os fatos,
que impressiona a imaginação popular”. Esses fatos devem, por condensação, se assim
me posso expressar produzir uma imagem surpreendente que sacie e obceque o
espírito¹.
É preciso que com ameaças mais diretas se continue a solapar o moral dessa
Infantaria, preparada pelas más noticias da retaguarda.
Ameaças de um poder de destruição tão grande e tão assustador quanto possível.
Fazer saber, e mesmo a miúdo fazer ver, que se dispõe de uma soma extraordinária de
artilharia e de obuses em quantidade considerável e de capacidade destruidora dia a dia
acrescida. Sobre tal assunto discutiu-se, durante a campanha de 1925-1926, em
Marrocos, contra Abd-El-Krim, a utilidade de empregar os grossos calibres, cujos
obuses enormes, tinham objetivos apropriados e, o mais frequentemente, caíam nas
vastidões vazias, sem matar ninguém.
E se puseram em paralelo esta ineficácia prática e as enormes dificuldades, de
transportar e de aprovisionar essas peças de parca mobilidade, em um país sem estrada
interior. Não há como negar, entretanto, que após manifestações de poder desses
materiais, apesar da esterilidade de suas destruições, achava-se menos resistência no
ataque. É que se tinha feito pairar sobre os marroquinos e ameaça destruição de um
poder que eles ainda desconheciam. Mal informados das dificuldades práticas de
deslocamento e de remuniciamento, acreditavam que acabariam por ser vitimas desses
terríveis meios de destruição.
Como negar, também, o efeito considerável, da artilharia pesada, sobre os
exércitos franceses do principio da guerra de 1914-1918? Por diminutos que tenham
sidos os efeitos dela, sobre as tropas aguerridas, continuaram a atuar por seu efeito
moral muito grande e pela ameaça permanente sobre a organização, fosse solida quanto
fosse.
A ameaça devida ao poder dos meios em ação não é a única que impressiona. As
características desses meios, o que tem de inquietante, exerce uma influência muito
grande. As carretas armadas e disfarçadas de Antiochus, os elefantes de Pirro, na
antiguidade, a fama da ferocidade dos “turcos” em 1870, que cortavam, dizia-se, as
orelhas dos adversários vencidos, os aviões, os gases, os carros de combate, mais
recentemente, todos esses meios deveram uma grande parte de sua inegável eficácia a
seu valor moral, aos aspectos inquietadores, requintados, novos, de ação.
A novidade, e a ameaça desses meios de destruição, inicialmente misteriosos,
conferindo-lhes um poder especial, nos conduz a tratar da terceira categoria de ações
que atuam sobre a alma da Infantaria inimiga: aquelas que se ligam aos efeitos da
surpresa.
Não podemos evitar fazer aqui uma incursão nos domínios da tática e do
armamento. Nem sempre se podem separar esses domínios dos da ação psicológica da
guerra sobre o inimigo. Deles só falaremos sob o ponto de vista de seus efeitos
psicológicos, mas desejamos fazê-lo de vez que, mesmo em um estudo como este, que
sistematicamente não trata tais questões, vale á pena efetuar-se em voz alta, apesar de
_________________
¹ - G. Le Bom: A psicologia das Multidões.
57

evidente, que se a ação moral é o fim, pois que é a derrocada dos adversários que se
quer e não obrigatoriamente sua morte, a pressão material e com mais frequência à
destruição ao menos parcial, constituem o meio mais poderoso de produzi-la e seu
argumento mais forte e infalível. Como os canhões pura os reis, “ultima ratioregun”, o
argumento que interessa, em definitivo, com certeza, é a morte provável e mesmo,
vamos tomar a ver e a dizer, a ameaça pessoal e aproximada de morte certa.
A surpresa tem diversas formas e age de modos diversos.
A surpresa estratégica influi muito de longe. Tem, para a Infantaria de batalha,
objeto de nosso estudo, um efeito semelhante, talvez ate muito parecido, ao da
preparação moral afastada de que já falamos acima. Ele cria uma atmosfera de derrota,
produz a desorganização do alto comando inimigo. As reações e as ordens deste serão
mais confuso, a ajuda que pode dar a Infantaria atacada será muito diminuída. Tudo
isso, segundo o escalão e a distância, será percebido em graus diversos, mas não
escapara a ninguém. E a fé na possibilidade de resistir vitoriosamente, começara a ser
minada.
A surpresa tática acentuara ainda mais essa depressão moral e seu efeito será
tanto mais marcante quanto mais de perto interessar e mais perigoso parecer aos
combatentes. Direções de ataque imprevistas e, por lugares considerados inacessíveis e
por isso mal defendidos, realização do choque na ocasião em que defensor esteja em
movimento ou mal apoiado, ou se defenda mal, ameaças inesperadas sobre as
comunicações, os reabastecimentos, os pontos delicados de soldaduras, etc..., tudo isso
traz, desde inicio, enfraquecimento a organização da defesa, tende a suprimir aquela fé
jue constitui o verdadeiro “em guarda” moral, tão útil a quem vai precisar de toda a sua
energia moral e de todas as reservas intelectuais para agir.
A surpresa intelectual, finalmente, vai perturbar a calma do raciocínio habitual,
alterando as bases em que costuma ser feito. A Infantaria que sabia ser difícil resistir aos
meios conhecidos, que poderá fazer contra meios novos, forçosamente superiores e de
que ainda ignora como se defender?
Obtém-se essa surpresa intelectual, sobretudo pelo emprego inesperado de um
material novo, guardado em segredo ate então. O emprego dos gases pelos alemães, na
Bélgica, a utilização dos “tanque” pelos ingleses na batalha de Cambrai, mais do que
seus indiscutíveis efeitos materiais --- produziram essa surpresa intelectual. Mas a
eficácia limitada dessas duas manifestações cujas possibilidades eram imensas, faz
ressaltar de maneira gingante um dos princípios especiais de utilização desses meios
novos. Sem duvida, segredo tinha sendo tinha sido suficientemente guardado e,
consequência extraordinária nenhuma defesa para eles pudera ser preparada; mas, em
lugar de procurar imediatamente uma decisão contra o inimigo ainda desarmado, o
assaltante contentou-se com uma espécie de experiência, sem ter preparado os meios
para explorar a fundo a surpresa intelectual e alargar e aprofundar, para torna-la mortal,
a brecha inicial obtida na frente sem resistência. Por outro lado, não se tirou, de
invenções importantes, resultados correspondentes ao seu poder, mas divulgaram-se,
por assim dizer, as possibilidades ulteriores. Quando se descobre um meio novo, é
preciso não só guardar-lhe o segredo até o momento de seu emprego, mas também saber
aventurá-lo num primeiro golpe, em uma ação de grande envergadura. É certo que é
mais cômodo, depois de um ensaio, saber o que a novidade é capaz de realizar, como
emprega-la melhor, pois até aquele que a inventa ainda permanece um pouco em terreno
desconhecido, mas é preciso não esquecer que não se encontrará jamais, nos ensaios
seguintes, as imensas possibilidades do primeiro, que permitem aventurar seu emprego
contra o adversário totalmente surpreendido, desarmado e incapaz de improvisar
qualquer meio de dar-lhe combate eficaz.
58

Obtém-se também a surpresa intelectual por novos processos de combate,


maneiras novas de utilizar o material conhecido. O aparecimento da barragem rolante,
durante a última guerra, o ataque sem preparação de artilharia, depois de um período
prolongado de ataques demorada e poderosamente preparados até o último instante,
foram, na ofensiva, meios de produzir a surpresa intelectual. Na defensiva, a descoberta
imprevista de obstáculos materiais, de trincheiras concretadas, de metralhadoras sob
cúpolas à frente de um adversário, que se acreditava já vencedoras e avançava confiante
no sucesso, realizaram efeitos de surpresa análogos.
Finalmente, em todas as guerras passadas, utilizaram-se para o mesmo fim de
surpresa intelectual, uma chusma de estratagemas de ardis de guerra. “Antes, então, de
ir onde vossa honra e vosso dever vos manda, escreve do modo bem agradável, em seu
prefácio o autor de pequena obra do século XVII¹, lêde e relêde este livrinho do
estratagemas e ardis de guerra, o qual vos ensinará, infalivelmente, os meios de
surpreender vossos inimigos e aquilo que é necessário observar para evitar ser
surpreendido, imitando os grandes homens que os inventaram e praticaram”. Sem
dúvida que já não há mais grandes cousas a aplicar. Na guerra moderna, dos
estratagemas de Solon, de Cimon, de Epaminondas, até de César e de Bayard, mas não
se pode dizer que não se tenha muito que salvo algumas raras manifestações simplistas
de ataques simulados não se levaria vantagem, durante o último conflito europeu, quer
de um quer de outro lado, entre os processos empregados para alcançar a surpresa
intelectual do adversário, e o emprego dos estratagemas e dos ardis de guerra
mencionados levando-se em conta os meios de informação e o caráter de guerra
moderna.
Chegamos assim ao 4.º meio de ação sobre o moral da infantaria inimiga, o mais
deplorável, talvez, pois que o mais brutal; o menos sedutor, pois que é o menos artístico;
mas certamente o mais eficaz e aquele ao qual, cedo ou tarde, é preciso chegar
inevitavelmente: aquele a que chamamos as realizações, isto é, a destruição efetiva de
infantes inimigos.
Mas, ainda ai, vai ser preciso procurar destruir de certa maneira. Sem falar da
dosagem dessas destruições com uma finalidade tática, nem das aplicações do material
em função dos meios de defesa do adversário, de seus abrigos, de suas redes de arame,
dos pontos sensíveis de sua organização, etc..., vamos em vista preparar e produzir o
resultado psicológico que procuramos: a derrocada da Infantaria inimiga.
Salvo o caso da surpresa, constantemente procurada, uma preparação de
artilharia, tão poderosa quanto possível, deve esforçar-se por semear o terror, atacar a
organização inimiga, matar o máximo de defensores. De qualquer modo que se proceda,
no estado atual do material e dos processos de defesa não se matará a todos e não se
poderá suprimir, para sua própria tropa, o esforço e os riscos do assalto. Mas pode-se-
lhe dar um inimigo diminuído em número e cujo moral já tenha sofrido a tensão nervosa
a que o tenhamos submetido, durante horas e talvez dias, de pessoas continuamente
ameaçadas de morte súbita.
____________________
¹ - Les stratagès ET lês ruses de guerre. (De La Fé, Paris, 1694).
59

Poder-se-á, ainda, diminuir sua capacidade de resistência e, por consequência,


sua fé na possibilidade de resisti vitoriosamente, pela privação do sono, pela privação
dos alimentos, submetendo ao fogo os reabastecimentos de toda ordem, pela privação
das comunicações com seus chefes, com suas reservas, com sua artilharia.
Depois, quando se aproximar momento do choque, convirá produzir a mais forte
impressão de terror, pela concentração sucessiva de enormes destruições localizadas.
“Cem pequenos crimes e cem pequenos acidentes - escreve Le Bon - não comoverão
tanto a imaginação das massas, quanto um único crime de grandes proporções, uma
única catástrofe. Estas impressionarão profundamente, mesmo com resultados
infinitamente menos mortíferos que os cem pequenos acidentes reunidos”. A imagem de
50 homens destruídos em poucos instantes em uma mesma Companhia impressionará
muito mais do que a morte de 200, repartidos por toda a Divisão. E pode-se estar certo
de que, não só a Companhia reduzida à metade, mas o Batalhão, mas a Divisão inteira,
informada instantaneamente pela imediata propagação dos boatos do campo de batalha,
e avassalante nos capítulos precedentes, aumentarão a depressão moral intensa devida a
essa concentração poderosa da morte.
Ganhar-se-á, ainda em efeito moral útil, manejando-se as manifestações de
poderio de forma a obter uma progresside ascendente. É inútil voltar aqui ao que já foi
anteriormente estudado.
Finalmente, depois dessas ameaças de destruição anônima, depois dessas
numerosas condenações à morte pronunciadas de longe e sem visar pessoalmente
qualquer indivíduo, ser mister chegar ao assalto, à progressão de uma Infantaria, a
atingir individualmente os infantes inimigos em suas trincheiras. E tudo o que ainda
existir vivo, entre os defensores - e serão muitos, pois ainda se fará milhares de
prisioneiros sem um arranhão sequer - terá de ser submetido à avalanche de novos
infantes, que agirão como destruidores em piedosos, resolvidos a matar de perto todos
os que não se renderem. É o meio de ação supremo, aquele ao qual ninguém resistirá, o
argumento de decisão que vai produzir a derrocada, que vai, enfim, fazer com que se
ergam os braços em sinal de rendição: a ameaça pessoal e aproximada de morte certa.
A inevitável necessidade desse ultimo argumento explica o irrisório armamento
da Infantaria para essa ação: a baioneta e granada a granada de mão. Isso já foi
explicado, mas é, a priori, e em face de argumentos de tempos de paz de tal modo
extraordinário que não é inútil repetir. Tudo mais, no estado atual do armamento,
obuses, gases de combate, projeteis de toda ordem, quaisquer que sejam seus notáveis
efeitos, é apenas preparação.
E a prova indiscutível disso é que nunca se viu uma Infantaria aguerrida
fraquejar e erguer os braços sob o bombardeio e sob os gases quaisquer que sejam as
perdas.
Quando se compreendeu bem o que é que dá o valor e qual é a razão de ser do
assalto, - eu repito: a ameaça pessoal e aproximada de morte certa, - é que se percebe
como muita gente - e até mesmo militares - compreende mal o que representam “o
fogo” e “o movimento”, esses dois meios de ação da Infantaria apontados em todos os
tratados de tática moderna . Alguns os separam e os opõem atribuindo, segundo seu
temperamento, um valor decisivo a um ou a outro. De tais erros resultam, seja ausência
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de uma decisão, se não se faz progredir a Infantaria, seja a destruição dessa Infantaria se
quer fazê-la progredir sem apoio nos alterar (solução pouco satisfatória de antes da
guerra), ou procuram emprega-los em conjunto, o fogo continuando seu trabalho de
cobertura durante todo o deslocamento da Infantaria para a frente. Há neste último
processo, o único a encarar em presença de um inimigo poderosamente armado e
energético, dificuldades técnicas a resolver. Não é aqui o lugar para examiná-las. Mas,
mesmo considerados assim em ação conjunta, o “o fogo” e “o movimento” não levam
forçosamente à decisão. Eles não são mais que uma preparação e principalmente o meio
- o único! - de fazer chegar, à distância do assalto, sem que tenha sido destruída pelo
fogo dos defensores enquanto avançar para eles, a Infantaria atacante. Só então começa,
para nós, o ato da decisão certa, que é diferente do “fogo” e também do “movimento”.
Na mesma ordem de idéias, uma expressão figurada dos nossos últimos
regulamentos, “o ataque é o fogo que avança” é também suscetível de falsa
interpretação. É preciso não ver nela, senão uma reação sistemática e utilíssima contra
as teorias de movimentos pura, uma proclamação da necessidade e do valor fogo no
ataque. Mas, tomada ao pé da letra e mal compreendida, essa frase poderia orientar
algumas pessoas para um aumento exagerado - em detrimento dos indispensáveis
efetivos de assalto - dos serventes das armas coletivas e dos engenhos, tendo
unicamente por objetivo aumentar o número de canhões, de metralhadoras, de material
produtor de fogo, para uma utilização exclusiva de fontes de fogo cuja manifestação
ideal será uma espécie de barragem rolante imensa, avançando progressivamente sobre
o inimigo e através de suas organizações.
Semelhante doutrina de guerra privada do emprego do assalto, não conduziria ---
tal é pelo menos nossa opinião, que os ensinamentos de todas as guerras passadas, até
agora, confirmam --- a resultados seguramente decisivos.
Se não se vê, pode-se dizer nunca, uma infantaria declarar-se vencida antes dos
infantes adversários chegarem ao combate aproximado, vê-se que cedem mais ou menos
depressa nessa ocasião. Alguns defensores, particularmente heroicos, não se renderão e
se deixarão matar. São raros. E estes, já que não podem impedir que cheguem
assaltantes muito mais numerosos do que eles próprios são (não se compreende,
normalmente, o sucesso no ataque, se não se obteve, no ponto decisivo procurado, uma
superioridade de efetivos importante --- superioridade necessária, mas que não basta
para obter bom resultado, se a operação não for bem montada e bem conduzida); já que
eles estão agora ameaçados individualmente de morte certa, todos compreendem que a
resistência se torna inútil. Mas ainda pode custar muitas vidas. É conveniente, pois,
diminuir-lhe a energia e a duração. É então que a todas estas pessoas, às quais tudo se
fez ate então por apavorar e por desesperar, é proveitoso oferecer a tentação de se
render, de fazer brilhar a esperança da vida salva, desde que demonstrem que cessam
resistência.
Deve-se então, e é último meio de ação mencionado no início deste capítulo —
atender prestimosamente a todos os que se rendem e isso desde o primeiro gesto de
rendição. O contágio do campo de batalha, o contágio das massas humanas, tão bem
conhecido, vai rapidamente espalhar primeiros resultados obtidos, desdobrá-los; e é
então que aqui milhares, ver-se-á os braços se erguem, as armas serem abandonadas, os
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defensores deixarem seus abrigos e se deixarem levar sem resistência para onde queiram
os vencedores.
Para apressar aquele primeiro gesto de rendição, para com antecipação provocá-
lo, é conveniente que o inimigo confie em que os prisioneiros serão bem tratados. E é
por isso , mesmo que não houve também um dever de humanidade, que se devem evitar
quaisquer atos vexatórios inúteis aqueles que deixaram de ser combatentes perigosos, e
por isso que é indispensável assegurar tratamento suportável para os adversários que
abandonaram definitivamente a luta.
O argumento de humanitarismo não seria, só ele, obrigatoriamente convincente.
Isso porque, antes de tudo o dever do chefe é de poupar a vida de seus homens. Quando
se chega a fazer a guerra é que não se pode achar outros meios de fazer respeitar os
direitos de sua pátria e proteger a liberdade e a existência de seus soldados. Está-se,
pois, decidido a matar todos aqueles que seja indispensável destruir para obter a vitória.
Se a luta seria abreviada e vidas de seus próprios homens seriam poupadas, pela
destruição total do inimigo pela supressão de prisioneiros, ser-se-ia obrigado a resolvê-
lo dessa maneira.
Eis porque a clemência na vitória e desde que a vitória se anula não é anuncia
não é aceita por todos, mormente pelas nações ferozes e cruéis que querem o mal pelo
mal e cuja opinião não nos interessa discutir.
Se acreditarmos em Ardant Du Picq, Annibal “ quer a destruição e seus métodos
tendem a obtê-la sempre, cortando qualquer retirada ao inimigo. Não crê que as massas
tenham a coragem do desespero; acredito no terror”.
Vimos que, também nós, para levar o inimigo à derrocada, fomos obrigados a
acreditar—e até o ultimo momento – no terror. Mas parece-nos que completar a ação de
terror pelas tentações da esperança desde a finda a resistência, - é um processo útil para
apressar em derrocada, para diminuir a animosidade da defesa e, por consequência, para
reduzir as perdas de nossa própria Infantaria.
A maioria dos militares é dessa opinião. Vegèce, ou melhor, seu tradutor do
século XVIII, intitula um dos capítulos de sua obra¹: “ o que convém fazer para que o
inimigo fuja”. E escreve: “ a maioria dos capitães, que não conhecem bem a guerra,
deixaram-se seduzir com a isca de uma vitória completa, e imaginam que não há senão
apertar novamente o inimigo, encurralá-lo em seu terreno, envolvê-lo pelo numero de
suas tropas , de modo que não lhe sobre qualquer modo de escapar², mas o desespero
faz nascer a coragem nas pessoas que se vêem assim envolvidas; o medo mesmo toma
as armas; e corre-se voluntariamente à morte, desde que se sabe que é preciso inevitável
perecer. Elogia-se vivamente a sentença de Scipião, que se deve preparar uma ponte de
ouro para o inimigo, para facilitar-lhe a fuga”.
____________________
¹ - Institutions militaires de Vegèce (trad. Bourdon de Syrais, Paris, 1759,Liv. III, Cap. V).
² É preciso cuidado para não interpretar mal esta argumentação e não ver aí uma condenação ao
cerco tático. Este, pelo contrário, é um dos melhores meios de apressar a derrocada e de tornar completo o
sucesso. Mas se deve procurar o aniquilamento definitivo de um exército e mesmo evitar que ninguém
escape, obter-se-á mais depressa e mais facilmente esse resultado, transformando seus soldados em
prisioneiros do que em cadáveres.
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Sem dúvida, quando se apela assim para o testemunho de autores antigos, há


sempre uma transposição indispensável a fazer, para aplicá-la à nossa época. Assim, por
fuga deve-se entender, aqui, não só o recuo desordenado dos inimigos para a retaguarda,
mas também a retirada dos combatentes modernos que é cortada pela atuação intensiva
da artilharia em sua retaguarda e que, erguendo os braços em sinal de rendição, e
lançando por terra suas armas, seguem assim desarmados, para o interior das linhas dos
próprios assaltantes que progridem e os ultrapassam.
Mas não é proveitoso, às vezes, fazer uma citação textual cujos termos, um
pouco arcaicos, trazem o sabor da antiguidade e exprimem tantas vezes uma opinião
com maior eloquência e relevo do que uma linguagem moderna, menos direta e mais
inóspida? E depois, quando se vê enunciar uma verdade de guerra, não é dar-lhe mais
certeza e mais valor que ela foi reconhecida e afirmada há séculos e em todas as épocas
Assim, no fim do estudo que nos ocupou neste capítulo , temos a ventura de
encontrar acordes a habilidade e a humanidade. Feliz e raro encontro em matéria de
assunto guerreiro,. Fiquemos sob esta agradável impressão sem esquecer, todavia, as
rudes necessidades ordinárias da ação psicológica sobre a Infantaria inimiga.
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SEGUNDA PARTE

OS QUADROS

Suboficiais¹
Oficiais

___________________
¹ - Sous-oficiers - No Exército Francês as graduações de 3º Sargento a Sargento-ajudante são
reunidas no circulo de suboficiais. Assim, para efeito deste estudo, o suboficial pode ser tomado, entre
nós, como o graduado que conquista permanência nas fileiras (NT).
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CAPÍTULO VIII

Características da psicologia suboficial de Infantaria—Ela difere dos “soldados rasos”


– Senso de autoridade e das responsabilidades correspondentes – Sua atitude nas
missões de detalhe, na condução de comboios, nas tarefas de reabastecimento em geral
– Suboficiais burocratas e Suboficiais de fileira—Abnegação e disciplina – Provém de
meios modestos, mas não , o que é bem raro, de ambições também modestas —
Constantes preocupações de ordem material—Rudeza e até mesmo, a miúdo,
servilismo – Mas admirável probidade e absoluto devotamento para com os bons.

Se bem que façam parte das praças de acordo com os regulamentos militares os
suboficiais não têm a mesma psicologia dos “soldados rasos”.
Estes — nem mais se lhes pode exigir – executam as ordens , o mais das vezes ,
unicamente por serem obrigados e sem procurar compreender a razão que as ditou.
Consideram a hierarquia quase exclusivamente como cadeia de dificuldades e de
exigências sempre enfadonhas e às vezes penosas.
O suboficial, ao contrário, já é um chefe. Tendo responsabilidades, tem o
sentimento da autoridade e compreende que precisa comandar. Quando está à frente de
um pequeno destacamento isolado, em que as pequenas questões materiais são tão
importantes, sabe que seus homens têm necessidades de sua previsão e de suas ordens.
Esses serão mal alojados ou ficarão ao relento; comerão mal ou nada comerão, se ele
não tiver sabido organizar seu serviço, refletir, prever, senão tiver partido bem as
tarefas, tomando para si as mais delicadas e dado ordens precisas e eficazes a cada um
de seus subordinados. Reflitam aqueles que tem o hábito de menosprezar esses
pequenos chefes e suas tarefas modestas, no que eles próprios fariam se fossem
encarregados, por exemplo, de conduzir durante vários dias uma quinzena de homens e
de mulas, com um carregamento delicado , cuja chegada intacta fosse indispensável, por
um itinerário difícil de encontrar e por caminho as vezes perigosos. Aquele que não viu
disso nas montanhas, transportes por veredas estreitas que desmoronavam sob a chuva,
as mulas caindo seu carregamento a ser refeito em casa queda, continuamente, os
condutores fatigados e desanimados, longe de qualquer socorro, não pode se dar conta
da dificuldade e do mérito de certas missões obscuras. Não cairia em desânimo e
talvez,ate,abandonaria a tarefa.
Graças à experiência prática, a preocupação com os pequenos detalhes, a energia
e a força física, os suboficiais são muito aptos para essas missões de reabastecimento,
indiscutivelmente tão difíceis e indispensáveis a própria vida das tropas.
Os suboficiais são muito hábeis para encontrar e conseguir os alimentos
necessários aos seus homens. Ninguém melhor que eles sabem fazer muito com pouco
dinheiro, discutir os preços, encontrar as ocasiões vantajosas. Como são diferentes, sob
esse ponto de vista, de muitos do seu meio, os operários, por exemplo, que pagam caro
e comem mal, gastando assim grande parte de um bom salário.
Para manter uma contabilidade meticulosa e controlada, de rígida e minuciosa
honestidade, para arrolar exatamente ou levantar os dados de uma administração
rigorosa e precisa, quem fará melhor que os sargentos contadores?
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Pode-se classificar os suboficiais em duas categorias: suboficiais burocratas e


suboficiais de fileira. Sem dúvida uns e outros vem do mesmo recrutamento e, quase
todos, passam de uma para outra categoria: mas, uma vez especializados, ficam com
mentalidades, e até mesmo aparência por vezes bem diversas.
Os primeiros, contadores e auxiliares de escritório, trabalham em "bureaux", são
encarregados da verificação e da guarda do material, de documentos, da apresentação
material da execução de trabalhos datilográficos, etc.. Sua colaboração, a principio
muito limitada, torna-se, às vezes , quando são dotados de boas memória e de
capacidade de assimilação (o que é frequente ), muito mais proveitosa e importante do
que a modéstia da sua função deixaria prever. Extremamente devotados do
desembaraçados eles se tornam com frequência, para os oficiais que os sabe dirigir
empregar, auxiliares extremamente preciosos, capazes de dar por vezes, aos trabalhos
destes, uma apresentação material e uma escrupulosa meticulosidade que, sozinhos,
talvez não obtivessem! O sargento ajudante que se julga o capitão, como o auxiliar de
escrita que pensa saber substituir o chefe, são sempre ridículos, e é mister que o chefe se
previna, na repartição como fora dela , para não abdicar da tarefa de dirigir nem mesmo
deixar que se crie aquilo a que se poderia chamar de "privativo" de certo auxiliar que se
julga indispensável e que se torna, bem depressa , insuportável. Mas seria, por outro
lado, injusto e inábil não reconhecer e recompensar, no momento oportuno, _ mesmo ao
preço de separação e do aborrecimento de uma nova preparação , - os serviços , o que
é difícil fazer com um oficial , - que não se permitem qualquer iniciativa, por menor
que seja , nem mesmo a mudança de uma vírgula,são muitas vezes melhores para
preparar notas e cartas rápidas , que exigem uma redação pessoal.
Os últimos , os da 2° categoria , mas rudes, mais terra a terra, tem geralmente
uma maneira de comandar mais seca , por vezes , mesmo abrutalhada. Tem o respeito e
o culto da força física, do aspecto vigoroso, da resistência a fadiga. Emprestando
importância aos detalhes, tem por vezes consciência escrupulosa, essa capacidade de
pensar em todos os detalhes , essa aptidão de nada esquecer e de nada deixar passar.
Bem entendido, se há exageros, os oficiais ai estão para impedi-los. E sempre se há de
ver os bons suboficiais modificarem ou abandonarem um modo de agir por eles
defendido energicamente ao instante anterior, com uma abnegação que é dos mais belos
exemplos das virtudes da disciplina.
No início de uma carreira e situação dos suboficiais e ainda instável. O desejo de
ser engajado e a possibilidade de não o ser, lhes tira o fôlego é preciso que seja assim,
pois só se deve conservar como suboficiais aqueles que tem as indispensáveis
qualidades de energia e de caráter, e é justo,pois eles também, bem podem não querer
engajar. não se fazem depressa , e as sanções disciplinares (tão raras para os oficiais e
para os suboficiais antigos) são, por vezes, indispensáveis para ativar o caráter dos
jovens e fazer-lhes compreender e reter as exigências de uma disciplina rigorosa , da
qual eles serão os mais decididos e exigentes guardiães. Convém - principalmente nas
tropas menos boas - saber com que suboficiais se trabalha. Não é normal que eles sejam
obrigados a dominar homens revoltados, principalmente em estado de embriaguez, as
vezes com perigo de vida . A manutenção da disciplina entre guerreiros poderosamente
66

aos suboficiais que são, fisicamente, os guardiães da ordem e explica sua rudeza ,
defeito as vezes , mas também inevitável manifestação da força que devem representar.
Os graduados provem, em sua grande maioria, de meios muito modestos, isso é
bom, pois o que se deseja e o que obtém deles, como tentei expor a cima, exige
qualidades habituais desses meios. Não falo dos que engajam para fazerem oficiais, que
se deseja e o que não fazem mais do que passar pelo corpo suboficiais. Mas em seus
quadros inferiores consagrados a um futuro limitado, a infantaria conta, felizmente
poucos malogrados . E deles se desembaraçará depressa, alias.
Sendo de meios modestos, são, naturalmente, muito preocupados com as
dificuldades da vida material. Desejam muito legitimamente ver aumentar o seu
modesto bem estar; e tudo o que lhes pode aumentar o soldo ou as vantagens, facilitar a
moradia, a vida de suas famílias é por eles acompanhado muito de perto. Mas que
admirável espírito de economia possuem!
Quando se aprofunda a questão e se estuda seus orçamentos fica se estupefato do
que chegam a realizar com tão pouco. Muitos operários, contramestres, pequenos
comerciantes ou funcionários, nunca aceitariam as privações que eles sabem se
imporem silêncio, para ter uma existência digna e aparecem, eles e suas famílias,
convenientemente vestidos e as vezes com certo requinte.
Têm, um espírito de solidariedade muito profundo - como tem muita gente do
povo , alias . O espírito de corpo e de alma é neles muito vivo, por vezes ate agressivo e
hostil em relação a corpos vizinhos. Não se saberia exigir deles uma dosagem sempre
perfeita de excelentes sentimentos, nesse sentido. Se têm, por vezes orgulho exagerado
pela unidade e até certa gabolice, é mister não esquecer que o orgulho coletivo é
também ele , quando o elevamos vantajosamente , uma forma fecunda do patriotismo .
Tem, em certas ocasiões, um senso de justiça bem mesquinho. A "vez" do
serviço, a "vez" da promoção a "vez" de certo trabalho mais penosos ou das
recompensas, são causas que é preciso sempre pesar cuidadosamente quando se tem
decisões a tomar a seu respeito. Convém não se deixar escravizar, pois a "vez", nem
sempre é a justiça e, principalmente nem sempre conduz a designação correia daquele
que é o mais capaz de bem cumpri a tarefa que se tem em mira.
Em resumo, se eles tem os defeitos da modéstia de sua origem, têm também as
qualidades.
Mas, tem, sobretudo, uma virtude bem rara, mesmo - eu ia dizer principalmente -
entre gente de origem modesta - tem ambições modestas. /bem poucos desejam chegar a
oficiais e se contentam em galgar lentamente os degraus de sua hierarquia particular,
sonhando somente em ter, a pouco e pouco, mais uma divisa, um pouco mais de
tranquilidade e de repouso , também . Entretanto vem, a seu lado, as grandes êxitos de
dinheiro, de situação e de influência, pela policia, pelo comércio, pelas intrigas, de
tantas pessoas de suas famílias, de seus círculos de amizades, de seu meio. Quando se
pensa nas ásperas reivindicações de tantas corporações profissionais, na ambição ,
pode-se dizer ilimitada , de quase toda humanidade , não se pode mais que admirar e
saudar baixinho esta excepcional modéstia de desejos. E quando um suboficial pode -
ambição suprema manter-se modestamente e fazer seus filhos ascenderem na escola
social a ponto que ele próprio nunca ousou nem mesmo desejou atingir, podemos
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inclinar-nos diante desse esforço de toda sua vida, diante dessa resistência quase única
a esses dois flagelos da humanidade : a inveja e o ódio.
Se é limitada sua ambição, seu devotamento nãoo é. E nesse particular alguns
atinge os pontos mais elevados. Qual o oficial de infantaria que não tem mil recordações
de devotamento e de abnegação dos suboficiais? certas tarefas , mais árduas do que se
acreditava que fosse ao serem ordenadas , custam-lhes os dias de domingo, noites
inteiras de trabalho, não só sem que digam uma palavra de queixa mas, ao contrário,
empregando-se a fundo,com uma vontade apaixonada de nada esquecer, de bem
cumprir, e tudo realizar do que lhes foi pedido. O escrúpulo em um grau excepcional, a
dedicação e a perseverança necessárias para certas missões intermináveis suboficiais de
infantaria possuam.
Sob a fiscalização dos oficiais, foram os suboficiais que dirigiram todas as noites
durante a guerra, a construção de intrincadas redes de arame, em contacto imediato com
linhas inimigas, que tarefa quase sobre-humana! A alguns metros de um inimigo
impiedosamente na espreita, pronta a lançar obuses ou atirar de metralhadora ao menor
indício de atividade, multiplicando os foguetes iluminativos para ver melhor, abandonar
as trincheiras e os abrigos, ficar completamente descoberto... Ser obrigado, assim, a
realizar uma tarefa penosa, longa e tão facilmente barulhenta e mortal. Bater as estacas
para crava-las no terreno , parando quando se julga ter sido ouvido: desenrolar as
bobinas e pregar o fio de arame farpado que esfola as mãos e dificulta os movimentos ;
Lançar-se ao solo a cada foguete e a cada sibilar de obus... retomar seu trabalho de
Penélope , depois de levado sem ruído seus feridos ... imagine-se, o que será passar uma
noite inteira nesse trabalho!
E que devotamento, por vezes, a pessoa dos oficiais, demonstrado-lhes
dedicação e consideração ! Que admirável senso se hierarquia e do que se deve ao chefe
digno desse nome! Vou citar um exemplo, para terminar.
Nos combates de agosto de 1917, o 94° de infantaria tinhas participado da
retomada das trincheiras próximas do Bois de Fosses , diante de Verdun. O aspirante a
Oficial Devillars, atacando a frente de seu pelotão que devia em seguida regressar , caiu
durante o assalto fico entre as linhas , sobre uma lombada constatemente batida pelos
fogos das metralhadoras inimigas . Parecia impossivel socorrê-lo. Infelizmente, aliás ,
tudo indicava que tivesse morrido. E , para ele como para os outros esperar-se-ia a noite
para tentar trazer os que se pudesse. Esperando , bem felizes de trincheiras , deixando a
vigilancia da linha entregue a alguns vigias colocados de longe em longe.
Qual não foi espanto gerall ao ver chegar , em pleno dia , nao so por onde nem como ,
esse infeliz aspirante que ja nao respirava , trazia nos ombros do sargento Marie !
E quando se felicitava a este ultimo , lagrimas nos olhos , pedindo-lhe que disse como
ousara e como obtivera exito em semelhante empresa , como se havia arriscado a morte
quase certa para buscar um pouco mais cedo e de dia - mas quand mais perigosamente
do que de noite ! - um oficial considerado perdido e que a todos parecia impossivel
socorrer antes de escurecer , ele nao encontrou senao esta resposta , tao admiravel em
sua concisão , quando sublime na simplicidade e impressionante pelo tom em que foi
dita: - " Era meu comandante de pelotão!"
Quem sabe de algo mais admiravel e mais belo ?
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CAPITULO IX

Como formar e melhorarseu quadro de suboficiais-O papel do combatente do corpo -


nomeações - engajamentos e reegnajamentos - Admissão no quadro de graduados de
carreira - selecionar e atrair "fechando a porta" - Estabelecimento de correntes de
engajamento , vindos de regiões escolhodas para obeter a melhor dosagem psicológicas
, apropiada ao recrutamento dos homens da unidade - Regular as promoções - dirigir
e preparar o futuro dos bons graduados - Evitar que cessem as promoções e impedir a
obstrução dos quadros , por medidas preventivas

Salvo alguns exceções , alias utéis se nao se multiplicarem , a carreira dos


suboficiais se faz toda ela na mesma unidade.
Sem duvida , há transfeências de um regimento para outro , remoções mesmo no
exército metropolitano , para os teatros de operações do exterior , estágios mais ou
menos prolongados em centros de instrução, o que tudo ocasiona as vezes , o
afastamento definitivo dos suboficiais, como instrutores. Mas , de um mode geral - e
isso é excelente - o suboficial que recebe sua primeira promoção do coronel de um
regimento , aí recebeu a instrução militar desde o inicio , aí enganja , reenganja , recebe
suas divisas seguintes e não o deixa senão para se reformar, quando ainda não fica ,
como procurador militar .
Pode-se dizer que sua carreira inteira depende de seu comandante de corpo.
Muita séria responsabilidade para este , por certo , mas também que grandes
possibilidades!
Pode-se discutir a organização atual do Exército Francês no que se refere a
formação dos suboficiais. Não há dutem melhor , a seguinte ocorridoe , de qualquer
modo, cessem quase sempre essas longas reivindicacões solitárias ou conversadas em
grupinhos , que irradiam desmoralizamm considerar , quando se decide por uma
organização , o dela se pretende obeter, em essência.
Deve um suboficial se um sábio , um teórico , possuidor de meticulosa erudição
militar e capaz de raciocinar friamente sobre problemas complicados de utilização das
armas e de tática elementar . Certamente que não. Um suboficial a altura de sas tarefas,
ou melhor , de suas multiplas tarefas , das quais vimos algumas no capitulo anterior , é
antes de tudo , homem de grande experiencia pratica , guarda meticulosa e energico de
realizacoes diarias . O que fazia um garagista , de um estudandte de engenharia , ou
mesmo um aluno de belas artes , se o tivesse como contramestre de suas oficinas ? do
que ele precisa e de um homem que conheca a fundo , praticamente , o funcionamento
dos motores de automovel , que saiba compreeender , escutar , revisar , capaz de inficar
auxiliares os mil pequenos reparos , os arranjos as pequenas coisas que fazem entrar em
acao um mecaniso que nao funcionava : diante de qual estava impotente o propietario de
veiculo , que em muitas vezes , é senhor de conhecimentos teoricos muito serios e por
vezes até muito versado em assuntos de eletricidade pura.
O que prepondera, para os suboficiais, antes de tudo é a prática. Ver comandar e
ele próprio comandar, é o essencial para sua boa formação. E isso justifica sua instrução
no corpo, adquiridaprincipalmente pelo repassar das funções de sua graduação.
Pode-se discutir , tambem , a promocao quase exclusivamente dentro da
69

unidade. Esse sistema pode causar diferencas sefundo a guarnicao e a unidade, diminuir
ou aumentar o tempo medio passado em cada graduacao. Praticamente , as sutuacoes
nos diferentes regimento sao bem comparaveis , e consequencia das remocoes para
outros teatro de operação exterior , dos engajamentos aceitos ou recusados e de
transferidos ou enganjados vindos de outros corpos .
Uma outra objeção e a dificuldade de comando inicial em que ficam a principio ,
aqueles que acabam de ascender a uma graduacao em presenca de seus camaradas da
vespera. Essa dificuldade nao dura muito para aqueles que tem o senso e o desejo de
comandar . As divisas dão depressa autoridade correspondente . E depois , pode-se
sempre impedir isso , tranferindo de companhia ou de batalhão um sargent que acabava
de ser promovido . O curioso e , que praticamente , maioria dos comandantes de
unidade procura evitar até mesmo essa pequena diferença . É que aqui a necessidade de
ter em conta a psicologia do novo graduado , contrapoe-se a convivencia de atender a
psicologia daquele que o propoes . Sem mesmo ceder a esse desagrado natural que se
experimenta e que é institivo , privando-se de um bom auxilar , mesmo visando
promove-lo , um comandante de companhia defenderá mais apaixonadamente , aqueles
dos seus cabos que poderão ser promovidos, se souber que podetar mante-los para si .
Por outro lado ele utilizará melhor , aperfeicoará mais facilmente um homem que ele
tenha instruido e comanda na graduação inferior , do que um subordinado novo , que
terá a tendencia de acreditar menos bem formado pelo vizinho , quando nao disser
memso , abertamente -o que é muito frequente - que se desembaraçaram, em seu
prejuizo , de um elemento mediocre.
Em resumo , pode-se aceitar como satisfatorio , como apresentado mais
vantagens do que inconvenientes , a organizacao atual do Exército francês .
Vejamos , um pouco mais detalhadamente , como se pode tirar dela o melhor
partido .
Comecemos pela questão da promoção inicial.
Periodicamente , o comandante do corpo determina aos comandantes
subordinados que façam , entre seus cabos um exame para a primeira graduação, a de
sargento. Ele se encontra , entao em presença dos mais variados candidatos , cudas
qualidades postar em revelo dependem em parte dos recusros de cada unidade , em parte
do temperamento de cada oficial subalterno que julda de acordo com seu ponto de vista
, segundo suas necessidades pessoais e que geralmente , nao ve o conjunto das
necessidades do corpo. Desde logo se impõe classificação muito delicada . Uma
dosagem tambem e de prever para preencher as vagas , segundo as necessidades atuais e
futuras do corpo, das duas categorias de graduados de que falamos no capitulo
precedente: suboficias de fileira e suboficiais burocratas . Os primeiros serão escolhidos
entre os que representem a energia , a decisão forte o sentido de comando direto ; os
ultimos , entre os elemtenos talvez mais fracos , porém mais inteligentes , tendo
disposições particulares para os trabalhos burocráticos , as funções administrativas .
Tendo promovido seus suboficiais o comandante de copro , auxiliado pelos
subordinados , toma a seu cargo , durante os primeiros anos , conservar aqueles que
obtem sucesso e eliminar pouco a pouco aqueles que nao conseguem satisfazer as
exigências do serviço . Os conselhos regimentais , presididos pelo coronel , podem
70

seleciona-lós , dando seu parecer sobre a aceitação dos pedidos de enganjamento e sobre
a sua duração . Quando se estudou cuidadosamente , durante dois ou três anos , um
engajamento , quando se o enganjou de um , dois ou três anos anos , está-se
perfeitamente informado sobre as possibilidades desse suboficiale seu valor para o
regimento e pode-se admiti-lo ou não , conscientemente , nos quadros definitivos de
suboficiais de carreira .
Todos estão de acordo , teoricamente , sobre a necessidade dessa seleção e
entretanto muitos cometem , de inicio um erro psicológico que vai completamente de
encontro ao fim procurado .
Para que a seleção seja eficaz , é preciso que se faça sobre o maior numero de
candidatos possiveis . Ninguem discorda. Será preciso por isso , fazer repetidos apelos
aos de fora , abrir largamente as protas ? Esse não é , creio eu, o bom processo . Sem
dúvida , é mister criar correntes de engajamentos , correndos numerodas e todas
abundantes , se possivel. Vamos , ver , amsi adiante , quais os principios para escolhe-
las . É indispensavel reservar lugares e facilidades de acesso por região , quero dizer ,
aos enganjados vindos de cada parte importante do território nacional. É aí que se deve
semear para colheros melhores engajamentos futuros ; fazer com que em sua aldeia , sua
socidade de preparacao militar de origem , durante suas licenças , ostentando as novas
divisas , os graduados sintam-se satisfeitos com a sorte , orgulhosos de seus uniformes e
de suas unidades , podendo servir de animados agentes recrutadores , talvez mesmo sem
saber e de atraentes exemplos vivos . Mas essencial ! é conquistar a possibilidade de
escolher.
E , então , nisso como em tudo , como muitos desejar entrar , é preciso "fechar a
porta". São principalmente os pequenos restaurantes que tem freguezes numerosos ,
pois sempre se pensa não encotrar mais lugar. Sós , os circulos elementos fechados e
com a reputação de acesso difícil , vem suas portas Assediadas e seus frequentadores
selecionados. Os outros multiplicam em vão o reclame e os apelos.
Um comandante de corpo não deve, pois, hesitar em dificultar as nomeações e
em desvencilhar-se dos elementos medíocres. Promover e engajar a qualquer um, não só
estorva um regimento com graduados inúteis, entrava o acesso dos elementos de escól,
diminui o valor do quadro de suboficiais e em consequência da tropa que será mal
instruída e mal enquadrada, mas ainda, afasta os elementos interessantes e de valor do
contingente chamado, que por si mesmos não hão de solicitar admissão em uma
coletividade depreciada.
È recusando os medíocres que se atrai os bons. Não se deve desanimar-se ao ver
claros nas fileiras, a principio. Mais do que isso, é preciso abster-se de receber pedidos
de engajamento de suboficiais de outras unidades. Nove vezes em dez, não se terá entre
eles mais do que maus elementos, gente de má fama mais ou menos dissimulada nas
folhas de alterações, os quais sua própria unidade não readmitiria. É preciso esperar,
conservar se necessário alguns meses os claros nas fileiras, e depois, o que é mais
importante, proporcionar uma carreira rápida aos melhores.
Há, já o dissemos acima, princípios a respeitar para escolher as regiões de onde
se quer obter suboficiais e onde é interessante, por consequência, criar correntes de
engajamento para sua unidade. A psicologia coletiva de uma unidade de Infantaria
71

depende, senão pelas características gerais expostas no primeiro capítulo, ao menos pela
variedade que elas comportam, das qualidades, e dos defeitos das raças que as
compõem. A designação dos recrutas que lhe são confiados escapa do comandante de
corpo. É uma questão de organização do conjunto do exército. Diremos algumas
palavras sobre esse assunto em capitulo posterior. As origens dos oficiais do regimento
escapam de mais ainda ao coronel e há, aqui, um mundo de considerações de interesse
geral e particular, de necessidades de carreira, de enquadramento e de utilização de
competência que tornam o problema complexo. Afinal, a influência das origens se
atenua e todos os oficiais devem ser capazes de se integrar em qualquer regimento e
apresentar um rendimento satisfatório.
Mas para o recrutamento de suboficiais é suscetível de grande poder a ação do
comandante de corpo. E pode-se afirmar com certeza, que não é igualmente indiferente,
por exemplo, que soldados do Norte sejam enquadrados exclusivamente por suboficiais
do Norte, os soldados do Sul por suboficiais do Sul, etc... Cada corpo, para ser o
melhor possível, precisa de uma discreta dosagem de sangue e de caracteres cariados.
Porque não haveria nos corpos algo parecido com o que ocorre e se procura pelo
selecionamento das raças? Nenhum criador ignora que uma raça nervosa e fraca como o
cavalo puro sangue inglês, por exemplo, é utilmente completada, para obter animais
capazes de um serviço ativo e rude, por uma corrente de sangue mais resistente e mais
rústica, como a do cavalo oriental; e aí está a razão de ser do anglo-árabe. Para todos os
animais quaisquer que sejam, considerações análogas fazem buscar cruzamentos
apropriados, segundo as qualidades que se deseja, os defeitos que quer se atenuar e a
utilização que se pretende fazer. É inegável que, se tal coisa fosse possível e não se
chocasse com dificuldades de hábitos intransponíveis, de tradições de conveniências,
melhorar-se-ia a raça humana e se obteria, um produto mais perfeito, cruzando, em
certas condições, se ouso dizer, as raças e as famílias. Assim é certo que as guerras e
particularmente as guerras de coalizão – por outro lado tão destruidoras – dão margem a
felizes transformações em certos caracteres nacionais, pelos casamentos muito
numerosos entre pessoas de nacionalidades diferentes que elas sempre favorecem.
Para a coletividade que encaramos, os mesmo princípios conservam seu valor, e,
sua aplicação não só provoca objeções, como é fácil e fecunda. Assim, se um regimento
recebe habitualmente os mesmos contingentes, tendo qualidades e defeitos bem
caracterizados, haverá maior vantagem em procurar uma melhoria do conjunto por um
mistura de qualidades complementares encontradas em recrutamentos diferentes. Às
qualidade de amor-próprio e de inteligência de certos contingentes, frequentemente
compensadas pela falta de energia e de dedicação, será mister acrescentar virtudes de
devotamento e de ardor no trabalho meticuloso, pelo complemento de suboficiais
oriundo de regiões apropriadas. Aos contingentes cheios de iniciativa e as vezes de uma
independência exagerada, convirá dar, por suboficiais homens que possuam em sua
região de origem o senso hereditário da hierarquia e do respeito as coisas estabelecidas.
Aqueles que tem apenas obstinação, será bom dar suboficiais cheios de atividade e de
energia etc... Temos a fortuna de achar tudo isso na França.
Sem precisar estender-se demasiados, vê-se que o estudo prévio das qualidades e
dos defeitos de recrutamento habitual, se impõe ao comandante do corpo. De pronto se
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verifica os esforços que ele deve desenvolver, para dar nascimento as correntes de
engajamento que são uteis a unidade, para obter uma judiciosa dosagem psicológica do
conjunto e fazer predominar, entre os suboficiais, as qualidades que faltam aos soldados.
Isso não é muito difícil em se dirigindo inicialmente as sociedades de Preparação
Militar das regiões escolhidas e facilitando, em seguida, o acesso aos melhores de lá
oriundos. Uma proporção suficiente de suboficiais, tomada nas principais regiões de
recrutamento dos homens, assegurará, por outro lado, uma satisfatória compreensão da
natureza destes e a exploração feliz, entre os suboficiais também, das qualidades dessas
regiões.
Aos suboficiais assim recrutados, selecionados e promovidos, é preciso
“assegurar” o acesso no corpo, como se procura assegurar o acesso dos oficias no
Exército interno.
Pode-se obter esse bom resultado mais facilmente, sob a condição única de que o
comandante do corpo não seja frequentemente substituído. É indubitável que
conhecemos melhor os candidatos cujos serviços se fazem debaixo de nossas vistas e se
podem comparar. Pode-se realizar isso, sem mudanças onerosas e difíceis de guarnição,
passando uns e outros por várias funções. Não se fica tão sujeito as influências de
colegas, nas as recomendações e a proteção que os mais altamente colocados provocam,
informando sobre pessoas que não conhecemos bem.
Ser justo desde o início é indispensável; e ser justo não dizer tratar todos da
mesma maneira, mas tratar cada um segundo seus méritos e suas capacidades,
atendendo também as necessidades e o interesse do corpo.
Experimentar a cada um, desde o início, nas primeiras graduações, nas funções
que exijam as qualidades mais diversas. Aqueles que sem mostrar incapaz de ser, em
qualquer tempo, um suboficial contador ou arquivista, poderá vir a ser um admirável
instrutor ou, um encarregado de tiro de dedicação inestimável; um outro, aparentando
inteligência, desenvolto, especializado no cálculo rápido, num cargo de contador, poderá
vir a se tornar, mais tarde, um auxiliar pouco escrupuloso, tudo exigindo atenção e
estudo para uma final designação acertada.
Depois de experimentados, nos primeiros anos, nas diferentes possibilidades,
engajar os suboficiais com pleno conhecimento de causa, dirigindo cada um aos cargos
correspondes as suas aptidões e as suas capacidades. Exigir, depois dos primeiros anos
de experiência, disciplina, dedicação, sentimento de dever e energia sem
desfalecimentos. Desvencilhar-se dos que não tiverem valor moral e dedicação absoluta.
As qualidade de inteligência, de distinção e mesmo de tato, são menos essenciais.
Demais, não se pode pedir todas as qualidades, nem mesmo os dons indispensáveis aos
postos mais elevados, aquele que devem contentar-se com trabalhos humildes. Não os
encontraríamos e, talvez, se os encontrássemos mesmo em dose menor, seriam
prejudiciais. Fujamos dos desclassificados e dos fracassados.
Depois disso, tendo selecionado e feito aparecer os bons elemento, deve-se
assegurar-lhes uma carreira razoável, suficientemente rápida e variada, para não os
desagradar e desanimar. As funções próprias de suboficiais, em uma unidade são
bastante diversas para permitir à experimentação das competências, seu
aperfeiçoamento, a recompensa aos esforços e a adaptação de cada um a melhor função,
73

no interesse geral.
Convém não esquecer que os mais velho9s, aqueles que exerceram sua atividade
e deram sua dedicação nas tarefas mais rudes, tem direito, no fim de carreira, aos cargos
de confiança, mais tranquilos. Seu passado justifica isso e os preservará da
desconsideração e da inveja que será dirigidas preferencialmente aos mais jovens, aos
que ainda não tenham conhecido, da vida material a parte mais dura.
Um. Estudo aprofundado das condições de acesso encontradas em seu regimento deve
orientar o coronel, para tomar as medidas necessárias e apropriadas para que, nele, o
acesso não seja interrompido durante certos períodos, para que um obstrução de efetivos
passageira, não comprometa a carreira de alguns suboficiais em atividade e não acarrete
– o que seria ainda m--ais grave – desagradáveis paradas repentinas, prejudiciais ao
próprio interesse da unidade, o qual é inseparável de um ritmo normal e harmonioso nos
engajamentos, na ascensão hierárquica e nos licenciamentos. As admissões limitadas no
quadro de suboficiais de carreira, a criação de cursos preparatórios aos empregos civis
reservados, que devem preencher sua finalidade de atração para a baixa, o licenciamento
dos quadros em seguida e outras medidas apropriadas, devem ainda permitir, atingir os
fins colimados, com o ponderado julgamento, a experiência e o espírito de continuidade
que cabe ao chefe utilizar.
Resumindo: no estado atual da organização da Infantaria, (falo da Infantaria
porque é ela que estou estudando, mas , tal como ela, o mesmo se dá nas outras Armas,
sob este ponto de vista), a formação e o aperfeiçoamento dos suboficiais dependem,
quase que exclusivamente, do comandante do corpo. Seja pelos poderes parar decidir de
que dispõe de acordo com as leis e os regulamentos, seja em virtude da autoridade
moral, que representa em face das decisões que, em parte, não lhe cabem, é ele que
detém nas mãos a sorte dos suboficiais de seu regimento. Para estar a altura dessa tarefa
considerável deve conhecê-los, compreendê-los e ama-los, tudo fazendo, sem fraquejar,
para se livrar dos maus. Mas todos os oficiais devem saber utilizar e comandar esses
auxiliares indispensáveis.
E isso nos conduz a estudar como se deve agir, para obter deles o máximo.
74

Capitulo X

Como empregar e comandar os suboficiais ----interessar-se por sua situação material--


-aumentar seu valor intelectual---elevar sua posição social---comandá-los enérgica e
claramente ----guiá-los---vigilância e confiança---ordens meticulosas e iniciativas úteis
---manter-lhes a autoridade em face dos subordinados-------defendê-los,quando for
justo,em face das autoridades superiores ou vizinhas---elevar sua situação no país e
preservá-los de um injusto e,infelizmente,tradicional descrédito.

Não obstante as indiscutíveis melhorias de vencimentos a pouco e pouco


concedidas,a situação material dos suboficiais ,sobretudo dos casados,permanece
precária.
Outrora eles eram todos celibatários. Em período de guerra,de constantes
mudanças de guarnição,é indiscutível que assim era melhor.Nos tempos atuais
.felizmente,as guerras são raras e a estabilidade tornou-se a regra .E tornou-se melhor
facilitar,para eles, como para todos os outros,a criação de famílias normais.Sem dúvida,
diminuiu-se-lhes um pouco o rendimentos e a mobilidade, mas também se os afasta de
uma vida de ''amigação'' e muitas vezes de amigação nos mais baixos níveis,que tão
facilmente os atrai.
Os suboficiais casados, nem sempre se sabe como, porque as aparências
enganam,não conseguem aguentar-se,como se diz,senão por prodígios de
engenhosidade e de economia e muitas vezes porque suas esposas os ajudam
trabalhando.Mas quando elas têm um filho,quando estão doentes ou quando têm alguém
dos seus doentes,pode-se imaginar,se se quiser pensar nessas cousas ,como serão
difíceis as situações porque passam.
É pois um dever,e o primeiro,interessar-se pela situação material dos suboficiais
E,mormente se puder confiar às esposas de oficiais escolhidos ,o cuidado de velarem,
nos momentos difíceis,por essas famílias, sem imiscuir isso com exigências do
comando,o chefe militar conquistará maior autoridade para exigir,como é necessário,no
serviço. Aquele que deu prova, algures, de benevolência e de bondade pode,se
necessário,ser por vezes até severo,sem que seus subordinados esqueçam do que
fizeram e deixem de crer nos sentimentos da justiça e de humanidade de seu
chefe,sentimentos esse que os unem.
As questões de dinheiro e de gratificações, devem ser as primeiras a prender a
atenção. Os graduados quase nunca têm fortuna pessoal que lhes permita suprir as
deficiências de vencimentos, como fazem frequentemente, os oficiais, Não se trata de
exigir, para eles, conforto exagerado e em desproporção com o meio a que pertencem e
com os trabalhos que realizam;mas deve-se-lhes assegurar uma vida suficientemente
equilibrada e afasta-los da tentação de aumentar seus recursos por meios impróprios e
desonestos.Não obstante a fiscalização meticulosa da administração militar,isso não lhes
será sempre impossível,em virtude de suas inevitáveis relações com os fornecedores e
da mentalidade comercial do após-guerra, que deslocou um pouco os limites da
honestidade.
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Soldos e gratificações suficientes em tempo normal, amparo oficial ou privado


nos momentos de doença, afastando as situações difíceis, é o essencial do que os chefes
devem obter para os graduados, sob o ponto de vista monetário.
É preciso, ainda, que com igual importância possam comprar mais. Todo o
esforço deve ser feito para defendê-los dos fornecedores muito careiros ,criar,se
possível,cooperativas de consumo,favorecer as compras em comum, etc....,esforçar-se
mesmo , sem abuso mas também sem estreiteza de ideias , por lhes facilitar certos
transportes excepcionais nos veículos militares momentaneamente disponíveis ,sob
condição,bem entendido,de utilização que pretendam de mão de obra militar que tenha
qualquer outra tarefa a cumprir, mas pode-se, e com vantagem , facilitar-lhes uma
economia em transporte em dia de mudança emprestando-lhes uma carroça com animal,
não ocupados em outro serviço.
A questão da mudança é bastante delicada, julgamos de utilidade ajudar os
suboficiais nesse particular. Foram previstas ajudas de custo para o aluguel - muito
insuficientes para cobrir as despesas correspondentes - construíram-se as moradias
militares.Mas esta segunda solução ,a mais satisfatória sob os pontos de vista de
acomodações residenciais e economia relativa , apresenta ,geralmente , o inconveniente
de dar margem a uma espécie de quartel para os suboficiais casados ,quer morem em
apartamento de um mesmo edifício,que disponham - o que é raro - de pequenos
pavilhões vizinhos. Mas em um ou em outro caso, não se evitam todos os
aborrecimentos de uma grande aproximação, todos os inconvenientes de uma quase
coabitação de pessoas de graduação diferente, tendo subordinações recíprocas, ciúmes
de serviço,rivalidades de dinheiro e de situação.E depois.não há senão vantagem, para
os suboficiais como para os oficiais em se misturarem um pouco mais ,fora do
serviço,na coletividade civil do país,vantagem em serem obrigados a falar um pouco de
outros assuntos diversos dos militares ,o que repousa o espírito,distrai as ideias ajuda
mesmo,e muito utilmente às vezes, a esquecer dos pequenos problemas de
quartel,inevitáveis. Não seria solução melhor a de tratar diretamente com os
proprietários, em número a fixar, o aluguel de moradias reservadas para os suboficiais,
espalhadas por toda a cidade, ou mesmo moradias quaisquer ocupadas depois e antes
por locatários civis? Mas voltemos, como convém, às ajudas de custo para o aluguel, a
melhor de todas as soluções, com a dupla condição de que cobram suficientemente as
despesas e não sejam exageradamente pesadas para o estado.
Poderíamos desenvolver esses diversos modos de interessar-se pelo bem estar
material dos suboficiais, o ideal é insistir sobre a importância desses assuntos. Os
suboficiais já vimos, atribuem a isso um valor particular. para eles,como para outros,e
até mais,--porque para muita gente modesta (porteiros,vigias,etc.)estão satisfeitas as
primeiras necessidades materiais e o ordenado já pode atender a um começo do
supérfluo ,--é preciso antes do mais,viver: primum vivere ...
Em seguida, convém, preocupar-se---mais do que se fazia antigamente - em
aumentar seu valor intelectual,em cumprir sua situação moral,em elevar-lhes a posição
social.Como todas as pessoas do povo sofrem com a insuficiência de sua instrução
geral.Sem dúvida, não se pode ter a pretensão, com a idade que tem e com a formação
inicial que possuem.-variáveis de uns para outros,mas geralmente muito rudimentar.-
76

fazê-los atingir os pontos culminantes do conhecimento.Mas quantos livros,quantas


revistas são a miúdo mais facilmente lidos e compreendidos por eles do que se
acreditaria!E eles são, de qualquer modo, sensíveis a essa prova de que os julgamos
dignos de tomar contacto com os cérebros cultos do país.Nos livros e brochuras que se
lhes ponha à ,disposição,há vantagem em reservar uma boa parte às produções de um
nível intelectual suficiente,mais do que em lhes reservar sempre e unicamente a
literatura de romances baratos ou as fastidiosas compilações que pretendem vulgarizar
conhecimentos.
Um circulo bem instalado, decorado com gosto, pouco a pouco os atrai e os
eleva. Há vantagem em melhorar um pouco suas instalações e as utilidades coletivas
que se organizem procurando fazê-las semelhantes às dos oficiais. Tudo o que se afastar
do gênero taberna e cantina e que se aproximar das instalações de um café confortável e
mesmo de um clube terá, não tenhamos dúvida, uma influencia certa sobre a conduta do
conjunto no local. Sem dúvida, é mister se expor a um desastre,nem procurar o
impossível; mas se renuncia muito facilmente sobretudo no exército francês. A obtenção
de locais apropriados ou de certa elegância, sob o pretexto de que ,em pouco tempo,tudo
estará sujo e estragado.A experiência prova que,onde há um pouco de requinte,os
ocupantes são mais cuidadosos. É verdadeiramente lamentável que, em uma nação
naturalmente culta e requintada como a nação francesa encontrem-se, tanto entre civis
como entre militares, instalações geralmente muito inferiores àquelas de meios análogos
de outros países. Qual o oficial francês que, tendo participado da ocupação da
Alemanha, não se recorda de acomodações de simples empregados constantes de
banheiro e uma sala confortável, enquanto que os franceses dessa classe moram em
condições de higiene e de conforto habitualmente muito inferiores? A melhoria geral do
conforto e da decoração do lar diminuem, felizmente, as distâncias sociais, afasta da
taberna, do café, até do cinema, orienta as despesas de cada um para um bem estar mais
durável. Trabalha-se nesse sentido pelo espírito de família e pela paz social. Essas
considerações gerais, válidas para o conjunto da sociedade, são aplicáveis também aos
suboficiais, sob a reserva, bem entendido, de não prejudicar a aptidão para as
transferências indispensáveis aos militares e à necessidade, para eles, de estar sempre
prontos a aceitar, quando necessário, condições de vida as mais duras e as menos
confortáveis.
A importância de um fardamento pomposo não pode deixar de ser acentuada.
Sabemos que é uma das principais atrações da vila militar. É digno de nota observar as
despesas, relativamente importantes, feitas com pelas chamadas de fantasia, até mesmo
por soldados recém incorporados, alguns dos quais entretanto, fingem que assim fazem
porque tem pressa em deixar o uniforme. Que isso seja pueril, que seja por vezes
inspirado por um desejo de sucessos fáceis ou por admiração de segunda ordem, pouco
importa. Não se trata, aqui, de apreciar as qualidades e os defeitos de certa psicologia,
mas de explorar-lhe, no interesse geral, os caracteres úteis.
Estendi-me um pouco sobre essas preocupações que devem tender a melhorar
constantemente a situação material e a situação moral dos suboficiais. Quando se fala
aos superiores em melhorar assim a sorte de seus subordinados, quase nunca são
arguidas objeções teóricas. Mas, quando se vai às realizações práticas, muitos se
77

desinteressam delas ou as deixam cessar pelas dificuldades de realizações reais, mas não
irremovíveis. Entretanto, nisso como em outras cousas, quantas reivindicações,
expressas um dia brutalmente e em desacordo com as regras normais de hierarquia
seriam evitadas, se todos os chefes se pusessem bem a par – e pudessem prova-lo –
efetivamente – que sua primeira obrigação é defender seus subordinados e falar
respeitosa, mas firmemente, quando necessário, em seu nome. Uma justa reclamação de
um chefe, em benefício dos subordinados, é um ato de comando que fortalece a
disciplina e a justifica, E, nesta nossa época de exagerado igualitarismo, de ódio a todo
comando, de procura de pistolão e de recomendações, há um interesse geral poderoso
em mostrar que um chefe não é apenas um controle no manancial da liberdade, mas
também, e frequentemente, o mais poderoso e o mais eficaz de seus defensores.
Se gostam que, solicitamente, deles nos ocupemos, os suboficiais não precisam
que os comandemos com diplomacia. Gostam do comando direto, claro e enérgico.
Basta dizer-lhes, simplesmente, claramente, com brevidade, o que deles se quer. Com
frequência, vê-lo-emos mais adiante, há vantagem em consultar oficiais antes de
transmitir uma decisão ou de dar uma ordem. Com os suboficiais o método pode ser
mais brusco, mais “militar”.
É preciso, também, entrar em muito mais detalhes. É melhor aconselhar antes,
dar explicações à altura das inteligências a que em cada caso se dirijam, do que ter de,
em seguida, repreender, mandar refazer, seja porque a ordem não foi suficientemente
ajudada. O chefe está presente para suprir, em princípio, a ignorância e a insuficiência
daqueles que comanda. Poderá, então, com muito maior intransigência, exigir uma
execução exata e minuciosa, que não terá exigido do subordinado mais do que as
qualidades de devotamento, de experiência e de energia, que são próprias de sua função.
Uma vez dada uma tarefa bem nítida e detalhadamente explicada, pode-se e
deve-se deixa-la à iniciativa do suboficial antigo e experimentado. É preciso, todavia,
fiscalizar sempre a execução e o rendimento. É principalmente pelos exames frequentes,
bem preparados e levados a fundo, nos trabalhos em execução, que se exerce a ação do
chefe e se evitam a moleza e a falta de dedicação e que ao contrário disso, se sabe
felicitar na ocasião devida o sentimento do dever, a engenhosidade e o zelo, se encoraja
os que executam o serviço.
É fácil compreender que um mesmo suboficial não pode ser comandado do
mesmo modo por todos os chefes a que a disciplina subordina. Particularmente um
oficial muito jovem, que se inicia, deve ter muita prudência e tato na lida com os
suboficiais antigos. Mas o espírito de disciplina destes últimos é, em geral, tão
excelente, que se vê, o mais comumente, velhos sargentos ajudantes obedecerem sem
dificuldade a aspirantes muito jovens, por pouco que estes saibam reconhecer a
superioridade de experiência dos velhos servidores e procurem dar ordens claras e bem
meditadas, que provam sua superioridade de formação teórica e de inteligência.
Em todos os graus hierárquicos, é preciso saber de quando em vez de conversar
com os suboficiais, inspirar-lhes confiança, compreender-lhes os desejos e sugestões
tantas vezes úteis. É raro que se possa adotar estas últimas, porque, olhando-se de baixo,
vê-se geralmente mal o conjunto e as consequências de certas modificações solicitadas;
entretanto, há sempre alguma cousa a apreender. E depois os subordinados, os de
78

menores graus principalmente, gostam que os escutemos com calma e paciência e,


convencidos, admivida de que uma escola especial de formação, análoga à da dos
oficiais, daria resultados de instrução teórica superiores... Teria vantagens e
inconvenientes. É preciso, então, uma regra geral de comando – às vezes difícil de
aplicar a suboficial ineptos, e os encontramos, temos de reconhecê-lo – impõe que
nunca se faça qualquer agravo a um chefe diante dos subordinados, salvo casos muito
raros. Pode-se e deve-se , em seguida, recolocar as cousas no lugar devido. É
indispensável evitar que os erros se repitam, fazendo ressaltar os inconvenientes, àquele
que tenha sido o culpado. Não se deve, por outro lado, tolerar nunca uma injustiça;
convém sempre retificá-la em público!
Vezes há em que é preciso defender os suboficiais contra pedidos de punição,
oriundos de unidades ou serviços vizinhos. Convém fazê-lo comedidamente, pois esses
pedidos são, em geral, justificados e as explicações dos acusados, quase sempre
eximindo-os completamente de responsabilidade, não são muito convincentes. Mas
acontece, às vezes, que as autoridades vizinhas, para não contrariarem diretamente uma
medida ordenada mais de cima, mas que desaprovam, acham mais fácil fazer recair
sobre um elemento subalterno, o descontentamento que experimentam.
Uma das principais preocupações dos oficiais deve ser elevar, em presença de
todos, a situação dos suboficiais. Estes são frequentemente atacados ou desacreditados
seja em conversa, seja por escrito. Há mesmo uma lenda tradicional que a muitos parece
sem graves inconvenientes. É certo que não se pode defender sempre a todos. Que haja
alguns suboficiais servis e desajeitados, é indiscutível, – são só eles? – mas aqueles que
generalizam essas cousas atacam o mais das vezes, indiretamente, os próprios princípios
da hierarquia e da organização do Exército. Muita gente clama que não compreende. A
vida comporta muitas tarefas humildes que tem de ser feitas forçosamente com
humildade. É injusto e particularmente odioso querer diminuir aqueles que são
encarregados dessas tarefas e que por certo preferiram, também eles, que fossem feitas
por outras pessoas.
Na guerra, essas tarefas humildes tornam-se, às vezes, as mais belas, pois que
comportam tantos ou mais perigos do que as outras. E elas não trazem nem glória, nem
promoção, nem mesmo, às vezes, as mais modestas recompensas.
Reconheçamos, entretanto, que o Exército Francês, para elevar a situação dos
suboficiais, descobriu felizes auxílios que outros exércitos ignoram. Em certos corpos,
entre nós em virtude de circunstâncias excepcionais, deu-se, a título honorário,
graduações, até a soberanos. Assim é que o rei Alberto I, da Bélgica, é sargento
honorário do 19º Batalhão de Caçadores; o rei Cristiano X, da Dinamarca, sargento
honorário do 22º Batalhão de Caçadores Alpinos. Por teórico que seja, o fato não deixa
de ter um valor simbólico de que já me foi dado constatar a importância.
Foi, mais que outras, uma maravilhosa ideia francesa a que fez da recompensa
dos suboficiais, – a Medalha Militar – a condecoração máxima reservada aos chefes de
mais alto grau, depois de lhes terem sido conferidas todas as outras condecorações.
Essa exaltação da tarefa dos suboficiais é útil e é justa. Útil porque, qual seria o
valor de uma tropa sem bons suboficiais? Justa, porque é um dever honrar esse tipo
79

humano que aceita uma vida áspera, subordinada, muito perigosa na guerra,
contentando-se com as mais modestas recompensas.
80

CAPÍTULO XI

O oficial de Infantaria - Origens e meios diferentes - Traços característicos de sua


psicologia em suas relações com a tropa, com os camaradas e com os chefes -
Interessa-se, detidamente, por seus homens, gosta dêles e os defende, dá-lhes o
exemplo de resignação nas ocasiões difíceis, é um professor de energia -
Solidariedade e emulação em presença dos seus iguais - Suscetibilidade, espírito
crítico e devotamento no trato com os seus superiores - Velhos e jovens oficiais de
Infantaria.

Fique bem entendido, de início, que tudo o que dissermos sobre o oficial de
Infantaria não visa traçar qualquer comparação com os oficiais das outras Armas ou
Serviços, nem implica qualquer ideia de inferioridade ou de superioridade.
Quando se quer estudar os tipos gerais, fica-se exposto, também e
principalmente, a erros particulares. Uma senhora disse-nos um dia, muito aborrecida: -
"Vós, os homens, dizeis: as mulheres têm esta qualidade... as mulheres pensam isto...,
etc... Mas isso não quer dizer nada. Há uma mulher que tem tal qualidade. Outra, tem-na
inteiramente diversa". Em verdade é assim. Entretanto a expressão dessa verdade peca,
ela própria, no que respeita aos homens, por generalização excessiva. Mas apesar disso,
há ou não há caracteres gerais comuns à maioria das mulheres? E aquele que os
conhece, que aproveita, falando a uma percepção instintiva, não tem mais
probabilidades de agir com o acerto do que empregando, na falta de argumentação
pessoal, não importa que raciocínio menos apropriado, dirigindo-se a ela como, por
exemplo, a um homem de ciência ou a um jurisconsulto?
Não é, pois, impossível nem despido de interesse tentar, do mesmo modo,
determinar alguns traços psicológicos, característicos, comuns a todos os oficiais de
Infantaria.
Estes são, no exército Francês atual, de origens, de meios e de futuro muito
diferentes. É um fato e é um bem, pois eles vão ser utilizados diferentemente.
O oficial saído de Saint-Cyr é geralmente inteligente, educado, instruído. É, de
início, desconhecedor dos detalhes práticos da administração da tropa. O oficial saído de
Saint-Maixent tem a miúdo apenas a instrução primária, mas está muito a par da vida
quotidiana das unidades. O oficial oriundo das fileiras e dos graduados antigos têm,
frequentemente, uma competência administrativa preciosa para os empregos especiais
nos serviços gerais do corpo. Os oficiais - numerosos agora - oriundos da reserva do
Exército, são de inteligência e de valor muito variáveis. Muitos têm cultura geral
desenvolvida, mas têm formação inicial menos militar e serão empregados mais
vantajosamente, fora do comando direto da tropa.
Na guerra, particularmente durante uma guerra de vários anos, como na última,
nenhuma diferença se pode fazer, nos postos subalternos, baseada nessas origens. Os
pormenores característicos delas resultantes, são insignificantes em comparação com as
características puramente guerreiras que fixam o conjunto da fisionomia moral. O fogo
da batalha dá a têmpera necessária e elimina os incapazes. Não se pode tratar de
questões de detalhe. Aquele que não for capaz de honrar seus posto será eliminado; e os
que ficarem valerão, sobretudo, por motivos que não se podem aprender nas escolas.
81

Já em tempo de paz se utilizaria mal um corpo de oficiais se não se levasse em


conta, em princípio, as diferenças de formação. Além disso, só um estudo aprofundado
dos valores e das qualidades individuais permitirá o bom emprego de cada um na
função devida. Deve-se evitar de classificar definitivamente os oficiais segundo suas
origens. Ficar-se-ia exposto a erros graves, infalíveis, pois o trabalho posterior ou a
maior inteligência, suprema, muitas vezes, aquelas deficiências que, de início, não lhes
fora possível corrigir, em virtude da própria formação moral.
Dessas possibilidades e aptidões particulares indicadas (há outras provenientes,
por exemplo, do meio social), vejamos o que se pode reconhecer como traços
característicos habituais, comuns aos oficiais de Infantaria em suas relações com a
tropa, com seus camaradas e com seus superiores.
O oficial de Infantaria estima a sua tropa e se interessa vivamente por ela.
Nenhum pormenor parece-lhe insignificante. Nem o estômago, nem as disposições de
espírito, nem os mais íntimos sofrimentos de seus homens, são-lhe indiferentes. Vê a
comida, examina os pés. Sabe que faz sofrer e o que alivia, o que descontenta e o que
alegra; sabe o que ajuda uma tropa a marchar e o que a desencoraja. Não tendo, o mais
das vezes, os meios para fazer transportar seus homens, nem mesmo para aliviá-los de
uma parte de seu equipamento - e é isto que os diferencia essencialmente, desde os
tempos de paz, dos oficiais das outras armas - sabe que é obrigado a contar com os pés,
as pernas, sua resistência física, com seu estômago e também com o que se chama de
coração, isto é, sua energia. E fica atento, cuidadosamente, ao seu estado físico e moral.
Defende e elogia sua tropa, quase sempre, mesmo que seja medíocre. A esse
respeito, o exemplo dos oficiais de Infantaria Ligeira da África é típico. essa é, sem
qualquer dúvida, uma tropa má, pois que é formada de homens viciados, que servem
obrigados e contra a vontade e que, a miúdo, não compensam essas deficiências com
qualidades de energia e de bravura, como o fazem os Legionários, na falta de
honestidade e de valor moral. Pois bem! a maioria dos oficiais dos "chistosos", como
costumam chamá-los, chegam a orgulhar-se de sua unidade, passando de largo sobre as
desilusões individuais.
O oficial de Infantaria sabe dar exemplo de resistência nos momentos difíceis e
de sofrimento. Mesmo em tempo de paz, sofre com seus homens e aprende bem
depressa, pelo exemplo dos camaradas e pela diferença dos resultados obtidos que,
mesmo que sua presença não corresponda a uma ajuda eficaz nem a uma necessidade de
comando, é necessária, entretanto, sob a chuva, na lama, ao frio, a fim de ajudar seus
soldados a suportar também eles, as intempéries e os sofrimentos. Pode-se discutir o
acerto, para o comandante de pelotão, de conduzir um dia a mochila de um homem
fatigado, pois ser-lhe-á preciso chegar menos cansado ao fim da jornada, não só pelas
idas e vindas suplementares, como para que ele próprio possa repousar, esperar que tôda
sua gente tenha feito tudo o que era preciso, escalar os serviços e dividir as tarefas
necessárias; mas é inegável que um comandante de companhia e mesmo um
comandante de corpo tem, frequentemente, interesse em apear do cavalo e marchar a pé,
quando a etapa é particularmente dura. O preceito não é de hoje, nem de ontem mas
muito antigo: "Ó capitães, meus companheiros, escreve Blaise de Montluc em seus
82

comentários¹, quantas e quantas vezes, vendo os soldados cansados e esgotados, apeei


para caminhar com eles, para fazê-los empreender uma grande caminhada! Quantas
vezes bebi água com eles, a fim de dar-lhes exemplo para matar sede!"
Pode-e estabelecer, para dar uma regra geral, que o oficial de Infantaria sabe
que, se sua tropa está em condições normais de conforto, ele pode e deve beneficiar-se
das pequenas vantagens de relativo bem estar que são privilégios de seu grau
hierárquico e correspondem às fadigas suplementares de direção e de comando; porém,
que, se ela passa por sofrimentos e fadigas um pouco excepcionais, também ele deve
compartilhá-los.
Partilhando completamente da sorte de seus homens, ele conhece melhor do que
ninguém suas necessidades e seus sofrimentos. Quando for preciso não será necessário
senão ele, para ser caloroso advogado, em tais assuntos.
É enfim, um professor - e dos melhores - e um modelo de energia. Acima de
tudo sabe dar exemplo da resignação, "esta forma, passiva da energia", como disse tão
excelente P. Géraldy em "La Guerre, Madame...", tão difícil, tão ingrata, tão
obscuramente meritória, mas tão frequentemente indispensável ao infante.
Para com seus camaradas, o oficial de Infantaria dá, geralmente, prova do maior
espírito de solidariedade. Necessitando ser sustentado e apoiado por seus vizinhos (no
fogo, a derrocada da tropa vizinha ou o seu retraimento, cria a brecha fatal por onde
passará o inimigo para nos envolver e nos isolar), ele próprio está pronto a ajudar com
todos os seus meios e com toda a dedicação, o camarada que comanda a tropa vizinha.
Os oficiais de um mesmo corpo formam um todo particularmente unido. Cada
um deles sabe que uma ação coesa, uma só opinião para todos aqueles que trazem na
gola o número, têm muito mais peso e influência do que a soma das ações e das
opiniões isoladas.
Sem dúvida, há certa emulação, por vezes até certa rivalidade entre as diferentes
unidades. Cada uma quer ter, ou antes, chegar a possuir a melhor tropa, mas, quase
sempre não se visa interesse pessoal e (salvo nas raras e penosas épocas das propostas
para recompensas e das competições para promoção depois das quais as decepções são
depressa esquecidas) a rivalidade e a inveja - muito mal vistas, aliás - são raras ou, pelo
menos, muito dissimuladas.
Os almoços² dos oficiais de Infantaria, quando o chefe ou o camarada que as
preside sabe aproveitar-se delas, são por certo, entre as reuniões de indivíduos de
origens, de futuros e de gostos mais diversos, as que se revelam as mais unidas, as mais
alegremente unidas. Não há intensa rivalidade de glória e pessoal e de dinheiro, como
na Aviação, por exemplo: diferenças exageradas de cultura científica, como às vezes na
Artilharia; supremacias de elegância e de gênero de vida, como em certos meios de
oficiais de Cavalaria. O nível médio estabelece-se um pouco mais baixo, mas cada um
guarda para si somente o seu modo de viver próprio; e os mais modestos sofrem pouco
as diferenças de situação que a tradição manda ignorar ou diminuir.
_______________________
¹ - Blaise de Montluc: Commentaires, tomo I, Liv. II. Ed. Paris, 1760, página 346.
² - Popotes, no original. (N.T.)
83

Relativamente aos superiores, o oficial de Infantaria é talvez o mais difícil de


comandar, por muito suscetível.
Sofrendo mais que os outros, sacrificado obrigatoriamente, na guerra, em
número infinitamente maior do que os oficiais de qualquer outra categoria, quer que se
leve isso em conta no modo de tratá-lo. Aceita perfeitamente ser o mais arriscado, ser
muito mais mal instalado, ter as tarefas mais duras, mais longas, mais cansativas e mais
ingratas; mas precisa que se apreciem seus esforços e que, de vez, em quando se fala
neles. Em sua presença e mister evitar qualquer inabilidade, sendo a mais frequente, na
intenção, sem duvida, de lhe fazer aceitá-la e empreende-la com mais agrado,
subestimar o caráter penoso e perigoso da tarefa que lhe atribui. Não se tem, para isso,
que diminuir as exigências indispensáveis; menos necessário, ainda, comover-se e
mostrar uma sensibilidade exagerada, que seria pieguice. A guerra, ou mesmo os
trabalhos de tempo de paz, são duros para o infante e devem sê-lo. Mas dizer ao infante
que muitos sofrem tanto quanto ele e inexato e o irrita. Dizer-lhe inutilmente que seus
antecessores caminharam mais que eles e mais que eles se arriscaram, no momento
exato em que se lhe pedem um grande esforço ou um risco importante, é, mesmo que
seja verdade – como e frequente um modo errado de estimulá-lo. É muito mais
aconselhável uma palavra de admiração ou estima particular.
O oficial de infantaria critica, frequentemente, as ordens dos chefes. Essa
esquisitice não lhe e particular, mas ele a tem mais acentuada que qualquer um. É bem
certo — e é humano — que se e pouco inclinado a discutir uma missão que se recebe
com agrado ou que não aborrece muito, é se ao contrario a priori hostil a uma tarefa
aborrecida ou penosas. E se procura demonstrar sua inutilidade ou seus inconvenientes.
Por seu mal, as missões do infante são aborrecidas e penosas. Frequentemente são
também perigosas, mas nesse caso — e é sua honra – o oficial de infantaria não mais as
discute. Não se ousaria suspeitar se quer, quanto mais acusa-lo de ter medo.
Muitas ordens também são dadas ignorando-se as dificuldades para a execução.
Não e mau, no fundo, que aquele que da a ordem não tenha de executá-la pessoalmente.
Por vezes ele hesitaria em dá-la. É talvez um bem, entretanto que aquele que aquele que
tenha de executar não seja quem deu a ordem. Pediria menos, por vezes e certamente
obteria menos. Mas do mesmo modo, e precioso que a ordem seja realizável. E se o é, o
oficial de infantaria, murmurando talvez, executá-la-á, sem dúvida alguma. E depois,
ficará muito orgulhoso por ter vencido sérias dificuldades.
Felizmente se é suscetível, se critica muito, ele é muito disciplinado e
profundamente devotado. Quando se trata de um bom oficial de infantaria — e
encontramo-los não poucos — tudo se lhes pode pedir. É conciencioso, tem o
sentimento do dever, Mas do que ninguém, pois ensina isso a seus subordinados sabe
quanto custa tolerar desfalecimentos nesse particular, sabe da importância vital das
missões que lhe são confiadas. Atuar mais ou menos, quando se é artilheiro, é
importante, e se faz mais ou menos mal ao inimigo; mas isso nem sempre e vital.
Enquanto que, não se manter, quando se tem a seu cargo uma parte de frente, é fazer
aprisionar ou matar os camaradas, é talvez deixar desorganizar toda defesa, ser a causa
da derrota.
84

Não têm – e é natural—exatamente a mesma mentalidade, os velhos e os jovens


oficiais de infantaria.
Os velhos, infinitamente preciosos por sua experiência, seu senso prático, seus
conhecimentos, que o ensino das escolas não pode superar, exageram por vezes o tipo
murmurando e critico falando com frequência em sua antiguidade, confrontando
perpetuamente aqueles que são seus comandantes com os que foram outrora, - e suas
recordações a esse respeito, são as vezes melhorada pelo afastamento no tempo – tem a
tendência de agir por conta própria, mesmo quando outra coisa lhes for prescrito, tem
tendência também, de diminuir os mais jovens, sobretudo, quando estes não contentes
com essa inegável e tão irritante superioridade que é a mocidade, fazem alarde de certa
confiança ou mesmo de alguma fatuidade, - e nisso estão errados -, ou simplesmente
quando alardeiam – alguma superioridade de instrução e de cultura – e nisso tem muita
razão.
São clássicos “resmungões”¹ do grande exército.
Os jovens oficiais de infantaria, quando verdadeiros oficiais forniam um dos
mais admiráveis modelos de homem. Quando já se esta longe dessa idade, ai de nós! É
precioso ainda assim, ter o mérito de reconhecê-lo. Deus sabe s eles não pagam esse
tributo com a execução das ordens que se lhes dá, são ardorosos, resistentes, prontos
para tudo, mesmo para a morte, com um sorriso com uma intrepidez que o melhor
soldado nunca atingirá. Externei já a minha admiração por esse último (e se ele for do
bom que o mereça, tonar-se-á, na guerra, um oficial), mas é inegável que o oficial o
supera.
Modelado em sentimento de honra e de dever, exaltado pelo entusiasmo, cioso de se
distinguir em presença de seus homens, dos seus camaradas e dos seus chefes, sem ter
nessa ocasião, qualquer ambição de recompensa com uma medalha ou simples
felicitações, desejo de agir tão bem ou melhor que seus ancestrais, ou que os heróis
lendários da história, os oficiais de infantaria lança-se as maiores dificuldades, às vezes
contra as muralhas aparentemente mais insuperáveis, com uma confiança, eu ia dizer
uma ignorância (há as duas), que excitam a admiração e a emoção.
Ergueram-se – e foi bom o que fizessem — muitas estátuas ao soldado heroico;
erigiram-se – e se teve muita razão – monumentos aos grandes chefes que conquistaram
vitórias. Mas se descobrissem um escultor de gênio, se quisesse — longe da multidão,
que não compreenderia e acreditaria em não sei que exaltação do militarismo”—fixar
no mármore aquele que mais se aproxima do jovem deus antigo, belo fisicamente e
moralmente acima da humanidade, dever-se-ia erguer a estátua do tenente de infantaria
de 25 anos. Que o deixem desconhecido e que o digam morto pelo inimigo no ataque,
para desencorajar a inveja e para fixar o momento do fastígio, sem temor de que o
derrubem mais tarde...
Imensa e frágil grandeza, diante do qual, em verdade e sem restrições todos
podem inclinar-se!

____________________________
¹ “Grognards”. Veteranos do Grande Exército de Napoleão. (N.T.)
85

CAPÍTULO XII

O oficial de infantaria na guerra — As qualidades que o fazem obter


êxito — As três espécies de bravura – A sorte – O oficial de
infantaria em guerra deve ser um “condutor de homens”—Diferenças
com os “condutores” em geral segundo Le Bom – Qualidades e meios de
ação – os elementos de seu prestígio e de seu valor.

Para obter êxito em campanha o oficial de infantaria deve possuir grande


número de qualidades.
A primeira dessas qualidades e a bravura. Há várias espécies de bravura.
Recordo-me de quando, sendo jovem oficial da legião e avidamente aguardando saber a
opinião reinante, nesse meio de conhecedores do assunto, surpreendi uma conversa
entre legionários que me impressionou muito. Com nomes e apoiá-los, classificavam os
bravos em três categorias, de valor crescente. Eliminavam de início e de um modo cruel,
aqueles que apenas “conduzam” galões e que não achavam bravos.
Admitam uma primeira modalidade de bravura aceitável, se bem que de segunda
ordem e merecendo, ás vezes um sorriso zombeteiro; a bravura excitada. Aquele que a
possui e talvez não esteja muito seguro de que a possui, manifesta-se por gestos
violentos e dramáticos, exalta-se com expressões agitadas e ordens febris. Não é de
desprezar, mas para um chefe e de rendimento muito limitado quando não acarreta a
desordem e a agitação.
Vem a seguir e bravura calma, mas inerte. Impassíveis sob as balas o obuses,
calmos no meio do perigo e diante de notícias e de incidentes ameaçadores, alguns dão
um belo exemplo de estoicismo e de solidez, mas parecem incapazes de achar , nessas
ocasiões, as ideias e as decisões que devem animar a defesa, inspirar reações úteis e
iniciativas futuras.
Finalmente, no ápice, está a bravura calma, desembaraçada e lúcida, aquele que
a possui não só resiste ato do desatino, a toda a aparência de receio e de fraqueza; mas,
mais à vontade as vezes, do que em sua mesa de trabalho, tudo vê rapidamente e com
nitidez; sente, mais depressa, as veze, do que depois compreende pelo raciocínio, o que
é necessário fazer e o que é preciso ordenar. Com uma voz admiravelmente calma e
clara , da as ordens necessárias, brilhantes. Para atirar, sabe esperar o momento asado,
descer-me os meios de poupar a seus homens riscos inúteis. Escolhe a decisão eficaz e,
sem elevar a voz, com autoridade multiplicada por sua calma e pela justeza
imediatamente evidente do julgamento, sabe desencadear o movimento desembaraçado
e decisivo e é capaz de reconduzir a serenidade e a ordem, nos momentos mais críticos.
Não se pode pedir a todos os oficiais de infantaria que tenham esta ultima formar
de bravura, principalmente nos locais das grandes destruições, onde agem geralmente os
menos elevados na hierarquia, mas todos, para obterem êxito, devem ser capazes de dar
exemplo de estoicismo, de paciência e de coragem.
Não faltam exemplos de bravura e podemos citar alguns, admiravelmente
caracterizadores, em poucos traços.
86

Ao acaso das recordações, vejo por exemplo, o aspirante Dousset. Ferido em


todos os ataques que realizava, voltando sempre a frente com o mesmo bom humor
calmo depois de suas altas sucessivas do hospital, estava, creio eu, em seu quarto
ferimento, na manha do ataque de Rancourt pelo 94º. Regimento de Infantaria a 25 de
setembro de 1916. Gracejando com um dos camaradas sobre sua persistente regular má
sorte, disse-lhe, pegando na blusa a altura do bolso: '' Preparo meu pacote de curativo
individual'', e de fato, alguns momentos depois, era ferido com muita gravidade.
Ferido mortalmente no mesmo dia, o aspirante Laguens, oficial dum outro
batalhão do mesmo regimento, recusava deixar que o tratassem e dizia ao homem que
lhe queria dedicar cuidado e atenção:'' Eu cuido de mim; volta para o teu capitão e
cumpre o teu dever''.
Agora um outro que, partindo para um assalto que lhe devia ser mortal, voltava-
se rindo para seu comandante de companhia, dizendo-lhe: ''Bem, meu capitão, vamos
conquistar a vossa Cruz de Campanha'' E este ultimo, ferido mortalmente pouco depois
e caído sobre os joelhos, achava ainda forças, antes de morrer, para ergue-se
inteiramente, com o braço estendido, comandando : ''Para a frente''.
Não uma vez, mas várias vezes, o tenente Thoveron tomou de assalto
metralhadoras em plena ação, depois de ter tido o sangue frio de manobrá-las de fazê-
las atacar em diversas direções por seu pelotão dividido em três; e isso, essa decisão e
essa manobra, a 10 metros da peça que disparava nervosamente. Nesses casos, a essa
distancia, aquele que não pensa unicamente em deitar-se é um louco ou um deus-- ou
simplesmente um áz da infantaria...
O capitão Lavignon, no ataque do bosque de Moreuil, a 8 de agosto de 1918,
reagrupa sua companhia, aproveitando todos os desenfia mentos momentâneos e torna
a lança-la com missões precisas, em plena zona das balas e no período de crise da
travessia da posição de resistência inimiga.
E muitos outros. No tempo de paz, aqueles que não fizeram a guerra, creem isso
quase impossível ou quase fácil. Não é nem uma coisa nem outra. poucos são capazes
desses atos sobre- humanos, mas existe alguns assim. nessas ocasiões há sem duvida,
uma espécie de estados de graça, como dizem os teólogos e, então, a aqueles que varias
vezes escaparam a morte na batalha, acabaram por acreditar em um privilegio de
imunidade pessoal.
Sem chegar a essas alturas, o oficial de infantaria não pode obter êxito, na
guerra, senão desde que saiba e possa dar o exemplo.
Deve, também, ter sorte. sem duvida que se ajuda a sorte com raciocínio,
preparação e decisão, mas que a sorte existe, é inegável. Aquele que a tem e que prova
tê-la aos seus subordinados, por sucessos e repetidos, desfruta de um prestigio muito
grande. Voltaremos, mais adiante, sobre essa qualidade, o prestigio, a qual tudo conduz
quando se trata de tal assunto. Ter sorte! Acreditar e fazer acreditar aos seus
subordinados, que se tem sorte, é tanto mais importante, para um chefe que precisa ter
êxito e ao menor preço, quanto é também um fator real de futuro sucesso. Além disso, é
um dom um pouco misterioso, que se pode discutir teoricamente, mas de que se
constatam com frequência os efeitos, efeitos e aquele que acredita possuí-lo, tem mais
audácia na realização, mais confiança no sucesso, e é também seguido com mais
87

confiança e entusiasmo por sua tropa. Ao contrario, aquele que se julga desajudado da
sorte que tem, quase sempre, alma de vencido e mostra hesitação e recuos. Sua tropa
fica mal impressionada, pronta para levar a pior e assim estará em bem mas condições
para obter êxito.
Saber defender sua tropa, poupa-lhe fadigas e riscos inúteis, trazer-lher a
reputação justificada, pensar sempre em seu repouso, repouso atual, se possível, repouso
ulterior se está em período de esforço necessário - tais são, ainda, qualidades
indispensáveis ao oficial que quer ter êxito.
Quem assim procede, não é nem timorato, nem eterno fatigado, nem ''chorão''.
Pelo contrario, sabe exigir mais de sua tropa e obter dela maiores sofrimentos,mais
energia, mais heroísmo. Acha a palavra que serve: aquela que marca justa e
impiedosamente, que exalta e vibra como um projétil, que recompensa e entusiasma
como elixir concentrado. Criticado, às vezes, sempre se o é por alguns, ele faz com um
olhar ou uma palavra se for preciso, calar as resistências e as hesitações e arranca a
execução por sua lucidez,seu exemplo,seu domínio sobre a tropa. é um compensador de
energias.
Percebemos, então, que o que caracteriza, acima de tudo, o oficial de infantaria
na guerra, é que este deve ser um condutor de homens, no sentido empregado por Le
Bon quando se refere aos dirigentes das multidões humanas.
Mas aqui, é preciso debater o assunto com esse incomparável inovador em
matéria de psicologia das massas.
Não me cabe contradizer algumas das suas conclusões a respeito das qualidades
e dos defeitos dos condutores de homens, em geral. Pode-se admitir ou negar, admirar
ou criticar. Nunca se poderia obter unanimidade e particularmente quando se trata de
conjuntos, quando se generaliza, é inevitável que se encontrem casos particulares que
não cabem no caso geral. De mais a mais o assunto é variado e imenso - abrange de
Manhomet a Robespierre! - e quaisquer que seja, os conhecimentos de um autor, mesmo
que se esteja de acordo com ele sobre os resultados e o fatos( o que já é muito difícil),
não é possível aceitar todas as suas explicações e integralmente todas as suas teorias
Cingir-me-ei exclusivamente ao meu assunto, Já bastante delicado: o oficial de
infantaria considerado, na guerra, como condutor de homens.
‘Os condutores de homens - escreve Le Bon ''Psicologia das multidões'' - não são
as mais das vezes homens de pensamento, mas sim homens de ação. São poucos
previdentes, e nem poderiam ser muito, pois a esperteza conduz geralmente a duvida e a
inação. Eles se recrutam, principalmente, entre os neuróticos, esses excitados, esses
semi alienados que costeiam as bordas da loucura''.
Estamos, pois, bastante afastados do oficial de infantaria que o é
conscientemente. Homem de ação. Não há duvida, mas neurótico, exaltado?
Absolutamente, não! Os legionários de que falei mais acima, sorriam do agitado,
mesmo que bravo! poder-se-á crer que eles, o seguissem voluntariamente, que eles o
considerassem um verdadeiro chefe; um condensador de energias?
Sem duvida a previdência conduz, as vezes, a duvida e a inação. Essa é a
previdência do sábio e do velho. Não é essa a previdência necessária ao cabo da guerra.
Necessária, eu disse bem, pois quem não é previdente, como quem não o foi no passado,
88

falhou e fez matar inutilmente, em ação, muita gente. e a massas militar na ação ,não
segue aquele que falhou , que vai, sem probabilidade de êxito e sem tomar as medidas
adequadas, arriscar a vida de seus homens , aqueles que no passado , por sua falta de
previdência, levou seus homens a trabalhos penosos e estéreis.
O condutor de homens militar é, obrigatoriamente, previdente e frio .
Ele deve criar a fé, diz Le Bon mais adiante. Nisso estamos de acordo. mas não
se trata, no nosso caso de uma fé cega, de uma fé mística. Aquele que joga a vida na
decisão de um chefe não se pode contentar, como argumento, com afirmações vagas ou
sem provas, pura exaltação verbal. Ele quer ter fé... no sucesso. Os homens se batem,
arriscam a existência, por alguma cousa, e, assim, a fé no sentido místico, a fé
patriótica, é necessária, mas para o soldado essa fé patriótica é o mais frequentemente,
subentendida; há, para os insensíveis a ela, outras molas menos nobres, os meios de
coerção que os condutores de homens, militares, tem a disposição.
A vontade e a energia, qualidades mestras do condutor de homens, segundo Le
Bon, são indiscutíveis virtudes essenciais ao condutor de homens militar.
'Pode-se, diz esse autor, estabelecer uma divisão bastante clara na classificação
dos condutores de homens. Alguns são homens enérgicos, de vontade forte, mas de
repentes e assomos outros, muito mais raros, homens que possuem vontade forte ao
mesmo tempo que constantes''. e acrescenta, a respeito dos primeiros : '' tais são
condutores de homens que não podem exercer suas funções senão sendo eles próprios
conduzidos e excitados sem cessar, tendo acima deles um homem ou uma ideia, ou
seguindo uma linha de conduta bem traçada''. Excluindo sempre essa ideia da excitação,
mais prejudicial do que útil para o chefe que estudamos, as qualidades menos marcantes
dessa categoria de condutores de homens, são suficientes para o condensador de
energias que deve ser o militar dos graus hierárquicos mais baixos. Recebendo ele
próprio ordens imperativas e missões precisa, não lhe faltarão o apoio de cima e a
impulsão necessária para cada esforço sucessivo. pouco importa se, nos períodos de
repouso, a energia moral distende-se um pouco e se ele deixa aos mais graduados a
responsabilidade e a incumbência da continuidade do plano de conjunto, como também
o cuidado de indispensáveis revezamentos.
Quanto aos meios de ação o oficial de infantaria, condutor de homens militar,
distingue-se ainda mais dos outros condutores de homens, como mentores de ideias, se
assim se pode dizer. poderá, em particular, na preparação. no momento da execução, no
momento em que deve condensar as energias de seus homens para emprega-las, dispõe
de um meios de que frequentemente não dispõem os outros condutores de homens: a
ordem. A ordem, apoiada no peso de toda hierarquia e no direito ao comando; a ordem
apoiada, também, se preciso for, nas ameaças de sanção que o Código da Justiça Militar
pôe à disposição dos chefes. Apela para o contágio; mas o contágio do heroísmo, que é
necessário, deve ser mais forte do que o contágio do medo. Para se fortalecer, é-lhe
preciso organizar a segurança: segurança pessoal, a mais forte segurança dos graduados
que o secundam, segurança, também, dos camaradas, sob os olhos dos quais a bravura é
mais fácil e a fraqueza mais humilhante.
Finalmente, como todos os condutores de homens, ele joga na balança o peso
enorme de seu exemplo, como também o de seu prestígio pessoal.
89

“Um militar uniformizado – diz com certa facilidade Le Bom – tem sempre
prestígio”. Sem dúvida que o galão visível é elemento de prestígio, mas muitos há que
têm galões e não tem prestígio... É que são necessárias outras cousas...
Há um elemento físico que é, sempre o acreditei, parente do magnetismo. Um
aspecto nervoso e vigoroso, beleza escultural, certos olhos e certo olhar, voz cheia de
ardor contido, gestos sóbrios e preciso, sensibilidade muito viva, um quê de maiúsculo
um pouco altivo... tais são alguns característicos físicos do homem capaz de condensar
as energias de seus subordinados. Ele sabe, também, conquistar o subordinado
colocando a mão sobre seu ombro e, fazê-lo avançar, com uma exclamação: “Ainda
estás aqui? Para a frente!” E se acrescenta à atração do afeto, - afeto que ele dá e que lhe
é retribuído – aonde não será seguido?
Há até mesmo defeitos que não prejudicam absolutamente à afeição ou à
admiração e menos ainda ao prestígio que aqueles sentimentos aumentam. A maneira
própria de andar, livre como a maneira de se expressar. Fraqueza e espontaneidade. A
mocidade principalmente, a mocidade quando não é tímida, ignorante ou pretensiosa,
mas quando irradia, quando irradia... e lança, com magnífico desinteresse, toda sua
beleza, todo seu futuro e todos os seus gozos possíveis nos riscos de uma destruição
imediata.
Mas, sobretudo os subordinados ama, particularmente aqueles que os defendem,
aqueles que, por eles arriscam-se a censuras pessoais e a malquerenças dos chefes, que
sabem reconhecer seus méritos, que querem para eles recompensas sacrificando às
vezes seus próprios interesses. Ai, como em toda parte, o desinteresse é grande elemento
do prestígio. Esse não é talvez um bom meio de subir, pois os superiores de maiores
graus hierárquicos frequentemente sabem só o que se lhes diz. Mas os subordinados,
que veem, tem ainda em maior conta aquilo que só eles veem e sabem e pagam isso em
dedicação.
Se os ignoramos por vezes, se esquecemos deles com frequência, principalmente
no tempo de paz, ao menos durante os anos de guerra, felizmente, faz-se galgar bem
depressa os escalões de hierarquia aos oficiais de Infantaria que obtém êxito, mesmo
que jovens. “Envelhece-se depressa nos campos de batalha – dizia Bonaparte
regressando da Itália, - e eu que já estou velho”. A maturidade de espírito e a mocidade,
a energia e a lucidez, a sorte e a bravura, a compreensão imediata e o desprezo pelo
risco, o prestígio, o desinteresse e o caráter, tais deveriam ser e tais são, com frequência,
as características do oficial de Infantaria, na guerra.
É pedir muito, talvez; mas a tarefa é uma das mais difíceis que existe. Pode-se,
sem restrições e sem preocupações exageradas de origem e de escolas, arrojadamente
escolher sobre a totalidade dos combatentes. As provas de batalhas selecionam,
realmente. Depois disso não se terá que hesitar em pôr à margem aqueles que não
conseguem sucesso e que se mostram incapazes de cumprir a tarefa que lhes cabe. É
necessário, aí, uma elite excepcional, uma elite que o chefe pode arriscar, que sabe disso
e o aceita, sob a condição de que se saiba, como é de justiça, utilizá-la, recompensá-la e
honrá-la.
90

Capítulo XIII

Como comandar o oficial de Infantaria e dele obter o melhor rendimento – Ter sempre
em conta seu valor e suas suscetibilidades – Confiança – Nada de mistérios inúteis –
Consultar a miúdo aqueles que irão executar as ordens, antes de tomar e de impor a
decisão – Manter o prestígio e a posição dos “combatentes” – Não evitar perigos e
fadigas úteis, sob a condição de prevenir com antecedência e glorificar depois –
Utilização daqueles que, nas tropas menos boas, “são capazes” – Recompensar sem
parcimônia e fazer ascender aqueles que mereçam, sem formalismos de antiguidade,
tendo por mira apenas o interesse do Exército.

Ninguém tem dúvida de que o oficial de Infantaria é apenas um militar como os


outros, que como os outros deve obediência, sem explicações. Além disso, ele próprio é
um chefe e tem também o dever de dar exemplo. Deve-se estar seguro de que ele, o que
quer que se lhe ordene e qualquer que seja o modo de ordenar-lhe, obedecerá
rigorosamente.
Apesar disso, não é indiferente saber ou não saber preparar a execução, direi
entusiasta e fanática, de uma ordem difícil. Nada há de injusto em considerar o valor de
quem o tem. Por outro lado, considere-se a sensibilidade de quem é digno e tenhamos
em conta as suas suscetibilidades.
Com relação a este assunto, vemos que há chefes que sabem agir e obtém êxito e
rendimento máximo. Outros há que sabem menos ou são desajeitados, obtém pouco e,
algumas vezes mesmo, não conseguem obter êxito. Durante a guerra, muitos destes
últimos, a princípio encantadores para quem os conhecia por alto, foram com muita
justiça postos de lado devido ao seu rigor intransigente e sem variações, à sua
brutalidade com aparência de energia, e perderam os seus comandos, depois de
recontros militares menos felizes, para tal não tendo deixado de contribuir o
descontentamento geral dos subordinados. Decerto estes, principalmente os oficiais,
executavam estritamente suas ordens, mas não executavam senão os que lhes era
comandado, sem iniciativa, com medo de serem rudemente repreendidos, e o faziam
sem dedicação alguma. Perdiam-se, também, nas preocupações dos detalhes, temendo
as constantes explosões de cólera de uma superior geralmente hipnotizado por cousas
atoas e incapaz de se integrar na realidade da situação.
Um dia, alta patente desse gênero, um General Comandante do Exército, visitava
um setor agitado e se deteve indignado numa região onde funcionavam várias cozinhas
rolantes, região não muito apropriada e que estava realmente, em certos lugares, suja
com restos de comida. Sem meditar em que talvez houvesse ali restos tivesse caído das
marmitas, por terem os homens bombardeios, esse general, dirigindo-se ao comandante
do Batalhão, disse-lhe, em tom desagradável, julgando por essa única impressão toda
situação administrativa do setor:
- Quando visito uma casa e encontro uma cozinha imunda, firmo logo meu
conceito: - é casa mal orientada e mal dirigida!
- Pois bem, meu General, respondeu-lhe o Comandante do Batalhão, ao pé da
letra, eu, quando vejo minha casa arder, não me interesso pelas privadas!”
91

Evidentemente não se pode aprovar semelhante resposta, a qual só a situação


desculpa e que apenas ganharia se fosse mais serena e demonstrasse maior acatamento.
Mas, no fundo, foi justa. E não há dúvida que qualquer que tenha sido a explicação dada
a seguir, os dois interlocutores se separaram descontentes um com o outros e muito mal
preparados para a colaboração indispensável. Tendo a superioridade hierárquica e o
dever do controle, o General certamente tinha o direito de investigar os detalhes e fazer
observações, mas estas, teriam ganho em ser feitas comedidamente e, principalmente,
como conhecimento de causa.
A incompreensão e a má vontade dos chefes, em particularmente dos de maior
hierarquia, eram muito raras durante a guerra, quase todos transbordantes de boa
vontade e de benevolência pela infantaria e por seus oficiais que eles haviam aprendido
a estimar.
Ouvi citar com reconhecimento certo comandante de Brigada que, tendo deixado
em repouso , em segunda linha , um batalhão muito sacrificado durante três dias de
batalha defensiva , telefonara a seus comandantes nestes termos .
-‘’ Estais em repouso e bem merecestes. Não se trata, no momento, de fazer
voltar vossa unidade à primeira linha. Mas será que vossos homens poderiam fazer uma
pequena baldeação de munição? Nada quero fazer com eles , nem mesmo isso , sem
conhecer vossa opinião”.
E o comandante do batalhão respondera-lhe:
- “Meu General eu vos sou infinitamente reconhecido por essa prova de
confiança e é pedindo-vos desculpas que vos expresso o desejo de que nada seja pedido
aos homens, atualmente o mesmo esforço limitados e isentos de perigo. Sabeis que
demos tudo que pedistes e em três dias poderemos ir para onde quiserdes. mas agora há
uma verdadeira necessidade de recuperar, com um repouso total, as forças físicas e
morais despendidas “.
De fato, esse batalhão esgotado por três dias de defesa heroica – e ainda mais
vitoriosa – ante um poderoso ataque inimigo, perdera três quartas partes de seu efetivo!
O restante estava em um tal de estado de esgotamento que vimos um oficial , habituado
a fumar cigarros uns em seguidas aos outros , sentir-se mal por ter fumado um cigarro
de fumo um pouco mais forte . Um outro que se tinha distinguido em particular ,chorava
e na nervosamente , olhando uma bandeirinha francesa ! Os homens principalmente os
melhores podem manter-se, graças aos nervos, mais do que parece possível as forças
humanas – e certamente que muitos mais do que os animais , - durante os tempos de
crise; mas a natureza cobra , em seguida , por momentos , os seus direitos e , com
violência , agita o organismo ao qual foi exigido demais . Só aqueles que passaram por
isso compreendem essas coisas. A recuperação se faz rapidamente aliás, e as energia ,
retemperadas reencontraram logo a sua elasticidade e seu poder . Precisarei dizer que
esse batalhão – ao qual seu comandante não esquecera de fazer saber a boa vontade do
comandante da Brigada – três dias depois estava pronto para novas façanhas e com
moral superexcitados , com ardente desejo de agradar ao chefe que o compreendera ?
Tudo isso faz ressaltar, penso, a necessidade da confiança dos chefes para seus
subordinados , os oficiais da infantaria que dela são dignos .
92

Por outro lado não são precisos, com eles, esses perpétuos mistérios tão
frequentemente inúteis, por vezes prejudiciais (pois quem é mal esclarecido , executa
mal ) e sempre irritante; Sem duvida , não se pode desvendar todos os projetos e o
segredo , no conjunto , é uma das grandes condições da surpresa e , pois , da vitória.
Mas quantas coisas que se poderiam revelar sem inconvenientes – e até com vantagens
– aos executante , foram por eles conhecidas durante a guerra , através do boletim das
praças”¹.
Alguns diplomatas e oficias de estado maior recém formados gostam de fazer
mistérios de tudo . Outros – os verdadeiros – sabem que se pode dizer muita coisa cuja
revelação lisonjeia e ate esclarece ultimamente aqueles a quem se faz a confidencia sob
promessas, quando necessário , de não passa-la adiante. Guardam para sim o essencial,
que deve ser conservado em segredo e o resto, o mesmo modo e tal como fariam com
um alimento, vão dando a curiosidade e a necessidade natural que todos tem de saber!
Acrescentarei que é principalmente desviando a curiosidade que melhor se pode
defender-se dela e que há, enfim, vantagem em ter como auxiliares, na defesa de um
segredo, confidentes bem escolhidos. Isso as deleita e eles empenham então, também
eles, sua inteligência, em manter o segredo, em lugar de auxiliar com sua perspicácia
aqueles que procuram descobri-lo e nos quais é essencial ocultá-lo.
Um processo de comando algumas vezes discutindo, mas , segundo muitos,
bastante empregado durante a guerra, consiste em ocultar aqueles que vão executar,
antes de tomar pessoalmente e de impor uma decisão. Algumas pessoas veem nisso uma
abdicação do comando e o receio das responsabilidades, confundindo semelhantes
consultas livres com os conselhos da guerra geralmente seguidos de votos, empregados
por chefes fracos que hesitam sobre a decisão e querem se apoiar na opinião dos
subordinados para decidir isto ou aquilo. Nada deve aliviar o chefe de sua
responsabilidade e de seu poder de decidir. Mas é-lhe interdito, principalmente se é
valoroso, ser hábil, e a decisão a quererem se apoiar na opinião dos subordinados para
decidir isto ou aquilo . Nada deve aliviar o chefe de sua responsabilidade e de seu poder
de decidir.
O marechal Foch – a quem também se tem censurado isso e cujo espírito
imperioso e mesmo peremptório se conhece – sabia apresentar , por vezes , sob forma
de sugestões , as instruções que tinha de dar às altas autoridades sob suas ordens . E se
dava voluntariamente, ares de haver obtido, o que poderia ter comandado de forma
imperativa, mas que, certamente então, provocaria infinidade de objeções.
Por que não considerar a mentalidade humana , quando se quer pedir aos
homens coisas grandes e difíceis , tal como faz o cavaleiro, por exemplo, que fica
obrigado a considerar o caráter de seu cavalo quando quer que ele corra ou salte bem?
Evidentemente não se trata de comandar coronéis, majores, capitães e tenentes
de sue próprio pais com as deferências necessárias a um comando supremo que inclui
altos chefes e até soberanos, mas com frequência há grande vantagem em se informar ,
junto aqueles que se encarregar da execução de unir missão , sobre as dificuldades e os
atenção da autoridade – dar uma ordem que seria preciso anular depois , em
______________________
¹ - No original; “Le rappot Du cuisinier”. (N. T)
93

meios de tal execução . Aproveita–se, assim, a experiência, indiscutivelmente superior,


dos habituados as realizações de tal gênero. Evita-se, também, - e isso deve chamar
consequência de uma objeção decisiva, apoiada em um fato que se ignorava, agindo
assim tem-se muita vez ocasião de responder vitoriosamente as objeções feitas de
pronto e de viva voz pelos subordinados interrogados. Finalmente expondo tudo,
claramente , as habituais e inevitáveis criticas , tem se a vantagem, bem longe de ser
descurada de excitar o amor próprio daqueles de quem se vai necessitar toda a
inteligência, toda a energia e todas as forças e de empregar homens convencidos daquilo
que vão fazer o que seriam, sem isso, senão recalcitrantes, ao menos faltos de fé.
Mas repito, fica bem entendido! Que após essas reuniões prévias, a ordem
escrita deve ser expedida e, tenham ou não sido evitadas em consideração as objeções
apresentadas pelos subordinados, mesmo os de reputação mais firme, a execução
rigorosa, e integral deve ser exigida. Os oficiais de infantaria é preciso reconhecê-lo e já
dissemos são muito dados a crítica, mas são fundamentalmente disciplinados, um chefe
que confia neles e teve a atenção de consulta-los , esta seguro de sua obediência seja
qual for sua opinião pessoal , estejam ou não convencidos . Se fosse de outro modo não
haveria mais nem organização, nem hierarquia, sem comando.
Nem todos os oficiais de infantaria e se equivalem em tempos de paz cada um
discute os méritos respectivos e se acredita in petto quase sempre igual ou superior a
seus camaradas na guerra isso não acontece. Toda gente ou quase toda reconhece
qualquer superioridade verdadeira é que tal superioridade é paga a preço muito alto e
não faltam ocasiões de prova-la. É grave erro de comando tratar do mesmo modo os
bons os medíocres e os maus e esforçar se e aí está uma prova de fraqueza e de
pieguismo - porque igualar face recompensas uma situação ou um elogio mistificado
excepcional provoca inveja é inevitável, mas uma citação ou um elogio complacente
desencoraje desmoralizar os bons não há nada diz Montluc que faça tanto mal o coração
dos bons como quando o rei faz bem aquele que o serve mal”¹.
Tem-se muitas vezes discutido infelizmente periodicamente abolido os
privilégios dos “combates”. Tal fato provoca na guerra, reação por vezes exagerada da
parte destes nos nunca esquecemos da irritante questão dos “emboscados”². Mas, pondo
de parte os exageros e principalmente por certo reconhecendo a necessidade de que os
titulares indispensáveis o cupim seus postos de ação fora nas primeiras linhas é mister
reconhecer que aqueles que arriscam sua vida suportam o peso do combate tem o direito
de não querer ser confundidos com aqueles que pensando bem só por eles defendidos
pagar muito barato semelhante dedicação tais riscos sofrimentos ir sacrifícios mudar
como recompensa algumas distinções alguns privilégios cujo único valor consiste a
mais de 2 vezes em títulos distintivos de uniforme considerações além disso para quem
deseja será sempre fácil tornasse merecedor de tais distinções solicitando obtendo
inclusão nas formações de combate sempre há nelas lugares preencher infelizmente
também lugares vagaram as exigências da justiça as necessidades da harmonia entre os
__________________
¹ - Blaise de Montluc: Commentaires, tomo IV, livro (Edição de Paris, 1760), pág. 317.
² - Durante a guerra de 1914-1918 os combatentes, assim chamando aos que realmente
combatiam, apelidaram “emboscados” àqueles que nunca iam à frente e, apesar disso, eram
recompensados e tratados como igualmente bravos (N.T.)
94

serviços e a tropa combatente e o interesse de não esgotar o indispensável recrutamento


de voluntários para os lugares mas árduos não há essa questão uma importância muito
séria.
Aqueles que se sabe honrar e se reconhece lealmente superioridade
desprendimento e de sofrimentos não se tem poupar por outro lado perigos nem fadigas
necessárias particularmente em presença oficiais sabem e devem poder “poupar seus
homens” é bom não dissimular - inutilmente e às vezes puerilmente - a rudez das
missões que lhes caibam. Aqueles que tem o coração bem formado colocaram todo o
seu amor próprio em realizar vantajosamente as missões que seus chefes mostraram
sabia serem cheias dificuldades excepcionais dar provas ao mesmo tempo de habilidade
e de justiça nada ocultar seguida 2 méritos de uma proeza realizada ia saber glorificar
oralmente ou por escrito agindo desse modo trabalhasse também pelos exemplos a
seguir ir para o futuro.
Entre os oficiais de infantaria algum talvez por serem mas psicólogos ou por
terem mais prestígio e o mais frequentemente por terem essas duas qualidades contam
com a vantagem confiança de suas tropas vantagem que é ainda maior quando se trata
de tropas difíceis, e, como os cavalos ariscos, são em geral os melhores. É preciso saber
utilizá-los. Conhecer bem sua gente, repartir as missões segundo os meios disponíveis e
escolher judiciosamente aqueles a quem confiá-la, são encargos de um comandante
geralmente muito difíceis.
Por fim é preciso não ser parcimonioso no recompensar e, como já foi dito
anteriormente, fazê-lo sem a injusta preocupação de igualdade entre as pessoas de
méritos desiguais. Aquele que cumpre apenas um dever sem riscos, geralmente não
merece a condecoração, mas o que se avantaja no cumprimento do dever e se encontra
sempre onde o dever é mais difícil, tem direito – e isso porque merece – deve ser citado
e condecorado, e tudo se lhe deve dar. E se, por façanhas repetidas, mostrar-se digno de
distinções reservadas, normalmente, a postos mais elevados por que priva-lo da honraria
e privar-se desse meio de ação? Ele saberá pagar isso cem vezes e às vezes com a vida.
É que na guerra só se merece, verdadeiramente, arriscando-se muito e ninguém se
arrisca impunemente.
Vimos que, por força das circunstâncias – e também porque não se podem lançar
da retaguarda para frente para substituir aqueles que caem -, os oficias de Infantaria, na
guerra, galgam, às vezes depressa e às vezes ainda jovens, os primeiros postos da
hierarquia. Só há vantagem em facilitar essa ascensão, entre outras frações porque,
como já vimos, os mais jovens, em igualdade de valor pessoal, são os que obtêm melhor
êxito nas missões de Infantaria em campanha e são os mais queridos e os melhor
seguidos por suas tropas. Por outro lado, no caso de não se dar a cada um senão o posto
que seja capaz de exercer, é mister libertar-se, todas as vezes que tal se imponha, das
mesquinhas preocupações de antiguidade, quer se trate de uma promoção em tempo de
paz, quer se trate de oficiais que se pode experimentar sob grande critério, que é o do
comando sobre fogo. Napoleão e seus marechais chegaram ao ápice de suas carreiras
aos 40 anos. A idade e a preocupação de não se comprometer a promoção ulterior, são
elementos de apreciação a considerar, mas não devem asfixiar considerações mais
urgentes, de valor atual e de interesse geral imediato. Um alto comando experimentado
e capaz, deve saber, sem receio, fazer ascender os possíveis verdadeiros chefes, - deles
não há muitos -, parar cada qual no escalão hierárquico para o qual é apto, mas depois
95

de experimentar dos escalões mais altos aqueles que saíram brilhantemente no escalão
precedente. A progressiva ascensão na hierarquia, sancionada pela luta, será limitada a
tempo para aqueles que não tem a necessária envergadura. Ainda não se encontrou nada
melhor, na carreira das Armas como nas outras, do que provas praticas de realidade,
para determinar os melhores e mais aptos para os postos de comando. Os oficiais de
Infantaria reconhecem que nem todos os chefes devem sair dentre eles e que há também
outros títulos para a ascensão hierárquica, além do êxito nos diversos escalões de
Infantaria – mas pensam - e deve-se considerar esse sentimento, que em principio é
justo-que, em igualdade de inteligência e de conhecimentos, convém, no interesse geral,
promover a maior parte para a apreciação dos títulos de verdadeiro comando, obtidos
nessa excepcional experiência dos campos de batalha, paga tão cara, pelos comandantes
de Infantaria.
Há, demais, entre aqueles que obtiveram sucesso, um potencial de energia e de
decisão rápida, uma resistência moral a toôas as ameaças de catástrofe, um senso e um
habito das responsabilidades, que são qualidades inegáveis e primordiais de grandes
chefes e que só raramente se encontram fora desse meio.
96

TERCEIRA PARTE

O CHEFE DE INFANTARIA

QUALIDADES UTEIS PESSOAIS ÚTEIS.


METODOS DE COMANDO
97

CAPITULO XIV
Qualidades pessoais úteis ao chefe de infantaria – defeitos “bom aluno” –
qualidades de caráter ,de negligencia e de coração – O passado – A reconhecida
bravura pessoas – o aspecto exterior – educação -desinteresse pessoal – Há defeitos
que não prejudicam – Conhecimento e compreensão da tropa de Infantaria – O dom
da intuição – A fama irradiante¹

Entendemos por chefe de Infantaria, qualquer um que seja a Arma que


provenha², aquele que tem a Infantaria sob ordens e enquanto duram as relações com
essa Arma. Como já foi anteriormente estudado o caso dos oficias subalternos e
superiores da Arma de Infantaria, é particularmente sobre os chefes de postos mais
elevados que trataremos agora, vistos de baixo, se assim pode se dizer, isto é, vistos pela
tropa.
Desse ponto de vista, expressando os desejos dos subordinados sobre as boas
qualidades que gostariam que seus chefes tivessem, poder-se-ia crer que eles fossem
insaciáveis, - por que não? Que perderiam eles? – quisessem a perfeição absoluta,
enumerassem a quantidade total das habilidades possíveis! Felizmente não são tão
exigentes, e veremos, até, que algumas qualidades são inúteis, por vezes prejudiciais e
que há defeitos que tem suas utilidades, porque possuem certo encanto.
Parece oportuno citar uma espirituosa tirada do general Estienne. Ela ganha em
valor quando se sabe que ele foi um dos ases da ciência da guerra, inventor dos carros
de combate, velho engenheiro, ex-aluno da Escola Superior de Guerra, um dos
triunfadores dos grandes concursos, tão habituais para fazer qualquer seleção.
Pediu ele que seus interlocutores lhe dissessem conforme a opinião de cada um,
qual o rei dos animais.
- É o leão, responderam-lhe todos, de pronto.
Diante de seus sorrisos e de suas negativas, procurava-se em vão:
- O tigre, o elefante...
- Não, não, continuava a dizer... Que tem qualquer um destes que os outros não
tenham, que o faça melhor?
- Então qual é?
- Vou dizer. É... o pato. Isso mesmo. Que se faz para selecionar o melhor,
designar o primeiro? Organiza-se um concurso. É preciso, com os animais, fazer como
se faz com os homens. Nesse concurso poremos uma prova de canto, uma prova de voo,
uma prova de salto, ainda outra de rastejar, outra de natação, etc... Que notas
lamentáveis terão o leão, o tigre, o elefante, na prova de voo, na de canto, na de
rastejar!... Por certo hão de tirar zero e serão eliminados. Enquanto isso, o pato nada um
pouco, rasteja um pouco, canta um pouco, salta um pouco, etc... Terá notas médias em
tudo. E com isso reconhecereis o bom aluno, médio em tudo, o vencedor de todos os
concursos. Vistes bem e não tendes dúvida: é o pato o rei dos animais!
Isso nos faz compreender, de modo divertido e paradoxal uma profunda verdade:
________________________
¹- No original “rayonnement”, que Bergson chamou “elan viatl” (NT)
²- E observe-se que alguns dos melhore chefes de Infantaria, no sentido aqui empregado
foram cavalarianos de origem.
98

a insuficiência de todos os concursos, os erros que se cometeria tomando-os como


critério exclusivo para escolher os dirigentes de qualquer ordem e os chefes militares
em particular. Que esse seja um processo de seleção muito cômodo, sobretudo o
processo que melhor escapa às possíveis interferências do favor pessoal, está certo. É
também um meio para obrigar ao estudo e ao trabalho, de conduzir a comparações
muito úteis. Mas, se é necessário levar na maior consideração, para os postos
subalternos – até de auxiliares de um escalão elevado –, os resultados de escola e os
pergaminhos, também é preciso considerar que outras qualidades e defeitos são
necessários àqueles que devem comandar. Defeitos? Sim, defeitos! Os mais perfeitos
soberanos (Luiz XVI, o tzar Nicolau II, por exemplo) foram os piores reis. E quantos
defeitos tinham os que foram maiores: Luiz XIV e Napoleão I, por exemplo. Este
último, o maior dos chefes militares e, sem dúvida, o mais amado, o mais
apaixonadamente seguido, em particular por sua Infantaria (a qual era por ele bem
guardada, apesar dele ser um artilheiro, pois ele, melhor que qualquer outro, sabia
utilizar sua Artilharia para apoiá-la), que irregularidade de temperamento tinha, que
severidade, como era exigente! Mas também que senso psicológico e que êxitos? E
quanto era ele um melhor chefe de Infantaria do que o seu impressionável sobrinho
Napoleão III, tão cheio de boas intenções e de doçuras...
Mas não se trata, aqui, da escolha e da designação dos chefes. Isolados, seus
conhecimentos de ciência militar pura, nenhuma vantagem oferecem. Valem, apenas, as
qualidades necessárias a um chefe de Infantaria para vencer no comando dessa Arma. E
foi isso que nos deteve, um pouco demoradamente, sobre o “bom aluno”.
Pode ser útil, e certamente que o é, haver sido um bom aluno. Mas não é preciso
tê-lo sido para comandar e quereria, antes, não o ter sido do que ficar nisso. Há no bom
aluno, no sentido que aqui emprego, uma ausência de qualidades e de relevo, uma falta
de personalidade, uma exagerada preocupação de agradar aos mestres, um arrivismo,
um respeito exclusivo às soluções admitidas, que prejudicam o sucesso das operações e
afastam a afeição e, principalmente, a esfima dos subordinados.
Entretanto por certo nada é mais útil ao chefe que a inteligência e os
conhecimentos militares. Mas ele necessita, também da experiência e dos dons que
conduzem ao êxito. Diremos que sua primeira qualidade, a que o distingue e que arrasta
à adesão os seus subordinados, mais que todas as outras, se assim se pode dizer, pois
para ela concorrem muitas outras qualidades, é o dom de tornar vencedores, quase
sempre, os seus subordinados e pelo menor preço. Que isso seja difícil, que haja muitas
vezes circunstancias, atenuantes do insucesso, bem como dados que não foram
conhecidos pelos chefes, pouco importa aos subordinados. Pede-se-lhes, muitas vezes a
vida, tem-se o direito, sem apelação, de engajá-los na ação, não se tem de dar-lhes
explicações. Eles sabem que certos chefes quase sempre vencem e os poupam, e não
querem ser comandados por outros.
O chefe da infantaria deve ter o senso da justiça. Vimos as exigências da tropa a
esse respeito.
Deve saber poupar sua tropa. Nada de exigências nem de perigos, inúteis.
Aquele que poupar a tropa quando puder, terá direito de exigir-lhe quando for preciso.
99

Deve ter vontade firme, ser mesmo capaz de uma aparente insensibilidade,
quando o dever a exigir. Aquele que recua diante de alguns sacrifícios, que não ousa
impor a resistência onde e quando for necessária, por mais custosa que seja, expõe sua
gente às destruições, sempre mais consideráveis, da defesa desorganizada e da derrota.
Mas não há necessidade de rigor inútil e inábil, mormente se o chefe evita para
si as fadigas e os perigos que impõe aos subordinados ou se seu posto de comando o
impede de partilhá-los.
Muitas vezes há oposição, principalmente a partir de certos escalões, entre o
local a ocupar, indispensável para o chefe poder ver e dirigir o conjunto, para que tenha
possibilidade de fazer agir em tempo os meios de ação que deve reservar para intervir
no combate, e o local que ele gostaria de ocupar para partilhar os sacrifícios e os perigos
de sua Infantaria. Esta compreenderá, bem depressa, que mais vale um chefe que a
apoia eficazmente e está longe das balas e da zona de destruição avançada, do que um
general imobilizado em uma cratera de obus, longe do posto de comando, longe do
comandante de sua Artilharia e afastado de seus meios de ação de comando.
Mas ele exige um chefe indiscutivelmente bravo. Não faltam ocasiões, por mais
alto que esteja colocado um chefe, em que ele possa dar prova de sua coragem, seja
antes, seja depois da batalha propriamente dita. E depois, - e é aí que intervém a
necessidade de um passado de guerra, bem recheado e reconhecido como um belo
passado, - não se chega aos altos postos sem ter passado pelos escalões inferiores.
Neles, por certo, se pode e se deve ter partilhado dos maiores perigos. Deve-se pois, já
que se alcançou posição tão elevada, ocupar os lugares donde digna e eficazmente se
pode comandar a Infantaria e atribuir e ordenar aos subordinados, missões perigosas e
penosas, pois que, às sua vez, já se obedeceu e realizou com brilhantismo as missões
mais difíceis e mais árduas.
Essa necessidade de ter dado provas de bravura pessoal é, para o chefe militar,
tanto mais imperiosa na guerra quantos, bem o sabem os combatentes, exagera-se,
geralmente, num ou noutro sentido, a reputação das pessoas. De um bravo que é
conhecido, faz-se facilmente um herói excepcional; de um homem timorato, sem
importância, faz-se um poltrão. E não é preciso dizer que com esta última reputação,
quaisquer que sejam a inteligência de um homem e seus conhecimentos militares, ser-
lhe-ia impossível comandar a Infantaria.
Se a insensibilidade aparente se alia, como é frequente, a uma bondade completa
e real, é perfeitamente aceita pelos subordinados. Depois de bem a conhecerem, eles até
a preferem à fraqueza, que acarreta sempre o medo e a abdicação da responsabilidade,
nas ocasiões difíceis em que se procura o chefe para que ele oriente e decida. Nessas
ocasiões, nos dias de tormenta, é que em última análise se revela, se os que estão no
comando são dignos dos cargos que ocupam.
Apesar dos clássicos gracejos sobre o espírito do infante, sinônimos de estrema
meticulosidade e de desconfiança, o infante, sinônimos de extrema meticulosidade e de
desconfiança, o infante não estima o chefe minucioso e desconfiado que se perde nas
intermináveis observações de minúcias e não quer deixar que nada passe. Vimos que os
suboficiais são os indicados para isso. É mister obriga-los a essa vigilância minuciosa e
mantê-los nessa tarefa. Mas o chefe, a partir de certo escalão, tem mais o que fazer.
100

Deve, também, algumas vezes, passar por alto sobre pequenas faltas disciplinares. Sobre
as pequenas, mas nunca sobre as grandes. É comum a tropa, a princípio, “experimentar”
seu chefe sob esse ponto de vista. Um salutar exemplo, no momento oportuno, bastará
para mostrar aos que forem tenlados pela confusão que a bondade e a compreensão não
são fraqueza.
O chefe deve ter caráter. Nada de humildade e de afobação em presença de
superiores. A tropa vê muito bem e não admite a falta de dignidade naqueles que têm a
honra de comandá-la. Nada de arrivismo, principalmente. Quem tem a reputação de
arriscar a vida de seus homens para obter vantagens ou aumentar sua glória pessoal, está
perdido. Ao contrário, aquele que se expõe a censuras ou a descrédito para defender
seus subordinados, para evitar-lhes sacrifício estéril ou fadiga inútil, que se eclipsa na
ocasião das recompensas, está seguro de ser melhor seguido por seus homens do que um
outro mais tímido ou mais individualista, menos cônscio de suas responsabilidades de
comando. Mais que estes óbitos, sacrifícios e sofrimentos, quando for preciso. Que
recompensa para vitoriosamente as objeções dos subordinados, as suas dúvidas sobre a
possibilidade de certa missão, com o simples argumento: “Vocês conhecem bem quem é
que comanda!”
Se bem que estas sejam qualidades secundárias, - particularmente para um chefe
de alto escalão – não é indiferente, para sua autoridade, que ele tenha um aspecto
exterior agradável que se apresente bem, a pé ou a cavalo. O subordinado quer poder
estar sempre orgulhoso, daquele que o comanda. É sensível as boas maneiras, a
educação, a elegância, se mantém aspectos viris. É erro grave imaginar que o homem do
povo gosta de encontrar vulgaridade em seu chefe. Sem dúvida a arrogância, isso que
ele chama de orgulho, desagrada. Mas por que haveria ele de obedecer a qualquer um
que não lhe pareça superior? Aprecia a superioridade e gosta que essa superioridade seja
evidente. Não terá senão reconhecimento a esse ser superior, por permanecer acessível,
por falar-lhe simplesmente e com cortesia. Todos ganharão, pois, em que essa
superioridade de apresentação, (expressão visível da superioridade real)., seja cheia de
simplicidade - sem que chegue, jamais a familiaridade,- que nada tenha com a fatuidade
e arrogância dos afortunados, pois estas são as maneiras que estes acham de guardar as
distâncias.
Há defeitos que não prejudicam. Seria evidente paradoxal preconizar os
sucessos com as mulheres, demonstrar especial inclinação para o prazer, - o escândalo é
sempre prejudicial; - mas é curioso constatar que alguns chefes, particularmente
estimados, estavam longe de ter uma reputação de austeridade. E essa indulgência
divertida, quase afetuosa, não era provocada por seus companheiros de prazer, mas sim
por seus soldados que, sem dúvida, - e aqui está a verdadeira explicação, - ficavam
alegre pós senti-los mais humanos, mais próximos deles, de seus desejos e de suas
fraquezas. Por certo é melhor que o chefe tenha, também, virtudes domésticas, tanto
mais que é raríssimo que os hábitos de prazer não prejudiquem o trabalho, devido às
exigências de presença que acarreta, mas deve evitar sempre de se intrometer, como
fazem certas pessoas muito austeras, na vida privada de seus subordinados. E escolhi,
para citar, essa berrante indulgência dos subordinados, tão habituados a comparar suas
atitudes com as de seus superiores, para fazer ressaltar que eles não exigem todas as
101

virtudes daqueles que os comanda. De um modo geral, aliás, o subordinado militar não
tem inveja de seu chefe, principalmente se é afável e tolerante; não tem, absolutamente,
a mania da igualdade.
Seria não menos paradoxal recomendar a irregularidade temperamental.
Entretanto, é inegável que alguns chefes, de expressões vivas e as vezes desagradáveis,
até violentas, são mais estimados do que outros sempre calmos, sempre frios, que
nunca têm uma palavra mais alta do que a outra, eu até diria, que mostram sempre uma
imperturbável igualdade de temperamento. Não há dúvida, a vivacidade de caráter,
particularmente se arrasta consigo, as vezes observação exageradas, é um defeito para o
chefe, mas menos antipático do que a insensibilidade, a frieza glacial, a completa falta
de espontaneidade. O homem de ação que pé o soldado, gosta do tipo de vida daquele
que o comanda, da franqueza exagerada, da ausência de caçulo e de dissimulação.
Parece-lhe que aquele que nunca reage não tem coração, inteligência, nem
generosidade; não saberá elogiar e admirar, do mesmo modo que não saberá elogiar e
admirar, do mesmo modo que não saberá censurar e indignar-se; que aquele que guarda
para si tudo que pensa, é dissimulado e compromete-se. Citam-se, certamente, chefes de
uma imperturbável, e mesmo muito frios, bastante queridos; mas é porque souberam, ao
mesmo tempo, mostrar umentos de bondade, de compreensão e de justiça. Não se
poderia exigir do chefes, qualidades contraditórias. E é de bem raro que o entusiasmo e
a vida que forjam os condutores de homens, a inteligência brilhante que faz os grandes
chefes de imaginação e envergadura, o caráter que marca as vontades poderosas, não
tenham a contrariá-los certos característicos maus. É necessário, bem entendido, que os
chefes saibam mostrar também generosidade, coração e senso de justiça. Que reparem
com uma palavra justa, uma ofensa que magoa, causada por uma censura exagerada; e
sobretudo, que esta vivacidade de reação, aceita em face das contrariedades da vida
corrente, não seja nunca agitação ou excitamento, e que dê lugar á calma lúcida e
imperturbável dos fortes, em face dos grandes perigos e das grandes decisões.
Enfim, para conduzir essa tropa sensível e conhecedora do sofrimento, de moral
às vezes frágil, que é a Infantaria, fazem-se necessárias ao chefe, qualidades de intuição.
Assim como o cavaleiro sente o temor de sen cavalo e o motorista o estado do motor de
seu carro, o chefe de Infantaria deve sentir os descontentamentos passageiros de sua
tropa, a usura de sua resistência, sua revolta causada pela inveja. Não deve ter
necessidade, para isto, nem de interrogar, - o que não conduz a nada e agrave o mal, -
nem mesmo, o que é mais comum, esperar que lhe contem. Uma palavra que não lhe é
destinada, atitudes, olhares, silêncios mesmo, tudo isto, para um chefe que conhece sua
tropa, que tem experiência e conhece suas funções, deve ser suficientemente revelador.
E é necessário, então, encontrar meios de reanimar o moral e a confiança, sem mesmo
claras, de reconfortar, de reanimar o moral e a confiança, sem mesmo deixar perceber a
possibilidade de uma fraqueza ou de um acesso de mau humor.
Dir-se-á que é exigir grandes qualidades, grandes dons. Mas porque se quereria
que os mais altos postos da hierarquia fossem mais fáceis do que os outros?A honra de
comandar multidões, os responsabilidades marcantes do pode militar para com o pais e
para com os subordinados, exigem uma excepcional seleção de homens escolhidos.
102

Ousarei ainda, terminado, ajuntar um dom difícil de definir, difícil mesmo de


dizer, de explicar, porque falta palavra exata e, para fazer compreendê-lo, é necessário
talvez procurar comparações nos efeitos do rádio, este misterioso gerador de
excepcionais energias. Faltando expressão que melhor o defina, adotarei uma talvez
muitas vezes empregada ou imaginada: - o resplendente magnetismo…
Este dom existe. Os chefes o possuem. Todos os infantes o conheceram, e ,
assim, atraídos, convencidos, arrastados quase contra a própria vontade por esse foco de
luz, de atração e de energia, viram diluir-se suas objeções e sofrimentos, sentiram-se
mais fortes, mais audaciosos e mais vibrantes e executaram com o êxito tarefas que não
teriam tentado com proveito sem este impulso quase sôbre-humano.
Magnífico e supremo dom para um chefe de Infantaria!
103

Capitulo XV

Métodos de comando - um comandante de infantaria deve, antes de tudo, fazer a


conquista moral da tropa - demonstrar sua própria afeição - nenhuma demagogia -
render homenagem ao passado das unidades de que assumam o comando - o papel
importante das licenças - pequenos meios úteis - não recear sua tropa - não recear a
tropa nas horas de possível rebelião - permitir tudo o que for possível - ocupar-se
pessoalmente das questões matérias de alimentação e alojamento - mostrar que são
úteis as exigências feitas - obter o que quer e obtê-lo com sucesso - observar e
reconhecer os esforços - recompensar a castigar com justiça - o exemplo pessoal.

Suponhamos um comandante de infantaria com os dona e as qualidades de que


se falou no capítulo precedente. Vejamo-lo acercar-se pela primeira vez da nova unidade
que irá comandar. Se conhecer suas funções, se quiser tirar o máximo de seu comando e
obter o melhor rendimento deverá, em primeiro lugar, fazer a conquista moral de sua
tropa, conquistar- lhe a estima e, se possível, a afeição.
Não se diga que isso seja rebaixar-se. O chefe que tem poderes consideráveis e
sabe usá-los sem admitir nem discussões nem desobediências, pode, sem enfraquecer,
procurar a adesão intelectual e moral dos subordinados. A disciplina que exigirá em
seguida, ganhará em qualidade e em rigidez com o ser, não direi livremente, mas
voluntariamente consentida.
E não se diga que muitos chefes não usam ais métodos e, escudados nos seus
direitos e no código da justiça militar, dão simplesmente ordens e querem que a
execução se faça. Tal execução, em princípio, não será obtida. Em todos os tempos e em
todos os exércitos houve revoltas, Rebeliões isoladas ou coletivas, ocorridas em
unidades que sob outros comandos se tornariam eficientes e motivadas pela falta de tato
e pela brutalidade de seus comandantes. Se essas revoltas graves não são mais
frequentes, em casos semelhantes, é que as autoridades intermediárias interpõem a sua
habilidade ou fazem valer sua popularidade pessoal ou o seu crédito moral. Os chefes
mais rigorosos, aqueles que quiserem comandar desde o começo sem se preocuparem
com a estima e com abdicação mesmo verbais ou por contraordens que estão lhes
arruínam definitivamente a autoridade, se rebaixam verdadeiramente. Qual o militar
que, tanto já algum tempo de serviço, não se recorda com bastante precisão de casos
assim?
Mas, sem irmos a êstes extremos, é certo que um comandante indiferente é
servido com indiferença. Acontece assim em tôda parte. Quem já viu a vitória sorrir, em
corridas ou em concursos hipicos, para cavaleiros brutais e sem tato, montando cavalos
briosos?
Sendo assim, o comandante que chega quer, desde o começo obter a estima e, se
possível a afeição dos subordinados. Fica entendido que ele se negará a toda demagogia,
a todos os meios de baixa popularidade, pois que são verdadeiramente aviltantes para
um chefe. Mas pode imediatamente, e isto desde o primeiro contacto, mostrar sua
própria afeição pela unidade que vai comandar e que já tem um passado.
É hábil e justo mostrar que se conhecem os feitos passados dessa tropa e for necessário,
ou pelo menos mantê-lo.
104

O que mais atrai a afeição e o devotamento de uma tropa, é a feição sincera e


profunda que seu comandante lhe tenha. Se um chefe não estimasse sua tropa seria
incapaz de bem comandá-la e, mais ainda, seria indigno de estar-lhe à frente. Deveria,
neste caso, pedir reconhecer-lhe o valor atual. Ter-se á, em seguida, mais facilidade para
aumentá-lo, se troca de posto. Não se poderia conhecer um bom chefe que não
estimasse esta admirável Infantaria que sabe dar tão profundamente sua dedicação, seus
sofrimentos e o sangue só por uma ordem e muitas vezes, só por um desejo do chefe.
Mas há graus na afeição, como há diferenças no coração e na sensibilidade. Os chefes
mais sensíveis, aqueles que sofrem mais por um mal entendido passageiro com seus
subordinados, não são sempre os mais expansivos, mas acham sempre a maneira de
mostras sua afeição são sempre os mais estimados. Todos conhecemos aqueles q amam
sua tropa de uma outra maneira, talvez mais ainda do que ao seu próximo,
possivelmente como se quer àqueles que estão prontos para dar a vida por nos e pelos
quais nos mesmos estamos prontos a sacrificar-nos. Quantas vezes não ouvimos esta
admirável expressão de devotamento total de subordinados que se referem a seus
chefes: “Deixar-nos-emos matar por ele!” O que é belo, talvez mais belo que tudo no
mundo, é que, o mais comumente, não há exagero de termos, mas estritamente uma
verdade, e uma verdade que tantos provocam na realidade.
Para obter um tal devotamento de subordinados, que centuplica a possibilidade
de um chefe, bem vale a pena mostrar afeição.
A melhor maneira é de prova-la com fatos. Aquele que sabe conduzir e poupar
com paixão, quando e possível e sem nada evitar para o país ou para a completa
execução da missão; aquele que sabe mostrar o coração nos dias d sofrimento; aquele
que sabe arriscar situação ou futuro para defender o subordinado; aquele que prova, por
medidas de benevolência e atenção inteligente, que procura suprir todo sofrimento e
todo risco inútil, todo desconforto não exigido pela situação, que esta pronto para
empenhar sua responsabilidade para dar mais licenças e mais liberdade compatíveis
com o serviço; pode ser exigente, rezingão e mesmo violento, mas estará certo de ser
estimado. E aí esta a primeira e a melhor maneira de o ser.
Não podemos voltar a essa questão das licenças sem insistir nela por um
instante. Os regulamentos, muito justamente, limitaram para números fixos as licenças
que podem ser normalmente concedidas. Não se poderia sem graves inconvenientes –
sobretudo em face das contínuas solicitações a esse respeito – afastar de seu serviço em
tempo de paz, os militares que têm tão pouco tempo para instruir-se e, com mais forte
razão, em tempo de guerra, soldados, todos indispensáveis para a conservação dos
efetivos, mas temos de concordar que isso é o que com mais frequência se pode dar, de
agradável, aos subordinados. Há, além do prazer procurado, o interesse de repouso
físico e moral, uma questão de repouso indispensável. Isso é tão verdadeiro e tão
imperioso que em plena guerra reconheceu-se a necessidade de mandar para casa,
alternadamente, por alguns dias, todos os militares, mesmo durante o períodos os mais
ativos, quando os camaradas ficam a frente tem de se empenhar em combate. Fora
dessas permissões regulares há casos excepcionais em que o chefe, que sabe dá-las com
medida e conhece bem o ambiente sob sua responsabilidade pode conceder licenças
suplementares e obter um efeito considerável.
105

Citarei, a propósito, um caso característico. O comandante de um batalhão


encarregado de uma operação particular e especialmente perigosa, tinha que retrair com
seu batalhão para preparar, durante alguns dias, detalhadamente, essa operação de
guerra que se anunciava difícil e da qual os homens, com ou sem razão, não
compreendiam bem a necessidade. Sentindo sua tropa um pouco descontente e querendo
tê-la na mão e dar-lhe a fibra moral e as qualidades de impulsão necessárias para esta
missão especial, o comandante não encontrou nada melhor do que dispensar
excepcionalmente, por dois dias, a totalidade do batalhão, antes de principiar o
exercícios preparatórios. Recebeu, pessoalmente, observações desaprovadoras dessa
iniciativa. Os subordinados tiveram conhecimento disso, o que aumentou os resultados
felizes destes preparativos com o reconhecimento dos subordinados. E toda a tropa ,
reconhecida, repousada, encarando de uma outra maneira essa tarefa suplementar que
aumentava, certamente, os perigos a correr, mas que por outro lado trouxera os
benefícios de uma licença a mais, restaurada moralmente, não só não teve qualquer
retardatário para o regresso, mas se entregou com paixão para os preparativos e
submeteu, em seguida, as linhas atacadas de um modo excepcional e vitorioso. Sem
dúvida não há teoria moral ou argumentos elevados que obtivessem com tamanha
eficácia e decisão um tal resultado. O comandante desse batalhão teve, em menção do
Boletim do Exército que se seguiu à ação e no qual foi recompensado, a seguinte
citação: “Depois de ter realizado de maneira notável e preparação moral e material de
sua unidade, conduziu a operação do batalhão que lhe fora confiado e obteve êxito
brilhante, atingindo todos os objetivos situados na quarta linha alemã, reduzindo os
encarniçados centros de resistência, trazendo vinte e cinco prisioneiros, uma
metralhadora, um bocal para granada e numerosos documentos”.
A “preparação moral de uma unidade” fora sobretudo aquela permissão
suplementar, dada sob sua responsabilidade e que lhe fora, a principio, censurada.
Não se poderia negligenciar certos pequenos meios que provam, quase sem o
conhecimento daquele que os utiliza, a afeição e a estima do chefe. Principalmente,
digamo-lo desde logo para não mais retornar e para que não haja nenhum mal entendido
a este respeito, tudo o que é artificial e falso, tudo que são demonstrações verbais,
mesmo sinceras, mas exagerado, deve ser rejeitado, pois faz mais mal do que bem. O
soldado e mesmo seus superiores mais imediatos, apegam-se sempre ao critério dos
fatos do que se falou anteriormente. Desprezam e não gostam do demagogo. Na guerra,
principalmente, as promessas então muito próximas das realizações para poderem iludir
por muito tempo.
Mas, além dessas realizações, certas maneiras de ser, certos gestos, tem um
poder de atração indiscutível. O General Deville, comandante da 42ª Divisão de
Infantaria, procurava sempre chamar seus oficiais pelos nomes. Muitas vezes ele não
conseguia isso senão se fazendo lembrar, no ultimo momento, dalguns desses nomes
que ignorava ou de que esquecera. Sabia-se disso, mas sabia-se, também, que passam na
guerra tantos oficiais em uma divisão, que um general de divisão não pode de lembrar
sempre do nome de cada um e eram-lhe reconhecidos por esforçar-se em conhecer
pessoalmente por um e pela tenacidade em encontrar lembranças pessoais. O valor de
106

sua Divisão ganhava mais nessas manifestações de interesse do que em inspeções


fastidiosas em que se recai sempre nas minúcias rotinadas e pouco significativas.
O general De Castelnau tinha maneira atenta, firme, destacada, de corresponder
à saudação dos mais humildes e às honras que lhe eram prestadas pelas unidades em
desfile. Esta expressão muda de afeição e de estima emocionada, que parecia de
reconhecimento, nunca deixava de atingir o alvo, e as fisionomias dos homens, em
seguida, mostravam haverem compreendido e estarem sensibilizados.
O general Passaga tinha maneira penetrante de olhar e aperto de mão que atraia e
prendia. Além disso, sabia-se de seu cuidado e de suas atenções pessoais, do
conhecimento próprio que buscava em seus reconhecimentos pessoais e minuciosos
sobre o terreno, antes dos ataques, do cuidado que punha em escolher a hora exata da
partida do ataque para que os executantes aproveitassem toda a obscuridade possível e,
imediatamente depois, claridade justamente suficiente para não perder a direção. Para
esta escolha, não se limitava a olhar o calendário, não atendia ao conselho de ninguém;
ia andar, muitos dias seguidos, ao findar da noite, exatamente ao raiar do dia. Enfim,
atribuía-se-lhe a invenção da barragem rolante, dessa barragem que o infante, depois de
experimentá-la, considerava corno o mais poderoso meio de sucesso e a melhor maneira
para diminuir as perdas no ataque.
Ainda que seja contrário ao regulamento, ainda que não possa ser usado por
todos e que lhe falte alguma cousa, não se ignoram os efeitos de um tutear afetuoso que
aproxima certos chefes dos subordinados, como a um pai de seus filhos, u camarada
mais antigo e mais graduado de um mais moço. Sabe-se que os oficiais da Legião
tuteiam habitualmente os legionários, salvo àqueles que são objetos de sanções graves
ou são sabidamente mau elementos; e estes sentem muito bem, nesta diferença de
tratamento que não lhes escapa, que são objeto de afastamento e de diminuição.
Nesta mesma ordem de ideias e talvez mais com o efeito de um magnetismo
elementar, a mão pousada afetuosamente sobre o ombro, tem um poder calmante
persuasivo que atrai a confiança.
O chefe deve ocupar-se pessoalmente e com frequência, das necessidades
materiais de sua tropa, de sua alimentação, de seu alojamento, de suas fadigas. Muitas
vezes, porem, é mau interrogar os homens sobre este assunto. Arriscamo-nos a
encontrar um cabeça-dura ou um descontente contumaz que se queixara sem razões
suficientes, sobre tudo em presença dos outros, falará de maneira falsa e talvez gere um
descontentamento geral que não existia antes. Todos sabemos que os mais exigentes são
aqueles que menos conforto tem em casa. De mais a mais não é nem possível nem bom
para uma tropa que deve ser rude e apta a privações inevitáveis, aumentar
demasiadamente o seu bem estar. O chefe, por mais altamente colocado que esteja, deve
ver por si mesmo, saber sentir se é ou não é suficiente o que está sendo dada a tropa,
sem se deixar nem iludir, nem apiedar. Muito antes de perguntar ao homem se está
fadigado ou mal nutrido deve tomar medidas que corrijam o que não está satisfatório. É
infinitamente melhor.
Depois do chefe ter mostrado bondade, solicitude e afeição, pode e deve fazer
exigências. O principal é que não tema a sua tropa. Isso é mais frequente d que se
imagina e, como já dissemos acima, tal fraqueza, indigna de um chefe, é o mais das
107

vezes, atitude daqueles que exerciam o comando de maneira brutal e intransigente.


Recordo-me de um capitão que conduzia sua companhia de legionário no sul da Algéria,
que com um rigor excepcional. Não perdoava nada e – o que é péssimo método de
comando- tinha o habito de ir, a tarde, escutar o que se dizia nas barracas. Era detestado.
Um belo dia o legionário, de volta de um serviço de transporte e tendo bebido um litro
de absinto puro, procurava-o, armado com seu fuzil e queria mata-lo. Foi preciso que
esse possesso, que já matara um cabo durante a ocorrência e que constituía um perigo a
todo acampamento, fosse abatido pelo seu tenente, este muito estimado por seus
homens e que os conteve depois desse penoso ato de energia, e o capitão mencionado,
que após esse incidente ficou meio louco obcecado sempre pela ideia de ser assassinado,
teve de ser transferido de corpo e recambiado para a França. Quantos oficias, entretanto
lidando com as tropas difíceis, tiveram pela frente um revoltado, fuzil na mão
ameaçador, mas a calma e a energia quase sempre estiveram o gesto definitivos. E era
preciso ver, no caso da legião citada como todos os outros legionários, ate os amigos do
revoltado puseram-se prontamente, de arma na mão, para defender o seu oficial e fazer
respeitar a disciplina.
Durante a guerra, a maioria das unidades teve seus momentos difíceis, enfrentou
possibilidades de rebelião, em todos os caos surgidos o que há de mais admirável não é
o fato de que eles tenham podido surgir e sim o contrario disso, isto é, que seja possível
comandar, quase sempre sem incidentes, multidões armadas que, por sua missão
organizam-se com homens rudes habituados a violência e decididos a arriscar a vida,
ameaçando a dos outros.
Não é, pois inútil dizer que um chefe não deve ter medo de sua tropa, nunca.
Salvo casos excepcionais, como os ocorridos com os exércitos russo e alemão no fim da
ultima guerra, é muito raro, mesmo em casos de derrota, que um chefe enérgico e
calmo, querido por sua tropa, tenha todos contra si e não posso por um comando hábil e
enérgico, restabelecer a disciplina, aproveitando-se dos elementos que permanecem
disciplinados, dando o exemplo fazendo apelo a disciplina e, se necessário, aos meios
extremos para a imposição da ordem.
Vimos o valor que a tropa atribui ao fato de ser comandada por um chefe que
vence, para ter êxito, é preciso treinar, é preciso exigir, é preciso conseguir o que se
quer. Não será o chefe mais benquisto, o mais sinceramente ligado a sua tropa e mais
cioso de suas forcas, quem exigirá menos. Talvez até seja ele quem mais exija; mas
exigirá quando e como for preciso e terá tanto mais autoridade para o fazer, quantas
provas tiver dado e suas preocupação em evitar riscos e sofrimento inúteis.
Durante o desenrolar de uma ação qualquer, um comandante deve saber
considerar devidamente o esforço e o mérito. Isso não é nem tão fácil, nem tão comum
quanto se posso acreditar, para quem nem tão fácil, nem tão comum quanto si possa
acreditar, para quem esta longe, comanda sobre espaços que se tornam dia a dia mais
amplos e deve, constantemente, procurar os mas merecedores entre aqueles que menos
aparecem, que fazem menos estardalhaço e destaca-los e não se enganar, pois só aqueles
que efetivamente realiza atos de justiça que sabe escapar as inevitáveis ambições dos
que o cercam e a tentação de recompensar a vantajosamente os atos ocorridos junto de
si, que dá relevo aos méritos mais assinalados depois de ter sabido descobri-los e
108

recompensa-los, só esses, repito, terão e conservarão a reputação de justos e imparciais,


de clarividentes e generosos no sucesso, reputação que há de assegurar sua autoridade
moral de chefe e seu poder de impulsionar a tropa.
Finalmente, se apresenta a ocasião - e é preciso procura-la -, o chefe ganhará
considerável prestígio e seu poder e comando será imensamente acrescido, se puder
provar, por um ato pessoal, que é capaz de fazer cousas ainda maiores do que as que
pede, que é digno de comandar os mais famosos dos seus subordinados. Não há
necessidade de repetirem-se, com frequência, atos dessa ordem. Um ou dois, bem
escolhidos, bastam quereis um exemplo?
Encarregado de operação limitada de batalhão, apoiado por artilharia
relativamente considerável (a de duas divisões), um comandante de batalhar teve tempo
bastante para preparar minuciosamente e até ao fim, toda ação. Esta, de duração muito
curta, não consistia senão em um golpe de forca um avanço penetrante no dispositivo
inimigo para fazer prisioneiros e destruições e, obtidos ou não resultados, regressar a
base de partida. Era o que se chamava durante a guerra um golpe de mão de vai e vem.
Essa ação por motivos de ordem feral devia constituir também manifestações de força e
constituir diversão relativamente importante. Era, por isso, ação muito potente,
apresentar grande riscos e --- particularidade que explica a continuação --- chefe que a
montara não tinha mais a fazer do que aguardar em posto e comando inicial sem
qualquer intervenção possível, com do combate e os seus resultados, quaisquer que eles
fossem.
Era ocasião excelente, pois, para uma prova de coragem pessoal, sem nenhum
inconveniente e com a vantagem contrario, de aumentar a atividade e a decisão dos
executantes, exemplo de chefe da ação. Para dar maior brilho ao seu gesto certamente
que também por um sentimento misto de satisfação pessoal e de reconhecimento aos
seus subordinados, - seus agentes de transmissão, - que acabavam de oferecer-lhe uma
pequena cruz da legião de Honra, o comandante em questão envergou seu mais belo
uniforme e pôs todas suas condecorações, precedidas pela cruz que acabara de receber,
partindo na frente, chegou por ultimo. Deveu a cerração, sem duvida, o ter voltado
indene. Aliás, não é certo que com o tempo claro fosse atingido por ser alvo marcante
para inimigo tão aproximado, no meio do qual progredia seu batalhão, pois as pessoas
atingidas durante a guerra não foram, em geral, individualmente visadas. Mas é certo
que ganhou com esse gesto, inicialmente, a excepcional vives de sua unidade
galvanizada por seu exemplo e, depois, uma autoridade moral muito acrescida nos seus
comandos ulteriores. O feito tornou-se legendário e foi, talvez felizmente para ele,
completamente ignorado por seus chefes.
Sem que seja possível o mais das vezes e talvez nem mesmo útil, ter gestos
semelhantes, não faltam ocasiões para os chefes, de darem prova de bravura pessoal. E é
de se notar que são os gestos supérfluos ou inúteis que mais repercutem. É muito justo
que seja assim porque, se é meritório arriscar a vida quando a isso se é forçado, naquele
caso o mérito é muito maior ainda, por que se poderia ter ficado em um abrigo. O
general Deville, de quem já citei as qualidades de psicólogo, não esquecia de fazer,
todas as vezes que podia, ato de bravura pessoal. Assim é que, durante, durante a noite
de 15 para 16 de abril de 1917, diante de Berry-au-Bac, ficou horas seguidas em uma
109

das pontes sobre o Aisne, batida continuamente elo inimigo, e por onde devia passar
numerosas unidades de sua divisão, que se deslocava para frente para o famoso ataque
da manhã seguinte. Era um dos lugares mais perigosos dessa passagem de linha e o
general comandante dessa divisão, sem prejudicar em nada ao seu comando, poderia
permanecer no seu longínquo P.C., esperando por notícia sobre as possibilidades de
passagem e, depois, sobre as perder verificadas durante a operação, ao passo que os
fatos fossem ocorrendo.
Não se duvide de que a vista de seu general a noite, nesse ponto perigoso, tenha
sido para muitos soldados, na manhã seguinte, poderoso estimulante a fim de se
lançarem para a frente; e esse feito, muitas vezes contado a seguir, aumentou fortemente
a autoridade moral de uni chefe que foi muito querido.
Por certo que ele o merecia sob todos os pontos de vista. E, entretanto não tivera
a principio, apesar de suas qualidades militares e morais (os homens o apelidavam até,
com certo rancor; “Ataque, Ataque!”), a autoridade e afeição de que ele conhecia a
necessidade e o poder, e que soube conquistar, depois pela variedade de meios que neste
capítulo, tentamos indicar por ser valor e por sua utilidade.
110

CAPÍTULO XVI

Métodos de comando- Como manter e aumentar o valor moral de suas unidades de


Infantaria – Como elevar excepcionalmente esse valor moral no momento de exigir
grandes esforços – Desenvolver ao máximo o espírito de corpo – Os nomes dos
regimentos – Distintivos de uniformes – Utilizar a emulação – Recompensas
individuais e coletivas – As sanções disciplinares – Dar caça impiedosa a todos os que
tentarem, sem motivo suficiente, fugir ao campo de batalha, é um dever de justiça e a
única maneira de conservar os efetivos – A palavra que empolga – Dar aos homens a
ração de amor próprio a que têm direito – Manter sempre, e se possível ultrapassá-las,
as promessas de repouso e de recompensa que forem feitas.

O chefe que soube, por suas qualidades, por sua maneira de agir e por seus
primeiros atos, assegurar autoridade moral e conquistar a afeição de sua tropa, está nas
melhores condições para conservar o valor moral de suas unidades de Infantaria e até
aumenta-lo e prepará-las, apesar do afrouxamento causado pelo prolongamento de
guerra, para as difíceis tarefas que, inevitavelmente, deverá exigir delas.
Não falarei da instrução e do treinamento físico que ultrapassam a questões
psicológicas aqui estudadas, mas, apenas para assinalar a inabilidade de certos chefes
maus psicólogos ou para habituados ao comando direto, deve-se apontar erros que
cometem quando, sem necessidade, descuidam de suas tropas e, por exemplo, deixam-
na exposta à chuva ou ao relento. Veem nisso, sem dúvida, um enrijamento às
intempéries e uma prova de que suas unidades são capazes de suportar tais
inconvenientes do serviço militar. Mas a tropa apenas vê nisso (mesmo quando quem
lhe deu a ordem também permanece à chuva ou ao relento o que nem sempre acontece)
mais uma prova excepcional por que terá de passar, mais uma exigência inútil,
verdadeira brincadeira de mau gosto. Já para um verdadeiro chefe, acostumado a
defender seus homens e a exigir deles apenas o indispensável e o necessário, seria
surpresa chocante perceber que seus soldados reclamavam quando lhes fosse exigido
fica à chuva, ao relento ou expostos ao frio ou mesmo à fome. Bem longe de ouvir
murmurações ou queixas quando as necessidades da guerra ou simplesmente de
manobras lhes fizesse deparar com esses inevitáveis aborrecimentos e riscos, este chefe
verá, quase sempre, - principalmente quando participa pessoalmente dos inconvenientes
citados – resignação calma e até mesmo alegre entre os seus homens. Foi-me contado,
por um capitão dos Atiradores Argelinos, que um dos seus indígenas, terrivelmente
ferido, transportado em uma padiola e gemendo durante o trajeto, dissimulou a dor que
sentia para sorrir quando o viu passar e disse-lhe: “Não é nada!” Se era conhecido por
sua bondade e pelo constante cuidado em evitar fadigas e sofrimento inúteis para seus
homens, este oficial o era também por seu rigor pessoal e por seu desprezo pelos débeis.
Não esqueçamos (o que exalta o valor deste exemplo e o resultado que ele revela) o ar
lamentável que geralmente apresentam os indígenas doentes e feridos, mesmo no caso
de ferimentos sem qualquer gravidade, quando se aproximam dos superiores. Não resta
dúvida de que os homens – como os animais – bem alimentados, bem cuidados e
preparados antes de qualquer esforço, são os mais aptos para resistir, no momento
oportuno, às fadigas e aos sofrimentos necessários.
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Precedentemente se falou, estudando a psicologia da tropa, do imenso valor do


espírito de corpo. O poder dessa alavanca é inegável e a sua influência ultrapassa o
quadro interior dos corpos e muitas vezes ultrapassa até mesmo o âmbito do Exército.
Tomemos como exemplo típico “o espírito de Caçador” do qual certas manifestações
exteriores, algumas até mesmo pueris, desagradam tanto aqueles que não passaram
pelos Batalhões de Caçadores e só veem os inevitáveis exageros, sem compreender
suficientemente a transformação total e definitiva que certas tradições particularistas
imprimem nas almas. Mesmo depois de darem baixa do serviço os antigos caçadores se
agrupam em sociedades particulares e o fazem de uma maneira que se pode dizer mais
fanática do que quaisquer outros. Como uma devoção comovedora, estes civis de todas
as condições, mantém a chama de outrora, vibram em uníssono nas manifestações de
aspectos e maneiras bem militares e, o que ainda é o mais curioso, as populações de
todas as cidades da França, mesmo as menos militaristas, deixam-se influenciar por seu
entusiasmo, saúdam com respeito seus desfiles e estandartes, mostram simpatia e
admiração pelas belas qualidades morais que eles representam.
Não deve haver nisso um privilégio dos caçadores. Todos os corpos, todas as
unidades, em graus diferentes, podem e devem beneficiar-se, por meios análogos, do
mesmo acréscimo de força moral.
O espírito de corpo conserva-se, essencialmente, pela manutenção das tradições.
Já se viu isso anteriormente. Mas o papel dos chefes mais graduados no estimulá-lo, a
necessidade de fazê-lo surgir, pode e deve ser considerada. Sem nos determos nos
pequenos inconvenientes das rivalidades, nas pequenas manifestações muitas vezes
embaraçantes da fé em uma superioridade que nem sempre é certa, é necessário fazer
crer habilmente a cada unidade que ela é superior a suas vizinhas ou que o deve ser.
Renovando as tradições do antigo Exército que dava não só um número mais anônimo,
mas um nome próprio para cada regimento, o general Passaga, e outros também,
preconizaram, durante a guerra, designar as unidades por apelidos relembrando os
acontecimentos da guerra, feitos de armas ou indicações das províncias de origem. Na
divisão, depois nas grandes unidades e unidades do Exército deste grande chefe, todos
os regimentos tinham seu nome próprio. Em uma outra divisão, a “Divisão dos Ases”,
cada regimento tomara o nome de um dos quatro ases do baralho. Havia o Ás de Copas
(penso que era o 60º Regimento de Infantaria), o Ás de Espadas, o Ás de Paus e o Ás de
Ouros. E cada um dos militares desses regimentos trazia, orgulhosamente, uma insígnia
representando essas figuras. Os apelidos desapareceram. Talvez tenha sido um erro. Mas
muitas insígnias permaneceram e, principalmente, todos os Batalhões de Caçadores
adotaram, cada um a sua, relembrando da origem, o habitual terreno de ação ou
qualquer outra particularidade representada por animais, ou flores características (cabra,
galo do pântano, edelvais) ou o número da própria unidade se prestando a um
trocadilho¹, etc. Nos exércitos estrangeiros utiliza-se mais do que entre nós estas
particularidades de uniformes que diferenciam os regimentos e ajudam a criar ou manter
o espírito de corpo. Haverá quem acredite que os soldados do “Royal Auvergne” ou do

_____________________
¹ - Em francês o numero 3 e o Cavalo de Tróia prestam-se a um trocadilho. (NT)
112

“Regimento do Príncipe de Gales” não são os mais assediados e mais brilhantes nos
quartéis, mais prontos em se distinguirem e em se fazerem matar em combate, pela
honra de sua unidade, do que os soldados do anônimo 621º?
Todos os meios que encorajam a emulação são bons. As recompensas e as
citações individuais e coletivas são as mais utilizadas e as mais eficazes.
As citações coletivas, com a atribuição de distintivos progressivos, foram uma
descoberta de comando, da última guerra. Esta particularidade, que modifica
definitivamente o uniforme de um corpo e de maneira proporcional aos méritos do
passado, desenvolve também o espírito de corpo e o orgulho coletivo. Tem, além disso,
a vantagem de estimular o desejo de brilhar, de obter sucesso, mesmo de se sacrificar e,
pode-se até dizer, a vantagem de exercer uma atração singularmente elevada. Não se
trata de uma questão monetária, de obter promoção ou vantagens tangíveis, nem mesmo
distinção pessoal. Paira muito acima disso tudo, é muitas vezes para que outros colham
beneficio, que os soldados de um regimento enfrentam os maiores perigos e as tarefas
mais árduas, sacrificando-se pessoalmente.
As citações individuais tem suas vantagens e seus inconvenientes - como tudo,
aliás – Sem duvida, o mais comum, sobretudo quando se faz alusão a fatos precisos (e
não se esqueça que as citações formais e rotinadas não iludem os verdadeiros
combatentes), é serem elas recompensas justas. Mas é inegável que os períodos de
recompensa são períodos de descontentamento. Os que são distinguidos acreditam
muitas vezes terem obtido menos do que mereciam por seus méritos e aqueles que nada
receberam julgam a miúdo que tinham, também eles, títulos que se deveria ter tomado
em consideração. Não nos detenhamos nestas manifestações da habitual inveja humana.
É o futuro, particularmente, que se quer preparar. Podemos estar certos de que os
mesmos que desaprovaram a partilha, logo que passe seu mau humor, tudo farão para se
distinguirem e por sua vez serem recompensados.
Dificuldade bastante grande, para o comandante de um escalão já um pouco
elevado, é repartir com equidade as condecorações de que disponha. Realmente, pois as
propostas, seu numero e os beneficiários variam, consideravelmente, com os
proponentes. Alguns pensam que o dever, seja qual for, é obrigação e não merece
recompensa. São extremamente. parcimoniosos em seus pedidos e os apresentam mal.
Outros, ao contrario, multiplicam as propostas, avantajando muito os motivos. Não
faltam mesmo os que experimentam apresentar as cousas de tal modo, dosar as
propostas de tal jeito, que constituam uma espécie de processo indireto, do qual a
verdadeira finalidade é uma recompensa pessoal.
É mister, pois, ter em linha de conta os hábitos e a mentalidade dos que fazem as
propostas. Além disso é preciso saber diferenciar os méritos e as dificuldades
respectivas das tarefas realizadas pelas diversas unidades e tornar proporcionais o
numero e a qualidade das recompensas totais atribuídas a um corpo, aos esforços e aos
resultados obtidos. Depois, tendo se feito o humanamente possível para ser justo, só
podemos nos encouraçar contra certas ingratidões completando, quando necessário, -
mas é pedir demais, - pela prova de seu desinteresse pessoal, um exemplo que não falha
113

nunca em seu objetivo e dando argumentos de uma particularidade, bastante


convincente para as pessoas decepcionadas.
Como quer que seja, como quer que sejam seus inconvenientes, as citações e as
condecorações, as promoções quando merecidas e correspondendo também às
possibilidades de comando superior do beneficiário são, para um chefe, os meios mais
poderosos e eficazes, d recompensar os méritos passados, de aumenta o valor de
conjunto de suas tropas, de aumentar o rendimento dos esforços ulteriores, de excitar
com promessa concreta o entusiasmo e o desprendimento daqueles que se vão lançar em
ação. Se é preciso recompensar os melhores, estimular, observando-os, medíocres, é
indispensável aplicar punições aqueles que não cumpriram o seu dever. E isso sem
sensibilidade, com mentalidade de comando e tendo em conta os imensos interesses em
jogo. É certo que muitos dos encargos da infantaria parece sobre-humano e que as
falhas mesmo graves, em face aos espantosos meios de destruição do inimigo, encontra
explicação. Mas é preciso não esquecer que aquele que se esquivou, deixou o lugar
perigoso para um outro, o que talvez tenha custado a vida de um camarada, ao qual não
tocava ainda a vez de afrontar o risco e, acima de tudo, que a salvação do pais repousa
sobre o espírito de sacrifício de seu Exercito e, ais particularmente, seus infantes. É um
dever, - face a face dos bravos e face e face do país- ser, muitas vezes, impiedoso.
Sem insistir nestes deveres penosos que são um dos mais pesados encargos do
comando se bem que, por felicidade, de incidência relativamente rara, é necessário
observar que é indispensável, e todo de tempo, dar aos que procuram subtrai-se ao
campo de batalha.
Não me referir aqui, sem duvida, a certos militares ou assemelhados de categoria
diversa, qualificado com funções ou empregos sem perigo, indispensáveis para marcha
do conjunto da pesada e complicada maquina de guerra. Há ai responsabilidades a tomar
uma organização a assegurar que foge ao quadro que aqui se estuda. Mas quero falar de
todos aqueles que se procuram subtrair, sem razões bastante, ao seu lugar normal de
combate. Entre estes, os mais numerosos são os doentes mais ou menos autênticos e
feridos que prolongam exageradamente a convalescença. ``Grande numero de pessoas,
diz Ardrant du Picq,entra para os hospitais sem outra moléstia que a falta de moral, que
bem logo se torna moléstia real´´. Os médicos, dos quais o papel é a proteção e o
reestabelecimento completo da saúde, tem muitas vezes de tomar decisões difíceis. Que
pessoa humana esta completamente e bem verdadeiramente apta as terríveis provas da
vida num campo de batalha de infantaria? A piedade é um sentimento bem natural,
principalmente na retaguarda, e explica a demora de inúmeros tratamentos com
justificação insuficiente. Não se poderia imaginar, por exemplo, se não se soube por
experiência pessoal, o numero considerável de homens que se afastaram
indefinidamente de suas companhias por motivo de moléstias venéreas e cuidados
dentários...É um dever de justiça, face aqueles que ficam e tem mais trabalhos e riscos,
pois que se tornam menos numerosos, é uma obrigação sob o ponto de vista de
conservação dos efetivos, estabelecer regras severas, exercer vigilância impiedoso, para
trazer o mais cedo possível para frente, todos aqueles que podem ocupar um lugar. Além
de que isso afeta moral dos que ficam... Estes, para os quais o dever é tão difícil de
realizar e tão meritório, devem poder contar com seus chefes, para que as tarefas mais
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pesadas sejam repartidas com justiça e não caiam sempre sobre os ombros dos mais
devotados e dos melhores.
Ainda que os infantes sejam pouco inclinado a tagarelice, não gostem de longo
discursos e haja dificuldades crescentes quando se trata unidades mais importantes, para
se fazerem ouvir, é indispensável que os comandantes de Infantaria saibam falar a sua
tropa. Por meio de palavras e escolhidas e oportunas, em encontros ocasionais com
graduados ou com simples soldados, por alocuções dirigidas a parcelas da tropa, por
notas escritas ou por proclamações, é necessário fazer entender certas ideias, pronunciar
certos palavras. Um chefe que unicamente da ordens é insuficientemente compreendido
e tem sua ação de comando muito limitada.
Os subordinados tem necessidades de escutar o comandante dizer que conhece certos
sentimentos, que lhe prepara certos remédios, que lhe é impossível momentaneamente
satisfazer certos desejos e por que. Aplicar-se-ão melhor a uma tarefa da qual lhes
tenham explicado em uma palavra a necessidade e grandeza. Perderão, eles que veem as
cousas mais de perto, certas apreensões de que lhes tenham feito compreender o
exagero. Lembro-me bem dos crescentes receios que nasceram em muitas tropas, em
1918, quando os alemães começaram a utilizar gases na preparação de seus ataques.
Bastou explicar aos soldados de um regimento, por meio de uma nota escrita, que era
tão impossível aos alemães quanto a ele próprios, progredir durante um verdadeiro
ataque, através do terreno removido, esburacado,com cercas e arame e trincheiras a
transpor, com mascara afivelada ao rosto, para os acalmar e fazer compreender que
obrigatoriamente, no momento mais duro da progressão da Infantaria inimiga, no
momento da chegada a distância do lançamento das granada pelos assaltantes, qualquer
perigo delas também cessava pra os defensores da posição.
Quando se pode usar a palavra diretamente, encontrar a palavra que empolga a
tropa antes de pedir-lhe um esforço grande e penoso, tem-se então um meio
extremamente eficaz de agir, como a chicotada oportuna – e de mais a mais tão difícil –
do jóquei que chega, arranca de seu cavalo, o esforço suprem que o faz vencer a corrida.
A ``palavra que empolga´´ merece, pois, que nos detenhamos um pouco.
Dizer que para a encontrar é mister, principalmente, não procura-la, seria
exagero. Não há inconveniente e nem é inútil refletir antes nas qualidades particulares
da tropa a que se vai falar, nas circunstancias dos esforço pedido, nas censura e nos
elogios que se impõem, nos argumentos que por sua veracidade e evidencia tem
possibilidades de produzir efeito estimulante, no caso particular.
Mas se essa busca leva a prepara uma frase, compor uma expressão histórica, se
exige que a expressemos de maneira teatral, arriscamo-nos ir de encontro ao fim
desejado e a lançar uma ducha de palavrório sem finalidade, sobre o entusiasmo talvez
já existente e embrião em lugar de precisamente o desenvolver.
Muitos elementos contribuem para dar relevo as palavras pronunciadas. Quase
se pode dizer que as expressões, em si mesmas, não tem importância. De qualquer modo
seu valor estilístico, sua correção literária, até o esplendor dos termos, se não tem
naturalidade e não correspondem as condições que falei, dada valem como meio auxiliar
para obtenção de êxito. As frases que mais tem empolgado e mais viva e profundamente
tem influído sobre a tropa, são geralmente expressassem francês popular, as vezes
115

pouco correto, mas tem fulgurado como faíscas que resultassem do choque da
sensibilidade dos ouvintes com a do seu chefe, este ultimo em contacto magnético de
olhos e de pensamento, com aqueles, encontrando repentinamente, poderíamos dizer, o
ponto vulnerável de seus corações.
A primeira condição para que uma palavra empolgue no sentido de exaltação
aqui tratado, é que parta de u chefe valoroso que conte com a estima, e se possível cm a
admiração de seus ouvintes. Um chefe desprezado ou desdenhado, o que quer que
dissesse chocar-se-ia contra o paredão da hostilidade latente. Tudo o que tentasse
explicar seria mal interpretado e sem efeito útil.
As palavras ganharão em interesse e em significação se o chefe valoroso que as
profere é conhecido por sua franqueza habitual, se sabe que ele é sempre sincero em
suas censuras, em seus elogios, em sua apreciação das dificuldades e das possibilidades
de uma missão, se já se constatou a justeza de seus prognósticos m ocasiões passadas.
O sentido do que se diz tem mis importância do que a forma. Convém descobrir
os argumentos decisivos para o caso especial, que esses se adaptem ao estados moral d
auditório no momento e a natureza do esforço que lhe vai ser pedido.
Independentemente do fim elevado desse esforço, é preciso fazer ressaltar a
necessidade, a possibilidade e até a relativa facilidade, dar relevo aos meios postos em
ação para apoiara operação, prever os resultados, a duração e as recompensas de ordem
moral e material que resultarão do bom êxito que vai se obter.
Finamente a brevidade, o tom de convicção fervorosa e fria, devem concentrar
toda força da eficácia. A palavra que empolga vem sempre do coração, da sensibilidade,
brota da impressão ardorosa do momento. E sente-se que ela empolga, no mais
profundo silencio de quem a ouve, na atenção e na maior emoção que se estabelece.
Não se duvide, efetivamente de que haja varias qualidades e vários graus de silencio.
Todos os que já falaram a um auditório importante e silencioso, o sabem. Sente-se
também quando, apesar do silencio, a atenção do auditório se desvia e abandona o
orador.
Aqueles que tem necessárias qualidades de valor e de atração e possui esse dom
inestimável – e raro – de encontrar, quando é preciso, a palavra justa, capaz de empolgar
seus comandados dispõem de poder utilizável mesmo normais altos postos de hierarquia
– recordemo-nos de algumas proclamações de Napoleão – e de um incomparável
eficácia ara comandar particularmente, a Infantaria.
No curso normal da vida militar, alguns chefes esquecem frequentemente de
conhecer louvores justos, de reconhecer o que está certo, mas não esquecem nunca de
apontar o que esta errado.
Ir-se-ia que não sabem se não resmungar e repreender, sem nunca compreender os
esforços feitos por seus subordinados para vencer as dificuldades, tanas vezes grande,
das tarefa diárias. Obtém, assim um inevitável rancor da parte dos subordinados, rancor
esse que seria muito fácil evitar que chegasse a existir, e desse modo desencorajaram
qualquer esforço com não aprecia-lo. Mesmo quando nada de excepcional sua
confiança em si mesma. foi realizado, um comandante deve ser capaz de ver aquilo que
poderia dificultar ou impedir a realização da tarefa extra simplesmente a sua satisfação.
Nada de felicitações exageradas e em desproporção com os resultados obtidos. Basta
116

dizer: ``Muito bem ´´!, dando mostras de que se notou a habilidade, o esforço ou
simplesmente a probidade com que foi executado o trabalho A tropa, e particularmente
a tropa de infantaria, necessita de sua ração de amor próprio, e necessária recebê-la com
alguma frequência para manter sua boa vontade e para conquistar ou conservar utilizar
suas energias e aumentar sua vontade de obter êxito, a sua confiança em si mesma. É
uma exigência necessária a saúde equilibrada de sua alma, como a nutrição é
indispensável a manutenção do físico de seus soldados.
Finalmente, para elevar o moral dos homens no momento de ataque, para
galvanizar suas energias e aumentar sua vontade de obter êxito, não s julgue inútil fazer
promessa de recompensas e substituições.
Mas a esse respeito é extremamente importante não fazer promessas que não se
possam cumprir. Sabemos que uma das principais razões das tristes derrocadas que se
seguiram aos recontros de 16 de abril de 1917, no exército francês além da decepção
inevitável devida a um sucesso gozado com antecipação e não obtido (mas quantas
decepções desse gênero já não experimentou a infantaria), foi o efeito das promessas de
substituição a fazer e que não foram realizadas.
Não há dúvida de que o futuro, principalmente durante uma guerra, é cheio de
imprevistos. Aquilo que se imagina poder dar torna-se possível no dia seguinte. Mas há
cousas de que se tem certeza e essas são as únicas que se pode prometer.
Mesmo com o fito de guardar margem de segurança, convém prometer sempre
mesmo do que se pretende dar. Prometendo menos, obtêm-se menos? Não é certo que
seja assim. De início se já se prometeu sem cumprir, as promessas sejam quais forem,
não terão mais qualquer efeito benéfico. Mas se os subordinados sabem que podem
contar, de maneira certa, com o que lhes foi prometido, há nessa certeza um excelente
ponto de apoio para a alavanca que se usa. Uma tropa que sabe que será ultrapassada;
quando atingir certo objetivo, porá mais energia e maior rapidez em atingi-lo do que se
ela acreditar que, conquistando-o mais depressa, terá de continuar a ação até mais
adiante. O que quer que pensem certos utopistas não há embriaguez de êxito capaz de
fazer com que uma infantaria vitoriosa prefira a continuação dos terríveis riscos de uma
ofensiva, à segurança merecida do revezamento e do repouso previsto.
De mais a mais, se promete menos e somente o mínimo que está seguro de poder
dar, nada impede conceder depois, vantajosamente, em particular no caso das
recompensas, tudo o que está em condições de dar. E ganhar-se-á com esse habito, uma
vez conhecido, um imenso poder de arranco, pois as esperanças possíveis não terão
mais por limite senão a ambição dos desejos .
Se um chefe promete 10 e só dá 8, não só se quererá os 2 que ele não deu, como
não será reconhecido pelos 8 dados. E não se acreditará mais nele. Se, ao contrário, se
sabe que ele geralmente dá mais do que promete, quando prometer 5 esperar-se-á 15.
Terse-á nos esforços despendidos, o benefício desse atrativo e não se poderá criticá-lo,
depois, por ter dado mais que 8.
Aí se vê, ainda que, a habilidade e a sinceridade, as exigências da realidade e a
generosidade não são, de nenhum modo, contraditórias.
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CAPÍTULO XVII

Princípios de organização e de emprego da infantaria – Permanência da organização


elementar e respeito aos laços orgânicos – Escolha dos chefes de acordo com as
diferentes missões – Repartição dos recrutas e mistura dos contingentes – As
substituições do decurso das operações – Considerar a percentagem de perdas e
limitar esforço ao anteriormente anunciado – A questão das tropas de elite.

O que estabelece diferenças iniciais entre as multidões humanas e a tropa de


infantaria (independente das questões de armamento e instruções, que não cabem no
nosso estudo) e o que firma a superioridade da segunda, é a organização. Não me parece
que isso possa ser seriamente discutido. Entretanto que de erros a esse respeito se vem
cometidos, na utilização prática das unidades de infantaria.
Não há dúvida que uma boa organização deve ser flexível. É mister fazer face às
múltiplas necessidades perpetuamente variáveis e mutáveis da guerra, adaptar-se aos
ataques de um adversário inventivo. Durante o último confronto flanco-alemão foi
modificada constantemente a composição dos exércitos e até dos grupos de exércitos.
Havia uma série de dificuldades de reabastecimento, de organização e de comando; mas
não havia possibilidades em meios por outro lado, para fazer face às necessidades, tão
frequentemente variáveis, das diferentes partes da frente. Um exército não atacado
poderia ser pouco apoiado; ao contrario de um exercito que era assaltado pelo inimigo,
ou um exército aprestado para o ataque, devia ser rápido e consideravelmente reforçado.
Daí uma dança quase diária de divisões nos corpos de exército. Era mais ou menos
inevitável e era possível em virtude de certa estabilização de frentes. Enfim, as
vantagens eram maiores do que os inconvenientes.
Mas quando se quer transferir essa verdadeira dança de unidades para o seio da
divisão e pior ainda para os regimentos e até para os batalhões, chega a uma
desorganização absoluta. Salta aos olhos de quem quer que queira atribuir qualquer
valor, ao menos, a algumas das considerações por nós estudadas nos capítulos
anteriores. A realidade esteve encarregada de provar inúmeras vezes a verdade dessa
afirmativa, mas isso não impede aqueles que se deixam hipnotizar pelas aparentes
necessidades do momento e que se esquecem os princípios gerais que mais importam
voltem a repetir o erro. E ainda mais em tática os revezes retumbantes de todo o curso
da história militar não recomenda a volta aos pequenos grupos e aos simples cordões
lineares. Com tal atuação quem quer manter tudo e parar o inimigo em toda a frente
pode estar seguro de não manter qualquer parte solidamente e de ver o inimigo penetrar
em sua organização, desborda-la, pô-la em perigo. Haveria muito a dizer e muitos
exemplos a citar, ocorridos em todos os tempos, mas o lugar para isto não é aqui.
Em psicologia coletiva da infantaria, é preciso apoiar-se em princípios absolutos:
A manutenção da organização elementar, dos regimentos e batalhões formando
unidades, e o respeito dos laços orgânicos. Por isso muito raramente poderá usar
batalhões regimentais fora de seus regimentos. Veremos entretanto, um pouco mais
adiante uma exceção que não confirma a regra, segundo a fórmula habitual, mas que
corresponde ás necessidades coloniais de dosagens de raça que se explica pela pobreza
118

de efetivos. Quase nunca devemos afirmar que será de se fazer a utilização de


companhias fora de seus batalhões, salvo para uma operação de fortuna, como a
tamponagem momentânea de uma brecha perigosa e pouco larga, durante uma batalha
defensiva. Nunca o emprego de uma companhia de batalhões diversos e menos ainda de
pelotões de companhias diferentes para chamar de manobra ou de marcha. É, talvez, um
processo supremo de defesa quase desesperado. Nunca é um meio normal de emprego,
esmo para melhorar os efetivos esgotados. Quando se faz isso, cria-se a confusão e a
desordem, volta-se a multidão. Tem-se o direito de organizar diferentemente sua
infantaria, de organizar batalhões até de companhias regimentais, no caso de se tratar de
determinado teatro de operações; onde se encontra um inimigo enfraquecido, mas desde
que as unidades existam com certa organização é preciso não dissocia-las mesmo
momentaneamente. Como indica a palavra corpo, quando se utiliza separadamente as
unidades de um corpo de tropa não se tem mais que membros incapazes de viverem
isoladamente, mesmo se os ligamos a outros corpos, não se tem mais um todo coerente,
animado de um mesmo espírito, suscetível de utilização completa, viva e inteligente.
Principalmente não se lhe tem mais a alma!
Isso é verdade mesmo em tempo de paz. Os destacamentos prolongados
acarretam a morte do garbo e da disciplina, do espírito de corpo, que só a vida em
comum, sob a autoridade direta do comandante ajuda a criar e manter. É por essa razão
também que parece necessário abolir a separação do contingente de recrutas, que alguns
desejam, em unidades de instrução para o interior do país e unidades para a utilização
em fronteiras. Ardant du Picq combateu longamente esse último processo, então já
posto em uso, o que prova que muitas inovações projetadas já foram tentadas no
passado, muitas vezes com insucesso.
Mas, se deve respeitar os laços orgânicos e utilizar grupadas as diversas
unidades não se seguem que as usemos da mesma forma, nem que não se deva ter na
maior conta as qualidades e os defeitos particulares dos que as comandam, para a
escolha das diversas missões. Esse é até um dos principais encargos do comando. Deve
conhecer a fundo seus subordinados imediatos (esses farão o mesmo com seus
subordinados) , saber o que podem dar e qual a melhor maneira de lhes apresentar
ordens. Nem todos tem ao mesmo tempo a juventude e o entusiasmo, a reflexão e a
ponderação, a intuição, a elasticidade para se adaptar durante a ação, a experiência
confirmada, o meticuloso método de preparação e o dom de aparar o golpe imprevisto.
Entretanto nós os julgamos todos bons oficiais, pois no caso contrario seria preciso
substituí-los. Mesmo bons, quase completos, nunca são perfeitos. E quando, antes de
uma operação. O chefe faz, como é seu dever o inventario dos meios, não basta pensar
em um reforço ao seu efetivo, é preciso uma penetrante analise dos meios psicológicos e
de sua possível adaptação. Quase se poderia dizer que a partir de certo escalão elevado,
o comando consiste essencialmente em uma decomposição de tarefas, consecutiva
determinação de missões simples e escolha dos chefes que serão encarregados, com
suas unidades, acrescidas ou não de meios suplementares, judiciosamente dosados. A
permanência da direção no alto escalão e as intervenções no correr da ação,
naturalmente serão asseguradas pela atuação da reserva.
119

Sob esse ponto de vista há, às vezes, erros de escolha. Assim, nem sempre é bom
entregar à melhor tropa, a tarefa mais dura e mais difícil. O emprego ao inverso
corresponde frequentemente à aplicação do principio essencial da tática de guerra, como
da de esgrima: a ação do forte no ponto fraco. E se assegurará muitas vezes, pela
adaptação do meio de ação mais poderoso ao encargo mais fácil, um êxito certo e rápido
que acarretará o sucesso conjunto. Nem sempre é indicado, do mesmo modo, empenhar
o chefe mais ativo e a tropa mais apta às ações penetrantes, nas tarefas iniciais de
penetração no dispositivo inimigo. Tais ações são geralmente preparadas mais em
detalhe e mais fortemente apoiadas por maiores meios de fogo. As missões de reserva,
ao contrario, pedem frequente vezes maior impulsão natural e mais ardor para agir
depressa e violentamente.
Enfim, na arte militar como nos exercícios de esgrima, não é possível medir toda
gente pelo mesmo molde; nem mesmo se pode querer encontrar em cada um todas as
qualidades. É necessário explorar, principalmente, as disposições naturais, até mesmo os
defeitos, para transforma-los, se possível em qualidades especiais e utilizar, de cada um,
o que faz melhor, pois isso corresponderá a seus instintos primitivos. Assim, é
recomendável empregar os atiradores marroquinos em primeiro escalão nos ataques em
montanha e os legionários, fechando a retaguarda nos movimentos retrógrados.
Isso nos leva a comparar os diferentes recrutas e os diversos contingentes.
Os homens de cada província francesa têm qualidades e defeitos que lhes são
próprios ou, mais exatamente, que lhes são mais naturais; todos os meridionais, por
exemplo, não são idênticos e o mesmo podemos dizer dos alsacianos. Mas, no conjunto,
para o estudo de que nos ocupamos, é mister julgar vantajosamente com os caracteres
gerais.
Assim é que os meridionais são realmente de índole mais fáceis, mais vibrantes,
mais sensíveis à amabilidade e aos apelos ao amor próprio e, por natureza, menos
asseiados, trabalhadores, disciplinados, escravos da rotina do os alsacionos e os naturais
do leste. Os parisienses não são mais nervosos, mais inteligentes, mais desenvoltos,
mais tratados e menos resistentes à chuva, a desmoralização, menos resignados e menos
fáceis de comandar que os bretões. E assim por diante. A melhor tropa de infantaria
francesa é, certamente, uma mistura de homens de diversas províncias. Cada um da ou
pode dar ao conjunto, um pouco de suas qualidades e permite um emprego mais variado
e mais eficaz de dons diferentes que põe o melhor cada qual em seu lugar e da ao todo,
o rendimento infinitamente superior. Sem duvidas, o recrutamento regional, - o seu
inverso-, por razões contraditórias e alternadamente tomadas em consideração, atende as
facilidades de transporte para mobilização e a inconvenientes locais: não se saberia
descuidar os argumentos. Mas a mistura dos recrutas nos corpos, a experiência da
guerra o provou, por certo que da a melhor composição e a matéria prima psicológica
mais favorável.
Quando se faz um estudo semelhante, sobre as diferentes raças arregimentadas
do exercito francês deve ser levado a considerar mais seriamente, ainda, a questão, por
isso que as qualidades e os defeitos são tão ainda muito mais marcantes: legionários,
negros, argelinos, marroquinos, etc... Levar-nos-ia muito longe o tentar definir, mesmo a
pena sob os pontos de vista militar e guerreiro, as características essenciais das raças
120

utilizadas no exercito francês. Pode-se dizer, apenas disso, continuando, que mal grado
as profundas, as consideráveis diferenças desse material humano de todas as cores, cada
uma dessas tropas de infantaria, seja sua origem e sua cor, constitui massa psicológica
muito comparável a sua vizinha, equivale-se moralmente, procura melhorar e se orienta
pelos mesmos princípios - aqueles que aspiramos estudar. Uma demonstração
extremamente surpreendente do acerto dessa afirmativa é dada pela prática do comando
da legião. Não é possível imaginar-se um conjunto – terrestre- menos homogêneo
inicialmente. Dele se faz – e pelos métodos psicológicos do comando que são bons para
os recrutas franceses – uma das tropas que tem mais acentuada espírito de corpo e das
mais unidas.
É verdade, entretanto, que sem se expor a uma má utilização da tropa e a sérios
desenganos não se deve negligenciar as diferenças existentes entre os contingentes
como entre as raças. Sem entrar aqui em pormenores das missões que tais ou quais
tropas teriam melhor êxito, por mais rápidas, pode-se dizer, não certamente no interior
dos corpos, - qualquer processo de incluir, por exemplo, alguns condutores indígenas
em alguns regimentos franceses, da bons resultados, - mas no interior das colunas, a
mistura de contingentes é indispensável. Fixava-se até, antigamente, em Marrocos, a
proporção de elementos brancos e indígenas a respeitar.
Quando se emprega a infantaria em grandes efetivos, divisões, por exemplo, o
melhor processo consiste, certamente, em juntar regimentos inteiramente brancos e
inteiramente constituídos de indígenas. Mas, quando reduzido os efetivos e a limitada
importância das missões coloniais forçam o emprego de uma unidade de pequeno
numero, pode-se e deve-se, para assegurar a indispensável dosagem de elementos
brancos e indígenas, reunir em formação de marcha, nas colunas de marcha como se diz
geralmente, batalhões de corpos e de raças diferentes. O processo foi muito empregado
em Marrocos, foi até exagerado mas merece ser anotado. Foi essa a exceção de que falei
anteriormente, sem que se possa, entretanto, dissimular os inconvenientes que advirão,
sob o ponto de vista de organização interna, já que sob o ponto de vista do espírito de
corpo os prejuízos não serão muito grandes, pois o contacto aproximado de varias
subdivisões de armas diversas ou de diversas tropas de infantaria estimula e exalta o
orgulho particular de cada uma delas. Quando esse emprego da infantaria se prolonga
chega-se, quase obrigatoriamente, a constituição de certos batalhões que tomam
individualidade própria, um pouco diferente da do regimento de origem.
Deixemos esses empregos excepcionais da infantaria, para voltarmos aos
problemas que decorrem de sua utilização normal, integradas as divisões com seus
regimentos orgânicos. Quando a guerra se estabiliza e se prolonga, quando os esforços
exigidos são terríveis e custam pesadas perdas, não se pode utilizar até a destruição
completa os infantes empenhados. Deve-se prever e organizar as substituições em curso
de batalha. O assunto se reduz apenas em saber quando substituir a tropa.
A primeira consideração ter em conta é referente à missão dada à tropa. Vimos
que uma tropa de infantaria dará com mais coração e com mais rapidez o esforço
solicitado se este for limitado no espaço, se lhe disser: “Conquistai tais objetivos. Feito
isso, sereis substituídos.” Sem duvida que, nesse caso, a promessa deve ser mantida e a
substituição deve seguir o mais cedo possível a conquista dos objetivos prescritos.
121

A segunda consideração a ponderar é referente às perdas. Tendo sofrido uma


certa percentagem de baixas, uma dada unidade não tem mais organização suficiente.
Não tem mais que o nome da tropa que é encarregada de representar. Um batalhão de
cem homens é sempre um batalhão, mas não é utilizável como batalhão. Não bastaria
juntá-lo, fundi-lo a um outro batalhão, pois já vimos os graves inconvenientes desse
procedimento. O que ser deve fazer é retira-lo para retaguarda, reconstituí-lo e dar-lhe,
recompletando-o, um efetivo aceitável.
Mas não é apenas quanto ao numero de homens que se tem que considerar. Uma
unidade de infantaria que esteja sensivelmente diminuída em seus efetivos, ou que
acabe de passar por uma prova excessivamente forte, terá perdido muito do seu valor
moral de conjunto. É mais vantajoso retira-la um pouco mais cedo do fogo que usa-la
até o esgotamento, pois ela se recuperará mais depressa se for retirada em tempo. Se
tem, por exemplo, três unidades para empregar sucessivamente na mesma parte da
frente, prolongaremos a duração total da utilização dessas unidades substituindo-as
algumas vezes do que só o fazendo quando cada uma delas chegar ao limite de sua
resistência. Não é possível dar números, nem fixar o simples imutáveis. Isso dependerá
da tropa e das missões que lhes couberem. Nas tarefas secundarias pode se empregar
tropas mais usadas; por outro lado, certas tropas são capazes de suportar perdas mais
severas do que outras, sem deixar de ser eficazmente utilizadas. Mas, sob esse ultimo
ponto de vista, deve-se estar escrupulosamente atento para o não exaurir suas melhores-
tropa. Aqui como sempre, é principalmente aos melhores que se deve poupar,
inicialmente por medida de justiça e para encorajar a qualidade e depois por um bem
compreendido sentimento de interesse geral, tendo em vista o futuro.
Não se pode negar que há tropas de qualidades diferentes. É, já vimos no
capitulo II, para muitos, uma questão dos comandos a questão diretamente
subordinadas. Mas é também resultado da ação de chefes de escalão superior, que
encorajam o espírito de corpo e exploram os sentimentos coletivos pela emulação.
Será preciso, indo mais longe neste assunto, criar, na organização do exercito,
tropas de elite? O assunto já foi discutido inclusive por espíritos eminentes e muito
sugestivos encontrar entre os que já cogitaram dele uma autoridade tão grande na
matéria, quanto o coronel Ardant du Picq. Ele não se arreceia de pedir a abolição dos
caçadores, de atacar o próprio principio das tropas de elite. “De como a infantaria se
torna mais forte com a supressão de caçadores e de companhias de elite e seus oficiais,
mais altivos”, tal é o titulo de um dos capítulos do seu admirável livro sobre o combate.
O essencial dos seus argumentos está contido nas três afirmativas seguintes:
1º. – Não se tem razão em reservar para algumas tropas o melhor
armamento ( na ocasião em que ele escreveu isso somente os caçadores
tinha fuzis, cujas qualidades e características balísticas eram superiores
às das outras armas em uso ), pois que seria mais vantajoso dotar com
tais armas todas as unidades .
2º –Tirar-se o que há de melhor em todas as unidades para formas as tropas
de elite com elementos escolhidos, não deixando para outras senão as
sobras.
122

3º – Enfim, pelo prestigio que se da às tropas de elite, humilha se as tropas


vizinhas , nas quais se diminuir , consequentemente , o orgulho , a
ambição de realizar algo e o rendimento na ação.

Parece que se pode aceitar as duas primeiras censuras e fazer de modo tal que
sejam suprimidos os inconvenientes assinalados. Não há razões, efetivamente, se tem
quantidade suficiente de um armamento mais aperfeiçoado, para privar dele quem quer
que seja. A unificação do armamento, é coisa que já foi realizada, há muito tempo, no
Exército Francês. Se ainda há, com frequência, armas mais recentes confiadas a
algumas tropas, trata-se de medida momentânea, que visa preparar a adoção definitiva
de um armamento novo. E elas não são confiadas a certas tropas presumidamente
melhores , de preferência pela tropa, porque é precisamente o emprego pelo menos
capazes que faz melhor ressaltar as imperfeições práticas, aquelas que o faz melhor
ressaltar as imperfeições práticas, aquelas que os centros de estudo e de fabricação não
podem relevar as suas experiência.
Relativamente à segunda censura também já se faz, e se deve continuar a fazer,
a distribuição dos homens sem reservar os melhores recrutas, os mais robustos, os
oficiais mais capazes, para certos corpos, privando os outros, sistematicamente desses
bons elementos. O contrário seria estabelecer para estes corpos uma lamentável
inferioridade inicial. Vimos a vantagem de misturar os recrutas, não escapará a ninguém
que aquela conduta de misturar os recrutas. Não escapará a ninguém que aquela conduta
geraria, a priori, bastantes dificuldades para os corpos desfavorecidos alcançarem o
indispensável orgulho coletivo, a crença fecunda em uma possível superioridade sobre
os vizinhos, bases do espírito de corpo e da aquisição de uma superioridade real.
E sendo assim não cairia por terra, também, a terceira censura? Quem poderia
pretender tornar orgulhoso um corpo de oficiais ao qual não se tivesse dado nenhum dos
meios para ter uma tropa tão boa quanto a vizinha ?
Mas, feitas essas restrições e respeitado o princípio da igualdade de armamento
e de recrutamento, porque privar-se das vantagens imensas de uma emulação fecunda,
por que renunciar a uma aspiração geral de igualdade pela mediocridade, sob todos os
aspectos tão nefasta? Que se outorguem nomes diferentes de todos os corpos, distintivos
de uniforme no maior numero possível. Tenha cada unidade o direito de usar um sinal
definidor da superioridade conquistada, justificado por uma reputação e um prestigio
superiores, pelo brilho de seu passado, pela projeção de suas façanhas pela maior
aptidão para sofrer, pela mais firme vontade no sacrifício. Ninguém pode ter inveja
daquilo que poderá ter quando merecer, igualando ou ultrapassando em méritos outras
tropas. Desse modo se concedera, justamente, uma especial estima a todas as tropas que
a mereçam e que serão qualificadas como tropas de elite.
Os fatos provaram, alias, que a qualificação de tropa de elite não é apanágio de
nenhum uniforme, e ninguém, finda a guerra, ousaria discutir o valor e classificação
como tropa de elite de tais e quais Regimentos de Infantaria. A feurregere (distintivo)
vermelha foi distribuída, indiferentemente, aqueles que a merecem e, o que é ainda mais
convincente, a escolha para as missões mais difíceis, mais perigosas, mais duras, não
caía sempre sobre os uniformes azuis escuros ou os uniformes cáquis.
123

E, para terminar, o objetivo final a alcançar com o estudo da psicologia da


Infantaria, não é de conseguir um meio de dar ao maior numero as qualidades das tropas
de elite?
124

CONCLUSÃO

Infantaria, mesmo a melhor, nem sempre estará em estado de perfeição. Estará


por vezes nervosa, por vezes desanimada e por vezes, também, errada. Nem sempre
saberíamos evitar-lhe censuras. Não abusemos delas. As criticas repetidas deprimem, a
incompreensão desanima e irrita, e ninguém tem mais necessidade de toda resistência,
de toda energia, do que a infantaria. Para quem tem a alma bem formada e faz tudo o
que pode, da melhor maneira, o elogio justo, a afeição verdadeira e, se possível, a
admiração, são estimulantes incomparáveis, que alentam e impedem a superar-se, para
tornar-se verdadeiramente digno.
Foram, não se pode ter duvida a respeito, a afeição publica, a afeição publica, a
admiração emocionada e enternecida que cercava os infantes que vinham em licença,
que os sustentaram e os puseram a altura de suas incríveis façanhas, durante a guerra.
Para dar uma ideia dos sentimentos dessa época, não se pode encontrar nada
melhor do que citar os versos que vão a seguir. Estamos já tão longe desses
acontecimentos, mesmo pela lembrança, que seus termos parecerão exaltados. Na época
eles eram ditos e ouvidos com fervor. Vamos revê-los. O titulo é “ A volta” e seu ator é
Lucien Boyer!

A VOLTA
A guerra terminara e Deus, do céu no alto, Entre astros de ouro que qual faróis
brilhavam Ouviu sons de fanfarras, vozes que clamavam,
E hurras vindos de Douvres a Tsing-Tao.

____________________
¹ - Seria muito mais interessante apresentar com rima e metro e meio os belos versos de Lucien
Boyer, mas, não sendo poeta, lamentara que tenha sido vã a tentativa que fizemos e que aqui apresentarão
(NT).
125

“Que ruídos são esses que perturbam assim


A paz celestial;”. “ Senhor, na terra passam
As Forças Aliadas. Vitoriosas, marcham
Sob o arco do triunfo. A paz voltou, enfim!”

Através do azul puríssimo um zum-zum correu.


A turba dos eleitos que estivera calma,
Anciosa por premiar esses heróis com palmas,
Em massa se lançou sobre os balcões do céu.

São Pedro, torcendo sua barba de profeta,


Febril, trepidando como um velho guerreiro,
Bradou: “Que venha cá Flambeau, o granadeiro;
Ele nos explicará os detalhes da festa”.

Flambeou avançou, garboso como em Schoeembrun:


“Isso eu conheço ,disse, a gloria militar!
Os belos regimentos que vão desfilar
Eu os vou nomear, Senhores, um por um!”

Subia lá da terra um ruído cascateante:


“Passam os hussardos, os dragões. Cavalaria!
Disse Flambeau. E o céu sem macula tremia
Com os fortes aplausos do povo delirante.

“Isso não é nada, disse Flambeau. Ficai atentos!


Olhai a Artilharia!” Os clarins que tocavam,
Calaram-se ante os hurras que mais semelhavam
Rajadas festivas buscando o firmamento!

“Isso não é nada”, disse Flambeau. “Vereis melhor! Passam agora a


Engenharia e os Aviadores
Porem entre o trepidar bravio dos motores!”
Cobre os ouvidos, dos aplausos, o Senhor!

Flambeau debruça-se e aponta: “A Marinha!”


126

Desta vez o vasto clamor agitou os mundos!


O sol festeja os nautas com raios profundos
Que a esquadra vão beijar, dos mares a rainha!

“Isso não é nada”, diz, “vereis a Infantaria


Quando passar! Espero não se rache o céu!
Será torrencial, e inaudito, Deus meu!”
E Flambeau, comovido, esérava e sorria.

E eis que de repente, após as ovações


Todos viram avançar os homens das trincheiras,
Os que a terra e as raízes beijaram, inteiras,
Quando as “minenwerfers” iam às destruições!

São Lignars, Zuavos, Alpinos, Caçadores...


Mar de singelos capacetes, que deslisa...
Ouvem-se gritos de vitória e após, so a brisa...
Silencia...De Flambeau as faces perdem as cores

E ante tanta ingratidão exclama irado:


“Esta bem! Por vós eles desafiaram a morte,
Sofreram fome e frio! Vossa vida e sorte,
Vossa felicidade atual, foi bem negado

Aos que lutaram, longos anos... Mas ficais,


Na hora em que devíeis abrir-lhes os braços,
Mudos, tristes e quedos. Esperar abraço
E gratidão, franceses, não era demais!”

Apenas dessa frase os ecos terminavam


Quando extasiados olhou a terra dadivosa:
No ouro fascinante da estrada radiosa,
Como semi-deuses, Poilus avançavam!

Brilhavam os capacetes, varados e velhos!


“Somos a própria França!” seu olhar dizia.
E ante esses heróis, ante essa infantaria,
O povo agradecido estava de joelhos!

Magnífica homenagem, exagerada, certamente e na qual não se poderia, nem


mesmo, observar a graduação na admiração das diferentes Armas. Não se veja nela mais
que a intenção, a expressão de um reconhecimento infinito que desejaria se igualar a
grandeza, repetição, a importância vital dos sacrifícios dessa Arma obscura –
127

aristocracia do sofrimento – da qual depende, mais ainda do que todas as outras, o


próprio destino da Pátria.
A Infantaria não quer, seguramente, genuflexão. Sabe que isso é demasiado. Mas
precisa de afeição. Será pedir muito?
A Infantaria é aquela que sofre mais que as outras, é quem vive mais
intensamente e mais duramente... é quem morre, sobretudo!

É preciso amar a Infantaria


Ela o merece.
E só aqueles que a estimam podem compreende-la bem comanda-lá!
128

ÍNDICE

Noticia sobre o autor ..................................................................................................... 8


Introdução..................................................................................................................... 9

PRIMEIRA PARTE

A TROPA

Psicologia da tropa – Psicologia do campo de batalha

CAPITULO I

Características da psicologia da infantaria - nem a psicologia individual nem a psicologia geral das
massas- a infantaria é massa particular por sua composição, pelos sofrimentos e perigos obrigatórios a
que se destina, por sua finalidade de destruição metódica e por seu armamento- traços característicos que
decorrem dessas particularidades .......................................................................................................... 11

CAPITULO II

Como melhorar o valor moral da tropa de infantaria- treinamento físico e cuidadosa instrução militar
influem sobre a disciplina moral- a robustez física e a distinção no trajar geram, muitas vexes a robustez e
a distinção morais -o espírito de corpo -cerimônia militar - conseguir bom êxito .................................... 19

CAPITULO III

O comando de uma boa infantaria-apelo ao amor próprio - pedir o mais difícil -recompensar com
inteligência-nunca esquecer de poupar particularmente os melhores ...................................................... 25

CAPITULO IV

Emprego de uma infantaria medíocre - missões relativamente fáceis - fazer com que tenha facilidades e
com menor perigo compreenda que desempenhar bem a missão, é mais vantajoso do que fazê-lo mal -
procurar das primeiras felicitações justas- reanimar o amor próprio- as sanções- perigos da rebelião e do
fracasso coletivo- antes de tudo, dissociar a solidariedade na indisciplina .............................................. 29

CAPITULO V

Psicologia do campo de batalha- o ataque da infantaria- vencer é quebrar a vontade do inimigo e agir
sobre sua alma- é preciso conhecer sua psicologia no campo de batalha- o momento de derrota é o da
fraqueza moral- o assalto, meio de decisão essencialmente psicológico- a surpresa- no caso de preparação
de artilharia, há um crescendo nas manifestações de poder- o desbordamento- a inundação humana- uma
boa tropa, no ataque, não foge nunca ao comando de seus chefes imediatos, mesmo no momento
derradeiro- fisionomia do ataque de infantaria em 1918 ......................................................................... 33
129

CAPITULO VI

Psicologia do campo de batalha- a defesa da infantaria- boatos do campo de batalha- o exagero- o


contagio do medo- as informações sobre o ataque inimigo iminente, fornecidas pelos desertores da noite
precede- a vontade de resistir e a coesão psicológica são as principais forcas morais da defesa- os vazios
da linha de defesa- apesar das destruições e do avanço inimigo, convém esforçar-se continuamente por
reestabelecer a ordem e a confiança na defesa de ressoldar as partes separadas do conjunto defensivo-
fisionomia da defesa da infantaria (verdum, 1916)................................................................................. 45

CAPITULO VII

A ação psicológica sobre a infantaria inimiga- como preparar sua derrocada na batalha- preparação moral
antecipada- a surpresa estratégica, tática e intelectual- as realizações pelas destruições efetivas- a
esperança pelos oferecimentos tentadores em troca de abandono da luta ................................................ 55

SEGUNDA PARTE

OS QUADROS

Suboficiais- Oficiais

CAPITULO VIII

Características da psicologia só suboficial de infantaria- ela difere da dos soldados rasos - senso de
autoridade e das responsabilidades correspondentes- sua atitude nas missões de detalhem na condução de
comboios, nas tarefas de reabastecimento em geral- suboficias burocratas e suboficias de fileira-
abnegação e disciplina- provem de meios modestos, mas são, o que é bem raro, de ambições também
modestas- constantes preocupações de ordem material- rudeza e ate mesmo, a miúdo, servilismo- mas
admirável probidade e absoluto devotamento para com os bons ............................................................. 64

CAPITULO IX

Como formar e melhorar seu quadro de suboficiais- o papel do comandante de corpo- engajamento e
reengajamento- admissões no quadro de graduados de carreira- selecionar e atrais fechando a porta-
estabelecimento de correntes de engajamento vindas de régios escolhidas para obter a melhor dosagem
psicológica, apropriada ao recrutamento dos homens da unidade- regular as promoções- dirigir a preparar
o futuro dos bons graduados- evitar que cessem as promoções e impedir a obstrução dos quadros por
medidas preventivas ............................................................................................................................. 68

CAPITULO X

Como empregar e comandar os suboficiais- interessar-se por sua situação material- aumentar seu valor
intelectual- elevar sua posição social- comanda-los energicamente e claramente- guiá-los- vigilância e
confiança- ordens meticulosas e iniciativas uteis- manter-lhes a autoridade em face dos subordinados-
defende-los, quando for justo , em face das autoridades superiores ou vizinhas- elevar sua situação no pais
e preserva-los de um injusto, e, infelizmente, tradicionalmente descrédito ............................................. 74
130

CAPITULO XI

O oficial de infantaria- origens e meios diferentes- traços característicos de sua psicologia em suas
relações coma tropa, com os camaradas e com os chefes- interessa-se detidamente, por seus homens,
gastar deles e defende, detalhes o exemplo de resignação nas ocasiões difíceis, é um professor de energia-
solidariedade e emulação em presença dos seus iguais- suscetibilidade, espírito critico e devotamento no
trato com seus superiores- velhos e jovens oficias de infantaria ............................................................. 80

CAPITULO XII

O oficial de infantaria na guerra- as qualidades que o fazem obter o êxito- as três espécies de bravura- a
sorte- o oficial de infantaria em guerra deve ser um condutor de homens- diferenças com os condutores
em geral segundo Le Bom- qualidades e meios, de ação, - os elementos de seu prestigio e de
seu valor............................................................................................................................................... 85

CAPITULO XIII

Como comandar o oficial de infantaria e dele obter o melhor rendimento- ter sempre em conta seu valor e
suas suscetibilidades- confiança- nada de mistérios inúteis- consultar a miúdo aqueles que irão executar as
ordens antes de tomar e impor a decisão- manter o prestigio e a posição dos combatentes- não evitar
perigos e fadigas uteis, sob a condição de prevenir com antecedência e glorificar depois- utilizam
daqueles que nas tropas menos boas são capazes- recompensar sem parcimônia e fazer ascender aqueles
que mereçam sem formalismo de antiguidade tendo por mira apenas interesse do exercito ..................... 90

TERCEIRA PARTE

O CHEFE DE INFANTARIA

Qualidades pessoais úteis – Métodos de comando

CAPITULO XIV

Qualidades uteis ao chefe de infantaria- defeitos do bom aluno- qualidade de caráter, de inteligência e de
coração- o passado- a reconhecida bravura pessoal- o aspecto exterior- educação- desinteresse pessoal- há
defeitos que não prejudicam- o dom da intuição- a fama irradiante ........................................................ 97

CAPITULO XV

Métodos de comando- um comandante de infantaria deve antes de tudo fazer a conquista moral da tropa-
demonstrar sua própria afeição- nenhuma demagogia- Render homenagem ao passado das unidades de
que assumam o comando- o importante papel das licenças- pequeno meio uteis- não recear sua tropa- não
recear a tropa nas horas de possível rebelião- permitir tudo o que for possível- ocupar –se pessoalmente
das questões materiais de alimentação e alojamento- mostra que são uteis as exigências os esforços-
recompensarem e castigarem com justiça- o exemplo pessoal .............................................................. 103
131

CAPITULO XVI

Métodos de comando- como manter e aumentar o valor moral de sua unidade de infantaria- como elevar
excepcionalmente esse valor moral no momento de exigir grandes esforços- desenvolver ao máximo o
espírito de corpo- os nomes dos regimentos- distintivos de uniformes- utilizar à emulação- recompensas
individuais e coletivas- as sanções disciplinares- dar caça impiedosa a todos os que sentarem sem motivo
suficiente, fugir ao campo de batalha, é um dever de justiça e a única maneira de conservar os efetivos- a
apalavra que empolga- dar aos homens a ração de amor próprio a que tem direito- manter sempre, e se
possível ultrapassa-las, as promessas de repouso e de recompensa que forem feitas ............................. 110

CAPITULO XVII

Princípios de organização e de emprego da infantaria- permanência da organização elementar e respeito


aos laços orgânicos- escolha dos chefes de acordo com as diferentes missões- repartição dos recrutas e
mistura dos contingentes- as substituições no decurso da operação - considerar a percentagem de perdas e
limitar o esforço ao anteriormente anunciado- a questão das tropas de elite.......................................... 117

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