Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Professor Mario Sergio Cortella diz que para sobreviver num mundo que muda
em grande velocidade é preciso ser capaz de antecipar-se.
Esta reflexão foi feita pelo filósofo e professor Mário Sérgio Cortella, ao falar sobre o tema
“Cenários turbulentos, mudanças velozes: acomodar é perecer”. Na palestra Cortella
mostrou com exemplos divertidos e surpreendentes como o mundo mudou velozmente
nas últimas décadas, ressaltando que não basta constatar as mudanças, é preciso
compreendê-las.
“A velocidade da mudança é tamanha, que cada dia você levanta mais cedo e vai deitar
mais tarde, sempre com a sensação de que está perdendo tempo”, disse Cortella. Nem
bem saímos de um fim de semana, outro já chegou, o Natal está próximo e o ano está
acabando. “Lembra, quando você era criança, como as férias de final de ano demoravam
a passar?”
Hoje tudo é fast, ressaltou o filósofo. O ritmo que essa velocidade imprime à nossa vida
altera o nosso modo de ser, de conhecer e aprender. O horário das aulas foi ultrapassado
pelas mudanças. Cortella explicou que o tempo da aula tradicional – de 50 minutos
durante o dia e 45 à noite – foi fixado no começo do século passado, depois que
psicólogos constataram ser este o tempo limite no qual a criança e o jovem conseguiam
se manter atentos. “Esta pesquisa foi refeita há dois anos e o tempo médio que uma
criança ou um jovem hoje presta atenção em alguma coisa é de seis minutos”, revelou o
filósofo. Isto porque as novas gerações cresceram assistindo a programas infantis de TV
em que os blocos são de seis minutos.
Queremos velocidade na hora de ser atendidos por um médico, mas não queremos
velocidade na consulta. Queremos velocidade na hora de sentar num restaurante para
comer, mas não queremos ter de comer velozmente. Queremos ser atendidos com
presteza pelo call center, mas não queremos usar o tempo que for necessário no
atendimento. “Algumas pessoas se submetem à velocidade como se ela fosse uma
ditadura, e isto acaba estilhaçando uma das coisas mais importantes para a nossa
capacidade de conviver, de aprender e de saber, que é a paciência”, advertiu Cortella.
“A gente não tem mais paciência para cuidar, paciência para aprender. Se o seu
computador demora 20 segundos para abrir um programa, você fica batucando no
teclado”, disse. Por falta de tempo, corremos o risco de perder, por exemplo, a arte de se
tocar piano, pois leva-se em média nove anos para aprender, praticando horas e horas
por dia. E os jovens não têm tempo para isso.
A arrogância é um perigo, pois corremos o risco de liquidar o mais poderoso estoque que
temos, que é o estoque de conhecimento. Este, segundo Mario Cortella, está não apenas
nos livros, mas em todas as pessoas; cada uma tem um tipo de conhecimento. Ele contou
duas histórias para exemplificar a importância do estoque de conhecimento.
Em 1994, quando chegou para palestra numa fábrica em São José dos Campos (SP),
havia um palco fixo e 20 fileiras de 20 cadeiras. Para aproximar as cadeiras do palco, ele
desceu e começou a puxar as cadeiras, uma por uma. Quando estava na quinta cadeira,
alguns operários lhe ofereceram ajuda. Perguntaram se podiam fazer do jeito deles.
Pegaram a última fileira e a puseram na frente. “O que eu estava fazendo era uma
solução, mas não era a melhor, pois consumia mais trabalho e mais tempo. A melhor
solução estava no estoque de conhecimento”, disse Cortella.
A outra história se passou no final dos anos 80, na fábrica paulista de uma das maiores
multinacionais do planeta. Na esteira de aço, no final do processo, vez por outra,
embalava-se uma caixa vazia. Para resolver o problema, dois engenheiros com pós-
doutorado, durante três meses gastaram milhões e chegaram a uma solução genial: um
programa de computador acoplado a uma balança ultra-sensível acusava diferença de
peso toda vez que passava uma caixa vazia; o sistema travava, e um braço hidráulico
rejeitava a embalagem. Depois de 5 meses de funcionamento com sucesso, a empresa
descobriu que o sistema tinha sido desligado pelos operários havia três meses. Eles
explicaram que aquele sistema interrompia o trabalho deles a todo momento, por isso
tinham resolvido o problema do seu jeito. Fizeram uma vaquinha, compraram um
ventilador e o colocaram junto à esteira (na lateral) – quando passava uma caixinha vazia,
o vento a empurrava para fora.
Mais uma vez, a melhor solução estava no estoque de conhecimento.
“Seres humanos são anjos de uma asa só, para voar têm que grudar no outro”, disse
Cortella, citando o escritor italiano Luciano di Crescenzo.
É preciso não cair numa armadilha de confundir idoso com velho, advertiu Cortella. “Idoso
é quem tem bastante idade, velho é o que acha que já sabe, que já está pronto. Velho é
arrogante. Idosa é uma pessoa de 60, 65, 70 anos; velho você pode ser aos 15 anos de
idade, aos vinte, trinta, quarenta, cinqüenta”, explicou. Velho não tem humildade, não
aprende; perece, porque é incapaz de acompanhar a mudança.
Por isso, segundo ele, a regra básica para não perecer é não estar satisfeito.
Mario Sergio Cortella é filósofo, com mestrado e doutorado em Educação pela PUC-SP, na qual é
professor Pós-Graduação em Educação e do Departamento de Teologia e Ciências da Religião,
especialista em geopolítica religiosa. É também professor convidado da Fundação Dom Cabral, em Belo
Horizonte, e consultor organizacional no campo da Ética, Educação e Gestão do Conhecimento.