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Ariclê Vechia
Programa de Pós-Graduação em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná
1MARCONE, N. Gli italiani al brasile. Roma : Tip. Romana, 1877, p.22-24 (trad. livre).
2
1883, foi celebrada a primeira missa, oficializada pelo Vigário de Curitiba, Padre José
Joaquim do Prado.2 Nas demais colônias, ressalvadas algumas peculiaridades, a
reconstrução do modo de vida seguiu o mesmo padrão.
Os colonos, contudo, passaram a solicitar assistência religiosa por parte de
padres italianos. Para atendê-los veio de São Paulo, em 1886, o padre Pedro
Colbacchini, que se tornou o superior dos escalabrinianos no Paraná, com faculdades
especiais concedidas pelo Bispo Diocesano, para casar colonos italianos em qualquer
paróquia em que residissem. O padre Colbacchini fixou residência na colônia Dantas
e a partir daí percorria os vários núcleos italianos da região.
Em 1887, o padre Colbacchini solicitou ao Bispo de São Paulo medidas
para regularizar o atendimento religioso das colônias. Por proposição da Vigaria Geral,
foi constituída uma Capelania Curada Italiana, sendo que, o que estabelecia sua
circunscrição era o número de pessoas domiciliadas nos núcleos e não os limites
territoriais.3 Os titulares da Capelania Curada eram os padres escalabrinianos de
orientação tridentina, acrescida da conotação ultramontana. A crença religiosa era
sustentada por princípios dogmáticos, rígidas normas éticas e tendo como maior
expressão da fé a prática sacramental ministrada pelo clero.4 Esse modelo de
catolicismo marcava de forma indelével as manifestações da vida cultural dos colonos.
Os imigrantes italianos do centro urbano, também passaram a se organizar
do ponto de vista social e cultural. Estabelecidos na cidade em 1878, já no ano de
1883 fundaram a primeira sociedade – Giuseppe Garibaldi – em homenagem ao
grande líder da unificação italiana em 1870. Em 20 de setembro do mesmo ano, os
dirigentes desta Sociedade organizaram uma festa em comemoração à tomada de
Roma. A festa foi uma demonstração pública do amor nutrido pela pátria de origem –
a Itália. A imprensa curitibana registrou o acontecimento.
2BALHANA, Altiva Pilatti. Santa Felicidade: uma paróquia vêneta no Brasil. Curitiba :
Fundação Cultural, 1978, p.29-30.
3Portaria
de 14 de fevereiro de 1888, livro 2, da Vigararia Geral Forense, p.118-123. In:
BALHANA, Altiva Pilatti, op. cit., p.31-32.
preservação dessa identidade e a escola era vista como instrumento de preservação deste
elemento. Esse matiz patriótico era expresso em outras esferas. A primeira associação
fundada recebeu o nome de herói da pátria – Garibaldi e o dia 20 de setembro –
considerado o dia da Unificação Italiana – era sempre efusivamente comemorado.
Para a maioria dos imigrantes italianos agricultores, contudo, o essencial
de sua cultura estava contido na prática da religião, e em torno dessa prática eles
foram, através da memória coletiva, reconstituindo todos aqueles elementos que eles
se recordavam. E, na medida que transportavam para o Brasil a Itália que amavam,
foram esquecendo a Itália real. A Itália que amavam não era a de Vitor Emanuel, nem
a de Garibaldi – a Itália Unificada –, mas os lugarejos onde nasceram. À época da
imigração, a Itália era recém-unificada; o papa havia perdido os Estados Pontifícios e
os católicos estavam revoltados com a situação. Na Itália surgiu o antagonismo entre
italianos e católicos. Ser italiano era ser liberal, subversivo, anti-religioso; ser católico
era ser reacionário, adepto da monarquia absoluta. A maioria dos imigrantes eram
antes de tudo católicos, não podiam ser identificados como italianos. Sua identidade
cultural era a catolicidade e não a italianidade. A preservação da língua e dos
costumes não poderia adquirir um colorido nacionalista.7
Membros da Igreja Católica Romana e intelectuais italianos passaram a se
preocupar com essa questão e com a preservação da identidade cultural dos
imigrantes, surgindo três posições distintas em relação à questão. Grupos de religiosos
defendiam apenas a assistência espiritual aos imigrantes, sem qualquer conotação
política; intelectuais de posição liberal ou anarquista viam na ação da igreja, junto aos
imigrantes, um esforço de impedir sua conscientização política. Para eles o mais
importante era a causa da italianidade sem se preocupar com a fé. Finalmente, a
Congregação de São Carlos, fundada pelo Bispo Scalabrini e a Congregação
Salesiana, buscavam a união da fé com a italianidade. A Cúria Romana não aceitou
essa posição dentro da Itália, por isso Scalabrini procurou insistir no binômio
8AZZI, Riolando. Fé e italianidade: a atuação dos escalabrinianos e dos salesianos junto aos
imigrantes. In: BONI, Luiz S. (org.). A presença italiana no Brasil. v.1, Porto Alegre : EST, 1990,
p.63-85.
“[...] a nossa sociedade que tem por fim a beneficência não podia deixar de
pensar na fundação de uma escola que desse aos nossos filhos a instrução tão
necessária para o progresso dos povos – a beneficência, senhores, não
consiste somente em distribuir pão aos que caem na indigência, mas, também
18VECHIA, Ariclê. imigração e educação em Curitiba: 1853-1889. São Paulo, 1998. Tese
(Doutorado) - USP. p.316-320.
“Entre os nossos, existem aqueles que aqui foram trazidos pelo demônio.
Destes, sofri e sofro perseguições de toda espécie. Combati e venci o
agente consular, Sr. Ernesto Guaita, que num discurso público designava-
se como ave notívaga e perigosa para Curitiba. Saíram diversos artigos no
jornal e, por fim, impôs-se a Guaita de deixar, e mais tarde perder o cargo
oficial que ocupava. Agora aqui e ali existem aqueles que me querem
morto, ou porque lhes tirei a concubina, ou porque avisei a polícia das
perturbações que traziam a certos colonos”.20
21Id, ibid.