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Material de Apoio – Leitura Necessária e Obrigatória

Teologia de Umbanda Sagrada – EAD – Curso Virtual


Ministrado por Alexandre Cumino

Texto 015

Ciência de Umbanda – Uma Religião Brasileira


por Alexandre Cumino

Este texto abaixo é parte integrante do livro História da Umbanda. São fragmentos editados livremente a
partir do original para dar sentido num texto simples, curto e direto.
Os primeiros estudiosos a se dedicarem à Umbanda se deram no campo da Sociologia e Antropologia,
partiram, a princípio, da cultura negra para a Umbanda.
Pioneiros, como Arthur Ramos, Edison Carneiro e Roger Bastide, já estudavam as expressões religiosas
afro-brasileiras e passaram a estudar a Umbanda por meio das semelhanças entre elas. Roger Bastide chegou a
entender como uma traição a Umbanda enquanto “embranquecimento” da cultura negra, afinal ele vai
caracterizá-la mais como uma “revalorização” da macumba carioca. Embora tivessem uma “visão de fora” para
a religião de Umbanda traziam uma “visão de dentro” dos próprios estudos sobre os Cultos de Matriz Africana.
Roger Bastide muda sua opinião de forma tardia reconhecendo a Umbanda como religião Brasileira. Digo
tardia, pois suas teses e obras principais já haviam sido publicadas, no entanto passa a um de seus
continuadores, Renato Ortiz, as novas considerações do reconhecimento da Umbanda enquanto Religião
Brasileira, retirando o peso da suposta traição, do “negro que quer ser branco” ou da apropriação, por parte
do branco, de uma cultura negra. Neste ínterim, aparece Candido Procópio Ferreira de Camargo que vinha
estudando o Espiritismo e fez o mesmo procedimento com outro ponto de vista, agora ele veria a umbanda a
partir do kardecismo englobando ambas as vertentes como Religiões Mediúnicas e parte de um único
“continuum mediúnico”.
Mais recentemente veremos Maria Vilas Boas Concone reconhecendo a Umbanda como Religião Brasileira,
e a partir dela e de Renato Ortiz fica clara a identidade nacional da Umbanda, o que se soma às contribuições
únicas de Diana Brow, Lísias Nogueira Negrão, Patrícia Birman e Zélia Seiblitz, principais estudiosos da
Umbanda no contexto antropológico e sociológico.
São anos de estudo e aplicação do método científico para chegar a estas conclusões, onde cada um dos
cientistas leu e releu, estudou e se aprofundou nas obras de seus antecessores. Além de todo o aporte teórico
e de base para cada uma de suas ciências vamos encontrar pesquisas de campo e estatísticas que revelam fatos
interessantes quando observados sob o olhar de fora.
Renato Ortiz, sociólogo, iniciou suas pesquisas sobre Umbanda em 1972, concluindo-as com sua tese de
doutorado em 1975, Paris, com orientação do Mestre Roger Bastide. Desta tese resultou o livro A Morte Branca
do Feiticeiro Negro. O trabalho foi realizado em duas partes, uma de seminários e outra em campo, fazendo
um período de um ano de pesquisas no Rio e em São Paulo. E justifica a escolha destes dois Estados, onde
escolheu “o Rio porque é o lugar histórico de nascimento da religião umbandista; São Paulo por ser a região
onde o movimento religioso se desenvolve hoje mais intensamente”.
Ortiz dedica este trabalho única e exclusivamente à Umbanda, não parte do Afro para a Umbanda, nem
do Kardecismo para Umbanda. Em sua obra a Umbanda vai além de um sincretismo para se autoafirmar como
uma síntese do povo brasileiro. A Umbanda é Brasileira e esta é uma conclusão construída com o rigor do
método cientifico, ou seja, o seu trabalho é a continuidade e a conclusão de todos que o antecederam, pois
assim se constrói o conhecimento científico. Vejamos sentimentos, pensamentos e palavras de Renato Ortiz
que calam fundo na alma que busca a neutralidade do trabalho científico sem perder o amor pelo objeto do
estudo:
“O objetivo de nosso trabalho é mostrar como se efetua a integração e a legitimação da religião
umbandista no seio da sociedade brasileira [...]
[...] Constataremos assim que o nascimento da religião umbandista coincide justamente com a
consolidação de uma sociedade urbano-industrial e de classes...
[...] A sociedade global aparece então como modelo de valores, e modelo da própria estrutura religiosa
umbandista...
[...] Visto que nossa tese coloca o problema da integração da religião umbandista na sociedade
brasileira, pareceu-nos interessante comparar a Umbanda com as práticas do Candomblé... Com efeito, pode-
se opor Umbanda e Candomblé como se fossem dois polos: um representando o Brasil, o outro a África. A
Umbanda corresponde à integração das práticas afro-brasileiras na moderna sociedade brasileira; o Candomblé
significaria justamente o contrário, isto é, a conservação da memória coletiva africana no solo brasileiro... O
que nos parece importante é sublinhar que para o Candomblé a África conota a ideia de terra-Mãe,
significando um retorno nostálgico a um passado negro. Sob este ponto de vista a Umbanda difere
radicalmente dos cultos afro-brasileiros; ela tem consciência de sua brasilidade, ela se quer brasileira. A
Umbanda aparece desta forma como uma religião nacional que se opõe às religiões de importação:
protestantismo, catolicismo, e kardecismo. Não nos encontramos mais na presença de um sincretismo afro-
brasileiro, mas diante de uma síntese brasileira, de uma religião endógena.
Neste sentido divergimos da análise feita por Roger Bastide em seu livro As Religiões Africanas no Brasil,
onde ele considera a Umbanda como uma religião negra, resultante da integração do homem de cor na
sociedade brasileira. É necessário, porém, assinalar que o pensamento de Roger Bastide havia
consideravelmente evoluído nestes últimos anos. Já em 1972 ele insiste sobre o caráter nacional da
Umbanda... Entretanto, depois de sua última viagem ao Brasil, seu julgamento torna-se mais claro; opondo
Umbanda, macumba e Candomblé, ele dirá: ‘o Candomblé e a Macumba são considerados e se consideram
como religiões africanas. Já o espiritismo de Umbanda se considera uma religião nacional do Brasil. A grande
maioria dos chefes das tendas são mulatos ou brancos de classe média...’. O caráter de síntese e de
brasilidade da Umbanda é desta forma confirmado e reforçado.”
Com este trabalho de Renato Ortiz, o olhar sociológico sobre a Umbanda fecha um ciclo que começa com
sua gestação, passando por seu desenvolvimento e identificação como uma Religião Brasileira. O fato de Ortiz
ter trabalhado em conjunto com Bastide nos passa um valor real de continuidade e capacidade em rever
“velhos” paradigmas.
Definir Umbanda é definir algo vivo e em movimento, é como querer definir o que é o “ser” em toda a
sua complexidade.
Segundo Roger Bastide” nos encontramos em presença de uma religião a pique de nascer, mas que ainda
não descobriu suas formas.”1 É certo que Bastide faz esta afirmação no final da década de 50, sob uma
perspectiva dos Cultos Afro-Brasileiros.
Lísias Nogueira Negrão afirma que:
“...a identidade umbandista faz-se e refaz-se em função das demandas de diferenciação e legitimação,
apresentando-se de forma eminentemente dinâmica e compósita.”2
Hoje a Umbanda se encontra melhor estruturada, no entanto, podemos dizer que ela mantém as
características de:
Religião ainda em formação (Roger Bastide), heterodoxa (Diane Brown), dinâmica e sobretudo
multiforme, um sistema religioso estruturalmente aberto (Lísias Nogueira Negrão) e diverso, no qual se
encontra uma certa unidade na diversidade3 (Patrícia Birman).
Em tempo, um fenômeno isolado não é Umbanda; Umbanda é Religião, portanto existe dentro de um
contexto histórico, geográfico, social e antropológico.
Podemos dizer, num ponto de vista teológico, que Umbanda pertence a Deus e aos Orixás, quando
pudermos definir Deus então, só neste dia, definiremos com precisão o que é Umbanda.

1
BASTIDE, 1971, p.441
2
Negrão, 1996 p. 170
3
BIRMAN, 1985. p. 26

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