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Resumo:
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Governança eleitoral: incentivos institucionais e competição partidária 1.
1. Introdução
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Este trabalho contém resultados parciais do projeto de pesquisa “Indicadores de Governança
Eleitoral: um estudo metodológico”, em andamento com auxílio do CNPq.
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eleitoral, por exemplo. Os órgãos encarregados de administrar os processos
eleitorais, os canais de solução de conflitos, as regras sobre elegibilidade,
sobre elaboração legislativa, sobre financiamento e recrutamento partidário,
todos estes aspectos são institucionais e produzem incentivos específicos ao
comportamento dos partidos e dos eleitores.
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“Electoral governance is the wider set of activities that creates and
maintains the broad institutional framework in which voting and
electoral competition take place.”
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No texto que formaliza pela primeira vez o conceito de governança eleitoral,
Mozaffar e Schedler (2002) apontam para os desafios a serem enfrentados no
seu estudo e identificam as seis dimensões nas quais as escolhas institucionais
dos países a respeito da governança eleitoral devem ser analisadas:
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legitimação dos processos eleitorais pela oposição é um elemento crucial da
governança eleitoral.
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Assim, várias organizações passaram a acompanhar os processos eleitorais
através do mundo e graças a isto a ciência política dispõe hoje de bancos de
dados muito ricos, tais como os do IDEA, a da Freedom House, entre outros.
Uma das vertentes mais profícuas destes estudos é a que compara os EMB
(Electoral Management Boards) entre diferentes países. Responsáveis pela
legitimação das autoridades políticas e pela definição inequívoca de
ganhadores e perdedores nas disputas eleitorais, estes órgãos acabam sendo
responsáveis também pela produção da confiança na opinião pública e em
última instância, pela própria credibilidade e legitimidade das eleições. A forma
como operam, seu desempenho na gestão dos processos eleitorais e sua
independência afetam as reações dos atores, sua propensão a aceitar
resultados adversos e o apoio ao sistema e às regras do jogo em geral. (Monte
2011).
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No Brasil, o caso da fraude nas eleições de 1994 no Rio de Janeiro é sempre lembrado como
exemplo da importância das rotinas operacionais para a legalidade das eleições.
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democracia, especialmente na América Latina, África e Leste europeu. (Way
and Levitsky 2002).
A importância dos EMB fica mais visível quando eles não funcionam a
contento, ou seja, em casos de fraude ou outras formas de delitos ou
transgressões eleitorais. Onde denúncias de favorecimento de candidatos do
governo ou de cerceamento da oposição são frequentes, por exemplo, os
atores políticos incorporam esta informação como um dado do sistema com o
qual devem interagir. Se o ambiente eleitoral não é competitivo, os partidos de
oposição não têm incentivos para investir em atividades eleitorais.
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relacionadas com o funcionamento dos sistemas partidários. Muito além do
EMB e do próprio sistema eleitoral, os processos de educação para eleições, os
procedimentos de cadastramento de eleitores, a complexidade do ato de votar
e a regulação das campanhas são, entre outros aspectos, institutos próprios da
governança eleitoral que afetam diretamente a atuação dos partidos.
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Quadro 1: Incentivos à competição partidária conforme dimensões e funções de governança eleitoral:
Dimensão
Produção de decisões
Eficiência da gestão Prevenção de fraudes Garantia de direitos
legítimas
Burocratização: caráter reduz erros por aumenta accountability impessoalidade dos complexidade dos
permanente da comissão eleitoral inexperiência e por identificação dos procedimentos favorece processos pode atrasar
e do aparato burocrático improvisação responsáveis aceitação dos resultados provimento de direitos
rotinas próprias e
Independência: ausência de autonomia favorecem aumenta confiança na aumenta confiança na aumenta confiança na
vínculo com o executivo agilidade dos neutralidade neutralidade neutralidade
processos
separação de expertise favorece divisão de tarefas
Especialização: separação entre beneficia-se da confiança
competências favorece detecção de facilita canalização de
as funções administrativa e judicial no judiciário
o desempenho irregularidades demandas
Delegação: tarefas e poder de evita favorecimentos
afasta atores
indicar membros da comissão reduz impasses por aumenta confiança na partidários e
interessados do
eleitoral a cargo de órgãos não embates partidários imparcialidade cerceamento de
processo decisório
partidários opositores
Regulação: grau de limitação da risco de ineficiência, limita discricionariedade beneficia-se da maior reduz oportunidades de
discricionariedade dos agentes morosidade e rigidez dos agentes conhecimento prévio das decisões ad hoc
pelos principais, através de regras do jogo
restrições formais
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Uma configuração que produz incentivos à competição eleitoral, em alternativa
a outras estratégias de oposição3, teria, por exemplo, uma gestão centralizada,
com comissões e burocracia permanentes, independentes do executivo e não
partidárias, além de uma detalhada regulamentação e da divisão das tarefas
administrativas e judiciais entre autoridades diferentes. Já a produção da
confiança geral no sistema seria favorecida por desenhos mais eficientes e
ágeis, para os quais a descentralização pode ser uma boa opção.
0 0,5 1,0
Dimensão
(ausente) (parcial) (plena)
eleições organizadas
as eleições são por EMB locais mas as eleições são
Centralização organizadas por EMBs uma instância nacional organizadas por EMB
locais cumpre papéis centrais
importantes
comissões eleitorais ad
comissões eleitorais e comissões eleitorais e
Burocratização hoc e burocracia
burocracia ad hoc burocracia permanentes
permanente
executivo participa das
EMB interno ao nomeações mas nenhum vínculo com
Independência
executivo decisões são executivo
autônomas
funções concentradas
Especialização divisão interna no EMB EMBs diferentes
no mesmo EMB
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Por exemplo, o apelo para mobilizações sociais ou golpes.
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As medidas acima são inspiradas na metodologia proposta por Monte
(2011:209) e permitiriam a construção de um indicador de governança eleitoral,
calculado pela média de todas as dimensões e variando de 0 a 1. Um modelo
em que todas as dimensões estivessem plenamente presentes, por exemplo,
teria o valor 1 e um modelo em que todas as dimensões estivessem ausentes
teria o valor 0. Por sua vez, a uma configuração hipotética descentralizada, não
burocratizada nem especializada, mas altamente regulada, com influência
parcial dos partidos e independente do executivo, por exemplo, corresponderia
um índice de 0,44.
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outra seria através das suas atividades próprias de EMB. No primeiro caso,
através da edição de normas sobre questões eleitorais, sobre as quais os
parlamentares deveriam legislar mas demoram a fazê-lo, o judiciário altera as
regras da competição político-partidária (Marchetti 2008). Alguns exemplos
frequentes neste debate são a verticalização das coligações eleitorais, a
redução do número de vereadores e a fidelidade partidária. No segundo caso, a
justiça eleitoral produz incentivos à participação gerando a confiança na lisura
do processo eleitoral, através da sua atuação na administração das eleições e
na solução de dissídios.
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Está em andamento uma revisão do eleitorado paralela ao recadastramento biométrico.
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é acompanhado por fiscais dos partidos; a apuração, além de também ser
acompanhada por fiscais, vem sendo feita de forma automatizada desde a
adoção da urna eletrônica, entre 1996 e 2000.
5. Considerações Finais
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Por exemplo, a substituição de um juiz em um caso em que seja considerado impedido de
agir com isenção.
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Agradeço a Ricardo Borges por chamar atenção para este aspecto: a conhecida morosidade
do judiciário funciona como incentivo contrário ao seu uso como estratégia eleitoral.
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potencial de afetar as expectativas que os atores políticos desenvolvem a
respeito da competição eleitoral. Disposições legais específicas e
características intrínsecas ao funcionamento dos EMB produzem efeitos sobre
a confiança no processo eleitoral e portanto sobre as decisões dos partidos
quanto à sua participação.
6. Referências
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Donno, D. and N. Roussias (2012). "Does Cheating Pay? The effect of electoral
misconduct on party systems." Comparative Political Studies 45(5): 575-605.
Elkit, J. and A. Reynolds (2005). "A Framework for the Systematic Study of
Election Quality." Democratization 12(2): 147-162.
IDEA (2005). Electoral System Design: the new international IDEA handbook.
Stockholm, Sweden, IDEA - International Institute for Democracy and Electoral
Assistance.
16
Peschard, J. (2005). "Transparencia y partidos políticos." Cuadernos de
transparencia - Instituto Federal de Acceso a la Información Pública 8.
Sawer, M. E. (2001). Elections: full, free and fair, The Federation Press.
Recursos eletrônicos:
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