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deMANAUS
Geraldo Santos, Efrem Ferreira, Jansen Zuanon
PEIXES
COMERCIAIS
de
MANAUS
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE Revisão Centro Nacional de Informação. Tecnologias
Marina Silva Maria José Teixeira - Edições Ibama Ambientais e Editoração
Helionidia Carvalho de Oliveira - Edições Ibama Edições Ibama
SECRETARIA DE COORDENAÇÃO DA AMAZÔNIA Antônio Calafi - Edições Ibama SCEN Trecho 2, Bloco B - Subsolo Ed. Sede do Ibama
Muriel Saragoussi 70818-900 - Brasília, DF
Projeto Gráfico e Capa Telefone (61) 316 1065
PROGRAMA-PILOTO PARA A PROTEÇÃO DAS Tito Fernandes E-mail: edicoes@ibama.gov.br
FLORESTAS TROPICAIS DO BRASIL
Nazaré Lima Soares Ilustrações
José Myrria e Karl Mokros Financiadores
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS
RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS Fotografias
Marcus Luiz Barroso Barros Efrem Ferreira: páginas 11, 17,21,25,73,103
Michael Goulding: páginas 16,20,24,72,102
DIRETORIA DE FAUNA E RECURSOS PESQUEIROS
Rômulo José Fernandes Barreto Mello Edição
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
COORDENAÇÃO-GERAL DE GESTÃO DE RECURSOS Naturais Renováveis
PESQUEIROS Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Várzea -
José Dias Neto ProVárzea/Ibama
Rua Ministro João Gonçalves de Souza, s/n. Distrito
PROJETO MANEJO DOS RECURSOS NATURAIS Industrial – Manaus-AM – Brasil. 69075-830
DA VÁRZEA Tel: (92) 3613-3083/ 6246/6754/ Fax: (92) 3237-
Coordenador: Mauro Luis Ruffino 5616/6124
Correio Eletrônico: provarzea@provarzea.ibama.gov.br
Página na Internet: www.ibama.gov.br/provarzea.
Catalogação na Fonte
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
S237p
Santos, Geraldo Mendes
Peixes comerciais de Manaus/ Geraldo Mendes dos Santos, Efrem J. G. Ferreira, Jansen A. S.
Zuanon. –Manaus: Ibama/AM, ProVárzea, 2006.
p. 144, il.: color. ; 27x21cm.
ISBN 85-7300-211-5
CDU (2.ed.)639.2.053
PEIXES
COMERCIAIS
de
MANAUS
Geraldo Mendes dos Santos
Efrem Jorge G. Ferreira
Jansen A. S. Zuanon
AGRADECIMENTOS
Ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), pelo apoio à pesquisa, produção e
divulgação do conhecimento.
À Lúcia Rapp Py-Daniel, Ana Paula Freire e Inês Cristina de Alencar, pela leitura crítica do texto.
Ao José Myrria e Karl Mokros, pelos desenhos e aprimoramento computacional das imagens dos
peixes.
A todos aqueles que de uma forma ou outra contribuíram para a realização desta obra.
SUMÁRIO
Prefácio 7
Apresentação 8
Prólogo 9
Introdução 10
Metodologia 11
Osteoglossiformes 17
Arapaimatidae 18
Osteoglossidae 19
Clupeiformes 21
Pristigasteridae 22
25 Characiformes
26 Acestrorhynchidae
27 Anostomidae
39 Characidae
56 Curimatidae
61 Cynodontidae
64 Erythrinidae
66 Hemiodontidae
69 Prochilodontidae
73 Siluriformes
74 Auchenipteridae
76 Callichthyidae
Doradidae 77
Loricariidae 69
Pimelodidae 80
Perciformes 103
Cichlidae 104
Sciaenidae 125
PREFÁCIO
Os recursos pesqueiros da Amazônia têm sido O acompanhamento da atividade pesqueira constitui-se
tradicionalmente subestimados na sua importância no melhor método de amostragem das populações
pelas autoridades governamentais. Prova disso é a naturais de peixes, fornecendo informações não
quase inexistência de séries de dados estatísticos e apenas sobre a sua biologia e parâmetros
informações científicas sobre a pesca nos diagnósticos populacionais, mas também, e principalmente, sobre
econômicos, informes ecológicos ou até publicações os efeitos da exploração pesqueira sobre a densidade
turísticas sobre a região. As publicações do IBGE - dos estoques. Assim, o ProVárzea/Ibama vem desde o
Anuário Estatístico do Brasil e Recursos Naturais e ano de 2000 realizando o monitoramento do
Meio Ambiente nem sequer mencionam os recursos desembarque pesqueiro em 16 municípios ao longo
pesqueiros, e os recursos hídricos são apenas da calha dos rios Solimões e Amazonas com o intuito
mencionados em função do potencial energético. de disponibilizar informações para subsidiar políticas
públicas e medidas de ordenamento pesqueiro para a
A pesca na Amazônia tem um caráter artesanal e região.
mesmo assim, o peixe representa a principal fonte de
proteína para consumo humano, particularmente das Um dos principais portos de desembarque na
populações que habitam as margens dos rios e lagos Amazônia é o porto de Manaus que desembarca, em
da região. O consumo per capita de pescado nas média, mais de 20 mil toneladas/ano e um número
cidades de Manaus e Itacoatiara foi estimado entre 100 diverso de espécies. E foram essas espécies que foram
e 200 g/dia na década de 70 e mais recentemente objeto de análises que resultou esta obra que agora
outros autores indicam que as populações rurais apresentamos.
ribeirinhas consomem cerca de 500 g/dia.
A presente publicação documenta de maneira
Estimativas mais conservadoras da produção extremamente didática e com uma riqueza de
pesqueira indicam valores de 200.000 t/ano para toda informações e detalhes as principais espécies
a Bacia, sendo a maior parte correspondente ao desembarcadas e comercializadas no porto de Manaus
território brasileiro. Estes valores representam entre 20 e vem contribuir para o melhor conhecimento desta
e 25% do rendimento total da pesca (marinha e de rica fauna aquática amazônica que muito ainda
água doce) do Brasil, o que mostra a importância dos necessita ser pesquisada.
recursos pesqueiros da região no contexto nacional.
APRESENTAÇÃO
O Mercado Municipal “Adolpho Lisboa” de defendidas e examinadas, a experiência de
Manaus, é uma instituição centenária, e um inúmeras viagens e expedições de campo,
dos mais belos pontos turísticos da cidade. O permeadas por extenuante esforço físico, calor
Mercado e as feiras espalhadas pelos bairros extremo, muita chuva e infinita curiosidade.
são um museu com mostruário itinerante, pois
ao longo do ano, a composição das espécies Para fechar a apresentação deste lindo livro,
de pescado à venda vai se sucedendo. que honra a ictiologia brasileira, escolhi o que
Algumas, que ora são muito abundantes, vão o grande ictiólogo americano Eigenmann
sendo substituídas por outras que, às vezes, escreveu em 1912, sobre a Amazônia, num de
só aparecem numa época bem definida, como seus relatórios de expedição:
a sardinha. Assim, visitar o Adolpho Lisboa, ou
cruzar com uma feira ao vagar pela cidade, é “Although all other things were sacrificed to * "Embora todas as outras coisas tenham sido
uma delícia para os olhos do biólogo atento. the two purposes mentioned, I cannot claim sacrificadas aos dois propósitos mencionados,
that I accomplished them to my entire não posso afirmar que eu os realizei com
Este é um livro oportuno, escrito por três dos satisfaction. The conditions were all so novel, inteira satisfação. As condições eram tão
maiores ictiólogos brasileiros, pesquisadores the difficulties of travel so great, the heat so novas, as dificuldades de viagem tão grandes,
do Instituto Nacional de Pesquisas da intense, the fauna so rich, the time and the o calor tão intenso, a fauna tão rica, o tempo e
Amazônia, em Manaus, que faz jus à money at my command so limited, that I now o dinheiro a minha disposição tão limitados,
espetacular ictiofauna a que se refere - a mais occasionally regret that at this or that point I que agora ocasionalmente me arrependo que
rica do planeta, os peixes da Amazônia. As did not use different means, or devote more em um ou outro ponto não usei meios
imagens, o texto de conteúdo científico time to the objects in view. But to offset this diferentes, ou dediquei mais tempo aos
rigoroso, embora acessível ao não regret I have many solid satisfactions.” * propósitos visados. Mas para compensar este
especialista, são primorosos. Assim, lê-lo ou pesar tenho satisfações muito sólidas .”
apenas folheá-lo é um êxtase. Nele, estão
contidos anos de meticuloso estudo de
material de museus, conversas com colegas de Miguel Petrere Jr.
diferentes partes do país e do mundo, aulas UNESP – Departamento de Ecologia
assistidas e ministradas, dissertações e teses Câmpus de Rio Claro (SP)
9 PEIXES COMERCIAIS DE MANAUS
PRÓLOGO
Manaus ocupa uma posição estratégica no iniciativa que se insere nesse contexto, tendo variação na distribuição geográfica de certas
cenário amazônico, situada às margens dos como objetivo o fornecimento de informações espécies. Além disso, certos tipos de peixes
rios Amazonas e Negro, na parte central da biológicas básicas sobre as principais espécies acabam não chegando aos mercados em
maior bacia hidrográfica do planeta. É a maior de peixes comercializadas no mercado função do desinteresse pelo seu consumo, por
metrópole da região, e conta com um mercado manauara. A carência por informação é razões estritamente culturais. Podemos
pesqueiro de extraordinária importância. tamanha que quando uma publicação desse assegurar, contudo, que este livro pode ser
Dados estatísticos das últimas décadas dão tipo é lançada é comum as pessoas esperarem utilizado como base para a identificação da
conta de uma produção média anual em torno que ela venha suprir todas as lacunas maioria das espécies comerciais encontradas
de 30.000 toneladas de pescado, resultando existentes, como foi o caso de dois livros nos mercados das principais cidades da calha
numa intensa atividade sócioeconômica, da publicados anteriormente sobre o tema: do rio Amazonas, pois é desse sistema
qual participam milhares de pessoas, tanto em “Catálogo de peixes comerciais do baixo rio aquático que a maioria do pescado regional é
Manaus quanto no interior. Tocantins” de G.M. Santos, M. Jegu & B. proveniente.
Uma das características mais marcantes do Merona, de 1984, e “Peixes comerciais do As ilustrações das espécies, feitas por meio da
pescado comercializado em Manaus é a alta médio Amazonas: região de Santarém” de combinação de fotografias em papel com
diversidade de espécies de peixes. E.J.G. Ferreira, J.A.S. Zuanon & G.M. Santos, de recursos da tecnologia digital, representam
Curiosamente, essa mesma diversidade que 1998. Essas duas obras, em que o próprio uma tentativa de realçar o perfil, as formas e o
encanta pesquisadores, turistas e curiosos título já restringia sua abrangência geográfica, colorido e, assim, facilitar o reconhecimento
representa uma dificuldade adicional para são utilizadas, até hoje, como base para a das espécies.
quem deseja conhecer em detalhes o pescado identificação de peixes em vários locais, tanto É nossa esperança que esta obra seja útil a um
e a ictiofauna regional, pois são muitas as na Amazônia quanto fora dela, o que pode público diversificado e sirva, também, como
semelhanças de forma, coloração e hábitos gerar confusões e erros em trabalhos técnicos. incentivo para que outros pesquisadores se
entre as espécies. O livro que ora apresentamos foi escrito com juntem a nós nessa tarefa instigante de
Quem já se dispôs a procurar fontes de base em informações obtidas exclusivamente produzir e sintetizar conhecimentos sobre os
informações sobre os peixes do Brasil, dos peixes comercializados em Manaus. peixes, essa fantástica riqueza natural
especialmente da Amazônia, sabe das Evidentemente, o trabalho não contempla amazônica.
dificuldades de se obter livros ou outras todas as espécies de peixes de porte comercial
publicações escritas em linguagem acessível existentes na região, dada a enorme
ao público leigo. O presente trabalho é uma diversidade ictiofaunística existente e a Os autores
PEIXES COMERCIAIS DE MANAUS 10
INTRODUÇÃO
Os rios tiveram e continuam tendo papel fundamental na renda e lazer para milhares de pessoas, tanto na zona rural região ou simplesmente ao consumo próprio ou das
ocupação e colonização da Amazônia. Foi por eles que a quanto urbana. É por meio dela que se explora o pescado pequenas vilas do interior. Esse baixo nível de organização
região pôde ser explorada, e isso pode ser observado para consumo e para o comércio de peixes ornamentais. da pesca comercial se reflete na baixa qualidade geral do
pela concentração da população ao longo das margens Os primeiros registros sobre a pesca na região de pescado oferecido à população, o que gera perdas
dos rios. Esse processo espontâneo de colonização, com Manaus datam do século XVIII, quando a capital da desnecessárias de alimento e um impacto adicional sobre
forte vinculação aos rios, só foi complementado Província era Barcelos, e houve a instalação de um os estoques naturais de peixes.
recentemente com a abertura de grandes eixos Pesqueiro Real na ilha do Careiro, para suprir com Apesar da imensa riqueza de peixes amazônicos, estimada
rodoviários. Além de servir como caminhos (igarapé, por pescado os habitantes dessa cidade. Essa é a origem do entre 1.500 e 3.000 espécies, apenas uma parcela muito
exemplo, significa “caminho de canoa”) e eixos de nome “Lago do Rei” dado ao lago existente na ilha do reduzida dessa diversidade é explorada comercialmente
desenvolvimento, os rios são, também, fonte do principal Careiro, antes conhecida como Ilha do Pesqueiro Real. pela pesca. Historicamente, a espécie de peixe mais
alimento para os habitantes da região: o peixe. Atualmente, a produção pesqueira nas águas interiores importante para a Amazônia foi o pirarucu, e até meados
Registros fósseis mostram que o uso de pescado como da Amazônia brasileira está estimada em torno de do século XX isso ainda era verdadeiro. Estudos sobre a
alimento pelas populações indígenas amazônicas 217.000 toneladas por ano, sendo Manaus o maior composição do pescado no mercado de Manaus, e de
retrocede à pré-história, entre 3.000 e 1.500 a.C., e até centro produtor e consumidor, com um desembarque outras cidades da Amazônia Central, mencionam que a
hoje a pesca é uma das atividades mais tradicionais na que varia entre 22.000 e 35.000 t/ano. Essa pesca pesca comercial explora cerca de 100 espécies, sendo
Amazônia. No diário feito por Frei Gaspar de Carvajal, concentra uma produção oriunda de rios situados num que aproximadamente 90% estão concentrados somente
sobre a viagem de Francisco Orellana, em 1541, raio de aproximadamente 1.000 km a partir de Manaus, e numa dezena de espécies, destacando-se o tambaqui, o
descendo o rio Amazonas, é dito que: “... depois de que engloba o curso médio do rio Solimões/Amazonas e jaraqui, a matrinxã, o curimatã, o pacu e o tucunaré. Em
passarem muita fome, chegando ao extremo de o curso inferior de seus principais afluentes, sobretudo virtude dessa concentração do esforço de pesca em
comerem cintos e solas de sapatos cozidos com ervas, os de água branca, como Purus, Juruá, Japurá e poucas espécies, existem evidências de que alguns
encontraram uma povoação de índios que, ao vê-los, Madeira. Os rios de água preta, em especial o rio Negro, estoques pesqueiros, especialmente o do tambaqui, já
fugiram, deixando toda a comida existente, que foi constituem a principal fonte de peixes ornamentais vêm sendo explorados acima de sua capacidade de
devorada pelos espanhóis; mas após isso o contato foi destinados ao mercado internacional de aquariofilia. suporte.
amistoso, e os índios forneceram suprimento de peixes e Computando apenas o valor da venda direta do pescado, A causa principal desse fenômeno pode ser atribuída a
aves para eles”. a um preço médio por quilo entre 0,50 e 1,00 dólar, essa uma pesca intensiva e descontrolada, praticada na região
A pesca também é mencionada pelos colonizadores atividade movimenta de 100 a 200 milhões de dólares ao longo do tempo; entretanto, mais recentemente,
portugueses e por viajantes europeus e americanos dos por ano. Se a essa cifra forem incluídos os custos causas indiretas e com influências crescentes, como o
séculos XVII a XIX, como Pedro Teixeira, Alexandre envolvidos na armação dos barcos, compra de desmatamento (sobretudo das matas ciliares), a pecuária
Rodrigues Ferreira, Johann Spix, Carl Friedrich Martius, combustível, gelo e alimentação, esses valores devem em áreas de várzea, a construção de hidrelétricas e a
Louis Agassiz, Alfred Wallace e Henry Bates; contudo eles pelo menos duplicar. Além disso, nessa atividade mineração nos leitos dos rios têm contribuído para
estavam mais interessados nos aspectos da identificação e participam diretamente cerca de 250.000 pessoas, não acelerar esse problema. Diante dessas elevadas taxas de
descrição das espécies de peixes, do que seu uso como incluindo os ribeirinhos, que têm na pesca de explotação, e à enorme gama de distúrbios ambientais, é
recurso natural. José Veríssimo, um paraense de Óbidos, subsistência uma de suas principais fontes de alimento fundamental o estabelecimento de uma ampla base
publicou em 1895 o livro “A pesca na Amazônia”, sendo (seguramente, a principal fonte de proteína animal). O técnico-científica, acessível a todos os segmentos e atores
esse aparentemente o primeiro relato sobre a biologia e papel de destaque do peixe na vida dos ribeirinhos está envolvidos na atividade pesqueira, como forma de
ecologia dos peixes e a pesca no Brasil. claramente refletido no consumo de pescado, estimado subsidiar ações políticas, administrativas e educacionais
A pesca se desenvolveu a partir da combinação das culturas em mais de 400g/pessoa/dia, um dos maiores do que visem sua exploração sustentável.
indígenas locais e européias. Depois de séculos utilizando mundo. Uma das grandes dificuldades para quem lida com
métodos tradicionais, essa atividade sofreu dois grandes Com exceção da pesca industrial, praticada no estuário estatística pesqueira, ou busca elaborar planos de
impactos: um, na década de 1930, com a introdução da do rio Amazonas e cuja produção é destinada à manejo, é que as designações populares dos peixes
rede de cerco, e outro na década de 1960, com a chegada exportação, todo o restante da pesca amazônica é comerciais geralmente não correspondem a espécies
dos fios de náilon, mais resistentes e baratos, para a artesanal, ou seja, pouco organizada e com produtividade biológicas, mas sim a um conjunto de espécies, e às
confecção das malhadeiras, sendo esses, até hoje, os muito variável ao longo das diferentes épocas do ano. vezes até de gêneros, distintos. Isso significa que um
principais métodos de captura de peixes na região. Esse caráter artesanal se verifica tanto na forma de mesmo nome popular pode ser dado a duas ou mais
A pesca tem destacado papel sócioeconômico, quer como subsistência quanto na comercial, independendo se o espécies. Além disso, alguns nomes variam de um lugar
produtora de alimento, quer como geradora de trabalho, pescado se destina aos grandes centros populacionais da para outro, dificultando comparações entre os
11 PEIXES COMERCIAIS DE MANAUS
METODOLOGIA
desembarques de diferentes regiões da Amazônia. As informações aqui apresentadas foram obtidas a
Se, por um lado, a denominação popular é bastante partir de um projeto de pesquisa financiado pelo
variável, espacial e temporalmente, e destituída de um Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
referencial que lhe dê estabilidade, observa-se também Tecnológico (Processo 3013304/86-6), cujo objetivo
que ela encerra uma noção muito racional e prática, era identificar as espécies de peixes comercializadas
advinda do acurado senso de observação, experiência nas feiras em Manaus. Para isso fizemos visitas
e conhecimento por parte do pescador. Muito quinzenais, entre março de 1998 e abril de 1999, a
comumente, há uma estreita relação entre a três diferentes tipos de feiras:
classificação popular e a científica. Por exemplo: o - Feiras livres (Fig. 1): Localizadas em áreas
nome aracu refere-se a todos os representantes da improvisadas nos bairros residenciais. Nelas se
família Anostomidae; bodós aos da família Loricariidae; comercializam pequenas quantidades de pescado
branquinha aos representantes de Curimatidae; e carás, recebido de intermediários ou mesmo vendido pelos
aos da família Cichlidae. próprios pescadores. Normalmente, funcionam apenas Figura 2 - Feira de bairro (Coroado).
Evidentemente, a nomenclatura popular é fruto de um uma vez por semana e têm caráter itinerante;
vasto conhecimento empírico e tem servido como base - Feiras de bairros residenciais (Fig. 2): Localizadas em
fundamental para o conhecimento dos peixes áreas fixas relativamente estruturadas nos bairros e
amazônicos; entretanto, é preciso destacar o fato de dos quais seus nomes são derivados. Nelas são
que cada espécie biológica tem uma história natural comercializadas quantidades relativamente grandes de
distinta e, portanto, necessidades, hábitos e estratégias pescado, que é vendido diariamente à população por
de vida próprios. Nesse sentido, cada espécie deve ser peixeiros profissionais e que o adquirem nas feiras do
tratada individualmente, sobretudo quando se tem em centro ou diretamente dos barcos que atracam no
vista planos detalhados de manejo. Assim, a correta porto da cidade; e,
identificação das espécies comercializadas e a aliança do - Feiras do centro (Fig. 3): Localizadas em áreas bem
conhecimento tradicional com o científico, devem estruturadas e especialmente construídas para esse fim
constituir uma preocupação constante e um na zona central da cidade, próximas ao porto fluvial.
instrumento imprescindível a todo e qualquer processo Nela são comercializadas diariamente grandes
de explotação pesqueira. quantidades de pescado, o qual é recebido diretamente
O presente trabalho se enquadra nesse contexto e foi dos barcos pesqueiros que ficam ancorados em seu
Figura 3 - Feira do centro (Panair).
concebido, justamente, para tentar minimizar esse entorno.
problema. Seu principal objetivo é constituir-se num As visitas foram realizadas nos finais de semana, pela quantidade de peixes à venda, e pela manhã nas feiras
guia descritivo e ilustrado das principais espécies de manhã, nas feiras do centro e de bairros residenciais, livres, em diferentes dias da semana.
peixes comercializadas no mercado de Manaus e por serem esses os dias e horários em que há maior Em cada visita era feita uma estimativa da participação
destinadas ao consumo humano. Para cada espécie relativa de cada grupo de pescado, em relação ao
são fornecidos os nomes científicos e populares, uma volume da produção total, que se encontrava exposta
caracterização morfológica sucinta, informações sobre à venda. As participações relativas ou graus de
os hábitos de vida e indicação da sua participação importância, tanto para os grupos quanto para as
relativa na produção local e regional. Além disso, para espécies de pescado foram agrupadas nas seguintes
cada espécie é fornecida uma bibliografia básica, em categorias:
que o leitor poderá encontrar informações adicionais Destacada: acima de 20%;
ou mais detalhadas a respeito das mesmas. Moderada: entre 5 e 20 %;
Em escala mais ampla, o objetivo deste trabalho é associar Insignificante: abaixo de 5%.
a nomenclatura científica com a popular, visando integrar, De cada espécie, foram adquiridos exemplares frescos e
num texto simples e acessível, as informações disponíveis em bom estado para ilustração e confirmação da
sobre as espécies comercializadas nos mercados de identificação em laboratório. Foi anotado também o nome
Manaus, contribuindo, assim, para o conhecimento e o comum dado a cada uma das espécies biológicas
uso sustentável desse importante recurso natural. Figura 1 - Feira livre (rua Airão). identificadas.
PEIXES MERCADO DE MANAUS 12
Metros
2500
TRAÍRA (+) Hoplias malabaricus 23
2000
TUCUNARÉ (++) Cichla monoculus (+++) 21
Cichla orinocensis (+) 1500
Cichla sp (+) 1000 19
Cichla temensis (++)
500 17
ZEBRINHA (+) Merodontotus tigrinus
0 15
Mai
Jul
Mai
Jul
Mai
Jul
Jan
Jan
Jan
Nov
Mar
Mar
Mar
Nov
Nov
Set
Set
Set
Legenda: Destacada (+++, mais de 20%), Moderada (++, de 5 a 20%), e,
Insignificante ( +, abaixo de 5%) Figura 4. Curvas do nível do rio e da produção de pescado desembarcado em Manaus para os anos de 1994,
1995 e 1996, segundo dados de Batista (1998).
PEIXES MERCADO DE MANAUS 14