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Ministério da Escola Dominical – MED

Professor: Adilson Alves Bezerra


Palestra: “A Reforma Protestante” – Data: 03/11/2002
Data Comemorativa da Reforma Protestante: 31 de outubro de 1517

INTRODUÇÃO

Os Precursores da Reforma

Para entendermos o movimento da “Reforma Protestante” é fundamental refletirmos inicialmente sobre a situação
da Igreja Católica ao longo de sua trajetória. Com estes fatos expostos ficam evidentes alguns indicativos para a implantação
da Reforma Protestante.

A Igreja Católica, que conhecemos hoje, é o resultado de alterações feitas a partir da Igreja Primitiva.
Durante os primeiros séculos cristãos ocorreram muitas perseguições, isto cooperou para que a igreja se mantivesse
fiel as Escrituras. Este período é chamado de era patrística, ou era dos pais da igreja.
A corrupção no cristianismo começou já, infelizmente, em meados do século III, onde houve o primeiro rompimento
sério dos cristãos, por causa da introdução dos batismos de crianças. Este rompimento foi conhecido como
"desfraternização". No século IV, Constantino ascendeu ao posto de Imperador. Este apoiou o cristianismo e fez o mesmo a
religião oficial do Império Romano. Assim sendo, muitos ímpios se tornaram cristãos por motivos políticos e escusos.
Constantino convocou em 325 d.C. o Concílio de Nicéia onde surgiu o catolicismo romano influenciado por doutrinas pagãs.
Como pôde haver essa junção entre o cristianismo e Roma? Roma que sempre foi centro de idolatria em que seus
imperadores eram considerados deuses? Alcides Peres conta que em 326 d.C., um ano depois do Concílio, Constantino vai a
Roma para celebrar o vigésimo ano de seu reinado. Por intriga palaciana, manda prender seu filho Crispo, que é logo
julgado, condenado e morto pelo próprio pai... Foi esse homem que deu origem a esta junção do catolicismo com o
romanismo.
A partir de então, a curva de desvio da Verdade acentuou e acelerou-se de forma violenta, a ponto de os
séculos mais negros da história da Europa coincidirem com os anos em que a Igreja Católica " reinou"
soberana: os mil anos de trevas (500-1500). Trevas estas não só espiritual, mas também intelectual e moral.
Veja a seguir um resumo dos desvios introduzidos pela Igreja nestes quase 1300
anos:
Orações pelos mortos, em 310
Acender velas, em 320
Adoração de santos, em cerca de 375
A Adoção da missa como necessária para a salvação, em 394
Adoração à Virgem Maria, em 432
A Doutrina do purgatório, em 593
Supremacia papal, 606
Costume de beijar o pé do papa, em 709
Adoração a imagens e relíquias autorizada em 788
Água benta, em 840
Canonização de santos, em 993
Celibato, em 1074
Infalibilidade papal, em 1076
O terço foi introduzido em 1090
Sete Sacramentos, em 1140. Os sete sacramentos: batismo, crisma ou confirmação, penitência, eucaristia
ou missa, matrimônio, unção dos enfermos ou extrema unção e santas ordens
A venda de indulgências, em 1190
O dogma da transubstanciação, em 1215
Confessionário, em 1215
A Ave Maria, em 1316
O cálice determinado só para o clero, em 1415
Purgatório decretado, em 1439
Tradição Católica Romana ao mesmo nível que as Sagradas Escrituras Bíblicas, em 1546
Livros apócrifos incluídos no Cânon Bíblico, em 1546
.
A concepção imaculada de Maria anunciada em 1854 (Imaculada Conceição de Maria)
A ascensão de Maria ao céu, em 1950 (A Assunção de Maria)
A salvação pelas obras
A Perpétua Virgindade de Maria

É apenas no século XVI que ocorre a tão conhecida “Reforma Protestante” que é sempre lembrada no
dia 31 de outubro por ser a data em que Lutero em 1517 d.C. colocou suas 95 teses na porta da Igreja do
Castelo de Wittenberg. Essas teses combatiam principalmente a compra de indulgências. Segundo Earle E.
Cairns: "A indulgência era um documento que se adquiria por uma importância em dinheiro e que livrava
aquele que a comprasse da pena do pecado." O pecador deveria arrependendo-se, confessar o seu pecado ao
sacerdote, e ainda pagar uma certa quantia para assim obter o perdão dos pecados e a certeza de uma vida ao
lado de Cristo, tornando-se desta forma o sacrifício na cruz como inválido. Lutero combateu isto com
veemência baseando-se em Romanos 1:17, ensinando que só a fé em Cristo justifica. Com a Reforma a Bíblia foi
traduzida para a língua do povo. Antes a Bíblia era negada ao povo sob a desculpa que só o sacerdote podia interpretá-
la corretamente para que a mesma não se tornasse um livro vulgarizado. A supremacia da Bíblia em todas as questões
de fé e prática foi enfatizada (sola scriptura) assim combatendo a idéia que a tradição e as interpretações dos clérigos
teriam o mesmo valor que as Escrituras.
Lorraine Boettiner escreveu: "O protestantismo como surgiu no século dezesseis não foi o começo de
alguma coisa nova, mas o retorno ao cristianismo bíblico e à simplicidade da igreja apostólica da qual a igreja
católica se afastou há muito tempo”.

A Transição da Idade Média para a Idade Moderna


(1500-1789)

* A SITUAÇÃO NA EUROPA NO SÉCULO XIV

A partir do século XIV é que podemos perceber a desagregação do mundo medieval. Essa
progressiva desagregação é demonstrada nos diferentes níveis da realidade social.
No plano econômico, assistimos à derrocada da economia feudal e ao renascimento do
comércio, que culminará com as grandes navegações do século XVI.
No plano social, temos o desenvolvimento de uma camada de mercadores e o progressivo
declínio da nobreza feudal. A camada de mercadores levou a iniciar uma nova classe social chamada
“burguesia”.
No plano político, ocorre progressivamente uma centralização do poder nas mãos dos reis. As
soberanias feudais locais vão desaparecendo. O rei, aliado aos mercadores, vai sujeitando à sua
autoridade, o poder da nobreza feudal e da igreja.
No plano religioso, assistimos ao declínio da igreja, com o surgimento de uma série de
movimentos que irão culminar com a Reforma Protestante. O homem medieval sempre foi
profundamente religioso e essa religiosidade gerará um inconformismo com a proposta doutrinária da Igreja
Católica. A Igreja pregava o amor ao próximo e a humildade. Contudo, havia uma grande contradição entre
o que ela pregava e o que praticava.
No plano científico, ocorre o aparecimento do método científico, possibilitando assim o
rompimento com o pensamento teocêntrico, tendo como um dos principais representantes Bacon e
Barth.
No plano cultural, temos o Renascimento cultural ou Renascença.
No plano da Literatura, diferentes escritos são produzidos em grande em escala devido ao
surgimento da imprensa de Gutemberg.
Assim, até os fins da Baixa Idade Média ou mesmo durante todo o período medieval a Igreja
Católica monopolizava a educação, a religião e a cultura na Europa Ocidental. A igreja era a única
instituição centralizada de toda a Europa feudal e sua força era superior à dos reis.
É somente em meados desta Idade que com o surgimento de novas condições de vida em
sociedade, uma nova cultura começou a aparecer. Essa nova cultura tinha um caráter humanista
(valorização do homem e suas obras), leigo e antropocêntrico (colocação do homem como centro do
universo). Ou seja, a partir do pensamento científico, caberia ao homem explicar todos os acontecimentos
do mundo.
É ao surgimento e desenvolvimento dessa cultura leiga, humanista e antropocêntrica que
atribuímos o nome de Renascimento Cultural.

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* AS CARACTERÍSTICAS DO RENASCIMENTO CULTURAL

O Renascimento Cultural ou Renascença, como já vimos, foi o surgimento de uma cultura


antropocêntrica em oposição ao teocentrismo medieval. Outra característica da Renascença foi o
individualismo em oposição ao coletivismo da Idade Média. Cada renascentista julgava-se o elemento
mais importante do mundo. Isso pode ser facilmente explicado e compreendido: enquanto na Idade Média o
homem só se via fazendo parte de um todo (o cristão só se entendia como parte da igreja, o servo como
elemento de um feudo, o artesão como elemento de uma corporação), na época renascentista, com o
estabelecimento da sociedade competitiva, cada indivíduo procurava se sobrepor aos demais,
buscando a satisfação de seus impulsos e desejos.
No plano do conhecimento, as características fundamentais do Renascimento Cultural foram:
- O racionalismo - todo conhecimento tem que ser demonstrado pela razão humana.
- O experimentalismo - o conhecimento agora deveria ser demonstrado através de experiências (método
científico. O método científico teve a sua origem com o pensador Bacon, estruturando-o em 04
fases: observação sistemática, formulação de hipóteses, experimentação da hipótese e, caso fosse
comprovada, a experimentação transformaria numa teoria.

* FATORES QUE LEVARAM AO RENASCIMENTO

O Renascimento Cultural foi um produto das transformações ocorridas na Europa Ocidental


a partir da Baixa Idade Média. Essas transformações foram:
- O Renascimento Comercial, ou seja, a generalização do comércio pela Europa Ocidental.
- O Renascimento Urbano, que implicou um crescimento e surgimento de novas funções para as cidades.
A cultura renascentista foi uma cultura eminentemente urbana.
- O surgimento e ascensão de uma camada de mercadores. Os ideais elaborados pelo Renascimento
correspondiam, de um modo geral, aos interesses desse grupo. Foram os mercadores os principais
elaboradores e financiadores da cultura renascentista.
- A centralização do poder nas mãos dos reis. Na medida em que foram centralizando o poder em
suas mãos, os reis foram submetendo a igreja a sua autoridade. Esta submissão possibilitou a
ascensão dos mercadores e o surgimento de uma cultura renascentista.
- O declínio da igreja que monopolizava a cultura medieval. Com o declínio da igreja, foram surgindo
novos centros de saber na Europa Ocidental - as Universidades - que se desenvolveram a partir do
século XI, financiadas pelos mercadores. Retoma-se o estudo de toda a cultura clássica e especificamente
do direito comercial romano.
- O desaparecimento dos ideais de vida da Idade Média, que possibilitou o surgimento de um novo
homem - o humanista. Entre esses ideais, que desapareceram, podemos citar : a cavalaria - que, além de
arma de guerra era o código de honra da nobreza feudal, passou, com o renascimento, a ser tratada com
desprezo e até mesmo a ser ridicularizada; a escolástica - que buscava a conciliação da fé com a razão,
passou a ser desdenhada.
Como vimos, o Renascimento Cultural é um produto das transformações européias no
alvorecer da Idade Moderna.
É preciso lembrar, no entanto, que a Europa não é um todo monolítico. Enquanto na Itália e
Países Baixos já temos no século XIV um significativo desenvolvimento da produção capitalista e o
domínio político de uma burguesia nascente, em outros países europeus temos, ao contrário, o
fortalecimento das relações feudais, e, conseqüentemente, da nobreza feudal.
Portanto, o Renascimento Cultural terá certas variações nacionais e seu engendramento dever-se-á
as condições históricas específicas de cada país.

* O Poderio da Igreja Católica na Idade Média

A Igreja Católica na Idade Média instruiu, de certo modo, os povos bárbaros nas verdades cristãs e
os preparou para uma vida civilizada, no entanto com muitas imperfeições. Suas maiores contribuições
foram: Introduziu nas leis civis certos princípios da moral cristã. “Amenizou” a sorte dos escravos.
“Elevou” a posição da mulher. E, por séculos essa igreja ministrou quase toda a educação que havia
na Europa. Neste período da Idade Média a Igreja Católica deteve o poder político, tendo em vista
que ninguém afrontava o sacerdote por medo do castigo eterno; econômico, tendo em vista que a
mesma, através das indulgências, conseguiu comprar e conquistar várias terras dos senhores

.
feudais; religioso, tendo em vista que a religião que mais crescia na Europa e cultural, tendo em
vista que ela ditava os costumes a serem rigidamente seguido pela população.

No entanto, houve grandes falhas da Igreja papal, dentre estas falhas podemos citar:

Em primeiro lugar, a corrupção do clero, pois muitos clérigos eram pluralistas, isto é,
exerciam dois ou mais ofícios eclesiásticos e aumentavam suas rendas; a avareza, no entanto, era
muito pior no alto clero. A cobiça, a extorsão, a violência dos bispos eram um escândalo notório.

Em 2º lugar a degradação da religião. Essa Igreja permitiu que o evangelho fosse substituído
por uma religião de ritos sacramentais que outorgavam uma salvação mágica, orações aos espíritos
bondosos da virgem e dos santos, relíquias milagrosas, maldições e absolvições dos sacerdotes
pela indulgência. E à medida que chegava o fim da idade média não se verificava qualquer esforço
por parte da Igreja no sentido de purificar seu culto.
Em 3º lugar, o povo estava abandonado. O povo só raras vezes ouvia sermões dos frades
franciscanos e dominicanos. Os párocos davam-se por satisfeitos com o que prescrevia o ritual latino,
o qual nem mesmo o povo e muitas vezes nem os padres mesmos entendiam. O povo necessitava do
evangelho, ela oferecia um grande sistema de superstição, administrado por um sacerdócio mundano e
corrupto.
Da mesma forma, 7 escândalos ilustram bem a corrupção a que chegara a igreja católica
romana:
O papa Inocêncio VIII, no século XIII. Era pai de 16 filhos ilegítimos e ordenou a execução dos
Valdenses que criam verdadeiramente na Bíblia e que foram um dos precursores da Reforma.
O escândalo do Cisma Papal. Século XIV e XV. Três papas reivindicavam a autenticidade do
seu papado. Onde fica a infalibilidade papal?
O escândalo da imoralidade. O celibato não funcionava de fato. Em I Tm.3:4 lemos que essa
doutrina do celibato não é bíblica. Todos sabiam que os sacerdotes eram imorais e que tinham uma vida
ativa sexualmente, chegando, inclusive, a manter relações com escravas e freiras.
O escândalo da idolatria. Eles conferiam às relíquias um poder supersticiosamente grande e da
mesma forma aos ídolos. Isso pode ser observado em catedrais e igrejas romanas ainda hoje. Pessoas indo
de santo em santo, de ídolo em ídolo para rezar e dando homenagem especial à Maria.
O escândalo das guerras das Cruzadas. A maior relíquia era a cidade de Jerusalém que estava
em poder dos muçulmanos e então foram organizadas guerras, que tiveram o nome de cruzadas onde
milhares de pessoas foram exterminadas. A população muçulmana ainda não se recuperou deste trauma e
por isso pregam constantemente o ataque ao cristianismo. É uma mancha tremenda na história da Igreja.
O escândalo da Inquisição. Thomas Tacomado foi o chefe da Inquisição na Espanha e fez
com que 10 mil pessoas fossem queimadas, presas a um poste por não serem católicos romanos.
Procurava aliciar judeus sem nenhum escrúpulo, para se tornarem cristãos.
As Indulgências. A salvação comprada por dinheiro foi o estopim que levou Lutero à
Reforma. Ele sentiu-se ofendido com Tetzel e a venda de indulgências. Tetzel era o mais talentoso
idealizador e vendedor de indulgência. O dinheiro arrecadado era dividido com os banqueiros da época e
com o papa, mas uma parte ficava para o próprio Tetzel. Desta forma Lutero conseguiu ver que as almas
estavam sendo enganadas quanto à salvação. Isto foi o que proporcionou o pontapé inicial da Reforma.

* ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA REFORMA PROTESTANTE

A) OS FATORES QUE GERARAM A REFORMA PROTESTANTE

- A expansão marítima e comercial que fortaleceu a burguesia européia, interessada na reforma


religiosa. Tal interesse se devia tanto à moral econômica católica do "preço justo", elaborada por
Tomás de Aquino, que constituía um obstáculo ao desenvolvimento do comércio, como também ao
alto custo do clero para a burguesia nascente.
- A formação das monarquias nacionais: com o surgimento dos Estados centralizados, o poder real e
a igreja entraram em conflito na medida em que esta última constituía um empecilho ao
fortalecimento do poder real. Por outro lado, os dízimos, a venda das indulgências e de relíquias
sagrada retirava dos Estados Nacionais uma boa parte da renda que era transferida para o papado
na Itália.
- O Renascimento Cultural. Na medida em que desenvolveu uma cultura antropocêntrica, um espírito
de crítica (pois agora era necessário utilizar-se da experimentação objetivando a comprovação dos
fatos), o individualismo levou ao declínio da escolástica e contribuiu para a Reforma Protestante.
.
- O declínio da igreja: a venda de indulgências e de cargos religiosos tornou a igreja alvo de crítica
da maior parte de seus fiéis.
Em cada país acrescentou-se a atuação de fatores específicos no surgimento da Reforma
Protestante. Estes fatores, tendo em vista que variam de país para país, veremos a seguir. No entanto, é
fundamental que entendamos agora alguns dos principais nomes que contribuíram para o desenrolar da
Reforma Protestante.

B) Os Precursores da Reforma Protestante

Nos séculos XIV e XV, a degeneração da igreja atingiu um grau monstruoso como vimos
anteriormente. O alto clero vivia num ambiente de luxo. Muitas pessoas se convenciam então de que a
igreja se afastara da doutrina original de Cristo, sendo necessário fazê-la retornar ao ponto de
partida.
Com o surgimento das Universidades, muitos eruditos, passaram a ler a Bíblia
independentemente das interpretações da igreja, difundindo a doutrina original de Cristo.
Esse eruditos, tal como Erasmo de Rotterdam, propunham uma reforma no interior da
própria igreja.
Também os camponeses e artesãos medievais, explorados pelos senhores leigos e
eclesiásticos, moviam contra a igreja violentas lutas armadas. Essas lutas e movimentos contra os
abusos do poder da igreja assumiam um caráter de heresia por parte da Igreja Católica.
O primeiro grande movimento dessa natureza foi o movimento husita (devido ao seu líder
John Huss, considerado hoje um dos precursores da Reforma Protestante), que irrompeu na
segunda década do século XV no reino de Boêmia. A igreja viu-se obrigada a fazer sérias
concessões aos rebeldes ante a derrota das tropas dos cruzados e mercenários por ela contratados. A
igreja, pela primeira vez em sua história, teve que tratar publicamente com os hereges, aceitando
suas petições.

I) João Wycliffe (1328 - 1384)


Foi considerado o primeiro precursor da Reforma. Um dos primeiros movimentos populares
considerado herético pela Igreja Católica foi o movimento liderado por Wycliffe (precursor da
Reforma Protestante) na Inglaterra. No século XIV, o reformador inglês John Wycliff distinguiu-se por
traduzir a Bíblia, contestar a autoridade pontifícia e censurar o culto dos santos das relíquias. Os
camponeses queriam a abolição da servidão e da cobrança dos dízimos pela igreja. Wycliffe pregou
até o confisco dos bens dos mosteiros, tendo sido apoiado nessa reivindicação pela nobreza
inglesa, interessada nas terras da igreja. As suas propostas teológicas eram revolucionárias,
marcadas por um caráter anticlerical, antifeudal e democrático. Para Wycliffe, qualquer homem
estava tão próximo de Deus quanto os padres, tendo, portanto, o direito íntimo de juízo em matéria
de religião. Os sacramentos tinham pouca importância em comparação com a pregação e estudo da
Bíblia. O homem era mais importante sendo ativo no mundo do que trancado num mosteiro.
Nascido na Inglaterra por volta de 1320. Ao povo inglês desagradava enviar dinheiro para um
papa em Avignon, que estava sob influência do inimigo da Inglaterra, o rei francês. Este sentimento
nacionalista natural aumentou o ressentimento real e da classe média por causa do dinheiro
desviado do tesouro inglês e da administração do Estado inglês através dos impostos papais. O
estatuto de Provisões de 1351 proibia a indicação papal de clérigos para o preenchimento de cargos da
Igreja Romana na Inglaterra. O Estatuto de Premunir de 1353 proibiu a prática clerical de apelar das cortes
inglesas para a papal em Roma. O pagamento do tributo anual de marcos, prática iniciada por João,
também cessou neste período por ato do Parlamento. Foi em meio a este clima de reação nacionalista
contra o eclesiasticismo que Wyciffe entrou em cena. Ajudado pelo poderoso João de Gaunt,
Wycliffe conseguiu desafiar o papa.
Wycliffe estudou e ensinou em Oxford a maior parte de sua vida. Até 1378, era reformador
que queria reformar a Igreja romana através da eliminação dos clérigos imorais e pelo despojamento
de sua propriedade, que, segundo ele, era a fonte da corrupção. Em uma obra de 1376 intitulada Of
Civil Dominion (sobre o Senhorio Civil), ele exigia uma base moral para a liderança eclesiástica. Deus
concedia aos líderes eclesiásticos o uso e a posse dos bens, mas não a propriedade, como um
depósito a ser usado para a Sua glória. A falha da parte dos eclesiásticos em cumprir suas próprias
funções era uma razão suficiente para a autoridade civil tomar os seus bens e entregá-los somente aos que
servem a Deus dignamente. Esta doutrina agradava os nobres que esperavam se apoderar das
propriedades da Igreja Romana. Eles e João de Gaunt protegeram Wycliffe para que a Igreja de
Roma não conseguisse pegá-lo.

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Wycliffe, desgostoso com o Cativeiro e o Cisma, não se satisfez com esta postura apenas
negativa e começou, a partir de 1378, a se opor aos dogmas da igreja Romana com idéias
revolucionárias. Atacou a autoridade do papa em 1382, dizendo num livro que Cristo e não o papa
era o chefe da Igreja. Afirmou que a Bíblia e não a Igreja era a autoridade única para o crente e que a
Igreja Romana deveria se modelar segundo o padrão da Igreja do Novo Testamento. Para apoiar
estas idéias, Wycliffe tornou a tradução completa do Novo Testamento para o inglês. Nicolau de
Hereford completou a tradução do Velho Testamento para o inglês em 1384. Desse modo, pela
primeira vez, os ingleses podiam ler a Bíblia toda em sua própria língua. Wycliffe se oporá em 1382
ao dogma da transubstanciação. A Igreja Romana dizia que a substância ou essência dos elementos
transformava-se embora a forma externa permanecesse a mesma; Wycliffe significaria que o sacerdote
não mais reteria a salvação de alguém por ter em suas mãos o corpo e o sangue de Cristo na
Comunhão.
As idéias de Wycliffe foram condenadas em Londres em 1382, e foi obrigado a se retirar para
seu pastorado em Lutterworth. Ele providenciara a continuação da propagação de suas idéias com a
fundação de um grupo de pregadores leigos, os lolardos, que as pregaram por toda a Inglaterra até
que a Igreja Romana, por força da declaração "De Haeretico Comburendo" promulgada pelo
Parlamento em 1401, introduzisse a pena-de-morte como castigo à pregação das idéias dos lolardos.
As habilidades de Wycliffe influenciaram na preparação do caminho para a reforma na
Inglaterra. Ele deu aos ingleses sua primeira Bíblia no vernáculo e criou o grupo lolardo para
proclamar idéias evangélicas entre o povo comum da Inglaterra. Seus ensinamentos de igualdade na
Igreja foram aplicados à vida econômica pelos camponeses que se levantaram na Revolta dos Camponeses
de 1381. Os estudantes boêmios que estudavam na Inglaterra levaram suas idéias para a Boêmia,
onde lançaram os fundamentos dos ensinos de John Huss.

As Proposições de Wycliffe condenadas em Londres, 1382, e no Concílio de Constança, 1415

João Wycliffe (1324-1384), era o maior erudito da Universidade de Oxford, onde passou a
maior parte de sua vida - pois, parece que pouco trabalhou em sua paróquia de Lutterworth. Era um
protegido de João de Gaunt e assim começou a ter influência política quando suas doutrinas começaram a
ter seguidores por obra dos "pregadores pobres" que ele comissionava. Os pontos mais importantes de
seu ensino eram: a teoria do "domínio pela graça"- a oposição à concepção feudal da derivação através
de intermediários e que encontrava seu paralelo na concepção da graça que vinha através do Papa e da
hierarquia e que tanto influenciou a teologia católica; a aceitação da Bíblia como a única regra de fé e
interpretada sem qualquer perspectiva histórica; sua doutrina a respeito dos sacramentos e especialmente
da missa. Essas doutrinas tiveram grande influência sobre João Huss, o reformador da Boêmia,
também condenado em Constança. Essas teorias acadêmicas foram levadas a conclusão práticas
pelos seus seguidores, chamados lolardos, que se tornaram mais revolucionários políticos do que
reformadores da Igreja. Seus principais ensinos foram:

Que Cristo não está neste sacramento essencial e realmente com sua própria presença corporal.
Que se um bispo ou um sacerdote estão em pecado mortal não devem ordenar, nem consagrar, nem
batizar.
Que não está escrito no Evangelho que Cristo tenha instituído a missa.
Que se um homem está devidamente arrependido qualquer confissão exterior é supérflua e inútil.
Que é contrário à Sagrada Escritura que os eclesiásticos tenham posses.
Que qualquer diácono ou sacerdote pode pregar a palavra de Deus sem a autorização da Sé
apostólica ou de um bispo católico.
Que ninguém é autoridade civil, prelado ou bispo enquanto está em pecado mortal.
Que quem dá esmolas aos frades é, ipso facto, excomungado.
[As proposições acima são comuns aos processos de Londres e de Constança. Muitas
outras proposições, das quais algumas são dadas abaixo, foram condenadas em Constança; são
mais extremistas no tom e devem provavelmente ser mais atribuídas aos lolardos do que ao próprio
Wycliffe]
Que não se deve temer a excomunhão do papa ou de qualquer prelado, porque são uma
censura do Anticristo.
Que a Igreja de Roma é a sinagoga de Satanás e que o papa não é o vigário direto e imediato
de Cristo e dos apóstolos.
Que é vão crer nas indulgências dos bispos e do papa.
Assim, numa linguagem que iria rivalizar com a de Lutero, ele escreveu que os padres:

Roubam o sustento dos pobres, os quais não podem se opor à opressão; cobram mais alto por
.
um tostão furado do que pelo sangue precioso de Cristo; rezam apenas para se mostrar e coletam taxas por
qualquer serviço religioso que oficiam; vivem na luxúria, cavalgando gordos cavalos forrados de prata e
ouro; são roubadores... raposas maliciosas... lobos vorazes... glutões... demônios... chimpanzés.

No que diz respeito à sua tradução da Bíblia podemos afirmar que como a imprensa ainda
não havia sido inventada, o manuscrito teve de ser copiado à mão, exigindo um exorbitante custo
diário. (Foram precisos quase dez meses de trabalho árduo de um copista experiente). A taxa da mão de
obra, de uma hora apenas, com essa obra custava o mesmo que um carregamento inteiro de feno). Mas, a
chegada da imprensa cumpriu a estranha profecia: "Esperemos que o baixo custo da Bíblia jamais
ocasione o baixo apreço pela mesma". (Os crentes dos dias atuais, infelizmente, podem constatar o
cumprimento desta profecia). Sem dúvida, é a este mestre John Wycliff que se deve a tradução do
Evangelho do Latim para o Inglês.
No ano de 1415, o Concílio de Constança determinou que os livros e ossos de
Wycliff fossem queimados e suas cinzas atiradas no rio Severn (que desaguava em sua cidade).
Exatamente treze anos antes que o cadáver do reformador fosse profanado, John Huss
(1372-1415) foi reconhecido como o apologista da "heresia Wyclifiana", na universidade de Praga. A
difusão da doutrina de Wycliff por Hus resultou em que a Boêmia recebesse a herança de "Berço da
Reforma".
Durante o Concílio de Constança, quando Huss foi traído e condenado à morte, a sentença
oficial também provou ter sido uma centelha inglesa que acendeu as chamas da Reforma Européia:
O Sagrado Concílio, tendo somente Deus diante dos seus olhos, condena John Huss por ter
sido e ainda ser um verdadeiro, real e declarado herege, discípulo, não de Cristo, mas de John
Wycliff, é o que veremos a seguir.

II) JOHN HUSS (1369 - 1415)

Reformador religioso e patriota tcheco (Husinec, Boêmia, hoje Tchecoslováquia, 1372 - 73 –


Constança hoje Konstanz. República Federal da Alemanha . 6-VII – 1415). Camponês educou-se em
Praga, ordenou-se sacerdote (1400), fez-se confessor da rainha Sofia e professor da universidade
Carlos (filosofia). Em 1402 começou a pregar na pequena capela de Bethlehem, hoje reconstruída.
Apoiado, de início, pelas autoridades, traduziu o Novo Testamento para o tcheco e publicou vários
livros: da glorificação do sangue de Jesus Cristo, Contra a adoração das imagens, Vida e Paixão de
Cristo segundo os quatro Evangelhos.
Em 1408 entrou em conflito com o arcebispo Zbvniec por haver demonstrado simpatia pelas
idéias do reformador inglês John Wycliffe e condenado, do púlpito, os privilégios do clero. Teve
assim mesmo, grande papel no movimento pelo qual os tchecos assumiram a liderança da universidade, até
então predominantemente alemã - decreto de Kutná Hora, 1409. Feito reitor, reconheceu a eleição do papa
Alexandre V pelo concílio de Pisa que depusera o papa Gregório XII e o antipapa Benedito XIII. Entretanto,
o arcebispo de Praga ficou fiel a Gregório e proibiu que Huss pregasse, ordenando ao mesmo tempo
uma investigação da sua doutrina. Huss desobedeceu e foi excomungado.
Essa primeira pena foi levantada por intervenção da rainha. Mas em 1412 o antipapa João XXIII
decretou uma cruzada contra o rei de Nápoles e ordenou a venda de indulgência para financiá-la.
Huss denunciou o abuso, foi citado, e viu dois dos seus discípulos condenados e executados. Nada
o deteve. Publicou um Tratado das indulgências, doze teses contra a bula do antipapa e dez sermões
sobre a anatomia do Anticristo. Excomungado pela segunda vez, deixou Praga a pedido do
imperador, embora a população da cidade se tivesse levantado em seu favor e contasse com
partidários na nobreza. Escreveu então, sua obra principal De Ecclesia em 1412; Sobre a Igreja.
Intimado a comparecer perante o concílio de Constança, muniu-se de um atestado de ortodoxia,
dado pelo inquisidor Nicolau de Husinec, e de um salvo-conduto do imperador Sigismundo. Atacado,
no entanto, pelos representantes da Sorbonne, foi sentenciado à fogueira. Queimaram-no no próprio
dia da condenação.
No dia 5 de junho de 1415 Huss compareceu diante do concilio. Poucos dias antes João XXIII tinha sido
aprisionado e trazido de volta para constança, Huss teve seus piores conflitos com ele, era de seu supor
que a situação do reformador melhoraria. Mas sucedeu o contrario, como se tivesse tentado fugir ou se já
tivesse sido julgado. Foi acusado formalmente de ser herege, e de seguir as doutrinas de Wycliff. Huss
tentou expor suas opiniões, mas algazarra foi tamanha que ele não o pode. E a questão foi adiada para o
dia 7 do mês seguinte. Não tinha maneira de resolver o conflito. De Alily queria que Huss se submetesse ao
concilio, cuja autoridade não poderia ficar em duvida. O concilio pedia unicamente que Huss se submetesse
a ele, retratando-se das suas doutrinas, mas não o queria escutar, o cardeal Zabarella. O cardeal preparou
um documento que exigia de Huss que se retratasse e Huss respondeu o Apelo de Jesus Cristo, o único juiz
todo-poderoso e totalmente Justo. Em suas mãos eu deponho a minha causa, pois Ele há de julgar cada um
.
não com base em testemunhos falsos e concílios errados, mas na verdadeira justiça. O encarceraram por
vários dias para que fraquejasse, mas Huss continuou firme. Por fim no dia 6 de julho, ele foi levado para
o catedral de Constança. Ali, depois de um sermão sobre a teimosia dos hereges, ele foi vestido de
sacerdote e recebeu o cálice, somente para logo em seguida lha arrebatarem ambos, em sinal que
estava perdendo suas ordens sacerdotais. Depois lhe cortaram o cabelo para estragar a tonsura,
fazendo-lhe uma cruz na cabeça. Por ultimo lhe colocaram na cabeça uma coroa de papel decorada
com diabinhos, e o enviaram para a fogueira. A caminho do suplício, ele teve de passar por uma pira
onde ardiam seus livros. Mas uma vez o pediram que retratasse e mais uma vez ele negou com
firmeza. Por fim orou, dizendo: " Senhor Jesus, por ti sofro com paciência esta morte cruel. Rogo-te
que tenhas misericórdia dos meus inimigos." Morreu cantando os salmos. Os inimigos da verdade
queimaram na mesma fogueira as roupas de Huss, e lançaram no rio as suas cinzas. Mas o clarão
daquela fogueira jamais se apagou!
Além das suas atividades de reformador, Huss é venerado pelo povo da Tchecoslováquia como
patriota boêmio e propugnador da língua tcheca. Tinha, aliás, conquistado a simpatia popular em muitas
oportunidades, por seus vigorosos sermões em idioma puramente nacional e pela austeridade da vida que
levava. Quando se efetivou a sua condenação, Huss tinha acabado de negar-se à retratação de suas
doutrinas. "a menos que nelas se descobrisse alguma contradição com a Bíblia sagrada". Vale salientar que
o conflito de pensamento surgiu nos círculos universitários. Pouco antes tinha começado a chegar a
Praga as obras Wycliff, que contribuiu para o pensamento de Huss. Ao se firmar a sentença, o mártir
encarou fixamente o imperador Sigismundo, que se cobriu de vergonha ante a cabal violação de seu salvo-
conduto. O grande reformador enfrentou as chamas com um estado de ânimo exemplar, atribuindo-se-lhe
as palavras: "Estou preparado para morrer na verdade do Evangelho, que ensinei e escrevi".

HUSSITAS. Chegando a Praga a notícia do suplicio de Huss, assumiu feição revolucionária o


movimento hussita, que, além de reivindicações religiosas, apresentava reivindicações sociais e
nacionalistas, de caráter antigermânico. Decidiram seus adeptos recusar obediência à Igreja romana.
Uma assembléia de hussitas da Boêmia e da Morávia enviou ao concílio de Constança solene
protesto contra a execução de seu chefe (2-09-1415). Seguiu-se a formação de uma liga de homens
resolvidos a não acatar as decisões do concílio e a incrementar, em seus domínios, a livre pregação da
palavra de Deus. Para chefe espiritual, escolheram a universidade de Praga e como emblema o cálice,
símbolo da comunhão sob as duas espécies (sub utraque specie) reclamada pelos hussitas. Daí vieram às
expressões utraquismo e utraquista.
Em oposição a essa liga, outra surgiu dias depois, fundada por nobres católicos da Boêmia. A
atitude inflexível de Sigismundo, acusado de haver deixado que o concílio condenasse João Huss, provocou
distúrbios em vários pontos da Boêmia e muitos padres fiéis a Roma foram expulsos de suas paróquias.
Influenciado por Sigismundo, seu irmão. Venceslau IV, rei da Boêmia, tentou repelir o movimento. Chamou
os padres vitimas da expulsão e, para o conselho da cidade nova, nomeou ferrenhos adversários dos
rebeldes. Acirraram-se os ânimos. Em Praga, sucediam-se os distúrbios. A 30 de julho de 1419, do edifício
do Conselho, atiravam pedras numa procissão hussitas que desfilava pela rua. O povo, encabeçado por Jan
Zizka, invadiu o prédio e jogou pela janela o burgomestre e vários conselheiros, logo mortos pela multidão.
Em conseqüência, sofreu o rei Venceslau um ataque apopléctico, morrendo dias após. A questão sucessória
veio complicar ainda mais o problema, já que aos tchecos desagradava o herdeiro legal da coroa,
Sigismundo.
Estiveram os hussitas quase desde o início divididos em duas grandes correntes:
moderados ou utraquistas, e radicais ou taboritas, do nome bíblico de Tabor, dado ao seu principal
reduto. Destacava-se Tabor pela organização democrática e a severa disciplina das tropas, comandadas
por Zizka. Em matéria religiosa, reclamavam também o cálice, mas entre outras divergências, só
admitiam dois sacramentos: batismo e comunhão. Em meados de 1420, promulgavam os hussitas os
Quatro Artigos de Praga, que resumiam a essência de sua doutrina: (1) livre pregação da palavra e
Deus; (2) comunhão sob ambas as espécies; (3) abolição do poder temporal da Igreja e volta do
clero à pobreza apostólica; (4) punição por todos os pecados mortais e atos públicos contrários à lei
de Deus.
Recusando Sigismundo esses artigos, prosseguiram as hostilidades e, em pouco, toda a
Boêmia caia em poder dos hussitas. Sob o comando, primeiro, de Zizka e, depois, de Procópio o
Calvo, obtém seus exércitos brilhantes e sucessivas vitórias derrotando todas as Cruzadas contra
eles dirigidas. Entretanto, graves dissensões internas entre utraquistas, taboritas e outras seitas conduzem
à guerra civil, impedindo o aproveitamento daquelas vitórias.
Sempre unidos contra Roma e o Império, a partir de 1427 passaram os hussitas à ofensiva,
transpondo muitas vezes as fronteiras da Boêmia. A questão da paz foi debatida no Concílio de Basiléia,
reunido no mesmo ano, com a participação de delegados hussitas. Habilmente souberam os padres
tirar partido da oposição entre utraquistas e taboritas. Recrudescendo na Boêmia a guerra civil,
.
tropas utraquistas aniquilaram as taboritas em Lipam (1434) a vitória dos moderados e a morte de
Procópio o Calvo, principal chefe taborita, possibilitaram a conclusão das negociações. Firmou-se
em acordo, consignado nos Compactata de 1436, aceito por Sigismundo, pelos hussitas e pela Santa Sé.
Aos tchecos, ficava assegurado o cálice. Em 1452, George de Podebradv ocupou Tabor e estabeleceu o
utraquismo. Em 1458, seria elevado ao trono da Boêmia e, mais tarde, excomungado pelo para Pio II.
A Comunidade dos Irmãos Boêmios manteve, até certo ponto, as tradições taboritas. Forneceu, nos
sécs. XV e XVI, alguns dos maiores adversários da Igreja romana na Boêmia. Iniciado o movimento
da Reforma numerosos utraquistas nele ingressaram e, em 1567, obtiveram a revogação dos
Compactata.
Jerônimo de Praga continuou a gloriosa obra de Huss e também pereceu na fogueira, na
mesma cidade de Constança, no ano de 1416. Cumpriu corajosamente sua missão. Antes de expirar,
assim se expressou em relação aos seus carrascos: “Senhor, Pai Todo-poderoso, tem piedade de mim e
perdoa meus pecados; pois sabes que sempre amei tua verdade”. Sua voz cessou, mas os lábios
continuaram a mover-se em oração. Tendo o fogo efetuado a sua obra, as cinzas do mártir, como a erra
sobre a qual repousavam, foram reunidas, como as de Huss, e lançadas no Reno.

III) FLORENTINO SAVONAROLA (1452-1498)

Wycliffe e Huss foram estigmatizados como hereges que colocaram a Bíblia como o primeiro
padrão da autoridade; Savonarola, porém estava mais interessado na reforma da Igreja em Florença.
Depois de se fazer monge dominicano em 1474, foi designado para Florença alguns anos depois. Ele
procurou reformar o Estado e a Igreja na cidade, mas sua pregação contra a vida desregrada do
papa provocou a sua morte pôr enforcamento. Mesmo sem chegar às posições vanguardistas de
Wycliffe e Huss, ele exigiu a reforma da Igreja Romana.
Todos estes três homens anteciparam o espírito e a obra dos Reformadores de tal modo que
Wycliffe, o principal expoente de medidas reformadoras, foi chamado de "Estrela D’Alva da
Reforma".

Conheçamos mais alguns Precursores da Reforma Protestante

IV) Cláudio de Turim

Viveu entre os séculos VII e IX, tendo morrido no ano 832. Foi bispo em Turim, grande cidade
do Norte da Itália. Discípulo de Agostinho na Teologia, opôs-se, entretanto, ao sacerdotalismo. Cria no
sacerdócio universal dos crentes (sem necessidade de mediadores, santos, sacerdotes); tirou as
imagens das igrejas que estavam sob sua jurisdição; condenou hábito da invocação dos santos; não
aprovou o costume das orações pelos mortos. Para que tenhamos uma idéia do valor de suas
posições, é bom que lembremos que o Sétimo concílio Ecumênico, realizado em Nicéia no ano 787,
havia oficializado o culto às imagens.

V) Pedro de Bruys e Henrique de Lausane

Um desses movimentos teve lugar no sudeste da França sob a chefia de Pedro de Bruys e
Henrique de Lausane. Eles se opunham as superstições dominante na Igreja, a certas formas de
culto e a imoralidade do clero. Este movimento chamado "Petrobrussiano" e "Henriquianos",
desenvolveu-se por uma vasta região, e muita gente de todas as camadas sociais a eles aderiram,
abandonando as Igrejas e escarnecendo o clero.
Tanto Pedro de Bruys quanto Henrique de Lausane, viveram no início do século XII. Suas
doutrinas eram as mesmas. Acreditavam que o Cristianismo deveria ser simples, mas poderoso no
efeito sobre os homens; salvação pela fé; rejeitavam o Batismo infantil; eram contra o uso de
imagens no culto; a ceia era um memorial; insistiam na autoridade da Bíblia sobre os pais da Igreja.
Pedro de Bruys foi queimado vivo em 1124 e Henrique de Lausane morreu na prisão em 1148.

VI) Arnaldo de Brescia (1155)

Discípulo de Abelardo, pregava que a Igreja não devia ter propriedades; que o governo civil
pertencia ao povo; que Roma devia ser liberta do papado. Ele foi enforcado, a pedido do Papa
Adriano IV.

VII) Os Cataristas

.
Outra força relacionada com este movimento foi o poderoso partido religioso dos cataristas
que se desenvolveu grandemente aos fins do século 12 e durante o século 13. Na realidade foi uma
igreja rival, pois possuía a sua própria organização, o seu ministério, o seu credo, culto e sacramentos. O
credo era uma estranha mistura de Cristianismo e idéias religiosas orientais. Pensavam eles que a matéria
fora criada por satanás e que ela era a sede e fonte de todo o mal. Daí não poderem eles acreditar
que o Filho de Deus tivesse tido um corpo e vida humana. Por isso julgavam que o caminho para a
santidade era fugir do poder da carne, negando os seus desejos ou deles fugindo pelo suicídio. Suas
vidas abnegadas e de moral irrepreensível constituíam uma reprimenda ao clero que usava o nome de
cristão. O culto e o sacramento eram modelados pelos da Igreja, mas livre dos elementos
supersticiosos e do formalismo. Embora não fossem cristãos completos, representavam o desejo
generalizado de uma religião melhor do que a igreja papal oferecia. Os Cataristas se espalharam pela
Itália, França, Espanha, Países Baixos e Alemanha. Foram mais fortes no sudeste da França, onde foram
chamados Albigenses (da cidade de Albi).
Em toda parte os Cataristas foram caçados pela Inquisição, que fora organizada,
principalmente, por causa deles. Contra os Albigenses ali, foi desencadeada, sob as ordens de Inocêncio
III, uma terrível guerra de extermínio que durou vinte anos, assolando a França e dizimando a sua
população naquela parte considerada o seu jardim. As ordens dos franciscanos e dominicanos foram
organizadas após o aparecimento dos Cataristas, como prova de que dentro da própria Igreja era
reconhecida a sua negligência, especialmente no que se refere à pregação e à instrução religiosa. Mas,
como já vimos, essas ordens perderam muito da sua vitalidade ao fim da Idade Média.
Pregaram contra as imoralidades do clero, contra as peregrinações; contra o culto aos
santos e imagens; rejeitavam o clero; opunham-se às pretensões da Igreja de Roma; faziam
freqüente uso das Escrituras Sagradas. Em 1167 eram a maioria da população da França, e em 1200,
eram muito numerosos no norte da Itália. Em 1208, o Papa Inocêncio III, ordenou guerra contra eles.
A guerra foi sangrenta: cidades passadas à espada; o povo foi massacrado, sem se poupar idade
nem sexo. Com o estabelecimento da inquisição, em 1229, dentro de 100 anos foram totalmente
aniquilados.

VIII) Pedro Valdo

Em 1176, o rico comerciante Valdez ou Valdo, da cidade de Lion (centro da França) movido
pelo ensino do capitulo 10 do evangelho de Mateus (Os doze e a missão), converteu-se e começou a
distribuir o seu dinheiro e bens com os pobres, e tornou-se um pregador ambulante do evangelho.
Muitas pessoas se reuniam para ouvir suas mensagens simples, porém, fiéis às escrituras.
Estas pessoas o ajudaram no trabalho dentro da Igreja, não obstante manifestaram, de início, o seu
protesto contra descaso dessa Igreja.
Em 1179, os Valdenses, foram proibidos de pregarem o evangelho pelo Papa Alexandre III e
excomungados em 1184, pelo Papa Lúcio III. Expulsos e considerados inimigos começaram a se
organizar como igreja à parte. Ao fim da idade média já encontramos os Valdenses completamente
organizados e espalhados por toda a Europa Ocidental.
Apesar de constantemente caçados pela Inquisição, eram intensamente ativos no ensino do
evangelho. Eles primavam pela pureza moral; rejeitavam o batismo de crianças, que era reservado
para quem pudesse crer; não criam na substanciação; não criam em imagens, nem cultuavam a
Maria; só reconheciam em matéria de fé e prática, a autoridade da Bíblia. Ainda distribuíam partes
manuscritas da Bíblia na língua do povo.
Exceto nos vales alpinos, onde ainda existem, são eles hoje a principal denominação
Protestante na Itália.

IX) Os Irmãos

Muitos semelhantes aos Valdenses eram os dissidentes que a si mesmos chamavam de


"Irmãos". Estas pessoas tinham uma fé cristã muito simples e eram conhecidas onde viviam por
suas vidas cheias de bondade e pureza incomuns. Nada tinham com a Igreja ou seu clero, e
realizavam o culto na língua comum do povo. Apreciavam a leitura da Bíblia e possuíam muitas
cópias de manuscritos de tradução da Bíblia ou de algumas das suas partes. As sociedades dos
"Irmãos" se espalharam pela Europa, correspondendo-se e realizando trabalho em conjunto missionário
muito ativo, porém em segredo, por causa das perseguições. Eram numerosos entre os camponeses e
operários das cidades, particularmente na Alemanha.
A igreja, porém, nada aprendeu com essa generalizada onda de protestos. Sua única
resposta foi a Inquisição. Tal atitude era uma profecia de sua própria condenação.

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Portanto, Erasmo, ao nível da crítica intelectual, John Huss e Wycliffe, ao nível dos movimentos
populares e demais pessoas aqui estudadas podem ser considerados os precursores da Reforma.

Biografia de Reformador Alemão Martinho Lutero

Martinho Lutero nasceu em 10 de novembro de 1483, na Alemanha, na vila de Eislebem. Aos 18


anos, em 1501, seu pai, desejando torná-lo advogado, o enviou para a Universidade de Erfurt. Mas uma
convulsão assaltava o jovem Lutero – ele tinha uma percepção de toda a miséria de seu coração. Contra a
ira de Deus, Lutero pateticamente buscava refúgio junto à Virgem e aos santos. O fato decisivo que o
levou, aos 22 anos, a ingressar, em 1505, no convento dos Cônegos Agostinianos foi o medo da
morte, por causa de uma violenta tempestade que desabou perto dele, quando retornava de sua casa
para a Universidade. Por causa de seus pecados, mesmo no mosteiro, tinha um espírito quebrantado e
estava sempre triste.
A partir do inverno de 1512, Lutero começou a pregar em Salmos (1513-1515), Romanos
(1515-1516), Gálatas (1516-1517), Hebreus (1517) e novamente Salmos (1518-1519). Através de seus
estudos das Escrituras, Lutero chegou a verificar que a culpa que o consumia não poderia ser retirada por
uma religião, e o Deus que ele tanto temia não era o Deus que Cristo havia revelado. Disparado da
Epístola aos Romanos (1.17), outro relâmpago cruzou seu caminho: "Noite e dia eu ponderei até que
vi a conexão entre a justiça de Deus e a afirmação de que ‘o justo viverá pela fé’. Então ele
compreendeu que a justiça de Deus era um ato gracioso e misericordioso ao destacar que Deus
justifica o homem através da fé. Toda a Escritura teve um novo significado e, se antes, a justiça de
Deus o enchia de ódio, agora ela se tornou inexprimivelmente doce em amor. Ele desvencilhou-se da
idéia medieval de que o homem faz-se justo. Lutero entendeu, seguindo o apóstolo Paulo nas
epístolas de Romanos e Gálatas, que Deus nos declara justos, baseado na perfeita obediência de
Cristo. Lutero disse que a doutrina da justificação pela graça, por meio da fé, é "o firme fundamento pelo
qual a igreja se mantém ou cai".
Lutero, além de professor em Bíblia, era o pastor da Igreja da cidade de Wittemberg, e
começou a pregar sua fé recém-descoberta para a congregação. Mas, ao mesmo tempo, um monge
chamado Johann Tetzel, representante do papa Leão X, estava vendendo indulgências. O monge
afirmava: "Não vale a pena atormentar-te: podes resgatar teus pecados com dinheiro! Pagando,
podes escapar dos sofrimentos do purgatório e aliviar os dos outros!", e tudo embalado pelo
cântico: "Quando uma moeda no fundo do cofre cai, a alma vai direto para o céu vai." Para Lutero,
isto era uma perversão do Evangelho! Em 31 de outubro de 1517 ele afixou, na porta da Igreja do
Castelo, em Wittemberg, as 95 teses que haveriam de marcar o princípio da Reforma.
Os eventos se sucederam com rapidez. Em 1518, Frederico, Eleitor da Saxônia, deu seu
apoio a Lutero. Em 1519, participou do debate de Leipzig. Em 10 de dezembro de 1520, Lutero
queimou os livros de "Direito Canônico" e a bula papal que o ameaçava de excomunhão. Em
começos de 1521, ele foi convocado a Worms, perante o Imperador Carlos V e os príncipes da
Alemanha, para dar contas de seu ensino. Depois de dois dias de debates, onde o que estava em
jogo era a autoridade das Escrituras, ao ser instado a retratar-se e retornar à comunhão com Roma,
Lutero exclamou: "Já que me pede uma resposta simples, darei uma que não deixa margem a
dúvidas: A não ser que alguém me convença pelo testemunho da Escritura Sagrada ou com razões
decisivas, não posso retratar-me. Pois não creio nem na infalibilidade do papa, nem na dos
concílios, porque é manifesto que freqüentemente se tem equivocado e contradito. Fui vencido
pelos argumentos bíblicos que acabo de citar e minha consciência está presa na Palavra de Deus.
Não posso e não quero revogar, porque é perigoso e não é certo agir contra sua própria
consciência. Que Deus me ajude. Amém." Era a noite de 18 de abril de 1521, e um novo dia raiou
para a cristandade.
Em 1529, os príncipes católicos reuniram-se em torno de uma resolução que impedia a
introdução da Reforma em seus territórios, mas reclamavam liberdade de culto romano nos
territórios conquistados pela Reforma. A recusa solene dos príncipes de "fé evangélica" (como se
chamavam) de concordar com esta imposição tornou-os conhecidos como "protestantes". Até sua
morte, com 62 anos, em 18 de fevereiro de 1546, na vila onde nasceu, em Eisleben, Lutero esteve
continuamente envolvido nas controvérsias de seu tempo. Por esta época, sua influência já se havia
espalhado não só pela Alemanha, mas também por partes da Holanda, Suécia, Dinamarca e Noruega.
Foi sucedido por seu amigo Filipe Melanchthon (1497-1560),o qual o ajudou a traduzir a Bíblia para o
alemão. Melanchthon, especialista em grego, e Aurogallus, especialista em hebraico, ajudaram muito nas
revisões para a tradução da Bíblia para o alemão.
Lutero traduziu o Novo Testamento do texto grego e o Velho Testamento do texto hebraico para o
alemão, pois seu povo não tinha acesso à Bíblia em seu idioma. Lutero defendeu um retorno à Bíblia.
.
Lutero inicialmente não desejava se casar, pois esperava diariamente a morte e a punição por
heresia”. Mas, em 12 de junho de 1525, ligou-se pelos laços do matrimônio a Catarina de Bora, da
nobreza rural da Saxônia. Lutero estava com 42 anos e ela, com 26. Catarina e mais oito freiras haviam
fugido do convento de Nimbsch e moravam em Wittenberg desde 1523. Ela era hóspede do pintor
Lucas Cranach. Desde os 10 anos até os 24, sua mulher esteve enclausurada.
Lutero teve três meninas e três rapazes. Isabel faleceu com oito meses e Madalena, com 14
anos. Margarida veio a casar-se com o vice-governador Kuhnheim. Dos homens, João formou-se em
Direito, Martinho foi pastor, e Paulo, médico.
O maior ensinamento de Lutero é que, todavia, a Palavra de Deus ensina e que ele custou a
descobrir que é que é “não podemos alcançar remissão dos pecados e justiça diante de Deus por
mérito, obra e satisfação nossas, mas pela graça, por causa de Cristo, mediante a fé, quando
cremos que Cristo padeceu e nos são dadas justiça e vida eterna” – formulando a justificação pela fé.
Por que o homem não pode alcançar a salvação mediante as obras, por exemplo, da própria Lei de
Deus? “Porque desde a queda no pecado, o homem natural é de todo incapaz para guardar a Lei de
Deus e o próprio cristão só a cumpre imperfeitamente”. Então, para que serve a lei? “A Lei serve para
um fim triplo. Em primeiro lugar, concorre para a manutenção da ordem e da honestidade exterior do
mundo, impedindo de certa maneira o desenfreamento grosseiro do pecado. Neste caso a Lei é freio. Em
segundo lugar, ensina de modo especial aos homens a reconhecerem verdadeiramente seus
pecados. Neste caso a Lei é espelho. Em terceiro lugar, mostra ao regenerado quais são
verdadeiramente as boas obras. Neste caso a Lei é norma”.

A REFORMA PROTESTANTE

Há 485 anos, no dia 31 de outubro de 1517, Martinho Lutero fixou suas famosas teses (total
de 95) contra a venda de indulgências, na porta da Igreja Católica do Castelo de Wittenberg, na
Alemanha, contrariando os interesses teológicos e, principalmente, econômicos da Igreja Católica. O
impacto foi tamanho, que se comemora nessa data o início da Reforma Protestante. Lutero foi, sem
dúvida, o grande precursor da liberdade religiosa atual e quem mais contribuiu para um retorno do
cristianismo às Escrituras.
A Reforma foi um movimento religioso que provocou uma revolução na Igreja Cristã do
século XVI, terminando com a supremacia eclesiástica do papado na Cristandade ocidental e
fundando as Igrejas Protestantes. Com o Renascimento, que a precedeu, e com a Revolução
Francesa, que lhe foi posterior, a Reforma alterou completamente a tradição medieval da Europa
ocidental e iniciou a era moderna na sua história. Apesar deste movimento datar do início do século XVI,
quando Martinho Lutero desafiou a autoridade da Igreja, as condições que explicam esta revolução já
existiam há séculos e têm complexas razões doutrinais, políticas, econômicas e culturais.
A preparação para a Reforma: No decorrer dos séculos, desde os tempos de Cristo, tem
havido um desvio daquilo que Jesus ensinou. No entanto, sempre se levantaram vozes em defesa da
pureza do Evangelho. Apesar do zelo, sempre existiram aqueles que se desviavam, trazendo para
dentro da Igreja práticas de outras religiões. Esses desvios, a princípio em número reduzido, foram
aumentando a ponto de paganizar a Igreja, transformando-a no que conhecemos hoje por Igreja
Católica.
No começo, foi apenas a inclusão da hierarquia onde o papa era o líder supremo; depois
vieram os batismos para a salvação, a adoração de santos, e outros, atingindo um patamar tal, que
por volta do século XIV, a Igreja Católica estava completamente envolvida no paganismo. Daí a
salvação passou a ser comercializada como qualquer outro objeto. Enquanto o cristianismo romano
se paganizava, muitas pessoas às quais o nome "cristão" fora negado, lutavam para que a Igreja
retornasse aos princípios do Novo Testamento. Entretanto, ela já havia se institucionalizado, e esses
reformadores passaram a ser acusados de hereges. Geralmente eram expulsos de suas congregações e
perseguidos, pagando, muitas vezes, com a vida, pelo zelo cristão. Até o século XIV, os protestos dessas
pessoas foram abafados; porém com o advento de uma nova mentalidade, que deu origem às
transformações políticas, sociais, científicas, literárias e mais, foram sendo notados.
Naquele período, as grandes descobertas marítimas, a invenção da imprensa, a descoberta
do maravilhoso mundo clássico da literatura e arte, até então perdidos, produziram um despertar da
natureza humana, que se processou de forma intensa e geral. Esse período ficou conhecido como
Renascença, movimento que produziu a energia necessária para a revolução religiosa que se daria
no século XVI. O grande nome dessa revolução religiosa foi Martinho Lutero, monge agostiniano.
que, revoltado contra a venda de indulgências, levantou a bandeira da liberdade religiosa frente à
corrompida Igreja Católica.

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O ressentimento contra os impostos do Papa e a submissão do clero à autoridade distante e
estrangeira do Papado manifestou-se também noutros países da Europa, o que contribuiu para que
ocorresse a Reforma.
O Cisma do Ocidente (1378-1417) fragilizou gravemente a autoridade pontifícia e tornou
premente a necessidade de reformar a Igreja. O Renascimento e a invenção da imprensa
reacenderam as críticas à Igreja: a corrupção e hipocrisia do clero em geral e, em particular, a
ignorância e superstição das ordens mendicantes; a ambição dos Papas, cujo poder temporal
originava divisões entre os crentes; e a teologia das escolas responsável pela deturpação e
desumanização da mensagem cristã. Estas críticas foram feitas por Lourenço Valla, na Itália do
século XV, e Erasmo de Roterdão, na Holanda, John Colet e Thomas More, na Inglaterra, Johann
Reuchlin, na Alemanha, e Jacques Lefèvre d’Étaples, em França, no século XVI, foram alguns dos
humanistas que procuraram conciliar o movimento humanista com a mensagem das Escrituras,
criticando algumas práticas da Igreja. Estas críticas serviram de base a Martinho Lutero e João
Calvino para clamarem pela Bíblia, mais do que a Igreja como fonte de toda a autoridade religiosa.
A época em que os reformadores viveram foi de grande inquietação. Foi o tempo do descobrimento
das Américas; imperadores, reis, generais e papas lutavam entre si, para tentar moldar a Europa
moderna; a Igreja Católica detinha a supremacia espiritual, cultural e política, e as tentativas de
reforma, como as de John Wycliffe (1328-1384) e Jan Huss (1373-1415) foram esmagadas. Surgiram
gênios como Erasmo, Miguelângelo, Da Vinci, Rafael, Colombo, Copérnico. A teologia de Lutero,
Zuwínglio, Calvino e dos demais reformadores foi uma resposta específica às ansiedades desta
época.
Na Reforma Protestante nós encontramos 3 eventos principais. Se entendermos estes três
eventos, iremos compreender a Reforma.
1) As 95 teses de 1517. Foi o protesto contra as indulgências e o primeiro manifesto contra a
prática “cristã” da Igreja Católica.
O primeiro evento - Na venda das indulgências havia variedades de preços. Para se certificar
de que tiraria dinheiro do bolso do povo, Tetzel criou um meio de atingir os ricos e os pobres. Quem
era rico, dava mais, quem era pobre dava menos, porém todos davam. Lutero ficou enfurecido com
isso e desenvolveu, a partir das Escrituras, 95 teses mostrando razões pelas quais essa prática era
inaceitável e não bíblica. Mas as 95 teses também eram a respeito da salvação. Era como se fosse uma
exposição bíblica do assunto. Ele pretendia que as 95 teses fossem uma plataforma para debate do
assunto. Por isso pregou-as na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Estavam escritas em latim
e constituíam um convite para um debate sobre o assunto. A imprensa escrita já havia sido inventada por
Gutemberg e a esta altura já havia jornalistas nessa época. Cada um deles pegou uma cópia e a traduziu
para o alemão moderno da época, vendendo-as a muitas pessoas. Em duas semanas estes escritos
estavam espalhados por toda a Europa. Os alemães, especialmente, foram muito tocados por essas
95 teses e a venda de indulgências caiu tremendamente. Ora, se você acerta o bolso de um homem,
realmente isso lhe dói bastante e profundamente. A partir daí a própria burguesia que se sentiu traída
pela Igreja Católica, passou a apoiar o pensamento de Lutero e a protegê-lo da perseguição da
Igreja. É interessante salientar que a burguesia contribuiu financeiramente porque, como a própria
Igreja Católica destacava, desejavam fugir do purgatório e da condenação eterna.
Os líderes católicos estavam muito preocupados e algo extraordinário havia acontecido.
Lutero havia chamado a atenção das pessoas para as Escrituras, havia alertado as pessoas para a
autoridade da Bíblia. As indulgências eram contra a Bíblia. Lutero havia puxado a corda do sino que
acordara o mundo! Depois de mil anos a Igreja estava agora acordada para a realidade. De repente Lutero
se tornou conhecido por toda a Europa e teria de responder por suas ações. Felizmente ele tinha um
amigo, o príncipe Frederico, o qual tinha muita influência política. Dessa forma, na hora que se fazia
necessário, ele vinha em defesa de Lutero. Porém, ainda assim, Lutero teve de prestar contas ao
Cardeal. Ele achava que iria ser martirizado e que fariam com ele o mesmo que fizeram com John
Huss, quando o queimaram vivo (precursor da Reforma).
Como resultado dos debates, outros escritos surgiram. Quanto mais eles desafiavam o
reformador, mais ele escrevia. Frederico, o príncipe, havia tido um sonho e nele viu um sacerdote que era
Lutero. A caneta de Lutero ficava cada vez mais longa, de tal maneira que atingia Roma e tirava o chapéu
do papa. Isso foi exatamente o que aconteceu. Os livros de Lutero começaram a se espalhar e espalhar
o Evangelho. Ele começou a expor os abusos da igreja católica. Expôs a doutrina da justificação
pela fé somente, e enfatizou o sacerdócio de todos os crentes. Essas publicações venderam muitos
números e todo mundo queria adquirir um exemplar. Um livro leva a outro e todos eram expositivos no
seu estilo.
2) A queima das leis (bulas) católico-romanas. Isso aconteceu quando Lutero foi excomungado
pelo papa em 1520, o qual não mediu esforços para lançá-las no fogo.

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O Segundo Evento - O papa teve de tomar uma medida drástica e apelou para a excomunhão
de Lutero tendo em vista as afirmações de Lutero nas 95 teses. Isso nos leva ao segundo evento da
Reforma. O fato de ser excomungado da igreja era uma coisa muito séria. Havia toda uma papelada
necessária e que era muito grande, todas com o selo papal e uma oração que dizia: " Levanta-te
Senhor contra este porco que invadiu Tua vinha". Essa linguagem irritou a Lutero que ficou ainda
mais irado. A excomunhão fazia também com que ninguém tivesse o direito de ler os livros de Lutero
e todos que os lessem corriam o risco de vida. A excomunhão de Lutero foi projetada de forma que
as pessoas não mais lessem seus livros. Mas havia um pequeno espaço de tempo de " misericórdia",
pois teria 60 dias para se arrepender de tudo. Eles criam que nesse prazo Lutero voltaria
arrependido. Foi um grande erro deles, porque a cada dia que se passava Lutero ficava mais irritado.
No 60º dia Lutero organizou um evento grandioso. Juntou todos os professores da
Universidade, os alunos e todos os amigos e anunciou que haveria uma cerimônia de "queima" de
alguma coisa. Na cidade de Wittenberg havia um portão através do qual saía todo o lixo da cidade.
Lutero pediu que fosse construída uma grande fogueira do lado de fora da cidade. Os professores e
alunos e todos que estavam ali fizeram como que uma procissão cerimonial e juntaram todas a leis
da igreja católica, leis papais, bulas papais que havia se acumulado durante séculos. Leis que
amarravam e amarram as consciências dos homens. Todo aquele ensino católico romano que era
destinado a fazer com que os homens ficassem escravizados àquelas leis. Todos estes livros foram
levados por aqueles que estavam à frente da procissão, atravessaram o portão da cidade e
chegaram à fogueira. Lutero ordenou que todos estes livros fossem jogados à fogueira, um após o
outro e que dessa forma representavam as leis e tradições que haviam se acumulado através dos séculos,
mantendo as pessoas escravas. Quando estes livros estavam na fogueira, Lutero tirou do seu hábito o
decreto papal, o documento da excomunhão, jogou-o na fogueira e disse: "Já que vocês destruíram
a verdade de Deus, que o Senhor consuma vocês nestas chamas". Foi um ato de muita coragem,
preparado para que as pessoas tivessem ousadia e coragem. Dessa forma Lutero se tornou corajoso e
conhecido pelo povo. Assim, quando o papa mandou emissários para impor nova excomunhão a
Lutero, esse povo os expulsou. Foi um quadro muito interessante ver os emissários do papa fugindo
pela primeira vez. Foram recebidos com paus e pedras o que serviu de " prato cheio" para os
chargistas da época. No entanto temos de ver um princípio bíblico importante aqui. Lutero estava
usando a autoridade das Escrituras para destruir a tradição.
Nós precisamos nos lembrar o que Jesus disse aos fariseus: vocês destruíram a Palavra de
Deus com as suas tradições. Isso foi exatamente o que Lutero disse. A Palavra de Deus é a verdade e
precisamos destruir a tradição humana libertando as pessoas. Então um movimento grandioso se espalhou.
A igreja fez de tudo para tentar amarrar Lutero, mas a cada tentativa de fazê-lo retroceder, havia
fracassos sucessivos. Só havia um método que faltava e a igreja católica apelou para ele, o poder
político de Carlos V que era o imperador e na realidade representava o poder civil e a igreja. Então
ele recebeu ordens para comparecer diante de Carlos V e isso foi organizado na cidade de Worms,
onde seria Lutero julgado diante do Imperador. Eles tinham certeza de que Lutero iria fraquejar
diante do imperador, pois pensavam que seu sistema nervoso não suportaria a pressão psicológica.

3) A posição firme de Lutero diante do Rei Carlos V em 1521, o qual defendeu firmemente os
seus pontos de vista sem temor, preparando-se assim para a morte.
O terceiro evento - Aqui chegamos ao terceiro evento da Reforma: Lutero diante do
imperador. Ele pensou que jamais sobreviveria a tudo aquilo. Viajou com alguns amigos para a
cidade de Worms e quando chegou à cidade, mais de 2.000 simpatizantes vieram encorajá-lo. Ele
chegou e ficou diante do Imperador. Todos ficaram surpresos, pois Lutero disse que precisava de
mais tempo para pensar e considerar as questões colocadas diante dele. Alguns pensaram que ele
estava começando a fraquejar. Lutero deveria comparecer no outro dia diante do imperador. Havia
tanta gente interessada neste evento que eles tiveram de ocupar o auditório mais amplo que havia
na cidade. No dia seguinte, Lutero apareceu. Sobre a mesa estavam todos os seus livros e exigiam
dele que tirasse todos aqueles livros dali e os renegasse a todos. O homem que o interrogava
chamava-se John Eck e era um homem muito eloqüente. Ele perguntou a Lutero como ousava
desafiar toda a igreja e como podia concluir ser o único certo e todos os demais errados; como
todos os papas podiam estar errados, todos os cardeais, toda a história da igreja? Será que Lutero
podia desafiar a todos eles? Não seria a hora de Lutero negar todos aqueles escritos e confessar
que estava errado?
Mas Lutero tinha uma capacidade muito grande de argumentar e colocar a sua defesa. Ele
disse que não conseguia encontrar nada em seus livros que fossem de encontro à Bíblia. Lutero
disse que achava ter dito algumas palavras duras a respeito de algumas pessoas, alguns líderes,
mas que havia boas razões para ter feito aquilo e mesmo isso não ia de encontro à Bíblia. "Por que
tenho de negar estes livros e retirá-los?", perguntou Lutero. Então John Eck disse-lhe: "Se seus
.
primeiros livros foram ruins, os últimos são piores ainda. Você precisa renunciar agora a sua
heresia. Você é a mesma coisa que Wycliffe e Huss (referindo-se aos precursores das reforma);
agora, será que você, sem muitas desculpas, nega os seus livros e os retira? É o momento de sua
última chance de renunciar aos seus erros. Negue estes livros!". Lutero se dirige ao Imperador e a
todos aqueles líderes que estavam ali e responde: "Não vou usar de mais argumentos e a menos
que seja convencido pela Bíblia, não aceito a autoridade papal, nem os concílios de tradição
católicos. Todos eles se contradizem. Minha consciência está cativa à Palavra de Deus. Tudo que
posso fazer é não negar os meus livros, pois não posso ir de encontro a minha consciência e a
Palavra de Deus. Ajuda-me Senhor Deus! Amém."
Houve um tremendo silêncio naquele lugar. Lutero havia ido de encontro a mil anos de
tradição da igreja, contra os papas e desafiava até o Imperador. Assim, o imperador, após análise
dos seus argumentos expostos oralmente e em livro, ordenou que o deixasse ir, pois de fato, não
havia prova suficiente para incriminá-lo no inciso referente a “apóstata da fé”. Todos, então o
deixaram livre. Os italianos que ali estavam presentes começaram a ranger os dentes, pois o
odiavam, mas à medida que saía daquele lugar, os alemães batiam palmas para ele. Um fato curioso
é que alguns líderes mundiais que ali se encontravam vindo da Suécia, Inglaterra e Escócia, antes
que Lutero saísse, exigiram que ele fizesse sua defesa em latim e ele o fez repetindo cada palavra
em latim. Certo autor tem dito que essa, talvez, tenha sido a hora mais brilhante na história da raça
humana, pois diferentes partes do mundo, mais precisamente, da Europa, partiram para suas terras
com as verdades contidas nos livros e fala de Lutero. Foi realmente um evento memorável.
Quando Lutero ia chegando à sua cidade ele disse: "Mesmo que todas as telhas dos
telhados da cidade fossem demônios, ainda assim, eu iria àquela cidade", referindo-se à cidade de
Worms.

CONHECENDO AS 95 TESES DE LUTERO

Debate para o esclarecimento do valor das indulgências.


Por amor à verdade e no empenho de elucidá-la, discutir-se-á o seguinte em Wittenberg, sob a
presidência do reverendo padre.
Martinho Lutero, mestre de Artes e de Santa Teologia e professor catedrático desta última, naquela
localidade. Por esta razão, ele solicita que os que não puderem estar presentes e debater conosco
oralmente o façam por escrito, mesmo que ausentes.

Em nome do nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.


5. O papa não quer nem pode dispensar de quaisquer penas senão daquelas que impôs por decisão própria
ou dos cânones.
10. Agem mal e sem conhecimento de causa aqueles sacerdotes que reservam aos moribundos penitências
canônicas para o purgatório.
11. Essa erva daninha de transformar a pena canônica em pena do purgatório parece ter sido semeada
enquanto os bispos certamente dormiam.
21. Erram, portanto, os pregadores de indulgências que afirmam que a pessoa é absolvida de toda pena e
salva pelas indulgências do papa.
24. Por isso, a maior parte do povo está sendo necessariamente ludibriada por essa indistinta promessa de
absolvição da pena.
27. Pregam doutrina humana os que dizem que, tão logo tilintar a moeda lançada na caixa, a alma sairá
voando [do purgatório para o céu].
28. Certo é que, ao tilintar a moeda na caixa, podem aumentar o lucro e a cobiça; a intercessão da Igreja,
porém, depende apenas da vontade de Deus.
32. Serão condenados em eternidade, juntamente com seus mestres, aqueles que se julgam seguros de
sua salvação através de carta de indulgência.
33. Deve-se ter muita cautela com aqueles que dizem serem as indulgências do papa aquela inestimável
dádiva de Deus através da qual a pessoa é reconciliada com Deus.
36. Qualquer cristão verdadeiramente arrependido tem direito à remissão pela pena e culpa, mesmo sem
carta de indulgência.
37. Qualquer cristão verdadeiro, seja vivo, seja morto, tem participação em todos os bens de Cristo e da
Igreja, por dádiva de Deus, mesmo sem carta de indulgência.
43. Deve-se ensinar aos cristãos que, dando ao pobre ou emprestando ao necessitado, procedem melhor
do que se comprassem indulgências.
45. Deve-se ensinar aos cristãos que quem vê um carente e o negligencia para gastar com indulgências
obtém para si não as indulgências do papa, mas a ira de Deus.

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46. Deve-se ensinar aos cristãos que, se não tiverem bens em abundância, devem conservar o que é
necessário para sua casa e de forma alguma desperdiçar dinheiro com indulgência.
50. Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa soubesse das exações dos pregadores de indulgências,
preferiria reduzir a cinzas a Basílica de S. Pedro a edificá-la com a pele, a carne e os ossos de suas
ovelhas.
51. Deve-se ensinar aos cristãos que o papa estaria disposto - como é seu dever - a dar do seu dinheiro
àqueles muitos de quem alguns pregadores de indulgências extraem ardilosamente o dinheiro, mesmo que
para isto fosse necessário vender a Basílica de S. Pedro.
52. Vã é a confiança na salvação por meio de cartas de indulgências, mesmo que o comissário ou até
mesmo o próprio papa desse sua alma como garantia pelas mesmas.
53. São inimigos de Cristo e do papa aqueles que, por causa da pregação de indulgências, fazem calar por
inteiro a palavra de Deus nas demais igrejas.
62. O verdadeiro tesouro da Igreja é o santíssimo Evangelho da glória e da graça de Deus.
65. Por esta razão, os tesouros do Evangelho são as redes com que outrora se pescavam homens
possuidores de riquezas.
66. Os tesouros das indulgências, por sua vez, são as redes com que hoje se pesca a riqueza dos homens.
67. As indulgências apregoadas pelos seus vendedores como as maiores graças realmente podem ser
entendidas como tal, na medida em que dão boa renda.
73. Assim como o papa, com razão, fulmina aqueles que, de qualquer forma, procuram defraudar o
comércio de indulgências,
74. muito mais deseja fulminar aqueles que, a pretexto das indulgências, procuram defraudar a santa
caridade e verdade.
75. A opinião de que as indulgências papais são tão eficazes a ponto de poderem absolver um homem
mesmo que tivesse violentado a mãe de Deus, caso isso fosse possível, é loucura.
76. Afirmamos, pelo contrário, que as indulgências papais não podem anular sequer o menor dos pecados
veniais no que se refere à sua culpa.
80. Terão que prestar contas os bispos, curas e teólogos que permitem que semelhantes conversas sejam
difundidas entre o povo.
82. Por exemplo: por que o papa não evacua o purgatório por causa do santíssimo amor e da extrema
necessidade das almas - o que seria a mais justa de todas as causas -, se redime um número infinito de
almas por causa do funestíssimo dinheiro para a construção da basílica - que é uma causa tão
insignificante?
84. Do mesmo modo: que nova piedade de Deus e do papa é essa: por causa do dinheiro, permitem ao
ímpio e inimigo redimir uma alma piedosa e amiga de Deus, porém não a redimem por causa da
necessidade da mesma alma piedosa e dileta, por amor gratuito?
85. Do mesmo modo: por que os cânones penitenciais - de fato e por desuso já há muito revogados e
mortos - ainda assim são redimidos com dinheiro, pela concessão de indulgências, como se ainda
estivessem em pleno vigor?
86. Do mesmo modo: por que o papa, cuja fortuna hoje é maior do que a dos mais ricos Crassos, não
constrói com seu próprio dinheiro ao menos esta uma basílica de São Pedro, ao invés de fazê-lo com o
dinheiro dos pobres fiéis?
90. Reprimir esses argumentos muito perspicazes dos leigos somente pela força, sem refutá-los
apresentando razões, significa expor a Igreja e o papa à zombaria dos inimigos e desgraçar os cristãos.
91. Se, portanto, as indulgências fossem pregadas em conformidade com o espírito e a opinião do papa,
todas essas objeções poderiam ser facilmente respondidas e nem mesmo teriam surgido.
92. Fora, pois, com todos esses profetas que dizem ao povo de Cristo: "Paz, paz!" sem que haja paz!
93. Que prosperem todos os profetas que dizem ao povo de Cristo: "Cruz! Cruz!" sem que haja cruz!
94. Deve-se exortar os cristãos a que se esforcem por seguir a Cristo, seu cabeça, através das penas, da
morte e do inferno;
95. e, assim, a que confiem que entrarão no céu antes através de muitas tribulações do que pela segurança
da paz.
1517 A.D.

** Conheçamos agora como a Reforma Protestante foi sendo desencadeada nos países
europeus

Os Movimentos Nacionais a Favor da Reforma Protestante

1) A Alemanha e a Reforma Luterana

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A SITUAÇÃO DA ALEMANHA NA ÉPOCA DA REFORMA

Na Alemanha, o poder real era fraco. O chamado Santo Império Romano Germânico era formado
por uma multiplicidade de principados, nos quais o poder político era exercido pela grande nobreza. A
dinastia dos Habsburgos (imperadores do Sacro Império), necessitava do apoio do Papa para manter
sua frágil hegemonia sobre os principados. Uma grande quantidade de terras do Sacro Império
pertencia às instituições eclesiásticas. O maior comércio de indulgências era o da Alemanha.
Era nessa região que a igreja obtinha as suas maiores rendas. No entanto, mesmo detentora
do poder, a Igreja Católica, sentiu-se enfraquecida diante das contradições entre as várias classes
sociais, e para algumas classes sociais o inimigo mais comum era a própria Igreja Católica.
A nobreza feudal tinha interesse em apoderar-se das terras da igreja; a grande burguesia
queria um clero menos custoso e ao mesmo tempo desejava impedir a fuga de capitais para Roma;
os camponeses e os artesãos viam na igreja o seu grande explorador, com a cobrança dos dízimos,
das rendas feudais, etc. Portanto, estes inconformismos com a Igreja Católica, levaram a Alemanha a
realizar a Reforma Protestante.
Um outro fator responsável pelo surgimento da Reforma foi o desenvolvimento do
humanismo na Alemanha, com o aparecimento das Universidades. Esses humanistas satirizavam a
vida dissoluta do clero, a moral religiosa medieval e as instituições eclesiásticas.
Entretanto, o fator imediato responsável pela deflagração da Reforma na Alemanha foi à
venda de indulgências. O para Leão X, necessitando de dinheiro para a construção da Basílica de
São Pedro, encarregou o monge Tetzel de vender as indulgências na Alemanha. Este levou ao máximo
tal comércio. Lutero, um monge agostiniano, afixou na igreja de Wittenberg, onde era pregador, as 95
teses, combatendo a venda de indulgências. Em virtude dessa atitude, Lutero foi ameaçado de
excomunhão pelo papa Leão X, caso não voltasse atrás. Lutero recusou-se a uma retratação, sendo
excomungado e convocado a comparecer frente à Dieta Imperial, que iria se reunir em Worms, para
ser julgado. Nessa Assembléia, pelo fato de muitos príncipes eleitores serem também hostis à Igreja,
nada foi feito contra o monge. Entretanto, o imperador Carlos V fez passar um édito, declarando
Lutero fora da lei. Todavia, passado o perigo da perseguição pelos soldados do rei, Lutero reiniciou
a sua luta e o édito nunca foi posto em execução. A partir daí, a reforma proposta por ele expandiu-
se pela Alemanha. Portanto, o grande responsável pela Reforma Protestante na Alemanha e no
mundo europeu foi o próprio Martinho Lutero.

* PRINCÍPIOS E CARACTERÍSTICAS DA REFORMA LUTERANA

A religião luterana tinha um caráter nacional na medida em que rompeu com o papado e colocou os
pastores dessa igreja sob a direção dos príncipes alemães. A igreja luterana simplificou os rituais
religiosos, tendo excluído todos os sacramentos da igreja católica, exceto dois - o batismo e a
eucaristia (santa ceia) - segundo Lutero, instituídos pelo próprio Cristo. A confissão passava a ser
feita diretamente com Deus. Todo homem era considerado capaz de interpretar livremente a Bíblia. A
reforma luterana foi uma reforma moderada que favoreceu a nobreza feudal e a grande burguesia.
A nobreza feudal foi favorecida tanto pelo fato de que os pastores dessa igreja ficavam sob a
direção dos príncipes, como também pelo fato dela haver se apoderado das terras da igreja.
A grande burguesia foi favorecida, na medida em que se viu liberada das grandes obrigações
financeiras para com a igreja católica, permanecendo tais rendas na Alemanha.

* A JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ

O princípio básico da religião luterana foi o da justificação pela fé. Através desse princípio,
Lutero dava maior valor à fé do que às boas obras praticadas pelos fiéis como meio de ganhar a
salvação.

* ALGUMAS CONSEQÜÊNCIAS DA REFORMA LUTERANA

Apesar da diversidade das forças revolucionárias do século XVI, a Reforma teve grandes e
consistentes resultados na Europa ocidental. Em geral, o poder e a riqueza perdidos pela nobreza
feudal e pela hierarquia da Igreja Católica Romana foram transferidos para os novos grupos sociais em
ascensão e para a coroa. Várias regiões da Europa conseguiram a sua independência política,
religiosa e cultural. Mesmo em países como a França e na região da atual Bélgica, onde o Catolicismo
Romano prevaleceu, um novo individualismo e nacionalismo foram desenvolvidos na cultura e na
política. A destruição da autoridade medieval libertou o comércio e as atividades financeiras das
restrições religiosas e promoveu o capitalismo. Durante a Reforma, as línguas nacionais e a literatura
.
foram estimuladas através da difusão dos textos religiosos escritos na língua materna, e não em
latim. A educação dos povos foi, também, estimulada pelas novas escolas fundadas por Colet na
Inglaterra, Calvino em Genebra e pelos príncipes protestantes na Alemanha. A religião deixou de ser
monopólio de uma minoria clerical privilegiada e passou a ser uma expressão mais direta das
crenças populares. Todavia, a intolerância religiosa manteve-se inabalável e as diferentes Igrejas
continuaram a perseguir-se mutuamente, pelo menos, durante mais de um século.

- A Revolta dos Cavaleiros (1522-1523): Os cavaleiros pertenciam à pequena nobreza que estava
sendo empobrecida com a concentração da terra nas mãos dos grandes príncipes leigos e
eclesiásticos. Imbuídos da doutrina luterana, que pregava uma igreja nacional e a subordinação do
poder espiritual ao temporal, os cavaleiros levantaram-se contra os príncipes católicos. Essa revolta
liderada por Ulrich Von Wutten e Francis Von Sickingen foi rapidamente dominada pela grande
nobreza.
- A Guerra Camponesa de 1523-1525 (a Revolta Camponesa de Thomas Münzer): entre os seguidores
de Lutero, os mais radicais eram os anabatistas. Em matéria de religião, eram extremamente
individualistas, rejeitando qualquer sacerdócio e acreditando que Deus continuava a se comunicar
diretamente com os eleitos. Do ponto de vista social, a seita anabatista era composta por
camponeses empobrecidos, por aprendizes de tecelão, ou seja, pelas camadas mais baixas da
sociedade alemã. Seu principal líder era Thomas Münzer, que pregava o desaparecimento da
propriedade privada (visão socialista). Os camponeses e os aprendizes das cidades revoltaram-se contra
o domínio da grande e pequena nobreza, dos sacerdotes e dos cidadãos ricos das cidades.
Os camponeses revoltosos queriam que lhes fossem devolvidas as terras comunais,
usurpadas pelos senhores e a diminuição do tributo em espécie e em trabalho. Na Alemanha Central,
o movimento tornou-se tipicamente revolucionário, com os camponeses exigindo a abolição da
servidão e a posse comunitária da terra. Em toda a Alemanha eram queimados os conventos e os
castelos da nobreza feudal. Em algumas regiões, as cidades auxiliaram o movimento camponês.
A falta de união e organização das forças camponesas facilitou o seu esmagamento pela
grande nobreza, aliada aos cavaleiros, aos burgueses, à igreja luterana e à igreja católica. O próprio
Lutero incentivou o esmagamento dos camponeses. Mais de 100 mil foram mortos e Münzer foi
decapitado.
- A Paz Religiosa em Augsburgo: assim, as terras clericais passaram para a mão da grande nobreza.
Mesmo alguns bispos abandonaram a igreja católica e se tornaram senhores dos principados
eclesiásticos.
A igreja católica, vendo-se enfraquecida, permitiu que alguns príncipes católicos ficassem
com as suas terras. Mas, no período compreendido entre 1530-1540, houve um aumento do número de
príncipes protestantes.
Carlos V, imperador do Santo Império, era católico. Temendo perder a coroa para algum príncipe
protestante, pois o imperador era eleito pelos príncipes, Carlos V voltou-se contra os príncipes
protestantes. Os principados, vendo na ação do imperador uma tentativa de fortalecimento do seu
poder, agitaram-se. Alguns príncipes católicos se aliaram aos príncipes protestantes, que também
recebiam ajuda dos reis de França, e derrotaram Carlos V. Assumiu o poder Fernando I que, em 1555,
assinou a paz religiosa de Augsburgo, onde ficou estabelecido que a religião do príncipe seria a
religião do principado (cujus regio ejus religio). Assim sendo, o norte da Alemanha tornou-se
protestante e o sul, católico.
A Reforma Luterana, pelo fato de favorecer a nobreza feudal, expandiu-se pelos países
dominados por essa nobreza, tais como Suécia, Dinamarca e Noruega.
Portanto, a Reforma Protestante foi um movimento predominantemente de transformação religiosa,
iniciada fora da própria igreja e em oposição a ela. Seria um erro considerar a Reforma como puramente
um movimento religioso, pois este movimento teve implicações econômicas, políticas e sociais na
medida em que refletiu as lutas de classe entre nobreza, burguesia, artesãos e camponeses do início
da Idade Moderna.
Na Suíça, os responsáveis pela Reforma foram Ulrich Zwinglio e João Calvino.

Peregrinação espiritual: Lutero nasceu em 1483, em Eisleben, Alemanha, onde seu pai, de origem
camponesa, trabalhava em minas. A sua infância não foi feliz. Seus pais eram extremamente severos.
Durante toda a sua vida foi prisioneiro de períodos de depressão e angústia profunda, quando
aspirava pela salvação de sua alma. Em 1505, antes de completar 22 anos, ingressou - contra a
vontade de seu pai, que sonhava com a carreira de advogado para ele - no mosteiro Agostinho de
Erfurt. Dos motivos que o levaram a tal passo, esse acontecimento foi decisivo: duas semanas
antes, quando sobremaneira o temor da morte e do inferno o afligia, prometeu a santa Ana caso se
salvasse se tornaria um monge.
.
Portanto, a razão principal, foi o seu interesse pela própria salvação. Ingressou no mosteiro
como filho fiel da Igreja no propósito de utilizar os meios de salvação que ela lhe oferecia e dos quais o mais
seguro lhe parecia o monástico. Acreditava que, sendo um sacerdote, as boas obras e a confissão seriam
as respostas para suas necessidades, almejadas desde a infância. Mas não bastava. Embora tentasse ser
um monge perfeito - repentinamente castigava seu corpo, a conselho de seu superior - tinha consciência de
sua pecaminosidade e cada vez, por isso, tratava de sobrepor-se a ela. Porém, quanto mais lutava contra
esse sentimento, mais se apercebia de que o pecado era muito mais poderoso do que ele. Frente a essa
situação desesperadora, o seu conselheiro espiritual recomendou que lesse as obras dos místicos, mas não
adiantou; então, foi proposto que se preparasse para dirigir cursos sobre as Escrituras na
Universidade de Wittenberg.
A grande descoberta. É certo que, quando se viu obrigado a preparar conferências sobre a
Bíblia, Lutero começou a ver nelas uma possível resposta para suas angústias. Em 1513, começou a
dar aulas sobre Salmos, os quais interpretava cristologicamente. Neles, era Cristo quem falava. E
assim, viu Cristo passando pelas angústias semelhantes às que passava. Esse foi o princípio de sua
grande descoberta, que aconteceu provavelmente em 1515, quando começou a dar conferências
sobre a Epístola aos Romanos. Lutero confessou que encontrou resposta para as suas dificuldades, no
primeiro capítulo dessa Epístola. Essa resposta, no entanto, não veio facilmente. Não ocorreu de um dia
para outro. A grande descoberta foi precedida por uma grande luta e uma amarga angústia. O texto básico
é Romanos 1.17, no qual é dito que o Evangelho é a revelação da justiça de Deus, e era precisamente
essa justiça que Lutero não podia tolerar e dizia que odiava a frase "justiça de Deus". Nela, esteve
meditando dia e noite para compreender a relação entre as duas partes do versículo que diz "a
justiça de Deus se revela no evangelho", e conclui dizendo que "o justo viverá pela fé".
O protesto: A resposta foi surpreendente. Lutero concluiu que a justiça de Deus, em
Romanos 1.17. não se refere ao fato de que Deus castigue os pecadores, mas ao fato de que a
justiça do justo não é obra sua, mas dom de Deus.
Portanto, a justiça de Deus só tem quem vive pela fé: não porque seja em si mesmo justo ou
porque Deus lhe dê esse dom, mas por causa da misericórdia de Deus que, gratuitamente, justifica o
pecador desde que este creia. A partir dessa descoberta, a justiça de Deus não passou mais a ser odiada;
agora, ela tornou-se em uma frase doce para sua vida. Em conseqüência as Escrituras passaram a ter um
novo sentido para ele.
Inconformado com a Igreja Católica, Lutero compôs algumas teses, que deveriam servir
como base para um debate acadêmico. Naquele período, teve início, por ordem do papa Leão X, a
venda de indulgências por Tetzel, através da qual o portador tinha a garantia de sua salvação. Não
concordando com a exploração de seus compatriotas, Lutero fixou suas famosas 95 teses na porta
da Igreja (local utilizado para colocar informações da universidade) do Castelo de Wittenberg. As
teses foram escritas acaloradamente com sentimento de indignação profunda, mas com todo o
respaldo Bíblico. E além do mais, ao atacar a venda de indulgências, colocava em perigo os projetos
dos exploradores, dentre eles, a ganância do papa Leão X em arrecadar dinheiro suficiente para
terminar a construção da Basílica de São Pedro.
Os impressos despertaram o povo e produziram um sentimento de patriotismo, o que facilitou a
Reforma na Alemanha. A importância de Lutero para o protestantismo moderno não deve ser esquecida. Foi
ele quem teve mais sucesso na investida contra Roma. Foi ele o grande bandeirante da volta às
Escrituras como regra de fé e prática. Foi um dos poucos homens que alterou profundamente a História
do mundo. Através do seu exemplo, outras pessoas seguiram o caminho da Reforma em seus próprios
países, e em poucos anos quase toda a Europa havia sido varrida pelos ventos reformadores. Lutero foi
responsável por três pontos básicos do protestantismo atual: a supremacia das Escrituras sobre a
tradição; a supremacia da fé sobre as obras; e a supremacia do sacerdócio de cada cristão sobre o
sacerdócio exclusivo de um líder. Humanamente falando, deve-se a Lutero um retomo à leitura da
Bíblia.
A Contra-Reforma e os jesuítas: Lutero teve de enfrentar o tremendo poderio da Igreja
Católica que, imediatamente organizou a Companhia de Jesus (jesuítas) para atacar a Reforma. Vide
o juramento dos jesuítas (livro Congregacional de Relatórios, página 3.362) que em resumo, diz: "Prometo
na presença de Deus e da Virgem Maria e de ti meu pai espiritual, superior da Ordem Geral dos Jesuítas...
e pelas entranhas da Santíssima Virgem defender a doutrina contra os usurpadores protestantes, liberais e
maçons sem hesitar. Prometo e declaro que farei e ensinarei a guerra lenta e secreta contra os hereges...
tudo farei para extirpá-los da face da terra, não pouparei idade, nem sexo, nem cor... farei arruinar, extirpar,
estrangular e queimar vivo esses hereges. Farei arrancar seus estômagos e o ventre de suas mulheres e
esmagarei a cabeça de suas crianças contra a parede a fim de extirpar a raça. Quando não puder fazer isso
publicamente usarei o veneno, a corda de estrangular, o laço, o punhal e a bala e chumbo. Com este punhal
molhado no meu sangue farei minha rubrica como testemunho! Se eu for falso ou perjuro, podem meus
irmãos, os Soldados do Papa cortar mãos e pés, e minha garganta; minha barriga seja aberta queimada
.
com enxofre e que minha alma seja torturada pelos demônios para sempre no inferno!". Preocupada em
conter o avanço dessas idéias, a igreja Romana iniciou através do Tribunal da Santa Inquisição a
perseguição mais infame e sangrenta da história, onde, no caso da França, numa única noite,
chamada de "Noite de São Bartolomeu", três mil protestantes foram assassinados e seus corpos
jogados nas ruas francesas, com as bênçãos católicas. Muitos jesuítas, tais quais espiões, levaram
os ditos "hereges" às mais variadas torturas, até a morte.
A Reforma Protestante começou na Alemanha quando Lutero publicou as "95 Teses",
transformando a teoria e a prática das indulgências.
Com uma interpretação muito pessoal, Lutero defendeu que o homem, apenas pelas suas obras, é
incapaz de se santificar e que é pelo ato de crer, ou seja, pela Fé, que se chega à santificação. Só a
Fé torna o homem justo, não sendo as boas obras suficientes para apagar os pecados e garantir a
salvação.

A excomunhão pelo papa de Martinho Lutero quebrou a unidade da Igreja ocidental e iniciou
um período de guerras que opuseram o Imperador Carlos V e alguns príncipes da Alemanha. A
condenação de Lutero na Dieta de Worms e o seu desterro dividiu a Alemanha numa fronteira
econômica e religiosa. De um lado, aqueles que desejavam preservar a ordem tradicional, incluindo
o imperador e o alto clero, suportados pela Igreja Católica Romana. Do outro, os apoiantes do
Luteranismo – os príncipes do Norte da Alemanha, o baixo clero, os grupos burgueses e largas
camadas de camponeses – que acolheram a mudança como uma oportunidade para aumentarem a
sua autoridade nas esferas religiosa e econômica, apropriando-se dos bens da Igreja.
Os intermitentes períodos de guerra civil religiosa terminaram com a Paz de Augsburgo. Este
tratado decidiu que cada um dos governadores dos Estados alemães, que formavam cerca de 300
Estados, optaria entre o Catolicismo Romano e o Luteranismo e subordinou a opção religiosa à
autoridade do príncipe. O Luteranismo, perfilhado por metade da população alemã, receberia finalmente o
reconhecimento oficial, mas a antiga unidade religiosa da comunidade cristã da Europa ocidental sob a
suprema autoridade pontifícia foi destruída.

2) A SUIÇA E A REFORMA LUTERANA

O movimento reformista na Suíça, contemporâneo da Reforma na Alemanha, foi conduzido


pelo pastor suíço Ulrico Zwínglio, que, em 1518, ficou conhecido pela sua vigorosa denúncia à venda
das indulgências. Zwínglio considerava a Bíblia a única fonte da autoridade moral e procurou
eliminar tudo o que existia no sistema do Catolicismo Romano que não derivasse especificamente
das Escrituras. De Zurique, este movimento alastrou por todo o território suíço, originando um conflito entre
1529-1531. A paz permitiu a escolha religiosa de cada cantão. O Catolicismo Romano prevaleceu nas
províncias montanhosas do país e o Protestantismo implantou-se nas grandes cidades e nos férteis
vales.
Após a geração de Lutero e de Zwínglio, a figura dominante da Reforma foi Calvino, um
teólogo protestante francês, que fugiu da perseguição de França e que se instalou na nova república
independente de Genebra, em 1536. Apesar da Igreja e do Estado estarem oficialmente separados,
cooperavam tão estreitamente que Genebra era virtualmente uma teocracia. Para reforçar a disciplina
moral, Calvino instituiu uma rígida inspeção à conduta familiar e organizou um consistório, composto por
pastores e leigos, com um grande poder compulsivo sobre as comunidades. O vestuário e o
comportamento pessoal dos cidadãos era prescrito ao mínimo pormenor: dançar, jogar às cartas e
aos dados e outros divertimentos eram proibidos e a blasfêmia e a linguagem imprópria
severamente punida. Debaixo deste regime severo, os inconformistas eram perseguidos e, por vezes,
condenados à morte. Para encorajar a leitura e o entendimento da Bíblia, todos os cidadãos tinham pelo
menos uma educação elementar. Em 1559, Calvino fundou a Universidade de Genebra, famosa pela
formação de pastores e professores. Mais do que qualquer outro reformista, Calvino organizou o
pensamento Protestante num claro e lógico sistema. A difusão das suas obras, a sua influência como
educador e a sua grande habilidade de organizador da Igreja e do Estado reformistas criaram um
movimento de adeptos internacionais e deram às Igrejas Reformistas, de acordo com o termo como as
Igrejas Protestantes eram conhecidas na Suíça, França e Escócia, um cunho inteiramente calvinista, quer
na religião quer na organização. Calvino é considerado o pai da teologia da “predestinação”.
A Suíça era o território mais livre da Europa ao tempo da Reforma, embora integrasse
formalmente o Santo Império Romano. Já em 1291, os cantões livres de Schwyz, Uri e Unterwalden
formavam uma união federal em que cada um ia se desenvolver livremente como república autogovernada.
Por ocasião da Reforma já eram 13 os cantões da confederação.

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Por causa de seu sólido espírito democrático, os mercenários suíços eram requisitados em toda a
Europa. Foram eles que encheram os exércitos que o papado organizou para defender seus interesses pela
força das armas.
Cada cantão tinha todo o encargo dos negócios locais, o seu governo estava livre para aceitar a
forma de religião que quisesse. Por isso, a Reforma na Suíça foi acompanhada de dispositivos legais
estabelecidos por governos locais democraticamente eleitos.
As cidades suíças eram também centros de cultura e nelas o humanismo se estabeleceu.
Basiléia tinha uma universidade de renome; foi lá que o grande Erasmo editou o Novo Testamento
Grego. Por causa disso, a Reforma Suíça teve no humanismo uma de suas maiores fontes.
Três tipos da teologia Reformada se desenvolveram nos territórios suíços. Os cantões do
norte, de fala alemã, seguiram Zwínglio. Os do sul, liderados por Genebra, seguiram Calvino. E os
radicais da Reforma, conhecidos como anabatistas, formaram uma facção extrema daqueles que,
antes, tinham trabalhado com Zwínglio. De Zurich, o movimento anabatista alcançou toda a Suíça, a
Alemanha e a Holanda, onde, sob a liderança de Menno Simmons, solidificou-se mais.

* A Reforma de Zwínglio nos Cantões Alemães do Norte da Suíça

Huldreich Zwínglio (1484-1531) pertence também à primeira geração de reformadores. Com


ele, as forças descontentes com Roma se uniram para uma reforma da igreja. Seu pai era fazendeiro e
juiz de Wildhaus. Tinha, pois, sua família uma renda que lhe permitia receber uma boa educação para
o sacerdócio. Depois de freqüentar a Universidade de Viena, foi em 1502 para a Universidade de Basiléia,
onde se formou em Bacharel em Artes, em 1504, vindo a receber o grau de mestre dois anos depois. O
humanismo dos professores interessara-lhe. Erasmo era o seu ídolo; as ciências humanas, o seu maior
interesse. Pouco lhe interessava a teologia.
Entre 1506 e 1518, serviu como pastor em Einsieden, um centro de peregrinos. Aí começou a
se opor a alguns abusos como o sistema romano das indulgências e a imagem negra da Virgem
Maria, ridicularizando-os à moda de Erasmo. Quando o Novo Testamento grego de Erasmo veio à luz,
em 1516, Zwínglio copiou as cartas de Paulo de um exemplar emprestado até ter o seu. Ao deixar
Einsieden, ele era um humanista bíblico. Chamado para pastorear em Zurich, começou seu trabalho no
começo de 1519. Nessa época, definiu sua posição contra o engajamento de mercenários suíços no
serviço estrangeiro, em razão das influências corruptoras que via exercida sobre os homens alistados neste
serviço; Zurich proibiu a prática em 1521.
Uma epidemia de peste bubônica em 1519 e o contato com as idéias luteranas levaram-no a
uma experiência de conversão. Zwinglio levantou a primeira bandeira da Reforma quando declarou
que os dízimos pagos pelos fiéis não eram exigência divina, sendo, pois, o seu pagamento uma
questão de voluntariedade. Isto abalou as bases financeiras do sistema romano. Por essa época,
estranhamente, o reformador se casou às escondidas com uma viúva, Anna Reinhard, em 1522. Só
em 1524, legitimou ele publicamente esta união ao se casar publicamente.
Quando os cidadãos invalidaram a prática do jejum quaresmal, sua argumentação foi o ensino de
Zwinglio sobre a autoridade exclusiva da Bíblia. Como a liturgia romana começava a se alterar com as
modificações introduzidas, as autoridades católicas resolveram que promoveria um debate público em que
Zwinglio sozinho enfrentaria a todos. Depois disso, então, os líderes civis eleitos pelo povo escolheriam a fé
que a cidade e o cantão adotariam. Foi por isso que a Reforma nos cantões do norte da Suíça
começou por uma iniciativa oficial.
Para o debate, Zwinglio preparou 67 Artigos, onde insistia na salvação pela fé, na autoridade
da Bíblia, na supremacia de Cristo na Igreja e no direito dos sacerdotes ao casamento. Condenavam-
se, também, as práticas romanas não aprovadas pela Bíblia. O conselho da cidade decidiu-se pela
vitória de Zwinglio e suas idéias ganharam logo condição de legalidade. As taxas de batismo e
sepultamento foram abolidas; monges e freiras receberam permissão para se casarem; o uso de
imagens e relíquias foi proibido. Em 1525 a Reforma se completou em Zurich com a supressão da
missa. O ensino de Zwinglio de que a última palavra pertence à comunidade cristã, que exerceria sua ação
com base na autoridade da Bíblia frutificou na reforma suíça: nela, igreja e Estado estavam unidos
teocraticamente.
Berna foi conquistada para a Reforma através de um debate semelhante ao de Zurich. Zwinglio
participou com suas 10 teses, e, como resultado do debate, o conselheiro da cidade decretou em 1528 a
aceitação dos princípios da Reforma. Em 1529, a missa foi abolida em Basiléia pela influência de um
amigo íntimo de Zwinglio, de nome Ecolampadio.
A partir de 1522, Zwinglio foi estorvado pelos seguidores que se tornaram conhecidos como
anabatistas devido à sua insistência no rebatismo dos convertidos. Em 1525, o conselho municipal
proibiu seus encontros e os expulsou da cidade. Felix Manz (1498-1527) foi executado por afogamento.

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Zwinglio perdeu também o apoio de Lutero no Colóquio de Marburg, em 1529, depois de não
concordarem sobre a natureza da presença de Cristo na Ceia. O zwinglianismo prosseguiu, então,
separado do luteranismo.
A aceitação dos princípios zwinglianos por vários cantões tornou necessária alguma forma de
organização religiosa, e em 1527 um sínodo das igrejas evangélicas reformadas suíças foi formado. Ao
mesmo tempo, a Bíblia foi traduzida para a língua do povo. Até essa época o papa não tinha interferido,
temeroso de perder os mercenários suíços, mas os velhos cantões rurais, fiéis ao papa, resolveram acabar
com o silêncio de Roma. Organizaram uma União Cristã dos Cantões Católicos e, em 1529, uma guerra
aberta irrompeu entre cantões protestantes e católicos. Os dois grupos fizeram uma trégua em Cappel, pela
qual a maioria dos cidadãos de cada cantão escolheria a sua religião, garantindo a tolerância aos
protestantes dos cantões papais. Quando Zwinglio tentou conquistar Genebra para sua causa, uma
nova guerra começou, em 1531. Zwinglio juntou-se aos seus soldados como capelão, morrendo em
combate. O resultado da batalha foi cada cantão receber o controle total de seus negócios internos, e
Zurique ter entrado em aliança com a Liga Cívica Cristã dos Cantões Reformados.
Depois disso, houve uma pequena mudança na situação religiosa na suíça alemã. Heinrich Bullinger
foi o sucessor competente e conciliador de Zwinglio. Mais tarde, zwinglianos e calvinistas conjugaram
seus esforços nas Igrejas Reformadas da Suíça, através do acordo de Zurique, em1549.
Zwinglio foi o mais humanista dos reformadores. Para ele, gregos como Sócrates e Platão e
romanos como Catão, Sêneca e Cipião estavam no céu. Afora isso, sustentou a autoridade absoluta da
Bíblia, nada permitindo em religião o que não fosse autorizado pela Bíblia. Aceitou a predestinação
incondicional para a salvação, entendendo que somente aqueles que ouvissem e rejeitassem o
Evangelho estavam predestinados à condenação. Zwinglio cria que a fé era a parte mais importante
dos sacramentos, a Ceia do Senhor era uma "comemoração" e não uma "repetição" da Expiação,
pelo que o crente pela reflexão sobre a morte de Cristo recebe bênção espiritual. Ele concebia o pecado
original como uma culpa; as crianças poderiam, portanto, ser salvas por Cristo independentemente
de batismo. Seu livro, Verdadeira e Falsa Religião, 1525, expressa o seu ponto de vista bíblico e
cristocêntrico.
Foram estas as idéias do homem que colocou os fundamentos da fé reformada na Suíça
Alemã. Embora Calvino tenha se tornado o herói da fé reformada, a igreja não pode esquecer o papel
de Zwinglio, erudito, democrático e sincero, na libertação da Suíça das garras do papa; embora mais
liberal que Lutero, foi tão corajoso quanto o grande reformador.

b) Ulrico Zuínglio nasceu em Wildhaus, uma pequena aldeia nos Alpes da Suíça de língua alemã , dois
meses depois do nascimento de Lutero, em 1º de janeiro de 1484. A reforma na Suíça não seria um
resultado direto da obra de Lutero, mas sim uma reforma paralela à da Alemanha. Houve pontos de
contato, mas a origem foi independente. Em 1506, Zuínglio recebeu seu título de Mestre em Artes, foi
ordenado sacerdote, e serviu na paróquia de Glarus. Lá ele continuou seus estudos, chegando a
dominar o grego, sendo um feito extraordinário, pois havia muitos sacerdotes que nunca tinham lido o Novo
Testamento! Diz-se que Zuínglio chegou a decorar todas as epístolas paulinas – em grego! Em cerca de
1516, depois de estudos diligentes no NT, Zuínglio foi despertado para a fé evangélica. Esse
acontecimento levou Zuínglio a voltar-se para as Escrituras com fervor ainda mais sincero. Zuínglio
também passou a sentir hostilidade contra o sistema medieval de penitências e relíquias (como a
imagem negra da Virgem Maria), que atacou em 1518. Logo depois, em 1519, Zuínglio foi chamado
para ser o sacerdote da Grande Catedral da cidade de Zurique, onde ficou até o fim da vida.
Sobre o portal dessa igreja, pode-se ler a seguinte inscrição: "A reforma de Ulrico Zuínglio
começou aqui, em 1º de janeiro de 1519". Um dos grandes momentos da Reforma ocorreu no início
daquele ano, quando Zuínglio começou o culto com a proclamação da sua intenção de pregar sermões
expositivos, capítulo por capítulo, começando no Evangelho de Mateus. Esta série de sermões foi seguida
por preleções em Atos, em 1 e 2 Timóteo, Gálatas, 1 e 2 Pedro, até que em 1525, já havia pregado em todo
o NT (menos Apocalipse), daí voltando-se para o Antigo. Segundo seu amigo e sucessor Henrique Bullinger
(1504-1575), ele recusava-se "a cortar em pequenos pedaços o evangelho do Senhor"! Ao permitir que a
Bíblia falasse diretamente à sua congregação, Zuínglio presenciou uma ávida corrida de seus paroquianos
para escutá-lo, enchendo a Catedral.
Neste ínterim, instigadas pelo papa, as regiões católicas da Suíça se organizaram, e em 1531
realizaram um ataque de surpresa contra a cidade de Zurique. Zuínglio perdeu a vida enquanto
servia como capelão das tropas de Zurique, na batalha de Kappel, e suas últimas palavras foram:
"Vocês podem matar o corpo, mas não podem matar a alma". Em 1523, Zuínglio havia dito: "Não
tenham medo, meus amigos! Deus está do nosso lado, e protegerá os que são seus. Vocês de fato
realizaram algo grandioso e encontrarão oposição por causa da pura Palavra de Deus, sobre a qual apenas
alguns se importam de pensar. Vão em frente, em nome de Deus!"

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3) A Reforma Calvinista em Genebra

Os milhões que aceitam a fé reformada e sua fundamentação doutrinária testemunham a


importância do sistema teológico fundado por João Calvino (1509-1564), designado geralmente pelo
termo "Calvinismo". O termo "fé reformada" aplica-se ao sistema de teologia desenvolvido a partir
do sistema de Calvino. "Presbiterianismo" é a palavra usada para exprimir a forma de organização
eclesiástica concebida por Calvino, que fez de Genebra o centro de execução de suas idéias. Calvino
pode ser apontado como o líder da Segunda geração de reformadores.

Lutero e Calvino

Calvino faz um interessante contraste com Lutero. Este era de família camponesa, mas o pai de
Calvino era um tabelião que fez do filho um membro da classe profissional. A formação universitária de
Lutero foi feita de filosofia e teologia; Calvino, porém, recebeu uma formação humanística; por isso,
enquanto ele foi organizador por excelência do protestantismo, Lutero foi a sua voz profética. Lutero
era fisicamente forte, enquanto Calvino teve de enfrentar problemas de saúde durante todo o seu
período de trabalho em Genebra. Lutero amava o lar e a família, ao passo que Calvino preferia o
estudo solitário. Lutero, que vivia numa Alemanha monárquica, esperava o apoio dos aristocratas e
dos príncipes; Calvino, numa Suíça republicana, interessava-se mais pelo desenvolvimento de uma
igreja governada representativamente.
Lutero e Calvino diferiam tanto teológica como pessoalmente. Lutero enfatizava a pregação;
Calvino preocupava-se com a formulação de um sistema formal de teologia. Os dois aceitaram a
autoridade da Bíblia, só que a ênfase maior de Lutero era sobre a justificação pela fé, e a de Calvino,
sobre a soberania de Deus. Lutero interpretava a consubstanciação como a melhor teologia para a
Ceia do Senhor; Calvino negava a presença física de Cristo, aceitando apenas a presença espiritual
de Cristo pela fé nos corações dos participantes. Lutero só rejeitava o que a Bíblia não aprovava;
Calvino rejeitava tudo o que não pudesse ser provado pela Bíblia. Lutero aceitava a predestinação
dos eleitos mas se preocupava muito pouco com a eleição para a condenação. Calvino, por sua vez,
defendia uma eleição dupla, para a salvação e para a condenação, baseada na vontade de Deus, e
rejeitou qualquer concepção da salvação como fruto do mérito do eleito ou da presciência de Deus,
como se Deus elegesse para a salvação aqueles que Ele sabia de antemão que creriam.

4) Início da Reforma na França

A Reforma na França começou no início do século XVI através de um grupos de místicos e


humanistas que se juntaram em Meaux, perto de Paris, sob a liderança de Lefèvre d’Étaples. Tal como
Lutero, d’Étaples estudou as Epístolas de S. Paulo e fez derivar delas a crença na justificação da fé
individual, negando a doutrina da transubstanciação. Em 1523, traduziu para francês o Novo
Testamento. No princípio, os seus textos foram bem recebidos pela Igreja e pelo Estado, mas, a partir do
momento em que as doutrinas radicais de Lutero começaram a espalhar-se em França, o trabalho de
Lefèvre foi visto como similar e os seus seguidores foram perseguidos. Apesar de todos os esforços para
evitar a expansão do Protestantismo em França, os Huguenotes cresceram imenso e a guerra civil
entre 1562-1598 foi generalizada. As mútuas perseguições entre católicos e Huguenotes originaram
episódios como o massacre de S. Bartolomeu, na noite de 23 para 24 de Agosto de 1572, durante o
qual foram assassinados os protestantes que estavam em Paris, para assistir ao casamento de
Henrique IV. A guerra terminou com o Edito de Nantes, em 1598, que concedeu a liberdade de culto
aos Huguenotes. Em 1685, Luís XIV revogaria este edito, expulsando do país os protestantes.

c) João Calvino nasceu em Noyon, na França, na fronteira dos Países Baixos, em 1509. Foi enviado
para estudar teologia em Paris, mas seu pai, após brigar com os líderes da igreja, mandou o filho para
estudar filosofia e direito. Em 1533, Calvino converteu-se, e a respeito deste fato disse: "minha mente, que
a despeito de minha juventude, estivera por demais empedernida em tais assuntos, agora estava preparada
para uma atenção séria. Por uma súbita conversão, Deus transformou-a e trouxe-a a docilidade". Em 1535,
ele precisou fugir de Paris, por suas convicções protestantes, exilando-se em Basiléia. Em 1536, ao
passar por Genebra, Calvino foi coagido a iniciar um trabalho ali, mas em 1538 foi expulso da cidade,
pelo rigor das reformas que propôs. De 1538 a 1541, ele mudou-se para Estrasburgo, onde pastoreou
a igreja de refugiados franceses naquela cidade. Lá, Calvino travou contato com Martim Bucer (1491-
1551), que influenciou profundamente sua teologia, principalmente acerca da doutrina do Espírito
Santo e da disciplina eclesiástica.
Em 1541, em virtude do caos moral, social e espiritual de Genebra, Calvino foi convidado a
retornar a essa cidade, onde, depois de grandes lutas, conseguiu implementar seu programa de
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reformas, mudando completamente toda a Genebra, tornando-a um exemplo para toda a cristandade.
O reformador escocês, John Knox (1514?-1572), disse que Genebra era "a mais perfeita escola de
Cristo que jamais houve na terra desde a época dos apóstolos". Em 1564 Calvino morreu, e suas
últimas palavras foram: "É suficiente para mim viver e morrer para Cristo, que é, para todos os seus
seguidores, um ganho tanto na vida quanto na morte." Devido a seu próprio pedido, não se ergueu lápide
alguma sobre o lugar de sua sepultura. Foi sucedido por Teodore de Beza (1519-1605), também um
refugiado francês.
Sua maior obra foi, sem dúvida, as Institutas ou Instrução da Religião Cristã, que era "uma
chave abrindo caminho para todos os filhos de Deus num entendimento bom e correto das Escrituras
Sagradas". Na edição final de 1559, ela alcançou 1500 páginas! Uma olhada no esboço desta obra
nos mostra um resumo de sua teologia, que seguia o padrão do Credo dos Apóstolos. Volume 1: "O
conhecimento de Deus, o Criador" – o conhecimento de Deus, Escrituras, Trindade, criação e providência;
volume 2: "O conhecimento de Deus, o Redentor" – a queda, o pecado humano, a lei, o AT e o NT, Cristo, o
mediador, sua pessoa (profeta, sacerdote e rei) e obra (expiação); volume 3: "O modo pelo qual recebemos
a graça de Cristo, seus benefícios e efeitos" – fé e regeneração, arrependimento, vida cristã, justificação,
oração, predestinação e ressurreição final; volume 4: "Os meios externos pelos quais Deus convida-nos à
sociedade de Cristo" – Igreja, sacramentos e governo civil. Esta foi a primeira "teologia bíblica" da
história da Igreja, e, na verdade, uma introdução que precisava ser completada e até mesmo
estendida por seus outros escritos! Eles são divididos em comentários bíblicos (sobre todo o NT, exceto
2 e 3 João e Apocalipse, e também sobre o Pentateuco, Salmos e Isaías, do AT), sermões (pregava duas
vezes ao domingo e uma vez por dia durante a semana, em dias alternados, usando o método expositivo),
folhetos e tratados polêmicos contra reformadores radicais, católicos, cartas para colegas reformadores, a
igrejas perseguidas e a protestantes presos, a pastores, vendedores de livros religiosos e mártires à espera
da sentença e escritos litúrgicos e catequéticos, para instruir o povo na "escola de fé".
A influência de Calvino se estendeu a vários países, tais como Suíça, França, Holanda,
Alemanha, Hungria, Polônia, Inglaterra, Escócia e Estados Unidos. Foram os reformados franceses
que realizaram o primeiro culto evangélico em terras brasileiras (em 10 de março de 1557), e foram
os reformados holandeses que construíram o primeiro templo protestante no Brasil (construído na
Ilha Maurício, no ano de 1642, em forma da cruz grega, chamado de Templo Gallicum. Depois da
expulsão dos holandeses, foi consagrado pela Igreja Católica à "Nossa Senhora do Ó"; atualmente é
dedicado ao "Divino Espírito Santo").

5) A REFORMA NA INGLATERRA

A revolta inglesa contra Roma difere das revoltas da Alemanha, da Suíça e da França em
dois aspectos. Primeiro, a Inglaterra era uma nação unida com um governo central forte, por isso,
em vez de dividir o país em facções ou partidos regionais e terminar numa guerra civil, a revolta foi
nacional – o rei e o Parlamento agiram juntos transferindo para a coroa a jurisdição eclesiástica
previamente exercida pelo papa. Segundo, nos países continentais, a agitação popular visando a reforma
religiosa precedeu e causou a ruptura política com o papado. Em Inglaterra, pelo contrário, a ruptura
política deu-se primeiro, como resultado da decisão de Henrique VIII para se divorciar da sua
primeira esposa, e a mudança na doutrina religiosa veio depois, nos reinados de Eduardo VI e de
Isabel I. Após o divórcio com Catarina de Aragão, Henrique VIII casou com Ana Bolena, mas, em
1533,o papa excomungou-o. Em 1534, através do Acto de Supremacia, o Parlamento reconhecia a
coroa como chefe da Igreja da Inglaterra e entre 1536-1539 os mosteiros eram suprimidos e as suas
propriedades anexadas pelo rei e distribuídas pela nobreza adepta da reforma.
No reinado de Isabel I (1558-1603), estabelece-se a Igreja Anglicana, que representa um
compromisso entre a doutrina calvinista e a liturgia católica. Pelo Acto de Supremacia, votado
novamente em 1559, Isabel I detinha a autoridade em matéria eclesiástica, enquanto o Acto de
Uniformidade, de 1564, impunha a Lei dos 39 Artigos, que estabelecia o essencial da religião calvinista.

* A "reforma radical" - 1525-1580

O fato de que o movimento anabatista esteve inicialmente ligado ao movimento zwingliano


no norte da Suíça, justifica tratar os anabatistas num capítulo sobre o surgimento da fé reformada na
Suíça. Foi a partir daí que chegou à Morava, Holanda e outras regiões. Os anabatistas sãos os
ancestrais espirituais diretos das igrejas menonitas e batistas hoje espalhadas pelo mundo. O
movimento apelou aos trabalhadores do campo e da cidade.

* Os Anabatistas

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Os anabatistas surgiram primeiro na Suíça em função da liberdade que existia nesse país. Nem
o feudalismo nem o papado tinham sido capazes de preservar o apoio desta terra de intrépidos soldados
mercenários. A insistência de Zwínglio na Bíblia como fundamento da ação dos pregadores encorajou a
formação de conceitos baseados na Bíblia.
Conrad Grebel (1498-1526) pode ser tido como o fundador do movimento anabatista suíço.
Membro de uma influente família nobre, recebeu uma excelente educação nas universidades de Viena e
Paris. Depois de sua conversão, em 1522, trabalhou ao lado de Zwínglio até romperem em 1525. O
primitivo ensino de Zwínglio de que o batismo infantil não tinha base bíblica o atraía. Em 1525 o
Conselho de Zurique ordenou a Grebel e a Felix Manz, outro culto líder anabatista, que desistissem de
promover reuniões de estudos bíblicos. George Blaurock foi batizado por Grebe em 1527 e depois batizou
Grebel e vários outros. Ao mesmo tempo, porque muitas pessoas perderiam sua cidadania, Zwínglio
desistiu da sua primitiva concepção da falta de fundamento bíblico para o batismo infantil. Os anabatistas
mais radicais que se opunham ao controle da religião pelo Estado estavam pondo em perigo os seus
esforços de convencer as autoridades conservadoras ainda indecisas a passarem para o lado da reforma.
De início, Zwínglio usava a técnica do debate para persuadi-los a mudar de idéia, mas quando o método
falhou, o conselho adotou medidas drásticas, como multas e exílio. Em 1526, o conselho decidiu punir
com a morte por afogamento todos quantos esposassem os princípios anabatistas. O movimento
praticamente não existia mais em Zurique em 1531, devido à perseguição que obrigou cristãos humildes a
emigrarem para outras regiões. Os Amish da Pensilvânia vieram desse grupo.
Balthasar Hubmaier (1481-1528), um dos primeiros anabatistas alemães, de excelente
educação, era doutor em teologia pela Universidade de Ingolstadt, onde foi aluno de John Eck,
adversário de Lutero. Seu pastorado em Waldshut, perto da fronteira Suíça, permitiu-lhe um contato com
os radicais suíços cujas idéias adotou. Ele e mais 300 seguidores foram batizados por afusão em 1525,
pelo que teve que fugir para Zurique a fim de escapar das autoridades austríacas. Daí, foi para a Morava,
onde assumiu a liderança de todos que haviam fugido da perseguição de Zwínglio e dos milhares de
moravianos convertidos às idéias anabatistas. Por ordem do Imperador, foi queimado numa estaca
em 1528, e sua esposa foi afogada no Danúbio pelas autoridades católicas romanas. Durante seu
ministério como líder anabatista, ensinou a separação entre Igreja e Estado, a autoridade da Bíblia e
o batismo de crentes.
É difícil sistematizar as crenças anabatistas, porque houve muitos grupos anabatistas
diferentes em suas doutrinas, como resultado natural da convicção de ser direito do crente
interpretar a Bíblia como regra final e infalível de fé e prática; muitos lhe davam uma interpretação
literal. Criam que a verdadeira igreja era uma associação dos regenerados e não uma igreja oficial de que
participavam até não-salvos. Praticam o batismo de crentes, de início por afusão ou aspersão e,
depois, por imersão. Por sua oposição ao batismo infantil, tido como anti-bíblico, e por sua
insistência no rebatismo receberam o nome de anabatistas. A maioria acentuava completa
separação entre a Igreja e o Estado e não mantinham comunhão com as igrejas estatais. A Confissão
de Schleithem de 1527, obra principalmente de Michael Sattler, expressou as principais idéias da
maioria dos Anabatistas. Inclinados ao pacifismo, negavam a fazer juramentos nos tribunais e a servir
como magistrados. Alguns eram milenaristas em sua escatologia e, em parte, devido a isso praticavam a
comunhão de bens.
Houve quatro tipos de anabatistas: os racionalistas, que enfatizavam a razão (rejeitando
doutrinas como a Trindade, as doutrinas ortodoxas da pessoa de Cristo, salvação pela graça etc.),
escatológicos e espiritualistas, que enfatizavam uma iluminação espiritual mais importante que as
Escrituras (liderados por João Matthys e João de Leyden, que estiveram envolvidos em uma sucessão de
acontecimentos desastrosos, os quais culminaram na destruição da cidade de Münster, na Alemanha, de
1532 a 1536) e os evangélicos, que enfatizavam a autoridade das Escrituras e o discipulado (os menonitas
são os herdeiros diretos deste grupo). Em 1523, os anabatistas começaram a se opor a Ulrich Zuínglio,
por causa do batismo infantil, que era praticado por ele. Em 1525, Conrado Grebel e Jorge Blaurock
foram rebatizados em Zurique. A principal ênfase do movimento anabatista era ter uma igreja só de
regenerados, tendo como sinal o batismo só de crentes. Em 1536, Menno Simons reuniu-se aos anabatistas
pacifistas da Holanda, liderados por Obbe e Dirk Philips, dando início ao movimento anabatista evangélico.
Além de confessarem o Credo dos Apóstolos, suas doutrinas principais eram o batismo de
adultos por aspersão (necessário para a salvação), a ênfase na regeneração como obra do Espírito
Santo (mais do que na justificação, que às vezes era confundida com a regeneração), a igreja
composta de crentes regenerados, sujeitos à disciplina eclesiástica que visava levá-los a ser
discípulos e a separação radical entre Igreja e Estado – inclusive da cultura.

* Os Radicais Místicos ou Espirituais

.
Muitos seguiram o nobre Kasper Schwnkfeld (1498-1561). Essas pessoas tinham uma orientação
mais para a experiência, eram inclinados ao misticismo e criam numa direção interior pelo Espírito Santo.
Um pequeno grupo ainda existe na Pensilvânia. Sebastian Franck (1499-c. 1542) tinha idéias similares.

* Radicais Socinianos Racionalistas

Os socinianos, precursores modernos Unitarianos, foram outro grupo radical da Reforma.


Suas idéias desenvolveram-se na Itália. Lelio Sozzini (Socinus) de Siena (1525-1562) foi atraído ao anti-
trinitarianismo pela morte do anti-trinitariano Servetus em Geneva. Fausto Sozzini (1539-1604), seu
sobrinho, mudou-se para a Polônia em 1579 e permaneceu lá até a sua morte. O Socinianismo
desenvolveu-se rapidamente na Polônia, e Fausto deu o Catecismo Racoviano ao movimento, que foi
publicado em 1605. De acordo com os socinianos, Cristo deve ser adorado como um homem que
obteve a divindade por sua vida superior. Sua morte foi simplesmente um exemplo de obediência
que Deus deseja de seus seguidores. Pecado original, a deidade de Cristo, a Trindade, a
predestinação foram negadas. Os Jesuítas capazes de suprimir esse movimento na Polônia, mas as
idéias socinianas espalharam-se para a Holanda e Inglaterra, e daí para a América. A moderna igreja
Unitariana é um descendente direto dos socinianos da Polônia, que foram chamados unitarianos
pela primeira vez na Transilvânia em 1600, aproximadamente.

3. Reflexões
1. Segundo o teólogo reformado Karl Barth (1886-1968), luteranos e reformados enfatizaram quatro
doutrinas principais: a autoridade e suficiência das Escrituras, o pecado original (nossa miséria
diante de Deus), a justificação pela graça mediante a fé e a eleição livre e soberana de Deus (a
prioridade de Deus na salvação). Do outro lado, os anabatistas evangélicos enfatizaram a igreja local
composta só de regenerados e a separação de Igreja e Estado. Os três grupos enfatizaram a doutrina do
sacerdócio de todos os crentes. Os luteranos e reformados enfatizando mais o aspecto da salvação (não
precisamos de mediadores, Cristo é nosso único mediador!) e os anabatistas o aspecto eclesiástico (todos
os crentes têm uma tarefa a desempenhar na Igreja). Estas doutrinas são a base da fé evangélica!
Precisamos voltar a pregar e ensinar essas doutrinas, pois são elas que nos tornam evangélicos!
2. A Reforma seguiu seu curso de forma poderosa. Quem foram os reformadores? Eles não eram
homens livres de falhas, muito pelo contrário! Às vezes estas eram mais evidentes que suas
qualidades! Mas Barth, ao entender que o verdadeiro legado deles residia em sua percepção da livre graça
de Deus em Cristo, que alcança o homem em seu estado de rebelião, morte e idolatria, afirmou a respeito
de Lutero (mas se aplicando a todos eles!): "Que mais foi Lutero, além de um professor da Igreja Cristã que
não se pode celebrar de outra maneira senão ouvindo-o?" Para aqueles que querem se aprofundar no
estudo da teologia dos reformadores, recomendaria as Obras selecionadas de Martinho Lutero, em
sete volumes (publicados pelas editoras Concórdia e Sinodal). Cada volume traz uma breve introdução e
um pequeno comentário dos textos contidos na obra. Recomendaria também o Livro de Concórdia, uma
coletânea das principais confissões de fé luteranas do período da Reforma (também publicada pelas
editoras Concórdia e Sinodal). Sobre João Calvino, recomendaria As Institutas da Religião Cristã – um
resumo (publicado pela PES). Vários de seus comentários estão saindo em português. Já foram publicados
Salmos (em dois volumes), Daniel (em um volume), Romanos, 1 e 2 Coríntios, Gálatas, Efésios, As
Pastorais e Hebreus (publicados pela editora Parácletos). A Confissão Belga e o Catecismo de Heidelberg,
importantes documentos reformados do mesmo período, foram publicados pela editora Cultura Cristã.
3. Como disse o historiador batista Timothy George, nós faríamos "bem em ouvir novamente a
mensagem desses cristãos corajosos que desafiaram imperadores e papas, reis e câmaras
municipais, porque suas consciências estavam cativas à Palavra de Deus. Seu evangelho da graça
livre do Deus todo-poderoso, o Senhor Deus dos Exércitos, conforme o grande hino de Lutero o expressa, e
seu destaque à centralidade a ao caráter infalível de Jesus Cristo permanecem em acentuado contraste
com as teologias enfraquecidas e demasiado transcendentais que dominam o cenário atual." Jerônimo, um
dos pais da Igreja, disse certa vez que, quando lia as cartas do apóstolo Paulo, podia ouvir trovões.
Os mesmos trovões também ecoam nos escritos dos reformadores.

* A Igreja Católica se Organiza Objetivando Combater o Avanço do Protestantismo (O Concílio de


Trento)

Enquanto João Paulo II encontra-se há 20 anos assentado no chamado trono de São Pedro, os
cinco papas que governaram a Igreja durante os 18 anos do Concílio de Trento (1545-1563) tiveram
pontificados de pequena duração.
.
Paulo III foi eleito papa aos 66 anos e morreu 15 anos depois. Júlio III foi eleito aos 63 e morreu
cinco anos depois. Marcelo II foi eleito aos 54 (a 10 de abril de 1555) e morreu 22 dias depois (1o. de maio ),
Paulo IV foi eleito aos 79 e morreu quatro anos depois. E Pio IV foi eleito aos 60 e morreu sete anos depois.
Com exceção do piedoso Marcelo II, todos os outros mancharam seus pontificados com a prática do
nepotismo. Paulo IV, por exemplo, fez de seu sobrinho Carlos Carafa Cardeal Secretário de Estado. Esse
homem era imoral e destituído de consciência e abusou de seu ofício para cometer extorsões vergonhosas.
O 19º Concílio Ecumênico da Igreja, mais conhecido como o Concílio de Trento, por ter se
reunido em sua grande parte na cidade de Trento, ao norte da Itália, realizou 25 sessões plenárias
em três períodos distintos, de 1545 a 1563. O primeiro período foi de 1545 a 1547. O segundo começou
quatro anos depois, em 1551 e terminou no ano seguinte. O último período começou dez anos mais tarde,
em 1562, e terminou no ano seguinte.
A essa altura, a Reforma Protestante já tinha se espalhado por todos os países da Europa
Ocidental e da Europa Setentrional. A abertura do Concílio de Trento deu-se 28 anos depois do
rompimento de Martinho Lutero com Roma (outubro de 1517) e nove anos depois da primeira edição
das Institutas da religião cristã, de João Calvino, em 1536 (um livro de formato pequeno, com 516
páginas). Outras edições em latim e francês já tinham sido publicadas. Por ocasião da abertura do
Concílio (13 de dezembro de 1545), todos os reformadores, exceto Ulrico Zuínglio, ainda estavam
vivos: Martinho Lutero com 62 anos, Guilherme Farel com 56, Filipe Melanchton com 48, João
Calvino com 36 e João Knox com 31. Lutero morreria no ano seguinte (1546).
O propósito do Concílio de Trento era fazer frente à Reforma Protestante, reafirmando as
doutrinas tradicionais e arrumando a própria casa. Portanto houve duas reações distintas, uma na área
teológica e outra na área vivencial. Um dos papas teria confessado que Deus permitiu a revolta
protestante por causa dos pecados dos homens, "especialmente dos sacerdotes e prelados".
No que diz respeito à melhoria da conduta do clero, o Concílio foi muito positivo. Formulou-
se uma legislação com o objetivo de eliminar os abusos. Os sacerdotes deveriam residir junto às
paróquias, os bispos, na sede episcopal, monges e freiras em seus mosteiros e conventos. A Igreja
deveria fundar seminários para preparar melhor seus sacerdotes.
Mas, no que diz respeito às doutrinas postas em dúvida pela Reforma Protestante, o Concílio
de Trento nada fez senão confirmar o ensino tradicional católico. Enquanto os protestantes afirmavam
que a Escritura Sagrada é a única regra de fé e prática dos cristãos, o Concílio colocava a tradição e os
dogmas papais no mesmo pé de igualdade com a Bíblia. O Concílio declarou que a tradução latina
da Bíblia, a Vulgata, era suficiente para qualquer discussão dogmática e só a Igreja tem o direito de
interpretar as Escrituras. Também reafirmou a doutrina da transubstanciação, defendeu a concessão
de indulgências, aprovou as preces dirigidas aos santos, definiu o sacrifício da missa, insistiu na
existência do purgatório e ensinou que a justificação é o resultado da colaboração entre a graça de
Deus e as obras meritórias do crente. Outra resolução do Concílio de Trento que acentua a diferença
entre católicos e protestantes foi à inclusão de livros dêuteros canônicos no cânon bíblico.
Depois do Concílio de Trento, a cristandade ficou definitivamente dividida entre a Igreja
Católica Romana e a Igreja Protestante, por meio de suas diferentes denominações: valdenses,
anabatistas, luteranos, presbiterianos (calvinistas) e outras. Como já havia uma divisão anterior,
ocorrida em 1.054, deve-se acrescentar o terceiro braço da Igreja Cristã: a Igreja Ortodoxa Grega.
A última sessão do Concílio de Trento aconteceu no dia 4 de dezembro de 1563. Nesse dia
foram lidas todas as decisões tridentinas — todo o texto ou apenas seus começos — e encaminhadas
ao Papa Pio IV para aprovação final, o que ocorreu menos de dois meses depois, em 26 de janeiro de
1564.
Durante o Concílio de Trento, os protestantes redigiram pelo menos três clássicas
confissões de fé: a Confissão Escocesa (1560), o Catecismo de Heidelberg (1562) e a Segunda
Confissão Helvética (1562). Os pontos doutrinários aí expostos não se afinam com as declarações
tridentinas. As diferenças entre um credo e outro permanecem até hoje, embora a convivência entre
um grupo e outro seja muito melhor neste final do século XX do que na primeira metade do século
XVI. Conhecemos o Catecismo de Heidelberg.

* O catecismo de Heidelberg: Sua História e Influência (Alderi Mattos)

Uma das principais características da Reforma Protestante do século XVI foi a produção de
um grande número de declarações doutrinárias na forma de confissões e catecismos. Estas
declarações resultaram tanto de necessidades teológicas quanto pastorais, à medida em que os
novos grupos definiam a sua identidade em um complexo ambiente religioso, cultural, social e
político. Mark Noll observa que esse fenômeno é típico da Reforma, uma vez que o termo "confissão", em
seu sentido mais comum, designa as declarações formais da fé cristã escritas especialmente por
protestantes, desde o início do seu movimento.(1)
.
Embora tais documentos normalmente sejam classificados como confissões e catecismos, é
importante recordar que os catecismos são também confissões de fé. A distinção é formal, já que os
catecismos são simplesmente "declarações de fé escritas na forma de perguntas e respostas que na
época da Reforma freqüentemente serviram aos mesmos propósitos que as confissões formais."
O ramo reformado do protestantismo foi pródigo na produção de tais documentos,
particularmente no período decorrido entre o primeiro catecismo de João Calvino, Instrução na Fé
(1537), e os catecismos de Westminster (1648). Uma das mais extraordinárias declarações de fé
escritas naquele período foi o famoso Catecismo de Heidelberg, também conhecido como o
Heidelberger o mais importante documento confessional da Igreja Reformada Alemã.
O objetivo do presente artigo é refletir sobre a singularidade desse documento, tanto no que
diz respeito às circunstâncias históricas que conduziram à sua preparação, quanto no que se refere à
natureza excepcional do seu conteúdo e da sua contribuição à igreja. Conforme destaca Karl Barth, o
Catecismo de Heidelberg resultou das necessidades imediatas da vida de uma igreja em particular. Ao final,
todavia, ele se tornou a mais ecumênica das confissões de fé protestantes. Esse estudo irá abordar os
antecedentes históricos do catecismo, os dois homens mais intimamente associados com a sua
preparação, suas principais características e sua influência duradoura.

- Antecedentes históricos

Foi especialmente na década de 1560 que o protestantismo reformado penetrou na Renânia.


Enquanto o luteranismo debatia-se com divisões internas, a tradição reformada suíça fez avanços em
estados anteriormente luteranos. Os líderes do movimento eram alemães que haviam sido inspirados por
Zurique e Genebra, mas que estabeleceram os seus próprios padrões. Para alguns, este era o próximo
passo a partir do Filipismo (luteranismo moderado) em direção a uma ampla reestruturação do culto e da
disciplina. Este movimento algumas vezes tem sido denominado "a segunda reforma".
Nas cidades-estado do Baixo Reno, o movimento teve início através de pressões congregacionais.
Ainda na década de 1540, refugiados holandeses começaram a chegar ao Baixo Reno e esse influxo de
imigrantes tornar-se-ia gigantesco após a repressão promovida pelo Duque de Alba em 1567. Em outras
áreas, as mudanças religiosas foram promovidas pelos governantes.
A reforma em Estrasburgo, sob a liderança de Bucer (morto em 1551), já havia manifestado
algumas características reformadas. Calvino havia trabalhado ali (1538-41) e era conhecido de
muitos naquela região. Na década de 1550 Estrasburgo tornou-se fortemente luterana e anti-
calvinista.
O Palatinado Renano ou Baixo Palatinado foi o primeiro e o mais importante estado a
envolver-se com o novo movimento. Lutero havia visitado Heidelberg em 1518; naquela época, Bucer,
então um jovem dominicano, abraçara a causa protestante. Heidelberg adotou o luteranismo sob
Frederico II em 1545-46. Todavia, durante a maior parte dos vinte anos seguintes, uma série de conflitos
manteve a vida da cidade em turbulência.
Sob o eleitor Oto Henrique (1556-59), o Baixo Palatinado adotou um luteranismo moderado
que tolerava o zuinglianismo e o calvinismo. No entanto, ao final da década de 1550 houve um grave
conflito na Universidade de Heidelberg, no qual extremistas luteranos atacaram aqueles de convicção
melanchtoniana e reformada e introduziram formas de culto vistas como idolátricas pelos seus oponentes. A
intolerância anti-calvinista desagradou a Oto Henrique e a seu sucessor Frederico III (1559-76).
O eleitor Frederico ficou particularmente incomodado com uma amarga controvérsia a
respeito da Ceia do Senhor ocorrida em 1560. Um pastor luterano e um diácono calvinista discutiram
violentamente diante dos cidadãos reunidos para uma celebração dominical da Ceia do Senhor. Frederico
baniu os dois antagonistas e tentou achar um caminho melhor. Ele era um homem sinceramente religioso e
inteligente que havia sido convertido ao luteranismo através da sua esposa. Ele familiarizou-se com os
pontos controvertidos de culto e doutrina. Seu desprazer em relação a cerimônias elaboradas fizeram-no
inclinar-se em direção ao calvinismo. Era cada vez mais difícil manter o luteranismo liberal do seu
predecessor, agora que Melanchton estava morto (abril de 1560).
Depois de um debate de cinco dias realizado em Heidelberg (junho de 1560), no qual as
doutrinas calvinistas foram apresentadas de maneira convincente, Frederico começou a tomar
providências no sentido de adotar o calvinismo. Em agosto, os religiosos que não quiseram aceitar a
confissão Augustana Variata (1541) tiveram de retirar-se.
Em janeiro de 1561, uma conferência de príncipes realizada em Naumburg separou luteranos
e calvinistas de modo ainda mais dramático, e o eleitor passou a promover o calvinismo nos seus
domínios. Na realidade, tratava-se de um calvinismo marcado por um espírito melanchtoniano.
Frederico precisava de teólogos que pudessem trabalhar juntos. Ele encontrou uma dupla
notável em Zacarias Ursino e Gaspar Oleviano, talentosos teólogos de orientação suíça, ambos com
menos de 30 anos. Ursino foi nomeado professor de teologia ele havia iniciado a sua educação teológica
.
com Melanchton, mas também estudara pessoalmente com Calvino. Oleviano era um protestante reformado
francês que também havia estudado com Calvino e apreciava os escritos de Melanchton. Ele tornou-se o
pastor da principal igreja de Heidelberg.
Noll comenta que "juntos eles formaram uma equipe de rara compatibilidade (...) Ambos estavam
ansiosos para trabalhar juntos a fim de apresentar uma frente protestante comum. E ambos tinham o dom
de discernimento pastoral." Seus nomes ficariam permanentemente associados ao produto mais
influente do movimento reformado alemão o Catecismo de Heidelberg, publicado a 19 de janeiro de
1563.

- Os Contribuidores do Catecismo de Heidelberg

-- Zacarias Ursino
Zacarias Ursino (1534-1583) nasceu na cidade silésia de Breslau (hoje na Polônia). Seu pai era um
homem de recursos modestos, mas Zacarias teve uma excelente educação preparatória graças às suas
conexões e ao apoio de um benfeitor Dr. João Crato, o médico da família.
Na sua juventude, Ursino foi grandemente influenciado pelo seu pastor, Miobano, um luterano com
tendências calvinistas. Ursino passou quase sete anos em Wittenberg (1550-57) sob a orientação de Filipe
Melanchton, ao qual se apegara fortemente. Ali ele estudou lógica, dialética e teologia.
Quando Melanchton foi para a conferência de Worms (1557), levou Ursino consigo. Ao terminar a
conferência, Ursino passou dez dias em Heidelberg com o eleitor Oto Henrique. Em 1557-58 ele foi para a
Suíça e a França numa viagem de estudos, e visitou todas as figuras conhecidas que pode, inclusive
Calvino. Logo após regressar para Wittenberg foi chamado para ensinar em sua cidade natal, mas teve de
partir em abril de 1560 durante uma controvérsia a respeito da Ceia do Senhor. Ele então foi para Zurique,
onde Pedro Mártir o conduziu a um calvinismo explícito.
"Com 27 anos, Ursino era um estudioso altamente preparado, apreciador dos clássicos e da poesia,
e familiarizado com todo o campo da teologia." Ele foi para Heidelberg em setembro de 1561. Com a reação
luterana que se seguiu à morte de Frederico III, ele mudou-se para Neustadt, onde passou os últimos cinco
anos da sua vida, ensinando na escola fundada por João Casimir.
À semelhança de Calvino, Ursino era um estudioso retraído que tinha a modesta ambição de levar
uma vida tranqüila; porém, a sua posição em Heidelberg tornou isto impossível. O conselho afixado à sua
porta em Neustadt é bastante revelador da sua personalidade: "Meu amigo, seja você quem for, torne a sua
visita breve, vá embora, ou ajude-me no meu trabalho."
Ursino sempre afirmou que pertencia à igreja evangélica. Derk Visser observa que "ele não pode
ser categorizado como pertencente a nenhuma escola ou movimento que não seja a igreja evangélica." Ele
esteve sempre ansioso por encontrar fórmulas conciliatórias e lutou sinceramente pela paz teológica.
Zacarias Ursino escreveu ou editou algumas das obras mais fundamentais da Igreja Reformada
Alemã. A exposição mais sistemática da sua teologia pode ser encontrada no seu comentário sobre
o Catecismo de Heidelberg. Peter A. Lillback argumenta que outra importante contribuição feita por ele à
teologia reformada foi "a primeira apresentação claramente articulada do pacto das obras, que Ursino
denominou como o `pacto da criação' ou o ´pacto da natureza'."

-- Gaspar Oleviano

Kaspar von Olewig (1536-1587) nasceu em Treves, na fronteira de Luxemburgo. Seu pai era o chefe
da associação de padeiros da cidade. O jovem Oleviano freqüentou escolas católicas; aos quatorze anos foi
para Paris e mais tarde, à semelhança de Calvino, estudou direito em Orleans e Bourges (1550-57).
Quando estava em Bourges, conheceu o futuro eleitor ao tentar, em vão, salvar o filho de Frederico quando
o mesmo se afogava. Durante aqueles anos ele foi influenciado por estudantes huguenotes e tornou-
se um calvinista.
Após a sua formatura, Oleviano estudou com vários líderes protestantes na Suíça (Pedro Mártir,
Beza e Calvino) e foi incentivado a voltar para Treves. Não havia nenhuma igreja protestante na cidade.
Oleviano ensinou por um ano e meio na academia local e em agosto de 1560 pregou um sermão
eletrizante no qual atacou a missa, o culto dos santos, procissões e outras práticas católicas. Ele
suplicou ao povo que observasse os ensinamentos das Escrituras. Dois meses depois foi preso juntamente
com o prefeito e outras pessoas que o apoiaram.
Frederico imediatamente enviou embaixadores a Treves e obteve a sua soltura. Oleviano foi para
Heidelberg no dia 22 de dezembro de 1560 e tornou-se pastor da Igreja de S. Pedro, bem como professor
na escola de teologia. McNeill comenta: "Ele era dois anos mais moço que Ursino, mais eloqüente e menos
erudito."

.
- A Produção do Heidelberger

Ursino e Oleviano trabalharam no Colégio da Sabedoria, a escola de teologia criada por


Frederico. Oleviano atuou principalmente como pregador e Ursino como professor.
Frederico III queria um catecismo conciliador que pudesse combinar o melhor da sabedoria luterana
e reformada, e que servisse para instruir as pessoas comuns nos elementos básicos da fé cristã.
Anteriormente ele havia buscado o conselho de Melanchton, que recomendou um acordo baseado na
simplicidade bíblica, moderação e paz, e advertiu contra sutilezas escolásticas.
A exata autoria do Catecismo de Heidelberg é uma questão controvertida. Joseph H. Hall
declara que Ursino tornou-se a sua principal "fonte" juntamente com Oleviano, mas "a verdadeira
autoria do Catecismo de Heidelberg permanece inconclusiva." Barth vai além e diz que "o catecismo
não é obra de um autor; é obra de uma comunidade." No entanto, ele admite que os dois teólogos
tiveram uma participação decisiva no projeto.
Com respeito a Oleviano, Lyle Bierma observa que a historiografia dos últimos 350 anos o
havia ligado a pelo menos duas fases da obra: a redação dos esboços iniciais e a redação final da
primeira edição alemã. Ele mesmo acredita que o papel de Oleviano foi o de um redator intermediário ele
teria preparado um esboço do texto alemão baseado em grande parte na Catechesis Minor de Ursino
(1562), que então apresentou o referido esboço a um grupo maior de teólogos e pastores para a elaboração
final.(20)
O catecismo foi publicado inicialmente sob o título Catecismo ou Instrução Cristã como tem
sido transmitida nas Igrejas e Escolas do Palatinado Eleitoral. Questões controvertidas quanto à
Ceia do Senhor foram evitadas e o conceito calvinista da predestinação foi apresentado de uma
forma mais moderada.
Uma edição latina publicada em 1563 foi usada como base para várias traduções para o inglês. O
Catecismo Palatino, como veio a ser chamado, teve ampla aceitação na Escócia. A sua aprovação pelo
Sínodo de Dort (1618) aumentou grandemente a sua autoridade.

- A Recepção do Heidelberger

O catecismo rapidamente obteve aceitação formal em praticamente todas as igrejas


calvinistas. "Ele tornou-se imediatamente popular naquelas partes da Alemanha que se inclinavam na
direção reformada e até mesmo alcançou algum sucesso em áreas luteranas, durante as duas décadas
seguintes..."
Frederico resistiu a todas as pressões de outros príncipes e do imperador Maximiliano no
sentido de repudiar o catecismo. Em maio de 1566 ele foi convocado a explicar-se diante da dieta
imperial reunida em Augsburgo, sob a acusação de ser um violador do Tratado de Augsburgo (1555).
Em virtude de sua defesa eloqüente e convincente, nenhuma ação punitiva foi tomada e ele passou a
organizar mais plenamente a igreja palatina, a fim de dar-lhe segurança e estabilidade.
O próximo eleitor, Luís VII (1576-83), filho de Frederico, agiu visando abolir a Igreja Reformada e
restaurar o luteranismo estrito. Cerca de 600 pastores e professores foram expulsos, entre os quais
Oleviano, que foi para Nassau-Dillenburg, e Ursino, que refugiou-se na corte do eleitor João Casimir.
Casimir sucedeu a seu irmão e restaurou o calvinismo. Mais tarde, Frederico IV (1592-1610) continuaria a
favorecer a Igreja Reformada e a fortalecer a sua organização.
A importância do Catecismo de Heidelberg como um guia para a vida cristã é evidenciada
pelas suas muitas edições e traduções. Somente durante as últimas décadas do século XVI, 43
edições e traduções vieram à luz. Ao todo, mais de 200 versões já foram identificadas.
O Heidelberger teria uma influência ainda maior na Holanda. Por volta de 1586 os ministros da
igreja protestante holandesa precisavam subscrevê-lo como expressão de sua fé, e ele tornou-se a base da
"pregação catequética" semanal tanto na Holanda quanto na Alemanha.

- Principais características

O Catecismo de Heidelberg tem sido destacado como a mais bela das confissões de fé
produzidas pela Reforma Protestante, e a mais generosa e pessoal dentre as exposições do
Calvinismo.
Trata-se de uma confissão constituída de 129 perguntas e respostas, tendo a sua seqüência
baseada na Epístola aos Romanos. As duas primeiras perguntas são introdutórias. A primeira pergunta,

.
"uma jóia de confissão existencial", estabelece o teor do documento, e a segunda pergunta esboça o que
vem a seguir: "meu pecado e miséria", "como eu sou redimido" e "como devo ser grato."
O documento tem três divisões principais: a Primeira Parte - Nosso Pecado e Culpa: A Lei de
Deus (perguntas 3 a 11), é uma confissão da pecaminosidade humana e do desprazer de Deus. A
Segunda Parte - Nossa Redenção e Liberdade: A Graça de Deus em Jesus Cristo (perguntas 12 a 85),
revela o plano de redenção e inclui uma exposição do Credo dos Apóstolos. A Terceira Parte - Nossa
Gratidão e Obediência: Nova Vida através do Espírito Santo (perguntas 86 a 129), apresenta a gratidão
obediente como o fundamento das boas obras e inclui uma exposição dos Dez Mandamentos e da Oração
Dominical. Esta seção vê a vida cristã como a resposta de gratidão do crente às bênçãos de Deus. O
catecismo constitui-se em um "pequeno clássico da vida devocional."
Os estudiosos têm destacado algumas outras características que tornam este documento
especialmente notável:
(a) O uso do pronome da primeira pessoa, muitas vezes no singular, "confere ao seu testemunho
evangélico um tom caloroso e pessoal." Bons exemplos disto são a pergunta n° 1: "Qual é o teu único
consolo, na vida e na morte?" Resposta: "Que eu pertenço corpo e alma, na vida e na morte não a mim
mesmo, mas ao meu fiel Salvador, Jesus Cristo..."; e a definição de fé encontrada na resposta à pergunta n°
21: "É não somente um conhecimento seguro pelo qual eu aceito como verdadeiro tudo o que Deus nos
revelou em sua Palavra, mas também uma confiança plena de que o Espírito Santo cria em mim através do
evangelho..."
(b) É a mais ecumênica dentre as confissões da Reforma, reunindo três correntes do pensamento
reformado. Ademais, está isenta de definições dogmáticas e é notavelmente não-sectária. A pergunta 80,
sobre a diferença entre a Ceia do Senhor e a Missa, foi inserida pelo eleitor Frederico após a primeira
impressão.
(c) Possui um caráter inteiramente bíblico; toda a sua estrutura é moldada pela perspectiva bíblica. O
catecismo deixa a Bíblia falar e não procura substituí-la.
(d) Em sua posição teológica, o catecismo é cristão, evangélico e reformado, estando plenamente
radicado na tradição dos apóstolos e dos concílios ecumênicos da igreja antiga.
(e) O catecismo é um manual de religião prática. Em lugar de levantar problemas especulativos, a fé
cristã é apresentada de maneira prática, acentuando-se a sua importância para a vida diária. Foi concebido
para ser ao mesmo tempo um guia para a instrução religiosa das crianças e jovens e uma confissão para
toda a igreja.
Bela Vassady comenta que o Catecismo de Heidelberg tem cumprido um quádruplo propósito:
catequético, teológico, litúrgico e querigmático. "Ele combina de modo feliz a ênfase à necessidade humana
de salvação com um testemunho ainda mais forte do triunfo da graça e glória de Deus em Sua contínua
obra de redenção."
Outros temas importantes são a sua ênfase na bondade e providência de Deus, sua forte
preocupação soteriológica e sua insistência numa "interioridade que não se torna em mera subjetividade."
Joseph Hall comenta que "o Catecismo de Heidelberg presta-se a uma pedagogia holística. Ele contém
perguntas cognitivas com respostas devocionais." Isto pode ser visto nas perguntas e respostas sobre a
Oração Dominical (119-129).
Finalmente, como muitas outras declarações de fé reformadas, o ensino sobre os Dez
Mandamentos vem após uma exposição do Credo dos Apóstolos (nas declarações de Lutero é o contrário).
Estas posições não são antitéticas, mas apontam para ênfases diferentes: a Lei como parte do alegre
serviço do crente a Cristo (ênfase reformada) e como a força que impele o pecador a Ele (ênfase luterana).

-- Influência duradoura

Por mais de quatrocentos anos o Catecismo de Heidelberg tem sido uma fonte de conforto,
encorajamento e alimento espiritual para muitas gerações de cristãos em vários continentes. Ele não
só tem proporcionado inspiração a homens e mulheres que enfrentam pressões externas e lutas interiores,
mas também tem sido um poderoso incentivo ao diálogo e à aceitação mútua entre diferentes grupos e
tradições cristãs. Isto se tornou possível, por um lado, graças às circunstâncias peculiares que contribuíram
para a sua composição e, por outro lado, devido à maneira feliz com que seus autores expressaram as
antigas verdades de um modo que se tornou relevante e significativo para os seus contemporâneos
naqueles dias turbulentos.
Espera-se que as igrejas reformadas deste final do século XX possam conhecer e utilizar
melhor mais este valioso elemento de nossa herança evangélica.

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* A REFORMA NO BRASIL
Em 1517, um monge agostiniano alemão chamado Martinho Lutero, revoltado com muitas práticas
anti-bíblicas que estavam sendo inseridas na igreja cristã, afixou na porta da Catedral de Wittenberg (onde
costumeiramente eram colocados assuntos para discussão) uma lista de 95 teses de práticas da igreja
jamais aprovadas ou citadas pelas Escrituras Sagradas pelas quais a mesma igreja dizia ser regida.
Seu objetivo era apenas reformar a única igreja na qual ele acreditava, porém as coisas tiveram
uma repercussão muito maior. O estopim que levou Lutero a escrever as 95 teses foi a cobrança
exagerada de indulgências em sua cidade por um homem chamado Tetzel, mas as teses consistiam
em uma completa exposição bíblica sobre salvação e suficiência das Escrituras, um ataque aberto a
muitas da práticas correntes da Igreja.
O texto estava escrito em latim, pois destinava-se aos teólogos. Como já existia a imprensa e
jornalistas, o texto foi traduzido em várias línguas espelhando-se por toda a Europa. Tudo isso
desencadeou na excomunhão de Lutero da Igreja, mas isso não fez com ele voltasse atrás. Levantando-
se contra séculos de tradição, firmado somente na Palavra de Deus, Lutero afirmava que jamais poderia ir
contra a sua consciência, a menos que fosse provado na Bíblia que ele estava errado. Era o início da
Reforma Protestante na Europa. Os reformadores ficaram conhecidos como "os protestantes". Seu
Slogan era Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Soli Deo Gloria, Solo Christi (Somente as
Escrituras, Somente a Graça, Somente a Fé, Só a Deus dai gloria, Cristo somente).
Espalhando-se pela Europa a reforma chegou à Escócia com John Knox e o francês João
Calvino (que aos 27 anos, em 1535 publicou As Institutas da religião Cristã - o escopo do
pensamento reformado) sob o nome de presbiterianismo. Na França estes mesmos presbiterianos
foram chamados de Huguenotes.
A Igreja Católica então iniciou a contra-reforma, perseguindo, excomungando e matando os
protestantes ou qualquer que lesse ou possuísse seus escritos.
Perseguidos pela Igreja Católica na França, os Huguenotes fugiram para as Américas - novo e
recém descoberto mundo.
Em 1557, quarenta anos após o primeiro ato de Lutero, chegou ao Rio de janeiro um grupo de
Huguenotes com o objetivo de fundar aqui uma colônia chamada França Antártica, que deveria se
caracterizar pela tolerância religiosa. Eram os primeiros Protestantes a pisar em terras.
Três pastores protestantes lideravam o grupo. Nesse grupo havia um homem, Villegaignon.
Ao aportarem no Rio esse homem os entregou às autoridades contra-reformistas. Alguns
conseguiram escapar, mas quatro deles Jean du Bourdel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon e André
la Fon, foram presos e condenados à morte. Eles foram presos não somente por aportarem no país que
era colônia portuguesa, mas por estarem difundindo o Evangelho da Graça, que contrariava as doutrina
Romana de salvação por fé e obras (o poder de Deus necessitaria da ajuda do homem no processo de
salvação), agarrando-se à doutrina Bíblica defendida por Lutero - Somente pela fé.
Antes de serem executados porém, os protestantes eram obrigados a confessar sua crença
uma vez mais, era um direito do governador exigir dos súditos uma confissão de fé. Era como uma
última chance de renegar suas "heresias", ou para que pudessem ser indiscutivelmente
condenados. Foi-lhes dado um prazo de 12 horas para que escrevessem num documento tudo
quanto criam.
Em doze horas aqueles quatro homens, com ajuda apenas de suas Bíblias (pois não
dispunham de outros livros com eles) escreveram o que seria a primeira confissão de fé das
Américas, mostrando aos clérigos jesuítas tudo aquilo no que criam. Foi uma espécie de Credo, e
eles sabiam que com ele estavam assinando sua sentença de morte.
No momento da execução o carrasco, por conhecer a vida piedosa daqueles homens,
recusou-se a executá-los. Impaciente, o padre que os acompanhava, José de Anchieta, afastou o
carrasco e ele mesmo pôs fim à vida daqueles homens. Era uma manhã de sexta-feira, 9 de fevereiro
de 1558. Era aparentemente o fim do Protestantismo em terras portuguesas.
Só em agosto de 1859 um Americano presbiteriano Ashbel Gree Simonton, de 26 anos, aportou
no Rio e, após se tornar um conhecedor da língua portuguesa, iniciou em 22 de abril de 1860, aos
domingos de manhã, uma escola Bíblica. O primeiro brasileiro a se converter à fé reformada foi
Serafim Pinto Ribeiro, a 22 de junho de 1862. Assim sendo a história do protestantismo no Brasil
está intimamente ligada à história do presbiterianismo reformado.

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Conclusão: Aplicação da Reforma Protestante no Mundo

Porém, nós precisamos fazer aplicação destas verdades para nós mesmos. Vejamos três
áreas de aplicação, pois são três desafios que agora se encontram em nossas mãos, presentes
luteranos:
1) A Bíblia e o desafio de Roma:
No Primeiro vemos que a igreja católica continua em nosso meio e tem na América Latina
seu grande campo de evangelização. Mas nós temos a Palavra de Deus como nossa arma poderosa,
nossa espada de dois gumes que é apta para fazer em pedaços todas as tradições humanas. Nós
precisamos fazer como os reformadores, que tinham ousadia e coragem. É possível que o Brasil possa
ser libertado de toda espécie de tradições católicas. Algumas tradições católicas foram adicionadas e se
acumularam ao longo dos séculos, mas continuam presentes ainda hoje, isso porque a igreja
católica não nega nenhuma delas, como por exemplo:
Ano 300 - Orações pelos mortos; ano 375 - Veneração de imagens; ano 593 - Doutrina do
Purgatório; ano 600 - Reza à Maria, aos santos que já morreram e aos anjos; ano 1050 - Sacrifício da
missa; ano 1079 - Doutrina maligna do celibato obrigatório; ano 1190 - Venda de indulgências; ano
1215 - Doutrina da transubstanciação; ano 1414 - O cálice da eucaristia foi tirado do povo e este não
mais o tomava; ano 1546 - Adição de livros apócrifos (depois de 2000 anos, como podiam fazer
qualquer adição às Escrituras?); ano 1870 - Infalibilidade papal; e, ano 1950 - Ascensão corporal de
Maria.
A igreja católica jamais negou estas tradições. Mesmo assim mudou alguma coisa. Em 1964
houve uma mudança dramática, pois agora ela é pluralista. As pessoas podem ser salvas através de
várias religiões diferentes. Isso trouxe um pânico dentro da igreja católica, pois até então ela achava
que você só poderia ser salvo se fizesse parte dela, os demais estariam perdidos. Precisamos
protestar esta mentira.
2) A Bíblia e o desafio das novas revelações:
Temos que considerar a Bíblia e o desafio das novas revelações. Depois de ser julgado pelo
imperador, Lutero voltou para casa. Porém, para protegê-lo de ser morto na sua viagem de volta,
houve um "seqüestro amigável" quando o levaram para um lugar secreto onde foi guardado em
segurança - o Castelo de Wartburg. Assim não o matariam. Neste lugar Lutero faz a tradução da
Bíblia para o alemão.
Havia muita encrenca em Wittenberg, pois alguns "profetas carismáticos" haviam chegado e
estavam gerando confusão entre os líderes e o povo da cidade. Havia alguns líderes neste
movimento e por isso Lutero teve de voltar. Eles diziam ter revelações especiais de Deus, uma
espécie de "linha telefônica direta" com deus. Esta tem sido hoje a forma de muitos reivindicarem
autoridade para si: "Deus me falou e eu posso transmitir para você o que Ele está dizendo porque é
só pegar o telefone". Lutero afirmou que toda a revelação deveria está contida na Palavra de Deus.
Ela, sim, é a revelação final de Deus aos homens.
Estes homens geraram muita divisão e introduziram doutrinas fanáticas entre o povo. Lutero
teve de voltar e pregar a Palavra de Deus dizendo do fanatismo destes homens e afirmar que a
reforma tinha de se estabelecer, se estabilizar. Nós temos os mesmos problemas hoje! E a forma que
se tem achado para se obter crédito é dizer: "O senhor me disse". Nosso desafio hoje é provar se
vem de Deus e se não for, protestar.
3) A Bíblia e o desafio do modernismo.
Chegamos a terceira aplicação. A Bíblia e o desafio do modernismo e da incredulidade. A
Igreja tem sofrido muito nos últimos cem anos por causa da reivindicação da ciência, que não deixa
de ser uma conseqüência da Reforma Protestante. A tendência moderna é negar o sobrenatural,
tudo é racionalista na mente humana, mas a Bíblia é um registro dos atos sobrenaturais de Deus. O
remover do povo de Israel do Egito foi um ato sobrenatural; a inscrição dos dez mandamentos
naquelas tábuas de pedra foi um ato sobrenatural; a encarnação do senhor Jesus Cristo foi um ato
sobrenatural; Suas obras poderosas e sua ressurreição foram atos sobrenaturais. É o poder todo
poderoso do nosso Deus. Temos de reconhecer que Deus criou tudo pelo poder da Sua Palavra. Mas
agora nós temos o ensino da teoria da evolução e muitos crentes fraquejam neste ponto pela
pressão da sociedade que exige a evolução como metodologia. Agora está sendo reconhecida como
não ciência, sendo apenas uma teoria e os cientistas estão tendo de corrigir algumas coisas que eles já
disseram. Mas Deus não tem nada a corrigir. O que Ele disse é a verdade e por isso temos de ficar com a

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autoridade das Escrituras. Se os cientistas dizem que a Bíblia está errada, nós os mandamos de volta
para seus laboratórios, pois precisam pesquisar mais até que cheguem a verdade.

Fim!!!

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