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Ensino técnico-profissionalizante: relatos sobre vivências no estágio de

observação

Ediel Rocha de Sousa


Universidade Federal do Pará – edielsousa@gmail.com

Mário Sérgio Pereira da Conceição


Universidade do Estado do Pará – mariosergiopereira2@gmail.com

Resumo: O estágio de observação é parte fundamental no processo de formação docente nos cursos
de licenciatura, levando o discente a analisar e refletir, instigando um caráter investigativo, como
apresenta Bona (2013). Na Universidade do Estado do Pará - UEPA, o curso de Licenciatura em Plena
em Música subdivide o estágio em Práticas Educativas I e II, sendo de observação e Estágio
Supervisionado I e II, onde o discente realiza pequenas intervenções. Este relato ocorreu no estágio de
observação em Práticas Educativas I, na Escola de Música da Universidade Federal do Pará
(EMUFPA) nas componentes curriculares de Literatura e Apreciação Musical I, Linguagem Musical I
e Canto Coral I. Serão descritos os conteúdos de cada componente assim como os materiais e
principais atividades realizadas em sala de aula, mostrando os perfis docentes diversificados, que
contribuem na formação dos futuros professores de música.
Palavras-chave: Estágio. Vivências. Ensino técnico-profissionalizante.

Professional technique level education: reports on experiences in the observation internship

Abstract: The observation stage is a fundamental part of the process of teacher education in
undergraduate courses, leading the student to analyze and reflect, instigating an investigative
character, as presented by Bona (2013). At the State University of Pará - UEPA, the Full Degree in
Music course subdivides the internship in Educational Practices I and II, being of observation and
Supervised Internship I and II, where the student performs small interventions. This report took place
during the observation stage in Educational Practices I, at the School of Music of the Federal
University of Pará (EMUFPA) in the curriculum components of Musical Literature and Appreciation
I, Musical Language I and Choral I. The contents of each component will be described. as the
materials and main activities performed in the classroom, showing the diversified teacher profiles that
contribute to the formation of future music teachers.
Keywords: Internship. Experiences. Professional technique level education.

1. Introdução

Como etapa que permite a vivência do licenciando em música em diversos contextos


de ensino contribuindo para sua formação, o estágio, componente curricular obrigatória nos
cursos de licenciatura permite que simultaneamente o discente observe, colete dados, analise e
reflita sobre práticas docentes, instigando um caráter investigativo de extrema importância em
seu processo formativo como futuro professor (BONA, 2013).
Permitindo que o discente relacione os conteúdos teóricos desenvolvidos nas
diversas componentes curriculares obrigatórias, o curso de Licenciatura Plena em Música da
Universidade do Estado do Pará - UEPA oferta dois anos de estágio do quinto ao oitavo
semestre. No primeiro ano, os estágios são exigidos por meio das componentes Práticas
Educativas I e II, sendo apenas de observação, ocorrendo cada uma em campos diferentes. Os
discentes precisam anotar as informações referentes às aulas observadas em um diário de
bordo elaborando um relatório no final de cada semestre. No segundo semestre (práticas
educativas II) é necessária participação em classe em duas intervenções com tempo
determinado pelo professor do campo, não necessitando mais de um diário de bordo e
elaborando um artigo em dupla com outro discente que tenha algum tema em comum.
No sétimo e oitavo semestre, os estágios são ofertados através das componentes:
Estágio Supervisionado I e II. O campo é escolhido pelos professores da instituição e os
discentes precisam dar uma aula por mês com plano de ensino e plano de aula.
Este relato refere-se à vivência do estágio em Práticas Educativas I do Curso de
Licenciatura Plena em Música da UEPA, que ocorreu nos meses de Abril a Maio de 2019. O
estágio foi realizado na Escola de Música da UFPA - EMUFPA em Belém (PA), nas aulas de
Literatura e Apreciação Musical I, Linguagem Musical I e Canto-Coral I do ensino técnico de
nível médio, com turmas de 20 a 40 alunos.

2. Escola de Música da Universidade Federal do Pará

A Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA) atende cerca de


350 alunos, matriculados em cursos livres, técnicos e especialização técnica com quadro
docente com cerca de 50 professores especialistas, mestres e doutores.
Com duração de dois anos e 800 horas de carga horária, seguindo o catálogo nacional
de cursos técnicos, com organização curricular semestral e com quatro turnos distintos:
matutino (8h – 11h40), vespertino (14h-17h40), integral (14h-19h40) e noturno (18h21h40), a
EMUFPA oferta cursos técnicos em canto (canto lírico, popular e canto-coral), composição e
arranjo e instrumento musical (banda sinfônica, música popular, orquestra, piano e violão).
Dentro da instituição, a grade curricular do Núcleo de Teoria se divide em: Canto
Coral I e II (28h), que objetiva desenvolver habilidades musicais que contribuam na formação
instrumental como solfejo, além de auxiliar a percepção musical (rítmica, melódica e
harmônica), improvisação e criatividade. Literatura e Apreciação I, II, III e IV (28h) que
aborda conteúdos de História da Música Ocidental, Música Brasileira e Música popular, e de
maneira abrangente, busca abordar além das características estruturais e técnicas dos períodos,
a apreciação e análise das obras apresentadas em sala. No ano de 2019, a componente
Linguagem Musical I (56h) foi desmembrada em Linguagem Musical I (28h), que trata
conteúdos de escalas diatônicas, modos e intervalos, e Escrita Musical (28h) com os
princípios básicos da notação musical. Linguagem Musical II (28h) aborda tríades e tétrades
com suas estruturas de escrita e execução, e Linguagem Musical III (28h) que aborda
cadências e encadeamento a quatro vozes.

3. Vivências no estágio

3.1 Literatura e Apreciação Musical I

Abordando de forma cronológica obras da literatura musical, o conteúdo que abrange


da monodia cristã à música vocal barroca, fundamentando-se na observação de aspectos
históricos, estilísticos, técnicos, biográficos e outros.

Unidade Conteúdo
Unidade1: Elementos do estilo musical Melodia, harmonia, timbre, forma e textura

Canto cristão monódico, organum paralelo,


melismático e livre, música profana e escola
Unidade 2: Origens da Polifonia
de Notredame.

Unidade 3: Desenvolvimento da polifonia


vocal I - experimentação Ars Nova

Unidade 4: Desenvolvimento da polifonia A Reforma Protestante na música e


vocal II - a questão litúrgica Contrarreforma na música

Unidade 5: Música polifônica profana da


Madrigal, frottola1, ricercare
Renascença

Camerata florentina, Claudio Monteverdi


Unidade 6: Nascimento e desenvolvimento
(L’Orfeo), Haendel e decadência da ópera
inicial da ópera
barroca

Unidade 7: Música sacra barroca Oratório, cantatas e paixões

Tabela 1: Conteúdo programático de Literatura e Apreciação Musical I

1
Gênero musical profano composto de três a quatro vozes
Como maneira de sempre relacionar os períodos musicais com o contexto histórico
na qual os períodos estão inseridos, ao iniciar as aulas o professor apresentava no quadro uma
linha cronológica mostrando de maneira ampla os anos, trabalhando cada época segundo seus
padrões e estilos. Para abordar os conteúdos, foram utilizados como materiais didáticos
recursos áudio-visuais para mostrar de maneira apreciativa vídeos e áudios de músicas e
documentários. Outra forma de aplicação que foi utilizada, tendo em vista que a disciplina
trabalha com os mais variados tipos de estilos, foi dar aos alunos a oportunidade de executar
os repertórios vistos em sala com formação instrumental variada.
Na visão do professor, o principal objetivo da disciplina é utilizar o conhecimento
adquirido (no que diz respeito às formas e estruturas composicionais de acordo com cada
estilo de época) para melhorar a performance instrumental dos alunos, estando atento ao
caráter e interpretação estilística, além de apresentar de forma acessível, repertórios que não
fazem parte da realidade do seu instrumento ou da sua preferência como apreciador.

3.2 Linguagem Musical I

Os conteúdos presentes no plano de ensino dessa disciplina seguem duas vertentes: a


teórica que visa à leitura musical, e práticas que visam trabalhar a percepção auditiva.
Partindo disso, o professor utilizou alguns materiais didáticos como um teclado de piano feito
com feltro que ao colocar na parede, todos puderam observar com mais facilidade conceitos
como tons, semitons e intervalos. De posse do piano elétrico em sala, os trabalhos de
percepção puderam ser mais eficientes. Em algumas aulas o professor aplicava um exercício
vocal utilizando intervalos de segunda menor à oitava justa.
O professor utilizou alguns jogos como recurso de aprendizagem para trabalhar os
conteúdos, tornando o ensino mais dinâmico proporcionando situações de interação entre os
alunos (KIYA, 2014, p.7-11). Intitulado de “Que intervalo sou eu?” o jogo funciona da
seguinte maneira: um aluno senta-se de costas para o quadro (de frente para turma) e um
intervalo é escrito no quadro pelo professor. Em silêncio, a turma deve analisar e classificar o
intervalo utilizando o máximo de informações possíveis. O objetivo do aluno é descobrir qual
intervalo está escrito fazendo perguntas à turma, mas para isso, ele deve apenas utilizar
perguntas cuja resposta seja “sim” ou “não”. Não é colocado um limite de perguntas, porém o
aluno só pode dizer qual é o intervalo uma única vez. O aluno tem a opção de consultar seu
material didático. Perguntas como: Sou um intervalo simples? Tenho menos de 10 semitons?
Sou harmônico? Em relação ao meu tipo, eu posso ser justo? Seriam como exemplos básicos
para identificar e resolver o jogo. Uma variação que o professor utilizou foi colocar dois ou
três alunos de costas para o quadro vencendo quem descobrisse primeiro, estando atento às
perguntas dos outros alunos.
Algo relevante considerar é a dificuldade de compreensão de alguns alunos, pois as
realidades das vivências musicais dentro da mesma turma são discrepantes. Alguns alunos que
possuem a leitura e escrita musical de maneira fluente por já possuírem uma vivência em
bandas e orquestras tinham mais facilidade, enquanto outros alunos entendiam, mas não
possuíam fluência e outros nunca tiveram contato com tais conteúdos, limitando o professor
em alguns momentos por ser um conteúdo gradativo, sendo necessário que os alunos
aprendessem os conteúdos iniciais como base para que os próximos fossem mais bem
compreendidos.

3.3 Canto Coral I

Com alongamentos corporais para melhor preparo físico são iniciadas as aulas, uma
vez que cantar exige energia física e emocional, requerendo ajustes no trato vocal (MELLO;
SILVA, 2008). Em seguida, ocorre o aquecimento vocal que consiste em exercícios
respiratórios e vocais com a finalidade de aquecer a musculatura das pregas vocais evitando a
sobrecarga e fadiga vocal (MOTA, 1998). São diversos os exercícios que podem ser
realizados como vibração de língua e lábios, seguidos de bocca chiusa2, importantíssimo para
a consciência e desenvolvimento dos ressonadores (HAUCK-SILVA, 2012).
Durante os vocalizes, o professor trabalhou com seus alunos diversos conteúdos da
linguagem musical como intervalos, escalas, arpejos, tríades, articulações, dinâmicas através
de melodias e harmonias diversas, contribuindo na familiarização e conscientização dessas
estruturas.
Nas aulas, os vocalizes eram sempre trabalhados após os alongamentos, como forma
de memorização e aplicação de rotina. Serão descritos abaixo alguns que foram trabalhados
quase todas as aulas. Trabalhando precisão no ataque inicial, principalmente por iniciar com
uma nota aguda descendo em graus conjuntos. As notas são ligadas para serem executadas em
apenas uma única respiração utilizando as vogais.

2
Expressão de origem italiana que significa boca fechada.
Figura 1: Vocalize I

Utilizando os intervalos de forma crescente, o próximo vocalize trabalha extensão,


justamente por utilizar uma nota como referência e a partir dela, executar os intervalos da
segunda menor até oitava justa, de maneira que cada intervalo é executado de modo
ascendente e descendente cantando o nome de cada intervalo.

Figura 2: Vocalize II

Utilizadas para treinar a percepção, são feitas escalas maiores e menores (natural e
harmônica) guiadas ao comando do professor, variando entre vogais, vibrando a língua, lábios
também e fazendo bocca chiusa.
Com o objetivo de trabalhar percepção harmônica, o professor executava ao piano
uma progressão de até quatro acordes (maiores e menores), onde cada aluno deveria ouvir a
harmonia, e cantar uma das notas da tríade com uma vogal pré-determinada.
Compondo o repertório, o coro trabalhou inicialmente três músicas: um arranjo da
musica Luz do Mundo de Manoel Cordeiro da banda paraense Warilou, arranjo feito por
alunos da escola no ano de 2018, Hakuna Matata! de Elton John , um cânon Amor, amor, e
Ave Verum Corpus de Mozart. Esse repertório foi ensaiado para a apresentação de avaliação
bimestral. Com a proposta de preparar um repertório de musicas tradicionais africanas, foram
escolhidas: Shosholoza originária do Zimbábue e África do Sul, Ipharadisi em Zulu também
da África do Sul, Bonse Aba da Zâmbia e Baba Yetu de Christopher Tin. Essas músicas
começaram a ser trabalhadas desde o início do semestre, mas para serem apresentadas ao final
do segundo bimestre. Os alunos também elaboraram um trabalho escrito sobre o repertório.
Foi feito um convite do professor responsável pela Orquestra Sinfônica Altino Pimenta
(OSAP) para executar uma versão da obra Finlândia, op.26, de Jean Sibelius, para coro misto
e orquestra, o que alterou um pouco o planejamento do professor.

4. Considerações Finais

A observação enquanto forma de estágio permite conhecer a atuação de diversos perfis


de professores como exemplos a serem seguidos ou não, além de questões que ultrapassam o
ensino musical especificamente como maneiras de agir em determinadas situações em sala de
aula, a convivência e a motivação que é passada aos alunos para que sintam interesse e
confiança em suas capacidades de aprendizado, tornando-se muito importante.
Relevante comentar que as disciplinas de Linguagem Musical I e Canto Coral I foram
ministradas pelo mesmo professor e por esse motivo, alguns conteúdos teóricos de
Linguagem Musical puderam fazer-se presente de forma mais prática em Canto Coral. É
importante ressaltar que sempre que possível, o professor deve aplicar de maneira prática os
conteúdos teóricos, principalmente se tratando de conceitos da leitura, escrita e teoria musical.
Apenas com a observação, foi possível aplicar em outros locais alguns materiais
didáticos utilizados durante as aulas, assim como os jogos com as devidas alterações. Desta
forma, a prática de observação se mostra eficaz ao permitir que o estagiário tenha acesso a
diversos materiais como repertório para suas futuras aulas, contribuindo no futuro da
educação musical.
Referências:

BONA, Melita. A formação do professor de música e o estágio. Revista Nupeart, Florianópolis v.


11, p. 14-33, 2013.

HAUCK-SILVA, Caiti. Preparação vocal em coros comunitários: estratégias pedagógicas


para construção vocal no Comunicantus: Laboratório Coral do Departamento de Música da
ECA-USP.158f. Dissertação (Mestrado em Artes). Universidade de São Paulo, São Paulo,
2012. m

KIYA, Marcia Cristina da Silveira. O uso de Jogos e atividades lúdicas como recurso
pedagógico facilitador da aprendizagem. Universidade Estadual De Ponta Grossa. Programa
de Desenvolvimento Educacional. Ortigueira. 2014.

MELLO; Enio Lopes; SILVA, Marta Assumpção de Andrada e Silva. O corpo do cantor:
alongar, relaxar ou aquecer? Os Desafios da Escola Pública Paranaense na Perspectiva do
Professor PDE Produções Didático-Pedagógicas, São Paulo v.10, n.4, 2008. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462008000400015>. Acesso em: 14 de maio de 2019.

MOTA, Andréa Coelho Gagliardi. Aquecimento e desaquecimento vocal. 18f. Monografia


(Especialização em Fonoaudiologia Clínica). CEFAC, Centro de Especialização em
Fonoaudiologia Clínica, Salvador, 1998.

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