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Universidade do Minho

Escola de Direito

Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal


Inês Catarina Azevedo da Costa Santos

A Retribuição e as Prestações Complementares


A Retribuição e as Prestações Complementares
Análise das repercussões na retribuição de férias,
subsídios de férias e de Natal

Inês Catarina Azevedo da Costa Santos


UMinho | 2014

Outubro 2014
Universidade do Minho
Escola de Direito

Inês Catarina Azevedo da Costa Santos

A Retribuição e as Prestações Complementares


Análise das repercussões na retribuição de férias,
subsídios de férias e de Natal

Tese de Mestrado
Mestrado em Direito dos Contratos e de Empresa
Direito do Trabalho

Trabalho realizado sob a orientação da


Professora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira

Outubro de 2014
DECLARAÇÃO

Nome: Inês Catarina Azevedo da Costa Santos

Endereço electrónico: inesccostasantos@gmail.com Telefone: 918026248

Número do Bilhete de Identidade: 13361273

Título tese de Mestrado: “A Retribuição e as Prestações Complementares - Análise das


repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal”.

Orientadora: Exma. Senhora Professora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira

Ano de conclusão: 2014

Designação do Mestrado: Mestrado em Direito dos Contratos e da Empresa

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA TESE/TRABALHO APENAS PARA


EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO,
QUE A TAL SE COMPROMETE.

Universidade do Minho, ___/___/______

Assinatura: __________________________________
"He is well paid that is well satisfied”

WILLIAM SHAKESPEARE – The Merchant of Venice (1596-1598)

i
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Agradecimentos

Ao longo do tempo de elaboração deste estudo fui acompanhada por algumas pessoas, cuja
imprescindível presença muito contribuiu para o meu crescimento pessoal e profissional, e para
a elaboração desta dissertação, às quais não podia deixar de agradecer:

À minha Ilustre Orientadora, a Professora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira, pela sua
disponibilidade e por todas as considerações tecidas acerca do presente estudo ao longo deste
percurso, que muito contribuiu para que esta dissertação chegasse a bom porto, constituindo
esta colaboração, um prazer e uma honra.

À minha família, de valor incomensurável a qual amo muito, por todo o amor, paciência, em
especial à minha mãe por sempre me ter incentivado a querer ser melhor, ao meu pai pelo
esforço constante em prol da família e por todos os princípios e ensinamentos transmitidos e ao
meu irmão, pelas contendas, brincadeiras, discussões, e partilhas.

Ao Tiago, fonte de inspiração e confiança pelo apoio constante, pela ternura, compreensão e
todo o carinho despendido.

Aos meus amigos que, direta ou indiretamente, estiveram presentes, sempre dispostos a ajudar
com companheirismo a amizade, sobretudo ao Edgar.

À Dr.ª. Patrícia Vilar Resende, Ilustre Advogada e Colega, a quem agradeço todo o tempo
dispensado com debates sobre várias questões relacionadas com este tema, cujos sábios
contributos e amizade foram fundamentais e tornaram possível o término da Dissertação.

À Dr.ª Susana Pardilhó, Ilustre Advogada e Patrona, pela amizade e por todos os ensinamentos e
conhecimentos que me tem transmitido, de forma incansável e sempre disponível.

A todos muito Obrigada.

iii
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Resumo

A Retribuição e as Prestações Complementares

Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal

O presente estudo tem como principal objetivo, compreender a influência que o conceito
de retribuição pode exercer na vida de um trabalhador, mormente no que concerne à sua
consideração para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal,
explorando os aspetos subjacentes ao desenvolvimento do conceito, procurando aprofundar o
papel que as prestações patrimoniais complementares, atribuídas pelo empregador ao
trabalhador, têm na vida deste último.

Para prosseguir com este objetivo procuramos, em primeiro lugar, explanar o regime
jurídico-laboral em vigor, explorando os elementos essenciais do contrato de trabalho, enquanto
principal mecanismo de regulação das relações juslaborais, e por fim indagar sobre o conceito
de retribuição que, em suma, é o que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos
usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.

Percebe-se, através de pesquisa doutrinária e sobretudo jurisprudencial que, na prática,


as decisões no âmbito destas matérias não têm sido unânimes no que concerne à avaliação dos
critérios de regularidade e periodicidade para efeitos de integração de certos complementos
salariais no conceito de retribuição, a serem tidos em conta no quantum a pagar pelo
empregador, a título de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, tendo havido nos
últimos tempos decisões divergentes que vêm mudando as tendências decisórias dos tribunais
portugueses.

Por outro lado, no que diz respeito ao regime da prescrição dos créditos laborais e
respetivos prazos, o entendimento é também díspar no seio da doutrina, no que concerne à
aplicação das normas respeitantes a prescrição previstas no Código Civil. Por último, discute-se
a natureza civil ou laboral dos juros de mora gerados pela mora derivada do incumprimento no
pagamento da retribuição, ou parte desta.

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Abstract

The Wage and Complementary Benefits

Analyses of the repercussions of holiday pay, holiday allowance and Christmas


allowance

The present study aims to understand the influence that the concept of wage can have in the life
of an employee, mostly regarding to its account for the purpose of holiday pay, holiday allowance
and Christmas allowance, exploring the underlying concept development aspects, seeking to
further the role that complementary patrimonial benefits, provided by the employer to the
employee, have in his life.

To pursue this goal we seek, firstly, to explain the labour law scheme, exploring the essential
elements of the employment contract, as the principal mechanism of regulation of jus-labour
relations, and finally we inquire about the concept of wage that, in short, is what in the terms of
the contract, the rules that govern the contract or customs, an employee is entitled in return for
his work.

It is clear that, through primarily doctrinal and jurisprudential research, in practice, decisions
within these matters have not been unanimous in regard to the evaluation criteria for periodicity
and regularity for integration purposes of certain wage supplements in the concept of wage, to be
taken into account in the quantum to be paid, by the employer, in respect of holiday pay, holiday
allowance and the Christmas allowance, have been divergent decisions in recent times, which
have changed the decision trends of the Portuguese courts.

On the other hand, regarding the system of prescription the labour credits and respective
deadlines, the understanding is also uneven within the doctrine, concerning the application of the
rules relating to the prescription provided by the Civil Code. Finally, we discuss the civil or labour
nature of arrears, generated by default derived of the failure to pay the wage, or part thereof.

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viii
Nota Prévia

As referências bibliográficas são citadas pelo autor, título, editora, local de publicação,
data e página.

A bibliografia final representa as obras consultadas, relacionadas com o tema.

O diploma legal a que recorremos ao longo deste é a Lei


n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterada pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro,
53/2011, de 14 de outubro, 3/2012, de 10 de janeiro e 23/2012, de 25 de junho, doravante
Código do Trabalho.

Sempre que a disposição legal é referida sem indicação da fonte, deve entender-se que
se reporta ao Código do Trabalho.

Se for imperioso citar diplomas precedentes, por necessidade elucidativa a nível de


evolução legislativa, fá-lo-emos identificando o diploma em causa.

A jurisprudência cuja fonte não esteja indicada pode ser encontrada em www.dgsi.pt (Cf.
índice de jurisprudência em anexo).

A escrita respeita o novo acordo ortográfico, sendo que as citações da doutrina e


jurisprudência respeitam o acordo ortográfico utilizado pelos autores originários.

ix
x
Índice

Agradecimentos………………………………………………………….…………………………….. iii

Resumo…………………………………………………………………….…………………………….. v

Abstract…………………………………………………………………….……….…….…….……….. vii
Nota Prévia………………………………………………………….……………..……………………. ix

Índice………………………………………………………….………….………………..…………….. xi

Abreviaturas e Siglas Utilizadas……………………………………………………….…………… xiii

Introdução………………………………………………………….…………….……….…………….. Pág. 17

1. O Conceito de Retribuição……………………………………………………………….………. Pág. 19

2. Evolução Histórica - Enquadramento Legislativo………………………………………….. Pág. 21

2.1. Formação das Relações Laborais……………………………………………………….. Pág. 22

2.2. Fontes internas do Direito do Trabalho………………………………………………… Pág. 24

2.3. Proteção Constitucional……………………………………………………………………. Pág. 25

2.4. Fontes Externas do Direito do Trabalho………………………………….……………. Pág. 26

3. O Contrato de trabalho………………………….……………………………………………….. Pág. 27

4. A Tutela da Retribuição…………………………………………………………………….…….. Pág. 33

4.1. Não Discriminação e Igualdade……………………………………………….…………. Pág. 33

4.2. Irredutibilidade Salarial…………………………………………………………………….. Pág. 34

4.3.Proibição da Renúncia, Insusceptibilidade de Cessão e Impenhorabilidade… Pág. 37

4.4. Proibição de Compensação e Descontos……………………………………………… Pág. 38

5. Garantias dos Créditos Laborais……………………………………………………………….. Pág. 41

5.1. Termos Gerais…………………………………………………………………..……………. Pág. 41

5.2. Privilégios Creditórios……………………………………………………….……………… Pág. 42

5.3. Responsabilidade Solidária das Sociedades em Relação de Domínio ou de


Pág. 43
Grupo………………………………………………………………………………………………………

5.4 Responsabilidade de Sócio, Gerente, Administrador ou Diretor…………………. Pág. 44

5.5. Pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial…………………………………………. Pág. 45

xi
6. Retribuição-Noção, Elementos e Modalidades de Retribuição ………………….…….. Pág. 47

6.1. Cálculo do Montante Retributivo ………………………………………….…………….. Pág. 49

6.2. Retribuição em Concreto e Retribuição Modular……………………………………. Pág. 50

6.3. A Retribuição como Elemento Essencial………………………………………………. Pág. 53

6.4. Componentes da Retribuição……………………………………………….……………. Pág. 55

6.5. O Caráter Regular e Periódico das Prestações Retributivas……………………… Pág. 58

6.6. A Presunção Estabelecida…………………………………………………………………. Pág. 62

7. Prestações Complementares – Exclusões Legais…………………………………………. Pág. 69

8. Retribuição de Férias e o Subsídio de Férias……………………………………………….. Pág. 79

9. Subsídio de Natal…………………………………………………………………………….……. Pág. 99

10. O Ónus da Prova – Presunção de Laboralidade…………………………………………. Pág. 105

11. Prescrição – Implicações no Pagamento da Retribuição…………………….……….. Pág. 109

11.1 A Prescrição no Código Civil Vigente - Resenha……………………………………. Pág. 109

11.2. A Prescrição no Código do Trabalho – Evolução Legislativa Nacional………. Pág. 112

11.3. A Prescrição dos Créditos Laborais…………………………………………………… Pág. 115

11.4. A Prescrição dos Juros…………………………………………………………………… Pág. 120

12. Do Exercício Abusivo do Direito por Suppressio……………………………….………... Pág. 125

Conclusões………………………………………………………………………………………………. Pág. 133

Bibliografia………………………………………………………………………………………………. Pág. 137

Índice de jurisprudência……………………………………………………………………………… Pág. 141


Anexo……………………………………………………………………………………………………… Pág. 143

xii
Abreviaturas e Siglas Utilizadas

Ac. (Acs.) – Acórdão (s)

al. – Alínea

art. (arts.) – Artigo(s)

BMJ – Boletim do Ministério da Justiça

BTE – Boletim do Trabalho e Emprego

CCivil – Código Civil

Cf. – Conferir

Cit. – Citada

CJ – Colectânea de Jurisprudência

Coord. – Coordenador/coordenação/coordenado

CPC – Código de Processo Civil

CPT – Código de Processo do Trabalho, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 489/99, de
09/11, revisto pelo Dec-Lei n.º 295/2009, de 13/10.

CSC – Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 02 de
Setembro

CT/2003 – Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de agosto

CT – Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro

CRP – Constituição da República Portuguesa

E. – Editora

Ed. – Edição

IDT – Instituto de Direito do Trabalho

IRCT – Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho

xiii
LCCT – Lei da Cessação do Contrato de trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 64A/89, de
27/02

LCT – Lei do Contrato de trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24/11/1969

n.º(n.os) – Número(s)

ob. – Obra

org. – Organizado/organização

pág. (págs.) – Página(s)

Prof. – Professor

RDES – Revista de Direito e de Estudos Sociais

RJCIT – Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto- Lei n.º 49
408, de 24/11/1969

RJCT – Regime Jurídico do Contrato de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de
24/11/1969

RLJ – Revista de Legislação e de Jurisprudência

RCT – Regulamentação do Código do Trabalho

TRC – Tribunal da Relação de Coimbra

TRE – Tribunal da Relação de Évora

TRG – Tribunal da Relação de Guimarães

TRL – Tribunal da Relação de Lisboa

TRP – Tribunal da Relação do Porto

segs.– Seguintes

STA – Supremo Tribunal Administrativo

STJ – Supremo Tribunal de Justiça

xiv
TFUE – Tratado de Funcionamento da União Europeia

UE – União Europeia

Vol. – Volume

vd. – Ver

xv
xvi
Introdução

O motivo que nos levou a escolher “A Retribuição e as Prestações Complementares -


Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal” como tema de
dissertação de Mestrado advém das diversas e conflituantes interpretações doutrinárias e
jurisprudenciais levantadas ao longo dos anos sobre tais conceitos, bem como a relevância
prática que o esclarecimento destas questões possa proporcionar na retribuição de férias,
subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores, no âmbito quotidiano da relação laboral.

Com o presente estudo propomo-nos tecer algumas considerações acerca de um dos


elementos que caracterizam o contrato de trabalho, ou seja, a retribuição. Nestes termos, vamos
começar por fazer uma pequena resenha histórica do surgimento da legislação laboral,
sobretudo no que concerne ao contrato de trabalho e à sua retribuição como elemento essencial
e caracterizador.

Seguidamente, procederemos à análise e enquadramento jurídico das prestações


complementares, sua eventual integração no conceito de retribuição e suas repercussões,
nomeadamente no que diz respeito à retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal,
dando nota, ao longo de todo o estudo, do entendimento jurisprudencial na interpretação destas
matérias.

Teceremos ainda algumas considerações no que concerne à aplicação do instituto da


prescrição dos créditos laborais, que comporta indagações de proeminente relevância na
demanda judicial das relações juslaborais. Ainda no âmbito do instituto da prescrição, vamos
expor algumas considerações acerca de uma figura criada pela jurisprudência alemã, a chamada
Verwirkung ou Suppressio.

Propusemo-nos analisar este tema porque, para além de ser uma matéria fulcral na
disciplina laboral, que interfere profundamente no quotidiano das empresas e trabalhadores,
alcança consequências bastante gravosas para os sujeitos da relação laboral e por isso fervilha
abundantemente no seio dos tribunais portugueses, originando decisões judiciais bastante
contraditórias em todas as instâncias decisoras, que até aos dias de hoje não encontraram uma
solução consensual e sistemática para estas questões.

17
Sendo certo que a retribuição é um conceito jurídico, ele procura regular um modelo
social que tem vindo a conhecer alterações no paradigma de relação entre trabalho e retribuição,
não apenas fruto das transformações económicas e sociais, como no aparecimento de novos
modelos de trabalho, os quais acompanham o progresso.

Reconhecendo que a aplicação do princípio mutatis mutantis poderia conduzir a uma


desregulação da relação de retribuição, do valor do trabalho, por tender a acabar com modelos
sociais baseados em classes ou profissões, a dúvida existente tanto nos tribunais e nas suas
decisões, como na difícil gestão da coisa pública tem levado a um conflito – eventualmente
geracional - onde as necessidades do mercado, a realidade política e social e ainda o
entendimento político traduzido por força de lei, confrontam-se com as necessidades de
retribuição e os seus respetivos direitos adquiridos.

Trata-se assim de estabelecer garantias de direitos sobre o valor do trabalho, a par da


mudança progressiva que o mercado tem vindo a trazer para a realidade laboral e, ainda, a
capacidade do Estado em continuar a corresponder a princípios constitucionais, estabelecidos
há mais de 40 anos, numa realidade presente que coloca em causa direitos estabelecidos.

Deste conflito resulta ainda uma instabilidade entre poderes públicos do Estado, dos
quais deriva uma consequência política que põe em causa sustentabilidade das finanças do
Estado, da relação de confiança que se estabelece com os contribuintes, e ainda das legítimas
expectativas dos trabalhadores.

O conceito de retribuição, no seu princípio jurídico, tem assim sido desafiado e posto em
causa do ponto de vista político, sendo razão das maiores perturbações sociais dos últimos
anos.

Torna-se por tudo isto imperativo atentar nos conceitos jurídicos sobre o tema e de que
forma poderão acompanhar os novos tempos, ou, se for caso disso, garantir justiça e equidade
social e de retribuição em virtude dos normativos legislativos em vigor.

Não será, por certo, ambicioso considerar que a necessária clarificação desta relação e
do conceito de retribuição constitui um importante contributo não apenas jurídico mas social e
político para todos aqueles que, nos tempos de hoje, se confrontam com a decisão pública e a
obrigação de proceder à implementação destes princípios.

18
1. O Conceito de Retribuição

Nos termos do n.º 1 do art. 258.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro 1 , considera-se retribuição “a prestação que, nos termos do contrato, das
normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho”.
O n.º 2 do mesmo artigo vem ainda esclarecer que a retribuição “compreende a retribuição base
e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em
espécie”.

Dir-se-á em primeira mão que o conceito de retribuição é um dos principais temas do


direito do trabalho, desde logo porque é uma das matérias que, no âmbito do contencioso
laboral, mais ocupa os tribunais portugueses decorrentes de reivindicações inerentes à
integração de certas prestações como sendo retributivas e porque constitui um elemento
essencial da relação laboral, cuja génese é a sua onerosidade e, por outro lado, porque a
obrigação de retribuição é a principal obrigação do empregador. Se assim não fosse, não viria
previsto no próprio conceito de contrato de trabalho nos termos do art. 11.º do CT: “ contrato de
trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga mediante retribuição, a prestar a sua
atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob autoridade destas”
(sublinhado nosso). Ademais, é através da retribuição que se afere a qualidade de vida dos
cidadãos, se avalia o grau de desigualdade social e económica dos mesmos em relação a outros
regimes políticos, económicos e sociais.

A questão que se levanta é a de saber se a retribuição é pura e simplesmente a


contrapartida do trabalho efetuado pelo trabalhador e da sua disponibilidade para o fazer, ou se
a retribuição engloba também a atribuição ao trabalhador de prestações em face de outras
situações que não constituem diretamente contrapartida do seu trabalho. Quanto a este aspeto o
n.º 2 do preceito supra referido esclarece que a retribuição inclui “outras prestações regulares e
periódicas”. E é neste ponto que nos detemos: se devem as prestações complementares ser
consideradas retribuição, para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de
Natal e, em caso afirmativo, quais devem ser consideradas retribuição e que requisitos devem
cumprir para integrar tal conceito.

1
Alterado pelas Leis n. 105/2009, 53/2011, 23/2012, 47/2012 e 65/2013.
os

19
Este estudo tem uma pandórica relevância prática uma vez que influi com matérias
essenciais do regime jurídico-laboral, designadamente porque a qualificação de certa prestação
como retribuição determina a aplicação dos regimes de garantia e de tutela dos créditos
retributivos previstos no CT nos termos do art. 258.º, n.º 4 – a proibição de compensação e
descontos nos termos do art. 279.º, a garantia de proibição de diminuição da retribuição ao
trabalhador nos termos do art. 129.º, al. d), (salvo nos casos previstos no CT e nos IRCT) e a
garantia dos salários intercalares em caso de despedimento ilícito nos termos do art. 390.º.

Comecemos por averiguar a evolução histórica do Direito do Trabalho e o contrato de


trabalho enquanto o principal negócio jurídico do direito laboral, e o corolário da retribuição
como elemento essencial do contrato de trabalho, bem como as variações que o conceito de
retribuição sofreu na ordem jurídica interna.

20
2. Evolução Histórica - Enquadramento Legislativo

O contrato de trabalho enquanto negócio jurídico de direito privado está previsto no


Código Civil, no Livro II, intitulado “Direito das Obrigações – Dos Contratos em Especial”. Lê-se
aí, no art. 1152.º do CCivil, que o contrato de trabalho “é aquele pelo qual uma pessoa se
obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob
autoridade e direção desta” e, o artigo 1153.º do mesmo diploma acrescenta que “o contrato de
trabalho está sujeito a legislação especial”, remetendo assim o CCivil esta disciplina para
legislação especial – concretamente, nos dias de hoje, o Código do Trabalho 2 . Dada a
especificidade das características do contrato de trabalho e da dinâmica e complexidade das
relações laborais, justifica-se que esta disciplina seja autonomizada do direito obrigacional puro,
por opção jurídico-política, uma vez que lhe corresponde uma realidade sociológica igualmente
autónoma 3 . Grande parte da doutrina indica que este tipo negocial tem como característica
principal o facto de a força do trabalho ser um elemento indissociável do trabalhador – pessoa
singular – e, citando LEAL AMADO 4 , “ao alienar a disponibilidade da sua força de trabalho, o
trabalhador aliena-se, de algum modo, a si próprio”. No entanto, entendemos que esta
característica não pode por si só ser fundamento para a autonomia deste ramo do direito, uma
vez que existem outras prestações pessoais, ou infungíveis, consagradas no CCivil.

Esta imprescindibilidade de regular a relação jurídica entre o trabalhador e o empregador


surge pela manifesta assimetria da relação de trabalho, uma vez que na maior parte dos casos,
o trabalhador carece da retribuição, que aufere mediante a prestação de uma atividade, para
fazer face às suas necessidades essenciais, estando numa posição de dependência económica.
Por outro lado, na execução da relação de trabalho tem de se submeter à autoridade e direção
do empregador, havendo assim uma subordinação jurídica do primeiro em relação a este último.

O contrato de trabalho e a obrigação de remuneração da respetiva atividade prestada,


tem as suas raízes no Direito Romano e sofreu algumas alterações decorrentes da evolução
histórica das circunstâncias políticas e sociais daquela sociedade. Inicialmente, numa economia
predominantemente agrícola, estas atividades eram prestadas no âmbito da família, isto é, os
elementos familiares sobreviviam dos proveitos da sua própria agricultara, considerada uma

2
Cf. art. 11.º do Código do Trabalho.
3
Não obstante a aplicação subsidiária do regime jurídico do CCivil
4
Amado, João Leal in “Contrato de trabalho”, 6.ª ed., janeiro 2014, Coimbra Editora, pág. 20.

21
atividade digna para qualquer cidadão romano. Com a expansão do Império Romano e o
aumento do número de pessoas em regime de trabalho servil, houve também um acréscimo no
que diz respeito à concorrência do trabalho manual, que começou a perder dignidade sendo
associado a trabalho prestado por escravos, passando assim a ter um sentido pejorativo. No
entanto, além da “elite” de cidadãos romanos que dispunha de escravos para efetuar aqueles
trabalhos manuais pouco dignos, existiam também duas classes de cidadãos romanos: uma
classe de homens livres que, não dispondo de escravos nem de outro meio económico, locavam
os seus serviços (operae) em contrapartida de um salário (merces), que se considera uma
recompensa (pretium). No fundo, eram homens livres sem dignidade social por realizarem
atividades desprezíveis à luz daquela sociedade (mercennarius). Por outro lado, surge a classe
de cidadão que se dedicava ao trabalho intelectual, com elevada estima da sociedade romana
(operae liberales). Eram consideradas atividades insuscetíveis de preço, que o homem intelectual
livre prestava por amizade ou por cumprimento de um officium que não concebe uma
remuneração. Não obstante, surgiu o sentimento de injustiça pois, muito embora não devessem
ser pagas, o tempo e despesas feitas em prol do exercício do trabalho intelectual, de algum
modo deviam ser compensadas, pelo que surgiu a figura do honorarium, que visa compensar as
operae liberales . 5,6

2.1. Formação das Relações Laborais

Sem prejuízo das fontes do Direito Romano, como refere MONTEIRO FERNANDES7, “o ponto
de partida do processo de formação do Direito do Trabalho (como ramo autónomo de Direito)
esteve no primado do contrato de trabalho como instrumento de regulação das situações do
empregador e do trabalhador, na linhas das concepções liberal-individualistas que serviram de
suporte à Revolução Industrial”.

Com o regime capitalista derivado da Revolução Industrial, baseado nos princípios da


liberdade de empresa e de concorrência, sendo a propriedade privada altamente tutelada e

5
Justo, António Santos in “O Contrato de trabalho no direito romano (locatio-conduction operarum)”, separata Ars Iudicandi, Estudos em
Homenagem ao Prof. Doutor António Castanheira Neves, Vol. III, Boletim da Faculdade de Direito, Studia Iuridica, n.º 92, Universidade de
Coimbra, Coimbra E., pág. 775-800.
6
A este propósito: Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Direito do Trabalho Parte I – Dógmática Geral”, 2.ª ed., outubro de 2009, Almedina,
pág. 43 e segs.
7
Fernandes, António Monteiro in “Direito do Trabalho”, 16.ª ed., outubro de 2012, Almedina, pág. 29.

22
deixando a classe operária sem qualquer proteção face à superioridade dos patronatos,
irrompeu, assim, o primeiro movimento sindical dos trabalhadores – é a chamada Questão
Social –, que careciam de representantes junto das entidades empregadoras, de forma a
exigirem melhores condições de trabalho e qualidade de vida minimamente aceitável para a
classe trabalhadora, autonomizando assim, pela primeira vez, o Direito do Trabalho, surgindo
este ramo do direito como resultado de uma tensão negocial, antes de ser propriamente uma
opção política.

Até então, os trabalhadores não dispunham de qualquer proteção estadual e modelo


organizativo, o que provocava um ambiente de competição entre si na disposição da sua força
de trabalho, ao contrário dos patronatos que dispunham de uma vasta oferta de pessoas que se
disponibilizavam para trabalhar. Tendo em vista a promoção de melhores condições de trabalho,
houve a aceitação generalizada da direta intervenção estadual, nomeadamente através da
criação de normas laborais e da proteção do legislador constitucional 8 , nascendo assim este
ramo do Direito com o escopo que se mantem até aos dias de hoje: tutela da relação laboral,
promovendo a proteção da parte mais débil da relação jurídica9.

O Direito do Trabalho português acompanhou o desenrolar dos desenvolvimentos


políticos e sociais europeus, sendo certo que em Portugal a evolução jurídica europeia só
décadas mais tarde é que foi seguida, os problemas sociais não foram sentidos com tanto vigor,
e quem desencadeou as reformas no âmbito da legislação laboral foi o próprio estado, na
sequência do que havia ocorrido em países vizinhos10.

Embora o contrato de trabalho encontre a suas raízes no Direito Romano o processo de


formação desta área do Direito no nosso ordenamento jurídico, é relativamente recente11. Apenas
no século XIX surgiu um conjunto de diplomas no ramo laboral com temas tão relevantes como
a idade mínima de admissão ao trabalho12, o estatuto das associações de classe13, a proteção do

8
O texto do atual do art. 59.º da CRP foi introduzido em 1982 (anterior art. 60.º).
9
A este propósito, vd., LEAL AMADO, “Contrato...”; António Monteiro Fernandes, op. cit.; Bernardo da Gama Lobo Xavier, “Manual de Direito do
Trabalho”, abril de 2011, Verbo; José João Abrantes, “Do Direito Civil ao Direito do Trabalho. Do liberalismo aos nossos dias”, 1978, Coimbra E.
10
Martinez, Pedro Romano in “Direito do Trabalho”, 6.ª ed., maio de 2013, Almedina, pág. 76.
11
Aliás, é igualmente recente a constituição da Organização Internacional do Trabalho, datada de 1919, e na qual participam os representantes
dos Governos, dos trabalhadores e dos empregadores de grande parte dos países do mundo.
12
Decreto de 14/4/1891.
13
Decreto de 9/05/1891.

23
trabalho das crianças e das mulheres, o tempo de trabalho, o descanso semanal14, etc. Mas a
sua formação decorreu sobretudo ao longo do século XX, nomeadamente com a consagração do
direito à greve e do lock-out (então lícito) através do Decreto, com força de Lei, de 6 de
dezembro de 191015.

2.2. Fontes internas do Direito do Trabalho

A nível do ordenamento jurídico interno, a questão social suscitada pela industrialização


teve um impacto social tardio, sendo que só em finais do século XIX é que começou a surgir a
legislação de proteção ao trabalho16, provavelmente devido ao clima de instabilidade política e de
guerras civis ocorridas durante os meados desse século.

Até ao CT de 200317, no que respeita ao regime jurídico da retribuição, tinha aplicação


legal a Lei n.º 1952, de 10 de março de 1937, que consagrava no seu art. 1.º a noção de
contrato de trabalho, onde já se previa uma remuneração. Mais tarde entrou em vigor o Decreto-
Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, que de seguida sofreu alterações com a entrada em
vigor do Regime Jurídico do Contrato de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24
de novembro de 196918.

Em 2009, a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, aprovou a revisão do CT de 2003, e


mais tarde a Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, procedeu à alteração do referido diploma.

Finalmente, em 2012, procedeu-se à terceira alteração do CT de 2003, com a


aprovação e publicação da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, vigente nos dias de hoje.

É também relevante para perceber o enquadramento jurídico-laboral atender à


regulamentação destes diplomas, designadamente, a Regulamentação do Contrato de Trabalho,
aprovado pela Lei n.º 35/2004 de 29 de Julho, que regulamenta a Lei n.º 99/2003, de 27 de
Agosto, que aprovou o Código do Trabalho.

14
Decreto de 3/08/1907.
15
Marcos, Rui Manuel de Figueiredo in “A emergência do contrato de trabalho no direito português”, Revista da Faculdade de Direito da
Universidade do Porto, 2011, pág. 217 e segs.
16
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 44 e segs.
17
Lei n.º 29/2003, de 27 de agosto – que aprovou o Código do Trabalho.
18
De ora em diante designado LCT (Lei do Contrato de trabalho).

24
2.3. Proteção Constitucional

A tutela da relação laboral encontra-se também salvaguardada constitucionalmente 19 .


Desde logo os princípios basilares que norteiam a relação laboral estão previstos no capítulo dos
Direitos Liberdades e Garantias – segurança no emprego e proibição de despedimento sem justa
causa, criação e atuação de comissão de trabalhadores, liberdade sindical, direito de
contratação coletiva, direito à greve - e no capítulo dos Direitos e Deveres Económicos – direito
ao trabalho e à retribuição, direito à organização do trabalho em condições dignas, direito a
condições de higiene, segurança e saúde no trabalho, direito de repouso, direito a um limite
máximo de jornada de trabalho, direito ao descanso semanal, férias periódicas e pagas, direito a
assistência nos casos de desemprego, direito a assistência e justa reparação em casos de
acidente de trabalho ou doença profissional, etc.

A Constituição da República Portuguesa configura assim uma importante fonte do direito do


trabalho, aliás fonte das fontes, sendo que se impõe fazer uma chamada de atenção para a
reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de direitos,
liberdades e garantias, pelo que estas matérias para serem reguladas pelo Governo (decreto-lei
governamental) carecem de prévia autorização (lei de autorização – lei de valor reforçado20) da
Assembleia da República, devendo esta definir o objeto, sentido, extensão e duração da
autorização, nos termos do art. 165.º, n.º 2 da CRP.

Fora do âmbito dos direitos, liberdades e garantias, embora o Governo possa legislar
sem autorização prévia do Parlamento, os trabalhadores sempre podem participar na elaboração
legislativa, através das comissões de trabalhadores e das associações sindicais e a sua 21

participação é de tal forma importante que a violação deste direito configura uma
inconstitucionalidade22, na medida em que a participação é requisito procedimental essencial.

19
Cf. art. 53.º e seg. da Constituição da República Portuguesa.
20
Cf. art. 112 º, n.º 2 da CRP.
21
Cf. art. 54.º, n.º 5 al. d) e 56.º, n.º 2 al. a), ambos da CRP.
22
Sendo que uma Lei ou Decreto-Lei que não respeite o direito constitucionalmente reconhecido às associações sindicais o de participarem na
elaboração da legislação do trabalho, é formalmente inconstitucional, por violação do preceituado no art. 56.º da CRP.

25
2.4. Fontes Externas do Direito do Trabalho

No que concerne a fontes externas do Direito do Trabalho é de referir, em primeiro lugar,


as Convenções Internacionais, entre elas a Declaração Universal dos Direito do Homem 23 , o
Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, a Carta Social Europeia e
as Convenções e Recomendações da OIT.

Em segundo lugar, e não menos importante, o Direito da União Europeia através do


Tratado sobre o Funcionamento da UE, Diretivas e Regulamentos, Carta dos Direitos
Fundamentais da UE, e a Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos
Trabalhadores (1989)24.

Assim, o Direito do Trabalho, além de estar sob a alçada das fontes externas que
referimos, a nível do ordenamento jurídico interno, está regulado não só pela Constituição da
República Portuguesa, mas também pela legislação ordinária (leis e decretos-leis), nos termos do
art. 1.º do CT.

Por outro lado, o contrato de trabalho, como mecanismo de regulação das relações
juslaborais, está sujeito, em especial, aos instrumentos de regulamentação coletiva de
trabalho 25 , 26 que, nos termos do art. 476.º do CT, só podem ser afastados pelo contrato de
trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis ao trabalhador, e aos usos laborais27
que não contrariem a boa fé28.

23
Cf. art. 16.º, n.º 2 da CRP – “Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados em
harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem”.
24
No âmbito do direito da União Europeia, o Tribunal de Justiça, questionado prejudicialmente pelos tribunais britânicos e alemães a propósito
da aplicação do Princípio da Igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso ao emprego à formação e promoção de profissionais,
veio finalmente interpretar o significado de remuneração – Cf. Ac. “Defrenne”: acórdão de 25 de maio de 1971, 80/70.
25
Cf. arts. 2.º e 3.º do Código do Trabalho – os IRCT podem ser negociais e não negociais. Os negociais dizem respeito às convenções coletivas
de trabalho nos termos do art. 485.º e segs.
26
Os IRCT negociais dizem respeito às convenções coletivas de trabalho nos termos do art. 485.º e seg. (contrato coletivo, acordo coletivo ou
acordo de empresa), acordo de adesão nos termos do art. 504.º ou decisão de arbitragem voluntária nos termos do art. 506.º todos do Código
do Trabalho. Os IRCT não negociais podem consistir em portarias de extensão nos termos do art. 514, portaria de condições de trabalho nos
termos do art. 517.º, decisão de arbitragem obrigatória ou necessária nos termos dos arts. 508.º e 510.º, respetivamente, todos do Código do
Trabalho.
27
Usos laborais são uma autovinculação do empregador resultante de exigências de coerência e de racionalidade, de acordo com as expetativas
geradas, pela sua prática regular e uniforme, dado a sua posição de autoridade. Podem ser distinguidos entre usos externos/profissionais e usos
internos/da empresa. Estes últimos têm carácter reiterado, espontâneo e são generalizados, devendo ainda ser favoráveis aos trabalhadores.
28
O princípio geral da boa-fé vem consagrado no n.º 2 do art. 762.º do CCivil: “No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do
direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé”.

26
3. O Contrato de trabalho

Do art. 11.º do CT podemos retirar os elementos essenciais caracterizadores da


existência de um contrato de trabalho.

É consagrada no art. 11.º do CT uma presunção ilidível (iuris tantum) da existência de


um contrato de trabalho, isto é, admite prova em contrário e ocasiona a inversão do ónus da
prova, fazendo recair sobre a outra parte a prova do contrário do facto que serve de base à
presunção. O legislador incluiu no n.º 1 desta norma uma lista de indícios que correspondem,
em grande parte à lista de índices de subordinação utilizada pela jurisprudência e doutrina, há
vários anos, como método de apuração de subordinação jurídica na relação em vigor entre as
partes.

Em primeiro lugar, o contrato de trabalho é um negócio jurídico bilateral, envolvendo


dois polos, com posições jurídicas opostas, na maioria dos casos tendo uma pessoa em cada
pólo, e cujas declarações de vontade são opostas mas harmonizáveis entre si29.

É um contrato nominado e típico, uma vez que este está previsto e é regulado por lei,
cujo conteúdo consagra prestações patrimoniais (atividade prestada pelo trabalhador e a
prestação remuneratória devida pelo trabalhador).

É um contrato oneroso e sinalagmático30, isto é, existe uma relação de reciprocidade e


interdependência de obrigações dele emergentes como explica MARIA DO ROSÁRIO PALMA
RAMALHO31, “a remuneração faz equivaler a posição das partes no contrato do ponto de vista das
vantagens que dele retiram (as utilidades decorrentes da actividade laboral para o empregador e
o enriquecimento patrimonial do trabalhador que decorre da retribuição), ao mesmo tempo que
evidencia a reciprocidade das suas obrigações negociais, uma vez que o dever de pagar a
remuneração se configura tecnicamente como a contraprestação de dever do trabalho.

Todavia o sinalagma do contrato de trabalho é um sinalagma imperfeito32, porque, em


alguns casos, subsiste o dever principal de uma das partes perante a ausência de prestação da

29
Varela, João de Matos Antunes in “Das Obrigações em Geral”, Volume I, 10.ª edição, 2002, Almedina, Pág. 216.
30
Varela, João de Matos Antunes, op. cit., Pág. 405 e seg.
31
Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado de Direito do Trabalho Parte II – Situações Laborais Individuais”, 4.ª ed., dezembro de 2012,
Almedina, pág. 85.
32
Paula Quintas e Hélder Quintas referem a “sinalagmaticidade atípica do contrato de trabalho”, in “Manual de Direito do Trabalho e de
Processo do Trabalho”, março de 2010, Almedina, pág. 43.

27
outra”, nomeadamente, no que diz respeito à remuneração em período de férias. É um contrato
duradouro e de execução continuada, cujas prestações não se esgotam, mas podendo ser
determinada, consoante o contrato seja por tempo indeterminado ou com termo resolutivo e tem
um caráter eminentemente pessoal33.

O contrato de trabalho obedece ao princípio da liberdade de forma, ou seja, é um


contrato consensual, nos termos do art. 110.º do CT 34 , podendo o contrato celebrar-se
verbalmente ou mediante comportamentos concludentes, o que permite uma maior proteção do
trabalhador uma vez que este pode provar a existência de um contrato de trabalho celebrado,
ainda que tacitamente. O silêncio das partes não significa que não exista, de facto, uma relação
juslaboral e para a aferirmos servimo-nos do art. 11.º do CT35, que estabelece uma presunção
judicial36, permitindo assim ao julgador, através de um juízo de normalidade que se traduz na
referida presunção, avaliar os factos e detetar a existência de um contrato de trabalho gerador
de obrigações37.

No entanto, a lei prevê expressamente algumas exceções à liberdade de forma, a saber:


exige-se forma escrita na promessa de contrato de trabalho, nos termos do n.º 1 do art. 103.º;
no contrato de trabalho com pluralidade de empregadores, nos termos do art. 101.º, n.º 2; no
contrato de trabalho a termo, nos termos do art. 141.º, n.º 1; no contrato de trabalho a tempo
parcial, nos termos do art. 153.º, n.º 1, no contrato de trabalho em comissão de serviço nos
termos do art. 162.º, n.º 3; no contrato de prestação subordinada de teletrabalho, nos termos do
art. 166.º, n.º 4; no acordo de cedência ocasional de trabalhadores, nos termos do art. 290.º,
n.º 1 e no acordo de pré-reforma, nos termos do art. 319.º, todos do CT38.

Quanto ao carácter eminentemente pessoal, JÚLIO GOME respondendo ao que considera 39

ser a doutrina dominante, indica que se está a usar expressões não sinónimas para se referir a
esta característica. Este autor explica que, não raras vezes, se diz que o contrato de trabalho é

33
Sobre esta matéria, Amado, João Leal, op. cit., pág. 73 e seg.
34
Cf. art. 219.º do CCivil.
35
A Presunção Judicial prevista no art. 11.º do CT auxilia na diferenciação do contrato de trabalho com outros tipos negociais, nomeadamente
através da aplicação do método indiciário, que se traduz numa avaliação por aproximação da existência dos elementos caracterizadores da
relação subordinada: vinculação a um horário de trabalho, a execução da prestação em local pelo empregador, a existência de controlo externo
do modo de prestação, a obediência a ordens, a sujeição à disciplina da empresa, a modalidade da retribuição, a propriedade dos instrumentos
de trabalho e a observância dos regimes fiscais e de segurança social próprios do trabalho por conta de outrem, etc.
36
Cf. art. 351.º do CCivil.
37
Fernandes, António Monteiro in “Direito...”, pág.125.
38
Leitão, Luís Manuel Teles de Menezes in “Direito do Trabalho”, 3.ª ed., 2012, Almedina, pág. 98.
39
Gomes, Júlio in “Direito do Trabalho Volume I, As relações individuais de Trabalho”, Coimbra E., pág. 85 e segs.

28
um contrato intuitu personae e que a relação que dele resulta é uma relação fiduciária e ainda
se acrescenta que a prestação realizada pelo trabalhador é uma prestação infungível, o que
explica a impossibilidade do trabalhador se fazer substituir na prestação da sua atividade.

Em primeiro lugar cumpre esclarecer o conceito de fungibilidade e para tal efeito,


citamos ANTUNES VARELA 40 , que explica que “a prestação diz-se fungível, quando pode ser
realizada por pessoa diferente do seu devedor, sem prejuízo do interesse do credor […]; será não
fungível no caso de o devedor não poder ser substituído no cumprimento por terceiro […]. São
obrigações em que ao credor não interessa apenas o objecto da obrigação, mas também a
habilidade, o saber, a destreza, a força, o bom nome ou outras qualidades pessoais do
devedor”.

A propósito da crítica apresentada por JÚLIO GOMES, o autor, para assinalar a doutrina
dominante nesta matéria (com a qual não se identifica) cita as palavras de ROMANO MARTINEZ41
que defende que “ainda que a massificação tenha quebrado o lado fiduciário entre o trabalhador
e o empregador, não é aceitável que um trabalhador, certo dia, para a realização da actividade a
que se obrigou, se faça substituir por outrem” e continua, afirmando que “se a relação laboral
não se baseasse na fidúcia, a substituição seria admissível, pois a actividade a desenvolver pelo
trabalhador era fungível”.

Neste seguimento, JÚLIO GOMES começa por referir que há uma imprecisão terminológica
e vem distinguir e esclarecer a aplicação dos conceitos de intuitu personae, o negócio fiduciário
e a infungibilidade na relação laboral.

Em primeiro lugar, esclarece que um negócio intuitu personae é aquele negócio no qual,
para a celebração do mesmo, são levadas em consideração as características e qualidades
pessoais de uma das partes, e que as mesmas são essenciais para a decisão de contratar, e se
estas não existissem o contrato não seria celebrado com aquela pessoa em concreto.

Ora, acompanhamos a visão de JÚLIO GOMES, que hesita em aceitar que todos os
contratos de trabalho celebrados sejam um negócio intuitu personae dando, para o efeito, o
exemplo de um trabalhador contratado para distribuir prospectos no passeio em frente a um
restaurante e acrescentamos nós o exemplo de um trabalhador contratado para verificar se

40
Varela, João de Matos Antunes, op. cit., pág. 97.
41
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 414.

29
todos os passageiros de um comboio estão acompanhados do devido bilhete para aquela
viagem. Por outro lado, o mesmo autor refere que nem sempre as qualidades do trabalhador se
possam associar a uma particular relação de fidúcia. Isto é, para JÚLIO GOMES, afirmar que em
todos os contratos de trabalho se estabelece uma relação de especial confiança é um exagero,
pelo menos no que concerne a fidúcia pessoal, no sentido de que, por exemplo, quando se
contrata um manequim, devido à sua excecional beleza ou porque as suas características físicas
se adequam ao perfil escolhido para uma determinada campanha publicitária, isso não significa
que aquele manequim, com o qual se celebrou um contrato de trabalho, estabelece uma relação
de especial confiança com o empregador.

O que acontece é que, em qualquer contrato de trabalho, o empregador acredita que o


trabalhador com quem celebrou o contrato irá cumprir pontualmente o negócio celebrado e agirá
dentro do princípio da boa-fé. Embora se admita que em qualquer relação laboral existe uma
mútua confiança que decorre não só do negócio celebrado mas também dos ditames e das
normas gerais que tutelam o Direito, não se pode afirmar que pela celebração de um qualquer
contrato de trabalho, exista uma relação de fidúcia (pelo menos pessoal) e que o trabalhador
estaria obrigado a uma especial obrigação de lealdade.

Sublinha-se, no entanto, que mesmo que não haja uma especial relação de fidúcia com
o trabalhador, isto não acarreta a possibilidade de o trabalhador se fazer substituir na sua
respetiva prestação, isto porque, ainda que não se ponha em causa a questão da especial
confiança naquele trabalhador, podem existir razões de ordem técnica ou organizativa que leve a
que o empregador não aceite (nem tenha de aceitar) que pessoas estranhas à empresa tenham
acesso ao espaço da mesma.

Além disso, o empregador, ao contratar determinado trabalhador assumiu certos riscos


em relação àquele (e só àquele trabalhador), levando-o por exemplo a celebrar um contrato de
seguro de acidentes de trabalho, em que o segurado é aquele trabalhador em concreto e não
outra pessoa pela qual o trabalhador se faça substituir na execução da sua prestação, bem com
o trabalhador ao celebrar determinado contrato de trabalho assumiu, não só as obrigações
diretamente decorrentes do contrato, mas também obrigações acessórias que dificilmente se
atribuem ao seu substituto.

30
Relativamente à infungibilidade do contrato de trabalho, JÚLIO GOMES considera que em
alguns cenários se pode admitir a possibilidade de o credor (empregador) consentir que o
devedor (trabalhador) se faça substituir por outra pessoa, considerando que a possibilidade de
inclusão no contrato de trabalho de uma cláusula que permita que o trabalhador se faça
substituir excecionalmente por outrem não descaracteriza este tipo contratual, referenciando, a
título de exemplo, um professor que solicite e obtenha autorização do empregador para se fazer
substituir por um colega, com iguais competências, em certas aulas que terá de faltar, e não é
por isso que o contrato celebrado com o empregador deixa de ser considerado um contrato de
trabalho.

A nosso ver, acompanhando a opinião de LEAL AMADO42, a infungibilidade do contrato de


trabalho é inegável, uma vez que, ainda que se permita a substituição do trabalhador por outrem
para a execução das tarefas a que se vinculou, esta substituição carece sempre de
consentimento (a nosso ver expresso) do empregador.

É de destacar que o contrato de trabalho só pode ser celebrado entre uma pessoa
singular (trabalhador) e outra (s) pessoa (s), ou seja o empregador ou vários empregadores,
sendo que a figura do trabalhador não pode, então, figurar numa pessoa coletiva. Este preceito
previsto no art. 11.º afasta-se da noção consagrada no art. 1152.º do CCivil, que diz que o
“contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a
sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob autoridade e direção desta”,
estabelecendo que a atividade prestada pelo trabalhador pode ser prestada a vários
empregadores, através de um só contrato de trabalho – pluralidade de empregadores – quando
haja uma relação societária de participações recíprocas entre os empregadores, expressamente
prevista no art. 101.º do CT. Pelo contrário não é prática corrente a celebração de um contrato
de trabalho com vários trabalhadores43. Esta perspetiva é alcançada facilmente, uma vez que a
prestação do trabalhador é a sua própria força do trabalho, indissociável da pessoa humana.

Por outro lado, além do requisito da singularidade do trabalhador, o elemento


“subordinação jurídica”, constituiu um segundo requisito para a aferição da existência de um
contrato de trabalho. Esta subordinação jurídica, não corresponde a uma subordinação
económica.

42
Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 75.
43
Cf. art. 2.º do CT relativo à Contratação Coletiva.

31
Da referida definição legal resulta que o trabalhador presta a sua atividade encontrando-
se sujeito à autoridade do empregador, que recebe a dita prestação. Conforme escreve JÚLIO
GOMES44, a subordinação é “a posição jurídica passiva que corresponde ao poder de direção do
empregador e traduz um modo de ser da realização do trabalho”, ou seja, há dependência da
conduta pessoal do trabalhador na execução do contrato, às ordens, instruções e orientações do
empregador, dentro dos limites e normas do contrato que o regem. Este requisito vem
consagrado não só no art. 11.º do Código do Trabalho, mas também nos arts. 97.º e 128.º, n.º
1 al. e), do mesmo diploma. Este elemento constitutivo do contrato de trabalho permite-nos
distinguir este tipo negocial de outros contratos suscetíveis de confusão, como seja o contrato de
prestação de serviços previsto no art. 1154.º do CCivil, definido como “aquele em que uma das
partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual,
com ou sem retribuição”45.

Além dos elementos supra identificados, é ainda necessário verificar-se a existência do


terceiro elemento essencial para aferir da existência de um contrato de trabalho referimo-nos à
retribuição, conforme consagrado no art. 258.º do CT. Assim, é exigível que a atividade prestada
pelo trabalhador ao empregador seja remunerada, constituindo o contrato de trabalho, um
contrato oneroso.

E este é o item chave do estudo que aqui se apresenta, uma vez que existem outras
prestações (chamadas “complementares”) que podem ser qualificadas como retribuição em
sentido técnico, e cujo alcance não vem definido claramente na lei. Esta matéria tem uma
relevância jurídico-prática bastante ativa, na medida em que tem vindo a ser discutida no seio da
jurisprudência e tem gerado algumas decisões contraditórias, cuja análise é imprescindível para
a compreensão do estudo da retribuição.

Para esse efeito, cumpre em primeiro lugar explicitar o alcance e conceito do elemento
retribuição, passando, em primeiro lugar, pela tutela jurídica que a mesma merece.

44
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 122.
45
A distinção entre a qualificação de um contrato como sendo de trabalho ou de prestação de serviços, não é uma tarefa fácil, uma vez que nem
sempre é claro se se oferece o trabalho ou o seu resultado, uma vez que o trabalho faz derivar um resultado. Para o efeito, a jurisprudência
concebe uma técnica jurídica para distinguir estes tipos negociais: método indiciário, que ajuda o intérprete da lei a aferir, casuisticamente, da
existência de um contrato de trabalho (ou pelo contrário da prestação autónoma de um serviço) através de índices de subordinação, no âmbito
da relação jurídica existente.

32
4. A Tutela da Retribuição

Embora para o empregador a retribuição seja sempre um custo de produção, uma vez
encarada como uma diminuição da margem de lucro, a maior parte das vezes, para o
trabalhador, constitui o único meio de subsistência ou fonte prevalecente de rendimento familiar
do mesmo, sendo que qualquer aumento dessa contrapartida significa, consequentemente, um
melhoramento da qualidade de vida, merecendo que o seu regime jurídico tenha uma especial
tutela jurídica, de forma a garantir a subsistência do trabalhador e dos seus familiares.

Nesse sentido, a própria Constituição da República Portuguesa prevê no capítulo relativo


aos direitos e deveres fundamentais, concretamente no art. 59.º, n.º 3 que os salários gozam de
garantias especiais.

4.1. Não Discriminação e Igualdade

Mas, a Constituição não fica por aqui. Na al. a) do art. 59.º é proclamado o princípio da
igualdade do tratamento retributivo, ou o comummente conhecido “trabalho igual, salário igual”.
Este princípio diz que devem ser retribuídos da mesma forma os casos que têm a mesma
quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, sem existir qualquer discriminação
entre os trabalhadores que não resulte da sua categoria profissional, tarefas executadas,
rendimento e qualidade de execução, e outros aspetos atendíveis e justificáveis46.

No entanto, não serão consideradas violações ao referido princípio os casos em que o


empregador remunera de forma diferente os trabalhadores que, embora executem tarefas com a
mesma quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, têm situações pessoais
diferentes, nomeadamente em função da antiguidade. Isto deve-se à conciliação do princípio da
igualdade, com o princípio (igualmente constitucional) da liberdade da empresa e autonomia
contratual.

Outro caso em que pode suceder diferenças salariais entre trabalhadores que executem
tarefas com a mesma quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, deve-se à
possibilidade de, no âmbito da mesma empresa, serem aplicáveis convenções coletivas

46
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 574.

33
diferentes 47 , ou pelo menos, só ser aplicada determinada convenção coletiva ao trabalhador
subscritor do sindicato outorgante da mesma.

O enfoque basilar deste princípio é o de proibir as situações de discriminação em função


da idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas
(conforme lista exemplificativa prevista no art. 59.º, n.º 1 da CRP).

No que concerne à discriminação referente à retribuição, o Código do Trabalho, refere-se


expressamente ao princípio da igualdade nos termos dos arts. 23.º e 24.º.

O art. 25.º, n.º 5 do CT, estabelece a regra do ónus da prova respeitante às situações de
discriminação, ou seja, incumbe à parte que alega a situação de discriminação indicar o
trabalhador em relação ao qual é discriminado. Por outro lado, incumbe ao empregador fazer a
prova de que aquela diferença de tratamento alegada não assenta em fatores discriminatórios,
incumbindo ainda a este, manter o registo dos recrutamentos efetuados, durante cinco anos,
nos termos do art. 32.º do referido diploma.

Ainda no âmbito deste diploma legal, o art. 31.º do CT prevê a não discriminação de
retribuição em função do sexo, assegurando a igualdade das condições de trabalho, entre
trabalhadoras e trabalhadores, por execução laboral semelhante prestada ao mesmo
empregador, promovendo no n.º 5, critérios de avaliação com objetividade comum entre
mulheres e homens.

4.2. Irredutibilidade Salarial

Como já se aludiu, o legislador consagrou no art. 129.º, n.º 1 al. d) do CT, o princípio da
irredutibilidade salarial. Este princípio vai no sentido de que não pode ser diminuída a retribuição
do trabalhador, salvo casos previstos no Código do Trabalho e nos instrumentos de
regulamentação coletiva de trabalho.

47
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de fevereiro de 2012, Processo n.º 3250/09.0TTLSB.L1-4, disponível no website
www.dgsi.pt . – “A diferenciação salarial assente no princípio da filiação não constitui violação do princípio da igualdade, na vertente de “para
trabalho igual salário igual”, salvo se a razão dessa diferenciação residir apenas no facto de os trabalhadores, não beneficiados pelos aumentos
em condições idênticas às desfrutadas por outros, não serem associados da organização sindical ou das organizações sindicais que outorgaram
o IRCT, ou no facto de eles não serem sindicalizados, cabendo neste caso, a esses trabalhadores que se julgam alvo de discriminação alegar e
provar que o trabalho por eles prestado é igual, em natureza, quantidade e qualidade, ao prestado pelos trabalhadores filiados na organização ou
organizações que subscreveram a convenção colectiva cujas tabelas salariais pretendem que lhes sejam aplicadas.”

34
Quanto às situações previstas no Código do Trabalho, referimo-nos aos casos de
mudança do trabalhador para categoria inferior (art. 119.º), aos casos de mobilidade funcional
(art. 120.º), aos casos de prestação de trabalho em tempo parcial (art. 154.º, n.º 3 al. a)), por
acordo com o trabalhador o mesmo prestar trabalho intermitente durante o período de
inatividade (art. 160.º, n.º 1), aos casos de cessão de comissão de serviços (al. a), n.º 1 do art.
164.º), casos de lay-off, ou seja, durante o período de redução temporária do período normal do
trabalho ou suspensão do contrato por facto imputável ao empregador (art. 305.º, n.º 1).

Além destes casos previstos no Código do Trabalho e dos casos previstos em IRCT, o
empregador não pode diminuir o montante da retribuição do trabalhador, contando para o efeito
a retribuição base e outras prestações complementares, regulares e periódicas, prestadas como
contrapartida do trabalho.

Como explica o autor BERNARDO LOBO XAVIER 48 , deve considerar-se as retribuições


nominais e não salários reais, pelo que se pode “verificar uma diminuição efectiva da retribuição
pelo simples decurso do tempo, desde que a empresa não actualize um salário sujeito a erosão
monetária provocada pela inflação”, isto é, o empregador não está obrigado a atualizar a
retribuição de acordo com a taxa de inflação, a não ser que o contrato de trabalho preveja de
modo diferente.

Tem sido entendimento geral da jurisprudência que nos casos de retribuição parcelar
não é negado ao empregador alterar o quantitativo de algumas das parcelas ou até proceder à
sua eliminação, desde que o quantitativo da retribuição resultante desta alteração ou eliminação
pelo empregador não resulte em valor inferior àquele que o trabalhador auferia resultante do
apurado o total do somatório das parcelas49.

Tal como a Relação de Lisboa explica em sumário: “é entendimento dominante na


doutrina e na jurisprudência que o referido princípio respeita à retribuição em termos globais e
não a cada parcela retributiva de per si, permitindo, por conseguinte, a alteração, ainda que no
sentido da supressão ou da baixa de algumas parcelas retributivas, desde que o valor global não
seja diminuído” 50, ou seja, a proibição fixada nesta norma legal, não significa que o empregador

48
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 577.
49
Marecos, Diogo Vaz, in “Código do Trabalho Anotado”, 2.ª ed., Coimbra Editora – anotação ao art. 129.º.
50
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de fevereiro de 2005, Processo n.º 5655/2004-4, disponível no website www.dgsi.pt.

35
não possa unilateralmente alterar o conteúdo de uma retribuição, dita mista, do trabalhador51,
desde que o faça sem reduzir o que o trabalhador efetivamente auferia, ainda que as expetativas
do trabalhador quanto ao aumento retributivo seja frustrado.

Por outro lado, não é vedado ao empregador a cessação de certos complementos


salariais se a situação que serviu de base à sua atribuição também cessar.

Como sabemos, as prestações a título de complementos salariais, são auferidas em


função da natureza da própria prestação ou da especificidade que a sua execução implica.
Referimo-nos aos subsídios de trabalho noturno, compensação por trabalho descontínuo,
trabalho suplementar, subsídio para transporte, etc., que constituem prestações que não são
pagas como contrapartida do trabalho prestado mas sim prestações para fazer face, ou
compensar, a penosidade ou despesas específicas em virtude da natureza da prestação ou da
própria execução do trabalho, que apenas são devidas enquanto as situações que lhes servem
de fundamento persistirem assim o empregador o poder de unilateralmente cessar a atribuição
das mesmas, logo que cessem as situações de natureza especifica que servem de fundamento a
sua atribuição, sem que isso implique a violação do princípio da irredutibilidade salarial52.

Porém, JÚLIO GOMES 53 coloca em discussão um problema que não podemos deixar de
abordar. Este autor releva que o contrato de trabalho tem como elemento essencial a
retribuição, mas que a redução da retribuição não é o principal problema a ser discutido, mas
antes o pontual cumprimento do mesmo, isto é, pacta sunt servanda. O autor referiu-se, em
relação a esta questão, à evolução jurisprudencial francesa, mencionando o Acórdão SA Systia
Informatique, de 28 de janeiro de 1998, que versou sobre uma alteração, unilateral, pelo
empregador do modo de cálculo da retribuição, no qual a Court de Cassation “afirmou que o
modo de remuneração de um trabalhador constitui um elemento do seu contrato de trabalho e
não pode ser modificado sem o acordo do trabalhador”54.

Neste caso o Tribunal entendeu que, uma vez que se trata de um elemento essencial do
contrato, e que mudar-se o modo de remuneração é alterar o próprio contrato, esta alteração

51
No mesmo sentido Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, 26 de março de 2008,
Processo n.º 07S3791 E 4 DE junho de 2008, Processo n.º 08S456, todos disponíveis no website www.dgsi.pt.
52
Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal Justiça, de 25 de setembro de 2002, Processo n.º 02S1197, 4 de maio de 2005, Processo n.º 04S779 e
17 de janeiro de 2007, Processo n.º 06S2188, todos disponíveis no website www.dgsi.pt.
53
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 777.
54
A este propósito Cf. ainda, Gomes, Júlio in “Algumas observações críticas sobre a jurisprudência recente em matéria de retribuição e afins”, IV
Congresso Nacional de Direito do Trabalho, pág. 59.

36
exige o acordo do trabalhador. Anuiu-se que se a retribuição é um elemento essencial do
contrato de trabalho, que é caracterizado pelo seu montante, forma de pagamento e de cálculo,
uma vez consentido pelas partes, como integrante do conteúdo do contrato, e neste sentido só
pode ser alterado com consentimento de ambos os contraentes.

Entenda-se que foi em troca da retribuição acordada que o trabalhador consentiu em se


submeter à autoridade e direção do empregador, sendo este um elemento essencial do contrato
que configura a contrapartida da prestação do trabalho. Pelo que aceitar que, unilateralmente, o
empregador o pudesse alterar seria, também, segundo o entendimento da jurisprudência
francesa, por em causa, o princípio basilar do direito dos contratos - pact sunt servada – uma
vez que o contrato de trabalho é um contrato na aceção civilista e, portanto, deve ser
pontualmente cumprido.

4.3. Proibição da Renúncia, Insusceptibilidade de Cessão e


Impenhorabilidade

Ainda a este propósito, é de evidenciar a proibição da renúncia à retribuição.

Não é lícito renunciar à retribuição durante a vigência do contrato de trabalho – referimo-


nos não só à retribuição a título de contrapartida do trabalho prestado, mas também a
retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal.

Após a cessação do contrato de trabalho, a jurisprudência entende que há possibilidade


de renúncia à retribuição, sendo assumida esta posição claramente pelo Supremo Tribunal de
Justiça em sumário: “é entendimento deste Supremo Tribunal que o contrato de “remissão
abdicativa” tem plena aplicação no domínio das relações laborais, designadamente quando as
partes se dispõem a negociar a cessação do vínculo pois, nessa fase, já não colhe o princípio da
indisponibilidade dos créditos laborais, que se circunscreve ao período de vigência do contrato
de trabalho, o que não exclui que tal contrato não possa ser tido como inválido, sempre que
concorra um vício na declaração da vontade, seja ele intrínseco ao agente ou motivado por
terceiros”55.

55
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de novembro de 2009, Processo n.º 274/07.6TTBRR.S1, disponível no website
www.dgsi.pt.

37
No entanto, a doutrina vem discordando desta posição, pois entende que se não é
possível ceder o crédito, nos termos do art. 280.º do CT (com a exceção da parte penhorável56),
então também não se pode permitir a renúncia ao crédito retributivo (“se a lei proíbe o mais,
também proíbe o menos”).

4.4. Proibição de Compensação e Descontos

A compensação é um mecanismo que visa a extinção de obrigações, através do qual, no


lugar do cumprimento, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor.

Ao mesmo tempo que a divida se extingue, cobra-se também um crédito a que se tem
direito. Este mecanismo vem previsto no art. 847.º do CCivil, e exige, por um lado, que o crédito
seja exigível judicialmente, não podendo proceder contra ele exceção perentória, ou dilatória, e
por outro lado, exige que as duas obrigações tenham por objeto coisas fungíveis da mesma
espécie ou qualidade57.

O art. 848.º consagra a forma do negócio da compensação e prevê que o mesmo seja
feito por meio de declaração de uma das partes à outra. Este mecanismo diz respeito apenas à
compensação legal, na qual uma das partes, unilateralmente, a impõe à outra, com ou sem a
sua vontade.

No que diz respeito aos créditos retributivos é ainda vedado ao empregador a


possibilidade de descontar ou compensar a retribuição devida por conta da relação laboral, com
crédito que tenha sobre o trabalhador, nos termos do art. 279.º do CT.

A enumeração das exceções previstas no n.º 2 do referido preceito (limite de 1/6


previsto no n.º 3 (salvo al. a)), não é exaustiva na medida em que existem mais casos em que o
empregador pode, legitimamente, descontar ou deduzir no montante retributivo, na vigência do
contrato. Referimo-nos aos casos previstos no art. 247.º, n.º 2, ou seja, quando o trabalhador
em período de férias exerça outra atividade remunerada, sem que a exercesse conjuntamente
com o trabalho que presta ao empregador, ou sem o consentimento do empregador. Nestes

56
Cf. art. 738.º do Código de Processo Civil – em relação à retribuição, apenas é penhorável 1/3 da retribuição, tendo como limite máximo o
montante equivalente a três salários mínimos nacionais à data da apreensão, e como limite mínimo, o montante equivalente a um salário mínimo
nacional.
57
Ressalva feita no n.º 2 da admissão de compensação parcial, no caso de as dívidas não serem de igual montante. O n.º 3 do mesmo preceito
legal consagra que a iliquidez da dívida não impede a compensação.

38
casos, o empregador tem o direito de readquirir a retribuição de férias e o respetivo subsídio,
sendo que metade destes valores reverte para o órgão de gestão financeira da Segurança Social.

39
40
5. Garantias dos Créditos Laborais

5.1. Termos Gerais

Se o empregador não cumprir voluntária e pontualmente a obrigação emergente do


contrato de trabalho a que está vinculado, sobretudo a essencial obrigação retributiva, o
trabalhador pode lançar mão de mecanismos para a realização coativa da prestação devida,
tendo em vista a satisfação do seu crédito, executando o património do devedor, nos termos
gerais do Código Civil58.

Ainda nos termos gerais do direito civil, pelo cumprimento das obrigações respondem
todos os bens do devedor suscetíveis de penhora (ressalva feita aos regimes previstos em
legislação especial)59.

Não obstante esta garantia geral que, em princípio, abrange todo o património do
empregador indiscriminadamente, situações há em que nem todo o património do devedor é
suscetível de satisfazer os créditos laborais. Como explica ROMANO MARTINEZ60, por um lado pode
ter sido consagrado um acordo de limitação de responsabilidade nos termos do art. 602.º do
CCivil. Ou por outro lado podem existir proibições, convencionais ou legais, quanto à disposição
de certos bens do seu património.

Pode ainda suceder que haja mais do que um credor laboral e o património do
empregador não seja suficiente para satisfazer os créditos em dívida. Assim, o art. 604.º do
CCivil consagrou o princípio par condicio creditorum, procedendo-se assim ao rateio dos
créditos, sendo os trabalhadores pagos de forma proporcional, em função do valor global do
património do empregador e do montante do crédito de cada um dos credores,
independentemente da data da constituição de cada crédito.

Ainda assim, pode o património do empregador ser insuficiente para a satisfação dos
créditos dos credores laborais, pelo que o legislador laboral, com o intuito de assegurar o
pagamento das prestações pecuniárias aos trabalhadores, estabeleceu um regime próprio de

58
Cf. art. 817.º do CCivil.
59
Cf. art. 601.º do CCivil.
60
Martinez, Pedro Romano in “Garantia dos Créditos Laborais. A responsabilidade solidária instituída pelo Código do Trabalho, nos artigos 378.º
e 379.º”, RDES, abril-dezembro de 2005, n. 2, 3 e 4, pág. 222.
ºs

41
garantias, recorrendo aos privilégios creditórios e ao Fundo de Garantia Salarial, como
analisaremos de seguida.

5.2. Privilégios Creditórios

O Código do Trabalho prevê nos arts. 333.º e segs., formas de garantia dos créditos do
trabalhador em caso de incumprimento contratual por parte do empregador.

O que o legislador pretende é consagrar uma série de recursos (privilégios creditórios)


que permitam ao trabalhador a satisfação de créditos que derivem do “contrato de trabalho, ou
da sua violação ou cessação”. Como se retira da letra da lei, aqui não está só em causa a
recuperação do crédito relativo à retribuição.

Neste sentido, o art. 333.º do CT inclui todos os créditos derivados da celebração e


execução do contrato de trabalho, onde de integram os créditos retributivos, bem como os
créditos resultantes da violação da relação laboral e da própria cessação do contrato.

O não cumprimento, pelo empregador, da obrigação retributiva, traduz-se na mora61, que


pode ser o incumprimento da prestação retributiva, ou o atraso no cumprimento da prestação. A
mora quer diga respeito ao incumprimento definitivo quer ao incumprimento temporário, no que
concerne às obrigações pecuniárias, que normalmente caracterizam a prestação retributiva
devida ao trabalhador, confere ao credor o direito a uma indemnização, correspondente ao juro
legal fixado, nos termos do art. 806.º do CCivil.

Em matéria laboral, o art. 323.º do CT consagra igualmente o direito de o trabalhador


ser indemnizado com os respetivos juros, pelo não cumprimento tempestivo da prestação
retributiva, conferindo-lhe ainda a possibilidade de resolver o contrato com justa causa com
direito a indemnização, nos termos do art. 394.º, n.os 1 e 2, al. a), do referido diploma legal.

Os privilégios creditórios dizem respeito a uma garantia de um credor, ou seja, do


trabalhador, a ser pago com preferência em relação aos demais credores que eventualmente
possam existir.

61
Cf. art. 804.º e segs. do CCivil.

42
Os privilégios creditórios previstos no art. 333.º, podem ser divididos em duas
categorias: privilégios mobiliários gerais e privilégios mobiliários especiais.

Os privilégios mobiliários gerais62, dizem respeito ao património do empregador, isto é, os


créditos laborais dos trabalhadores são graduados com preferência63 aos créditos constantes do
art. 747.º, n.º 1 do CCivil64, ou seja, preferem aos demais créditos com privilégio mobiliário geral,
e com privilégio mobiliário especial referidos no art. 747.º do CCivil, sucumbindo apenas aos
privilégios dos créditos constantes de despesas de justiça, nos termos do art. 746.º do CCivil, e
art. 333.º, n.º 1 al. a) e n.º 2 alínea a) do CT.

O regime laboral consagra ainda aos trabalhadores os privilégios mobiliários especiais


sobre “o bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua atividade”, que são
graduados com preferência aos créditos previstos no art. 748.º do CCivil65, e ao crédito relativo à
contribuição para a Segurança Social66. Além disso, ainda prevalece sobre os direitos reais de
gozo, e de garantia de terceiro anteriormente conferida sobre o mesmo bem, nos termos do art.
751.º do CCivil67.

5.3. Responsabilidade Solidária das Sociedades em Relação de Domínio


ou de Grupo

O art. 334.º do CT 68 prevê a possibilidade de o trabalhador reclamar a satisfação de


créditos laborais (todos os créditos emergentes da celebração da execução do contrato de
trabalho, da violação e sua cessação, nos quais de incluem os créditos remuneratórios, a

62
Cf. arts. 736.º e 737.º do CCivil.
63
Cf. art. 737.º, n.º 1 al. d) e n.º 2 do CCivil- respetivamente “1. Gozam de privilégio geral sobre os móveis: […] d) Os créditos emergentes do
contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato, pertencentes ao trabalhador e relativos aos últimos seis meses.”; 2. – “O prazo
de seis meses referido nas alíneas b), c) e d) do número anterior conta-se a partir da morte do devedor ou do pedido de pagamento.”
64
Cf. art. 747.º do CCivil – “a) Os créditos por impostos, pagando-se em primeiro lugar o Estado e só depois as autarquias locais; b) Os créditos
por fornecimentos destinados à produção agrícola; c) Os créditos por dívidas de foros; d) Os créditos da vítima de um facto que dê lugar a
responsabilidade civil; e) Os créditos do autor de obra intelectual; f) Os créditos com privilégio mobiliário geral, pela ordem segundo a qual são
enumerados no artigo 737.º”.
65
Cf. art. 748.º do CCivil – “Os créditos com privilégio imobiliário graduam-se pela ordem seguinte: a) Os créditos do Estado, pela contribuição
predial, pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e doações; b) Os créditos das autarquias locais, pela contribuição predial”.
66
Cf. art. 333.º, n.º 1 al. b) e n.º 2 alínea a) do CT.
67
Cf. art. 751.º do CCivil – “Os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele e
preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores”.
68
O art. 334 do CT é um regime especial em relação ao regime supletivo previsto no art. 501.º do CSC.

43
qualquer das sociedades a que o empregador, sendo uma sociedade comercial, esteja em
relação de coligação societária69.

Este preceito consagra assim a responsabilidade solidária através da qual a sociedade


ou sociedades com as quais o empregador se encontre em relação de participações recíprocas,
de domínio ou de grupo, são solidariamente responsáveis pelos créditos laborais, devidos ao
empregador, vencidos há mais de três meses 70 . A obrigação é solidária porque o credor
(trabalhador) “pode exigir a prestação integral de qualquer dos devedores e a prestação
efectuada por um deles libera a todos perante o credor comum”71. O dever de prestação integral
recaí assim sobre qualquer um dos devedores e em consequência da prestação dá-se o efeito
extintivo recíproco da satisfação dada por qualquer dos devedores ao direito do credor 72, ou seja,
a prestação integral por um dos devedores aos restantes liberta.

No plano das relações internas, a sociedade que satisfaça créditos laborais do


trabalhador, tem o direito de regresso pela totalidade do montante pago, contra o co-devedor73,
não sendo possível ao empregador afastar este regime, nem com o consentimento do
trabalhador.

Uma vez que a função desta previsão normativa é a de garantir o cumprimento do


contrato de trabalho, basta a existência de uma coligação para operar o instituto da
responsabilidade solidária, pelo que se prescinde da alegação e prova por parte do trabalhador,
sendo assim o único requisito procedimental o vencimento do crédito ter mais de três meses74.

5.4 Responsabilidade de Sócio, Gerente, Administrador ou Diretor

Se o empregador for uma sociedade comercial, a legislação laboral, através do art. 335.º
do CT, confere ao trabalhador a possibilidade de demandar quer os sócios75, quer os gerentes,

69
Cf. art. 482.º do CSC.
70
Martinez, Pedro Romano in “Garantia...”, pág. 234.
71
Cf. art. 512.º, n.º 1 do CCivil.
72
Varela, João de Matos Antunes, op. cit., pág. 751.
73
Cf. art. 524.º do CCivil.
74
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 584.
75
A lei limita a responsabilidade aos chamados “sócios-controladores”, nos termos do art. 83.º do CSC.

44
quer os administradores ou diretores da respetiva sociedade76, tendo em vista a satisfação dos
créditos laborais vencidos há mais de três meses.

Como explica BERNARDO LOBO XAVIER77, estamos perante uma situação de “responsabilidade civil
extracontratual verdadeira e própria, fundada na actuação ilícita e culposa do sujeito que se
pretende demandar e num dano causado ao trabalhador”. Neste seguimento, cumpre ao
trabalhador alegar e provar os pressupostos da responsabilidade civil, nos termos do art. 483.º
do CCivil isto é, facto ilícito, dano, culpa, nexo de causalidade.

5.5. Pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial

O art. 336.º do CT consagra, a favor do trabalhador, uma última garantia do pagamento


dos créditos laborais emergentes de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, que não
possam ser pagos pelo empregador devido a insolvência ou insuficiência económica.

No seguimento da legislação comunitária mormente, Diretiva n.º 80/787/CEE, de 20 de


outubro de 1980, alterada pela atual Diretiva n.º 2008/94/CE, de 22 de outubro de 2008,
surge o Fundo de Garantia Salarial, nos termos do decreto-lei n.º 219/99, de 15 de junho.

A instituição do Fundo de Garantia Salarial visa assegurar o pagamento dos créditos


laborais, em caso de insolvência ou insuficiência económica do empregador e, nas palavras de
LEAL AMADO 78 , acaba por funcionar “como uma espécie de fiador ope legis das obrigações
emergentes do contrato de trabalho”.

Atualmente, o Fundo de Garantia Salarial vem previsto no art. 336.º do CT, e por força
do art. 12.º n.º 6 al. o) da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o novo Código do
Trabalho, enquanto não for publicada a legislação especial sobre o Fundo de Garantia Salarial,
mantêm-se em vigor os artigos 317.º a 326.º da anterior Regulamentação do Código do
Trabalho aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho.

O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos emergentes do


contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, que se tenham vencido nos seis meses

76
Cf. art. 78.º e 78.º do CSC.
77
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 594.
78
Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 334.

45
anteriores à propositura da ação de declaração de insolvência do empregador ou da
apresentação do requerimento para promover o procedimento de conciliação previstos no
Código da Insolvência (arts. 336.º do CT e 337.º a 319.º da RCT), com o limite de pagamento
até ao valor equivalente a seis meses de retribuição, não podendo cada mês de retribuição
ultrapassar o triplo da remuneração mensal mínima garantida (art. 320.º do RCT)79.

Depois de efetuado o pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial este último subroga-se
na posição do trabalhador em relação ao crédito sobre o empregador, podendo exigir o
cumprimento dos direitos do trabalhado nos termos do art. 322.º do RCT.

79
Martinez, Pedro Romano in “Garantia...”, pág. 231.

46
6. Retribuição-Noção, Elementos e Modalidades de Retribuição
Juridicamente, a retribuição configura nada mais do que a obrigação nuclear a cargo do
empregador como contraprestação de um trabalho prestado80.

Citando o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 20 de fevereiro de 2008 “A


retribuição abrange assim o conjunto de valores que, nos termos do contrato, das normas que o
regem ou dos usos, a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao
trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada, presumindo-se, até prova em
contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade empregadora ao
trabalhador” 81.

Apesar da aparente simplicidade da definição, é inegável a conflitualidade existente no


que concerne à interpretação do conceito de retribuição82, mais propriamente no que se refere
ao enquadramento jurídico de algumas prestações realizadas pelo empregador e à respetiva
integração ou não das mesmas como prestações retributivas. Bem assim como a terminologia
utilizada para a referência à retribuição nas leis laborais é bastante diversificada83.

Desde logo o termo salário84 é referido pela CRP no art. 59.º, n.º 1 al. a) in fine, sendo
também usual nos instrumentos de regulamentação coletiva e em leis laborais avulsas,
nomeadamente, na Lei dos Salários em Atraso e Lei do Salário Mínimo. Já o termo retribuição é
referido na CRP, na primeira parte do n.º 1 do seu art. 59.º, bem como no CT (nomeadamente
no art. 258.º do CT).

Por último, o termo remuneração, é utilizado no direito originário da União Europeia (art.
157.º do TFUE) e é comummente utilizado em instrumentos de regulamentação coletiva de
trabalho e pela doutrina.

Distingue-se a remuneração em sentido amplo e a remuneração em sentido estrito (ou


retribuição). De acordo com esta diferenciação, a retribuição em sentido estrito corresponde à

80
Xavier, Bernardo in “Introdução ao estudo da retribuição no direito do trabalho português”, Revista de Direito e Estudos Sociais, Ano XXVIII (I
da 2ª série) n.º 1, janeiro-março de 1986, Coimbra 1986, Almedina, pág. 67.
81
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de fevereiro de 2008, Processo n.º 7354/2007-4, disponível no website www.dgsi.pt.
82
Utiliza-se comummente terminologia variada sobre a matéria da “retribuição”, tal como “remuneração”, “salário”, “ordenado”, “vencimento”,
etc.. No entanto aplicaremos indistintamente estes conceitos, como sendo a contrapartida da prestação do trabalho devida pelo empregador.
83
Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 569 e 570.
84
Como explica Sónia Preto, in “Alguns aspectos da retribuição: I A remuneração durante as férias½”, Revista de Direito e Estudos Sociais, n.º
1/3, janeiro-setembro de 2013, Coimbra 2014, Almedina, pág. 244, “Sal é a raiz etimológica da palavra salarium (radical de salário) forma de
pagamento aos soldados romanos.”

47
prestação patrimonial, em dinheiro ou em espécie, regular e periódica, que é devida ao
trabalhador, por força do contrato, das normas que o regem e dos usos, como contrapartida do
seu trabalho. Por outro lado, a remuneração em sentido amplo diz respeito ao conjunto de
vantagens patrimoniais de que o trabalhador beneficia em razão do seu contrato de trabalho e
que podem ou não decorrer do trabalho prestado.

Para MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO85 a distinção doutrinal referida deve ser mantida e
a sua utilidade deve-se a dois pontos essenciais. Em primeiro lugar, porque o conceito é
associado ao princípio da irredutibilidade consagrado no art. 129.º, n.º 1 al. d) do CT, permitindo
esta distinção “isolar as prestações remuneratórias que se sujeitam a este princípio, não
podendo, por consequência, ser retiradas ou diminuídas, das restantes prestações patrimoniais,
que, por expressa determinação da lei, não se sujeitam à regra da irredutibilidade”. Em segundo
lugar, diz a autora que é importante levar em consideração a divergência dos conceitos de
retribuição e remuneração para efeitos de interpretação de outras fontes normativas que se 86

referem ao termo remuneração em sentido amplo.

Do ponto de vista dos trabalhadores o seu salário é considerado um rendimento de


subsistência e de satisfação de necessidades pessoais e familiares, sendo esta uma visão social.
No entanto, a retribuição não é a mera contraprestação do trabalho prestado, uma vez que
aquela tem diversas funcionalidades ou seja, nem tudo o que o trabalhador recebe do
empregador é retribuição em sentido técnico87.

Por conseguinte, para o empregador a retribuição não equivale a todo o custo de


trabalho efetivo, uma vez que este tem outros encargos, tais como os custos previdenciais,
despesas com seguros de trabalho, segurança e higiene no trabalho. E, da mesma forma, o
trabalhador sabe que a retribuição auferida não equivale a todas as suas necessidades pessoais
e familiares, destacando-se a título exemplificativo, os cuidados de saúde familiar e as despesas
inerentes à educação.

E o Direito (laboral) pretende somente conciliar estes interesses divergentes, tendo uma
participação regulativa que visa “garantir uma existência condigna e a prossecução de um bem

85
Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 571.
86
Cf. art. 157.º do TFUE, Diretiva 117/75/CE, de 10 de fevereiro de 1975 e Diretiva n.º 2006/54/CE, de 5 de julho de 2006, sobre o princípio
da igualdade de remuneração entre trabalhadores de sexos diferentes.
87
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 533 e segs.

48
comum”, não deixando esta matéria apenas nas mãos dos seus principais atores88, e sobretudo
promovendo a proteção da parte mais débil da relação jurídica laboral, que na maior parte dos
casos se consubstancia no trabalhador. A este propósito convém indicar que o próprio legislador
consagrou na al. d) do n.º 1 do art. 129.º do CT o princípio da irredutibilidade salarial, feitas as
devidas ressalvas aos casos expressamente previstos naquele diploma legal ou em IRCT, a que
mais à frente faremos uma referência mais aprofundada.

6.1. Cálculo do Montante Retributivo

Ao fazer uma análise do sistema retributivo facilmente se conclui que a forma de fixação
do montante da retribuição depende de variadíssimos fatores.

Para aferir do montante retributivo, além da quantificação da prestação fixada em função


do tempo, nos termos do art. 59.º, n.º 1 al. a) da CRP, considera-se ainda a atribuição de
retribuição em função do posto de trabalho ou categoria (isto é, retribuição em função da
natureza), retribuição em função da performance ou mérito no desempenho da função
(qualidade), e retribuição em função da evolução na empresa – aqui referimo-nos à antiguidade.

É ainda de ressalvar quanto à fixação do montante retributivo o limite legalmente


imposto através da chamada “retribuição mínima mensal garantida”, comummente salário
mínimo, previsto nos arts. 273.º a 275.º do CT.

A este propósito deve ser referido que, nos termos do art. 59.º, n.º 2 al. a), compete ao
Estado interferir diretamente no estabelecimento e atualização do salário mínimo, atribuído a
nível nacional, intercategorial e interprofissional, fixado em ordem a satisfazer necessidades de
subsistência dos trabalhadores, e que, configuram geralmente o mínimo, relativamente ao qual
não pode ser estabelecido montante retributivo mais baixo, com exceção dos casos de
trabalhadores em fase formativa, como sejam os aprendizes, praticantes, estagiários, e
trabalhadores com capacidade de desempenho reduzida.

88
Cf. art. 59.º, n.º 1 al. a) e n.º 2 al. a), ambos da CRP.

49
O n.º 4 do art. 274.º do CT vem esclarecer que este montante mínimo garantido não
inclui subsídios, prémios, gratificações ou outras prestações a estas equiparadas89.

6.2. Retribuição em Concreto e Retribuição Modular

O problema da aferição do cálculo da prestação retributiva coloca-se em dois patamares:


a) determinação em concreto da retribuição, quando a mesma não se encontra fixada pelo
contrato de trabalho; b) determinação em abstrato da prestação retributiva.

Ou seja, a questão que se levanta é a de saber “quanto recebe um qualquer trabalhador


por mês considerando, em abstrato, determinados pressupostos padronizados”90.

Como explica BERNARDO LOBO XAVIER91, “a retribuição em concreto diz respeito a saber o
quantitativo devido a um trabalhador, que prestou serviços num dado mês, com esta ou aquela
assiduidade e faltas, justificadas ou não, com a produtividade apurada, nestas e naquelas
condições (tantos dias de turno, tantos dias de trabalho nocturno, etc.). A retribuição em
abstrato tem a ver com o montante que o trabalhador ganha num (qualquer) mês e, portanto,
com um apuramento médio, padronizado, que se torna necessário fazer para lhe definir direitos
no plano do contrato de trabalho”.

Normalmente, o montante retributivo em concreto vem expressamente previsto no


contrato de trabalho outorgado, mas pode suceder que as partes não tenham determinado a
prestação retributiva no mesmo. Neste caso, o montante retributivo, direta ou indiretamente,
pode resultar de cláusula prevista em convenção coletiva para a categoria ou função que o
trabalhador exerce no seio da empresa, isto é, as partes podem, aquando da celebração do
contrato de trabalho, não determinarem o quantum retributivo, acordando (ainda que
tacitamente) fazer equivaler a prestação retributiva devida, ao valor que os trabalhadores da
mesma categoria, ou com as mesmas funções, recebem de acordo com convenção coletiva que
fixa a tabela salarial da empresa, mesmo que a eles não lhes seja aplicada tal convenção, por
não serem trabalhadores sindicalizados.

89
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 535 e segs.
90
Preto, Sónia, op. cit., pág. 258.
91
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 566.

50
Se não houver fixação expressa do valor da retribuição no contrato de trabalho, nem
resultar de normas aplicáveis ao contrato, pois não vigora qualquer convenção coletiva no seio
da empresa em questão, sempre pode o montante retributivo em concreto ser determinado
judicialmente, nos termos do art. 272.º, n.º 1 do CT.

Por outro lado, além da dificuldade de determinação do quantum retributivo nos casos
que referimos, é também difícil a aferição em concreto do montante retributivo nos casos em
que os critérios consagrados no contrato de trabalho ou na lei, para a determinação da
retribuição não são suficientemente claros. Porquanto, as mais das vezes, a terminologia
utilizada nos mesmos parece afastar-se da retribuição base, cuja principal função é a fixação de
um critério para o cálculo dos complementos remuneratórios, os quais são calculados com
recurso a percentagens do “valor hora”, “valor dia” ou “valor mês”.

Considera BERNARDO LOBO XAVIER92 que a retribuição base e diuturnidades, previstas no


art, 262.º, n.º 1 do CT, deverão ser consideradas como a base de cálculo para a determinação
dos complementos remuneratórios, uma vez que se corre o risco de se utilizar um método que
implique uma “duplicação”, isto é, “não se pode, por exemplo, computar o subsídio de turno (ou
subsídio por trabalho nocturno) com base na «retribuição» e depois dizer-se que esse mesmo
subsídio integra a «retribuição»”. No entanto considera o referido autor que, a título excecional,
existem prestações complementares cujos cálculos serão feitos após a determinação de outros
complementos remuneratórios, dependendo da previsão legal ou convencional aplicável que
estabeleça tais prestações complementares. Em suma, a determinação em concreto do
montante da retribuição, depende da previsão legal ou convencional a determinação da forma de
cálculo dos complementos remuneratórios, uma vez que, em certos casos recorre-se à
“retribuição base” e, noutros casos, à “retribuição base integrada com complementos”.

No entanto, há casos, como o previsto no art. 393.º, n.º 2 al. a), que se refere às
prestações a que o trabalhador tem direito por ilicitude do despedimento, em que surge a
necessidade de determinar o valor da “retribuição”, consagrando a estrutura remuneratória que
integra o “estatuto” do trabalhador93. Essa determinação só pode ser aferida a posteriori, e diz
respeito ao conjunto de atribuições patrimoniais pagas pelo empregador durante um
determinado período de tempo ao longo do contrato de trabalho. Trata-se de determinar a

92
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 568.
93
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.400.

51
estrutura retributiva de um trabalhador, de forma a criar critérios de cálculo para aferir o valor
padrão, ou o módulo, do esquema remuneratório do trabalhador, em referência a uma unidade
de tempo. Assim, a legislação laboral refere bastantes vezes, para a determinação do montante
indemnizatório, um período temporal padrão de retribuição, sendo esse montante, portanto,
abstrato (mas determinável), a retribuição modular.

Como explica MONTEIRO FERNANDES94, “o critério legal constitui, assim, o instrumento de


despiste dos valores que, no seu conjunto, têm como nexo de correspectividade com a posição
obrigacional do trabalhador, encarada também na sua globalidade. Ele serve, então, para definir
a posteriori uma base de cálculo para certos valores derivados”.

O art. 258.º do CT considera, assim, que a “retribuição” se reporta a períodos padrão de


duração recorrendo, nomeadamente, a unidades de tempo (hora, dia, mês) cujo valor seja
devido ao trabalhador. Importa, então, não considerar a retribuição devida num certo mês pelo
trabalho prestado naquele período, mas antes considerar um módulo, um valor teórico,
padronizado (abstrato) que se refere a um hipotético período de duração (hora, dia ou mês).

Na opinião de BERNARDO LOBO XAVIER 95 , a legislação laboral concede os elementos


essenciais, no art. 258.º, n.º 2 do CT, para se aferir da retribuição abstrata. O autor diz que a
ideia de regularidade e periodicidade é um “elemento necessário para definir sem distorção o
que é retribuição-tipo ou modular durante um período padrão de tempo (dia ou hora) e que
constitui medida ou base de cálculo de inúmeros direitos consignados nas normas de trabalho”.
Ou seja, são excluídas do cálculo do módulo ou padrão retributivo, isto é, da retribuição abstrata
ou modular, todas as prestações que são esporádicas, extraordinárias ou atípicas, como sejam
as que decorrem de exclusões diretas da lei, as atribuições que não têm caráter temporal,
nomeadamente a atribuição de telemóvel ou uso de carro da empresa e prestações que têm a
sua atribuição dependente de regras próprias.

No que concerne à determinação da retribuição abstrata, ou retribuição modular, o


Supremo Tribunal de Justiça 96 entende que mesmo “o facto das prestações periódica e
regularmente recebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não
significa que linearmente tenham de ser levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações

94
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.401.
95
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 570.
96
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de janeiro de 2007, Processo n.º 06S2188, disponível no website www.dgsi.pt.

52
cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição, como, por exemplo, acontece com a
retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. A retribuição a atender para esse efeito
não é a retribuição global, mas sim a chamada retribuição modular ou padrão, da qual devem
ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento não é justificado pela prestação de trabalho
em si mesma, mas por outra razão de ser específica”.

Em suma, se se atendesse a um regime “homogéneo” da retribuição para qualquer


circunstância retributiva, sem mais, surgiriam soluções bastante injustas e desajustadas, quanto
ao cálculo da prestação retributiva 97 . Por um lado, as prestações complementares iam ser
calculadas em função da retribuição e, por outro lado, essas mesmas prestações
complementares integravam a atribuição retributiva. Pelo que, a qualificação de certa prestação
como integrante do padrão da prestação retributiva do trabalhador, definido pelo art. 258.º do
CT, “não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria,
nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado da
«retribuição». O «ciclo vital» de cada elemento da retribuição depende do seu próprio regime
jurídico, cuja interpretação há-de pautar-se pela específica razão de ser ou função desse
elemento na fisiologia da relação de trabalho” 98.

6.3. A Retribuição como Elemento Essencial

Lê-se no art. 258.º do Código do Trabalho que “considera-se retribuição a prestação a


que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito
em contrapartida do seu trabalho”. A retribuição enquanto elemento essencial do contrato de
trabalho, não é mais do que o “preço” da atividade prestada pelo trabalhador, isto é, a sua força
de trabalho. Significa isto que, se excluem do regime jurídico do contrato de trabalho, as formas
de trabalho não remunerado, como sejam as ações de mera cortesia, de boa vizinhança,
voluntariado e qualquer outro género de atividades prestadas de forma gratuita. Como diz
BERNARDO LOBO XAVIER 99 , “em traços gerais, do ponto de vista jurídico, a retribuição costuma
perfilar-se como a obrigação essencial a prestar no contrato de trabalho pelo empregador,
obrigação de índole patrimonial e marcadamente pecuniária, devida em todos os casos e não

97
“Duplicação” nas palavras de Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 568.
98
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.402.
99
Xavier, Bernardo Lobo in “Introdução...”, 1986.

53
tendo carácter meramente eventual, ligada por uma relação de reciprocidade à actividade
prestada, tendo nela a sua causa”.

A previsão legal do conceito de retribuição indica que, a mesma envolve uma prestação
de bens, normalmente sempre em dinheiro, por parte do empregador e específica que, ainda
que possa existir prestações não pecuniárias e na medida em que estas se destinem à
satisfação de necessidades pessoas do trabalhador ou da sua família, o valor destas prestações
não pode exceder o valor da prestação pecuniária100. Ora, quanto a este aspeto o n.º 2 do art.
259.º do CT estabelece que as prestações em espécie não podem exceder a parte em dinheiro,
salvo se o instrumento de regulamentação coletiva o permitir. No entanto, é nosso entendimento
que se aplica a este preceito a limitação do salário mínimo nacional, uma vez que a al. e) do n.º
2 do art. 274.º, prevê o limite de que o total das prestações em espécie não pode exceder 50%
do valor da retribuição mínima mensal. Assim sendo, e porque o art. 274.º, n.º 2 al. e) tem
carácter imperativo, é nossa opinião que quando a retribuição de um trabalhador seja de
montante igual ao salário mínimo nacional, não pode o instrumento de regulamentação coletiva
ultrapassar aquele limite, levando em consideração o art. 3.º, n.º3 al. j) do CT.

O n.º 2 do art. 258.º, na tentativa de especificar os elementos que integram o conceito


de retribuição, vem dizer que a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações
regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie. Ora, lido este
n.º 2 concluímos facilmente que a retribuição não se refere exclusivamente a uma prestação
devida ao trabalhador em contrapartida do seu trabalho, uma vez que a obrigação do
empregador ao pagamento da retribuição permanece ainda que não haja uma correspondência
com o trabalho efetivamente prestado. Os casos a que nos referimos, a título exemplificativo, são
o pagamento da retribuição do período de férias prevista no art. 264.º, a retribuição
correspondente a feriado prevista no art. 269.º, o pagamento de retribuição nos casos de faltas
justificadas nos termos do art. 255.º, a retribuição durante o encerramento ou diminuição de
atividade prevista no art. 309, que claramente constituem exceção à típica relação sinalagmática
do contrato de trabalho.

100
Cf. art. 259.º do CT.

54
No entanto, o n.º 3 do mesmo preceito vem alagar o conceito de retribuição,
estabelecendo uma presunção ilidível 101 , de que qualquer prestação do empregador ao
trabalhador integra a retribuição deste último.

Em termos gerais, podemos salientar que o conceito de retribuição consagrado no art.


258.º do CT, evidencia quatro características essenciais: a) prestação devida ao trabalhador por
título contratual legal; b) como contrapartida do seu trabalho; c) prestações regulares e
periódicas; e d) em dinheiro ou em espécie.

6.4. Componentes da Retribuição

Ainda na missão de caracterizar a prestação retributiva, a lei (art. 261.º) consagra três
modalidades de retribuição, isto é, a retribuição pode ser certa, variável ou mista. Em primeiro
lugar é de referir que a retribuição é devida pelo empregador ao trabalhador, ainda que ele não
possa efetivamente prestar a sua atividade devido a circunstâncias que lhe são alheias, isto é, na
vida empresarial de uma sociedade e na pendência de um contrato de trabalho, momentos há
em que o volume de produção oscila, ou a procura de certo produto diminui, e portanto, embora
o trabalhador esteja disponível para executar as funções a que foi afeto, o mesmo não as podem
realizar por circunstâncias adversas e que a ele não são imputáveis, o que não significa que o
empregador possa, legitimamente, deixar de cumprir a sua obrigação retributiva, uma vez que a
retribuição deverá ser a contrapartida do trabalho (e portanto a disponibilidade de o prestar) e
não de uma específica prestação de trabalho, neste sentido vem o Tribunal da Relação de
Coimbra sublinhar que “resulta explicitamente da norma cujo conteúdo acaba de transcrever-se
que só deve ter-se por retribuição aquilo a que o trabalhador tem direito como contrapartida da
sua disponibilidade para o trabalho”102.

A retribuição certa é calculada em função do tempo de trabalho e define por exclusão a


parte variável, que é calculado em função de outros fatores. O tempo de trabalho, a que se
refere o n.º 2 do art. 261.º do CT encontra-se definido no art. 197.º, n.º 1 do CT, sendo
“qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à
realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos” previstos do n.º 2 do

101
Cf. arts. 349.º e 350.º, n.º 2 do CCivil – presunção iuris tantum de omnicompreensividade- pode ser afastada mediante prova em contrário.
102
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 3 de maio de 2014, Processo n.º 601/13.7TTVIS.C1, disponível no website www.dgsi.pt.

55
mesmo preceito legal. O tempo de trabalho é medido em número de horas por dia e por
semana, ou seja, determinação das horas de início e do termo do período normal de trabalho,
sendo que o período normal de trabalho é o período de tempo que o trabalho se obriga a
prestar, conforme consta no art. 198.º do CT e tem como limite máximo, nos termos do art.
203.º do mesmo diploma legal, as oito horas por dia e quarenta horas por semana. Citando o
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de 2000, “A lei limita-se, assim, a fixar
limites máximos para a duração dos períodos normais de trabalho mas não delimita estes
períodos que, inquestionavelmente, podem ser inferiores a esses máximos”, e esclarece ainda
que “As entidades patronais podem, assim, em princípio, alterar o horário de trabalho do seu
pessoal mas, sendo esse horário a determinação das horas do início e do turno do período
normal de trabalho e sendo este o número de horas que o trabalhador se obrigou a prestar, não
podem alterar o horário de trabalho, unilateralmente, para além da duração do período
normal. O período normal de trabalho, repete-se, sendo "o número de horas de trabalho que o
trabalhador se obrigou a prestar", é acordado pelas partes, que não podem exceder os limites
máximos estabelecidos para a duração do trabalho”103.

A retribuição variável, como referimos supra, não é calculada com base no tempo de
trabalho, mas sim calculada em função do resultado ou rendimento do trabalho prestado 104 .
Embora o contrato de trabalho seja um negócio jurídico em que o trabalhador se vincula a
prestar uma atividade sob direção do empregador em contrapartida de uma retribuição, ou seja,
o trabalhador compromete-se a prestar uma atividade e não a obter um certo resultado, isto não
significa que parte da sua retribuição não possa ser variável (contando que não ultrapasse o
limite previsto no art. 273.º, n.º 1 referente à garantia de retribuição mínima mensal). Embora a
obrigação a que o trabalhador se vinculou seja a de prestar uma atividade (e não à obtenção de
um resultado), a verdade é que o cálculo da parte variável passa por apurar o resultado da
atividade gerada pelo trabalhador, de forma a determinar o montante patrimonial devido pelo
empregador e não tanto por apurar se o trabalhador executou ou não as suas obrigações, com o
devido zelo e diligência105. Na verdade, se o trabalhador não atingir certo resultado não está a
incumprir as obrigações decorrente do contrato de trabalho a que se vinculou, mas o fracasso na

103
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6 de junho de 2000, Processo n.º 99S346, disponível no website www.dgsi.pt.
104
Distingue-se dos lucros na medida em que se trata de uma retribuição de um resultado concreto do trabalhador e não de um resultado global
da empresa.
105
Cf. art. 128.º, n.º 1 al. c) do CT.

56
obtenção de certo resultado vai-se repercutir negativamente na parte variável da retribuição a
que tem direito.

A razão de ser da retribuição variável prende-se maioritariamente com motivos de


incentivo à competição entre trabalhadores de modo a aumentar a produtividade da empresa,
podendo no entanto ter impactos negativos na vida pessoal dos trabalhadores uma vez que,
normalmente, gera ritmos de trabalho excessivos, afeta a solidariedade entre colegas de trabalho
tornando o ambiente de trabalho mais hostil. A 2ª parte do n.º 3 do art. 261.º do CT ao
estabelecer que se considera a média dos montantes das prestações correspondentes aos
últimos dozes meses, ou ao tempo de execução de contrato que tenha durado menos tempo
quando não se aplique o respetivo critério, indica que as partes definem o critério para o
apuramento da parte variável da prestação retributiva a priori, sendo que a 2ª parte do n.º 3 do
art. 261 do CT, só se aplica no silêncio das partes quanto ao apuramento deste valor,
configurando assim um regime supletivo.

A retribuição mista, como a própria denominação indica, é constituída por uma parte
certa e outra variável. Para o cálculo da retribuição variável, o legislador nos termos do n.º 3 do
art. 261.º do CT, considera a “média dos montantes das prestações correspondentes aos
últimos dozes meses ou ao tempo da execução do contrato que tenha durando menos tempo”.
Os tribunais portugueses têm entendido que o empregador pode, legitimamente, alterar de modo
unilateral a componente da retribuição mista, por exemplo, subindo a parte fixa e reduzindo a
variável, desde que não haja redução da retribuição que o trabalhador aufere, respeitando a
garantia de irredutibilidade salarial prevista no art. 129.º, al. d) do CT106.

Levando em consideração os dados apresentados, já é possível esboçar o conceito de


retribuição no âmbito laboral. Não obstante, é necessário persistir no estudo desta matéria com
o intuito de auxiliar o intérprete da lei no que concerne à aplicação deste conceito para efeitos de
retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Assim, numa primeira e breve abordagem podemos desde já afirmar que a retribuição
integra a retribuição base e as prestações complementares e acessórias que sejam regulares e
periódicas e, citando o Supremo Tribunal de Justiça: “o conceito de retribuição tem vários
sentidos, podendo falar-se em remuneração em sentido amplo, que abrange as diversas

106
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, disponível no website www.dgsi.pt.

57
prestações remuneratórias de que o trabalhador beneficia, e retribuição em sentido estrito ou
técnico-jurídico. A retribuição em sentido estrito ou técnico-jurídico abrange o conjunto de valores
pecuniários ou não que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o
empregador está obrigado a pagar, regular e periodicamente, ao trabalhador como contrapartida
do seu trabalho”107.

No entanto, cumpre ir mais longe no estudo desta matéria nomeadamente através de


uma análise mais aprofundada do regime jurídico no n.º 3 do art. 258.º.

6.5. O Caráter Regular e Periódico das Prestações Retributivas

Para que uma prestação seja considerada retribuição, o legislador faz depender a sua
qualificação como tal, de um pagamento regular e periódico (n.º 2 do art. 258.º do CT), sendo
que não tem natureza retributiva a prestação extraordinária ou cujo pagamento não esteja
antecipadamente garantido, faltando-lhe assim a estabilidade exigível (art. 260.º, nº 1 al. c) e n.º
3 al. b)). Estas prestações destinam-se a reconhecer as necessidades regulares e periódicas do
trabalhador no âmbito da execução do seu contrato de trabalho e tem a ver com a própria
distribuição no tempo da sua prestação.

Isto é, as características da periodicidade e da regularidade por um lado apoiam a


presunção da existência de uma vinculação prévia (quando não esteja expressamente prevista)
e, por outro, protegem as expectativas de ganho do trabalhador, consagrando assim o nexo
existente entre a retribuição e as suas necessidades pessoais e familiares.

Com a expressão “regular” o legislador quis referir-se a uma prestação não arbitrária,
isto é, a uma prestação que siga uma regra uniforme, sendo assim uma prestação constante.

Já no que concerne à expressão “periódica”, a lei pretende indicar que para uma
prestação ser qualificada como retributiva, a mesma deve ser paga em períodos certos no
tempo, ou com uma frequência aproximada, de modo a integrar-se na ideia típica de
periodicidade do contrato de trabalho e nas necessidades recíprocas das partes outorgantes a
quem diz respeito o contrato.

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website
107

www.dgsi.pt.

58
De salientar que a regularidade e a periodicidade são dois requisitos cumulativos: uma
prestação variável, cuja regra de cálculo esteja previamente definida no contrato, cumpriria o
requisito da regularidade, mas já não o da periodicidade, visto que o quantum concreto
resultante de tal cálculo não é replicável em todos os períodos.

A regularidade e a periodicidade têm como pressuposto a execução no decurso do


tempo da prestação do trabalhador, sendo que se exige que o seu pagamento seja suscetível de
criar no trabalhador a expectativa do seu recebimento, associada à previsibilidade de
rendimentos.

Para BERNARDO LOBO XAVIER108, a regularidade e periodicidade devem-se à “necessidade


de calcular uma retribuição-tipo, abstrata, padrão, de carácter normal, porque esse cálculo é
indispensável para certas aferições no plano do Direito de trabalho e em que, portanto, deve ser
excluído tudo o que for esporádico ou atípico”.

Para MONTEIRO FERNANDES109, estas características têm um “duplo sentido indiciário”, uma
vez que sugerem a “existência de uma vinculação prévia”, e portanto, uma “prática vinculativa”,
e “assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador”, conferindo assim “relevância
ao nexo existente entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares daquele”.

Uma vez que o legislador não fixou concretamente um critério para a aferição da
“regularidade e periodicidade”, a qualificação das prestações como retributivas, tendo em conta
a sua “regularidade e periodicidade”, não tem sido uniforme no seio da jurisprudência.

Assim, por exemplo, a Relação de Lisboa110, em acórdão datado de 16 de dezembro de


2009, a propósito do subsídio de disponibilidade atribuído pela TAP aos técnicos de manutenção
de aeronaves que estão de prevenção, considerou que não basta que uma prestação seja
regular e periódica para a mesma se integrar na retribuição devida ao trabalhador, não sendo
consideradas parte integrante da retribuição se tiverem uma causa específica e individualizável,
diversa da remuneração do trabalho e afirmando que “não basta a verificação da regularidade e
da periodicidade (ou melhor, o seu não afastamento pelo empregador, por força da presunção
legal) para que as prestações sejam qualificadas como retributivas, para os devidos efeitos

108
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 546.
109
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.397.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website
110

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59
legais. A regularidade e a periodicidade com que são atribuídas as prestações são apenas um
dos vários elementos integradores do conceito de retribuição, não tendo qualquer apoio na lei a
ideia de que tem um valor autónomo e suficiente. As características da regularidade e da
periodicidade devem ser reportadas ao elemento essencial da contrapartida do trabalho (no
sentido em que é, enquanto contrapartida do trabalho, que as prestações remuneratórias devem
ser regulares e periódicas) e devem ser ponderadas em conjunto com os demais elementos do
conceito de retribuição, para se poder concluir pela qualificação de uma determinada prestação
como retributiva”.

Ainda no mesmo acórdão, a Relação de Lisboa pronunciou-se no sentido de que


discorda das decisões judiciais que consideram que a prestação regular e periódica deve ser
integrada no conceito de retribuição nos anos em que a mesma foi auferida em pelo menos seis
meses, indicando que “a regularidade e a periodicidade (…), apontam para a constância, para
um ritmo temporal que se repete ao longo dos anos de vigência da relação laboral e que é
conhecido e esperado pelo trabalhador e, no caso em apreço, não se verificam estes requisitos.
Além disso, a relevar uma unidade tempo para aferir a regularidade e periodicidade de uma
prestação, que o trabalhador alega constituir retribuição variável, essa unidade de tempo terá
que ser, necessariamente, a unidade mensal, uma vez que a retribuição do trabalhador é paga
ao mês, conjugada com o período de um ano, relativamente ao qual são devidos a retribuição de
férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal, cuja “reconstituição” o trabalhador reclama. É
isso que resulta do disposto nos arts. 84º, n.º 2 da LCT e 252º, n.º 2 do Código do Trabalho,
nos quais se estabelece que para determinar o valor da retribuição variável tomar-se-á como tal a
média dos valores que o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses
ou no tempo da execução do contrato, se este tiver durado menos tempo”.

Com o mesmo raciocínio mas discordando da dimensão do período, o Supremo Tribunal


de Justiça 111 entendeu que “estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais
devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,
o respectivo subsídio e o subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro para sustentar a
aludida expectativa, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência
mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem
correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2010, Processo n.º 607/07.STJLSB.L1.S1, disponível no website
111

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60
[…], e, assim, considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o
conceito de retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento
ocorre todos os meses de actividade do ano” (sublinhado nosso). Neste caso os Conselheiros
acolheram o entendimento de que o critério a ter em linha de conta, é a cadência mensal e só
as prestações cujo pagamento ocorreu onze vezes por ano, devem ser tidas como prestações
retributivas.

Com entendimento diverso, defendendo o critério dos seis meses de pagamento de uma
prestação para a mesma se incluir na retribuição, o Tribunal da Relação do Porto considerou que
“tem a jurisprudência das Relações considerado que uma prestação só poderá considerar-se
regular se for prestada com alguma frequência, chamando à colação para aferir de tal frequência
a bitola da metade do ano”. Neste sentido pronunciou-se o Acórdão da Relação do Porto de 21
de fevereiro de 2011112, citando o Acórdão da Relação de Lisboa de 17 de dezembro de 2007,
onde se refere que “qualquer prestação que não tenha uma periodicidade certa e pré-
determinada só poderá considerar-se regular se for prestada com alguma frequência, que terá
de ser, pelo menos, de metade do ano. Menos do que isso não lhe permitirá deixar de ser uma
prestação esporádica e, portanto, sem carácter retributivo”. Tendemos a concordar com este
critério orientador do cariz regular e periódico das atribuições patrimoniais.

Com sapiência sui generis, o Tribunal da Relação de Coimbra113 não concorda com um
mecanismo matemático para a aferição da regularidade e periodicidade da prestação,
concretamente: “não concordamos inteiramente que o critério da regularidade tenha que ser
aferido mecanicamente por um número certo, de mais de metade (seis em onze) ou, muito
menos, da totalidade (onze em onze) de repetições da prestação em cada ano; a questão deve
ser perspectivada de outro modo: só não deve ponderar-se nas férias e subsídios o que se revela
excepcional, ocasional, inesperado”.

Assim, podemos dizer que se determinada prestação configurar uma prática habitual
(e não anómala ou ocasional) do empregador e disser respeito a trabalho prestado nas
condições que pessoal e funcionalmente forem mais onerosas e desgastantes para o
trabalhador, gerando no mesmo uma legítima expectativa de ganho em função da regularidade e

112
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 7 de abril de 2014, Processo n.º 408/12.9TTVLG.P1, disponível no website www.dgsi.pt.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º 1191/09.0TTCBR.C1, disponível no website
113

www.dgsi.pt.

61
periodicidade da correspondente prestação de trabalho, é também legítima e justificada a sua
convicção de que tal benefício económico constitui um complemento normal da sua retribuição.

No entanto, e por hipótese meramente académica, se sempre que os trabalhadores de


determinada empresa gozassem férias, o trabalhador A os substituísse voluntariamente no
exercício das respetivas atividades e em função dessa substituição, auferisse pelo menos seis
meses de subsídio por trabalho suplementar, gerava naquele trabalhador a convicção de que
aquelas prestações auferidas através do trabalho suplementar prestado, constituiriam um
complemento normal da sua retribuição? Em nosso entendimento não.

Como se conclui estamos em matéria de proteção de expectativas e citando MONTEIRO


FERNANDES “a repetição (por um número significativo de vezes, que não é possível fixar a priori)
do pagamento de certo valor, com identidade de título e/ou de montante, cria a convicção da
sua continuidade e conduz a que o trabalhador, razoavelmente, paute o seu padrão de consumo
por tal expectativa – uma expectativa que é justamente protegida”114 e, na esteira das decisões
mais recentes do Supremo Tribunal de Justiça, salvo melhor entendimento, supomos que para a
criação de uma razoável e legítima expectativa na esfera jurídica do trabalhador de que certas
prestações se destinam a integrar o orçamento normal do trabalhador, o melhor critério, tendo
em conta a regularidade e periodicidade, para sustentar a expectativa do trabalhador será o da
cadência mensal, uma vez que no caso da aferição de o valor de atribuições patrimoniais
devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,
o respetivo subsídio e o subsídio de Natal. De certa forma coincide com a forma para o cálculo
da retribuição variável (art. 261.º, n.º 2 do CT), devendo, em nosso entendimento, considerar-se
regular e periódica, prestação cujo pagamento ocorre todos os meses de atividade do ano,
constituindo, assim, um complemento normal da retribuição do trabalhador.

6.6. A Presunção Estabelecida

O n.º 3 do art. 258.º consagra a presunção de que constitui retribuição “qualquer


prestação do empregador ao trabalhador”. A razão de ser da presunção prevista no n.º 3 do art.
258.º é a de precaver os casos em que o empregador pretende efetivamente pagar a

114
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 458.

62
contrapartida do trabalho prestado pelo trabalhador, mas atribui outra nomenclatura à
prestação, não assumindo a mesma como retribuição.

A presunção, prevista no art. 349.º do CCivil, indica que nos termos do sistema
probatório consagrado nesse diploma legal se dá como demonstrado um facto desconhecido, a
partir de um facto conhecido (por exemplo, se sai fumo por uma porta, presume-se que do outro
lado há um incêndio). Na verdade o legislador aplica a técnica da presunção para preencher um
conceito legal, podendo este ser afastado pela parte interessada que não beneficia da mesma.
Assim, por aquele n.º 3 do art. 258.º o legislador faz presumir a natureza retributiva como
consequência da conhecida atribuição de uma prestação patrimonial.

No entanto, o empregador pode ilidir esta presunção, pela demonstração de que certa
prestação não é um complemento retributivo por, por exemplo, faltar o preenchimento dos
requisitos do n.º 1 do art. 258.º, ou estar excluída da qualificação de retribuição nos termos do
art. 260.º, ou seja, o ónus da demonstração de que certa atribuição não é retributiva, é do
empregador, através, nomeadamente, da demonstração da falta de obrigatoriedade ou de outros
elementos essenciais caracterizadores da retribuição.

Convém sublinhar que esta presunção só diz respeito à qualificação de certa atribuição
patrimonial como retribuição para efeitos de aplicação dos princípios de tutela e garantias dos
créditos retributivos. Segundo BERNARDO LOBO XAVIER115, “não pode dizer-se que o reconhecimento
do carácter retributivo de uma dada atribuição envolva fatalmente a produção de todos os efeitos
jurídicos da retribuição, tal como, ao inverso, não pode afirmar-se que as prestações não
retributivas não beneficiam de nenhum dos efeitos associados à retribuição”.

Ou seja, se um trabalhador demonstrar que várias vezes, ao longo de um ano, lhe foram
pagos certos montantes, este beneficia da presunção do caráter retributivo daquelas prestações,
e o empregador terá de ilidir essa presunção, para evitar as consequências legais que daí
advêm, nomeadamente, a aplicação do princípio da irredutibilidade salarial. No entanto, não
basta ao trabalhador alegar o pagamento efetivo desses montantes e que os mesmos têm
caráter retributivo para a aferição dos montantes devidos a título de retribuição e subsídio de
férias, uma vez que isso seria extrapolar o sentido do n.º 3 do art. 258.º e interpretar esta norma
em excesso. Sendo que com esta interpretação, além de uma presunção de caráter retributivo,

115
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 545.

63
tínhamos também a atribuição de relevância para efeito da aplicação de determinado regime
jurídico.

Um exemplo bastante discutido na jurisprudência é o caso de atribuição ao trabalhador


de um veículo automóvel (ou de um telemóvel ou computador portátil) para que este o utilize,
não só na prestação da sua atividade mas também na sua vida privada, incluindo fins-de-semana
e férias116.

Esta atribuição por parte do empregador pode ser considerada retribuição em espécie,
uma vez que manifesta uma vantagem de natureza económica para o trabalhador. Conforme diz
o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012117 “sendo a retribuição a
contrapartida da atividade prestada pelo trabalhador em sede de contrato individual de trabalho,
ela é paga normalmente em numerário. Tal não impede que uma parte da retribuição, pelo
menos, não possa ser paga em espécie, como sucede com a atribuição de alimentos, refeições,
ou o uso de viaturas. Porém, a utilização de um veículo automóvel da empresa, com todos os
custos a cargo desta, tanto pode configurar um mero instrumento de trabalho, porque é usada
durante e por causa da prestação laboral, como pode configurar uma parcela da retribuição do
trabalhador, quando o empregador autoriza o trabalhador a usar o veículo irrestritamente, para
além do horário normal de trabalho, maxime, em fins-de-semana, feriados e férias. Nesta
situação, evitando o trabalhador de adquirir viatura própria para se deslocar de e para o trabalho
e em toda a sua vida pessoal e familiar, o empregador confere-lhe uma vantagem patrimonial,
suscetível de avaliação em numerário, que integra a designada retribuição em espécie, como se
tem entendido”.

No mesmo sentido o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 30 de abril de


2014118 diz que “perante a matéria de facto provada, impõe-se concluir que a atribuição ao autor
de veículo automóvel assume natureza retributiva, uma vez que a empregadora, ao conferir
àquele o direito de utilização do veículo na sua vida particular, incluindo em fins-de-semana e
férias, e ao suportar os respectivos encargos, designadamente, com a sua manutenção, seguros,
portagens e combustível, ficou vinculada a efectuar, com carácter de obrigatoriedade, essa

116
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 397, nota de rodapé n.º 1.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012, Processo n.º 749/10.0TTPRT.P1, disponível no website
117

www.dgsi.pt.
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de abril de 2014, Processo n.º 714/11.00TTPRT.P1.S1, disponível no website
118

www.dgsi.pt.

64
prestação. Trata-se de uma prestação em espécie com carácter regular e periódico e um
evidente valor patrimonial, que assume natureza de retribuição, nos termos dos artigos 82.º da
LCT, 249.º do Código do Trabalho de 2003 e 258.º do Código do Trabalho de 2009,
beneficiando, por isso, da garantia de irredutibilidade, prevista nos artigos 21.º, n.º 1, alínea c),
da LCT, 122.º, alínea d), do Código do Trabalho de 2003 e 129.º, alínea d), do Código do
Trabalho de 2009”.

Não obstante este entendimento generalizado, se o empregador conseguir ilidir a


presunção de que constitui retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador,
designadamente porque a utilização de veículo automóvel se deve à necessidade das específicas
funções do trabalhador, e a utilização do mesmo veículo de trabalho na vida privada do
trabalhador configura apenas uma liberalidade do empregador, então esse veículo não é parte
integrante da retribuição, conforme é dito no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de
setembro de 2008119: “no que diz respeito ao automóvel, é óbvio que a sua utilização pelo autor
na sua vida particular lhe trazia vantagens económicas, mas essas vantagens também não
constituíam uma contrapartida directa do trabalho, uma vez que resultavam de uma mera
liberalidade da entidade empregadora que, como tal, podia ser por ele retirada a todo o tempo,
não constituindo, por isso, um componente da sua retribuição”.

Discordando do entendimento maioritário da doutrina, MARIA MANUELA MAIA 120 , entende


que se a atribuição de viatura não for consagrada no contrato, só em casos especiais deve ser
integrada na retribuição, explicando a título de exemplo que nas situações de “mobilidade
funcional, do ius variandi ou em consequência de um processo de restruturação e reorganização
da empresa sem menoscabo da categoria, retribuição e dignidade, o trabalhador se vê privado
da viatura da empresa, não existe ânimo empresarial no sentido de ofender a dignidade do
trabalhador ou retirar-lhe competência ou direito, porque a dignidade humana assenta em
valores e princípios mais elevados e importantes que o mero uso de uma máquina”.

Dúvidas não há quanto à exclusão de consideração de prestação retributiva nos casos


em que o trabalhador de desloca com o seu veículo até as instalações da empresa e apenas aí
inicia a sua utilização diária do telemóvel, computador portátil ou veículo disponibilizados pelo

119
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de setembro de 2008, Processo n.º 08S1031, disponível no website www.dgsi.pt.
120
Maia, Maria Manuela in “O conceito de retribuição e a garantia retributiva”, II Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Lisboa, 1999,
Almedina, pág. 267.

65
empregador para exercer as suas funções, e ao fim do dia de trabalho devolve esses meios
disponibilizados nas instalações do empregador, não tendo a eles acesso em tempo de férias
e/ou fins-de-semana.

Questão semelhante é a da atribuição de cartão de crédito, seguros de saúde e de vida,


combustível, parqueamento, concessão de stock options, descontos em serviços ou bens da
empresa, etc.

O plano de aquisição de ações, as chamadas stock options, diz respeito a opção de


aquisição de ações da empresa, concedida pelos empregadores aos trabalhadores.

Como explica ROMANO MARTINEZ 121 , a “dispersão acionista e o designado «capitalismo


popular», dos anos 50-60 do século passado, deram origem à democracia acionista, com as
«ações do trabalho», tendo em vista transformar os trabalhadores em capitalistas”.

No entanto, apesar desta ideia inicial, as empresas concedem normalmente as stock


options com outros intuitos, como sejam, alinhar os interesses dos gestores com os dos
acionistas, reduzindo os custos de agência; como forma de remuneração que permite minimizar
o reconhecimento de custos com os trabalhadores; como substitutos de remunerações pagas
em caixa e seus equivalentes; para atrair e reter trabalhadores na empresa evitando a
transferência para empresas concorrentes e como instrumento de extração de rendimento dos
acionistas122 e, acima de tudo, tem por base requisitos variados, como a existência de relação de
trabalho, verificação de resultados da empresa e o bom desempenho do trabalhador para o
alcance desses resultados.

Os planos de aquisição de ações podem também ser planos de aquisição de obrigações,


convertíveis em ações. Embora do ponto de vista fiscal, as stock options sejam tributadas como
rendimentos do trabalho, à luz do regime laboral, normalmente não se integram no conceito de
retribuição123.

Em suma, a qualificação destas atribuições como retribuição depende da sua utilização,


e deve ser sempre alvo de avaliação casuística, isto é, se aquela atribuição é uma mera

121
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 547.
122
Morais, Ana Isabel in “Stock Options: Principais determinantes da atribuição”, in Revista da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, nº 37
abril/junho de 2007, pág. 49-54.
123
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 548.

66
liberalidade ou tolerância do empregador, revogável pelo mesmo a qualquer momento, ou se,
por outro lado, estas atribuições se traduzem numa intenção de atribuição de um benefício
económico ao trabalhador.

Ainda quanto às tipologias de retribuição, recentemente os empregadores começaram a


atribuir a certos trabalhadores algumas prerrogativas. Normalmente estas regalias são
consagradas a trabalhadores que exercem cargos de chefia, dirigentes. São os chamados “fringe
benefits” (ou “atribuição de meios”), ou seja, são prestações que têm como objetivo aumentar a
motivação dos trabalhadores, reduzir o absentismo, o “turn-over”, aumentar a produtividade,
atrair melhores profissionais, melhorar a imagem da empresa dentro do setor ou conexão entre
o trabalhador e os objetivos da empresa e da organização onde esta inserido, etc. Podem
configurar vários privilégios, “como sejam o pagamento de prémios de seguro, complementos à
assistência em caso de doença, pensões complementares de reforma, empréstimos para
aquisição de casa ou automóvel” 124 , bem como prestações de fianças e outras garantias
bancárias aos trabalhadores, a atribuição de um cartão de crédito com um limite de crédito
autorizado, atribuição de cargos e situações de consultoria em sociedades coligadas, etc.

Como explica JÚLIO GOMES125, em termos sociológicos, “trata-se de prémios de fidelidade


que exprimem lealdade recíproca, sendo que o valor simbólico destas atribuições, quando dizem
respeito a produtos e serviços126, são usados para realçar as diferenças hierárquicas e sociais
nos quadros das empresas”.

É discutível se todos os “fringe benefits” deverão ser entendidos como retribuição em


espécie, acompanhando a opinião de DIOGO VAZ MARECOS127, no que diz respeito aos empréstimos
que o empregador realize não devem ser entendidos como retribuição em espécie, em primeiro
lugar porque podem deixar de ser concedidos a qualquer momento (com exceção dos
resultantes de obrigação contratualmente prevista) em segundo lugar, porque normalmente
configuram benefícios sociais atribuídos pelo empregador e que este, a qualquer momento, pode
alterar o montante do empréstimo ou até eliminar a concessão destes empréstimos a futuros
trabalhadores, não podendo estes últimos alegar o direito a estes empréstimos.

124
Gomes, Júlio in “Algumas...”, pág. 57 e 58.
125
Gomes, Júlio in “Algumas...”, pág. 58.
126
Nomeadamente, automóveis, relógios ou outros objetos de usos pessoal, viagens, férias, cartas de crédito, formação, etc.
127
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 6 da anotação ao art. 259.º.

67
68
7. Prestações Complementares – Exclusões Legais

Ao fazer uma análise prática dos conflitos decorrentes do conceito de retribuição, logo se
percebe que a consideração de certa atribuição patrimonial como retribuição é uma das causas
mais discutidas nos tribunais portugueses. Estes conflitos decorrem, sobretudo, do facto de os
empregadores, muitas vezes, quererem facultar atribuições remuneratórias encapotadas com
outro título. Esta necessidade de mascarar uma atribuição remuneratória deve-se, sobretudo, à
vantagem do empregador não se vincular à obrigatoriedade do seu pagamento, bem como à
obrigatoriedade de não diminuição da prestação retributiva (de acordo com o princípio da
irredutibilidade salarial), evitando, por outro lado, todas as despesas inerentes à concessão de
retribuição, como seja o pagamento do valor devido à Segurança Social. Todavia, o inverso
também se discute, tendo em conta o disposto no n.º 3 do art. 258.º do CT, que estabelece a
presunção de que todas as prestações do empregador ao trabalhador configuram retribuição,
quando na verdade nela não se devem integrar.

Pelo supra mencionado, urge a necessidade de expor algumas considerações


concernentes a certas prestações patrimoniais atribuídas pelo empregador que podem ou não
constituir parte integrante da prestação retributiva, recorrendo ao entendimento jurisprudencial
no âmbito destas matérias.

Decorre do n.º 1 do art. 258.º do CT que apenas constituem retribuição as prestações a


que o trabalhador tenha direito, ou seja, ficam desde logo excluídas as gratificações prestadas
pelo empregador “e cuja concessão este não seja obrigado por força do contrato, das normas
que o regem ou dos usos (alínea b) do n.º 1 e alínea a) do n.º 3 do art. 260.º)”128. No fundo, o
art. 258.º não deixa margem para dúvidas quanto ao facto de que apenas se pode considerar
retribuição as prestações que configuram uma contrapartida da atividade do trabalhador,
deixando de parte todas as prestações cuja causa é autónoma e individualizável, nomeadamente
aquelas prestações que visam compensar o trabalhador por despesas feitas durante a execução
da sua prestação.

As prestações complementares estão intimamente ligadas às especiais circunstâncias


em que a prestação do trabalho deve ser efetuada. Queremos com isto referir-nos àquelas

128
Carvalho, António Nunes, in “Notas sobre o Regime de Retribuição no Código do Trabalho”, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano LI, 2ª
série.

69
circunstâncias a que o trabalhador está exposto, tais como elevada penosidade, perigo,
isolamento, toxicidade e que servem de base a que de certa forma deva ser “compensado”, ou
situações ligadas ao mérito e performance ou ainda situações pessoais ligadas aos anos que
aquele “deu à casa”, isto é, antiguidade.

É indiscutível que a obrigação de retribuição não pode ser reduzida à lógica do


sinalagma “prestação-contraprestação”, sendo necessário aceitar a natureza híbrida do próprio
conceito de retribuição. Esta relatividade do conceito decorre, desde logo, do facto de o
trabalhador receber uma prestação em troca do seu trabalho bem como da relação de sujeição a
que está adstrito. Além disso, o legislador, embora estabeleça a regra geral no n.º 1 do art.
258.º, vem abranger através do n.º 2 outras prestações, além da retribuição base129, que sejam
regulares e periódicas e através da presunção do n.º 3 do mesmo preceito uma série de
prestações complementares, invertendo o primeiro raciocínio e concluindo que nem a retribuição
diz apenas respeito à prestação a que o “trabalhador tem direito em contrapartida do seu
trabalho”.

Mas, muito embora o n.º 4 do art. 258.º venha aplicar o regime das garantias previstas
no Código do Trabalho à “prestação qualificada como retribuição”, na ótica de BERNARDO LOBO
XAVIER, “não pode dizer-se que o reconhecimento do caráter retributivo de uma dada atribuição
envolva fatalmente a produção de todos os efeitos jurídicos da retribuição, tal como, ao inverso,
não pode afirmar-se que as prestações não retributivas não beneficiam de nenhum dos efeitos
associados à retribuição” 130 . Na opinião deste autor devem merecer a mesma tutela das
prestações retributivas, o crédito do trabalhador que diga respeito a, por exemplo, ajudas de
custo ou à remuneração por trabalho suplementar, seja ou não considerado como prestação
retributiva.

A verdade é que nem sempre as prestações complementares devem ser integradas na


prestação retributiva, e neste sentido o Código do Trabalho, no seu art. 260.º, consagra
expressamente as prestações que devem ou não ser incluídas na retribuição, e estabelece que
“não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de

129
Cf. art. 262.º, n.º 2 al. a) - A retribuição base tem carácter obrigatório decorrente do contrato ou IRCT e corresponde à atividade
desempenhada pelo trabalhador em contrapartida do trabalho prestado, de acordo com um período normal de trabalho, que é certo e fixo.
130
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 545.

70
viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao
trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador”.

Os casos previstos na al. a) do n.º 1 do art. 260.º do CT são normalmente excluídos do


“conceito de retribuição”, uma vez que as mesmas não são necessariamente contrapartida do
trabalho prestado, mas configuram formas de ressarcimento pelo empregador de despesas
efetuadas com a realização da prestação a que o trabalhador se vinculou, sendo que,
normalmente, essas despesas serão dispersas, não preenchendo assim o requisito da
regularidade e periodicidade para serem tidas em conta enquanto prestações retributivas. Em
suma, não se consideram retribuição as importâncias devidas ao trabalhador por deslocações,
novas instalações, despesas feitas em serviço – ajudas de custo, abonos de viagem, despesas
de transporte ou despesas de instalação.

No entanto, o legislador quis acautelar os casos em que o empregador atribui estas


prestações complementares ao trabalhador, de forma regular e periódica, prevendo que estas
ajudas de custo ou outros subsídios integrem, pelo menos em parte, a retribuição (art. 260.º, n.º
1 in fine). Ou seja, quando as ajudas de custo ou abonos forem “frequentes”, previstos no
contrato ou se devam considerar integrantes da retribuição pelos usos, sendo que, ainda que
estes requisitos estejam previstos, apenas são considerados retribuição na medida em que
excedam os “respetivos montantes normais”. É ainda fixado o mesmo regime para o abono por
falhas e para o subsídio de refeição, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal.

Na opinião de MARIA MANUELA MAIA131, as prestações complementares que dizem respeito


às compensações por risco, como sejam, por exemplo, os abonos para falhas, trabalho por
turnos, isolamento, trabalho noturno, toxicidade, perigosidade, horas extraordinárias, etc., não
devem integrar o conceito de retribuição pelo seu cariz não ser remuneratório mas antes
compensatório do risco ou especial penosidade a que os trabalhadores estão sujeitos. Entende a
autora que os referidos subsídios só deverão subsistir enquanto a situação que lhes serve de
base perdurar, configurando circunstâncias que por força da lei ou convenção serão transitórias,
“não revestindo carácter de regularidade ou habitualidade”, uma vez que “estes complementos
são parcelas ligadas a «condições extrínsecas» da prestação convencionada, que as partes
interiorizam como suscetíveis de cessar”.

131
Maia, Maria Manuela, op. cit., pág. 268.

71
Em conclusão a autora considera que para o reconhecimento de uma prestação
complementar como parte integrante da retribuição do trabalhador, há que verificar duas
condicionantes, a saber: analisar se o complemento foi previsto no contrato, e caso o tenha sido,
presume-se como integrante do montante retributivo; se não tiver sido previsto contratualmente,
o complemento não integra a retribuição, exceto nos casos em que tiver “adquirido uma
regularidade e periodicidade tal, bem como a interiorização das partes que o mesmo tenha
integrado o núcleo do sustento do trabalhador”.

São ainda excluídas da retribuição as importâncias atribuídas pelo empregador a título


de gratificações ou prestações extraordinárias, concedidas como recompensa ou prémio de bons
resultados da empresa, nos termos do n.º 1 al. b). Estas atribuições assumem um caráter
voluntário e extraordinário, uma vez que o empregador pretende recompensar o trabalhador ou
premiá-lo pelos bons serviços, mas não quer a elas vincular-se. Em princípio, estas atribuições
estão conexas aos resultados obtidos pela empresa ou à qualidade do serviço de um dado
trabalhador, mas podem também dizer respeito a outras causas, como sejam a comemoração
de uma data importante para a empresa (aniversário, Natal - atribuição de um “cabaz de
Natal”), homenagear um trabalhador ao fim de certos anos de serviços na empresa, com a
atribuição de objetos valiosos (relógio, medalha, etc..), etc.

Quanto às gratificações, é necessário ressalvar os casos em que as mesmas são devidas


por força do contrato ou das normas que o regem, os casos em que as gratificações, pela sua
importância e caráter regular e permanente, devam considerar-se como parte integrante da
retribuição por força dos usos, ou quando as mesmas tenham caráter estável, ordinário, por
estarem relacionadas com os resultados obtidos pela empresa, quer por força do título atributivo,
quer pelo seu caráter regular e permanente. O legislador previu e visou proteger aqueles casos
em que as atribuições patrimoniais são regulares e permanentes, tendo assim um caráter
estável, e que, por estarem previstas no contrato e nas normas que o regem, criam no
trabalhador uma expectativa legítima do recebimento dessas atribuições, considerando-as assim
com retributivas.

72
Como explica ROMANO MARTINEZ132, tendo em conta o art. 260.º do CT, o critério a seguir
é o da “contraposição entre o animus donandi e a obrigatoriedade de efetuar a prestação,
associado à regularidade”.

Se a gratificação for devida por força do contrato ou se pelos usos se integrar na


contraprestação, não deixa de integrar a retribuição. Como explica o autor citado, “são
prestações que, apesar do (aparente) animus donandi, por serem devidas ao trabalhador,
constituem um crédito deste e consideram-se, portanto, retribuição; diferentemente da doação,
que assenta no espírito da liberalidade (art. 940.º, n.º 1 do CCivil), estas prestações são devidas
por força da execução do contrato”.

Se, por outro lado, a gratificação atribuída pelo empregador, for irregular, mas não
garantida, não integra o conceito de retribuição por não corresponde a uma contrapartida do
trabalho prestado, nos termos da al. b) do n.º 1 do art. 260.º.

Muito se discute na doutrina o caso de certas gratificações, atribuídas por terceiros, ou


seja as comummente chamadas “gorjetas”133. Na verdade, numa abordagem leve, sempre se
dirá que o requisito essencial para se considerar que certa atribuição patrimonial integra a
retribuição, não está preenchido. Referimo-nos, naturalmente, à obrigatoriedade jurídica do
empregador, ou seja, as gorjetas não correspondem a uma prestação devida pelo empregador,
mas sim, a uma liberalidade de um terceiro, de natureza eventual e optativa, portanto, logo se
dirá, que a “gorjeta” não configura uma prestação retributiva, este é o nosso entendimento, bem
como da maioria da doutrina, nomeadamente de LEAL AMADO 134 que diz que, a retribuição
configura uma prestação obrigatória a cargo da responsabilidade do empregador, e se a mesma
não for “juridicamente obrigatória” ou não for efetuada pelo empregador, então não será uma
prestação retributiva, reconhecendo no entanto que “ainda que correspondam a uma parcela
não negligenciável do rendimento daquele, não integram a retribuição do trabalhador”.

No entanto, e uma vez que tais gratificações muitas vezes são uma parte significativa do
rendimento do trabalhador (ex. restaurantes, bares, cabeleireiros, etc.) levanta-se a questão de
saber se a gorjeta poderia ser considerada retribuição através de um de dois caminhos: a) ou da

132
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 545.
133
A este propósito Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual..., pág. 561; Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 302; Gomes, Júlio in
“Direito...”, pág. 769 e Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 550.
134
Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 302.

73
renúncia do empregador na cobrança do serviço ao cliente, ou b) na possibilidade de conferir ao
trabalhador o recebimento das gorjetas, assumindo o empregador o dever de não diligenciar de
forma comprometedora do recebimento das referidas gorjetas135.

Por um lado, ainda que acompanhando a teoria de que a gorjeta não é uma prestação
retributiva, sempre se dirá que a sua atribuição, anda par a par com a mesma, tal como
demonstrado por JÚLIO GOMES que cita, em nota de rodapé, o autor GIULIO MUSACCHIA, que deu o
exemplo da possibilidade de um contrato de trabalho, quanto aos croupiers, prever que a
retribuição fosse inteiramente excluída em atenção à frequência e importância das gorjetas136.

Aliás, mesmo que as gorjetas não sejam retribuição, em caso de despedimento ilícito,
devem ser tidas em conta para a determinação do prejuízo sofrido pelo trabalhador pela ilicitude
do despedimento. Este é o entendimento generalizado da jurisprudência, sobretudo no que diz
respeito aos trabalhadores de casino, mormente da Relação do Porto 137 , recorrendo à prévia
análise do Supremo Tribunal de Justiça, e citando o douto Tribunal, transcreveu as palavras do
mesmo, que explicavam que, “embora não se possa considerar aquelas gratificações como
retribuição, a verdade é que elas, apesar de donativos de terceiros, estavam dependentes da
prestação de trabalho pelo A. Com o despedimento operado pela R. o A. viu-se privado de as
receber durante o espaço de tempo em que o despedimento prevaleceu”138.

Por força das al. c) e d) do n.º 1 do art. 260.º do CT, respetivamente, as prestações
decorrentes de factos relacionados com o desempenho, o mérito profissional ou a assiduidade,
desde que não estejam antecipadamente garantidas e a participação nos lucros da empresa,
desde que a retribuição certa contratada seja adequada ao trabalho prestado pelo trabalhador,
são igualmente prestações que não se integram na retribuição. Estas são, tal como as
gratificações, prestações que não são obrigatórias. São prestações que configuram liberalidades
que o empregador quer realizar, mas que a ele não estão vinculadas.

135
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 769.
136
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 769, em nota de rodapé citando o autor Giulio Musacchia, Mancia, Enciclopédia del Diritto, Giuffrè, vol. XXV,
Milano, 1975, pág. 306: “non poche recipoche interferenze”.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de novembro de 2010, Processo n.º 431/08.8TTBCL.P1, disponível no website
137

www.dgsi.pt.
138
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de janeiro de 1996, Coletânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de
Justiça, 1996, Vol. I, págs. 249 e segs., e no mesmo sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de novembro de 1996, in
Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, Ano XXXVI, 1997, págs. 691 e segs.: “a entidade patronal, casino, na sequência de despedimento
ilícito, constitui-se na obrigação de indemnizar o trabalhador por este não ter recebido as gratificações correspondentes a dádivas de clientes”.

74
Quanto às prestações conferidas relacionados com o desempenho, o mérito profissional,
normalmente denominadas “prémios”, destinam-se a incentivar os trabalhadores, tendo em
vista o aumento da produtividade da sua prestação, mas em geral não dependem dos resultados
da empresa. Estes prémios muitas vezes estão previstos nos regulamentos internos das
empresas, ou até nos próprios contratos, condicionados ao desempenho do trabalhador, mas
não se consideram retribuição dado o seu caráter de incentivo e encorajamento, exigindo um
esforço complementar.

Conforme explica BERNARDO LOBO XAVIER 139


, o facto de o empregador prever
regulamentação relativa aos incentivos ligados ao desempenho, não significa que esta
regulamentação e não discricionariedade os aproximem do conceito retributivo. Em primeiro
lugar, porque na verdade o prémio nunca é garantido, uma vez que depende sempre de uma
avaliação ao desempenho do trabalhador, que por si só é aleatório, que é uma condição, incerta,
não sendo assim um dado garantido, o que por si só exclui a ideia de garantia. Em segundo
lugar, se a atribuição dos prémios fosse garantida, por um lado o empregador sairia beneficiado
quando decidisse atribuir discricionariamente um dado prémio, e sairia prejudicado quando
regulamentasse a atribuição de prémios, e os mesmos perderiam o seu caráter de incentivo e
toda a sua eficácia prática.

Contudo, o n.º 3 do art. 260.º do CT consagrou expressamente os casos excecionais às


al. b) e c) do n.º 1 do referido preceito legal. Quanto às gratificações, ainda que estas estejam
condicionadas aos bons serviços prestados pelo trabalhador, estas serão obrigatórias e
configuram um direito do trabalhador, se forem devidas por contrato ou das normas que o
regem, ou se considerem retribuição pelos usos. Além disso, se o empregador instituir na
empresa um certo prémio de fim de ano, e o mesmo se repetir, criando assim uma expetativa
de recebimento do mesmo na esfera jurídica do trabalhador, o legislador, criou um mecanismo
de defesa dessa expectativa, através no n.º 3, alínea b), em que a obrigatoriedade do pagamento
decorre do uso e das expectativas por ele causadas, ainda que o seu montante possa variar em
função dos resultados obtidos.

Relativamente às comissões, estas consistem num acréscimo à remuneração,


determinado por percentagem sobre o valor das vendas efetuadas pelo trabalhador, ou seja,
configura a participação no resultado concreto da atividade do trabalhador. São atribuições

139
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 559.

75
patrimoniais retributivas que existem não só no trabalho subordinado, mas também nos
contratos comerciais, nomeadamente, no contrato de agência e por se relacionarem com o
desempenho profissional do trabalhador, questiona-se se estas atribuições não se encontram
abrangidas pela al. c) do n.º 1 do art. 260.º do CT, do que resultaria as mesmas não serem
consideradas retribuição. A doutrina e jurisprudência 140 têm considerado que as comissões
integram a retribuição do trabalhador, na modalidade de retribuição variável, sendo certo que o
regime jurídico do Direito do Trabalho, pouco se pronuncia quanto a este tipo de prestações.

Como explica JÚLIO GOMES141, “na prática dos negócios é frequente que estas só sejam
pagas se os contratos promovidos vierem a ser efectivamente cumpridos, mantendo-se o direito
à comissão se o contrato vier a ser resolvido por incumprimento culposo do principal (no
contrato de agência) ou do empregador (no contrato de trabalho)”.

Quanto à remuneração por trabalho suplementar, a prestação deste pretende


compensar as situações de especial penosidade, que resulta da execução do trabalho fora do
horário normal de trabalho. O regime jurídico relativo a esta prestação encontra-se consagrado
nos arts. 226.º e seguintes do CT. O Código do Trabalho não prevê expressamente a exclusão
dessa atribuição da retribuição, ao contrário do art. 86.º da LCT. No entanto, em nosso
entendimento e salvo melhor parecer, parece-nos que a atribuição concedida pelo trabalho
suplementar não deve integrar a retribuição, desde logo porque esta prestação tem, em
princípio, caráter excecional. Pelo que, só se deve considerar que a prestação pelo trabalho
suplementar como parte integrante da retribuição, quando pela sua atribuição regular e
periódica se conclua que o montante auferido a este título influencia consideravelmente o valor
recebido pelo trabalhador, de tal forma a que este legitimamente crie uma expectativa de
recebimento do mesmo. Nesse sentido, escreve ainda MONTEIRO FERNANDES 142 , “no tocante ao
trabalho suplementar, a remuneração acrescida pode ser ou não computada no salário global
conforme se verifique ou não a regularidade do recurso a horas suplementares de serviço”.

140
Neste sentido Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, e Acórdão do Tribunal da
Relação de Lisboa, de 13 de março de 2009, Processo n.º 2195/05.8TTLSB-4, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt.
141
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 773.
142
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.406.

76
Este tem sido também o entendimento unânime no seio da Jurisprudência. Citando a
Relação do Porto 143 “face às considerações que acima se deixaram expostas a propósito da
natureza regular e periódica de uma prestação, a conclusão que se impõe é no sentido da
retribuição do trabalho extraordinário ou suplementar não ser de computar na retribuição global,
excepto se a prestação desse trabalho pelo trabalhador assumir natureza regular”.

No que concerne às diuturnidades, como explica o Supremo Tribunal de Justiça, as


diuturnidades “constituem complementos pecuniários estabelecidos para compensar a
permanência do trabalhador na mesma empresa ou categoria profissional, e têm como razão de
ser a inexistência ou dificuldade de acesso a escalões superiores. Assim, vencidas nos termos
convencionalmente fixadas, o montante das diuturnidades que tem carácter regular e certo,
integra-se no vencimento como parcela a somar ao salário base, gozando, por isso, da protecção
própria inerente à retribuição”144.

Estas prestações têm como característica o facto de serem associadas à pessoa do


trabalhador, isto é, a atribuição patrimonial está ligada à antiguidade do estatuto de cada
trabalhador, e não à qualidade ou natureza da sua prestação. A antiguidade a que se refere a al.
b) do n.º 2 do art. 262.º, diz respeito à antiguidade de um dado trabalhador em certa categoria
ou função, e não à antiguidade na empresa, sendo que, se o trabalhador mudar de categoria ou
função, recomeça a contagem da antiguidade para o cômputo da diuturnidade. O legislador
visou afastar todas as prestações auferidas pelo trabalhador, com exceção da retribuição base e
diuturnidade, para a aferição da prestação complementar ou acessória.

Como consagra o art. 262.º do CT, as diuturnidades fixam um critério para a


determinação da prestação complementar ou acessória devida ao trabalhador. A este propósito
fala-se da não consagração do princípio da omnicompreensibilidade no direito do trabalho
português, como explica DIOGO VAZ MARECOS, no comentário feito ao art. 262.º do CT, “ de
acordo com o princípio da omnicompreensibilidade a retribuição é constituída por todas as
prestações que tenham um nexo de causalidade com o contrato de trabalho, o que se traduz na

143
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de março de 2014, Processo n.º 597/13.5TTVNG.P1 e no mesmo sentido Acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça de 30 de março de 2006, Processo n.º 08/06, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt.
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de dezembro de 2010, Processo n.º 285/07.1TTBGC.P1.S1, disponível no website
144

www.dgsi.pt.

77
relevância de toda e qualquer prestação complementar retributiva, independentemente do
instituto retributivo em causa”145.

145
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., anotação ao art. 262.º.

78
8. Retribuição de Férias e o Subsídio de Férias

“O facto das prestações periódica e regularmente percebidas pelo trabalhador


integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não significa que linearmente tenham de ser
levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações cujo montante se encontra indexado ao
valor da retribuição, como, por exemplo, acontece com a retribuição de férias e os subsídios de
férias e de Natal”146. Estas questões são com frequência litigadas nos tribunais portugueses, para
que decidam se uma dada prestação deve ou não ser integrada no valor devido ao trabalhador a
título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

A Constituição da República Portuguesa, consagra no seu art. 59.º, n.º 1 al. d), o direito
ao repouso e aos lazeres, isto é, o direito a férias periódicas pagas. Esta consagração, em
termos sistemáticos, está prevista no âmbito dos direitos económicos, sociais e culturais, muito
embora se entenda este direito com natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias dos
cidadãos, e portanto sujeito ao regime dos arts. 17.º e 18.º do mesmo diploma legal147.

Na verdade o legislador compreende que o trabalhador não se desprende do cidadão-


pessoa, tendo, por isso, necessidades pessoais e que o mesmo carece de recuperação física e
psíquica bem como disponibilidade pessoal e oportunidade para participação no quotidiano
familiar, social e cultural, conforme é reconhecido pelo disposto no art. 237.º, n.º 4 do CT.

Com o intuito de conceder ao trabalhador um período extralaboral para satisfação das


suas necessidades pessoais e recuperação física e psíquica, o legislador fixou uma duração
mínima de vinte e dois dias úteis, por cada ano civil de trabalho prestado148, ou seja, de segunda
a sexta-feira, não incluindo os dias feriados, os sábados e os domingos.

Na verdade, a consagração do direito a férias remuneradas “emana da qualidade de


trabalhador subordinado constituindo um verdadeiro direito subjectivo e traduz-se na pausa ou
pausas na prestação de trabalho, remuneradas, por um período total de dias que deverá ser
gozado seguido até a um limite mínimo, preferencialmente no ano a que reportam, e que se
destinam a proporcionar ao trabalhador um período anual de repouso retribuído para a sua

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º 467/06.3TTCBR.C1.S1, disponível no website
146

www.dgsi.pt.
147
Canotilho, Gomes e Moreira, Vital in “Constituição da República Portuguesa”, anotação I ao art. 59.º, 4ª ed. Revista, Vol. I, 2007, Coimbra E.,
pág. 770.
148
Cf. art. 238.º, n.º 1 do CT.

79
recuperação física e psíquica bem como garantir-lhe temporariamente a auto determinação e
disponibilidade pessoais, integração familiar e participação social e cultural sendo que poderão,
marginalmente, traduzir um prémio nomeadamente pela assiduidade”149.

Percebe-se que, uma vez que o direito a férias se relaciona com a promoção humana,
social e cultural, bem como com a necessidade de descanso anual do trabalhador, sendo que
estimula também a colaboração do empregador com o trabalhador para a obtenção de uma
maior produtividade no seio da empresa, o trabalhador não possa efetuar outras atividades
remuneradas, durante o hiato respeitante ao período de férias, que lhe exijam esforço físico ou
intelectual, privando-o dessa forma da necessidade de descanso que fundamenta o direito às
férias remuneradas, ressalvando as exceções legalmente previstas.

Estas exceções estão previstas na 2ª parte do n.º 1 do art. 247.º do CT, e dizem
respeito às situações em que o trabalhador já exerça cumulativamente outra atividade
remunerada ou nos casos em que o empregador autoriza o trabalhador a exercer atividades
remuneradas em período de férias.

Fora estes casos, e sem prejuízo da responsabilidade disciplinar do trabalhador nos


termos do art. 328.º e segs. do CT, o empregador terá direito a reaver a retribuição de férias e o
respetivo subsídio 150 , sendo que metade desses valores reverte para o serviço de gestão
financeira do orçamento da segurança social (Cf. art. 247.º, n.º 2).

Segundo a CRP, conforme mencionado supra e nos termos do art. 237.º, n.º 1 do CT, o
trabalhador tem direito a “um período de férias retribuídas”. A este propósito o art. 264.º, n.º 1
do CT esclarece que “a retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador
receberia como se estivesse em serviço efetivo” e, o n.º 2 consagra o direito do trabalhador a
um subsídio de férias, diferente do montante da retribuição de férias, que compreende a
retribuição base e “outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico
da execução do trabalho”.

O art. 264.º do CT, relativo à retribuição do período de férias e respetivo subsídio,


suscita várias dúvidas no que concerne à própria interpretação do referido preceito. Levando em
consideração os aspetos supra mencionados quanto à dificuldade de balizar o conceito de

149
Sónia Preto, op. cit., pág. 284.
150
Nos termos do n.º 3 do art. 247.º, em cumprimento do n.º 2 do mesmo preceito, pode o empregador fazer descontos na retribuição do
trabalhador, até ao limite de um sexto, em relação a cada uma dos períodos de atribuições patrimoniais posteriores.

80
retribuição, à multiplicidade de complementos salariais existente à margem do salário base e
quanto ao caráter misto ou variável da prestação retributiva, a forma de cálculo da retribuição de
férias vai também encarar todas estas dificuldades, acrescidas da circunstância da forma de
cálculo da retribuição de férias não ser coincidente com a forma de cálculo do subsídio referente
ao período de férias.

Porquanto, no que diz respeito à expressão “outras prestações retributivas que sejam
contrapartida do modo específico da execução do trabalho”, de acordo com JOANA
VASCONCELOS151, a “formulação adoptada comporta uma opção, de entre os diferentes nexos de
correspectividade que caracterizam as várias componentes da retribuição, por aqueles que se
referem à própria prestação do trabalho” isto é, a autora indica que são contrapartida do modo
específico do trabalho os “condições extrínsecas” como seja a penosidade, isolamento,
toxicidade, trabalho noturno, turnos rotativos e por isso, incluídas no subsídio de férias. Por outro
lado excluí por não serem contrapartida do modo específico do trabalho, as atribuições
patrimoniais devidas pela efetiva prestação da atividade, ou seja, as “condições intrínsecas” da
prestação do trabalho, que respeitem ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (como
prémios de assiduidade, produtividade, gratificações, comissões), “que consistam na assunção
pelo empregador de despesas em que aquele incorreria por causa da prestação do trabalho,
quando devam considerar-se retribuição (subsídios de refeição, de transporte) ”.

O direito a férias é entendido como elemento integrante do próprio contrato de trabalho,


sendo um direito do trabalhador associado à própria personalidade do mesmo. Como explica
SÓNIA PRETO152, “trabalhar não se traduz apenas em entregar força de trabalho de uma forma que
se possa retratar como estanque, independente de todos os demais elementos que constituem o
ontos de uma pessoa. O direito a férias é um desses direitos que reflete a especial relação que
se estabelece no domínio laboral entre o empregador e o trabalhador. E é esta especial relação
(…) que justifica uma regulamentação jurídica que tenha por base e limite a dignidade do
trabalhador pessoa”.

Como referimos supra, esta é uma das causas pelas quais o contrato de trabalho não é
um contrato civil estritamente bilateral, isto é, o sinalagma que assenta na prestação do trabalho

151
Cf. Código do Trabalho Anotado de Pedro Romano Martinez e outros, anotação n.º 3 ao art. 264.º por Joana Vasconcelos, 8ª edição, outubro
de 2009, Almedina, pág. 631, e Manuel Ferreira da Costa in “A Reforma do Código Do Trabalho - A retribuição e outras atribuições
patrimoniais”, dezembro de 2004, Coimbra E., pág. 404.
152
Sónia Preto, op. cit., pág. 299.

81
versus retribuição, acaba por padecer de um “vício”, uma vez que mesmo durante o período de
férias, ou seja, inatividade do trabalhador, a prestação retributiva continua a ser paga ao
trabalhador, sem qualquer impacto que seja prejudicial ao trabalhador.

O legislador consagra o atual direito à retribuição de férias e explicita que a mesma diz
respeito ao valor que o trabalhador usualmente recebia se estivesse a desempenhar as suas
funções e, já quanto ao subsídio de férias, o conceito legal veio balizar as prestações que podem
ou não integrar o mesmo.

Somos levados a acreditar que, no que concerne à retribuição de férias, o legislador quis
manter a retribuição de férias proporcional à retribuição que o trabalhador aufere em período de
não férias, ou seja em serviço efetivo, excluindo as atribuições patrimoniais pagas ao trabalhador
que têm como escopo compensar as despesas que o mesmo tem a título de alimentação, e pela
deslocação que o trabalhador tem de realizar para executar o contrato.

Exclui-se em nossa opinião, portanto, estas prestações uma vez que estas circunstâncias
não se verificam em período de férias e por não terem sequer natureza retributiva, sem prejuízo
do previsto na parte final da al. a), do n.º 1 do art. 260.º se, porém, estas atribuições relativas a
despesas forem devidas independentemente da sua efetivação ou nos termos em que excedam
os valores normais.

Quanto aos complementos retributivos por trabalho noturno, isenção de horário de


trabalho, trabalho suplementar, por exemplo, deve aferir-se, em primeiro lugar, da sua natureza
retributiva através do critério do pagamento regular e periódico (cremos com base no critério dos
onze meses, conforme referido supra), e em caso oposto não deverão as mesmas assumir
caráter retributivo e, como tal, não devem ser tidas em conta para o cálculo da retribuição de
férias.

Quanto à parte variável da retribuição, referimo-nos nomeadamente ao caso das


comissões, por fazer parte da retribuição do trabalhador deve integrar, igualmente, o montante
pago a título de retribuição de férias; o critério para apurar o montante devido deve ter por
referência os doze meses anteriores, com base no art. 261.º, n.º 3 do CT153.

153
Com efeito, no que concerne às comissões o fundamento mantem-se, isto é, uma vez que as mesmas fazem parte da retribuição variável,
normalmente como complemento à parte fixa da retribuição, devem também integrar a retribuição de férias, atendendo ao valor médio.

82
É nosso entendimento que o legislador, na atual consagração legal do subsídio de férias,
pretendeu eleger, entre as várias atribuições patrimoniais, aquelas que, de algum modo, se
prendem com a própria prestação do trabalho, e às específicas circunstâncias que a prestação
acarreta.

Nesta perspetiva, as atribuições a título de trabalho suplementar (porque se destina a


compensar a especial penosidade do modo específico da prestação do trabalho), trabalho
noturno (porque visa compensar a penosidade e incómodo de trabalhar à noite), trabalho por
turnos (visa remunerara a maior penosidade da prestação da atividade por turnos), isolamento
(porque visa compensar o modo específico da prestação de trabalho, pela penosidade da
prestação em isolamento), toxicidade (visa remunerar o risco acrescido derivado da exposição
que o modo especifico da prestação de trabalho implica), etc., devem ser tidos em consideração
para o cômputo do valor a pagar por subsídio de férias, por serem prestações que são
contrapartida do modo específico da execução do trabalho, sendo este o critério eleito pelo
legislador.

Dado o exposto, ficam excluídas do subsídio de férias aqueles complementos


remuneratórios que dizem respeito à pessoa do trabalhador, às despesas que o mesmo tem de
efetuar para a realização da sua prestação de trabalho, bem como ao seu desempenho, por
assim dizer, devem excluir-se do subsídio de férias, as diuturnidades, os prémios de
produtividade e semelhantes, gratificações bem como os subsídios de refeição, transporte,
fardamento, parqueamento, etc.

Ora, a disposição legal relativa à retribuição de férias no atual CT, segue a orientação já
prevista na Lei das Férias, Feriados e Faltas, concretamente o Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de
dezembro, que consagrava o princípio da não penalização remuneratória, e nas palavras de
ANDRADE MESQUITA154, este princípio significa que “em termos de contrapartida do trabalho, tudo
se passa como se não existisse tempo de repouso”. Este entendimento é maximalista, mas
apesar de a lei apontar para a ficção de que a retribuição de férias correspondia ao montante
que o trabalhador recebia se prestasse efetivamente os seus serviços e assentando nessa
pressuposição se determinava o quantum a pagar a título de retribuição de férias, deixava de se

154
Mesquita, José Andrade in “O direito a férias”, Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, Vol. III, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 106.

83
considerar “substancial heterogeneidade dos pressupostos e razão de ser da atribuição de cada
uma das prestações retributivas”155.

Apesar desta visão maximalista do regime relativo à retribuição de férias, a verdade é


que o mesmo levantava algumas questões pertinentes que a doutrina não deixou de criticar.
Desde logo, a ficção não permite contabilizar o montante das prestações desligadas da mera
efetividade do trabalho e dependentes da sua qualidade ou produtividade, assim como a
assiduidade do trabalhador, sobretudo nos casos em que estas características não
determinassem apenas o quantum a pagar, mas a própria existência de determinada prestação.
Por outro lado, levanta-se também a dificuldade derivada do momento em que a retribuição de
férias se vence, isto é, a prestação vence-se e o seu montante tem de ser concretamente
determinado antes do período a que respeita, no entanto, no momento em que a mesma se
torna exigível é impossível tomar em consideração factos que, em abstrato, podiam alterar o
montante retributivo devido (por ex.: acréscimo de trabalho, maior faturação, produtividade da
empresa, etc…)156.

Por outro lado, não seria de todo razoável que o montante retributivo relativo às férias
fosse alterado em função do momento, ou forma (seguidas ou interpoladas) em que as mesmas
fossem gozadas.

Neste sentido, parte da doutrina157, ao longo da vigência da Lei das Férias, Feriados e
Faltas, entendia que a determinação das prestações devidas a título de retribuição de férias,
devia ser feita com base em “pautas de regularidade e normalidade, em função de um padrão
retributivo, em abstrato, que correspondesse a um módulo temporal de duração igual ao período
de férias”, sendo “incontornável” o recurso a um padrão retributivo, e em função desse padrão,
o trabalhador teria direito ao que lhe era devido caso estivesse em serviços efetivo. Ou seja,
como explica ANTÓNIO NUNES CARVALHO158 “teria de lhe ser pago tudo aquilo com que o prestador
de trabalho pudesse antecipadamente contar pela mera permanência em efectividade de
funções durante o período de férias. Porém, decerto que o trabalhador não poderia
legitimamente contar – a menos que outra coisa resultasse do respectivo título atributivo – com

155
Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 92.
156
Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 92 e segs.
157
Assim, Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 94 e no mesmo sentido Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 636;
“Introdução...”, pág. 100.
158
Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 94.

84
prestações cuja causa de atribuição desaparecesse durante o período de férias (v.g. subsídio de
transporte) ”.

Com a entrada em vigor do CT/2003 e sucessivas revisões e, apesar da nova


abordagem que o legislador faz quanto a esta matéria, a doutrina e jurisprudência divergem
quanto ao conteúdo do montante retributivo de férias, desde logo porque certo tipo de
atribuições que o empregador concede podem não ser devidas em férias (por ex.: despesas de
transporte), por outro lado, a obrigação de inclusão das parcelas variáveis da retribuição, no
valor devido a título de retribuição de férias, mostram-se também duvidosas, pelo que esta
matéria se revela de extrema importância para as partes do contrato de trabalho e tem sido
ativamente discutida no seio dos tribunais portugueses.

Para a abordagem do tema retribuição de férias e subsídio de férias, é imprescindível


sublinhar que a retribuição, na aceção do art. 258.º do CT, tem como característica basilar ser a
contrapartida da prestação de trabalho, fixada pela vontade das partes, normas que regem o
contrato ou pelos usos. E esta característica permite ao intérprete da lei excluir do âmbito do
conceito de retribuição as prestações que não decorram da prestação do trabalho e que,
portanto, tenham fundamento divergente deste. Assim, há prestações patrimoniais, que, muito
embora possam criar no trabalhador a expectativa de recebimento, não são, rigorosamente,
correspetivas da execução do trabalho, não se podendo incluir na retribuição (nem no subsídio
de férias).

Por outro lado, releva para este matéria, a regularidade e periodicidade com que as
atribuições são conferidas aos trabalhadores, dando materialidade por um lado à presunção de
existência de vinculação prévia do empregador, e criando por outro lado expetativa de
recebimento, e criação de nexo entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares do
trabalhador. Mas as características da regularidade e periodicidade andam de braço dado com o
principal elemento definidor da retribuição, ou seja, o elemento da contrapartida, não têm valor
autónomo suficiente para conferir a uma atribuição patrimonial o cunho retributivo. Ou seja, as
atribuições patrimoniais conferidas de forma regular e periódica, só integrarão a retribuição, se
não tiverem uma causa específica e individualizada diversa da contrapartida159.

Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website
159

www.dgsi.pt.

85
Ora, o art. 264.º n.º 1 parece indiciar que o legislador quis atribuir ao trabalhador, a
título de retribuição de férias, não só as atribuições patrimoniais referidas no art. 258.º do CT,
(que consagra os princípios gerais da retribuição) constituída pela prestação a que nos termos
do contrato o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho (com a ressalva de que,
como mencionado supra, no caso da retribuição de férias, não há concretamente
correspetividade de prestações), compreendendo a retribuição base (Cf. art. 262.º do CT) e
outras prestações regulares e periódicas feitas pelo empregador, incluindo aquelas prestações
pecuniárias devidas pelo específico modo de prestação do trabalho (ex.: subsídio de trabalho
noturno), bem como aquelas atribuições patrimoniais que não revistam, em princípio, o caráter
retributivo, como sejam as despesas de transporte, o subsídio de refeição e outras prestações
equivalentes;

Incluindo ainda as demais prestações retributivas de caráter variável, como as


comissões, sendo que, a parte correspondente ao valor variável é calculado nos termos do art.
261.º, n.º 3, ou seja, recorrendo-se ao critério anual através do cálculo da média dos valores que
o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses.

Quanto ao subsídio de férias, ANTÓNIO NUNES CARVALHO160 entende que a determinação se


refere ao cálculo um complemento retributivo, pelo que se deveria aplicar, em princípio, o
regime jurídico previsto no art. 262.º do CT, caso o art. 264.º, n.º 2 não fixasse um critério para
aferir deste valor. O referido autor entende que o n.º 2 do art. 264.º não é uma norma
imperativa, mas antes fixa um regime excecional ao n.º 1 do mesmo preceito, que nem por isso
pode deixar de ser afastado pela vontade das partes, imputando no subsídio de férias os
complementos cuja atribuição tenha lugar por “força da lei e nos seus termos, como sucede
com o subsídio de isenção de horário de trabalho ou o pagamento de períodos de trabalho
nocturno incluídos no trabalho estabelecido”, mas excluí as atribuições patrimoniais que surjam
por vontade das partes, nomeadamente, as que são criadas pela autonomia coletiva e da
convenção resulte que os mesmos complementos não integram a retribuição161.

Defende o referido autor que, quando da convenção coletiva não decorra outra solução,
os complementos devem ser tidos em conta para o cálculo do subsídio de férias. Porém,

160
Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 100.
161
António Nunes Carvalho, na obra citada pág. 101, entende a este respeito que “não está aqui em causa (ao contrário de que acontece quanto
ao nível de rendimentos assegurados durante as férias) um princípio constitucional […]”.

86
ressalva que o regime jurídico do subsídio de férias consagra uma “proporção mínima (no
sentido inderrogável), com o normal montante retributivo, vedando a sua distorção por
convenção coletiva”.

Ainda neste âmbito, o autor citado supra entende que, o legislador decidiu integrar as
prestações complementares acessórias, sendo sempre necessário para a sua afetação no
subsídio de férias, distinguir entre elas as que constituem contrapartida da forma de execução
da prestação162, e no que concerne à retribuição variável considera que se o montante variável for
atribuído como “contrapartida da prestação standard”, então a mesma deve ser considerada no
computo do valor do subsídio de férias a atribuir ao trabalhador.

A este respeito, LEAL AMADO 163 chama a atenção para as prestações de caráter não
retributivo, que estão ligadas à específica execução (ou execução de facto, por exemplo: subsídio
de refeição) da prestação do trabalho, e que por isso, em princípio, estas não integram a
retribuição e não serão devidas durante as férias, nos termos do art. 260.º do CT, contando com
a presunção retributiva prevista no art. 258.º, n.º 3 do CT, e diz o autor que “em caso de dúvida,
tais prestações patronais também devem integrar a retribuição em período de férias”.

No que concerne às comissões, entende este autor 164 , uma vez que as mesmas têm
caráter retributivo (parte variável da retribuição) e o trabalhador a elas terá direito como
contrapartida do seu trabalho, as mesmas não podem deixar de ser tidas em consideração para
efeitos do cálculo de retribuição de férias, devendo ser apurado o valor médio, nos termos do art.
261.º, n.º 3 do CT.

Já no que concerne ao subsídio de férias, LEAL AMADO 165 indica que numa primeira
abordagem as comissões não integram o conceito de “outras prestações retributivas”, a que o
CT alude, admitindo que as mesmas relevem para efeitos de retribuição de férias como
referimos supra, mas já não para o subsídio devido a esse título 166. Por outro lado, entende que

162
Incluindo, nestes termos, o subsídio de isenção de horário de trabalho, ou a prestação de trabalho noturno compreendida no horário de
trabalho, bem assim como todas as prestações que decorram a “condições programadas da execução da prestação”.
163
Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 290, em nota n.º 401.
164
Amado, João Leal in “Comissões, subsídio de Natal e férias (breve apontamento à luz do Código do Trabalho) ”, Prontuário de Direito do
Trabalho, n.º 76 a 78, 2008, Coimbra E., pág. 239.
165
Amado, João Leal in “Comissões..”, pág. 241.
166
No mesmo sentido, com a ressalva de que esta matéria é discutível e por isso, admitindo a possibilidade de as comissões poderem integrar o
subsídio de férias, Rouxinol, Milena Silva in “O direito a férias do trabalhador (comentário aos artigos 237.º a 247.º e 264.º do Código do
Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009) ”, Cadernos do Instituto de Direito das Empresas e do Trabalho n.º 8, junho de 2014, Almedina, pág.
122.

87
as prestações ligadas às circunstâncias da prestação do trabalho, ao seu “condicionalismo
externo”, como sejam as prestações devidas por trabalho noturno, subsídio de risco, isolamento,
toxicidade, trabalho por turnos, penosidade, etc., devem ser tidas em conta para efeitos de
subsídio de férias.

Já MONTEIRO FERNANDES 167 esclarece que estão fora do âmbito do montante retributivo
devido em período de férias, as atribuições patrimoniais cuja razão de ser esteja ligada à
prestação de facto, como sejam, nomeadamente o subsídio de refeição, bem como as
atribuições que não sejam atribuídas pelo empregador, mas sim por terceiros, como sejam as
gorjetas e ou gratificação, ainda que estas sejam uma significativa fonte de rendimento para o
trabalhador. Quanto à retribuição variável, mormente as comissões, este autor entende que a
mesmas se integram e o critério para o seu cálculo é o que vem previsto no art. 261.º, n.º 3 do
CT, com referência ao valor médio dos doze meses anteriores.

No que concerne ao subsídio de férias, MONTEIRO FERNANDES, entende que o preceito


legal permite excluir as atribuições que correspondem à antiguidade de serviço, bem como os
subsídios que não se relacionem com o “modo específico da prestação”, como seja o subsídio
de transporte, de refeição, estudos, etc.

Para DIOGO VAZ MARECOS168 a retribuição do período de férias deve incluir as prestações
pecuniárias como o subsídio de refeição e transporte. Recorrendo ao argumento da maioria de
razão, este autor inclui também, para efeitos de retribuição de férias, outras prestações
pecuniárias que se relacionem com o modo específico da prestação do trabalho como sejam,
por exemplo, o subsídio de turnos, bem como as prestações que constituam a retribuição
variável.

No que diz respeito ao subsídio de férias, na opinião deste autor, ao contrário da


retribuição de férias, neste caso não devem ser consideradas as atribuições que pressupõem a
efetiva prestação de trabalho, como o subsídio de refeição e transporte, incluindo-se, por outro
lado, todas as prestações que decorram da contrapartida do modo específico da execução do
contrato, considerando, por exemplo, o subsídio de turnos e de trabalho noturno, bem como
comissões que devem ser calculadas, nos termos do n.º 3 do art. 261.º do CT, explicando a este

167
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.358.
168
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., anotação ao art. 264.º.

88
propósito que “no subsídio de férias, o que existe é um subvenção criada por lei, não sendo
aplicável o critério para apurar a retribuição variável, hà que recorrer à regra supletiva do n.º 3
do art. 261.º […]”.

A propósito deste assunto, SÓNIA PRETO 169 entende que o legislador se quis referir ao
conceito de retribuição previsto no art. 258.º do CT, “associando-o à ideia de serviço efectivo”. A
autora explica que “apenas as parcelas que estejam ligadas ao serviço efectivo fazem parte da
retribuição devida de férias”, excluindo dessa forma aquelas atribuições que pretendem facilitar
a prestação do trabalho, ou torná-la mais cómoda, pois trata-se de despesas que não configuram
uma “receita efectiva no orçamento familiar do trabalhador”, e conclui dizendo que devem ser
excluídas da retribuição de férias aquelas atribuições patrimoniais não consideradas retribuição,
e dentro das parcelas retributivas, aquelas que não se prendam com o serviço efetivo.

A mesma autora, referindo-se aos casos em que a retribuição do trabalhador é mista,


portanto constituída por uma parte certa e uma parte variável, defende que as parcelas variáveis
devem ser contabilizadas para o cômputo do valor da retribuição de férias, sendo que o critério
supletivo a adotar para o seu cálculo, será o previsto no art. 261.º, n.os 3 e 4, clarificando que o
referido critério não assenta no fundamento de retribuir o trabalhador como se estivesse em
serviço efetivo, pelo facto de a sua referência não ser o trabalho do mês de férias a gozar, mas
antes a referência ao ano anterior, e por isso, “a ideia de retribuição do (presumível) efectivo
serviço” só deve ser aplicada supletivamente, sendo que, como esclarece, “a ideia subjacente a
este cálculo não é a média das retribuições auferidas anteriormente, mas aquela que
razoavelmente, com base na ideia de regularidade e previsibilidade da sua atribuição, lhe seria
necessariamente devido pela prestação do trabalho durante as férias”.

Mas SÓNIA PRETO vai mais longe e revela que a maior dificuldade no que concerne à
retribuição em período de férias diz respeito à impossibilidade do cálculo da retribuição em
concreto, mas da retribuição em abstrato ou modular, uma vez que, durante o gozo das férias,
não há as vicissitudes do quotidiano laboral, como sejam as faltas, os atrasos, as refeições que
devem ser somadas ou deduzidas no montante retributivo a prestar, pelo que, para aferir do
montante retributivo de férias “exige-se um juízo de prognose no sentido de apurar o que será
efectivamente devido”.

169
Sónia Preto, op. cit., pág. 314 e segs.

89
A este propósito, ANTÓNIO NUNES CARVALHO170 diz que a retribuição de férias se alcança
pela “definição do padrão retributivo”, dando enfâse à ideia de regularidade, que decorre da
fixação por lei com eventuais adaptações por convenção coletiva, para o fim específico de “uma
regra retributiva, de um padrão, não se inferindo em termos aritméticos”. Para este autor, “deve
ser pago ao trabalhador aquilo que ele receberia pela mera circunstância de se encontrar
efectivamente ao serviço”, e portanto ficariam excluídas as atribuições patrimoniais irregulares,
eventuais ou que não decorressem diretamente da efetiva prestação do serviço. No entanto, na
ótica deste autor, não basta o critério da regularidade para que uma prestação possa ser
integrada na retribuição devida em férias, sendo necessário que o recebimento da mesma seja
legitimamente previsível171.

Relativamente à parte variável da retribuição, o referido autor defende que se as


prestações disserem respeito a atribuições que normal e previsivelmente estão presente na
efetiva realização da atividade a que o trabalhador está afeto, sem consideração de outras
causas específicas que afetem a sua atribuição, então estas deverão ser computadas no valor a
pagar a título de retribuição de férias, recorrendo ao critério do art. 261.º, nos 3 e 4.

JÚLIO GOMES 172 destaca que, para efeito de retribuição de férias, e uma vez que o fim
último desta consagração legal é garantir que o “trabalhador não se sinta tentado, por
necessidade económica, a não gozar as férias”, devem ser consideradas “todas as componentes
da retribuição”, desde comissões, ajudas de custo, deslocações, subsídios de refeição, etc.

Com referência ao subsídio de férias, JÚLIO GOMES refere que o problema está na
circunscrição das prestações que dizem, ou não, respeito ao modo específico da execução do
trabalho. Em primeira linha, admite que há casos de fácil consideração de modo específico de
execução do trabalho, como sejam, o subsídio de turno e o pagamento de trabalho noturno. Mas
levanta sérias dúvidas ao subsídio de risco ou de isolamento, admitindo, no entanto, que os
mesmos também devem ser considerados para o subsídio de férias.

170
Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 96.
171
Com efeito, o autor sublinha que a lei não dá relevância aos montantes recebidos pelo trabalhador antes do período de férias para aferir o
montante devido por esse período, nem o legislador prevê os “instrumentos para a tornar operativa”, esclarecendo que não se trata de fazer uma
“média a partir do que efetivamente e em concreto se passou, em termos de trabalho prestado, no período de uma ano”, mas antes de “fixar, a
partir do critério legal expresso no n.º 1 do art. 264.º, uma regra ou padrão retributivo mensal (padrão este que representa uma remuneração em
abstrato, uma unidade de conta)”.
172
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 780.

90
Já no que concerne ao pagamento do trabalho suplementar e às comissões, este autor
tece considerações mais cautelosas. Rigorosamente, o trabalho suplementar é uma
contrapartida cujo fundamento assenta na penosidade agravada de trabalhar fora do horário de
trabalho, e no entendimento deste autor, as prestações conferidas a este título devem ser
abrangidas pelo subsídio de férias. Contrariamente, as comissões, embora só se tornem
realizáveis através do modo específico da execução do trabalho, tendo assim um nexo de
conexão com esse modo específico, no entendimento de JÚLIO GOMES, dúvidas permanecem para
a classificação plena destas atribuições como contrapartida do modo específico da execução do
trabalho, sublinhando por fim que “a fórmula legal é hermética e fonte de alguma ambiguidade”.

Segundo BERNARDO LOBO XAVIER173, para o cálculo da retribuição de férias, deve ser tida
em consideração a retribuição em abstrato, ou modular. No que concerne às atribuições a título
de despesas que, em princípio diziam respeito ao trabalhador, as que visam facilitar o trabalho,
ou que não têm fundamento de contrapartida da prestação, como seja o subsídio de refeição,
transporte, fardamento, parqueamento, etc., entende o autor que não devem ser incluídas na
retribuição de férias bem assim, como não devem ser incluídas no subsídio de férias.

Já no que diz respeito às parcelas variáveis da retribuição, mormente as comissões de


venda e prémios, BERNARDO LOBO XAVIER, destaca, nos casos em que estas sejam consideradas
retribuição174, que a dificuldade se prende com a determinação do valor das referidas parcelas
que devam ser imputadas na retribuição de férias, sendo que, conforme refere, “a questão
estará em conciliar a necessidade de estabilizar a retribuição de modo a que o trabalhador não
esteja a receber menos durante as férias e ao mesmo tempo as expectativas do empregador em
pagar apenas em função de resultados obtidos e não em situações de não-trabalho, como as das
férias”, sugerindo que a concessão de uma única atribuição anual contribuiria para a resolução
desta querela ou a divisão dessas atribuições a obter durante um ano em catorze parcelas
(contando com a retribuição de férias e respetivo subsídio).

173
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 636.
174
Supra, opinião do autor mencionada na página 31.

91
No que tange ao subsídio de férias, o autor referido defende que deve operar “um
conceito depurado e próprio da retribuição”, e por isso, o subsídio de férias “é computado como
um minus relativamente à retribuição durante as férias”175.

Quanto à referência legal “outras prestações retributivas que sejam contrapartida do


modo específico de execução do trabalho”, prevista no n.º 2 do art. 264.º, BERNARDO LOBO XAVIER
concebe que se afasta a regra geral prevista no n.º 1 do art. 262.º bem como o critério do art.
264.º, n.º 1 e nesta sequência, afasta da integração no subsídio de férias, aquelas atribuições
“relativas ao próprio trabalhador de performance, mérito ou desempenho e que foram pensadas
fora dos parâmetros directos da execução do trabalho”, e ainda que sejam retribuição não
devem ser computadas no subsídio de férias, por defender que não devem ser pagas as
“atribuições ou o seu valor em que não se verifique a ideia de contrapartida relativamente à
execução do trabalho”.

Ademais, entende que se encontram também excluídas do subsídio de férias, as


diuturnidades ou prémios de antiguidade, pelo seu fundamento ser a evolução do trabalhador na
empresa e não a forma específica de execução do trabalho, bem assim como os prémios ligados
ao trabalhador, consagrados, eventualmente, por via de contrato ou convenção coletiva, como
sejam os prémios de tecnicidade, disponibilidade, conhecimentos de línguas, etc. Além destas
exclusões, BERNARDO LOBO XAVIER, entende que também os subsídios exclusivos que se liguem,
nomeadamente com estudos, formação profissional ou equipamentos, também não devem, ser
considerados para efeitos de subsídios de férias, pois não nexo entre os mesmos e a execução
da prestação de trabalho. Ainda fora do âmbito do subsídio de férias na opinião deste autor,
estão as atribuições patrimoniais permanente e em espécie, desligadas da contrapartida
específica da prestação do trabalho, como sejam o uso de casa, telemóvel e até automóvel,
ainda que as mesmas possam ser correspondidas a título de retribuição de férias176.

Por outro lado, o autor entende que devem ser incluídas no subsídio de férias o
acréscimo de retribuição devido a trabalho noturno, bem como no caso de o “trabalhador
exercer a sua função em regime de turno, o subsídio de turnos que esteja previsto em
convenção coletiva”, por serem prestações retributivas caracterizadas como modo específico da
execução da prestação sendo este também o entendimento quanto à retribuição por isenção de

175
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 637 in fine.
176
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 639.

92
horário do trabalho, com a ressalva de que há “situações muito subjetivas que podem ter mais a
ver com a disponibilidade pessoal que com a execução do trabalho”.

JORGE COSTA177 refere que com a nova redação do CT parece haver um “certo grau de
regressão, de natureza material, já que se perdeu a parificação à retribuição por férias”,
indicando que esta nova redação, quanto ao subsídio de férias, veio delimitar o seu âmbito, e
entende que estão excluídas do mesmo, pela sua natureza não corresponder ao modo específico
de execução do contrato, as prestações “facilitadoras da prestação do trabalho”, como o
subsídio de refeição, e os incentivos à produtividade, como os prémios.

Outrossim, MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO178 a propósito do subsídio de férias indica


que para calcular as “demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo
específico da execução do trabalho”, devem ser distinguidas duas categorias de prestações
complementares: as que dizem concretamente respeito às funções ou posto de trabalho daquele
trabalhador, como sejam as prestações de trabalho noturno, turnos, penosidade, risco ou
comissões; e as que digam respeito ao “cumprimento efetivo do dever do trabalho”, tais como,
por exemplo, os subsídios de refeição, transporte, alojamento, prémios de assiduidade e
produtividade e abonos para falhas. Sendo que, na opinião desta autora devem apenas ser
incluídos no subsídio de férias a primeira categoria de prestações complementares e não a
segunda, chamando a atenção que, para efeitos de inclusão no subsídio de férias, sempre será
necessário o cumprimento do requisito geral de qualquer prestação remuneratória, que é o da
natureza retributiva da prestação em causa, nos termos do art. 258.º do CT, exigindo o
cumprimento de três requisitos: periodicidade ou regularidade; contrapartida do trabalho
prestado e constituir um direito do trabalhador, sendo que na dúvida prevalece a presunção
retributiva do n.º 3 do referido preceito legal.

Acresce que a jurisprudência também não abraça um entendimento unânime no que


concerne a esta matéria, sobretudo no que respeita às comissões, sendo certo que é
entendimento generalizado que a retribuição de férias não tem uma cabal correspondência com
a retribuição auferida pelo trabalhador em serviço efetivo e, por conseguinte, o entendimento
tem sido o de excluir as prestações que são conferidas ao trabalhador como forma de

177
Costa, Jorge, in “A retribuição e outras prestações patrimoniais no Código do Trabalho (reflexão e perplexidade à volta de um direito
fundamental) ”, A reforma do Código do Trabalho, Coimbra E., 2004, pág. 387.
178
Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 595.

93
compensação das despesas realizadas por este não se encontrar no seu domicílio, ou por
despesas de deslocação no exercício das suas funções de trabalho. Em suma, são excluídas as
atribuições que visam compensar aquelas circunstâncias que não se verificam em tempo de
férias, concretamente, o subsídio de alimentação e transporte.

Assim, por exemplo o Supremo Tribunal de Justiça 179 exclui o subsídio de alimentação e
concretiza dizendo que, o referido subsídio “embora assuma, na maior parte dos casos,
natureza regular e periódica, só é considerado retribuição na parte que exceder os montantes
normalmente pagos a esse título. E isto porque, não obstante assumir as apontadas
características, não consubstancia uma contrapartida específica da prestação laboral por banda
do trabalhador (ao contrário das componentes com natureza retributiva), mas antes uma
compensação decorrente do contrato de trabalho. […] dir-se-á, em acréscimo, que o facto das
prestações periódica e regularmente percebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o
conceito de retribuição não significa que linearmente tenham de ser levadas em conta para
efeitos de cálculo das prestações cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição,
como, por exemplo, acontece com a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. A
retribuição a atender, para esse efeito, não é a retribuição global, mas sim a chamada
retribuição modular ou padrão, da qual devem ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento
não é justificado pela prestação de trabalho em si mesma, mas por outra específica motivação.
O subsídio de alimentação não integra a dita retribuição modular, pois destina-se a cobrir ou
minorar as despesas que o trabalhador tem de suportar por ter de tomar as suas refeições fora
de casa, não sendo de o computar no cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e
de Natal”.

Igualmente, no que ao subsídio de transporte diz respeito, o Supremo Tribunal de


Justiça180, citando acórdão do mesmo Tribunal de 30 de março de 2006 (Revista n.º 8/2006 da
4.ª Secção) explica que devem excluir-se do cômputo da retribuição de férias e subsídio de férias
“as prestações que são atribuídas ao trabalhador, não para retribuir o trabalho no
condicionalismo em que é prestado, mas para o compensar de despesas que se presume que
tenha que realizar por não se encontrar no seu domicílio, ou por ter que se deslocar deste e para
este para executar o contrato de trabalho. É o que sucede com o subsídio de refeição, o subsídio

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º 467/06.3TTCBR. C1.S1, disponível no website
179

www.dgsi.pt.
180
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de abril de 2007, Processo n.º 06S4557, disponível no website www.dgsi.pt.

94
especial de refeição, o subsídio de pequeno-almoço e o subsídio de transporte pessoal, que
estão em correlação estrita com o tempo de trabalho efectivo” […] Estes subsídios visam cobrir
ou minorar as despesas que o trabalhador tem que suportar com a aquisição de almoço e
pequeno-almoço, fora do seu domicílio por virtude da prestação de trabalho e com o transporte
do domicílio de e para o local de trabalho. Destinam-se, pois, a fazer face a despesas concretas
que o trabalhador presumivelmente tem que efectuar para executar o contrato, para “ir
trabalhar”, não constituindo um ganho acrescido para o mesmo, uma mais-valia resultante da
sua prestação laboral, razão pela qual não se justifica a sua inclusão na retribuição de férias e
no respectivo subsídio”.

Todavia, quanto às atribuições de trabalho suplementar e de trabalho noturno, de


subsídio de compensação de horário incómodo, subsídio de abono de viagem, subsídio de
compensação por horário descontínuo, etc., tem-se entendido que se tratam prestações pagas
pela prestação de trabalho, e que, “independentemente de estarem ou não sujeitas ao princípio
da irredutibilidade, ou seja, de ser admissível que o seu pagamento cesse por deixarem de
ocorrer as particulares condições de prestação do trabalho que as justificam, devem ser
consideradas para o efeito de retribuição das férias e do respectivo subsídio, […] enquanto se
mantiver a situação que justifica tais pagamentos, sob pena de violação do princípio da não
penalização remuneratória do trabalhador em virtude do gozo das férias”.

Relativamente às prestações concedidas a título de trabalho noturno, muito


especificamente na circunstância de “trabalho prestado durante a noite excedesse as 30 horas
mensais” (sublinhado nosso) […] trabalho nocturno prestado para além das 30 horas mensais,
desenvolvido pelo trabalhador sujeito ao regime de turnos e que mais não visa senão compensá-
lo pela maior penosidade que representa laborar durante a noite, quando o número de horas por
mês ultrapasse as 30 horas de trabalho entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia
seguinte”, o Supremo Tribunal de Justiça sustentou em acórdão datado de 24 de outubro de
2012181, que, basta faltar requisito da contrapartida do trabalho que o conceito de retribuição
exige e pressupõe, independentemente da sua regularidade e periodicidade, para que
determinada atribuição patrimonial não seja suscetível de partilhar daquela natureza, in casu, “o
abono em causa tem uma causa determinante diversa da prestação da actividade pelo
trabalhador, ou da sua disponibilidade para o trabalho, não devendo os valores auferidos a esse

181
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de outubro de 2012, Processo n.º 73/08.8TTLSB.S1, disponível no website www.dgsi.pt.

95
título integrar o cálculo da retribuição de férias e respectivo subsídio”, dando, assim, este
tribunal relevância ao critério defendido por alguns autores que, para que uma atribuição
patrimonial integre a retribuição para efeitos de retribuição de férias, é necessário que a mesma
seja conferida no âmbito da efetiva prestação do serviço e portanto, só nesses casos seria
legitimamente expectável que as mesmas integrassem a retribuição para efeito de férias.

A propósito das prestações concedidas, por exemplo, a título de subsídio de assiduidade


– mormente prémios, diz o mesmo tribunal, em acórdão datado de 5 de junho de 2012 182 ,
citando acórdão do Supremo Tribunal, de 18 de janeiro de 2012, processo n.º
1947/08.1TTLSB.L1.S1, da 4.ª Secção, adota o entendimento de que “revestindo-se de
natureza notoriamente aleatória e ocasional, não pode, pois, integrar no conceito legal de
retribuição. Porém, mesmo que devesse integrar tal conceito não tinha, sem mais, como
consequência que fosse devido nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, já que nem todas
as remunerações acessórias são devidas naquelas situações”.

Outro fator que este tribunal sublinha como sendo determinante para aferir da
integração ou não de certas prestações no conceito de retribuição para efeitos de retribuição de
férias é o critério com fundamento na regularidade e periodicidade durante onze meses do ano,
conforme explica este coletivo, “estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais
devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,
o respectivo subsídio e o subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro para sustentar a
aludida expectativa, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência
mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem
correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável
(artigos 84.º, n.º 2, da LCT e 252.º, n.º 2, do Código do Trabalho de 2003), e, assim,
considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de
retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorre todos os
meses de actividade do ano”.

No que tange às comissões de vendas a bordo dos trabalhadores na TAP e enquanto


modalidade de retribuição variável, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 2 de

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2012, Processo n.º 2131/08.0TTLSB.L1.S1, disponível no website
182

www.dgsi.pt.

96
abril de 2014 183 , entende que as mesmas têm natureza retributiva, configurando-se como
contrapartida do modo específico de execução do trabalho, devendo integrar-se na retribuição de
férias dos anos a que respeitam e dos subsídios de férias e de Natal, e ainda quanto à
regularidade e periodicidade e da repercussão que estas importam na expectativa de ganho do
trabalhador, neste acórdão, à semelhança de outros do mesmo tribunal, entende-se que o
critério seguro para fundamentar a expectativa de ganho do trabalhador, com base na
regularidade e periodicidade, tem por base uma “cadência mensal”, “independentemente da
variação dos valores recebidos”, recorrendo ao critério estabelecido para o cálculo da retribuição
variável, nos termos dos nos. 3 e 4 do art. 261.º do CT, considerando assim como regular e
periódica, integrante do conceito de retribuição para o pagamento de retribuição de férias, as
prestações conferidas durante onze meses do ano.

Em sentido contrário, um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 184 entende que


“numa primeira aproximação à nova fórmula adoptada pelo CT para o cálculo do subsídio de
férias, parece-nos que ela comporta uma opção, de entre os diferentes nexos de
correspectividade que caracterizam as várias componentes da retribuição, por aqueles que se
referem à própria prestação do trabalho, isto é, às específicas contingências que o rodeiam, ou,
dizendo de outro modo, ao seu condicionalismo externo (penosidade, isolamento, trabalho
nocturno, turnos rotativos), em detrimento daqueles que pressuponham a efectiva prestação da
actividade, quer respeitem ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (prémios, gratificações,
comissões), quer consistam na assunção pelo empregador de despesas em que incorreria o
trabalhador por causa da prestação do trabalho (subsídios de refeição e de transporte). Em
relação a certas prestações retributivas, como o subsídio de turno, o acréscimo devido pelo
trabalho nocturno, o subsídio de risco ou de isolamento, podemos afirmar, com alguma
segurança que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho. Já o mesmo não
parece suceder com as comissões, os prémios e as gratificações”.

183
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de abril de 2014, Processo n.º 2911/08.6TTLSB.L1.S1, disponível no website www.dgsi.pt.
184
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de março de 2009, Processo n.º 2195/05.8TTLSB-4, disponível no website www.dgsi.pt.

97
98
9. Subsídio de Natal

O subsídio de Natal vem previsto no art. 263.º do CT. Inicialmente terá sido consagrado,
apenas por via de lei aos trabalhadores da Administração Pública em regime de emprego público
e aos trabalhadores com contrato de serviço doméstico 185
. Para a generalidade dos
trabalhadores, este direito foi instituído através da contratação coletiva e só com o Decreto-Lei
n.º 88/96, de 3 de julho, é que foi instituída para a maioria dos trabalhadores, embora em
regime supletivo, sendo que mediante acordo entre as partes podiam existir disposições diversas
nesta matéria.

O legislador laboral, através do subsídio de Natal, quis conceder ao trabalhador uma


maior disponibilidade financeira na quadra natalícia, através do pagamento de uma prestação
pecuniária, para aquele fazer face ao acréscimo de despesas características desta época do ano.

Conforme descrito no art. 263.º do CT, o subsídio de Natal configura uma prestação
retributiva, que se vence anualmente, e deve ser paga até ao dia 15 do mês de dezembro, e o
montante equivale a um mês de retribuição, mas poderá ser superior se acordado mediante
convenção coletiva ou por contrato individual, nos termos do art. 3.º do CT.

A regra geral é a de que o subsídio de Natal é atribuído por inteiro, mas pode, em
circunstâncias específicas, sofrer de algumas “supressões”. Como explica LEAL AMADO 186 ,
caracteriza-se por ser uma “prestação retributiva de formação progressiva ao longo do ano civil,
num salário diferido que se vai sedimentando gradualmente”. Ou seja, o n.º 2 do art. 263.º
prevê que o subsídio de Natal é pago de forma proporcional aos serviços prestado em cada ano
civil, no ano de admissão do trabalhador, no ano de cessação do contrato e em caso de
suspensão do contrato por facto respeitante ao trabalhador. Nesta última hipótese, o legislador
ressalvou os casos em que a suspensão por facto respeitante ao empregador 187 , em que a
suspensão não altera suprime o direito ao subsídio de Natal por inteiro do trabalhador.

Ora, é a propósito do valor do subsídio de Natal que surgem as dúvidas sobre esta
matéria. Discutia-se se este valor dizia respeito se o valor referido no art. 263.º a título de
subsídio de Natal, será o previsto no art. 258.º do mesmo diploma, incluindo todos os elementos

185
Leite, Jorge in “Observatório Legislativo”, Questões Laborais, Ano III - n.º 8, 1996, Coimbra E., pág. 214.
186
Amado, João Leal in “Comissões...”, pág. 236, nota de rodapé n.º 10; e o mesmo autor in “Contrato...”, pág. 304, em nota n.º 438.
187
Insolvência e Recuperação da empresa, art. 347.º; encerramento temporário do estabelecimento por caso fortuito ou força maior, art. 350.º;
encerramento temporário do estabelecimento por facto imputável ao empregador, art. 351.º, todos do CT.

99
descritos nesse preceito ou se diz respeito ao valor que o empregador paga, de forma regular e
periódica, por cada mês de trabalho, é uma questão bastante complexas, sobretudo nos casos
em que a retribuição auferida pelo trabalhador tem uma parte variável.

Na verdade, esta matéria com a entrada em vigor do CT/2003 encontrou um


entendimento maioritário pacífico. Com a consagração do art. 262.º do CT com “um campo de
aplicação potencial bastante dilatado” 188 , veio dissipar a maior parte das questões levantadas
sobre esta matéria.

Segundo ROMANO MARTINEZ189, o subsídio de Natal configura um “complemento salarial


certo” e deve atender-se à regra contida no art. 262.º do CT, que só abrange a retribuição base
e as diuturnidades 190 para aferir do montante devido a título de subsídio de Natal, ficando,
portanto, excluídos todos os complementos salariais que o trabalhador aufere, nos termos do art.
263.º do CT, ainda que tenham caráter retributivo, ressalvando-se apenas os casos em que as
partes disponham em sentido oposto191.

Com entendimento semelhante, MONTEIRO FERNANDES 192 diz que o “subsídio é uma
prestação complementar porque não tem correspectividade directa com certa quantidade de
trabalho”, pelo que o art. 262.º do CT configura um regime supletivo que deve ser seguido, que
indica que a base de cálculo será composta pela retribuição base e diuturnidades193.

É entendimento de BERNARDO LOBO XAVIER194 que o legislador laboral, com a consagração


legal do subsídio de Natal e embora não o dizendo expressamente, quis referir-se apenas à
obrigatoriedade de pagamento da retribuição certa seguindo, assim, o princípio geral do art.
262.º do CT, que refere que a “base de cálculo para as prestações complementares e
acessórias – entre as quais o subsídio de Natal – é constituída apenas pela retribuição base e

188
Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 304.
189
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 556 e segs.
190
A maioria da doutrina partilha desta opinião, por exemplo, Joana Vasconcelos, Código do Trabalho Anotado de Pedro Romano Martinez e
outros, anotação ao art. 263.º por, 8ª edição, outubro de 2009, Almedina, pág. 629; Manuel Ferreira da Costa, op. cit., pág. 402 e 403.
191
No mesmo sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho in “Tratado...”, pág. 594.
192
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.406.
193
Com o mesmo entendimento, LEAL AMADO in “Comissões...”, pág. 237 e 238.
194
Xavier, Bernardo da Gama Lobo, “Manual...”, pág. 552.

100
diuturnidades”, ressalvando os casos previstos na lei com soluções diversas ou acordados entre
as partes mediante convenção coletiva ou contrato de trabalho195.

Ao contrário da maioria da doutrina, JORGE LEITE196 defendia que o que se entende por
“um mês de retribuição” deve ser “o montante equivalente ao que recebe o trabalhador em
cada um dos 12 meses do ano, tudo se passando como se a 12.º se seguisse um 13.º mês,
recebendo neste o que lhe é pago naquele. Porém, quando tenha havido oscilações ao longo do
mesmo ano civil, o montante do subsídio deve corresponder à média das retribuições dos
diferentes meses”, sendo que para este autor esta configuraria a “solução mais equilibrada e
mais conforme com o princípio da tendencial proporcionalidade que se desprende do disposto
no n.º 2 do art. 2.º” do Decreto-Lei n.º 88/96.

Entendendo-se em discórdia com a maioria da doutrina mas admitindo que contrariar o


entendimento predominante será inócuo, JÚLIO GOMES197 questiona a própria natureza acessória
ou complementar da prestação patrimonial concedida a título de subsídio de Natal, entendendo
que hoje já não deve ser este o entendimento quanto à natureza daquela prestação.

Este autor explica, questionando que, muito embora o subsídio de Natal tenha a fonte na
contratação coletiva e uma vez que esta prestação é hoje obrigatória, por força da lei, se não
será hoje “retribuição normal para todos os efeitos, sucedendo apenas que o montante
retributivo global recebido por um trabalhador já não é hoje dividido por 12 prestações mensais”.
E vai mais longe, dizendo que, apesar de reconhecer a existência de indícios na lei em sentido
oposto, exemplificando com a forma de cálculo da retribuição horária, na qual a retribuição
mensal é multiplicada por 12 (art. 271.º do CT), questiona se não haverá um “anacronismo
resultante de não se ter considerado a obrigatoriedade legal do pagamento do subsídio de
Natal”, continuando a afirmar que, ainda que se considere que o subsídio de Natal é uma
prestação complementar ou acessória, sempre se poderá dizer que o art. 262.º do CT não
estabelece que “onde a lei diz retribuição se deve ler retribuição base e diuturnidades”, e a
interpretação do art. 263.º respeitante ao subsídio de Natal pode ser a de estabelecer o
contrário, “uma vez que diz expressamente que o trabalhador tem direito a um subsídio de Natal
de valor igual a um mês de retribuição".

195
No mesmo sentido, Jorge Costa, op. cit., pág. 402 e 403; António Nunes Carvalho, op. cit., pág. 86.
196
Leite, Jorge in “Observatório...”, pág. 215.
197
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 779.

101
A jurisprudência relativamente ao conteúdo do subsídio de Natal, até à entrada em vigor
do CT/2003, era pacífica e considerava que “ao prever que os trabalhadores têm direito a
subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, pelo seu teor literal e tendo ainda em
consideração a unidade do sistema jurídico, pretendeu assegurar que o subsídio de Natal fosse,
em todos os casos, de valor igual a um mês de retribuição, apontando no sentido de que, para
efeito do pagamento do subsídio de Natal, devia também atender-se a todas as prestações
retributivas que fossem contrapartida da execução do trabalho198. Ou seja, “os subsídios de Natal
vencidos antes da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003 podiam ter um valor distinto
daquele que tiveram, ou deveriam ter, posteriormente à entrada em vigor daquele diploma,
incluindo remuneração base e todos os suplementos ou complementos remuneratórios que
fossem retribuição, os quais eram calculados de acordo com os valores médios recebidos, nos
termos previstos no n.º 1 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 88/96, de 3 de julho, e dos n.os 2 dos
arts. 82.º e 84.º da LCT”199.

Em consequência da entrada em vigor do CT/2003, com as alterações que até hoje


foram feitas, é entendimento generalizado que não devem ser tidas em consideração as
atribuições patrimoniais que pressupõem a efetiva prestação do trabalho e que visam, tão-
somente, compensar o trabalhador das despesas que realiza pela efetiva execução das suas
funções, como sejam o subsídio de refeição e transporte. Por outro lado, não entram também
para o cálculo do quantum devido por subsídio de Natal as prestações que sejam contrapartida
do modo específico da execução do trabalho, como sejam os complementos salariais a título de
subsídio de turnos, trabalho noturno, etc., ainda que estes sejam concedidos de forma regular e
periódica. Desta feita, o valor do subsídio de Natal é balizado pelo legislador, nos termos do art.
262.º do CT, aferindo-se pelo montante da retribuição base e diuturnidades, salvo quando por
disposição legal, cláusula contratual ou mediante instrumentos de regulamentação coletiva
aplicável ao caso em concreto haja disposição em sentido oposto.

É também nosso entendimento que, traduzindo-se o subsídio de Natal numa prestação


complementar, acompanhando o juízo de MONTEIRO FERNANDES referido supra, aplicar-se-á ao
subsídio de Natal o disposto no art. 262.º n.º 1 do CT que diz que “a base de cálculo da
prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades”,

Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2010, Processo n.º 2065/07.5TTLSB.L1.S1, disponível no website
198

www.dgsi.pt.
199
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., em anotação ao art. 263.º.

102
ressalvado os casos de disposição legal, convencional ou contratual que disponham em sentido
oposto, conferindo assim a esta norma uma natureza supletiva.

Em suma, o art. 263.º do CT dispõe que o subsídio de Natal é de “valor igual a um mês
de retribuição”, e em consequência do subsídio de Natal configurar uma prestação
complementar, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, o seu quantum
há-de equivaler à soma da retribuição base e das diuturnidades, uma vez que, manifestamente,
na aferição do montante das prestações complementares e acessórios, o legislador quis afastar
expressamente as restantes prestações recebidas pelo trabalhador, independentemente do seu
caráter regular e periódico, afastando nesta norma o princípio da omnicompreensibilidade200, que
diz que a retribuição compreende todas as prestações que tenham nexo de causalidade com o
contrato de trabalho.

200
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., em anotação ao art. 262.º.

103
104
10. O Ónus da Prova – Presunção de Laboralidade

De acordo com o art. 342.º, n.º 1 do CCivil, aquele que invoca um direito tem o ónus de
fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado. Esta é a norma civil geral no que
concerne ao ónus da prova. E se se aplicasse esta norma ao regime laboral, em matéria de
retribuição, sempre que o trabalhador alegasse que determinada prestação que lhe foi atribuída
pelo empregador, ser uma prestação retributiva teria de provar que auferiu ou tinha direito a
receber certas prestações do empregador e que as mesmas integravam o conceito de
retribuição, por cumprirem os elementos constitutivos da retribuição.

No entanto, o legislador laboral, ciente da dificuldade agravada de tal prova pelo


trabalhador, estabeleceu no n.º 3 do art. 258.º do CT em matéria de retribuição, uma
presunção, geralmente em benefício do trabalhador, de que se presume retribuição “toda e
qualquer prestação do empregador ao trabalhador”. Como referimos supra aquando das
considerações feitas acerca da referida presunção, esta é uma presunção iuris tantum, ou seja,
ilidível.

Ora, nos termos do art. 350.º, n.º1 do CCivil, “quem tem a seu favor esta presunção
escusa de provar o facto a que ela conduz” o que significa que, a existência da presunção do art.
258.º, n.º 3 do CT leva a uma inversão do ónus da prova 201 . Assim, muito embora os
pressupostos da retribuição constituírem factos constitutivos para a alegação e invocação do
direito do trabalhador, e nos termos gerais do direito civil, o trabalhador dever provar a existência
dos mesmos, este beneficia da presunção consagrada no CT, invertendo assim o ónus da prova,
e fazendo com que seja o empregador que tenha o encargo de demonstrar a existência dos
elementos integrantes do conceito de retribuição, ou seja, o caráter regular e periódico e a
correspetividade da prestação.

Na verdade, não basta ao trabalhador alegar a presunção, o mesmo tem de demonstrar


que recebeu as invocadas prestações pecuniárias, não tendo no entanto de provar que as
mesmas são contrapartida do seu trabalho.

A dificuldade relativa a este regime é a conciliação da presunção do art. 258.º, n.º 3 do


CT com as exclusões legais previstas no art. 260.º, n.º 1 do mesmo diploma legal. Como vimos,

201
Cf. art. 344 do CCivil - Inversão do Ónus da Prova.

105
incumbe ao empregador, nos termos dos arts. 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do CCivil, provar que
as prestações atribuídas ao trabalhador revestem a natureza de ajudas de custo, ou abono de
viagem (etc.), que têm causa individualizada e específica, aproveitando assim a consagração
prevista no art. 260.º, n.º 1 do CT, ilidindo dessa forma a presunção de existência de uma
prestação retributiva, muito embora este entendimento seja discutido no seio da jurisprudência
nacional.

Por um lado, o Supremo Tribunal de Justiça, com o entendimento de que é ao autor que
cabe o ónus da prova de que as prestações atribuídas a título de despesas de transporte, ajudas
de custo, etc., não constituem prestações retributivas, dispõe em acórdão datado de 18 de junho
de 2008, o seguinte: “No caso vertente, os termos em que se expressou a decisão da matéria
de facto (e respectiva fundamentação) permitem afirmar, como se afirmou no acórdão
impugnado, que, apesar de não concretizados os custos suportados pelo Autor para a execução
do contrato, a(s) importância(s) que lhe eram pagas “a título de ajudas de custo” tinham
fundamento específico diverso da prestação do trabalho, ou, mais rigorosamente, da
disponibilidade de prestar o trabalho, a que corresponde a retribuição” 202.

Por outro lado, com um entendimento diferente, a Relação do Porto em acórdão de 18


de fevereiro de 2013203, em jeito de resumo, refere que “O “Ab. Kms”, pago de 1995 a 1998, a
que se reporta a clª 155ª do AE aplicável aos C… publicado no BTE nº 24/1081,e o “Abono de
viagem/Mar” a que se reporta, posteriormente, a clª 147.º do AE aplicável aos C… previsto no
BTE 21/1996, bem como nos AE posteriores, ainda que pago regularmente, não constitui
retribuição, competindo ao trabalhador, pelo menos, a alegação de que tais abanos não visam a
compensação a que se reportas as citadas clªs ou outras despesas decorrentes de viagens e/ou,
bem assim, que o pagamento excede o montante das despesas que o pagamento do referido
abono visa compensar”, esclarecendo na fundamentação do referido acórdão que “importa
também referir que, mesmo que se considerasse, por via da presunção legal decorrente dos
arts. 82.º, nº 3, da LCT, 249.º, nº 3, do CT/2003 e 258.º, nº 3, do CT/2009, que caberá ao
empregador o ónus da prova de que determinada prestação paga ao trabalhador não constitui,
face do disposto nos arts. 87.º da LCT e 260.º do CT/2003 e do CT/2009, retribuição, sempre
incumbirá ao Autor/trabalhador, pelo menos, impugnar a natureza compensatória de prestação

202
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de junho de 2008, Processo n.º 07SS4480, disponível no website www.dgsi.pt.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de fevereiro de 2013, Processo n.º 573/10.0TTSTS.P1, disponível no website
203

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106
que lhe haja sido paga a algum dos títulos previstos nestes últimos preceitos, sendo certo que a
ele cabe a definição do objeto e termos do litigio através da formulação do pedido e da indicação
da respetiva causa de pedir. Assim, e tendo presente o caso em apreço, se ao trabalhador é
paga determinada prestação a título de abonos de viagem (suscetível de se enquadrar no
disposto nos citados arts. 87.º da LCT e 260.º do CT de 2003 e de 2009), caber-lhe-á, caso
pretenda discutir a veracidade do título/designação ao abrigo do qual o pagamento foi feito, pelo
menos invocá-lo, delimitando o objeto da causa que pretende ver discutido”(sublinhados
nossos).

Logo se percebe que a questão do ónus da prova não é tão linear quanto a doutrina
parece entender.

Em primeiro lugar, sempre se deverá questionar se a norma legal que estabelece a


presunção de que todas as atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador
constituem retribuição, salvo prova em contrário – invertendo assim o ónus da prova (de certa
forma desfavorecendo o empregador), prevalece sobre a norma legal que expressamente
consagra quais as prestações que devem ser excluídas (ou incluídas) na retribuição.

Salvo melhor parecer, e tendo sobretudo em conta a sistematização do CT, é defensável


que o legislador quando consagrou as exclusões legais do conceito de retribuição, em artigo
posterior à previsão da presunção retributiva, fê-lo com a intenção de amenizar a prova a ser
produzida pelo empregador, pelo menos, quanto à não integração daquelas prestações no
montante retributivo.

Ademais, conforme explica o Tribunal da Relação de Lisboa204 a propósito da inversão do


ónus da prova e da presunção de laboralidade, “esta presunção legal em matéria de retribuição
não tem, em si mesma, uma função qualificativa adicional das prestações do empregador ao
trabalhador, nem confere um valor qualificativo autónomo ou superior a nenhum dos elementos
do conceito de retribuição que atrás enunciámos. Assim, por exemplo, não basta a verificação da
regularidade e da periodicidade (ou melhor, o seu não afastamento pelo empregador, por força
da presunção legal) para que as prestações sejam qualificadas como retributivas, para os
devidos efeitos legais. A regularidade e a periodicidade com que são atribuídas as prestações

Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website
204

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107
são apenas um dos vários elementos integradores do conceito de retribuição, não tendo
qualquer apoio na lei a ideia de que tem um valor autónomo e suficiente”.

108
11. Prescrição – Implicações no Pagamento da Retribuição

11.1 A Prescrição no Código Civil Vigente - Resenha

Uma questão de especial relevo, que é comummente discutida dos tribunais


portugueses, é a dúvida se poderão ser exigidos créditos emergentes do contrato de trabalho,
vencidos há mais de vinte anos, ou se pode o trabalhador legitimamente demandar o
empregador para pagamento de uma indemnização, por ilícito laboral sofrido há mais de trinta
anos.

Na verdade, no que à matéria da prescrição dos créditos laborais diz respeito, a doutrina
tem tido um entendimento grosso modo pacífico.

Apesar de para um melhor entendimento acerca deste tópico ser sempre necessário
fazer uma revisão à evolução legislativa, no que concerne ao regime da prescrição dos créditos
laborais, em primeiro lugar cumpre sintetizar o regime geral da prescrição consagrado no Código
Civil.

Por conseguinte, o CCivil vigente, no capítulo III do subtítulo III da Parte Geral, dedica-se
ao “tempo e sua repercussão nas relações jurídicas”, regulando na secção II o instituto da
prescrição.

Como explica CARVALHO FERNANDES 205 , o CCivil de 1867 206 referia que “a prescrição
extintiva referia-se, em termos gerais, o fenómeno de extinção de um direito e,
correspondentemente, de uma obrigação, pelo seu não exercício, durante certo tempo;
reservava-se a expressão prescrição aquisitiva – ou usucapião – para referir o fenómeno de
aquisição de um direito real por efeito da manutenção da respectiva posse, verificados certos
atributos da mesma, durante certo período de tempo”. O referido autor continua dizendo que
nos dias de hoje, “o Código Civil actual reserva a palavras prescrição sem mais qualificativos,
para referir o primeiro instituto (arts. 300.º e 327.º) e recorre, para a chamada prescrição
aquisitiva, ao termo clássico de usucapião”.

205
Fernandes, Carvalho in “Teoria Geral do Direito Civil II”, 5ª edição revista e atualizada, E. Universidade Católica, Lisboa, 2010, pág. 686.
206
O CCivil de 1867, previa no seu art. 505.º o conceito de prescrição, diferenciando entre a prescrição positiva e negativa ou extintiva. No CCivil
em vigor, a chamada “prescrição negativa ou extintiva” diz respeito à prescrição, por outro lado, “a prescrição positiva” diz respeito à figura da
usucapião, prevista e regulada no Livro II do CCivil atual.

109
Assim, a prescrição é regulada pelos arts. 298.º, n.º 1, 300.º a 327.º do CCivil e, nos
termos do n.º 1 do art. 304.º do referido diploma, “tem o beneficiário a faculdade de recusar o
cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito”,
ou seja, “apenas acontece que o direito de exigir (obrigação civil) fica reduzido a um direito de
pretender (obrigação natural) ”207.

Com respeito à definição do conceito de prescrição, o art. 298.º, n.º 1 do CCivil vem
assinalar os seus fatores distintivos, a saber: o não exercício do direito devido a inércia do seu
título; durante um hiato de tempo considerável; os direitos não sejam indisponíveis ou a lei os
não declare isentos de prescrição. Ora, a legislação não consagra assim uma noção legal desta
figura.

MENEZES LEITÃO208 indica que a prescrição configura uma exceção perentória, sendo que
paralisa em definitivo o direito do credor, que deixa de poder exigir o seu cumprimento, estando
nas mãos do devedor a realização da obrigação de forma voluntária, sendo que a mesma não
pode ser repetida nos termos no n.º 2 do art. 304.º do CCivil. Para este autor, ao contrário da
maioria da doutrina209, a prescrição deve ser incluída nas causas de extinção das obrigações.

O legislador, através do instituto da prescrição permite que o devedor se oponha ao


exercício de um direito, cujo titular não invocou nem dele fez uso durante um lapso temporal
previsto na lei, por razões de segurança e paz social. De certa forma compreende-se que a
inércia do credor crie no devedor uma legítima expectativa do não desejo do exercício do direito,
que deve também ser protegida, por razões de estabilidade e confiança jurídica. Está em causa
o conflito entre a “justiça” e a “certeza ou segurança” das relações jurídicas210.

Para que o devedor possa fazer vale a prescrição, para que esta seja eficaz, precisa de
ser invocada, nos termos do n.º 1 do art. 303.º do CCivil, pelo que o tribunal não a pode
oficiosamente suprir, só a podendo considerar quando a mesma for invocada a título de exceção
perentória211.

Hörster, Heinrich Ewald in “A Parte Geral do Código Civil Português – Teoria Geral do Direito Civil”, 4ª reimpressão da ed. De 1992, março de
207

2007, Almedina, pág. 214.


208
Leitão, Menezes in “Direito das Obrigações”, Vol. II, 2001, 8ª edição, pág. 119.
209
Entre outros, Cf. Fernandes, Carvalho, op. cit., pág. 692.
210
Fernandes, Carvalho, op. cit., pág. 687
211
Cf. n.º 1 e n.º 3 do art. 576.º e art. 579.º do CPC.

110
O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art. 309.º). No entanto, a lei prescreve
prazos inferiores ao prazo ordinário nos arts. 310.º, 316.º e 317.º, todos do CCivil.

Conforme acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 212 de 13 de outubro de 2010, o


fundamento da prescrição é a inércia do respetivo titular, que ou significa a renúncia ao seu
direito ou, de qualquer maneira, o torna indigno de proteção jurídica213.

No que concerne à retribuição, tem aplicação a al. g) do art. 310.º do CCivil, que fica
que as prestações “periodicamente renováveis” prescrevem no prazo de cinco anos.

Nos termos do art. 306.º do CCivil, o prazo de prescrição começa a correr desde a data
em que o direito em causa possa ser exercido, com a ressalva de que, se o beneficiário da
prescrição só se encontrar vinculado ao seu cumprimento depois de decorrido um certo hiato
temporal, só após o termo desse prazo se inicia a contagem da prescrição.

O prazo de prescrição é contínuo, salvo ocorrência de causas de suspensão (arts. 318.º


a 322.º do CCivil) ou interrupção (arts. 323.º a 327.º do CCivil).

A suspensão do prazo de prescrição implica que esta não corra enquanto a causa que a
suspende se mantiver, sendo que quando a causa de suspensão cessar, o prazo retoma a sua
contagem, ou seja, as causas de suspensão da prescrição “adormecem” a prescrição.

Como explica LEAL AMADO214, “fala-se em suspensão do curso quando ela impede o início
ou o curso da prescrição (que a prescrição comece a correr ou que prossiga) e em suspensão do
termo quando ela impede que o tempo da prescrição se complete”.

Por outro lado, a interrupção do prazo de prescrição tem como consequência a


inutilização do prazo já decorrido, ou seja, cessando a causa de interrupção, dá-se início a uma
nova contagem de um prazo integral a partir do ato interruptivo.

Em suma, e nas palavras do Supremo Tribunal de Justiça215, “em regra todos os direitos
estão sujeitos a prescrição, o que vale por dizer que o não exercício do direito por parte do titular
e no prazo fixado pela lei, conduz à prescrição. Excetuam-se os direitos indisponíveis e os

212
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º 76/10.2YFLSB, disponível no website www.dgsi.pt.
213
Esta posição era bem traduzida no velho adágio “dormientibus non socurrit ius”.
214
Amado, João Leal in “A prescrição dos Créditos Laborais (Nótula sobre o art. 381.º do Código do Trabalho”, Prontuário do Direito do Trabalho
– 71, pág. 68.
215
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º 76/10.2YFLSB, disponível no website www.dgsi.pt.

111
direitos que a lei declare isentos de prescrição (art.º 298.º 1, do CC). A prescrição tem por fonte
um facto, o decurso do tempo. E, verifica-se quando nesse período temporal definido pela lei o
titular do direito não o exerce. A prescrição é determinada no interesse do devedor ou sujeito
passivo da relação jurídica, e supõe a negligência ou inércia do titular do direito, o que inculca a
sua renúncia e o torna por isso, indigno de proteção jurídica”.

11.2. A Prescrição no Código do Trabalho – Evolução Legislativa


Nacional

A Lei n.º 1952, de 10 de março de 1937, previa no seu art. 25.º que “a prescrição dos
ordenados e salários e das remunerações e indemnizações […] devidos a empregados ou
assalariados despedidos, corre desde o dia seguinte ao da rescisão do contrato de trabalho”216,
ou seja, desde o término da relação laboral, indicando assim o início da contagem do prazo de
prescrição. Até então era aplicável o disposto nos arts. 535.º e 536.º do Código de Seabra, que
por sua vez tinham caráter imperativo.

Como explica MONTEIRO FERNANDES217, o legislador para justificar o início da contagem do


prazo de prescrição após a data da cessação do contrato de trabalho, presumiu que o
trabalhador não teria liberdade psicológica para reclamar o que lhe é devido durante a vigência
do contrato.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, deu-se uma
alteração significativa do teor da lei quanto ao instituto da prescrição dos créditos laborais.
Assim, o art. 38.º previa que “todos os créditos resultantes de trabalho e da sua violação ou
cessação, que pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador, extinguem-se
por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de
trabalho, sem prejuízo do disposto na lei geral acerca dos créditos pelos serviços prestados no
exercício de profissões liberais”.

Sem prejuízo do disposto no art. 26.º do mesmo diploma legal: “Os preceitos desta lei não prejudicam o que estiver ou vier a ser estabelecido
216

em contratos ou acordos colectivos de trabalho e são imediatamente aplicáveis aos contratos vigentes”.
217
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.414.

112
Note-se que há uma alteração significativa no texto da norma no que concerne aos
sujeitos que podem beneficiar da prescrição, aos créditos que podem ser suprimidos por via da
prescrição e um previsão de um prazo para a extinção de créditos por via da prescrição.

Ora, se no diploma precedente o legislador se referia à prescrição “dos ordenados e


salários e das remunerações e indemnizações […] devidos a empregados ou assalariados
despedidos”, à luz do Decreto-Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, vem o legislador prever:
a) créditos resultantes de trabalho e da sua violação ou cessação – já não se referindo apenas
aos créditos relativos à retribuição ou indemnizações devidas; b) pertencentes à entidade
patronal, quer pertencentes ao trabalhador – aditando à lista de sujeitos a “entidade patronal”,
atualmente o empregador; c) extinção no prazo de um ano, a partir do dia seguinte à cessação
do contrato – fixação de um prazo de curta duração para o exercício do direito. Entende-se que o
legislador contemplou os créditos devidos também ao empregador para “salvaguardar uma certa
simetria de posições entre as partes”218 da relação laboral.

Mas cumpre avançar na evolução legislativa no que concerne ao regime jurídico da


prescrição dos créditos laborais.

Com efeito, com a alteração registada pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de novembro
de 1969219, que no seu 38.º artigo estatui: “todos os créditos resultantes do contrato de trabalho
e da sua violação, quer pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador,
extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o
contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na lei geral acerca dos créditos pelos serviços
prestados no exercício de profissões liberais”, o legislador já contemplou os créditos resultantes
do “contrato de trabalho”, diferentemente dos diplomas precedentes que consagravam
“ordenados e salários e das remunerações e indemnizações” e “todos os créditos resultantes de
trabalho e da sua violação ou cessação”. Por outro lado, acolheu a disposição já consagrada na
primeira versão da LCT, incluindo neste preceito os créditos pertencentes ao trabalhador bem
como ao empregador, e a fixação do prazo de um ano para a invocação da prescrição, sob pena
de extinção dos créditos por via da prescrição. Este diploma apenas faz a ressalva, na parte final

218
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 414.
219
Comummente designada LCT.

113
do n.º 1 do seu art. 38.º, aos créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões
liberais, aos quais manda aplicar a lei geral220.

Com a codificação das leis laborais, surge em 2003 do primeiro CT no regime jurídico
português. Este código manteve no seu art. 381.º, n.º 1, na generalidade, a redação dada pela
LCT, quanto à prescrição dos créditos laborais, apenas afastando a disposição da última parte
do n.º 1 do art. 38.º concernente aos créditos pelos serviços prestados no exercício de
profissões liberais e alterando a terminologia de um dos sujeitos da relação laboral, considerada
mais correta, para a referência “empregador”, anteriormente designado por “entidade patronal”.

Outrossim, com a entrava em vigor do CT/ 2009, registou-se uma alteração significativa
do regime da prescrição dos créditos laborais. Desde logo, no que concerne à sistematização, o
CT de 2009 prevê o regime da prescrição na secção V, concretamente no art. 337.º, n.º 1. No
que respeita ao conteúdo literal da norma, o legislador laboral de 2009 consagrou: “o crédito de
empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação
prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de
trabalho”. Consigna-se, essencialmente, a alteração da referência “todos os créditos” para “o
crédito”.

Como refere BERNARDO LOBO XAVIER221, “é claro que se podem sempre extrair algumas
consequências do desaparecimento de ênfases… A verdade é que podia ser dada algum
significado histórico à expressão «todos» na altura da publicação da LCT, porque se simplificou a
discriminação dos créditos, segundo os seus vários títulos e titulares, que constava dos arts. 23.º
e 24.º da L. n.º 1952, artigos aos quais se somava a norma do C. Civ. de Seabra que
estabelecia a prescrição de 6 meses, e sobretudo pelo caso especial de caducidade anual
quanto ao trabalho extraordinário”.

No que à prescrição dos créditos laborais diz respeito, a doutrina tem sido unânime
quanto ao entendimento de que o início da contagem do prazo de prescrição do direito do
trabalhador só se verifica com o terminus do contrato de trabalho, e justifica esta posição com a
presunção de que o trabalhador não está plenamente livre de exercer os seus direitos durante a
vigência da relação laboral. Por outro lado, e de acordo com a ideia de simetria na relação de

220
Cf. art. 317.º do CCivil, que estabelece um prazo de prescrição de dois anos para os créditos resultantes do exercício de profissões liberais.
Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição nas Relações de Trabalho (Uma Questão Polémica) ”, Revista de direito e de estudos sociais,
221

2012 (XXVI da 2ª Série), pág. 15, nota de rodapé n.º 15.

114
trabalho, o benefício de o início da contagem do prazo prescricional só se iniciar após a
cessação do contrato de trabalho também se aplica ao empregador 222 ; em sentido oposto,
BERNARDO LOBO XAVIER223.

Neste estudo não nos propomos a analisar com pormenor o regime especial de prova de
certos créditos previsto no n.º 2 do referido art. 337.º do CT. Assinalemos, porém, que este
normativo indica que os créditos vencidos há mais de cinco anos resultantes de indemnização
por falta do gozo de férias, ou pela aplicação de sanções abusivas e pela realização de trabalho
suplementar só podem ser provados por documento idóneo, embora este não seja o tema que
pretendemos abordar com mais afinco no presente estudo; para mais desenvolvimentos veja-se
BERNARDO LOBO XAVIER 224 , que indica que se deve considerar “um documento escrito que
demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito”.

11.3. A Prescrição dos Créditos Laborais

Na atual regime jurídico o instituto da prescrição dos créditos laborais vem previsto no
art. 337.º, n.º 1 do CT.

Este normativo consagra “uma concepção ampla do conceito de crédito laboral”225, isto
é, são incluídos neste preceito todos os créditos que resultem da celebração, da execução, da
violação e da cessação do contrato de trabalho o que, necessariamente, abarca os créditos
retributivos. O mesmo preceito prevê que o “crédito laboral” prescreve no prazo de um ano a
partir da cessação do seu contrato de trabalho (independentemente do motivo que gerou a
cessação do mesmo226).

A primeira crítica que surge a esta norma jurídica, acompanhando neste ponto LEAL
AMADO227, prende-se com o facto de o legislador laboral dar um tratamento igual, no que concerne

222
Cordeiro, Menezes in “Manual...”, pág. 735.
223
Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 26.
224
Xavier, Bernardo Lobo, in Regime Jurídico do Contrato de Trabalho, Anotado, 2.ª ed., Coimbra, Atlântida E., pág. 103
225
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 4 da anotação ao art. 337.º do CT.
226
Como refere Pedro Romano Martinez, in “Direito...”, pág. 573, “a extinção do vínculo deve entender-se em sentido factual, abrangendo a
hipótese de despedimento ílicito”.
227
Amado, João Leal in “A prescrição...”, pág. 69.

115
à disciplina da prescrição, a todo e qualquer crédito proveniente da relação laboral,
independentemente do titular do crédito ser o trabalhador ou o empregador.

A segunda crítica ao regime jurídico da prescrição dos créditos laborais relaciona-se com
a falta de clareza no que respeita ao início da contagem do prazo prescricional e à aplicação, ou
não, das regras da prescrição consagradas no CCivil.

Impõe-se assim, na ótica dos créditos retributivos, uma abordagem mais profunda a este
tema, uma vez que esta matéria suscita vastas dúvidas e levanta complexas querelas junto dos
tribunais portugueses.

A doutrina e jurisprudência dominantes têm tido o entendimento de que o trabalhador se


encontra numa posição bastante restritiva, de forma a criar no espírito do trabalhador um certo
sentimento de temor em agir contra o empregador por este se encontrar numa circunstância
social e económica alegadamente mais favorável. Por outro lado, a subordinação jurídica do
trabalhador em relação ao empregador, caracterizadora do contrato de trabalho, pode fomentar
algum embaraço para o trabalhador fazer valer os seus direitos. Assim, recorrendo a estes
argumentos é a maioria da doutrina e jurisprudência têm dado o seu parecer no sentido de que
a prescrição não se inicia, nem corre, na pendência da relação laboral.

Assim, para LEAL AMADO228, na vigência do contrato de trabalho existe uma “verdadeira
suspensão do curso da prescrição”, que se fundamenta na “desigualdade das forças em
presença” na relação laboral. Para este autor, a supremacia económica e social do empregador
aliada à subordinação jurídica que caracteriza as relações laborais origina, no trabalhador, um
sentimento de inibição e receio para este último vir reclamar daquele os seus créditos na
vigência do contrato. No entanto, o referido autor critica a curta durabilidade do prazo de um
ano, por entender que a solução mais adequada aos interesses das partes seria a de aplicar aos
créditos laborais um prazo mais dilatado, de cinco anos, conjugado com a suspensão do termo,
segundo o qual a prescrição só se pudesse completar um ano após a cessação contratual.

Em concordância com esta tese MONTEIRO FERNANDES229 indica que presumivelmente, na


pendência da relação laboral, o trabalhador se encontra numa situação de dependência para
exercer plena e livremente os seus direitos. No entanto, entende que o importa para o início da

228
Amado, João Leal in “A prescrição...”, pág. 69.
229
Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.415.

116
contagem do prazo de prescrição o “momento da ruptura da relação de dependência, não o
momento da cessação efectiva do vínculo jurídico” mesmo que o ato tenha posto termo à
relação de trabalhão venha mais tarde a ser declarado inválido.

No mesmo sentido ROMANO MARTINEZ230 também defende que na vigência do contrato de


trabalho subsiste uma suspensão da prescrição.

JÚLIO GOMES231, com entendimento semelhante, recorre à teleologia da norma, dizendo


que o que está em questão é que “as partes não se sintam compelidas a recorrer aos tribunais,
durante a vigência do contrato de trabalho sob pena de perderem os seus direitos, já que o
recurso aos tribunais teria frequentemente sequelas sobre a continuação da relação laboral”.
Neste sentido, vai mais longe e alega este autor que “a prescrição dos créditos laborais não
deveria correr (ou deveria interromper-se) sempre que cessado um contrato de trabalho, as
mesmas partes viessem depois a celebrar um novo contrato de trabalho232” e, no mesmo sentido
pronunciou-se a Relação de Lisboa233.

De forma discordante argumenta BERNARDO LOBO XAVIER234 que não se pode retirar da letra
da lei que não se aplica aos créditos laborais, os prazos prescricionais gerais nem mesmo que
durante a relação laboral a mesma não corra ou fique a prescrição suspensa. Diz o autor que se
assim o legislador o quisesse dizer, expressaria que “a prescrição só se inicia e corre finda a
relação do trabalho”, ou diria o preceito legal que o “crédito emergente de contrato de trabalho
(ou da sua violação ou cessação) só prescreve ou apenas prescreve decorrido um ano a partir da
cessação do contrato”.

BERNARDO LOBO XAVIER explica que o que se pretendeu com a consagração do mesmo
regime prescricional de curto prazo para créditos do trabalhador e do empregador, foi suprimir a
“gritante injustiça”, uma vez que até a referida consagração admitia que os créditos dos
empregadores subsistissem por um longo período de tempo após a cessação da relação laboral,
e os créditos dos trabalhadores prescrevessem no prazo de um ano finda a relação de trabalho.

230
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 572.
231
Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 904 e segs. e o mesmo autor in “Estudos dedicados ao Professor Doutor Luís Alberto Carvalho Fernandes”,
Vol. II, Universidade Católica E., 2011, pág. 353 e segs.
232
Indica que no caso de existência de contratos sucessivos entre as partes, devia produzir o mesmo efeito sobre a prescrição dos créditos
laborais já existentes.
233
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de fevereiro de 2014, Processo n.º 4598/12.2TTLSB.L1-4, em citação do Acórdão de 17
de janeiro de 2007, Processo n.º 7258/2006-4 do mesmo tribunal, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt.
234
Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 16.

117
O autor defende que se deve partir do princípio que a letra da lei nada diz diretamente
sobre a suspensão da prescrição no decurso das relações de trabalho e não aceita os
argumentos sustentados pelos maioria dos intérpretes de que essa seria a vontade subjetiva do
legislador laboral, uma vez que é nesse sentido que vai a interpretação tradicional, constante e
unânime da norma, sem nunca ter sido posta em causa pelas várias redações da mesma; então
deve ser essa a sua interpretação.

Assim, entende que objetivamente são abarcados na letra da lei relativa à prescrição dos
créditos laborais as regras gerais do CCivil relativas ao prazo e da sua contagem, podendo
coexistir com a prescrição de curto prazo do CT235, podendo ser aplicadas a ambas as partes da
relação laboral as regras prescricionais previstas no CCivil e as regras previstas no CT. Para o
mencionado autor nada justifica a inércia das partes por um hiato temporal tão prolongado e o
devedor carece de tutela tendo em conta a inércia do credor, sobretudo porque pode gerar uma
convicção de tolerância ou perdão da sua dívida. Ademais, explica que a exigência inesperada de
créditos somados e com juros pode gerar um colapso económico no devedor. Outrossim a
prescrição de curto prazo prevista no CT tem como fundamento a segurança e certeza jurídica
no acerto de contas e a facilitação da aplicação do regime da compensação, o que não se
harmoniza com a paralisação ocasionada pela suspensão.

Resumindo, este autor propõe uma leitura linear da norma que fixa o regime da
prescrição dos créditos laborais no CT, uma vez que na sua opinião na letra da mesma não há
nada que se oponha à aplicação dos prazos gerais de prescrição previstos no CCivil. Esta
perspetiva assenta na ideia de que o que se retira da leitura da norma jurídica relativa à
prescrição dos créditos laborais não é a pretensão de paralisação durante a vigência da relação
laboral, mas antes a consagração de um novo prazo prescricional (curto) que se aplica
suplementarmente e se conta a partir do dia seguinte à cessação da relação de trabalho,
aplicável aos créditos de ambas as partes da relação laboral.

Defendendo a aplicabilidade das normas gerais do CCivil, DIOGO VAZ MARECOS236 diz que
“não pode deixar de causar desconforto que um trabalhador, volvidos 40 anos sobre um
vencimento de um crédito que não lhe foi pago atempadamente, possa vir reclamá-lo, desde que
a relação laboral tenha cessado há menos de um ano”. Assim, este autor perfilha que não há

235
Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 35.
236
Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 6 da anotação ao art. 337.º.

118
motivos para afastar as normas gerais em matéria de prescrição dos créditos laborais pois,
aplicando-se essas normas, “a prescrição inicia-se a partir do momento em que os créditos
laborais são exigíveis, continuando a correr até à verificação da prescrição, ou seja, 5 anos para
as prestações periódicas, cf. artigo 310.º do Código Civil (nestas se incluindo o crédito
retributivo), e 20 anos quanto às demais prestações não periódicas cf. artigo 309.º do Código
Civil”, e continuando afirmando que se o legislador quisesse que a “prescrição dos créditos
laborais não se iniciasse, nem corresse na pendência do contrato de trabalho, tê-lo-ia previsto
expressamente, à semelhança do que sucede a quem presta trabalho doméstico, cf. alínea e) do
artigo 318.º do Código Civil”.

Para este autor, o exercício das relações laborais mudou o seu paradigma, pelo que é
comum nos dias de hoje a observância de alguns comportamentos que durante muitos anos
constituíam exceção, concluindo dizendo que o tráfico jurídico obriga a uma segurança jurídica e
previsibilidade que é posta em casa pelo entendimento generalizado de que a prescrição dos
créditos laborais não se inicia nem corre no decurso da relação laboral.

Em suma, na esteira de BERNARDO LOBO XAVIER e DIOGO VAZ MARECOS, não nos parece de
todo absurdo que se aplique aos créditos laborais as regras gerais do CCivil. Em primeiro lugar
porque, objetivamente, a norma jurídica relativa à prescrição no CT, não exclui liminarmente a
aplicação das regras gerais. Por outro lado, é inquietante, do ponto de vista da paz,
previsibilidade e segurança jurídica, que passados vinte e trinta anos (ou mais), possa vir ser
exigido o pagamento de um crédito que não foi pago tempestivamente, sobretudo nos casos em
que o trabalhador teve um comportamento compactuante com o incumprimento do empregador,
não demonstrando, em qualquer altura da vigência do contrato e sucessivo incumprimento por
parte do empregador, a sua vontade de fazer valer os seus direitos, causando no empregador
um legítimo sentimento de condescendência para com esse incumprimento, decorrente da
passagem de um prazo de longa duração.

119
11.4. A Prescrição dos Juros

O principal crédito emergente do contrato de trabalho corresponde à retribuição, que por


sua vez é um dos elementos essenciais do mesmo 237 , e que configura o principal tema em
análise.

O conceito de retribuição vem consagrado no art. 258.º CT, complementado pelos


esclarecimentos prestados pelos arts. 259.º e 260.º do mesmo diploma legal, nos termos
expostos nos capítulos precedentes no presente estudo.

Ora, o art. 337.º do CT, na sua atual redação, reporta-se ao “crédito […] de trabalhador
emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação”. Ora, perante o incumprimento
contratual, por parte do empregador, decorrente da falta de pagamento da sua principal
obrigação – retribuição – estamos perante um crédito do trabalhador que deriva do contrato de
trabalho ao qual, portanto, se aplica o regime prescricional consagrado pelo art. 337.º.

Não raras são as vezes em que o trabalhador por via judicial vem demandar o
empregador para o pagamento de juros desde a data de vencimento das prestações retributivas.

Destarte, cumpre fazer um comentário ao regime jurídico da obrigação de juros, previsto


no CCivil.

Com efeito, o art. 561.º do referido diploma legal consagra a “autonomia do crédito de
juros”, e retira-se do citado normativo que “o crédito de juros não fica necessariamente
dependente do crédito principal”. Nestes termos, é fixado o prazo de cinco anos para a
prescrição dos créditos decorrentes dos juros, determinando assim um afastamento claro em
relação ao regime aplicável à obrigação principal.

Salvo melhor parecer, sempre se poderá afirmar que o crédito de juros não decorre
objetivamente do regime laboral, ou seja não decorrem do contrato de trabalho, da sua violação
ou cessação, mas antes das regras consagradas no Direito Civil.

Saliente-se que os créditos de juros têm um regime jurídico fixado por lei que consagra o
princípio da autonomia dos mesmos (Cf. art. 561.º e 310.º d), ambos do CCivil) em relação à
obrigação capital. No caso em concreto, os juros devidos por mora no pagamento da obrigação

237
Cf. a este propósito o art. 1152.º do CCivil.

120
retributiva devem seguir o seu regime próprio e não o regime previsto no CT para a prescrição
dos créditos laborais, ou seja, é de qualificar os juros como civis e não de natureza laboral.

Outrossim, tendo em conta aquele princípio previsto no art. 310.º do CCivil, os juros dos
créditos laborais devem obedecer-lhe e, por isso, entende-se que os mesmos prescrevem ao fim
de cinco anos.

Ou seja, não é defensável que a obrigação dos juros assuma a natureza laboral apenas
porque a obrigação principal reveste essa natureza, e assim não nos parece razoável que se lhes
seja aplicável o mesmo regime, tanto mais que o regime da prescrição dos créditos laborais é
um regime especial. Isto é, o regime jurídico da prescrição dos créditos laborais é um regime
excecional e não refere os juros, e nem mesmo pela interpretação da norma se alcança uma
sustentação mínima em sentido contrário (art. 9.°, n.º 2 do CCivil), pelo que nos parece
inequívoco que o regime consagrado pelo art. 337.º do CT não abrange os juros no seu âmbito.

Nesta senda, o Tribunal da Relação de Coimbra238 entende que “atenta a sua autonomia
em relação ao capital, aos juros dos créditos laborais, como aos que decorrem de qualquer outro
tipo contratual, é aplicável o prazo de prescrição previsto no artigo 310.º, alínea d) do Código
Civil, norma específica que abrange expressamente no seu âmbito aplicativo todos e quaisquer
juros”.

Com entendimento semelhante, ROMANO MARTINEZ 239 diz que “não faria sentido que,
concedendo-se uma situação de benefício ao credor, se lhe permitisse ainda «ganhar» com o
valor de prestações acessórias, mormente a dívida de juros”. Este autor reitera dizendo que a
especial tutela da prescrição consagrada para os créditos emergentes do contrato de trabalho,
sua violação ou cessação, prevista no CT pelo art. 337.º, não se aplica à obrigação acessória de
juros, que é autónoma da dívida capital, sendo que aceita a aplicação normativa em sentido
oposto seria estar a “permitir que o credor beneficiasse de um venire contra factum proprium:
não reclama o pagamento da dívida durante um período longo porque a prescrição não corre e
vem depois exigir o pagamento de juros durante esse longo período”.

Tendo em conta os ditames da boa fé da previsibilidade, segurança e certeza jurídica,


não parece que o legislador tenha consagrado um regime prescricional, no âmbito dos créditos

Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º 1191/09.0TTCBR.C1, disponível no website
238

www.dgsi.pt.
239
Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 575.

121
laborais, mormente da retribuição, que visasse incluir os juros nos sucessivos preceitos da
prescrição dos créditos laborais, sendo certo que configura uma insensatez jurídica que um
trabalhador após vinte e trinta anos, sobre o vencimento de um crédito que não lhe foi pago
atempadamente, possa vir reclamar juros desde o vencimento, o que resultava num descomunal
prejuízo para o empregador.

Paralelamente o art. 337.º do CT fixa, no seu n.º 1, um regime que se refere a


circunstâncias derivadas do contrato de trabalho, sua violação ou cessação. Por outro lado,
relevam para a aplicação do seu n.º 2 créditos equiparados à violação do direito a férias,
indemnização por sanção abusiva ou pagamento de trabalhão suplementar. Diante disto, parece
não estar incluído na letra da lei qualquer referência aos juros.

Através desta solução, alcança-se a pretendida simetria na relação laboral, pois por um
lado o prazo de cinco anos em que assenta o art. 310.º d) do CCivil é francamente mais
vantajoso para o trabalhador do que o curto prazo de um ano previsto na disciplina laboral; por
outro lado, para o empregador este regime é também mais profícuo visto que o prazo passa a
contar desde os juros possam ser exigidos.

Convém ainda, quanto à data do vencimento dos juros respeitante às prestações


retributivas debatidas, nomeadamente se uma dada prestação deve ou não ser integrada no
valor devido ao trabalhador a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de
Natal, esclarecer quando os mesmos se vencem.

Resulta do art. 806.º, n.º 1 do CCivil que na obrigação pecuniária vencem juros a contar
do dia da constituição em mora. O momento da constituição em mora, vem previsto no art.
805.º do mesmo diploma legal. De acordo com o art. 805.º do CCivil, o devedor só fica
constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir e,
nos termos do n.º 3 do referido preceito, sendo o crédito ilíquido não há mora enquanto este não
se tornar líquido.

No entanto, o art. 323.º do CT consagra uma regra especial no que concerne à falta de
cumprimento das prestações pecuniárias, não bastando, na moral laboral, o não pagamento,
sendo também necessário um juízo de culpa.

122
Não obstante ser consagrado um prazo certo para o pagamento da retribuição de férias,
subsídio de férias e de Natal, se a questão quanto à natureza das prestações patrimoniais
prestadas ao longo da relação laboral for controvertida na medida de saber se as mesmas
integram ou não o conceito de retribuição não se pode considerar a quantia liquidada no
momento do pagamento do seu pagamento.

Pelo que não se mostra razoável exigir do devedor o cumprimento de uma prestação da
qual ele não saiba o montante e o objeto exato da prestação que lhe cumpre realizar – in
illiquidis non fit mora.

Apenas pela avaliação casuística é que se pode afirmar, com clareza, se e quais são as
prestações que o trabalhador aufere ao longo do contrato com o empregador que se podem
considerar retribuição para efeito de pagamento da retribuição de férias, subsídio de férias e de
Natal. Assim, o trabalhador só pode demandar o empregador para o pagamento de juros caso se
verifique que este último não cumpriu a sua prestação no que concerne à inclusão de
determinados montantes no pagamento de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal,
quando lhe era possível fazê-lo no tempo devido.

Razão pela qual se entende que não havendo culpa do devedor, não é possível imputar
ao empregador a mora geradora de condenação em juros, sendo que estes são devidos tão só a
partir do momento do dia da constituição em mora, nos termos do art. 806.º do CCivil.

Em sentido diverso, o Tribunal da Relação do Porto240 entende que “os juros de mora
relativos a créditos laborais encontram-se submetidos ao regime da prescrição constante do
artigo 38.º, n.º1 da LCT, 381.º, nº 1 do CT de 2003 e 337.º, nº 1 do CT de 2009, que
estabelecem um regime especial e, nessa medida, constituem um desvio ao regime geral
estabelecido no artigo 310.º, al. d) do Código Civil”. Com o mesmo entendimento pronunciou-se
a Relação de Lisboa241, entendendo que “(…) na formulação ampla da norma cabem os juros de
mora, sendo essa a interpretação que melhor corresponde às exigências do art.º 9.º do CC, quer
por atender ao pensamento legislativo quer por ser a mais coerente com a unidade do sistema
jurídico (n.º1), sem que se lhe possa apontar (como defende o entendimento contrário), que
não tenha na lei correspondência verbal (n.º 2), dado que essa abrangência é intencional”.

240
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de dezembro de 2013, Processo n.º 1260/12.0TTPRT-A.P1, disponível no website
www.dgsi.pt.
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de maio de 2014, Processo n.º 1195/13.9TTLSB.L1-4, disponível no website
241

www.dgsi.pt.

123
Para MENEZES CORDEIRO 242 o prazo de prescrição previsto no art. 337.º do CT é
igualmente aplicável aos juros moratórios relativos aos créditos laborais, deixando de estar
sujeitos às regras gerais do CCivil243.

A mesma orientação é perfilhada por MILENA SILVA ROUXINOL 244. A autora explica que a
decisão de demandar o empregador para o cumprimento das obrigações em falta é sempre
condicionada pelo “típico constrangimento psicológico do trabalhador ante a entidade
empregadora”. E, por outro lado, rejeita igualmente o argumento de que “encontrando-se o
trabalhador protegido pelas normas e princípios laborais, mormente o da segurança no
emprego, pode ignorar-se qualquer inibição para o exercício dos direitos que lhe assistem”.
Assim, entende que “a decisão de reagir contra a entidade empregadora só se afigura, para o
trabalhador, como pensável a partir do momento em que a relação se quebra”, e reitera que se
aplique o mesmo regime aos juros.

242
Cordeiro, Menezes in “Manual...”, pág. 380.
243
No mesmo sentido Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 905.
Rouxinol, Milena Silva in “O regime da prescrição dos Juros Laborais – Comentário ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de
244

março de 2011”, disponível no website do Repositório Científico Lusófona - http://recil.grupolusofona.pt/.

124
12. Do Exercício Abusivo do Direito por Suppressio

O Capítulo III do Livro I, referente à Parte Geral do CCivil, é consagrado ao tempo e às


suas repercussões nas relações jurídicas. As figuras previstas neste regime, como formas de
repercussão do tempo, são a prescrição, a caducidade e o não uso. No entanto, esta
enumeração parece não ser taxativa, sendo que a doutrina e a jurisprudência têm apontado
outras figuras jurídicas que têm eficácia direta pelo decurso do tempo.

Com efeito MENEZES CORDEIRO 245 propõe a hipótese da suppressio ex bona fide ou
supressão por exigência de boa fé, isto é, o autor explica que as regras previstas no
ordenamento jurídico, atinentes à repercussão do tempo, servem para assegurar a certeza e a
segurança, definido balizas de aplicação generalizada, mas atenta para o facto de o Direito ter
uma preocupação diferenciadora que carece de ser tutelada, pelo que nem o instituto da
prescrição nem a caducidade “têm aptidões para aderir aos meandros das situações
individuais”. Assim, este autor sugere que o corretivo necessário para assegurar tais situações
poderia advir da boa fé, preconizando o instituto supra referido, explicitando que: “perde a sua
posição jurídica a pessoa que não exerça por um período de tempo e em circunstâncias tais que
não mais seja de esperar qualquer exercício”.

Este autor defende que esta figura é uma das diversas modalidades do instituto do
abuso de direito e designa a posição do direito subjetivo que não tendo sido exercido em
determinadas circunstâncias num dado hiato temporal, não mais deverá poder sê-lo, sob pena
de contrariar a boa fé.

Segundo o acórdão da Relação do Porto de 17 de junho de 2013 246 , “a supressio,


enquanto modalidade do abuso do direito, respeita àquelas situações em que uma posição
jurídica que não tenha sido exercida em certas circunstâncias e por certo lapso de tempo, não
mais possa sê-lo por, de outro modo, contraria a boa-fé”.

A suppressio é a expressão latina do termo Verwirkung, originário do direito alemão. A


origem desta figura é jurisprudencial, mas o seu surgimento deu-se no âmbito da “venda de
ofício comercial, a favor do comprador, ficando consignadas em decisões do então

245
Cordeiro, Menezes in “Tratado de Direito Civil” Vol. V, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 236.
246
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.

125
Reichsoberhandelsgericht – o Tribunal Superior do Comércio do Império Alemão, antes da
unificação das jurisdições civil e comercial”247.

Como explica a Relação do Porto 248 , o seu surgimento deu-se “no tempo da I Guerra
Mundial, de grande inflação, em que se verificavam alterações elevadas no valor das
mercadorias, como é típico de tais circunstâncias temporais. Visou obstar aos inconvenientes de
se exercer o direito, em matéria comercial, decorridos longos períodos de tempo, onde não
existiam prazos de prescrição e o cumprimento dos contratos levaria à ruína de uma das partes
pela subida vertiginosa de preços. Daí que o exercício do direito em tais circunstâncias seja
entendido como abuso”.

MENEZES CORDEIRO249 elucida que em consequência das alterações monetárias, o exercício


tardio de alguns direitos conduzia a situações de desequilíbrio inadmissível entre as partes, e a
suppressio iria funcionar como contrapeso, assegurando o efeito do devedor, indicando que a
boa fé requer o equilíbrio da situação das partes. Chama ainda a atenção para um ponto
essencial, referindo que a suppressio surgiu como um instituto autónomo e só mais tarde houve
aproximação ao conceito da boa fé e ao instituto do abuso de direito.

Relativamente ao sucesso e aceitação desta figura MENEZES CORDEIRO 250 indica que foi
com a conciliação da suppressio à proibição de venire contra factum proprium com a seguinte
matriz: “o titular do direito, abstendo-se do exercício durante um certo lapso de tempo, criaria,
na contraparte, a representação de que esse direito não mais seria actuado; quando
supervenientemente, viesse agir, entraria em contradição”.

Em consonância com o desenvolvimento independente do conceito e a fixação de um


regime diferenciador, o autor supra referido indica alguns elementos basilares para a aferição da
existência da suppressio nas situações jurídicas. Por um lado, afirma que todos os direitos
subjetivos lhe estão sujeitos, salvo determinadas exceções; é exigido um certo decurso de tempo
sem exercício, tempo esse que é eminentemente variável consoante as circunstâncias. Ademais
requerem-se indícios objetivos de que o direito em causa não irá mais ser exercido251.

247
Cordeiro, Menezes in “Tratado...” Vol. V, pág. 315.
248
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.
249
Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé no Direito Civil”, Vol. II, Almedina, Coimbra, 1984, pág. 801.
250
Cordeiro, Menezes in “Tratado...” Vol. V, pág. 320.
251
Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 810 e segs.

126
Neste sentido, é coerente afirmar que o hiato de tempo sem exercício para se poder
arguir a suppressio em detrimento do direito do credor sempre terá de ser inferior do que os
prazos de prescrição, sob pena de inutilidade da figura da suppressio; sendo que será
necessário fazer um juízo equilibrado relativamente ao caso em concreto para aferir que já não é
de se esperar o exercício do direito em causa.

Em nota de rodapé252, o mesmo enuncia como exceções, nomeadamente, os direitos que


prescrevem em períodos curtos, por no prazo de prescrição ser sempre de contar com o seu
exercício; os direitos legalmente excluídos da suppressio; os direitos emergentes de contratos
coletivos de trabalho; certos direitos essenciais dos trabalhadores, como o direito ao salário.

Aponta ainda a suppressio como um instituto objetivo, ou seja, independente de culpa


(dolo ou má fé) do titular atingido, requerendo apenas a sua inércia. Sendo que, por um lado, é
afetada por elementos voluntários que interrompam ou suspendam o decurso do prazo de
prescrição ou caducidade, uma vez que tais ocorrências deitam por terra a ideia de que o direito
não mais iria ser exercido. Por outro lado, indica que esta figura é uma “saída extraordinária”,
tendo natureza subsidiária e por isso, só podendo ser aplicada se mais nenhuma solução
prevista no ordenamento jurídico for aplicável ao caso253.

VAZ SERRA254 refere que a Verwirkung é uma figura análoga à prescrição, acolhida pela
jurisprudência alemã, tendente a valorar o não exercício do direito, em certos casos excecionais,
sem que tenha decorrido qualquer prazo de caducidade ou de prescrição.

Por outro lado, PAIS DE VASCONCELOS255 referindo-se a esta figura entende que, tal como a
surrectio (Erwirkung) , não instituem um novo tipo de abuso de direito. São sim, subtipos do
256

venire contra factum proprium, e ambas as figuras traduzem o comportamento contraditório do


titular do direito que o vem exercer depois de uma prolongada abstenção e acrescenta que é
essa abstenção prolongada no exercício de um direito que pode, em certas circunstâncias,
suscitar uma expectativa legítima e razoável de que o seu titular o não irá exercer ou que haja

252
Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 810, nota n.º 603.
253
Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 812.
254
Serra, Vaz in “Prescrição e Caducidade”, BMJ 105, pág. 5.
255
Vasconcelos, Pedro Pais de in “Teoria Geral do Direito Civil”, Almedina, Coimbra, 2012, pág. 240.
256
Menezes Cordeiro indica que a expressão “Erwirkung” foi proposta por CANARIS para se referir ao “surgimento”, e explica que a língua
portuguesa não comporta a construção de novas palavras, por aditamentos ou partículas, pelo que, para o efeito, propõe a termo “surrectio”
para se referir a Erwirkung, Cf. Cordeiro, Menezes in “Tratado...”, Vol. V, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 324.

127
renunciado ao próprio direito, ao exercício de algum dos poderes que o integram, ou a certo
modo do seu exercício.

Em suma, a suppressio apresenta-se como uma forma de tutela da confiança do seu


beneficiário (devedor), perante a inércia do titular do direito (credor)257. Ora, para cimentar esta
teoria MENEZES CORDEIRO indica que esta figura carece de circunstâncias colaterais que melhor
fundamentem a confiança do beneficiário, a saber: a) um não exercício prolongado; a existência
de uma situação de confiança; uma justificação para essa confiança; um investimento para essa
confiança e a imputação da confiança ao não exercente do direito.

O fundamento para a tutela da confiança do beneficiário assenta, essencialmente, no


não exercício prolongado. Este tem de ser de tal forma relevante que crie no espírito do homem
médio, colocado na posição do beneficiário concreto, a legítima expectativa de que aquele direito
não mais deverá ser exercido. Pelo que, esta confiança e o investimento nela feito deverão ser
protegidos, sob pena de causar danos irreparáveis.

Face ao exposto, o referido autor conclui 258 afirmando que “a suppressio manifesta-se
porque, mercê da confiança legítima, uma pessoa adquiriu (por surrectio) uma posição
incompatível com um exercício superveniente, por parte de exercente”. Assim, na ponderação
dos interesses de ambos, vai-se dar preferência ao beneficiário, porque tendo em conta o
investimento de confiança, os danos sofridos com por este último seriam consideravelmente
superiores às vantagens que o titular do direito iria colher e porque, face ao nexo de imputação
de confiança, o titular do direito não exercido se coloca numa situação que faculta julgar social e
eticamente ajustado o seu sacrifício.

Nos termos propugnados pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 259, “como tem
sido assinalado pela doutrina, os casos redutíveis a um exercício abusivo do direito por
suppressio, impõem que, patente ou ostensivamente, se crie, no obrigado, a convicção de que a
prestação já não virá a ser exigida, sob pena de a posterior exigência representar para ele um
incomportável sacrifício”

257
Cordeiro, Menezes in “Tratado...”, Vol. V, pág. 323.
258
Cordeiro, Menezes in “Tratado...” , Vol. V, pág. 324.
259
Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de junho de 2009, Processo n.º 09S0620, disponível no website www.dgsi.pt.

128
Transponhamos, então, para o campo do Direito do Trabalho a figura que acabamos de
apresentar, no âmbito do presente estudo quanto à repercussão que o conceito de retribuição
causa na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, enquadrando a suppressio
nos casos em que o trabalhador vem requerer judicialmente a integração de certos suplementos
salariais no conceito de retribuição para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e
subsídio de Natal, volvidos, pelo menos, vinte e trinta anos desde o vencimento dos referidos
créditos.

Tem sido entendimento generalizado que “o abuso do direito, na modalidade da


suppressio, não terá aplicação, em princípio, em matéria de direito laboral, nomeadamente, em
matéria de retribuições, onde existe também prazo de prescrição”260.

No entanto, face ao que anteriormente acobertamos no que concerne à integração de


certos complementos no conceito de retribuição, bem como à tese defendida no que diz respeito
aos prazos de prescrição dos créditos laborais e da matéria referente aos juros, entendemos que
um trabalhador que não tenha reclamado da não integração de certos complementos
patrimoniais na retribuição de férias e nos subsídios férias e de Natal, durante um dado hiato
temporal, nomeadamente nos casos em que excede o prazo geral de prescrição previsto no
CCivil, de vinte e trinta anos, poderá gerar na esfera jurídica do empregador, uma legítima e
defensável convicção que o mesmo jamais irá ser demandado.

Sem conceder, a verdade é que o fim social ou económico do direito à retribuição como
contrapartida do trabalho prestado visa, essencialmente, a proteção do trabalhador, para quem,
em regra, o rendimento do trabalho constitui a fonte principal, senão única, de satisfação das
necessidades básicas de subsistência, pelo que se afigura conforme ao fim social e económico
do direito o trabalhador procurar obter do empregador o pagamento das retribuições que a lei
lhe confere, nomeadamente dos juros de mora que acrescem àqueles créditos.

Parece uma conclusão precipitada afirmar categoricamente que um qualquer


trabalhador, que não tenha tido um comportamento expresso durante largos anos quanto à sua
vontade de fazer repercutir na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal aqueles
complementos patrimoniais, cuja natureza não é claramente retributiva (tendo em conta as

260
Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.

129
considerações já expostas), não ultrapassa os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes
ou pelo fim social e económico do direito.

Com efeito, a renúncia tácita do crédito laboral sempre seria inválida, uma vez que o
direito à retribuição é indisponível durante a vigência da relação laboral, o que se justifica, quer
pela natureza da retribuição, entendida como crédito alimentar, indispensável ao sustento do
trabalhador e da sua família, quer pela situação de subordinação económica e jurídica em que o
trabalhador se encontra face ao empregador, que, segundo o entendimento tradicional, o pode
inibir de tomar decisões verdadeiramente livres, em resultado do temor reverencial em que se
encontra face aos seus superiores ou do medo de represálias ou de algum modo poder vir a ser
prejudicado.

No entanto, não deixa de causar algum desconforto que o exercício tardio do direito do
trabalhador, sendo reclamado apenas vinte anos após a data do vencimento dos complementos
patrimoniais que alegadamente integrariam o conceito de retribuição para efeitos de retribuição
de férias e nos subsídios férias e de Natal, mais do que poder representar, concretamente, um
incomportável sacrifício para o empregador, mormente num contexto de crise socio económica
como o atual, signifique desvalorizar a legítima convicção do empregador de que aquele direito
não mais iria ser exigido, derivada da falta de exigência do cumprimento durante um acentuado
período de tempo, tornando as relações jurídicas laborais bastante incertas.

Reiteramos que em nosso entendimento, salvo melhor parecer, não se patrocina a teoria
de que o trabalhador não é livre de fazer valer os seus direitos, sobretudo no que concerne ao
direito à retribuição e que o facto de ser constitucionalmente protegido, não seja por si só um
forte fundamento para que o trabalhador se sinta desprendido de quaisquer constrangimentos,
especialmente aquele trabalhador em concreto que se encontra sob a alçada de um sindicato,
com robustez suficiente para assegurar o cumprimento pleno dos direitos dos seus
trabalhadores.

Assim, parece-nos legítimo invocar a figura da suppressio nas causas que tenham como
litígio o conceito de retribuição, se as prestações complementares são consideradas para o
referido conceito e em caso afirmativo, quais a que nele devam ser integradas para efeitos de
retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, e que apenas venham a ser exigidas
após uma duração prolongada de tempo, durante o qual o trabalhador (máxime o trabalhador

130
sindicalizado) nunca tenha tido um comportamento discordante de tal prática, provocando no
empregador a legítima expectativa de que não se encontra sequer em incumprimento.

131
132
Conclusões

1. O contrato de trabalho, enquanto mecanismo jurídico de regulação das relações laborais, tem
as suas raízes no Direito Romano.

2. A obrigação de remuneração da atividade prestada, já consagrada na era Romana, na


qualidade de elemento essencial do contrato de trabalho, sofreu algumas alterações decorrentes
da evolução histórica das circunstâncias políticas e sociais.

3. Em Portugal, o processo de formação do Direito do Trabalho é relativamente recente, tendo


acompanhado o desenrolar dos desenvolvimentos políticos e socias europeus derivados dos
movimentos sindicais que requeriam melhores condições de trabalho, que se faziam sentir um
pouco por toda a Europa.

4. Os primeiros diplomas legais concernentes às questões laborais em Portugal remontam


apenas ao século XIX, tendo sobretudo a formação do ordenamento jurídico-laboral alcançado
um espaço relevante ao longo do século XX, nomeadamente com a consagração do direito à
greve e do lock-out.

5. A retribuição é um dos elementos essenciais do contrato de trabalho, enquanto mecanismo


máximo das relações juslaborais, consagrada no art. 258.º do CT.

6. Por ser um elemento essencial do contrato de trabalho o legislador estabelece vários


mecanismos de proteção da retribuição, mormente de consagração constitucional, no art. 59.º,
n.º 3 da Lei Fundamental.

7. O cálculo do montante retributivo tem em conta vários fatores, tais como a quantificação da
prestação fixada em função do tempo, o posto de trabalho ou categoria, a performance ou
mérito no desempenho da função e a evolução na empresa, ou seja a antiguidade.

8. Há doutrina que entende que o problema da aferição do cálculo da prestação retributiva


coloca-se em dois patamares, sendo um o da determinação em concreto da retribuição, quando
a mesma não se encontra fixada pelo contrato de trabalho e o segundo o da determinação em
abstrato da prestação retributiva.

9. O n.º 2 do art. 258.º indica que para que uma prestação seja considerada retribuição, o
legislador faz depender a sua qualificação como tal de um pagamento regular e periódico e, uma
vez que o legislador não fixou concretamente um critério para a aferição da “regularidade e
periodicidade”, a qualificação das prestações como retributivas, tendo em conta a sua
“regularidade e periodicidade”, não tem sido uniforme no seio da jurisprudência.

10. Em nosso entendimento, e na senda das mais recentes decisões do Supremo Tribunal de
Justiça, deve considerar-se regular e periódica a prestação cujo pagamento ocorre todos os
meses de atividade do ano, constituindo, assim, um complemento normal da retribuição do
trabalhador.

133
11. O legislador consagra no art. 258.º, n.º 3 uma presunção de que constitui retribuição
qualquer prestação do empregador ao trabalhador; no entanto, esta presunção carece sempre,
em nosso entendimento, de uma avaliação casuística, isto é, de aferir se aquela atribuição é
uma mera liberalidade ou tolerância do empregador, ou se se traduz numa intenção de
atribuição de um benefício económico ao trabalhador, digno de tutela.

12. O legislador laboral prevê no art. 264.º do CT o direito a retribuição de férias, sendo que
defendemos que o legislador quis manter a retribuição de férias proporcional à retribuição que o
trabalhador aufere em período de não férias, ou seja em serviço efetivo e, portanto, excluem-se
as prestações que pelas suas circunstâncias não se verifiquem em período de férias por não
terem sequer natureza retributiva, sem prejuízo do previsto na parte final da al. a), do n.º 1 do
art. 260.º.

13. Quanto ao subsídio de férias, é nosso entendimento que devem ficar excluídos aqueles
complementos remuneratórios que dizem respeito às condições que afetam a pessoa do
trabalhador pelo exercício efetivo do trabalho, às despesas que o mesmo tem de efetuar para a
realização da sua prestação de trabalho, bem como ao seu desempenho.

14. Relativamente ao subsídio de Natal, consagrado pelo legislador no art. 263.º, entendemos
que não devem ser tidas em consideração as atribuições patrimoniais que pressupõem a efetiva
prestação do trabalho e que visam, tão-somente, compensar o trabalhador das despesas que
realiza pela efetiva execução das suas funções, nem as prestações que sejam contrapartida do
modo específico da execução do trabalho, e sendo o subsídio de Natal considerada uma
prestação complementar o seu cálculo deverá obedecer ao disposto no art. 262.º n.º 1 do CT.

15. Somos da opinião de que se o legislador consagrou as exclusões legais do conceito de


retribuição em artigo posterior à previsão da presunção retributiva (art. 258.º, n.º 3), fê-lo com a
intenção de amenizar a prova a ser produzida pelo empregador, pelo menos, quanto à não
integração daquelas prestações no montante retributivo.

16. Igualmente consideramos que no que concerne à prescrição de créditos laborais, quer para
o trabalhador quer para o empregador, não é absurdo que se aplique aos créditos laborais as
regras gerais do CCivil. Uma vez que a norma jurídica relativa à prescrição no CT não exclui
liminarmente a aplicação das regras gerais. Além disso, não é razoável, do ponto de vista da
paz, previsibilidade e segurança jurídica, que passados vinte e trinta anos, ou mais, possa vir ser
exigido um crédito que até então nunca havia sido considerado para efeitos de retribuição de
férias, subsídio de férias e Natal.

17. Quanto à obrigação de juros de mora, não nos parece que no âmbito das relações laborais
os juros assumam natureza laboral apenas porque a obrigação principal reveste essa natureza.
Assim deverá, em nosso entendimento, aplicar-se aos juros o regime geral consagrado no CCivil.

134
18. A figura da suppressio, quanto a nós, deve ser entendida como proibição de venire contra
factum proprium, e é uma questão sobre a qual os tribunais do trabalho portugueses têm sido
progressiva e recentemente chamados a pronunciarem-se. Entendemos que é um domínio ainda
pouco considerado no âmbito do Direito do Trabalho mas merecedor de atenção, dada a sua
relevância prática.

135
136
Bibliografia (*)

(*) Indica-se aqui o conjunto de elementos bibliográficos expressamente coligidos e consultados


para a realização do presente trabalho, sejam ou não citados em nota de rodapé.

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140
Índice de jurisprudência
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de janeiro de 1996, Coletânea de
Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 1996, Vol. I, págs. 249 e
segs.;
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de novembro de 1996, in Acórdãos do
Supremo Tribunal Administrativo, Ano XXXVI, 1997;
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6 de junho de 2000, Processo n.º 99S346
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, de 25 de setembro de 2002, Processo n.º
02S1197:
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de fevereiro de 2005, Processo n.º
5655/2004-4;
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, de 4 de maio de 2005, Processo n.º 04S779;
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de março de 2006, Processo n.º 08/06;
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, de 17 de janeiro de 2007, Processo n.º
06S2188;
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17 de janeiro de 2007, Processo n.º
7258/2006-4
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de abril de 2007, Processo n.º
06S4557
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º
07S3786;
 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de fevereiro de 2008, Processo n.º
7354/2007-4
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, 26 de março de 2008, Processo n.º 07S3791
 Acórdão do Supremo Tribunal Justiça, de 4 de junho de 2008, Processo n.º 08S456
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de junho de 2008, Processo n.º
07SS44804
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de setembro de 2008, Processo n.º
08S1031;
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de março de 2009, Processo n.º
2195/05.8TTLSB-4
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de março de 2009, Processo n.º
2195/05.8TTLSB-4
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de junho de 2009, Processo n.º
09S0620
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de novembro de 2009, Processo n.º
274/07.6TTBRR.S1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º
1881/07.9TTLSB.L1-4
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º
467/06.3TTCBR. C1.S1

141
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2010, Processo n.º
607/07.STJLSB.L1.S1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º
76/10.2YFLSB
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de novembro de 2010, Processo n.º
431/08.8TTBCL.P1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de dezembro de 2010, Processo n.º
285/07.1TTBGC.P1.S1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2010, Processo n.º
2065/07.5TTLSB.L1.S1
 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º
1191/09.0TTCBR.C1
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de fevereiro de 2012, Processo n.º
3250/09.0TTLSB.L1-4
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2012, Processo n.º
2131/08.0TTLSB.L1.S1
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012, Processo n.º
749/10.0TTPRT.P1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de outubro de 2012, Processo n.º
73/08.8TTLSB.S1
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de fevereiro de 2013, Processo n.º
573/10.0TTSTS.P1
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º
629/10.9TTBRG.P2
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de dezembro de 2013, Processo n.º
1260/12.0TTPRT-A.P1
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de fevereiro de 2014, Processo n.º
4598/12.2TTLSB.L1-4
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de março de 2014, Processo n.º
597/13.5TTVNG.P1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de abril de 2014, Processo n.º
2911/08.6TTLSB.L1.S1
 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 7 de abril de 2014, Processo n.º
408/12.9TTVLG.P1
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de abril de 2014, Processo n.º
714/11.00TTPRT.P1.S1
 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 3 de maio de 2014, Processo n.º
601/13.7TTVIS.C1
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de maio de 2014, Processo n.º
1195/13.9TTLSB.L1-4

142
Anexo
INSTÂNCIA DATA DO FONTE PROCESSO N.º CONSIDERAÇÕES RELEVANTES
ACÓRDÃO
TRL 27.09.199 CJ/95, T4 Recurso n.º 9471 O subsídio de aniversário integra o conceito de
5 Comarca de Lisboa retribuição, porque, sendo pago regularmente,
cabia ao empregador afastar a presunção,
provando que não era retribuição;
TRL 18.10.199 DGSI 0001294 O facto de a ré nunca ter considerado o abono de
5 viagem como retribuição, e nunca o ter pago na
retribuição de férias e subsídios, nem sobre ele ter
feito descontos para a CGA, quer em relação ao
autor quer em relação aos restantes trabalhadores
nas mesmas condições, não obsta a que o mesmo
possa e deva ser considerado, agora, como fazendo
parte do conceito de retribuição;
STJ 16.05.200 CJSTJ/00 Recurso n.º 343/99 A retribuição de férias e dos subsídios de férias e
T2 de Natal devem ser calculadas com base em todos
os proventos que constituem e se integram na
retribuição;
TRC 11.04.200 CJ/02, T2 Recurso n.º 3124 Todos os benefícios pecuniários concedidos ao
2 Comarca de Coimbra trabalhador constituem, em princípio, retribuição;
TRL 01.02.200 DGSI 9563/2005-4 O subsídio de trabalho noturno, o subsídio de
6 divisão do correio e a comparticipação especial,
recebidos de forma regular e periódica, integram o
conceito de retribuição, sendo, por isso, a respetiva
média devida na retribuição de férias, no subsídio
de férias e no de Natal;
STJ 24.09.200 DGSI 08S1031 No que diz respeito ao automóvel, é óbvio que a
8 sua utilização pelo autor na sua vida particular lhe
trazia vantagens económicas, mas essas vantagens
também não constituíam uma contrapartida direta
do trabalho, uma vez que resultavam de uma mera
liberalidade da entidade empregadora que, como
tal, podia ser por ele retirada a todo o tempo, não
constituindo, por isso, um componente da sua
retribuição”;
TRL 17.06.200 DGSI 607/07.5TTLSB.L1-4 As prestações regulares e periódicas pagas pelo
9 empregador ao trabalhador, independentemente da
designação que lhes seja atribuída no contrato ou
no recibo, em princípio, só não serão consideradas
parte integrante da retribuição se tiverem uma
causa específica e individualizável, diversa da
remuneração do trabalho;
STJ 25.06.200 DGSI 09S0620 Como tem sido assinalado pela doutrina, os casos
9 redutíveis a um exercício abusivo do direito por
suppressio, impõem que, patente ou
ostensivamente, se crie, no obrigado, a convicção

143
de que a prestação já não virá a ser exigida, sob
pena de a posterior exigência representar para ele
um incomportável sacrifício;
TRL 16.12.200 DGSI 1881/07.9TTLSB.L1-4 A relevar uma unidade tempo para aferir a
9 regularidade e periodicidade de uma prestação,
que o trabalhador alega constituir retribuição
variável, essa unidade de tempo terá que ser,
necessariamente, a unidade mensal, uma vez que
a retribuição do trabalhador é paga ao mês,
conjugada com o período de um ano, relativamente
ao qual são devidos a retribuição de férias, o
subsídio de férias e o subsídio de Natal, cuja
“reconstituição” o trabalhador reclama;
TRP 14.06.201 DGSI 522/08.5TTLMG.P1 Provando-se o carácter regular e periódico dos
0 suplementos pagos ao trabalhador, no período de
1986 a 2003, a título de remuneração de trabalho
suplementar, de trabalho noturno, prémio
motorista, abono de viagem, prémio de
desempenho, os mesmos devem relevar para o
cômputo da remuneração de férias e dos subsídios
de férias e de Natal;
STJ 23.06.201 DGSI 607/07.STJLSB.L1.S1 Estando em causa determinar o valor de
0 atribuições patrimoniais devidas anualmente
correspondentes a um mês de retribuição, como
são a retribuição de férias, o respetivo subsídio e o
subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro
para sustentar a aludida expectativa, baseada na
regularidade e periodicidade, há-de ter por
referência a cadência mensal, independentemente
da variação dos valores recebidos, o que, de algum
modo, tem correspondência com o critério
estabelecido na lei para efeito de cálculo da
retribuição variável […]. E, assim, considerar-se
regular e periódica e, consequentemente, passível
de integrar o conceito de retribuição, para os
efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo
pagamento ocorre todos os meses de atividade do
ano;
STJ 03.11.201 DGSI 425/07.0TTCBR.C1.S1 A remuneração de férias, o seu subsídio e o
0 subsídio de Natal são atribuições patrimoniais de
carácter retributivo, mas que, ao contrário do
ordenado mensal e respetivos complementos, não
têm uma relação de correspetividade direta e
concreta com certa prestação de trabalho, realizada
em tempo e espaço definidos, representando
valores que corrigem ou ajustam a retribuição
global do benefício auferido pelo empregador;

144
STJ 16.12.201 DGSI 2065/07.5TTLSB.L1.S Deve considerar-se regular e periódica, para efeito
0 1 de cálculo de férias e de subsídios a atribuição
patrimonial cujo pagamento ocorre em todos os
meses de atividade do ano;
TRC 02.03.201 DGSI 1191/09.0TTCBR.C1 Atenta a sua autonomia em relação ao capital, aos
1 juros dos créditos laborais, como aos que decorrem
de qualquer outro tipo contratual, é aplicável o
prazo de prescrição previsto no artigo 310.º, alínea
d) do Código Civil, norma específica que abrange
expressamente no seu âmbito aplicativo todos e
quaisquer juros;
TRP 17.06.201 DGSI 629/10.9TTBRG.P2 A suppressio, enquanto modalidade do abuso do
3 direito, respeita àquelas situações em que uma
posição jurídica que não tenha sido exercida em
certas circunstâncias e por certo lapso de tempo,
não mais possa sê-lo por, de outro modo, contraria
a boa-fé;
TRP 18.12.201 DGSI 1260/12.0TTPRT-A.P1 Os juros de mora relativos a créditos laborais
3 encontram-se submetidos ao regime da prescrição
constante do artigo 38.º, n.º1 da LCT, 381.º, nº 1
do CT de 2003 e 337.º, nº 1 do CT de 2009, que
estabelecem um regime especial e, nessa medida,
constituem um desvio ao regime geral estabelecido
no artigo 310.º, al. d) do Código Civil;
TRP 07.04.201 DGSI 408/12.9TTVLG.P1 Tem a jurisprudência das Relações considerado
4 que uma prestação só poderá considerar-se regular
se for prestada com alguma frequência, chamando
à colação para aferir de tal frequência a bitola da
metade do ano;
STJ 30.04.201 DGSI 714/11.00TTPRT.P1.S Perante a matéria de facto provada, impõe-se
4 1 concluir que a atribuição ao autor de veículo
automóvel assume natureza retributiva, uma vez
que a empregadora, ao conferir àquele o direito de
utilização do veículo na sua vida particular,
incluindo em fins-de-semana e férias, e ao suportar
os respetivos encargos, designadamente, com a
sua manutenção, seguros, portagens e
combustível, ficou vinculada a efetuar, com
carácter de obrigatoriedade, essa prestação. Trata-
se de uma prestação em espécie com carácter
regular e periódico e um evidente valor patrimonial,
que assume natureza de retribuição, nos termos
dos artigos 82.º da LCT, 249.º do Código do
Trabalho de 2003 e 258.º do Código do Trabalho
de 2009, beneficiando, por isso, da garantia de
irredutibilidade;

145

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