Você está na página 1de 132

UNIVERSIDADE TIRADENTES

SIÇA DRIELY DE SOUZA CHAGAS

AUTOGESTÃO NA HABITAÇÃO
SOCIAL:
Uma experiência no Bairro santa Maria em
Aracaju-Se

Aracaju, 2017
Foto da capa: Atelier Populaire - École de Beaux Arts. Paris, 1968.
SIÇA DRIELY DE SOUZA CHAGAS

AUTOGESTÃO NA HABITAÇÃO SOCIAL:


UMA EXPERIÊNCIA NO BAIRRO SANTA MARIA EM ARACAJU-SE

Trabalho Final de Graduação apresentado à


Universidade Tiradentes como um dos pré-
requisitos para obtenção do grau de bacharel em
Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Profª Ma. Heloísa Diniz de


Rezende

Aracaju
2017
SIÇA DRIELY DE SOUZA CHAGAS

AUTOGESTÃO NA HABITAÇÃO SOCIAL:


UMA EXPERIÊNCIA NO BAIRRO SANTA MARIA EM ARACAJU-SE

Trabalho Final de Graduação apresentado a


Universidade Tiradentes como um dos pré-
requisitos para a obtenção do grau de bacharel em
Arquitetura e Urbanismo.

Aprovada em ____/____/____.

Banca examinadora

Profª Ma. Heloísa Diniz de Rezende

Orientadora - UNIT

Profª Ma. Lygia Nunes Carvalho

Avaliador Interno - UNIT

Eng.ª Dalva Angélica Santos da Graça

Avaliador Externo
Dedico esta pesquisa à todas as pessoas que, de
alguma forma, constroem a luta pela moradia.
AGRADECIMENTOS

Não queria ser piegas, mas não poderia concluir a pesquisa ignorando todas as pessoas
que se envolveram comigo nesse processo e que sozinhos, não caminhamos tão longe. Afinal,
é sobre isso que a pesquisa fala: trabalho coletivo.

Devo agradecimentos à força do bem que me guia e me faz despertar o interesse em


cuidar do próximo.

Á minha mãezinha, que além de mãe é minha melhor amiga e absolutamente sempre
acreditou em mim. Eu realmente não teria permanecido nessa cidade, não fosse o seu amor
enorme que me protege.

Á minha família que amo tanto mas em especial aos meus avós que são pai e mãe ao
mesmo tempo, sempre zelaram pelos meus estudos e nunca mediram esforços pra me ver
caminhar pra onde quer que fosse; e ao meu pai, que do jeitinho dele, me faz sentir protegida
e amada de forma imensa.

Á minha namorada, por me cuidar com tanto carinho em todos os momentos que eu
pensei que desabaria e, por todos os outros. Eu amo a nossa amizade e como você se faz
presente de uma forma incrível.

Aos meus amigos mais maravilhosos desse mundo, Rafa e Mari. Nós somos tão
diferentes e mesmo assim, nossa amizade é tão incrível porque ela é sincera. Obrigada por
aguentar meus momentos mais chatos.

Á minha orientadora, Helô, maravilhosa. O momento que você chegou aqui nessa
cidade, pra mim, pareceu incrível e predestinado. Obrigada por compartilhar tanto, por
dedicar seu tempo extra a me orientar e me ajudar a descobrir a autogestão, mas sempre
pondo os pés no chão.

Á Lygia, por ser sempre acessível e compartilhar tanto, estando em aula ou não. Eu
admiro muito a professora urbanista que você é.

Á Sheila, por todo o conhecimento compartilhado durante o estágio e por ser sempre
tão compreensiva.

A todos os funcionários da Sociedade Sergipana Monte Sião por compartilhar o


trabalho e me fornecer materiais essenciais para a pesquisa.
RESUMO

A monografia trata da produção de habitação de interesse social por autogestão. As práticas


da autogestão no Brasil começam na década de 80 devido o envolvimento entre a academia,
técnicos e movimentos sociais ao se unirem para pleitear questões relacionadas ao direito à
cidade e ao seu direito de agir na produção da cidade. Essa modalidade de produção se
fortaleceu a partir dos Programas Crédito Solidário e Minha Casa, Minha Vida – Entidades,
ambos do Governo Lula. Assim, se realizou um estudo de caso de um empreendimento no
âmbito do Minha Casa Minha Vida - Entidades na cidade de Aracaju com o objetivo de
investigar dentro dos processos do projeto, a autogestão presente nas suas práticas de caráter
participativo e no reflexo produto dessas ações. O método utilizado no estudo parte de três
eixos norteadores: o Acesso à Terra, que investiga os processos e estratégias para obtenção
do terreno; Aspectos Produtivos, que faz a relação entre o projeto e a obra a partir da
qualidade arquitetônica e urbanística e da relação do mutirão com o canteiro de obras, assim
como a atuação das assessorias técnica e social a partir da sua relação com as famílias
beneficiárias e com a Entidade Organizadora e a atuação do Trabalho Social desenvolvido a
Autogestão, enquanto prática resultante da estrutura organizacional, em que compreende a
mobilização com as famílias, espaços de formação e a atuação das comissões de
acompanhamento previstas nas normas do programa. Assim, o trabalho propõe a hipótese de
que na esfera do Minha Casa Minha Vida - Entidades, o processo do empreendimento está
submetido a diferentes arranjos entre os seus agentes, em que é possível obter múltiplos
resultados que podem contemplar ou apenas permear o conceito de autogestão.

Palavras-chave: habitação social, política habitacional, autogestão, Minha Casa Minha Vida.
ABSTRACT

The monograph deals with the housing production of social interest by self-management. This
practices of self-management in Brazil starts in the 80s due to interactions between the
academia, technicians and social movements as they come together to raise issues related to
the right to the city and their right to act in the city's production. This modality of production
was strengthened by the social programs Solidarity Credit and My House, My Life - Entities,
both part of the Lula Government. Thus, a case study was developed of an enterprise within
the scope of My House My Life - Entities in Aracaju city, with the purpose of investigating
within the project processes, the self-management present in its participatory practices and the
reflex product of these actions.The method used in the study is based on three guiding axes:
Access to the Earth, which investigates the processes and strategies for obtaining the land;
Productive Aspects, which brings the relation between the project and the shell-work based
on the architectural and urban quality and the mutirão relations with the construction site, as
well as the technical and social advisory services based on their relationship with the
beneficiary families and the Organizing Entity; as also the operation of Social Work
developed in Self-management as a resulting practice from the organizational structure,
which includes mobilization with families, training spaces and the performance of the
monitoring committees stated in the program norms. Therefore, this paper proposes a
hypothesis that in the sphere of My House My Life - Entities, the process of the enterprise is
submitted to different arrangements among its agents, in which is possible to obtain multiple
results that may contemplate or only permeate the concept of self-management.

Keywords: social housing, policy housing, self-management, My Home My Life Entities


[...] a solução da questão da habitação não soluciona
simultaneamente a questão social, mas só através da
solução da questão social, e da abolição do modo de
produção capitalista, se torna simultaneamente possível
a solução da questão da habitação. (ENGEL, 1987)
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 01_ZILAH SPOSITO SOB ASSESSORIA TÉCNICA USINA_CTAH ........................................ 34


FIGURA 02_URBANIZAÇÃO SENHOR DOS PASSOS SOB ASSESSORIA TÉCINA USINA_CTAH ......... 34
FIGURA 03_ FLUXOGRAMA DE FUNCIONAMENTO DO MCMV-E ............................................... 50
FIGURA 04_ PROJETO ARQUITETÔNICO CONJUNTO HABITACIONAL JOÃO CÂNDIDO A E B ....... 54
FIGURA 05_ PROJETO REALIZADO PELA CDHU E APRESENTADO À USINA CTAH .................. 55
FIGURA 06_ PROPOSTAS DE PARCELAMENTO DO TRECHO OESTE REALIZADAS PELA
CONSTRUTORA ESECON E PELO USINA ............................................................................... 56
FIGURA 07_PROCESSO DE CONCEPÇÃO PARTICIPATIVO COM AS FAMÍLIAS E ASSESSORIA TÉCNICA
USINA CTAH ..................................................................................................................... 58
FIGURA 8_PROCESSO DE CONCEPÇÃO PARTICIPATIVO COM AS FAMÍLIAS E ASSESSORIA TÉCNICA
USINA CTAH ..................................................................................................................... 58
FIGURA 09_ TIPOLOGIA 01 MUTIRÕES TÂNIA MARIA E CINCO DE DEZEMBRO ......................... 59
FIGURA 10_ TIPOLOGIA 02 MUTIRÕES TÂNIA MARIA E CINCO DE DEZEMBRO ......................... 59
FIGURA 11_ TIPOLOGIA 03 MUTIRÕES TÂNIA MARIA E CINCO DE DEZEMBRO ......................... 60
FIGURA 12_PERSPECTIVA DO PROJETO PARA OS MUTIRÕES TÂNIA MARIA E CINCO DE
DEZEMBRO ......................................................................................................................... 61
FIGURA 13_ OCUPAÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE INTERESSE AMBIENTAL NO BAIRRO PORTO
D'ANTAS ............................................................................................................................. 74
FIGURA 14_ PROJETOS HABITACIONAIS ARACAJU 2000-2014 .................................................. 76
FIGURA 15_DIVULGAÇÃO DA ASSINATURA DO CONTRATO COM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
EM SETEMBRO DE 2014 ...................................................................................................... 86
FIGURA 16_ RENDIMENTO MÉDIO FAMILIAR POR BAIRRO ......................................................... 90
FIGURA 17_ TRAJETO DO EMPREENDIMENTO ATÉ O BAIRRO CENTRO ....................................... 91
FIGURA 18_RUA SEM PEDESTRES NO TRAJETO DO PONTO DE ÔNIBUS MAIS PRÓXIMO ATÉ O
EMPREENDIMENTO ............................................................................................................. 92
FIGURA 19_ PONTO DE ÔNIBUS MAIS PRÓXIMO DO EMPREENDIMENTO ...................................... 92
FIGURA 20_ LOCALIZAÇÃO DO CONDOMÍNIO GETÚLIO ALVES BARBOSA ................................. 93
FIGURA 21_ FAMÍLIAS APÓS O MUTIRÃO NO PONTO DE ÔNIBUS MAIS PRÓXIMO AO
EMPREENDIMENTO ............................................................................................................. 93
FIGURA 22_ RECORTE DO MACROZONEAMENTO PDDU - ARACAJU ......................................... 96
FIGURA 23_ COMÉRCIO LOCAL NA RUA DO EMPREENDIMENTO ................................................. 97
FIGURA 24_ ENTORNO DO EMPREENDIMENTO ........................................................................... 97
FIGURA 25_ ENTORNO DO EMPREENDIMENTO ........................................................................... 98
FIGURA 26_RECORTE DAS ÁREAS DE DIRETRIZES DO PDDU - ARACAJU.................................. 98
FIGURA 27_PROJETO ARQUITETÔNICO CONDOMÍNIO GETÚLIO ALVES BARBOSA - TIPOLOGIA 01
......................................................................................................................................... 105
FIGURA 28_PROJETO ARQUITETÔNICO CONDOMÍNIO GETÚLIO ALVES BARBOSA - TIPOLOGIA 02
......................................................................................................................................... 106
FIGURA 29_SALA DE ESTAR/JANTAR EM FASE DE OBRA - TIPOLOGIA 02 ................................. 107
FIGURA 30_ COZINHA EM FASE DE OBRA - TIPOLOGIA 02 ........................................................ 108
FIGURA 31_ QUARTO 02 EM FASE DE OBRA - TIPOLOGIA 02 .................................................... 109
FIGURA 32_ BLOCO TIPO ......................................................................................................... 109
FIGURA 33_IMPLANTAÇÃO ...................................................................................................... 110
FIGURA 34_MAQUETE ELETRÔNICA - EQUIPAMENTOS DE IMPLANTAÇÃO............................... 111
FIGURA 35_MAQUETE ELETRÔNICA - ESPAÇO DE CONVIVÊNCIA EM ZONA ENTRE BLOCOS ..... 111
FIGURA 36_CANTEIRO DE OBRAS - COND. GETÚLIO ALVES BARBOSA ................................... 112
FIGURA 37_ FAMÍLIAS EM MUTIRÃO NA OBRA ......................................................................... 113
FIGURA 38_FAMÍLIAS EM MUTIRÃO NA OBRA .......................................................................... 114
FIGURA 39_ FAMÍLIAS EM MUTIRÃO NA OBRA ......................................................................... 114
FIGURA 40_ CRIANÇAS NO ESCRITÓRIO DO CANTEIRO DE OBRAS EM DIA DE MUTIRÃO ............ 121
FIGURA 41 _ REUNIÃO COM AS FAMÍLIAS NO CANTEIRO DE OBRAS EM DIA DE MUTIRÃO ......... 123
LISTA DE TABELAS

TABELA 1_ EVOLUÇÃO DOS DADOS SOBRE INADIMPLÊNCIA DAS COHABS - BRASIL - 1971/1974
........................................................................................................................................... 26
TABELA 2_FINANCIAMENTOS HABITACIONAIS CONCEDIDOS ATRAVÉS DE SFH ATÉ 31 DE
DEZEMBRO DE 1980 ............................................................................................................ 26
TABELA
3_INVESTIMENTOS DO GOVERNO FEDERAL*EM HABITAÇÃO DISTRIBUIDOS POR FAIXA DE R
ENDA (1993‐2002) ............................................................................................................. 37
TABELA 4_ AMPLIAÇÃO DAS RENDAS PARA O MCMV .............................................................. 47
TABELA 5_ UNIDADES HABITACIONAIS CONSTRUÍDAS PELO PROGRAMA DE ARRENDAMENTO
RESIDENCIAL – PAR – 2001 - 2009 .................................................................................... 71
TABELA 6_PROJETOS HABITACIONAIS ARACAJU 2000-2014 .................................................... 75
TABELA 7_ PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL – PAR EMPREENDIMENTOS E
UNIDADES HABITACIONAIS 2001-2008 ............................................................................. 77
TABELA 8_ PRODUÇÃO ATUAL MCMV ..................................................................................... 77
TABELA 9_ ARACAJU - DISTRIBUIÇÃO DAS UNIDADES HABITACIONAIS E DÉFICIT
HABITACIONAL 2009 A 2014 ............................................................................................. 78
TABELA 10_ COMPOSIÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE HABITAÇÃO EM ARACAJU ............. 83
LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1_ EVOLUÇÃO DOS INVESTIMENTOS FEDERAL EM HABITAÇÃO (2002 A 2007)........... 39


GRÁFICO 2_ DISTRIBUIÇÃO DE SUBSÍDIOS DO FGTS POR FAIXA DE RENDA ........................... 40
GRÁFICO 3_ DISTRIBUIÇÃO DE SUBSÍDIOS DO FGTS POR FAIXA DE RENDA ............................. 40
GRÁFICO 4_ RITMO ANUAL DAS CONTRATAÇÕES DO PCS (JUNHO 2004/AGOSTO 2011)............ 45
GRÁFICO 5_ MCMV - ENTIDADES: PERCENTUAL DO DÉfiCIT HABITACIONAL 2010 E
PERCENTUAL DE UNIDADES HABITACIONAIS CONTRATADAS POR ESTADO (JANEIRO, 2015)
........................................................................................................................................... 52
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

AEIS – Áreas Especiais de Interesse Social

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

BNH – Banco Nacional de Habitação

CA – Compra Antecipada

CAO – Comissão de Acompanhamento de Obras

CEF – Caixa Econômica Federal

CEHOP – Companhia de Habitação e Obras Públicas

CDHU - Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano

COHAB/SE – Companhia de Habitação Popular de Sergipe

COHAB – Companhias de Habitação Popular

CONAM – Confederação Nacional das Associações de Moradores

CNPJ – Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica

CMH – Conselho Municipal de Habitação

CGFNHIS – Conselho Curador do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social

CONDESE – Conselho de Desenvolvimento de Sergipe

CRE – Comissão de Representantes

DESO – Companhia de Saneamento de Sergipe

DI - Desenvolvimento Institucional de Municípios

EC – Estatuto da Cidade

EMURB – Empresa Municipal de Obras e Urbanização

ENEA – Encontro Nacional das e dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo

FCP – Fundação da Casa Popular

FENEA – Federação Nacional das e dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

FICAM – Financiamento para Construção Ampliação e Melhorias

FUCAVAM – Federacción Uruguaya de Cooperativas de Vivienda por Ayuda Mútua


FUNDAP – Fundo Estadual de Habitação Popular

FUNDESE – Fundação de Desenvolvimento Urbano de Sergipe

FNHIS - Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social

FNMP – Fundo Nacional de Moradia Popular

FNRU - Forúm Nacional de Reforma Urbana

INOCOOP – Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais

GIDURs – Gerência de Desenvolvimento Urbano da CEF

GRPU – Gerência Regional do Patrimônio da União

HABI – Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano e executado pela


Superintendência de Habitação Popular

OGU – Orçamento Geral da União

MCMV – Minha Casa, Minha Vida

MCMV-E – Minha Casa, Minha Vida- Entidades

MDU – Ministério de Desenvolvimento Urbano

MCID - Ministério Das Cidades

MNLM – Movimento Nacional de Luta pela Moradia

MOTU – Movimento dos Trabalhadores Urbanos

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto

ONG – Organização Não Governamental

OP – Orçamento Participativo

OPH – Orçamento Participativo de Habitação

PAR – Programa de Arrendamento Residencial

PCS – Programa Crédito Solidário

PLS – Planilhas de Levantamento de Serviço

PLANHAP – Plano Nacional de Habitação Popular

PLHIS – Plano Local de Habitação de Interesse Social


PDDUS – Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Sustentável

PPS – Programa de Prioridades Sociais

PMA – Prefeitura Municipal de Aracaju

PNH – Política Nacional de Habitação

PROFILURB – Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados

PAC – Programa de Aceleração ao Crescimento

PNHU – Programa Nacional de Habitação Urbana

PNHR – Programa Nacional de Habitação Rural

PROMORAR – Programa de Erradicação da Sub-Habitação

PSH – Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social

PTTS – Projeto de Trabalho Técnico Social

SEAC – Secretaria Especial de Ação Comunitária

SEDURB – Secretaria de Desenvolvimento Urbano de Sergipe

SEHAP – Secretaria de Habitação e Previdência Social

SEMASC – Secretaria Municipal e Assistência Social e Cidadania

SEPLOG – Secretaria de Planejamento Orçamento e Gestão

SEPURB – Secretaria de Política Urbana

SERASA – Centralização dos Serviços Bancários S/A

SFH – Sistema Financeiro de Habitação

SIFHAP – Sistema de Habitação Popular

SM – Salário Mínimo

SNHIS -Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social

SSMS – Sociedade Sergipana Monte Sião

TP – Terreno Próprio

TTS – Trabalho Técnico Social

UAS – Urbanização de Assentamentos Subnormais


UMM – União dos Movimentos de Moradia

UNMP - União Nacional por Moradia Popular

URBEL – Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte

ZAB – Zona de Adensamento Básico


Sumário
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 18
2. O PERCURSO DA AUTOGESTÃO ALIADO A HABITAÇÃO SOCIAL NO BRASIL . 21
2.1 RETROSPECTO DA HABITAÇÃO SOCIAL NO BRASIL: BNH AO MCMV ........... 22
2.2 PRÁTICAS NO MCMV-ENTIDADES ............................................................................. 46
3. POLÍTICAS DE HABITAÇÃO SOCIAL EM ARACAJU ................................................ 60
3.1 ATUAÇÃO DOS PROGRAMAS HABITACIONAIS NO ÂMBITO ESTADUAL E
MUNICIPAL ........................................................................................................................ 61
3.2 OS AGENTES PRODUTORES DA HABITAÇÃO EM ARACAJU ............................ 78
4. ESTUDO DO CONDOMÍNIO GETÚLIO ALVES BARBOSA NO ÂMBITO DO
MCMV-ENTIDADES ............................................................................................................. 84
4.1 O ACESSO À TERRA ................................................................................................... 88
4.2 ASPECTOS PRODUTIVOS .......................................................................................... 99
4.3 AUTOGESTÃO ........................................................................................................... 117
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 124
REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 128
1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de compreender a autogestão enquanto modelo de


administração dos empreendimentos voltados para a habitação de interesse social.

O interesse pelo tema se deu em meados de 2015 com o primeiro contato in loco, com
a luta pela moradia na comunidade da Vila Autódromo no Rio de Janeiro, facilitada pelo
envolvimento com a construção do Enea Rio 2015 - Encontro Nacional dos Estudantes de
Arquitetura e Urbanismo (ENEA), promovido pela Federação Nacional dos e das Estudantes
de Arquitetura e Urbanismo (FENEA). A comunidade naquela época sofria com demolições
ilegais e um cenário devastado em um contexto de posturas higienizadoras e repressoras
vindas do governo atual na produção da futura cidade Olímpica.

Conhecer as líderes dos movimentos, e compartilhar mesmo que por quinze dias dessa
luta fizeram-me elucidar algumas questões e, ao ver os interesses privados se sobressaírem em
detrimento de uma comunidade me fez sentir, um pouco na pele, como na prática, a nossa
política habitacional é preconceituosa e opressora.

Depois dessa experiência, descobri a autogestão a partir do documentário Copromo;


que apresenta o surgimento da autogestão no Brasil e exemplifica o seu êxito a partir deste
Conjunto Habitacional, na cidade de Osasco, no estado de São Paulo. Assim, entender o
momento em que a autogestão surge com a aproximação de profissionais de arquitetura,
1
organizados em assessorias técnicas juntamente aos movimentos sociais tentando inseri-lo
na política habitacional me demonstrou como isso se trata do reconhecimento e legitimação
das ocupações, e a urgência de uma produção habitacional de interesse social de qualidade
arquitetônica e com a preocupação da sua inserção urbana.

A escassez de profissionais na área da arquitetura e urbanismo que se dedicam a


trabalhar a habitação social e se envolverem como assistência técnica, se faz enquanto
dificuldade dentro da demanda que existe no país. Neste contexto o mercado passa a produzir
em grande escala na periferia com um nível baixo de qualidade através de construtoras onde,
na maioria das vezes, o lucro se faz enquanto objetivo2; assim, as famílias entram em um
processo de alijamento das demandas de construção da habitação e o seu direito à uma
moradia digna e adequada são negados.

1
A assessoria técnica se refere a um grupo que fornece assistência para a concepção e execução de projetos.
2
KOKUDAI, Sandra (2014). AT e Autogestão e As Experiências no Brasil. In: Assistência Técnica e Direito à
Cidade. FNA.
19
A autogestão está inserida na produção da habitação social enquanto bandeira de
alguns movimentos de moradia. As suas lutas estão baseadas na compreensão do controle e
participação popular na implementação de Políticas Públicas que a contemplem. Assim,
Kokudai (2014) afirma que o controle das etapas de construção vai além da construção em si,
mas enquanto um processo de inserção das comunidades tornando-as atuantes, onde, se
comparada ás práticas de mercado, quando as famílias controlam o processo, é possível
combater o desperdício e a corrupção que pode haver neste sistema.

Dentro do histórico da política habitacional no Brasil, a autogestão representa um


momento significativo na esfera da qualidade arquitetônica e principalmente representativa
para a ascensão dos movimentos populares no caminho para uma governança democrática e
participativa. É importante ressaltar que as práticas da autogestão no Brasil acontecem devido
o envolvimento entre a academia, técnicos e movimentos sociais ao se unirem para pleitear
questões relacionadas ao direito à cidade e ao seu direito de agir diretamente na produção da
cidade. Dessa forma, ao levar em consideração também o contexto da suspensão de recursos
3
para a produção habitacional de interesse social, este momento se mostra crítico e assim,
torna-se imprescindível o estudo e o envolvimento da academia com o tema.

Com isso, foi observada a necessidade de realizar um estudo de a fim de analisar um


empreendimento no âmbito do Minha Casa Minha Vida Entidades (MCMV-E) por esta ser a
modalidade que, hoje, possibilita a produção da habitação social de forma autogestionária e,
além disso, se destina às famílias com renda de até dois salários mínimos, representando
assim a maioria do déficit habitacional no país.

O conjunto analisado, é o Conjunto Getúlio Alves Barbosa e está localizado no


Loteamento Santa Maria, na cidade de Aracaju-SE. Sendo assim, na seção 4, foram definidos
três eixos principais que poderiam ser investigados: os modos de Acesso à Terra, formulados
pela Entidade Organizadora para adquirir um terreno dentro dos moldes delineados pelo
programa; os Aspectos Produtivos, que abrange a relação entre projeto e obra a partir da
qualidade arquitetônica e urbanística do empreendimento e da relação com os aspectos do
mutirão e da participação das famílias no processo produtivo e a participação das assessorias
técnica e social na elaboração de projetos e nos serviços de apoio ao acompanhamento e
gestão das obras, e o exercício do trabalho Técnico Social (TTS) proposto; a Autogestão,
3
Raquel Rolnik explicita em seu blog a proposta do orçamento de 2018 sobre os direcionamentos dos gastos
com os recursos arrecadados através de impostos e taxas recolhidos pelo Governo Federal, o Projeto de Lei (PL)
020/2017).
20
como prática resultante da estrutura organizada pela Entidade para o acompanhamento e
gestão do processo de contratação e de administração do empreendimento a partir dos
processos para seleção, credenciamento, mobilização, formação política e organização das
famílias que viriam a ser “beneficiárias” do programa.

Assim, a seção 2 tem objetivo de traçar um retrospecto das Políticas Habitacionais no


Brasil e a autogestão aliada a esses processos. Para isso, ela aborda detalhadamente a
trajetória da autogestão a partir da implementação do Banco Nacional de Habitação (BNH)
até o programa mais atual, o Minha Casa Minha Vida (MCMV), assim passando por
experiências pioneiras da autogestão, como é o caso de São Paulo na Gestão Erundina com as
experiências do Funaps Comunitário; assim como as tentativas de inserção dessa política
enquanto integrante da política habitacional no país e um recorte sobre as experiências do
MCMV-E - esse que possibilita as práticas autogestionárias.

A seção 3, tem o objetivo de analisar a nível local as Políticas Habitacionais e a


atuação dos agentes produtores dessa habitação; logo, abordará os caminhos percorridos pelas
Políticas Habitacionais na cidade de Aracaju e Região Metropolitana, a fim de compreender
as relações de produção na esfera habitacional, destacar e entender as suas ações a partir dos
agentes produtores dessa habitação. Para a produção desta seção foi utilizada pesquisa
bibliográfica, baseada em pesquisadores que tratam a questão habitacional em Sergipe, e a
partir da coleta de dados em órgãos estaduais e municipais responsáveis pela mediação na
produção do espaço urbano no que diz respeito à habitação. Para entender a forma como se
consolida essa política, busca-se assimilar o modo de construção e governança da cidade de
Aracaju levando em consideração o contexto da origem da formação do espaço urbano, as
políticas habitacionais que foram desenvolvidas ao longo dos anos e os agentes produtores
dessa habitação.

21
2. O PERCURSO DA AUTOGESTÃO ALIADO A HABITAÇÃO SOCIAL NO
BRASIL
A autogestão, em seu primeiro conceito, significa a gestão coletiva e, em alguns países
socialistas, gestão de uma empresa a partir de seus trabalhadores 4; ou seja, trata-se das
transformações das relações de produção.5 O objetivo desta seção, entretanto, é a abordagem
da autogestão dentro da produção de habitação de interesse social e a sua trajetória aliada à
trajetória das políticas habitacionais no Brasil. O foco aqui abordado da autogestão busca
entender esse processo a partir da perspectiva da população das classes sociais mais baixas,
estas, excluídas do mercado formal, mas que, buscaram a sua forma de autoconstruir com seus
próprios recursos financeiros e mão de obra; se encontrando na maioria das vezes em terrenos
da cidade informal e carentes de infraestrutura urbana.6

Dessa forma, percebe-se que esteve o povo a construir suas casas e sua história: "A
autoconstrução, o mutirão, a auto-ajuda, a ajuda mútua são termos usados para designar um
processo de trabalho calcado na cooperação entre as pessoas, na troca de favores, nos
compromissos familiares, diferenciando-se portanto das relações capitalistas de compra e
venda da força de trabalho."7 Para uma melhor compreensão, é importante salientar a
diferença entre autoconstrução (mutirão) e a autogestão que será abordada na pesquisa. A
primeira se refere à ação de construir, com a própria força de trabalho em regimes de mutirão
e trabalho coletivo, e a segunda não necessariamente implica a participação na obra em si,
mas sim a gestão e a tomada de decisões de forma autônoma e democrática; se distinguindo
ambas da heterogestão, produzida por empreiteiras.8

A autogestão aliada à produção da habitação de interesse social no Brasil, surge


enquanto emergem os movimentos populares na década de 80 no âmbito das reivindicações
impulsionadas pela conjuntura política daquela época. É importante salientar aqui, que tais
transformações são decorrentes de muita luta pelo acesso à moradia e, se hoje existe
referências nesse modelo de gestão e de implementação de uma política habitacional que pode

4
AUTOGESTÃO. In: DICIONÁRIO AURÉLIO. Disponível em: https://dicionariodoaurelio.com/autogestao.
Acesso em 17 set. 2017.
5
No âmbito da arquitetura e do urbanismo, conceito defendido por Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo
Lefébvre na Arquitetura Nova - movimento surgido na década de 60 que questionava as relações de produção no
canteiro de obras e a autonomia por meio do trabalho livre.
6
A opção habitacional para a maioria da população cobre consiste em cortiços, favelas, loteamentos clandestinos
- localizados na periferia das metrópoles -. Logo, a autoconstrução torna-se a única solução possível para estas
camadas populares. (AZEVEDO, 1989, P. 116)
7
MARICATO, E., 1982, p. 71
8
OLIVEIRA, 2012
22
ser de fato, democrática, é resultante de um processo das pressões realizadas diante o poder
público no qual a academia, técnicos e movimentos sociais uniram os seus conhecimentos
para pleitear questões relacionadas ao direito à cidade diante do poder público; conseguindo
destes, respostas que contemplam as questões sociais; tais relações serão abordadas nos
subcapítulos seguintes.

2.1 RETROSPECTO DA HABITAÇÃO SOCIAL NO BRASIL: BNH AO


MCMV

A autogestão na habitação é um processo em que, de forma organizada, os futuros


moradores gerenciam, em todos os aspectos, a construção das suas casas. (BONDUKI, 1992)
Esta carrega a ideia da prática de uma autonomia, politização e a busca pela inalienação. Com
a autogestão na habitação permite-se quebrar as barreiras da habitação enquanto um produto e
trazer à tona a sua importância enquanto um processo.

Partindo do contexto do golpe militar em 1964, acontece a criação do Banco Nacional


de Habitação (BNH) como nova alternativa à questão da habitação, entretanto, ainda que
apresentado enquanto uma nova instituição que se diferencia do que já havia sido feito com a
Fundação da Casa Popular (FCP)9, o BNH se apresenta com os mesmos mecanismos na busca
por efeitos positivos no contexto de crise econômica do país. Isso se comprova com a
intenção de ambas em legitimar o Estado com o discurso da preocupação com a questão da
habitação, se colocando ao lado dos direitos populares.

A necessidade de atrelar o acesso à aquisição da casa própria não se devia apenas a


um intuito político e ideológico; as implicações econômicas dessa decisão foram de
suma importância no percurso do BNH. Foi no ideal da casa própria que o BNH
encontrou o fertilizante perfeito para propagar uma política econômica
fundamentada na produção de moradia. (MEDEIROS, 2015: p.2)

Ainda que carregasse uma visão de banco, o BNH e as demais políticas de habitação,
tem na sua trajetória a tentativa de atingir as camadas populares e as exigências sociais; dessa
forma, criou-se alguns mecanismos que ao longo do tempo facilitaram a obtenção de crédito e
posteriormente a correção das dívidas causadas pela aquisição, ainda que em baixo custo.10

A partir de 1977, reconhecendo que as COHABs não estavam atingindo plenamente


a população cujos rendimentos estavam na faixa de O a 3 SM, o BNH aprofunda sua
tentativa de atingir essa parcela majoritária da população do país. São implantados

9
Fundação da Casa Popular- Criada em 1946 no Governo Dutra como primeiro órgão brasileiro de política
habitacional.
10
AZEVEDO, S., VINTE E DOIS ANOS DE POLÍTICA DE HABITAÇÃO POPULAR (1964-86): CRIAÇÃO,
TRAJETÓRIA E EXTINÇÃO DO BNH, P. 112.
23
programas como o Programa de Financiamento da Construção ou Melhoria da
Habitação de Interesse Social (FICAM) em 1977, é reformulado o Programa de
Lotes Urbanizados (PROFILURB) em 1978, volta a tabela price para a correção da
dívida do mutuário em 1979, nesse ano ainda é criado o PROMORAR, e em 1980 o
Programa Nacional de Habitação para o Trabalhador Sindicalizado (PROSINDI).
(MARICATO, 1987: p.54)

É assim, como Maricato explica acima, que a forma popular de construção de moradia
- a autoconstrução - é institucionalizada pela primeira vez enquanto política pública no Brasil.
No contexto do estado de São Paulo - pioneiro, nessas questões no Brasil -, essas ações estão
também ligadas à eleição de Franco Montoro em 1982. Montoro propôs ações que
dialogavam com os movimentos populares e que apoiavam a autoconstrução. Nesse contexto,
segundo Royer (2002), as iniciativas do Governo do Estado nesse período foram resultados de
pressões dos movimentos de moradia que, desde 1981 seguiam em ritmo crescente. Assim, é
importante ressaltar as primeiras reuniões no Centro Pastoral Belém, a partir de 1985; estas
dariam origem posteriormente à União dos Movimentos por Moradia (UMM). (TATAGIBA e
TEIXEIRA, 2016) No âmbito municipal, na cidade de São Paulo, no governo de Mário
Covas (1983-1985), acontecem experiências significativas que introduziriam a ideia da
autogestão enquanto modelo de gestão para a produção de habitação social, assim, financiado
pelo Promorar, surge o Mutirão da Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte de São Paulo; este
será abordado mais a frente ainda neste subcapítulo.

Entretanto, marcando a descontinuidade nas iniciativas alternativas da política


habitacional, ainda referenciando o Estado de São Paulo, o início do governo de Orestes
Quércia (1987-1991) é marcado pela extinção do programa mutirões - iniciado na gestão
Montoro -, onde, Royer afirma que nesse governo "a solução empresarial ganha força, ficando
os programas alternativos como marginais, com finalidades políticas bem delimitadas”.
Assim, é possível perceber como a trajetória da política habitacional é marcada pela
prioridade dada aos investimentos no setor privado em detrimento das políticas de ação
democrática.

Paralelamente às experiências explicitadas acima, em que alguns instrumentos de


viabilização tinham sido pensados na política do BNH, passa a existir uma inadimplência de
pagamento11 por parte das camadas de menor poder aquisitivo - conforme pode ser constatado
na Tabela 1 - como resultado do contexto econômico do país aliado às medidas militares para

11
" O índice de inadimplência andava por volta de 90%. Muitos moradores provindos de favelas e cortiços nunca
pagaram qualquer prestação." (MARICATO, E. Política Habitacional no Regime Militar, p. 43, 1987)
24
12
resolver essas questões, a exemplo, o "arrocho salarial" - que diminuiu o poder de compra
do salário mínimo. Assim, o BNH passa a reduzir consideravelmente os investimentos para
as famílias de menores rendas e aumentar para o então chamado "mercado médio"13, uma vez
que as taxas de juros eram mais altas e o índice de inadimplência era menor se comparado ao
das classes mais pobres; assim, segundo Sérgio de Azevedo, a saída da crise se daria pela
reformulação da política habitacional.14

Dessa forma, a única saída para as famílias pobres era recorrer a ocupação da cidade
informal em favelas e loteamentos clandestinos nas periferias das cidades em regime de
autoconstrução.15 Para Bonduki, o grande equívoco dessa política foi, justamente, ignorar
esses processos que passaram a ocorrer, sem estruturar uma ação que fosse significativa para a
organização desses processos alternativos de ocupação da cidade e que pudesse estimular a
capacidade organizativa das comunidades, assim, acentuando um intenso processo de
urbanização informal.16 É importante salientar que a observação feita por Bonduki explicita o
contexto nacional de atuação do BNH, uma vez que acontecem de forma pontuais as
relevâncias dadas a estes processos e que, como está sendo apresentado, ainda assim é
marcado pela descontinuidade das suas ações e o acirramento com os movimentos sociais.
Diante dos contextos esclarecidos, é notório como a questão da habitação enquanto
direito básico - este a ser incluído posteriormente na Constituição Federal de 1988 - até então
não fora primordial. A ideia de aliar os objetivos sociais da política de habitação com o
modelo empresarial resulta numa ferramenta de sustentação da economia apostando sempre
nos investimentos do setor privado e no estímulo da produção e enriquecimento do setor
imobiliário e da construção civil.

Dessa forma, a Tabela 2 mostra os resultados obtidos ao longo da atuação do BNH,


em que, percebe-se o seu enfoque na habitação para a população com renda de três a cinco
salários mínimos - camadas essas, que podiam se manter na política financeira do programa -,
12
"Política implantada pelo regime militar sob a alegação de resolver os problemas econômicos da época,
significou uma diminuição progressiva dos salários reais das classes de baixa renda." (AZEVEDO, S., VINTE E
DOIS ANOS DE POLÍTICA DE HABITAÇÃO POPULAR (1964-86): CRIAÇÃO, TRAJETÓRIA E
EXTINÇÃO DO BNH, P. 112.)
13
"Do total de moradias produzidas, 35% foram destinadas ao “mercado popular”, com comprometimento de
apenas 13% de todos os recursos investidos pelo BNH." (MOTTA, L., A QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO
BRASIL: POLÍTICAS PÚBLICAS, CONFLITOS URBANOS E O DIREITO À CIDADE)
14
AZEVEDO, S., VINTE E DOIS ANOS DE POLÍTICA DE HABITAÇÃO POPULAR (1964-86): CRIAÇÃO,
TRAJETÓRIA E EXTINÇÃO DO BNH, P. 113.
15
MOTTA, L., A QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO BRASIL: POLÍTICAS PÚBLICAS, CONFLITOS
URBANOS E O DIREITO À CIDADE
16
BONDUKI, N., Descentralização da Política Habitacional e a Experiência de São Paulo (1989-1992), Escola
de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo - Brasil;
25
não atendendo assim às camadas populares que correspondiam verdadeiramente ao déficit
habitacional por não conseguir se inserir no mercado formal e nem na política financeira do
programa; comprovando como a discussão da habitação naquele momento serve, mais uma
vez, para sustentar a economia em detrimento da efetivação de uma política habitacional, de
fato, para os mais pobres.

Tabela 1_ Evolução dos dados sobre inadimplência das COHABs - Brasil - 1971/1974

ANO % HABITAÇÕES COM % HABITAÇÕES COM


ATRASO MAIS DE 3 MESES DE
ATRASO
1971 50 30
1972 54 25
1973 54 28
1974 67 30
Fonte: Banco Nacional de Habitação (BNH). Carteira de operações de Natureza Social, Serviço de
Estatística e Informações apud. MARICATO, E. 1987

Tabela 2_Financiamentos Habitacionais concedidos através de SFH até 31 de dezembro de 1980

CLIENTELA UNIDADES %
FINANCIADAS
Mercado popular* 1.004.84 35,0
Mercado econômico** 627.824 21,8
Mercado médio*** 1.241.175 43,2
Total 2.873.883 100,0
*Cohabs e habitações construidas diretamente pelo BNH para população de baixa renda.
**Cooperativas Habitacionais, Institutos, Mercado de Hipotecas
***SBPE e Recon
Fonte: Banco Nacional de Habitação (BNH), Departamento de Planejamentos e Coordenação (Dplan).
Rio. 1981 apud AZEVEDO, Sérgio de; ANDRADE, 2011.

Nos últimos anos do Regime Militar, o país se encontrava numa conjuntura política de
reivindicações pelas eleições diretas para presidente e pela Constituinte; dessa forma
continuava a crescer a mobilização popular, fazendo nascer movimentos sindicais que viriam

26
também pleitear a questão da moradia. Em 1985, com o fim desse regime, ocorre a crise17 do
Sistema Financeiro da Habitação 18 e da necessidade de exigir-se novas formas de governança
e novos sujeitos para atuar dentro da política habitacional; o início da Nova República viria a
propor essas modificações. Dessa forma, uma comissão para propor sugestões é criada e nela
é agregada a Associação dos Arquitetos do Brasil19 a fim de fomentar debates que envolvesse
os domínios universitário, entidades de classe e associações. Explica Azevedo: " a maioria das
propostas giravam em torno de temas como descentralização, prioridade social e criação de
instrumentos de equilíbrio financeiro, através da modifIcação da legislação em vigor."20 No
entanto, em 1986 o atual presidente, José Sarney, abortou esse processo e decretou a extinção
do BNH.

Assim, com a extinção do BNH e a não introdução a novos mecanismos de


financiamento para habitação popular, acontece um esvaziamento nas medidas para a política
habitacional e emergem os movimentos populares. Assim, a reunião dos fatores que
decretavam a depreciação das políticas de habitação popular resultou num processo acelerado
de ocupações de terras, principalmente nas regiões periféricas (Bonduki, 1994a). 21

Ao ser extinto, suas funções precisaram ser divididas22 entre o Banco Central, a Caixa
Econômica Federal (CEF) - enquanto gestora do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
(FGTS), o Ministério de Desenvolvimento Urbano (MDU) - responsável pela política
habitacional dos programas tradicionais e a Secretaria Especial de Ação Comunitária (SEAC),
reponsável pelos programas alternativos enquanto alguma das medidas pontuais que foram
tomadas pelo Estado e, ainda que não tenham sido levadas à frente no sentido de uma
reestruturação da política habitacional, precisam ser citadas enquanto embriões da autogestão
em resposta ao que pleiteavam os movimentos.

17
"A recessão econômica atingiu plenamente a indústria da construção e o mercado imobiliário no início dos
anos 80." (MARICATO, E, 1987: p. 85)
18
O Sistema Financeiro da Habitação (SFH) foi criado em meados da década de 60, pela Lei nº 4.380, de 1964,
no âmbito de uma reformulação geral do Sistema Financeiro Nacional. A Mesma Lei instituiu a correção
monetária, com o objetivo de abrir o mercado para a colocação de títulos do governo e viabilizar financiamentos
de longo prazo. (Fonte: <http://www.resimob.com.br/a-historia-do-sfh-sistema-financeiro-da-habitacao/> Acesso
em: 15 set. 2017)
19
Instituto de Arquitetos do Brasil- IAB é entidade de livre associação de arquitetos e urbanistas brasileiros, que
se dedica a temas de interesse do arquiteto, da cultura arquitetônica e de suas relações com a sociedade. Fundado
no Rio de Janeiro em 26 de janeiro de 1921. (Fonte:< http://www.iab.org.br/quem-somos> Acesso em: 15 set.
2017)
20
AZEVEDO, S., VINTE E DOIS ANOS DE POLÍTICA DE HABITAÇÃO POPULAR (1964-86): CRIAÇÃO,
TRAJETÓRIA E EXTINÇÃO DO BNH, P. 118.
21
BONDUKI, 1994a apud TATAGIBA; TEIXEIRA, 2016.
22
SANTOS, 1999 apud MOREIRA, A. F. 2009
27
Programas alternativos baseados na autoconstrução foram lançados - alguns já citados
-; em 1985 tem-se o Programa Mutirões, vinculado ao PPS (Programa de Prioridades Sociais)
e, em 1987 o Programa Nacional de Mutirões Habitacionais, coordenado pela SEAC.

Programa Nacional de Mutirões Comunitários voltado a famílias com renda inferior


a três salários mínimos. Com um bom aporte de recursos a fundo perdido este
programa propunha financiar cerca de 550 mil unidades habitacionais, mas a
ausência de uma política clara para o programa acabou levando-o ao fracasso,
avaliando o programa conclui-se que menos de um terço do previsto acabou sendo
executado. (BOTEGA, R. L., Periódico de Divulgação Científica da FALS Ano I -
Nº 02- Março de 2008 p. 11)

Visto a não continuidade destes programas e a ausência de uma política que o


embasasse, é importante relembrar o contexto de crise financeira em que se encontrava o país
e a tendência neoliberal que continha o governo atual em questão - Governo Sarney seguido
do Governo Collor -, dificultando a sua ação contínua na política habitacional.23

24
No contexto de crise financeira vale ressaltar a Resolução nº 1.464 de 26/02/88 que
resulta na restrição de crédito por parte da CEF às companhias e associações, ampliando
25
assim, créditos destinados ao setor privado para o âmbito da habitação - situação que até
hoje dificulta o acesso à cidade formal pela priorização do setor privado enquanto produtor da
habitação de interesse social. É importante também se voltar para o objeto de estudo desta
pesquisa, a autogestão na habitação de interesse social, e ressaltar que a experiência acima
citada não se trata da prática de uma autogestão, uma vez que lhe é somente aplicado o regime
de mutirão afim de baratear a mão de obra e ficando o Governo à cargo de subsidiar as demais
necessidades, não envolvendo os beneficiários numa gestão participativa.

Moreira (2009) avalia que, nesse período, a política habitacional parecia ter boas
chances dentro do privilégio da existência de um Ministério que cuidaria diretamente da
questão da habitação, porém no decorrer dos anos passa a existir um "troca-troca"26
ministerial responsável por tal atribuição, logo, passa-se a ter na esfera institucional uma
desarticulação, o que justificaria a falta de continuidade de propostas para substituir a política
habitacional anterior.

23
" A visão neoliberal pretende a mínima intervenção do Estado em todas as esferas, inclusive na da política
social e na de habitação." (CARRION, K. B. O., NOVA POLÍTICA HABITACIONAL: UMA VELHA
QUESTÃO, p. 297)
24
Ação que previu restrições financeiras de acesso ao crédito.
25
MOREIRA, 2009
26
"Ao longo do governo Sarney, a SEAC-
Secretaria Especial de Ação Comunitária esteve vinculada inicialmente ao Ministério do Planejamento, à Casa
Civil da Presidência, depois passou a fazer parte do Ministério da Habitação e Bem‐Estar Social, do Ministério
da Previdência e, por fim, vinculou‐se ao Ministério do Interior. " (MOREIRA, 2009)
28
Em 1988, com a Nova Constituição, que prevê o fim da centralização político-
administrativa, permite então uma autonomia às cidades e a sua gestão:

A recuperação das bases federativas do Estado brasileiro tem impacto sobre o


processo de descentralização das políticas sociais no país pelo fato de que,
resguardados pelo princípio da soberania, estados e/ou municípios assumem a gestão
de políticas públicas sob a prerrogativa da adesão, precisando, portanto, ser
incentivados para tal. (ARRETCHE, 1999: p. 112)

É nesse período que acontece a primeira experiência de mutirão no Brasil: o Mutirão


Vila Nova Cachoeirinha27, na Zona Norte de São Paulo. Sendo um dos resultados do
programa Promorar em São Paulo; a experiência instigada através das vivências trazidas pelo
engenheiro Guilherme P. Coelho que, ao visitar o Uruguai, volta e passa a promover a
exibição de um filme em super-8, com registro dos conjuntos habitacionais promovidos pelas
Cooperativas de Ayuda Mutua em regime de mutirões e autogestão, e organiza sessões do
filme nas periferias de São Paulo fazendo assim nascer uma nova esperança nesse novo modo
de política democrática:

"Quando o Guilherme veio pra gente tinha aquele filmezinho dele, que ele ia,
passava, mostrava em tudo que era favela [...] Aí ele passou o Projeto do Uruguai.
Quando ele passa, então, ele explicou bem o que era Ajuda-Mútua, que a gente
tinha que ajudar um ao outro [...] Nós ia saber o que era uma comissão de compras,
nós ia construir a nossa casa, sabe? Ia ver o que era uma casa de boa qualidade,
nós ia tomar consciência. E quando ele explicou tudo direitinho, ele com toda a
calma, passando parte por parte do filme, a partir daquele momento eu sentia que o
pessoal, assim, já tinha ficado encantado. Vimos que o Promorar não tinha nada a
ver. Pensamos: agora nós vamos chegar lá! Aí todo mundo no ônibus: “a gente vai
batalhar por esse projeto, a gente vai trabalhar pra esse projeto sair”. Nesse
momento, a gente encostou junto do Guilherme e falou: “Olha Guilherme, você
nunca mais vai deixar a gente."

Jacira Rodrigues - Depoimento em “Arquiteto Pau-de-Arara"


(BARAVELLI, 2006: p. 106)

Em 1984 aconteceu a vinda das primeiras lideranças e técnicos do Uruguai,


representantes da FUCAVAM -
Federacción Uruguaya de Cooperativas de Vivienda por Ayuda Mútua - que juntamente com
as associações que vinham participando de processos de mutirão em diferentes bairros,
participaram do 1º Encontro de Movimentos de Moradia, cuja temática central era Por um
cooperativismo de ajuda mútua e autogestão. Ainda que centrado na ideia da autogestão, o
movimento trouxe pautas da questão urbana que visavam combater a especulação imobiliária
e a retenção de terras vazias, comprovando assim como o envolvimento popular de forma

27
Sobre a experiência da Vila Nova Cachoeirinha consultar BARAVELLI (2006)
29
organizada é capaz de propor direcionamentos organizacionais na busca por uma política
democrática. Em 1985 é realizado o segundo encontro que reúne os movimentos de moradia
de São Paulo e o Grupo de São Bernardo 28. De acordo com o contexto de São Paulo enquanto
palco principal das primeiras experiências de mutirão e autogestão, Baravelli (2006), ressalta
o intervalo de 1989 a 1992, como precursor dos programas de moradia por autogestão de São
Paulo29.

No embalo das experiências uruguaias aliado às necessidades de moradia e ao


adormecimento de ações efetivas da política habitacional, resulta-se em algumas ocupações a
formação de grupos técnicos comprometidos com a moradia popular, e a crescente
organização dos movimentos de moradia que se determinaram a representação dentro da
atuação da política de habitação; dessa forma passa-se a ter algumas experiências de
autogestão e três segmentos inspirados nas cooperativas uruguaias são mencionados por
Bonduki (1992) enquanto fundadores dos novos caminhos a serem seguidos pelo mutirão em
São Paulo. São esses: "O movimento da Zona Sul", "São Bernardo" e o "Laboratório de
Habitação" da faculdade de Belas Artes que fomentou debates ligados à prática social da
arquitetura; este, até o seu posterior fechamento em 1986, contribuiu para o marco inicial da
militância dos arquitetos pelo mutirão autogerido ao prestar apoio técnico à urbanização de
favelas formando diversos profissionais que posteriormente trabalhariam em assessorias
técnicas de mutirão e administrações do Partido dos Trabalhadores.30

Nesse contexto, em 1988, acontece a 1ª Caravana da Moradia para Brasília, que


contou com a presença de militantes de diversos estados brasileiros; o que veio a movimentar
ainda mais as reivindicações sociais. Assim, a década de 80 é encerrada com a criação da
UMM e, em São Paulo, a eleição de Luiza Erundina, em que, envolvida com as lutas por
moradia, tem o seu governo marcado pela iniciativa de implementação da autogestão
enquanto política de estado.

Logo, para entender a trajetória da tentativa da inserção da autogestão, destaca-se o


período de 1989 à 1992 - governo de Luiza Erundina em São Paulo - e as modificações
político-administrativas que alí se fizeram, se contrapondo futuramente às seguintes

28
Associação Comunitária de São Bernardo, formada em 1983 para gerir o fundo de greve do Sindicato do
Metalúrgicos e que promoveu um mutirão - a Vila Comunitária. (BARAVELLI, 2006: p. 98)
29
"Foram nestes anos que os empreendimentos de moradia social por autogestão passaram de experiências-
pilotos estritamente controladas pela companhia habitacional do município a parte ativa e integrante das políticas
de promoção habitacional da Prefeitura Municipal de São Paulo." (BARAVELLI, 2006: p. 96)
30
(Baravelli 2006, apud. Bonduki, 1992)
30
prefeituras e criando uma interrupção de planejamento, e a consequente dificuldade da
inserção do poder popular. É em fevereiro de 1989 que a Prefeitura junto à nova equipe da
Secretaria de Habitação divulga o "Programa de Ação Imediata", onde provia de diretrizes
gerais para a mudança do cenário da habitação social que tendenciavam, claramente, a busca
por uma gestão democrática. Algumas dessas diretrizes são citadas por Ronconi:

Nos novos projetos habitacionais será dada prioridade a demanda organizada pelos
movimentos de luta por moradia ou de urbanização de favelas (...) apoio técnico à
construção de moradias por iniciativa das próprias famílias ou por associações de
construção comunitária e financiamento ao material básico de construção..
(RONCONI, 1995, p. 20)

Dessa forma, comprova-se uma mudança estrutural dentro da secretaria no incentivo


de uma gestão participativa, dado esse uso do recurso público. É importante salientar o que
Baravelli destaca, onde, essas transformações no sistema financeiro não buscavam o fim das
licitações por empresas privadas, mas demonstravam que essa não seria a única forma de
construção de uma política pública de habitação, onde "era preciso reconhecer a diferença
entre socializar o poder e privatizar o poder."31

Em 1989, a proposta do Fundo Nacional de Moradia Popular (FNMP) começa a ser


construída a partir da mobilização dos movimentos de moradia organizados, que visava o
financiamento da produção habitacional organizada pelos movimentos.32 Sendo a principal
bandeira de movimentos pioneiros como UNMP, MNLM, CONAM, CMP e FNRU, somente
vai ser aprovado em 2005 - itém que será discutido posteriormente nessa pesquisa. Voltando à
questão de São Paulo, ainda no mesmo ano, surge a proposta do programa de financiamento
municipal FUNAPS COMUNITÁRIO33, que definia as associações comunitárias enquanto
agentes diretos da organização popular capazes de enfrentar o problema da moradia - com o
devido apoio do Estado; propunha que essas poderiam realizar a construção das casas
assumindo o gerenciamento dos empreendimentos desde o projeto até a execução das obras,
inclusive, atribuindo o regime de mutirão enquanto facilitador e redutor de gastos nesse
processo, quando necessário. A assessoria técnica deveria ser prestada por entidades sem fins
lucrativos, porém a sua remuneração não ultrapassava 4.0% do total do financiamento, e esta
era responsável por prestar assistência técnica, jurídica, contábil, administrativa e social, a fim
de garantir o melhor desempenho da associação (RONCONI, 1995).

31
BARAVELLI, 2006, p. 102
32
MESTRADO REGINA DE FÁTIMA, P. 91
33
Fundo De Atendimento À População Moradora Em Habitação Subnormal - FUNAPS
31
O FUNAPS passou então a atuar efetivamente na política habitacional e era dirigido
pela Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano e executado pela Superintendência
de Habitação Popular (HABI) e a Companhia Habitacional de São Paulo (COHAB); é
importante lembrar que além do FUNACOM34, era ação da HABI
as intervenções em área de risco em favela e a urbanização de favela comunitária (URBANC
OM).35 O que demonstra mais uma ação voltada para a redemocratização a partir da
organização da cidade informal.

Durante a atuação do FUNAPS, as assessorias técnicas eram contratadas diretamente


pelas associações e tiveram um importante papel ao serem responsáveis pela elaboração dos
projetos juntamente às famílias beneficiárias e pelo acompanhamento das obras a serem
realizadas por mutirão.

As associações, compostas pelos beneficiários do programa e, algumas vezes,


organizados também por movimentos de moradia, eram responsáveis por gerenciar a obra em
todos os seus aspectos; sejam eles processos construtivos, administrativos e/ou financeiros -
sempre com o apoio das assessorias. Dessa forma se percebe a forma autônoma de atuação
das comunidades, além de terem também a responsabilidade de prestar contas diante da
prefeitura.

Percebe-se então, como a participação nessas experiências autogestionárias


possibilitam um exercício de cidadania e responsabilidade; tirando-as de uma situação de
alienação diante dos processos da política habitacional - pensadas exatamente para essas
pessoas - e possibilitando o contato com outros níveis de conhecimento. Se tratava da tomada
de decisões de forma direta sobre as necessidades da sua vida e da vida do outro pautada em
um exercício da coletividade. Nesse âmbito, Chauí expressa bem a proporção do alcance
trazido pela experiência com a autogestão: "...a socialização dos conhecimentos técnicos, a
troca recíproca de saberes e experiências, a decisão democrática da autogestão dos mutirões
de moradia popular, as inovações tecnológicas e políticas daí decorrentes constituem uma

34
FUNAPS COMUNITÁRIO
35
" Os mesmos princípios autogestionários foram utilizados nas intervenções em Cortiços, casos do Mutirão
Celso Garcia e Madre de Deus, e também em alguns processos de urbanizações de favela." (Bonduki, apud
Moreira, Fernanda Accioly. 2009)
32
conquista popular na luta por direitos e uma crítica prática aos poderes ideológicos
existentes."36

As experiências vividas no âmbito da autogestão na cidade de São Paulo proporcionou


um amadurecimento dos movimentos, ampliou grupos de base, fazendo-os também alcançar a
esfera da política habitacional nacional.

O retrato do fortalecimento e amadurecimento da atuação dos movimentos de morad


ia de São Paulo, especialmente da UMM‐SP, foi a negociação e conquista com o Go
verno do Estado de São Paulo da criação do Programa de Mutirão‐UMM, e posterior
mente, do Programa Paulista de Mutirão que proporcionaram um novo
fôlego ao movimento após a eleição de Paulo Maluf para a Prefeitura de São Paulo e
suspensão do Programa FUNAPS‐Comunitário. (MOREIRA, 2009, p.55)

Partindo então para esse alcance nacional, pode-se citar algumas experiências
baseadas na autogestão na produção da habitação de interesse social e seu alcance na década
de 90; para isso, pode-se citar a experiência das Cooperativas dos Correios na Região
37
Metropolitana de Porto Alegre - com origem aliada a criação do Orçamento Participativo
(OP)38 -, o governo municipal passa a incentivar a formação das cooperativas com a criação,
em 1993, do Programa de Cooperativas Habitacionais; a experiência de Belo Horizonte que
implanta em 1994 o Fundo Municipal de Habitação Popular e
o Conselho Municipal de Habitação39 e, assim como em Porto Alegre, implementou o OP,
este, em seguida, evoluiu para o Orçamento Participativo de Habitação (OPH), posteriormente
surge o Programa de Apoio à Moradia por autogestão por sugestão de técnicos da
Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (URBEL)40 que realiza alguns trabalhos
juntamente ao Projeto Alvorada e a assessoria técnica da Usina CTAH, como a exemplos a
Urbanização de Senhor dos Passos (1993-1994) e Zilah Sposito (1993-1998).

36
Chauí, Marilena (1992). Apresentação: Construindo a Utopia Democrática. In: Bonduki, Nabil. Habitação e
Autogestão: construindo territórios de utopia. Rio de Janeiro: Fase.
37
Sobre a experiência das Cooperativas em Porto Alegre consultar WARTCHOW (2012)
38
Implantado em 1989, é instrumento importante de participação popular. " O OP é um processo dinâmico que
se adéqua periodicamente às necessidades locais, buscando sempre um formato facilitador, ampliador e
aprimorador do debate entre o Governo Municipal e a população." Fonte:
<http://www2.portoalegre.rs.gov.br/op/default.php?p_secao=1129> acesso em 24/09/2017.
39
Estes contendo representantes da sociedade civil e poder executivo. (SOUZA, 2007 apud MOREIRA, 2009)
40
Moreira, Fernanda Accioly, 2009
33
Figura 01_Zilah Sposito sob assessoria técnica Usina_ctah

Fonte: Site Usina - Disponível em < http://www.usina-ctah.org.br/zilahsposito.html> Acesso em: 25 set. 2017

Figura 02_Urbanização Senhor dos Passos sob assessoria técina Usina_ctah

Fonte: Site Usina - Disponível em < http://www.usina-ctah.org.br/zilahsposito.html> Acesso em: 25 set. 2017

Em contrapartida aos dois exemplos citados anteriormente, cujos tiveram ações de


programas públicos que os incentivaram, a experiência a seguir - Rio de Janeiro - aconteceu
independente a esses processos; contou com a doação de recursos da entidade internacional
Misereor (entidade alemã). A Fundação de Direitos Humanos Bento Rubião, criou por meio
dessas doações um Fundo Rotativo que passou a ser gerido por um conselho composto por
representantes das cooperativas de famílias e Fundação; com esse recurso foi possível a
construção inicialmente de 82 unidades habitacionais por meio de autogestão com assessoria
técnica realizada por uma equipe interdisciplinar da própria Fundação; já em 2001, o fundo
recebeu doação desta vez da Fundação Interamericana, de modo que, somado aos recursos

34
anteriores foi possível a construção de mais 61 unidades por meio da autogestão e ajuda
mútua.41

A política habitacional no Governo Itamar é marcada por iniciativas que visavam a


reestruturação do governo anterior e, a implementação de dois programas, o Habitar-Brasil e o
Morar-Município; o primeiro atendia aos municípios com mais de 50 mil habitantes e, o
segundo atendiam aos municípios com população inferior a 50 mil habitantes. Eles seguiam a
tendência dos programas alternativos também vinculados ao Ministério do Bem-Estar-Social,
apoiado na ideia da autoconstrução e trabalho comunitário.

Entretanto, Naime (2009), observa que esses programas possuem caráter


assistencialista, uma vez que, os moradores “deveriam ser proprietários ou ter a posse dos
terrenos, sendo que os projetos poderiam prever construção de moradias, urbanização de
favelas, produção de lotes urbanizados e melhorias habitacionais” (AZEVEDO, 2007, p.21
apud NAIME, 2009, p.76). Nos casos em que o beneficiário não possuísse o terreno, as casas
ou lotes permaneciam enquanto patrimônio do fundo estadual ou municipal por no máximo
cinco anos; assim, eram cobradas parcelas que não ultrapassassem 5% do salário mínimo
durante esse tempo. Naime aponta que, dessa forma, busca-se compatibilizar o valor cobrado
com o salário dos beneficiários; fato que não foi dado relevância no período do BNH. Nesse
período, enquanto ponto positivo, Itamar instaurou conselhos gestores estaduais e municipais
que tinham enquanto atribuição a administração dos fundos e projetos das suas respectivas
políticas habitacionais; concretizando assim uma forma de administração descentralizada.
Entretanto, ainda ocorrem problemas que constituem a política habitacional nessa gestão:

Mesmo sendo uma iniciativa de política descentralizadora, os referidos programas


pecavam por uma excessiva padronização; (...) faziam tábula rasa da enorme
heterogeneidade dos municípios brasileiros, exigindo de todos a formação de
conselhos e fundos. (...) apesar de propor a criação de fundos estaduais e municipais,
o governo não logrou (...) a formação de um fundo federal. Os mencionados
programas dependeram fundamentalmente de verbas orçamentárias ou de recursos
provisórios (IPMF), o que os fragilizou institucionalmente. Tampouco se conseguiu
avançar na formação de um conselho nacional (...) (AZEVEDO, 2007: p.22 apud
NAIME, 2009: p. 77).

No âmbito da política habitacional durante o governo Fernando Henrique Cardoso -


FHC (1995-2002), obtiveram algumas medidas que estabeleceram um caráter de prioridade
dada ao setor privado enquanto principal agente dessas produções. Ao assumir o cargo, FHC
apresenta um projeto político-econômico orientado para o neoliberalismo. Dessa forma, as

41
Segundo Moreira, 2009;
35
questões sociais foram concebidas de modo a serem enfrentadas de modo isolado e
desarticulado.

Assim, o Governo Fernando Henrique Cardoso extingue o Ministério do Bem-Estar


Social e cria a Secretaria de Política Urbana (SEPURB); a qual tinha como linha de atuação
consistida na descentralização de programas específicos na esfera habitacional e serviços
urbanos como saneamento e infraestrutura para estados e municípios, ficando então a união
com funções reguladoras. Assim, em 1996 é divulgado a "Política Nacional de Habitação"
(PNH) que tinha como objetivo principal a universalização do acesso à moradia.
LORENZETTI, 2001 apud SOUZA, 2005) Em contrapartida, novos mecanismos tinham sido
propostos no ano anterior, onde, o modelo de financiamento que antes estava voltado para a
produção habitacional, passa a ser destinado à comercialização de unidade habitacionais. Para
isso, foi criado o Programa Carta de Crédito Individual, que utilizava o FGTS como fonte de
recurso, destinado para famílias com renda de até 12 salários mínimos; em que estas, buscava
as agências da CEF para serem avaliados e proporcionalmente, concedido o crédito
diretamente ao consumidor.42

Logo, é possível perceber o retrocesso dentro dessa política no que diz respeito à
concepção da habitação; se contrapondo ao que apresenta as políticas baseadas na produção
autogestionárias, que rompe com a ideia da habitação enquanto um produto. Na esfera das
políticas habitacionais para a população de baixa renda, foram mantidos os programas ativos
na gestão anterior - Habitar Brasil e Pró-Moradia, antigo Morar Município -. Entretanto, como
condição para participação dos programas descritos acima, era necessário a comprovação da
capacidade de pagamento do mutuário, estar adimplente com o pagamento do FGTS e a
disponibilidade de recursos para a contrapartida exigida que variava de 10 a 20%43

Diante dessas exigências, fica concluído como a população que não possuía renda, era
alijada desse processo, continuando assim, sem direito à subsídios que garantissem o seu
direito à moradia. Já em 1999 a CEF envia ao governo a proposta do Programa de
Arrendamento Residencial (PAR) destinado à famílias com renda entre quatro e seis salários
mínimos, estas selecionadas pelo município e prioritariamente pertencentes a regiões
metropolitanas com mais de 100 mil habitantes.44 Nesse processo, a CEF possuía propriedade

42
Moreira, 2009
43
Souza, 2006
44
Moreira, 2009
36
fiduciária das unidades, fato que pode comprovar o estado de vulnerabilidade das camadas
mais populares dentro dessa política financeira. Dessa forma, explicita Souza (2005): " De
uma forma geral, a política FHC foi capaz de criar mecanismos dinamizadores do mercado
privado de habitação, beneficiando as classes média e alta, e engendrando os motores da
economia por meio do incentivo ao setor de construção civil." (NAIME, 2009, p.81).

Assim, seguindo os erros de políticas anteriores, é percebida a sua necessidade de


correção; para isso é criado em 2001 a Medida Provisória 2.212, o Programa de Subsídio à
Habitação de Interesse Social (PSH). O PSH teve como objetivo o subsídio direto às famílias
com renda de até três salários mínimos para aquisição de compra de imóveis ou para a sua
produção. Esta foi então a primeira medida da prover unidades habitacionais novas às
famílias com renda de até três salários mínimos dentro da política habitacional dessa gestão;
esta até então se restringia aos Programas Habitat Brasil e Pró‐moradia, que no entanto
passaram por restrição de crédito. Dessa forma, Moreira (2009) afirma:

81,6 % da população têm renda familiar mensal inferior a três salários mínimos e co
ncentra 90,3% do déficit habitacional, estaríamos caindo numa contradição. Isso por
que a maior parte da população brasileira (81,6%) compõe um perfil de renda que nã
o tem capacidade de endividamento para acessar crédito habitacional, e ainda oferec
e alto risco de inadimplência, ou seja, não apresenta condições adequadas exigidas p
elo mercado para acessar um financiamento habitacional. (MOREIRA, 2009: p. 78)

Assim, ao tomar como base a gestão Itamar e FHC, encontra-se mais uma vez a
prioridade dada aos investimentos para a população com renda acima de 3 salários mínimos,
ou seja, a população que correspondia ao déficit habitacional continuava a ser deixada a
segundo plano comprovando como a política financeira dos programas não eram pensadas
para a sua permanência.

Tabela
3_Investimentos do Governo Federal*em habitação distribuidos por faixa de renda (1993‐2002)

FAIXA DE RENDA Nº ABSOLUTO (em R$ EM %


bilhões)
Até 3 s.m. 469,800 8,7
3 a 5 s.m. 318,600 5,9
5 a 10 s.m. 1247,400 23,1
Acima de 10 s.m. 3364,200 62,3
TOTAL 54,000 100
Fonte: Fagnani, 2006

A população brasileira que compõe os cerca de 90% do déficit habitacional brasileir


o toma pra si, sem ter alternativas formais, o esforço de solucionar (de maneira parci

37
al e precária) o seu problema de moradia resultante da isenção, ao longo da história,
por parte do Estado de sua responsabilidade ao alinhar‐se à diretrizes e interesses do
setor privado(...)Para se ter uma dimensão da importância desse fato, somente entre
1995 e 1999 do total de 4,4 milhões de unidades habitacionais novas
empreendidas no país, 700 mil foram promovidas pela iniciativa privada e pelo setor
público, as demais (3,7milhões) foram auto‐empreendidas pela população.
(BRASIL/MCID, 2004 apud MOREIRA, 2009: p.79)

Partindo para o governo Lula - 2002 - e o contexto em que se inseria a política


habitacional, destaca-se a criação do Ministério das Cidades em 2003; cuja ideia central era a
integração das políticas de habitação, saneamento ambiental e dos transportes e trânsito
urbano. Para isso, a ideia era integrar essas políticas a partir de diretrizes que determinem o
uso e a ocupação do solo capaz de construir uma Política de Desenvolvimento Urbano a longo
prazo e que fosse capaz de reverter influência dos bancos públicos, vide BNH e CEF. 45 O
Ministério se subdivide em quatro secretarias nacionais; são elas: Habitação, Transporte e
Mobilidade, Saneamento Ambiental e Programas Urbanos. Nele está inserido também o
Conselho Nacional das Cidades que funciona enquanto mecanismo que facilite a ação
participativa de estados e municípios. É importante ressaltar a legitimidade dada às ações dos
movimentos sociais a partir da criação do Ministério.

Tendo como premissa o direito à cidade, o Ministério teve por responsabilidade


consolidar em nível federal os princípios defendidos pelos movimentos sociais de
luta pela Reforma Urbana, materializando-os na definição das políticas setoriais e da
Política Nacional de Desenvolvimento Urbano. O Ministério foi concebido, pelo
menos a priori, para trabalhar de forma articulada e solidária com estados e
municípios, e mais os movimentos sociais, organizações não governamentais, o
setor privado e outros segmentos da sociedade, tendo na Caixa Econômica Federal, a
operadora dos recursos, um dos instrumentos de intermediação para essa interação
(BRASIL/MCID, 2009 apud NAIME, 2009: p. 95).

Assim, para garantir a efetivação dessa gestão participativa, foram criados ferramentas
que garantissem o seu alcance nos diversos segmentos da sociedade. Dessa forma é que foi
criado o Conselho Nacional das Cidades - consiste na consolidação de conselhos estaduais e
municipais, de atuação prevista no Estatuto da Cidade (EC)46, as Conferências das Cidades e
o Conselho Curador do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (CGFNHIS).

Conferências Municipais foram realizadas em 3.457 municípios brasileiros ao longo


de 2003, culminando em outubro desse mesmo ano na 1ª Conferência Nacional, que
elegeu o Conselho das Cidades e estabeleceu os princípios e diretrizes da PNDU.
Outras Conferências Nacionais foram também realizadas em 2005 e 2007. Por meio
dessas esferas de participação diversas propostas foram debatidas e incorporadas às
políticas urbanas, dentre elas os objetivos e as ações do próprio Ministério das
Cidades e das políticas setoriais. (NAIME, 2009: p. 96)

45
MOREIRA, 2009
46
Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001.
38
Logo, enquanto fruto dos conselhos participativos, tem-se a Política Nacional de
Habitação (PNH), elaborada em 2004 e tem enquanto objetivo principal “retomar o processo
de planejamento do setor habitacional e garantir novas condições institucionais para promover
o acesso à moradia digna a todos os segmentos da população” (BRASIL/MCID, 2009 apud
NAIME, 2009). Em relação aos investimentos feitos no âmbito do financiamento
habitacional, percebe-se um aumento considerável se comparado aos governos anteriores.
Dessa forma, Moreira (2009) identifica os três principais focos referentes à produção
habitacional e ao seu financiamento, são eles: incentivo à produção de mercado, ampliação
de recursos e ajuste no foco.

Gráfico 1_ Evolução dos investimentos Federal em Habitação (2002 a 2007)

Fonte: MOREIRA, 2009, p. 92

Assim, no que diz respeito ao redirecionamento do foco dos investimentos que a partir de
agora passa a atender a real demanda do déficit habitacional. Isso se deu
a partir da Resolução nº 460 de 2004 e, posterior alteração pela Resolução nº 518 de 2006 do
Conselho Curador do FGTS, onde, ainda concedidos pelas Cartas de Crédito Individual,
foram melhor distribuídos conforme as rendas.

39
Gráfico 2_ Distribuição de subsídios do FGTS por faixa de renda

Fonte: Moreira, 2009, p. 94

Dessa forma, criou-se uma lógica inversamente proporcional ao déficit habitacional no


que diz respeito ao percentual de atendimentos habitacionais. Isso se mostra de forma
positiva, mais uma vez relacionado aos governos anteriores; assim, configurando-se um
avanço que, por mais não tenha posto fim ao déficit, tornou a política de investimentos mais
coerente com o que havia sido estabelecido enquanto meta da PNH. Destacando que, em
governos anteriores, por mais que tenha havido um discurso que pudesse ter estabelecido essa
mesma relação, se mostrou enquanto público alvo, aqueles com maior renda, tornando
incoerente com as suas teorias de discurso, conforme apresentado anteriormente na Tabela 03.

Gráfico 3_ Distribuição de subsídios do FGTS por faixa de renda

Fonte: MOREIRA, 2009, p. 95

40
Na esfera dos avanços tem-se em 2005 a aprovação da primeira lei de iniciativa
popular47 que está em pauta desde o fim da década de 80 através das bandeiras levantadas
pelos movimentos populares e até então tramitava pelo Congresso Nacional sem retornos, o
Sistema e o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS/FNHIS), anteriormente
chamado de FNMP. O SNHIS veio para reunir todos os agentes,instrumentos e ações
relacionadas à produção de habitação de interesse social, em que estão incluídos os conselhos,
órgãos, e instituições de administração, além de englobar o Ministério das Cidades, CEF,
Conselho das Cidades e o CGFNHIS. (BRASIL/MCID, 2008 apud MOREIRA, 2009).

Esse sistema pressupõe a conformação de fundos estaduais e municipais de


habitação, com a definição de seus conselhos gestores, os quais devem estar
articulados com os respectivos planos de habitação. Estes, por sua vez, devem estar
em consonância com o Plano Nacional de Habitação, o qual vem sendo elaborado
desde agosto de 2007. (MOREIRA, 2009)

Ainda em relação ao aumento dos investimentos dados para habitação, destaca-se a


criação em 2007 do Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC); em que, de 2007 a 2010
foram investidos R$ 55,9 bilhões para o financiamento de habitação e urbanização de
assentamentos precários. Para esse medida, a lei nº 11.578, de 26 de novembro de 2007
determina a transferência obrigatória de recursos financeiros para a execução pelos estados,
Distrito Federal e municípios. Nessa esfera de avanços, o Programa Pró-Moradia - criado na
gestão Itamar Franco -, teve em 2007 suas atividades retomadas, porém com redução na taxa
de juros para 5% ao ano. (NAIME, 2009) No âmbito de significativos avanços no modo de
estruturação da política habitacional e da vitória - ainda que atrasada - ao que pleiteavam os
movimentos sociais envolvidos com as questões urbanas - a criação do FNHIS - tem-se um
ano antes, em 2004, a criação do Programa Crédito Solidário (PCS), onde, segundo Moreira
(2009), o PCS foi criado diante às reivindicações dos movimentos populares enquanto
solução baseada na autogestão e que não se deu de forma pontual, mas construída ao longo
das lutas dos movimentos e, inclusive, ao que andava paralelamente às reivindicações pelo
FNHIS.

No entanto, segundo Naime (2009), o Programa parece ter “dupla paternidade”. Por
um lado, o PCS seria fruto de antigas reivindicações a respeito da habitação
associativa e da autogestão, levadas ao Ministério das Cidades e ao Conselho das
Cidades por quatro organizações integrantes da coordenação do Fórum Nacional de
Reforma Urbana. De outro, seu objetivo era dar destino aos recursos acumulados
pelo FDS, que até então não haviam sido utilizados, e geridos pela CEF – cujos
técnicos, os responsáveis pela concepção, normatização e formato final do PCS,
desconheciam as reivindicações das organizações sociais acerca da produção
associativa da habitação e da autogestão. (CAMARGO, 2016: p. 64)

4747
Lei Federal nº 11.124.
41
Ainda assim, é importante destacar a relevante ação vinda dos movimentos populares ao
conquistarem mais uma bandeira representativa para a gestão democrática e que possuía um
caráter de inserção popular, entretanto, se mostra difícil estar à mercê dos arcabouços
políticos e seus arranjos muito bem esquematizados. Dessa forma, esse cenário configura
mais um momento do que talvez possa-se chamar de "cabo de força" entre o que reivindicam
os movimentos populares e os instrumentos que serviam aos interesses políticos, este, por
muitas vezes ligados aos interesses privados; neste contexto, a criação do PCS se mostra
enquanto ápice no movimento de "vai-e-vem" das conquistas populares.

Tem uma série de indicadores aí que demonstram que ela [a CEF] é, acima de tudo,
um banco, que ‘tá’ envolvido com o processo de acumulação. E é exigido isso dela,
pelos seus próprios princípios... ela tem que dar lucro na escala bancária brasileira.
Ela não investe no microcrédito, ela não investe no financiamento da produção; ela
investe da mesma forma que os bancos privados: no crédito consignado, onde tem,
digamos assim, a possibilidade de ganho garantida... ela não arrisca nada além. Não
tem uma gestão estatal, é um banco de lógica privatista, apesar de ser uma
burocracia pública e ter discurso de banco público, de banco social (RAMOS -
Gerente do PCS no MCidades, em entrevista, 2009 apud NAIME, 2009: p. 121).

Dessa forma, nos primeiros anos de sua aplicação, diversas críticas foram recebidas pelas
organizações dos movimentos, cujas se fundavam na incompatibilidade entre as regras do
programa - baseadas em critérios bancários - e as características dos beneficiários de baixa
renda. Dessa forma, as regras do PCS consistia em quatro opções de modalidades para
as associações: (1) aquisição de material de construção, (2) aquisição de terreno e construção,
(3) construção em terreno próprio e (4) conclusão, ampliação ou reforma de unidade
habitacional. Ficava à cargo das associações decidir também qual o regime de construção
utilizado entre: autoconstrução, mutirão ou administração direta - onde melhor se encaixa o
conceito de autogestão. Assim, o valor do investimento poderia ser composto pelos recursos
referentes ao terreno, projeto (este limitado à 1,5% do valor da obra), construção, materiais de
construção, despesas de legalização e seguros; dentro destes, 95% poderiam ser financiados,
entretanto 5% deveria ser uma contrapartida financeira dos beneficiários, podendo ser
resultado de parcerias com agentes facilitadores como prefeituras ou governo do estado ou
enquanto mão de obra de mutirante. Em relação ao pagamento do financiamento, o prazo de
carência limitava-se a 12 meses a partir da assinatura de contratos, o prazo máximo de
amortização era de 240 meses e o valor das parcelas podia chegar a 25% da renda familiar.
(CAMARGO, 2016) Ainda nessa questão, Camargo (2016) aponta dificuldades que as
associações encontraram no momento de efetivar a contratação dos empreendimentos.

42
A despesa inicial significativa teve que ser aportada pela associação ou como
contrapartida pelas próprias famílias, sem que tivessem a garantia da efetivação do
contrato. Outros aspectos, como a falta de assessoramento às entidades, a falta de
capacitação e de estrutura institucional, as limitações técnicas das agências da CEF
espalhadas pelo país e a falta de flexibilidade das exigências, a exemplo da
regularidade prévia dos terrenos, levaram à extrema morosidade dos processos de
análises, que demoram até dois anos para aprovação das propostas. (CAMARGO,
2016: p. 67)

Nesse contexto das dificuldades, muitas entidades tiveram dificuldade em conseguir


aprovação dos projetos pela CEF, para confirmar tem-se os dados de que na primeira seleção
do programa em 2004, foram selecionadas 684 de 2.789 propostas apresentadas e somente
158, até 2007, chegaram à efetiva contratação. (RODRIGUES e MINEIRO, 2012: p. 24 apud
CAMARGO, 2016: p. 67). Dessa forma, várias famílias também tiveram dificuldades em
permanecer no programa e tiveram dificuldades com o agente financeiro, assim, algumas
medidas foram propostas diante às reivindicações pelo fim da dificuldade de acesso ao
programa. A primeira modificação trata-se da criação do Fundo Garantidor (FG), em 2005 e
tinha o propósito de “viabilizar uma alternativa de garantia para implementação do
financiamento às famílias de baixa renda que necessitam de condições especiais e
subsidiadas.” (Resolução nº100 do CCFDS, fevereiro de 2005). Dessa forma, Moreira (2009)
explica que para efetivação do FG era constituído um acréscimo de 19,85% sobre o valor do
financiamento, em que o recurso era utilizado em caso de atrasos superiores a 60 dias,
liquidação antecipada quando o saldo do fundo fosse maior do que a dívida. Assim, nesta
situação encontra-se uma manobra para que os beneficiários "tivessem condições" adequadas
de pagamento, entretanto o acréscimo oneroso na parcela era significativo, criando assim uma
falsa melhoria onde, na verdade, estavam apenas fazendo-os pagar antecipadamente algo que
poderia vir a ser uma dívida. Ainda assim, é importante ressaltar que aproximadamente 56%
dos empreendimentos contratados até o final de 2007, foram assinados com Fundo
Garantidor. (Moreira, 2009) Isso demonstra como a medida foi bem aceita pelos beneficiários
ou, como a ilusão do crédito passou despercebida por ser a sua única opção. Outras alterações
se seguiram como a implementação da livre porcentagem de financiamento, antes limitados a
1,5% do valor total do investimento; o envio da pré-viabilidade deixa de ter acesso pelo
Ministério das Cidades e passa a ser pelos Escritórios de Negócios das Agências da CEF, este,
entretando muda novamente em 2007, passando a ser responsabilidade da Gerência de
Desenvolvimento Urbano da CEF (GIDURs), dessa forma, dando uma maior importância ao
olhar técnico.

43
Em novembro de 2007, acontece a 3ª Conferência das Cidades, o que ocasionou numa
reestruturação do PCS. Estabelecidas pela Resolução nº 121, de 09 de janeiro de 2008, a
Instrução Normativa 14, de 25 de março de 2008 coloca o programa na sua segunda fase,
chamando-o Programa Crédito Solidário 2 (PCS 2). A principal alteração veio a reduzir as
responsabilidades financeiras das famílias e adotou regras mais flexíveis ao programa, para
isso foi criada uma conta estabilizadora por empreendimento. Para isso eram investidos ao
longo do período de amortização recursos gerados no mercado financeiro que serviriam para
efetuar o pagamento dos seguros e taxas de análise cadastral, eximindo assim dos
beneficiários essa responsabilidade e reduzindo o valor das prestações. Com esta mesma
normativa, foi possível flexibilizar a análise cadastral "na qual 20% das famílias poderiam ter
seu cadastro comprometido com a SERASA (Centralização dos Serviços Bancários S/A) e o
SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). Por outro lado, a obrigatoriedade de demonstrar
capacidade de pagamento e a controle rígido em relação à inadimplência permaneceram."
(Camargo, 2016: p. 68)

Outra implementação característica da segunda fase do programa foi a criação da


garantia de responsabilidade solidária, em que beneficiários que não pudessem oferecer
garantia real, era possível instituir cinco titulares para se responsabilizar em caso de
inadimplência. Diante as mudanças ocorridas ao longo do programa, é possível estabelecer
um ritmo de contratações resultantes dessas ações que começam muito baixos e vai
ascendendo a partir das flexibilizações oferecidas nas mudanças; tendo o seu ápice na segunda
fase diante as alterações descritas acima e passa a decair no momento de implementação do
Minha Casa Minha Vida Entidades (MCMV-E), cujo será abordado na subseção seguinte.

44
Gráfico 4_ Ritmo anual das contratações do PCS (junho 2004/agosto 2011)

Fonte: Camargo, 2016: p. 69

No Governo Lula, além do PCS, houve a tentativa de implementação de mais um


programa que, entretanto, não saiu do papel. Foi idealizado então o Ação de Produção Social
da Moradia (APSM), lançado em março de 2008 após da modificação da Lei do SNHIS
(através da Lei 11.578/2007); esta garantia o acesso das associações e cooperativas ao FNHIS.
Este seria o programa habitacional voltado totalmente para a autogestão; para isso seria
utilizado recursos do FNHIS, entretanto, a Lei 11.578/2007 alterou a Lei 11.124/200 - que
cria o FNHIS, e assim viabiliza o repasse de recursos do FNHIS para entidades privadas sem
fins lucrativos, porém "o fato de ser um fundo contábil iria inviabilizar, posteriormente, este
programa". (FÁTIMA, 2014: p. 140) Dessa forma, a partir da primeira seleção de projetos o
FNHIS não prevê outra fonte de renda se não o Orçamento Geral da União (OGU), assim, o
sistema de repasses deveria se dar de acordo com as mesmas exigências feitas para os
repasses aos municípios.

As entidades, que já haviam se organizado com o PCS, se depararam com uma


lógica completamente distinta e que se referia muito mais a estados e municípios do
que a entidades sem fins lucrativos. Além disso, o Siconv (Sistema de Convênios)
ainda estava sendo ajustado e carecia de diversos aperfeiçoamentos. Como todo o
processo é baseado na Lei de Licitações, induzia à contratação por empreitada
global, pois, no caso da autogestão, cada compra, ou contratação de mão de obra,
deveria ser antecedida de um processo licitatório, o que, na prática, o inviabilizaria.
Por fim, o FNHIS não poderia antecipar parcelas de recursos para obras, o que é
fundamental para a atuação das entidades que não possuem capital de giro
(RODRIGUES, 2013, p.71).

45
Assim, em 2009 é implantado no Governo Lula um novo programa habitacional, o
Minha Casa Minha Vida (MCMV), em que é importante ressaltar mais uma vez o contexto no
qual são inseridos novos programas habitacionais; assim, seguindo a mesma ideia do BNH, o
MCMV nasce no contexto de crise econômica e vem para estimular as atividades da
construção civil, com o discurso novamente da resolução do déficit habitacional, mas
sobretudo, obedecendo ao segmento econômico popular de mercado. (CAMARGO, 2016)

O governo, também preocupado com os efeitos da crise, especialmente o risco de


desemprego, e pressionado diretamente pela indústria da construção, passa a
construir o que foi chamado de programa Minha Casa Minha Vida (MCMV). A
condução das negociações com o setor foi feita pela então ministra chefe da Casa
Civil, Dilma Roussef, que recebeu as propostas formatadas por grandes empresas,
para definir o programa. Ao final do processos, outros segmentos, como prefeituras,
governos estaduais e movimentos sociais também apresentaram suas propostas, mas
a estrutura do programa já estava definida. (RODRIGUES, 2013: p. 54)

Assim, o MCMV nasce com uma bandeira baseada em metas quantitativas e se propõe a
construção de 1 milhão de casas. Para isso, diferente dos outros programas, ele se subdivide
em grupos de atuação em três faixas de renda com diferentes fontes de recursos. A primeira
etapa do programa compreende o período de 2009 a 2010 instituída pela Medida Provisória
459, de 25 de março de 2009 e posteriormente convertida para a Lei 11.977, de 7 de julho de
2009. A segunda etapa do programa (MCMV 2), é iniciada em 2011 e instituída pela Lei
12.424, de 16 de junho que dobra a meta da primeira etapa propondo a construção de 2,4
milhões de moradias.

A faixa 1 compreende o Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU), o


Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR) e o Minha Casa Minha Vida Entidades
(MCMV-E) - esse voltado para as Associações e Entidades e possibilita a autogestão; todos
executados com recursos, exclusivamente, da OGU aportados ao Fundo de Desenvolvimento
Social (FDS) conforme disposto no art. 2º, inciso II, da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009.
As faixas 2 e 3 são feitas diretamente por empresas privadas e por elas comercializadas; ou
seja, a CEF financia a produção e fornece os subsídios, entretanto todas as responsabilidades
são assumidas pela empresa; essas faixas, assim como a faixa 1 recebem recursos da OGU,
mas contam também com subsídios do FGTS. No ano de 2015 é instaurada a fase 3 do
programa (MCMV 3) e com isso, em outubro de 2016 é criada a faixa 1,5 para atender à
famílias com renda até R$2,35mil e para isso os beneficiários dessa faixa passaram a atender
às condições de análise de créditos previstas para as faixas 2 e 3.48 Já em fevereiro desse ano,
o Governo anuncia a ampliação de renda para as faixas 1,5; 2 e 3 - não houve mudanças na
faixa 1.

48
Disponível em: http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2016/10/caixa-inicia-financiamentos-da-faixa-1-5-do-
programa-minha-casa-minha-vida. Acesso em 03 out. 2017.
46
Tabela 4_ Ampliação das rendas para o MCMV

AJUSTE DA RENDA DAS FAMÍLIAS ATENDIDAS*


Faixa Renda familiar mensal Taxa de juros
1,5 Até R$2.600 5%
Até R$2.600 5,5%
2 Até R$3.000 6%
Até R$4.000 7%
3 Até R$7.000 8,16%
Até R$9.000 9,16%
Fonte: Elaboração da autora/ Disponível em:
http://www20.caixa.gov.br/Paginas/Noticias/Noticia/Default.aspx?newsID=4550. Acesso em 03 out. 2017

Dessa forma, percebe-se a perpetuação de um programa habitacional que já dura oito


anos e se renova garantindo a sua manutenção. Entretanto, é possível apostar que as
ampliações de renda ocorridas no programa se mostrem mais uma vez no leque das
possibilidades de investimento financeiro por parte do Governo Federal e sua aposta no
mercado imobiliário enquanto fomentador da economia do país; com o discurso da geração de
empregos e do aumento no alcance das famílias beneficiadas é que são implantadas as
ampliações; entretanto cabe o questionamento sobre a desvirtuação do programa, uma vez que
seu principal foco são as famílias de baixa renda. Nesse âmbito de questionamentos e da
disputa pelo espaço nas políticas de habitação por parte de entidades e movimentos sociais
que será abordada na próxima seção a atuação do MCMV Entidades.

2.2 PRÁTICAS NO MCMV-Entidades

A implantação do PMCMV acontece em um contexto que se faz importante de ser


ressaltado, em que, se repete no âmbito das soluções encontradas para enfrentar a crise
financeira - que, nesse caso, havia se instalado no ano anterior (2008) -. Isso acontece também
no ano de implementação do BNH e assim se encontram semelhanças na vertente que
ocasiona os investimentos na esfera da política habitacional e deixa à margem de
questionamento ao que realmente motiva essas produções. Assim, Camargo (2016), destaca
que esse programa foi moldado para atender sobretudo ao segmento econômico popular de
mercado, embora atendesse à promoção da política pública habitacional.

Previa-se gerar empregos num setor da economia capaz de mobilizar diversos outros
setores associados: desde a indústria extrativista e produtora dos materiais básicos
da construção civil, até a indústria moveleira e de eletrodomésticos, ativadas no
momento da entrega das chaves (SANTO AMORE, 2015: p 16 e 17 apud
CAMARGO, 2016 : p. 74).

47
Entretanto, com o histórico de aplicação de políticas habitacionais que possibilitaram a
autogestão enquanto modelo de produção na gestão Lula, surge em 2009 um braço do
MCMV, que se apresenta enquanto resposta ao que continuavam a pleitear os movimentos
sociais. É fundado o Minha Casa Minha Vida - Entidades que se incorporava ao Programa
Crédito Solidário. O programa é voltado para entidades sem fins lucrativos, o que incluía
associações e cooperativas com bandeiras autogestionárias.

Sobre o Minha Casa Minha Vida Entidades, localizado na faixa 1 do MCMV, pode-se
dizer que suas regras derivam do PCS e outra parte equivale ao MCMV destinado às
construtoras; entretanto ela se diferencia por centralizar à Entidade Organizadora (EO) a
responsabilidade pelo contrato, seleção, organização e indicação dos beneficiários, cujos
devem se enquadrar nas regras gerais do programa, o que inclui a inscrição e a submissão aos
critérios do CadÚnico49. Entretanto, se diferenciando do PCS, a equação de financiamento no
MCMV-E não considera o valor financiado, mas a capacidade de pagamento de cada família
diferenciadamente. Isso é possível pela estruturação do programa estar subdividida por faixas
de renda, o que se mostra um critério mais justo. Em melhoria ao PCS, excluiu-se a
necessidade de análise cadastral e consequentemente o despendimento que isso causava às
famílias; entretanto, incluiu-se como regime de construção a Empreitada Global; essa, atribui
às construtoras a responsabilidade de todo o andamento da obra; vale ressaltar que, para
construções verticalizadas, a CEF exige que seja obrigatoriamente em regime de Empreitada
Global, salvo exceções em que a Entidade comprove experiência em gestão de obras desse
porte, porém isso pode se mostrar enquanto uma dificuldade de inserção do regime de
autogestão e administração direta por parte das EO.

O MCMV-E se diferencia também com a inclusão da possibilidade de estabelecer um


contrato preliminar específico a partir da compra do terreno de forma antecipada. Dessa
forma, foi possível que os beneficiários recebessem o subsídio inicial referente à compra do
terreno a partir da comprovação junto à CEF da viabilidade técnica e financeira do
empreendimento; assim, essa "vantagem" lhes foi dada de forma justa, uma vez que para a
contratação é necessário o terreno juntamente com o projeto e seus demais estudos, em que,
no mercado aquecido pelo próprio MCMV, as construtoras obtinham vantagem disparada
nessa relação, uma vez que elas possuem muitas vezes o terreno ou capacidade de comprá-los.

49
Instrumento Federal para coleta de dados e informações com o objetivo de identificar todas as famílias de
baixa renda existentes no País. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2010/03/cadunico.
Acesso em 03 out. 2017
48
Nesse contexto, Camargo confere ao MCMV Entidades um modelo de autogestão ao qual
chama "produção autogestionária à brasileira", em que:

Permite que os futuros beneficiários, potencialmente selecionados e conhecidos


antes dos processos de obra, participem dos projetos e das obras, conheçam os
terrenos e seus entornos, opinem na concepção, acompanhem o modo como os
recursos são empregados na execução das obras, apropriem-se dos excedentes que
resultam de bons processos de compra e contratações e os reinvistam na melhoria da
qualidade das moradias. Esses processos, tão ricos quanto complexos, poderiam
representar uma cunha no contexto geral do MCMV. (CAMARGO, 2016 p. 80)

O primeiro passo para se empreender no âmbito do MCMV-E é a habilitação por parte


da entidade junto ao gestor dos programas federais de habitação - Ministério das Cidades,
estando os seus critérios estabelecidos na Portaria nº 747 do Ministério das Cidades, de 02 de
dezembro de 2014. O Gestor exige também que as Entidades estejam constituídas há no
mínimo três anos para estar apta para se habilitar; isso por um lado é interessante por garantir
a atuação de organizações que possuam experiência e possam desempenhar um bom papel no
desenvolvimento dos projetos, entretanto, impossibilita que as famílias formem sua própria
entidade organizada para ter acessos aos recursos federais; aqui é importante estabelecer o
comparativo com as cooperativas uruguaias, essas formadas a partir da organização das
próprias famílias.

Continuando no caminho a ser percorrido pelas entidades até a concretização do


projeto; após a habilitação, ela parte para a procura do terreno que pode ser público ou
privado - nesse caso, pode-se utilizar o recurso da compra antecipada, explicitada
anteriormente -. Para elaborar o projeto, então a entidade deve ter a sua própria assessoria
técnica ou contratá-la, encaminhar o projeto para seleção após aprovados nos órgãos
competentes da localidade (água, esgoto, infraestrutura etc.).

Assim, a contratação é feita junto ao agente operador com a apresentação dos


documentos referentes ao projeto, das famílias e da entidade organizadora. Após a
contratação, as obras são iniciadas e, a depender do regime de construção escolhido pela
entidade organizadora, o fluxo da obra e liberação de verbas obedecerá a regras diferenciadas.
Nas obras em regime de administração direta - autogestão -, há a liberação dos recursos em
cada etapa de obra de forma antecipada. Já na modalidade empreitada global, o pagamento só
é liberado após a medição do serviço. Paralelamente à obra e em todos os regimes de
construção, são realizadas as atividades do trabalho social. O desenvolvimento e o ritmo no
qual se dão as contratações são variáveis para cada estado e município dependendo da forma
que é estabelecida as relações com o agente operador. Isso é apresentado de forma clara em
49
estudo realizado sobre a produção social da moradia no Brasil e baseado na atuação do
MCMV-E nos diversos estados brasileiros:

Presenciamos vários casos em que há a construção de um relacionamento entre


entidade organizadora e escritório regional que busca alavancar o desenvolvimento
dos projetos. Seja pela iniciativa do representante do agente operador – com
propostas de capacitação e orientação técnica às entidades, por exemplo –, seja pela
iniciativa da entidade organizadora – com a procura por um entendimento comum
sobre a interpretação de determinado normativo, por exemplo. Em outras situações
nos deparamos com contextos em que a relação se constituiu de forma conflituosa,
existindo um distanciamento entre escritório regional e entidade organizadora,
dificultando a proposição e desenvolvimento de projetos. (LAGO, L. at al, 2016: p.
37)

Figura 03_ Fluxograma de Funcionamento do MCMV-E

Fonte: LAGO, L. at al, 2016: p. 46

No âmbito da qualidade dos empreendimentos do MCMV-E, pode-se constatar uma


inversão na lógica na configuração do ambiente construído, em que, ao invés de tomar partido
das particularidades advindas do contexto urbano no qual será inserido, contata-se a

50
recorrência de um mesmo tipo sendo inserido em diferentes contextos. Isso pode ser
justificável na lógica de mercado inserida na intenção das construtoras ao se envolverem
nessa produção, entretanto, visto que a lucratividade não movimenta as ações das
organizações populares, existe o questionamento e o levantamento de hipóteses para essa
produção tão semelhante ainda que na esfera das entidades:

- Na lógica de financiamento do PMCMV-Entidades, os movimentos sociais são


vistos como construtoras e por isso devem responder a um padrão de eficiência para
concluir a obra no prazo de 18 meses;
- Na expectativa de serem uma alternativa ao mercado imobiliário, muitos
movimentos tem apostado na construção de projetos em grande escala. Nesse
contexto, a padronização e a repetição aparecem como “viabilizadoras” da proposta;
- Há uma imposição ideológica dos sistemas utilizados pelo mercado. A facilidade
de encontrar os materiais de construção e a mão de obra necessária para sua
utilização são aspectos fundamentais na conformação dos projetos;
- Falta de assessoria técnica. A falta de núcleos de assessoramento a movimentos
sociais faz com que esses recorram a redes de conhecidos, que por não trabalharem
especificamente com habitação de interesse social por autogestão acabam por repetir
soluções padrões;
- A dificuldade de diálogo com o agente operador do programa. Em muitos locais
em que a Caixa se mostra contrária à ação dos movimentos sociais, seguir os
padrões propostos pela instituição é a certeza de menores atritos na aprovação do
projeto. (LAGO, L. at al, 2016: p. 51)

Dessa forma, percebe-se que, ainda com instrumentos possíveis para a realização de
uma prática autogestionária na produção da habitação de interesse social, estes encontram
barreiras na estrutura organizacional do programa - fato que se assemelha à programas
anteriores, vide PCS - criam manobras que passam a dificultar as suas ações. Assim, um outro
dado relevante mostra o quantitativo das habitações construídas no âmbito do MCMV-E nos
estados brasileiros comparados ao quantitativo do déficit habitacional desses mesmos estados
apresentados no Gráfico 05. Embora o objetivo do programa não seja vencer o déficit
habitacional, é possível constatar a sua ineficiência, e questionar os destinos que estão sendo
dados à essas unidades habitacionais, uma vez que o número da sua produção é superior ao
quantitativo do déficit.

51
Gráfico 5_ MCMV - Entidades: Percentual do Déficit Habitacional 2010 e Percentual de Unidades
Habitacionais Contratadas por Estado (Janeiro, 2015)

Fonte: LAGO, L. at al, 2016: p. 25

Entretanto, existem muitas possibilidades de arranjo na atuação do MCMV-E,


principalmente, relacionados ao modelo de gestão em que, aliados às variantes do contexto de
cada estado, assim como as características de atuação de cada movimento de moradia ou
entidade envolvida, resultará em um novo tipo de experiência na esfera do programa.
A problematização dos resultados destas experiências, para além de todas as
discordâncias conceituais sobre o significado da autogestão, é necessária como
reflexão para que se possam detectar os múltiplos sentidos destas práticas, assim
como seus deslizamentos recentes. (CAMARGO, 2016: p. 102)

Dessa forma, e se voltando para o objeto de estudo - a autogestão - é importante destacar as


diversas vertentes que poderiam na prática configurar esse modelo de gestão ainda que
teoricamente se encaixem em outro formato. A exemplo prático, tem-se a experiência do
conjunto "Sonho Meu" em Mauá/SP, em que foi priorizado o regime de administração direta,
sem assessoria técnica, e que desenvolveu trabalho em mutirão com as famílias como parte do
52
Trabalho Técnico Social (TTS) e envolveu as famílias na escolha dos materiais e em demais
aspectos administrativos da obra. No entanto a autogestão não é tema de discussão da
Entidade Organizadora desse projeto. (CAMARGO, 2016: p. 102) Ou seja, fica um tanto
subjetivo o conceito dado na prática para autogestão, uma vez que ela pode ser exercida em
diversos níveis. Dessa forma, são diversas as experiências no âmbito do MCMV-E que podem
ser consideradas enquanto bem sucedidas no que diz respeito à qualidade arquitetônica e pela
participação das famílias de forma autônoma nas tomadas de decisão na gestão do
empreendimento da sua futura morada. Logo, ainda que essas experiências possam apenas
permear o conceito de autogestão ou não sejam assim chamadas, as características que lhe
conferem essa possibilidade estão presentes no seu produto.

Assim, serão apresentadas a seguir duas experiências de empreendimentos contratados


pelo MCMV-E a fim de exemplificar como estão sendo colocadas em prática as diretrizes do
programa e seus diversificados arranjos; a fim de um embasamento para o estudo de caso
dessa pesquisa que se realiza paralelamente.

 Conjuntos Habitacionais João Cândido A e B50

O primeiro exemplo trata-se dos Conjuntos Habitacionais João Cândido A e B,


localizados em Taboão da Serra/SP. O empreendimento foi contratado durante o MCMV II e
tem como Entidade Organizadora a Associação de Moradores do Acampamento Esperança de
um Novo Milênio (MST Taboão da Serra e MTST). Seu regime de construção é a Empreitada
Global - a sua execução ficou sob responsabilidade da construtora Esecon - entretanto, contou
com assessoria técnica da Usina CTAH, TTS de responsabilidade da equipe da própria
entidade e é composto pelas comissões previstas para o programa (CRE e CAO) formada
pelos beneficiários para acompanhamento do processo. O projeto arquitetônico conta com 6
torres de 8 pavimentos, 8 apartamentos (de 2 e 3 dormitórios) por pavimento e elevador em
todas as torres.

Composto por 384 UH (192 UHs em cada empreendimento) adaptados. As áreas dos
apartamentos são de 56,00m² e 63,00m² para dois e três dormitórios respectivamente e conta
com um centro comunitário em cada empreendimento enquanto edifícios complementares.51
A partir do programa que compõe o empreendimento e das áreas das UH's é possível perceber
50
Todas as informações sobre os processos do projeto estão disponíveis em:
http://habitararquitetas.com.br/producoes-academicas/CONJUNTOS-VERTICALIZADOS-MCMV.pdf Acesso
em: 15 out. 2017
51
CAMARGO, 2016
53
o alto nível com relação a outros conjuntos do MCMV - sem entidade envolvida - e que esse
exemplo não se enquadra na esfera dos empreendimentos de má qualidade citados
anteriormente.

Figura 04_ Projeto Arquitetônico Conjunto Habitacional João Cândido A e B

Fonte: ZULIN, 2016: p.15

Dessa forma, para mostrar como as soluções projetuais são também consequências dos
arranjos organizacionais, é importante ressaltar a especificidade desse caso em relação ao
"duelo" entre assessoria técnica e construtora. A princípio a Usina CTAH, em 2009, foi
convidada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) para realizar um estudo do
conjunto para o que seria futuramente o empreendimento. Entretanto, o projeto previsto
possuía unidades duplex - solução ainda não viabilizada pelo MCMV -; previsão de áreas
públicas separadamente dos condomínios; estrutura metálica52, característica considerada
pouco convencional por alguns agentes, incluindo a Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano (CDHU) 53- cedente do terreno -.

Logo, a CDHU acabou assumindo a responsabilidade com a justificativa de conseguir


agilidade na aprovação e execução por adotarem soluções mais convencionais. Entretanto, o

52
Entretanto, a Usina CTAH possui experiência na utilização desse tipo de estrutura, inclusive, em
empreendimentos com regime de autogestão e mutirão, como é o caso do COPROMO em Osasco (1990-1998) e
Paulo Freire na Cidade Tiradentes (1999-2010).
53
A CDHU é um dos maiores agentes promotores da moradia popular no Brasil e também intervém no
desenvolvimento urbano das cidades, de acordo com as diretrizes da Secretaria da Habitação e atua no Estado de
São Paulo. Disponível em: < http://www.cdhu.sp.gov.br/a_empresa/apresentacao-cdhu.asp> Acesso em: 20 out.
2017
54
projeto apresentado pela CDHU se apresenta ineficiente e a Usina CTAH é novamente
convidada em 2012 para retomar o acompanhamento, agora partindo do projeto da CDHU
que já estava com a aprovação em andamento.

Figura 05_ Projeto realizado pela CDHU e apresentado à USINA CTAH

Fonte: ZULIN, 2016: p.11

Assim, como fica perceptível na figura 05, o diagnóstico da Usina CTAH encontra problemas
como o reservatório ocupando espaço desnecessário no térreo, área excessiva para circulação,
janelas voltadas para orientação com maior insolação, sala sem ventilação direta e tamanhos
desproporcionais para área de serviço e quartos. Dessa forma, o projeto seguiu com o paralelo
entre a construtora Esecon e Usina CTAH, resultando na divergência dos usos dos espaços.

55
Figura 06_ Propostas de parcelamento do trecho oeste realizadas pela Construtora Esecon e pelo Usina

Fonte: ZULIN, 2016: p.12

Seguindo a lógica qualitativa e agora, em análise à Figura 06, percebe-se como a


distribuição dos espaços e a preocupação com a inserção de áreas públicas segue como
característica das propostas da Usina CTAH, enquanto nesse caso, a proposta da construtora
segue mais rígida e com uma menor preocupação com os impactos causados no entorno pelo
empreendimento; podendo assim abrir margem para a suposição de um projeto mal sucedido
se levado à frente pela construtora ainda que no âmbito das entidades. Para isso se faz
necessário frisar a atuação das CRE e CAO enquanto acompanhantes e não comandantes do
processo durante a concepção do projeto e andamento da obra. Dessa forma, cria-se a hipótese
de que ainda que as comissões não funcionem de forma atuantes no processo, pode-se obter
uma boa qualidade no projeto e sua inserção; mas não pode garantir a relação de propriedade
e autonomia que os beneficiários terão ao fim do empreendimento; o que comprovaria a
fragilidade contida nos arranjos que compõe o MCMV Entidades e a sua subjetividade sobre a
prática autogestionária.

 Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro

O segundo exemplo, trata-se dos Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro,


localizados em Suzano/SP (Região Metropolitana de São Paulo). O empreendimento foi
contratado na primeira fase do MCMV, no ano de 2010 com início das obras somente em
2014. A ideia para os mutirões nasceram da relação entre lideranças da União dos
Movimentos de Moradia (UMM) com o Grupo de Moradia Jardim Natal mobilizando assim
150 famílias para esta ação. Então, a USINA CTAH foi convidada para acompanhar o projeto
enquanto assessoria técnica. Assim, a primeira assembleia com os futuros moradores foi
realizada em março de 2010 onde foram dados os repasses sobre a negociação feita com a

56
Prefeitura - durante a gestão de Marcelo Candido (2005-2012), do Partido dos Trabalhadores -
que lhes concedeu o direito de uso de dois terrenos nas proximidades dos bairros onde
residiam os trabalhadores; contou com a presença dos arquitetos da assessoria técnica USINA
CTAH, em que foi apresentado a metodologia do trabalho autogestionário que se realizaria.
"Ao final da assembleia as famílias se manifestaram por voto unânime a favor do processo de
autogestão e contrárias à realização por construtoras."54 Dessa forma, o momento de
esclarecimento sobre o processo e o reconhecimento por parte das famílias do compromisso
com esse modelo de gestão se faz imprescindível para o bom funcionamento do projeto
participativo.

A apropriação – que se inicia na concepção do desenho de maneira participativa até


o fim da obra –, é um requisito fundamental da autogestão na luta pela produção de
outra cidade, na medida em que possibilita a construção de saberes e autonomia
como maneiras indissociáveis do fazer. Nesse sentido, o processo participativo
sempre produz tipologias variadas e áreas construídas maiores que aquelas
normalmente destinadas à habitação de interesse social, pois reflete o desejo e as
necessidades dos trabalhadores por moradia adequada. (USINA CTAH, Entre o
Projeto e o Canteiro, 2016: p.362)

Assim, nessa esfera de participação, a assessoria técnica começou a realizar um processo para
a concepção do projeto que se diferencia do exemplo apresentado anteriormente. Foram então
realizadas atividades juntamente às famílias que incluíram o debate de gênero no espaço de
moradia e a problematização das plantas padrão do programa MCMV. Para isso, a Usina, com
uma metodologia didática, utilizou ímãs como representação dos móveis em escala 1:10,
colando-os em uma lousa, para que as famílias em grupo pudessem formular os ambientes a
partir das suas necessidades.55

54
ATA da Assembleia, disponível em: http://taniamaria-5dezembro.blogspot.com.br/2011/06/primeira-
assembleia-autogestao.html Acesso em 16 out. 2017
55
Usina CTAH, Entre o Projeto e o Canteiro, 2016.
57
Figura 07_Processo de concepção participativo com as famílias e assessoria técnica Usina CTAH

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

Figura 8_Processo de concepção participativo com as famílias e assessoria técnica Usina CTAH

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

Depois dessas atividades, conseguiu-se fechar o programa para os mutirões em três


tipologias distintas com dois e três dormitórios e todas contaram com uma varanda ampla -
reivindicação das famílias por espaços abertos nos apartamentos, que podem ser visualizados
58
nas Figuras 09, 10 e 11. As coberturas contaram com espaços de lazer para uso comunitário,
sendo algumas com lajes impermeabilizadas e outras com áreas verdes.

Figura 09_ Tipologia 01 Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

Figura 10_ Tipologia 02 Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

59
Figura 11_ Tipologia 03 Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

Assim, na esfera das comprovações de que é possível viabilizar um projeto


arquitetônico de interesse social com soluções "não convencionais" considerando-se o âmbito
do MCMV, o sistema construtivo adotado foi a alvenaria cerâmica estrutural - que dispensa a
construção de vigas e pilares - e circulação vertical dada através de torres de escadas
metálicas que foram posicionadas antes da construção das alvenarias. Por estarem inseridos
em área urbanizada e por contar com infraestrutura, os pavimentos térreos que se voltavam
para a rua foram pensados para uso misto, ou seja, usos complementares à moradia contando
com áreas comunitárias, áreas de lazer e comércio. A perspectiva do projeto que possibilita
visualizar o uso comunitário nos terraços dos blocos, assim como o uso misto dado aos
pavimentos térreos pode ser vista na figura 12, abaixo.

60
Figura 12_Perspectiva do Projeto para os Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro

Fonte: Acervo Usina CTAH. Disponível em <http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html >


Acesso em: 16 out. 2017

Com a experiência dos Mutirões Tânia Maria e Cinco de Dezembro é possível


perceber mais uma possibilidade de atuação dentro do MCMV Entidades com resultados
satisfatórios; nos quesitos da qualidade arquitetônica, implantação, integração com o entorno
e processo participativo resultante na apropriação por parte das famílias ao projeto. Assim, é
importante ressaltar que tais resultados são consequências de um novo tipo de arranjo para
essa atuação, destacando-se inclusive, a parceria feita com a Prefeitura de Suzano ao ceder o
terreno e por se responsabilizar pela implantação dos espaços públicos propostos para os
térreos dos blocos - conforme visto anteriormente. Isso comprova como o resultado de cada
experiência é subordinado à variantes das relações estabelecidas entre entidade, assessoria
técnica, beneficiários e o poder público.

Assim, como forma de compreender as relações que se estabelecem à nível local e os


seus resultados refletidos nas políticas de habitação, a seção seguinte abordará as políticas de
habitação social e os arranjos resultantes da atuação dos agentes produtores dessa habitação.

3. POLÍTICAS DE HABITAÇÃO SOCIAL EM ARACAJU E REGIÃO


METROPOLITANA

Assim como diversas outras cidades brasileiras, Aracaju possui as raízes do seu
desenvolvimento pautadas na segregação socioeconômica; e isso pode ser explicado a partir
do contexto de seu surgimento. Aracaju torna-se oficialmente capital de Sergipe no dia 17 de
março de 1855 e isto acontece devido interesses econômicos em transferir de São Cristóvão -
61
a fim de, responder à política mercantil e capitalista no Brasil daquela época - e, assim,
estabelecer a construção da capital em área que favorecesse o contato de importação e
exportação.

Aracaju, embora obedecesse o pré-requisito da localização litorânea, fora instalada em


área pantanosa, muito abaixo do nível do mar e, por isso, propícia a inundações. No ano
seguinte à sua criação, é implantado o primeiro instrumento legislativo da cidade - o Código
de Posturas -, que determinava o comportamento dos transeuntes e habitantes da área
planejada e, inclusive no que dizia respeito às suas vestimentas, além de, também proibir a
construção de casebres de palha. (CARVALHO, 2013) De tal forma, percebe-se o caráter de
segregação contido em suas raízes e a política higienista que passa a se instalar, uma vez que,
além do ponto central onde foi inserida a cidade projetada, a partir - principalmente - do
código de conduta estabelecido, os povos mais pobres e os negros alforriados passam a ocupar
um pequeno povoado no alto do morro Santo Antônio - hoje, o que consiste o Bairro Santo
Antônio -.56

Dessa forma, é possível começar a traçar a trajetória da expansão territorial delineada


pela política de habitação, em que começou a se estabelecer um processo de marginalização
para parte da população impossibilitada de ocupar a cidade na sua centralidade, esta, que
passara a prover das infraestruturas necessárias; instituindo a cidade segregada.

Como forma de demonstrar a construção dessa cidade, a subseção seguinte abordará


de forma mais detalhada a atuação dos programas de interesse social no âmbito estadual e
municipal, em Sergipe, Aracaju e sua Região Metropolitana na tentativa de intercalar as
experiências promovidas pela política habitacional.

3.1 ATUAÇÃO DOS PROGRAMAS HABITACIONAIS NO ÂMBITO


MUNICIPAL

Logo, no que diz respeito às políticas habitacionais, parte-se do contexto do BNH -


assim como na seção 2 desta pesquisa -, e da COHAB, responsável pela produção
habitacional local. É nesse momento de impulsão por parte do Governo Federal que se
intensificam as ações do poder público no estado de Sergipe. Desta forma, a COHAB/SE foi

56
LOUREIRO, 1983 apud CARVALHO, 2013
62
criada, enquanto uma sociedade de economia mista57 por resulução do Conselho de
Desenvolvimento Econômico de Sergipe58 (CONDESE). O primeiro conjunto habitacional
construído pela COHAB/SE data de 1968 - Conjunto Castelo Branco I -. Juntamente à
COHAB/SE, estava inserido no programa do SFH, o Instituto de Cooperativas Habitacionais
(INOCOOP); entretanto, ao contrário da COHAB/SE que desempenhava o papel de construir
casas para a população com renda entre 01 a 05 salários mínimos, o INOCOOP era
responsável pela provisão dessas habitações para a população com renda entre 05 a 10
salários e, através de empreiteiras.

A COHAB adotou como parâmetro básico a construção de conjuntos habitacionais


distantes da malha consolidada. Tal procedimento exigiu na ampliação de
infraestrutura (água, energia, transporte, entre outros), valorizando ainda mais os
espaços vazios localizados entre a malha e as novas áreas ocupadas.(FRANÇA,
1999: p. 82)

Com a valorização do solo a partir dos vazios urbanos ocasionados pelo distanciamento das
implantações dos conjuntos habitacionais populares - citados acima - pode-se começar a
traçar a tendência especulativa imobiliária que continha nas ações das políticas habitacionais.
Fato que contribui para a negação do direito à cidade, intencionalmente, enquanto instrumento
de enriquecimento do setor imobiliário e da construção civil, ressaltando que, isso não seria
possível sem a participação, consciente, também do estado nesse processo, uma vez que, a
implantação da infraestrutura necessária é de sua atribuição.

No ano de 1973 é sancionada a Lei que executa no âmbito estadual o Plano Nacional
de Habitação Popular (PLANHAP).59 Essa lei que previu o alinhamento da política estadual
com a nacional, determinava ações que pudessem alcançar tal objetivo. Eram eles: "elaborar
planos, programas e projetos de acordo com os objetivos do PLANHAP, fiscalizando-os por
meio de suas entidades administrativas diretas e indiretas; integrar o Estado e entidades de
administração direta e indireta no Sistema de Habitação Popular (SIFHAP); instituir o Fundo
Estadual de Habitação Popular (FUNDHAP); “promover a reestruturação da COAHB/SE e
fazê-la ajustar-se permanentemente, às normas de organização de operações baixadas pelo
BNH”. (CARVALHO, 2013). Entretanto, embora tenha estruturado modificações

57
Lei 1917/74 - “Art. 3º - Para os fins desta lei, considera-se: [...] III - Sociedade de Economia Mista - a entidade
dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei para exploração de atividade que o Estado
venha a exercer mediante a associação de capitais governamentais e privados, sob a forma de sociedade
anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria ao Estado e a Entidade da Administração
Indireta”
58
Decreto n° 470, de 31 de março de 1959 e atualmente extinto.
59
Lei Nº 1805, De 07 de Novembro De 1973.
63
organizacionais importantes, é válido ressaltar que esta não alcançou os objetivos descritos no
Art. 1º:

I - Eliminar, no período máximo de dez anos, o "déficit" estadual de habitações para


famílias com renda regular entre um e três salários mínimos regionais; II - Atender à
demanda adicional de habitações que venha a ocorrer, na mesma faixa de renda.
(GOVERNO do ESTADO. LEI n° 1.805, de 07 de novembro de 1973).

Logo, no âmbito das mudanças organizacionais realizadas, em 1974 é novamente instituída


uma nova lei que altera a estrutura da COHAB-SE60; na qual passou a se vincular à Secretaria
da Justiça e Ação Social (antiga Secretaria de Justiça), perdendo assim o seu vínculo com a
CONDESE. Outra ação do Governo do Estado nesse período foi uma modalidade
denominada Terreno Próprio (TP).

Segundo técnicos da COHAB/SE, este programa consistia no financiamento da


construção de unidades em parceria com o agente do setor público ou privado, que
já possuía o terreno para implantação destas unidades habitacionais, como por
exemplo, o conjunto Jessé Pinto Freire. (CARVALHO, 2013: p.69)

Partindo para o fim da década de 70, onde, nacionalmente se instituía um contexto de


inadimplência por parte das camadas mais pobres e, a não eficiência de atendimento no
âmbito do BNH - já explicitadas na seção 2 - algumas medidas são tomadas e entre elas a
criação do programa Estadual FICAM - Financiamento para Construção, Ampliação e
Melhorias - no ano 1980.

Em 1983 novas mudanças organizacionais administrativas virão atingir mais uma vez
a COHAB/SE e sua estrutura. Agora deixaria de ser vinculada à Secretaria da Justiça e da
Ação Social; e passa a ser subordinada à Secretaria de Habitação e Previdência Social
(SEHAP).61 É a primeira secretaria ligada diretamente ao governo do estado, que tratava
especificamente da questão habitacional.

Entretanto, segundo Souza (2009) as décadas de 70 a 90 foram marcadas por uma


política segregadora conduzidas pelas ações do Estado de Sergipe através da COHAB-SE, o
que trouxe desequilíbrios sociais uma vez que os conjuntos habitacionais foram construídos
para atender aos interesses das construtoras e eleitorais, em que, as estratégias adotadas não
previam a consulta popular. Nesse contexto é importante ressaltar a inserção das "cidades
dormitórios" no corpo da Região Metropolitana de Aracaju; como é o caso de Nossa Senhora
do Socorro, em que a partir da explosão demográfica dada nas décadas passadas pela

60
Lei Nº 1917, de 18 de Dezembro de 1974.
61
Lei N° 2.410, de 14 de Março De 1983
64
construção dos conjuntos nessas cidades circunvizinhas gerou um amplo processo de
metropolização, o que fortaleceu a segregação sócio-espacial entre o centro e a periferia.

Assim, enquanto experiência do regime de mutirão na construção da habitação social


tem-se o Conjunto João Alves Filho, que contou com cerca de 3.458 UH's destinadas a
funcionários públicos com rendimento mensal de até 4 salários mínimos. Assim, a construção
foi dividida em 3 fases; sendo a primeira etapa construída em novembro de 1985 e, em um só
dia, obteve-se a construção de 221 casas. Nesse sistema de mutirão as casas eram pré-
moldadas, em que houve uma interação entre as empresas de material de construção, os
mutuários, a COHAB e as construtoras Cosil, Celi, Genco, Pecon e Caioba que ficaram
responsáveis pela construção das placas das paredes, piso, pilares e dos anéis de fundação. E
ao estado coube a assistência técnica a partir da COHAB. (FRANÇA, 1999) Entretanto, a
partir desse quantitativo das unidades habitacionais é possível ter uma breve noção da
possível sobrecarga que atingia os mutirantes a partir desse caráter apenas assistencialista
oferecido pelo governo.

França (1999), aponta que a opção pela casa pré-moldada era uma opção muito
dispendiosa e que não possuía conforto térmico, além de não ter qualidade arquitetônica
assinalando a sua baixa qualidade e pouca durabilidade; dessa forma, afirma que os altos
custos contribuíram para a descapitalização da COHAB-SE e que o mutirão serviu apenas
como propaganda política como uma forma de manutenção do poder na tentativa de
demonstrar agilidade na resolução dos problemas da comunidade usando o trabalhador.

No cerne dessa questão, Francisco de Oliveira (2006), faz uma crítica62 aos regimes de
mutirão aplicados enquanto solução habitacional de forma generalizada. Ele defende que a
industrialização nesse período estava se fazendo sob os recursos da classe trabalhadora, que
autoconstruía a sua habitação e assim, rebaixava o custo de reprodução da força de trabalho.
Ou seja, parte-se do pressuposto que ao autoconstruir em massa, passa-se a haver a
desvalorização do trabalhador assalariado das construções baseando-se na lógica da oferta e
da procura.

Assim, a sua crítica é totalmente pertinente e, exatamente por isso é importante


ressaltar, novamente, a diferença entre o mutirão e a autogestão, em que o primeiro é dado
62
"O mutirão é uma espécie de dialética negativa em operação.A dialética negativa age assim:ao invés de elevar
o nível da contradição,ela o rebaixa.Elevar o nível da contradição significaria atacar o problema da habitação
pelos meios do capital.Rebaixar o nível da contradição significa atacar o problema da habitação por meio dos
pobres trabalhadores." OLIVEIRA, 2006: p. 72
65
pela uso da mão de obra das famílias beneficiárias e nesse, sim, pode-se considerar um espaço
à margem da exploração da força de trabalho, além de retratar um quadro de injustiça - vide,
esse método não ser necessário para as construções de conjuntos habitacionais para as
famílias de maiores rendas - e estabelecer uma situação de alienação, uma vez que a
participação das famílias se restringe ao uso da sua força de trabalho e determina o seu
alijamento das demais decisões; e a autogestão, parte do princípio da autonomia da gestão de
todas as atividades que concernem a produção da moradia, desde o momento da contratação,
compra de materiais, administração financeira e a participação na concepção do projeto
arquitetônico e urbanístico junto à assistência técnica.

Nesse contexto, a atuação da COHAB - até o momento da sua descapitalização -,


marcou o período pela ampliação no número das empresas de construção civil decorrentes das
ações do Estado, passando de 18 empresas locais na década de setenta, para 174 até os anos
noventa. (CAMPOS, 2006 apud SOUZA, 2009) Assim, é possível confirmar a tendência
neoliberal à nível federal na década de 90 com os Governos Collor e FHC, ao dar abertura
nesses espaços para o investimento privado.

Partindo então para o contexto da extinção do BNH (1986), onde as suas funções
foram transferidas para a CEF; a nível estadual e municipal, a COHAB-SE se transformara
em Companhia Estadual de Habitação e Obras públicas - CEHOP63. A partir dessa mudança,
outras funções além da provisão da habitação passam a incorpora-la; assim, enquanto
construtora e fiscalizadora das obras públicas do Governo do Estado, passa a se
responsabilizar pela implantação de escolas, postos de saúde, penitenciária, áreas de lazer, etc.

Assim, entre 1988 e 1998 ocorreu uma diminuição dos investimentos para os
empreendimentos de habitação social. Carvalho (2013) indica que a produção dessa década se
resume a apenas 1.384 unidades habitacionais, por meio do programa federal PRONHAP e do
estadual FICAM, enquanto somente o INOCOOP produziu 1.462 unidades. É importante
acentuar aqui como essa produção é mísera se comparada à dos períodos anteriores e
estabelecer o comparativo em relação à produção da INOCOOP - voltada para a população de
5 a 10 salários mínimos - nessa mesma época, destacando o aumento na produção da
habitação para a população mais abastada e que não correspondia ao déficit habitacional.

63
Lei n° 2.960
66
Entretanto, sobre ações na década de 90 e, de acordo com publicação da SEPLAN
(1995), algumas medidas foram tomadas para conter o déficit habitacional diante da
diminuição dos investimentos do Governo Federal; a Fundação de Desenvolvimento do
Estado de Sergipe (FUNDESE) passou também a produzir essas UH's em regime de mutirão,
com verba do Orçamento Geral do Estado. (TRAMA, 1995 apud CARVALHO, 2013)

Assim, enquanto modo de disfarce para uma "participação popular", Souza (2009)
também aponta para essas casas populares que foram levantadas em sistema de Mutirão,
cedendo o material e utilizando a mão de obra dos futuros moradores como forma de
barateamento do investimento. No entanto, essa situação estabelece um cenário que se
diferencia totalmente das propostas de mutirão que continham a autogestão como
procedimento organizacional do processo, como foi o caso da Gestão Erundina em São Paulo
- explicitado na seção 2. Entretanto é importante ressaltar que, nesse âmbito, os movimentos
populares - a nível nacional - evoluíram o seu discurso por toda problematização acerca dos
mutirões e passaram a levantar a bandeira "por menos mutirão e mais autogestão", 64 por
compreender que a inserção no processo de gestão é muito mais importante e democrática.

Assim, embora a produção da FUNDESE não tenha se dado de um modo qualitativo


relevante, já no final da década de 80, foram utilizadas glebas no extremo oeste do município
- limitando-se com o município de São Cristóvão - para a construção de alguns conjuntos
habitacionais e que deu origem às ocupações do atual bairro Santa Maria; um local de difícil
acesso e com uma série de fragilidades ambientais.

Todavia, contando com os avanços da década de 80 na política urbana que refletira a


luta dos movimentos sociais urbanos e da construção de um novo modelo de gestão da
política habitacional focada nos municípios, a dinâmica fora modificada. Dessa forma, em
1990 foi aprovada a Lei Orgânica do Município que tina enquanto objetivo organizar e reger o
município, obedecendo os parâmetros constitucionais65.

É então nesse contexto, em 1998, que Aracaju e Nossa Senhora do Socorro passam a
integrar o Programa Habitar Brasil/BID que tinha o objetivo de promover intervenções em
assentamentos subnormais, através de dois subprogramas: o chamado DI - Desenvolvimento
Institucional de Municípios e o UAS – Urbanização de Assentamentos Subnormais.

64
LOPES, João Marcos, 2006
65
Lei Orgânica do Município- Art 1° - Parágrafo único
67
O DI, tinha por objetivo construir, ampliar ou modernizar a capacidade institucional
dos municípios para a melhoria das condições habitacionais das famílias de baixa renda. E o
UAS, com a finalidade de implantar os projetos integrados de "assentamentos subnormais" a
partir da compreensão da regularização fundiária enquanto instrumento e a implantação de
infraestrutura urbana e de recuperação ambiental nessas áreas, garantindo a participação
popular na concepção e implantação dos projetos.

No ano de 2001, é instituída a Lei Federal 10.257/2001 que cria o Estatuto da Cidade
enquanto instrumento que regulamente o capítulo da política urbana presente na Constituição
Federal de 1988. Esse instrumento visa garantir o papel social da cidade e da propriedade e, a
democratização da política urbana. Embora o Estatuto só tenha sido regulamentado em 2001,
os governos municipais, estimulados pela ideia do fortalecimento da gestão local iniciaram
seus processos antes mesmo da aprovação do instrumento.

Dessa forma, no ano de 2000, é aprovado o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano


da Cidade de Aracaju. Assim, no ano seguinte e, de modo a integrar o DI, surgiu o PEMAS
(Plano Estratégico Municipal para Assentamentos Subnormais), que objetivou implantar um
conjunto de ações que tinham a finalidade de ampliar a capacidade institucional das
Prefeituras para que pudessem atuar na melhoria das condições habitacionais das famílias de
baixa renda.

De acordo com o PEMAS de Aracaju (SEPLAN ARACAJU, 2001), o déficit


habitacional do município em 2001 era de 13.800 residências, além da necessidade
de melhoria de 10.000 residências já existentes. Foram identificadas a partir deste
estudo técnico 72 favelas na capital. Já o PEMAS de Nossa Senhora do Socorro
(SEPLAN NOSSA SENHORA DO SOCORRO, 2004) identificou 31 assentamentos
subnormais no município, além de um déficit habitacional de 8.208 moradias.
(SOUZA, 2009: p. 58-59)

Dessa forma, de acordo com diagnóstico do PEMAS, dos mais de 460 mil habitantes
que residia no município (2001), mais de 15% da população viviam em 14.845 domicílios
situados em 52 áreas em condições de subnormalidade. Entretanto, o déficit habitacional do
município, alcançou 23.751 domicílios. Em que, dadas as condições naturais do sítio de
Aracaju, a maioria desses assentamentos estavam situados em locais alagados ou sujeitos à
inundações.

Assim, apesar da situação crítica da maioria das habitações diagnosticadas nas AEIS (
Áreas Especiais de Interesse Social) no Município de Aracaju, o PEMAS aponta para a
insuficiência ou inexistência dos instrumentos municipais de política habitacional e ainda se

68
encontravam fortemente desarticulados. A ausência de um órgão gestor de uma política
habitacional, refletia nos "poucos registros de uma atuação efetiva do município na produção
de unidades habitacionais, ficando restrito à eventuais recuperações de moradias afetadas por
inundações ou fenômenos semelhantes." (PEMAS, 2006: p. 122)

No âmbito nacional, em 2003 é criado o Ministério das Cidades e em 2004, o Plano


Nacional de Habitação (PNH) enquanto medida do Governo Lula. O plano tinha a ideia de
solucionar o déficit habitacional a partir da ação integrada entre os três níveis de governo e
por intermédio do Ministério das Cidades.

A PNH preconiza a divisão do Sistema Nacional de Habitação em dois sistemas de


atuação; um destinado ás ações do mercado e, outro destinado à promoção da habitação de
interesse social - população com renda de até 3 salários mínimos. Essa divisão aconteceu para
garantir a redistribuição dos investimentos de forma mais igualitária. Para isso, foram
elaborados o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e o Fundo Nacional de
Interesse Social para fazerem o arrecadamento e distribuição da renda proposta para a
promoção das habitações de interesse social.

Para isso, à nível de atuação estadual e municipal, era necessária a elaboração de um


projeto de lei que instituísse um Fundo e um Conselho Municipal ou Estadual de habitação ,
além de um Plano Local de Habitação de Interesse Social.

Por conseguinte, retornando à esfera local, em 2004 é criado o Fundo Municipal de


Habitação e seu Conselho Deliberativo com a finalidade de proporcionar bases financeiras
para a execução de projetos e programas habitacionais de interesse social. No seu artigo 3º, é
acrescentado que este fundo será gerido pela Secretaria Municipal de Planejamento,
entretanto, contará com a participação do Conselho Municipal de Habitação. Já no seu artigo
4º, existe a determinação de que o Conselho tem caráter deliberativo, fiscalizador e
consultivo. (CARVALHO, 2013)

Em 2004, é então implantado em Aracaju o Programa Moradia Cidadã a partir do


Decreto 169 de 21 de maio de 2004, que passou a determinar durante algum tempo as ações
referentes à política de habitação na cidade e suas ações foram baseadas no diagnóstico da
situação habitacional elaborado pelo PEMAS. Entretanto, o Diagnóstico Municipal referente
aos aspectos da habitação de interesse social elaborado em 2015 pela Prefeitura Municipal de
Aracaju (PMA), quando o PEMAS foi elaborado em 2001 e apontou 52 assentamentos
69
subnormais, ao final da pesquisa de campo já existiam de fato 72 assentamentos de ocupação
irregular.

Contudo, no âmbito das atuações do Programa Moradia Cidadã, foram realizadas


obras de urbanização nas ocupações irregulares no bairro Santa Maria situadas em áreas de
risco de inundação. Assim, a Prefeitura Municipal lança o Projeto Bairro 17 de Março, em
2007, que entretanto, se diferencia das obras de urbanização citada acima. O projeto contou
com a implantação e construção de novas habitações em local distante do centro da cidade,
para abrigar as famílias advindas de outros bairros caracterizados como área de risco. Além da
implantação das unidades habitacionais foram projetados equipamentos sociais como escolas,
bibliotecas e áreas verdes.

Pode-se ressaltar que não houve estudo de adequação desses equipamentos em


relação à demanda de pessoas que ali foram morar, o que pode ser exemplificado
pela falta de unidades de educação: para uma população de quase 9000 habitantes só
tem uma escola de 8 salas de aula. (PMA - Diagnóstico de Aracaju, 2015: p. 5)

Apesar disso, o bairro passou a apresentar condições contraditórias aos ideais do


projeto elaborado pela Prefeitura. Os equipamentos públicos insuficientes e a depredação dos
existentes passou a ser um grave problema enfrentado pelos moradores. Assim, somente em
2011 é instituída a Lei que cria o Bairro 17 de Março66, o qual recebe 2.012 famílias
residentes das áreas precárias e de risco, como Morro do Avião, Invasão do Arrozal, Prainha,
Marivan, Água Fria, Gasoduto e outros locais. (FRANÇA, 2016)

Alguns pontos foram assinalados pela Prefeitura Municipal no Diagnóstico,


elaborado na revisão do Plano Diretor, como a descaracterização das moradias e sua
transformação em outros usos, como padarias, mercearias, igrejas. Além disso,
também foi noticiada a venda ilegal das moradias, detectada poucos meses após a
entrega oficial, com valor negociado por cerca de dez mil reais (SEPLOG, 2015
apud FRANÇA, 2016: p.156).

Assim, as problemáticas que giram em torno da implantação do Bairro e a falta de


apropriação dos moradores, alerta para a necessidade de se entender a resolução da questão da
moradia, não somente enquanto quantitativa; mas pela compreensão da responsabilidade do
Poder Público em relevar o contexto das famílias, ou seja, não trata-se simplesmente da
relocação de famílias de um extremo a outro da cidade, sem o alinhamento das demais
políticas que objetive e realize a implantação de um bairro contemplado por espaços públicos
de qualidade; porque são através dessas medidas que a população de baixa renda se sente
inserida, diferentemente do histórico do alijamento das suas demandas.

66
Lei Municipal n°4024/2011
70
Outro conjunto habitacional instalado pela PMA foi o conjunto habitacional Vitória da
Resistência , no bairro Lamarão, que substituiu a ocupação da antiga Salina São Marcos;
proposto em 2012 e concluído em março de 2014 ofertou 410 UH's. A PMA passou então a
acompanhar e prestar assistência técnica aos moradores de modo a regular o que pode ou não
ser feito ou modificado nas unidades que foram entregues. (PMA - Diagnóstico de Aracaju,
2015) Dessa forma, buscou-se chegar a resultados que se diferenciem dos citados acima na
experiência do Bairro 17 de Março.

Em fevereiro de 2001, havia sido instituído à nível nacional, o Programa de


67
Arrendamento Residencial (PAR) . Tinha enquanto objetivo propiciar moradia à população
de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra. As ações do
PAR são decorrentes da iniciativa privada que se dirige à Superintendência Regional da
CAIXA ou Agências da CAIXA, nos Municípios de abrangência do Programa para buscar
informações a fim de formalizar a proposta.

Em Aracaju, os empreendimentos do PAR aconteceram prioritariamente nas regiões


sul e sudoeste do município, totalizando 6.830 unidades habitacionais. Essas construções se
deram nos mesmos bairros que já vivenciaram as produções feitas pelo Estado e podem ser
constatados na Tabela 04 a seguir.

Tabela 5_ Unidades Habitacionais Construídas pelo Programa de Arrendamento Residencial – PAR –


2001 - 2009

Empreendimento Número Localização Ano


2001-2007 de UH's
1 Residencial Mirassol 132 Aeroporto 2001
2 Res. Vila Verde I 84 Aeroporto 2001
3 Res. Vila Verde II 84 Aeroporto 2001
4 Res. Lagoa Doce 96 Jabotiana 2002
5 Res. Colinas Residencias 108 Lamarão 2002
6 Res. Solar I e II 80 - 2002
7 Res. Salinas 40 Aeroporto 2002
8 Res. Laguna 80 Aeroporto 2002
9 Res. Bela Vista 144 Jabotiana 2003
10 Res. Costa Norte 176 S. Campos 2003

67
Lei Nº 10.188, de 12 de Fevereiro De 2001
71
11 Res. Alto da Boa Vista 266 - 2003
12 Res. Pousada Verde 112 - 2003
Res. Villa Vitória 407 Capucho 2004
13
14 Res. Villa Velha 240 - 2004
15 Res. Morada do Sol 160 - 2004
16 Res. Brisa Mar 496 Z. Expansão 2004
17 Res. Horto Do Carvalho I 238 Z. Expansão 2004
18 Res. Costa Nova I 200 Z. Expansão 2004
19 Res. Costa Nova II 200 Z. Expansão 2004
20 Res. Sen. Gilvan Rocha 176 Farolândia 2004
21 Res. Costa Nova IV 122 Z. Expansão 2005
22 Res. Costa Nova III 122 Z. Expansão 2005
23 Res. Horto do Carvalho II 185 Z. Expansão 2005
24 Res. Águas Belas 180 Z. Expansão 2005
25 Res. Santa Fé 176 Jabotiana 2006
26 Res. Padre Melo I 160 Farolândia 2006
27 Res. Padre Luis Lemper 160 Farolândia 2006
28 Res. Franco Freire I 240 Aeroporto 2006
29 Res. Sergio Vieira de Melo 500 S. Conrado 2006
30 Res. Nova Canaã 144 Lamarão 2006
31 Res. Santa Maria 126 Aeroporto 2006
32 Res. Rio Poxim 160 Jabotiana -
33 Res. Campo Belo 140 - -
34 Res. Franco Freire II 240 Aeroporto 2007
35 Res. Jose Rosa de O. Neto 208 Jabotiana 2008
36 Res. Dr. Armando Domingues 160 Olaria 2008
37 Res. Tennyson Fontes 160 Jabotiana 2007
38 Res.Drº Armando Domingues 160 Olaria -
Total 6.830
Fonte: PMA - Diagnóstico de Aracaju, 2015: p. 6-7

No ano de 2009, o PAR fora substituído pelo Programa Minha Casa Minha Vida -
PMCMV (Lei Federal n°11977/2009), atual programa de atuação nacional. Criado pelo
72
Governo Federal no contexto da crise econômica vivida no ano anterior (2008), aprece
enquanto aparato para impulsionar o país economicamente e, para isso, ampliaria o acesso ao
mercado habitacional para atendimento das famílias com renda de até 10 salário mínimos
(SM).

O programa se subdivide em dois eixos de atendimento - eixo de interesse social, faixa


de renda entre 0 a 3 salários mínimos por família; e eixo de (mercado “popular” ou
“econômico, faixa de renda de 3 a 10 salários mínimos por família -; o primeiro, recebe
subsídio do orçamento geral da união (OGU) e, o segundo, são recursos provenientes do
FGTS.

Dessa forma, desde que foi implantado até o ano de 2013, o MCMV construiu mais de
44 empreendimentos, numa soma de 10.572 UH's. Essa produção corresponde à 62,45% da
produção total em Aracaju; localizando-se majoritariamente nas zonas norte, oeste e sul e em
bairros na Zona de Expansão. Entretanto, apenas 02 empreendimentos foram voltados para a
população de 0 a 03 salários mínimos e, ainda assim, localizados em bairros distantes da
malha urbana consolidada; o que soma 650 moradias, sendo que, 95,7% do déficit
habitacional correspondiam à faixa de renda de 0 a 3 salários mínimos. (PMA - Diagnóstico
de Aracaju, 2015)

À vista disso, segundo o Diagnóstico de Aracaju (PMA, 2015) cerca de 88% do total
dos beneficiários do programa em Aracaju estão inseridos na faixa de 3 a 10 salários mínimos.
Esses dados demonstram a ação arbitraria do programa à nível local, uma vez que o PNH
estabelece a redistribuição dos subsídios investidos na decorrência da possibilidade de
inserção nas políticas de financiamento privada da habitação por parte das camadas de maior
renda, em que estas, passam a ser privilegiadas em detrimento da atuação para a maior parcela
correspondente ao déficit habitacional.

Na esfera das medidas a partir de ações com caráter participativo, no ano de 2010, foi
elaborado o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS) por intermédio da
participação da população a partir das discussões sobre as questões habitacionais na 3°
Conferência das Cidades e pelo envio de sugestões através site da PMA.

No diagnóstico contido no PLHIS, o déficit habitacional de Aracaju compreende


20.851 unidades sendo que 19.955 delas correspondem à famílias com rendimentos entre 0 a
3 salários mínimos. Para isso, a ideia do déficit habitacional compreende a noção mais
73
imediata na necessidade de construção de novas moradias, logo, espelha a quantidade de
habitação que deve ser construída. Entretanto, a se tratar da Inadequação de Domicílios, o
déficit eleva para 26.149 unidades, sendo que dentre essas 25.025 situam-se na faixa de 0 a 3
salários mínimos.68

Enquanto ação resultante do PLHIS, após o reconhecimento desses déficit e


localização das comunidades e assentamentos precários, o Município realizou o cadastro
dessas famílias para incluí-las no benefício do Auxilio Moradia; na qual, após cadastradas, as
famílias passam a receber o valor mensal de R$300,00 como forma de auxilio para o
pagamento de gastos relacionados à moradia mediante comprovação da aplicação desse
recurso. Entretanto, essa medida tem caráter assistencialista e paliativa, porque em si, não
resolve a questão do déficit ou das condições de moradia dessas famílias.

No ano de 2013, foi iniciada a construção de 580 moradias no bairro Porto D’Antas,
em área cedida Gerência Regional do Patrimônio da União - GRPU. Construído com recurso
Federal através do Programa Pró-Moradia69. As moradias foram destinadas às famílias de
baixa renda que viviam em condições precárias, às margens de mangues (área de preservação
permanente pela Legislação Federal e de interesse ambiental pelo Plano Diretor), às margens
da Avenida Euclides Figueiredo, no entorno do Conjunto Porto D’Antas.

Figura 13_ Ocupação irregular em área de interesse ambiental no bairro Porto D'antas

França, 2016: p. 158


Assim, entre os anos de 2001 e 2014, foram construídas 6.704 moradias no Município
de Aracaju. França (2016) aponta os projetos habitacionais enquanto destaques não somente
pelas obras, mas também pelo enfoque na urbanização - com acompanhamento social -
planejamento da mobilidade das famílias e organização destas no projeto; assim como, para a

68
PMA- Plano Local de Habitação de Interesse Social, 2011
69
Programa do Governo Federal para famílias de baixa renda, o qual utiliza recurso do FTGS e contrapartida so
solicitante para oferecer financiamento a Estados, Municípios, Distrito Federal e empresas públicas não
dependentes atendam famílias com renda mensal de até R$ 1.395,00.
74
recuperação ambiental de áreas degradadas como o manguezal dos bairros Coroa do Meio e
no Santa Maria, com o plantio de árvores no Morro do Avião.
Entretanto, essa produção de iniciativa do Poder Público, é ínfima se comparada à
produção habitacional de programas destinados à iniciativa privada, a exemplo do PAR, no
qual de 2001 a 2008, totalizam-se 6.850 unidades habitacionais em sete anos, ou seja,
corresponde a um número ainda maior do que o produzido pelo Estado e Município, durante
catorze anos.
Tabela 6_Projetos Habitacionais Aracaju 2000-2014

Agente Projeto Bairro Unidades


Responsável Habitacionais
Prefeitura Urbanização da Coroa do Coroa do Meio 652
Municipal Meio
Urbanização do Santa Maria Santa Maria 1.900
Construção do 17 de Março Zona de 2.562
Expansão
Urbanização da Invasão do Porto D’Antas 600
Coqueiral
Residencial Vitória da Lamarão 410
Resistência
Governo do Conjunto Porto D’Antas Porto D’Antas 580
Estado
Total 6.704
Fonte: FRANÇA, 2016: p.159

75
Figura 14_ Projetos Habitacionais Aracaju 2000-2014

Fonte: FRANÇA, 2016: p.154

76
Tabela 7_ Programa de Arrendamento Residencial – PAR Empreendimentos e Unidades Habitacionais 2001-
2008

Zonas Bairro Empreendimentos Unidades


Habitacionais
Total %
Norte Industrial 96 1,40
Lamarão 252 3,68
Soledade 112 1,64
Cidade Nova 266 3,88
Oeste Capucho 407 5,94
Jabotiana 1184 17,28
Olaria 160 2,34
São Conrado 500 7,30
Siqueira Campos 176 2,57
Sul Farolândia 848 12,38
Zona de Expansão 2.849 41,59
Total 39 6.850 100
Fonte: FRANÇA, 2016: p.163
Ainda na esfera da produção da habitação pela iniciativa privada, tem-se a atuação do
Programa Minha Casa Minha Vida, que possui a sua maior produção nas modalidades de
mercado, ou seja Faixas 1,5; 2 e 3; e não, onde maior se concentra o déficit habitacional.

Tabela 8_ Produção atual MCMV

Operação Modalidade Situação Número De Total Total de UH


Unidades de UH por
Habitacionais Operação
Faixa 1,5 Em 464 464
Execução
Faixa 2 Em 4.109 18.361
Operação de Execução
Mercado Concluído 14.252 24.651
Faixa 3 Em 128 5.826
Execução

77
Concluído 5.698
FDS Em 1.525 3.004
Execução
Habitação de Concluído 1.479
Interesse Paralisado 1 Empreendimento 15.431
Social Em 2.532 12.427
PNHR Execução
Concluído 9.895
Paralisado 7 Empreendimentos
Elaboração da autora. Fonte: CAIXA, 2017
A pouca produção para as operações de habitação de interesse social, são marcadas
pela dificuldade do acesso à terra urbanizada, barata e que viabilize a produção, visto a
grande demanda de terra para outras faixas. Assim, as famílias que possuem a renda de 3 a 10
salários mínimos, encontram uma maior oferta de moradias, porque a sua construção e venda
é mais favorável ao mercado imobiliário.

Tabela 9_ Aracaju - Distribuição das Unidades Habitacionais e Déficit Habitacional 2009 a 2014

Até 3 % De 3 a 10 % Total
SM SM
Déficit Habitacional (2010) 19.955 95,70 896 4,30 20.851
Número de Unidades Projetos 6.704 100 0 0 6.704
Habitacionais PAR 0 0 6.850 100 6.850
MCMV 1.262 12,64 8.724 87,36 9.986
Total 7.966 33,84 15.574 66,16 23.540
Fonte: FRANÇA, 2016: p. 178
Assim, diante dos dados apresentados, embora os programas carreguem o discurso da
redução do déficit habitacional, o que se constata, é o inverso. As famílias que possuem renda
de até 3 salários mínimos, correspondem à 95,7% do déficit, não são alvo central dos
programas de moradia e isso é decorrente dos diversos arranjos que compõe a produção da
habitação. Ou seja, a produção da habitação será resultado da relação entre os seus agentes
produtores, onde, deve ser levado em consideração o que pleiteiam os movimentos sociais e
os resultados obtidos a partir das suas demandas. Dessa forma, o subcapítulo seguinte,

78
abordará os agentes produtores dessa habitação e as consequências obtidas na inversão das
prioridades.

3.2 OS AGENTES PRODUTORES DA HABITAÇÃO EM ARACAJU

"(...) a cidade é o local de concretização da produção, circulação e consumo


capitalistas, mas, é também, resultante da própria produção, ou seja, é meio e
produto simultaneamente. É ao mesmo tempo, palco do conflito da divisão de
classes, em função da diversidade de interesses, especialmente entre o capital e o
social" (HARVEY, 1980; GOTTDIENER, 1993 apud FRANÇA, 2016: p.40).

A produção da habitação será resultado da união de fatores e agentes que atuam na


cidade e que se dispõe à produzir essas unidades a partir de uma motivação e com uma
finalidade específica; nas quais, essas serão consequência do contexto que se estabelece no
espaço urbano.

Corrêa (2011), considera a produção do espaço como decorrente da ação dos agentes
sociais, com papeis não totalmente definidos, portadores de interesses, contradições e práticas
que podem partir de um objetivo comum ou individual. Dessa forma, o seu produto estará
sempre subordinado aos interesses de quem o produz.

França (2011), caracteriza a formação do tecido urbano a partir de quatro agentes: os


proprietários fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais de baixa
renda. Assim, são esses os principais agentes na esfera da produção da Habitação de Interesse
Social e que serão abordados adiante.

Os proprietários fundiários, irão se interessar pelo uso mais rentável possível, uma vez
que a terra é mercadoria no espaço urbano. Logo, suas ações são interseccionais às
intervenções governamentais, uma vez que este tem a atribuição de garantir infraestrutura a
partir de investimentos públicos, o que consequentemente, irá valorizar o valor da sua terra, o
que dará margem para a especulação imobiliária. 70

Dentro desses proprietários fundiários, estão aqueles que também atuam diretamente
na produção da moradia, promovendo-a; ou seja, as construtoras e incorporadoras
imobiliárias. São elas que, geralmente, produzem habitação para o segmento social mais

70
" (…) uma forma pela qual os proprietários de terra recebem uma renda transferida dos outros setores
produtivos da economia, especialmente através de investimentos públicos na infraestrutura e serviços urbanos
(…)" Ou seja, a partir desses investimentos, e o consequente aumento do valor de troca da terra, o proprietário
aproveita-se e muitas vezes, estoca terras, com a intenção dessa valorização futura.
79
favorecido e que possui capacidade financeira de compra. Para esses investidores, a
construção dos imóveis para a baixa renda, somente será interessante, quando o Estado, tornar
viável através de políticas habitacionais (França, 2011). Para isso, tem-se as experiências
explicitadas na seção dois, vide COHAB's, PAR e MCMV.

Assim, o Estado possui múltiplas funções em relação à produção do espaço, onde,


terão suas definições enquanto reflexo das diferentes variantes as quais se insere. Ou seja,
dependerá de um contexto econômico, social e político de cada momento da dinâmica onde se
situa. Assim, as suas principais funções serão prover infraestrutura através de planejamentos e
planos de ação; controlar o mercado fundiário; produzir as condições de produção para outros
agentes sociais, como vias de tráfego, sistemas de energia, água e esgotamento sanitário assim
como o próprio espaço físico da cidade; além de definir regulamentações urbanísticas para
uso e produção do espaço (Samson, 1980 apud Corrêa, 2011).

O outro agente atuante na produção da habitação, sãos os grupos sociais de baixa


renda, que por não conseguir se inserir na lógica mercadológica da produção da cidade,
ficarão alijados da oferta habitacional, se não partir do Estado, políticas de inserção para estas
camadas. Esses grupos sociais, embora possuam o direito à cidade e à moradia, conseguirão
pleiteia-lo de forma mais ampla, se organizados a partir de movimentos e entidades que
possam servir de representantes, a fim de respostas que sejam significativas.

Ao tratar-se dos atores sociais envolvidos no processo de promoção de habitações de


interesse social à nível local, em Aracaju; tem-se essa mesma estrutura: Poder Público,
iniciativa privada e os grupos que integram os movimentos sociais urbanos.

Na esfera do Poder Público, destaca-se o Ministério das Cidades, tendo a Caixa


Econômica Federal (CEF) enquanto principal agente operador financeiro. É necessário
ressaltar também, a atuação do Banco do Brasil e do SEBRAE, ainda que indiretamente,
desenvolvendo ações de fortalecimento dos arranjos produtivos locais. 71

A atuação da prefeitura municipal é realizada a partir da Empresa Municipal de Obras


e Urbanização - EMURB, pela Secretaria Municipal do Planejamento, Orçamento e Gestão -
SEPLOG, enquanto o Governo do Estado através da Secretaria de Estado do Planejamento, da
CEHOP - Companhia Estadual de Habitação e Obras Públicas e das concessionárias de

71
Prefeitura Municipal de Aracaju, PLHIS, 2011.
80
Energia Elétrica – ENERGISA e de água e esgoto DESO, as quais também contribuem na
esfera pública para o setor de habitação de interesse social.

A ação local dos proprietários fundiários, dificulta a destinação da terra para habitação
de interesse social, porque estes detêm a propriedade de grande parte das terras não ocupadas
do município - que estariam disponíveis para habitação -. Dessa forma, eles detém o controle
sobre a ocupação dessas áreas, e acaba dificultando a sua destinação para a habitação de
interesse social, a partir dos altos custos praticados no mercado, o que resulta em práticas
especulativas. 72

Na cidade de Aracaju, os arranjos são dependentes da relação entre esses, que muitas
vezes giram em torno da produção e reprodução do capital. Com isso e, voltando-se para as
funções e deveres dos Poderes Públicos Municipais, é possível notar uma abstenção no que
diz respeito à produção da habitação social e isso é confirmado a partir da vagarosidade na
qual foram efetivados programas habitacionais de interesse social. (Tabela 9)

As ações voltadas para a questão da moradia, ficam restritas às diretrizes retiradas dos
diagnósticos municipais realizados: PEMAS (2006) e PLHIS (2011). Assim, as produções de
habitação de interesse social, são reservadas para os Programas Federais, com escassez de
programas no âmbito municipal.

Entretanto, neste momento existe um planejamento interno para ações conjuntas entre
a SEPLOG, EMURB e a Secretaria Municipal da Assistência Social (SEMASC) para
reformular a política habitacional do município e tem previsão para revisão do PLHIS até
agosto de 2018.73

Nos últimos catorze anos, a produção da habitação - incluindo a regularização de


assentamentos subnormais - em Aracaju foi exígua, sendo estabelecida pela urbanização do
Santa Maria e da Invasão do Coqueiral, a construção do Conjunto Porto D'antas, Residencial
Vitória da Resistência e construção do Bairro 17 de Março. (Tabela 6)

Logo, mesmo que a produção através dos programas federais, tenham tido um
significado relativo na esfera quantitativa, o modo como ele acontece a partir da priorização
dos agentes imobiliários e a falta de utilização de recursos que os viabilizem em localidades
melhores e que garantam a sua boa inserção urbana, dificulta o acesso à cidade por parte

72
Idem;
73
Segundo Mariana Albuquerque, funcionária da SEPLOG, em entrevista realizada no dia 14 nov. 2017.
81
dessas camadas e continua a instituir a cidade segregada, mantendo-se a lógica de
funcionamento de programas anteriores como as COHAB's.

Em Aracaju, a produção habitacional fragmentada na periferia mostra a participação


ativa e privilegiada dos agentes imobiliários através da promoção dos seus interesses
na condução da expansão urbana. O Estado abandonou seu papel de protagonista na
efetivação do direito à cidade, para tornar-se construtor, mediador, viabilizador e
parceiro do capital, especialmente na escolha de locais para implantação dos
empreendimentos, como os subsidiados pelos Programas de Arrendamento
Residencial – PAR e o Minha Casa Minha Vida – PMCMV (França, 2016: p. 152)

Em contrapartida à essas ações, existe a atuação dos movimentos sociais no pleiteio às


questões ligadas à habitação. Segundo o PLHIS (2011), Aracaju possui cerca de 110 entidades
que estão envolvidas na discussão das questões urbanas e habitacionais.

Dessa forma, o Conselho Municipal de Habitação (CMH)74, é composto por cinco


representantes do Poder Público, onze representantes da Sociedade Civil, três representantes
de Instituições ligadas à Produção e ao Financiamento do Desenvolvimento Urbano, três
representantes de Entidades Profissionais, Acadêmicas e de Pesquisa e um representante das
ONGs. (Tabela 10) Entretanto, o Consellho se mostra inoperante nos últimos anos, embora
haja previsão para retomada das suas ações efetivas juntamente à revisão de toda política
habitacional.

74
"O Conselho Municipal de Habitação é um canal institucionalizado de participação da população na gestão
habitacional da cidade. Sua finalidade é discutir e deliberar a respeito da política habitacional, além de
acompanhar e fiscalizar os programas a serem implementados e os recursos a eles destinados." (PMA, PLHIS,
2011: p.63)
82
Tabela 10_ Composição Do Conselho Municipal De Habitação Em Aracaju

Fonte: PMA, PLHIS, 2011: p.64-65

Paralelamente à essas ações que regulamentam o que pleiteiam os agentes sociais -


embora no momento, sem eficiência -, a prática diária de atuação dos movimentos de
moradia, também refletem as suas urgências e as legitima como forma de embasar os traçados
para a política de habitação.

Ainda assim, existe uma renúnicia por parte do Poder Público Municipal, das
demandas das classes mais baixas, uma vez que ele enquanto agente produtor de condições
para atuação de outros agentes e responsável pela aplicação das regulamentações urbanísticas
para uso e produção do espaço, estabelece critérios que não correspondem às necessidades das
camadas mais baixas - estas que compõe o déficit habitacional.

Como exemplo, em Setembro de 2015, o Excutivo Municipal, encaminhou à Câmara


de Veradores um projeto que autoriza a venda de lotes de propriedade do município
localizados no Bairro da Coroa do Meio para agentes privados; embora não tenha sido
apresentado argumentos razoáveis que justificasse a sua venda ou as expectativas de

83
arrecadação, o projeto fora aprovado pelo Legislativo e os terrenos postos em leilão. O
Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos (MOTU), realizou uma plenária com a
presença de vereadores para discutir a venda dos terrenos.75

Os trabalhadores do MOTU questionaram a venda desses lotes frente à necessidade


de uma política de habitação para o município de Aracaju. Questionaram a prefeitura
se desfazer daqueles terrenos diante de uma demanda reprimida que existe na nossa
cidade para a garantia de moradia popular. (Iran Barbosa, em entrevista disponível
em: <http://www.cmaju.se.gov.br/2016-04-11-19-21-08/2016-04-11-19-32-
22/noticias/10097-somente-quem-ve-a-mao-de-deus-em-todas-as-coisas-pode-
colocar-todas-as-coisas-em-suas-maos-tenha-um-sp-9050> Acesso em: 17 out.
2017)

Surge então, o questionamento sobre as prioridades dadas à política habitacional, que


está subordidana aos interesses de quem às direciona. Ou seja, a relação entre os agentes
produtores dessa política, determinará as suas ações; e se os interesses dos agentes sociais de
baixa renda não preexistem aos interesses privados, os resultados serão ações como estas.

Assim como os arranjos dentro da política de habitação são subordinados aos


interesses de quem a produz e, principalmente quem possui acesso à terra, delineará os seus
caminhos; a estrutura organizacional dos programas habitacionais já estabelecidos, também
determinarão o modo com eles irão funcionar. Dentro dos arranjos estabelecidos para a
produção da cidade, e os que se tabelecem nos programas específicos, terão a mesma lógica
de funcionamento, diferenciando-se portanto, as suas escalas de abrangência.

Assim, como forma de explorar os arranjos entre os agentes produtores da habitação à


nível local, será apresentado na próxima seção, um estudo de caso em um empreendimento na
esfera do Programa Federal Minha Casa Minha Vida Entidades (MCMV-E), compreendido na
cidade de Aracaju; o Condomínio Getúlio Alves Barbosa, localizado no loteamento Santa
Maria.

75
Disponível em: < http://www.cmaju.se.gov.br/2016-04-11-19-21-08/2016-04-11-19-32-22/noticias/10097-
somente-quem-ve-a-mao-de-deus-em-todas-as-coisas-pode-colocar-todas-as-coisas-em-suas-maos-tenha-um-sp-
9050> Acesso em: 17 out. 2017
84
4. ESTUDO DO CONDOMÍNIO GETÚLIO ALVES BARBOSA NO ÂMBITO DO
MCMV-ENTIDADES

O Condomínio Getúlio Alves Barbosa, localiza-se na Rua Vinte e Oito, no


Loteamento Santa Maria. Suas principais vias de acesso são a Avenida Gasoduto, seguida da
Avenida Alexandre Alcino Nunes Resende e a Estrada para São Cristóvão.76

A Entidade Organizadora77 do projeto estudado é a Sociedade Sergipana Monte Sião


(SSMS), filiada à União Nacional por Moradia Popular (UNMP) - que atua em 17 estados
federativos levantando a bandeira da autogestão há 28 anos. A SSMS tem sua origem a partir
de um núcleo de famílias que realizava uma ocupação no Loteamento Paraíso do Sul, no
Bairro Santa Maria, organizados por um grupo da Igreja Evangélica que perceberam a
necessidade de recrutar famílias e instituir uma creche no espaço - chamada na época de
Associação Monte Sião - com o apoio do Movimento Popular de Moradia de Sergipe78;
entretanto, passaram a ter dificuldade na regularidade do CNPJ ocasionado por ação jurídica
movida por alguns funcionários a partir da falta de pagamento.

Dessa forma, sem poder se manter enquanto associação, lideranças do Movimento


Popular de Moradia, interessados em pleitear legalmente a questão da moradia após a criação
do Ministério das Cidades, assumem em 2007 os gastos da antiga associação, regularizam o
CNPJ e trocam a razão social para Sociedade Sergipana Monte Sião79 a fim de se cadastrar
enquanto Entidade no Ministério das Cidades.

A militância da Associação continuou a partir de ações de arrecadação de fundos para


distribuir comida às famílias filiadas, na organização de cursos para a comunidade e no apoio
à algumas ocupações de moradia da época; entretanto, somente em 2012 a Entidade consegue
aprovação no Ministério das Cidades, embora um ano antes - em 2011 -, depois de já
instituído o Programa Minha Casa Minha Vida (2009), havia começado a discussão para a

76
Ver Figura 16, p. TAL
77
A Entidade Organizadora pode ser uma cooperativa habitacional ou mista, associação ou entidade sem fins
lucrativos e tem a responsabilidade de reunir, organizar, e apoiar as famílias no desenvolvimento e execução dos
projetos habitacionais. (Caixa Econômica Federal - Manual de Implementação MCMV-E Disponível em:
https://www.caixa.gov.br/Downloads/habitacao-minha-casa-minha-vida/MANUAL_MCMV_ENTIDADES.pdf
Acesso em: 02 out. 2017)
78
O movimento ajudou na conquista da implantação de sistema de distribuição de água e energia para o
Loteamento e na abertura de vias de acesso. (Jussara Barbosa - coordenadora da SSMS, em entrevista realizada
no dia 07 nov. 2017)
79
O nome foi alterado porque nesse momento o movimento já fomentava a discussão da questão da moradia em
outros municípios: Lagarto, Salgado, Estância, Laranjeiras e Canindé do São Francisco. (Jussara Barbosa -
coordenadora da SSMS, em entrevista realizada no dia 07 nov. 2017)
85
proposta do projeto para o Condomínio Getúlio Alves Barbosa. Assim, a divulgação para
cadastramento e filiação das famílias com a Entidade, aconteceu boca a boca e através de
publicação no Jornal Cinform em março de 2012. Dessa forma, iniciaram-se as primeiras
assembleias com as famílias cadastradas para apresentação da ideia do projeto e para
explicitar o modelo autogestionário que seria praticado.

A proposta foi enviada à Caixa Econômica Federal em Julho de 2012, entretanto foi
contratado somente na segunda fase do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV II) em
Setembro de 2014 e o seu regime de construção é misto, ou seja, parte da mão de obra é
assalariada e contratada pela própria Associação e a outra parte é dada a partir de mutirão
realizado com as famílias beneficiárias aos finais de semana.

Figura 15_Divulgação da assinatura do Contrato com a Caixa Econômica Federal em Setembro de


2014

Fonte: Acervo da Sociedade Sergipana Monte Sião.

A assessoria técnica que esteve presente no início da contratação e da obra era


composta pelo Engenheiro José Ivan Araújo, contudo, devido à problemas técnicos que estão
melhor explicados na subseção 4.2, ela precisou ser substituída e hoje, o corpo da assessoria
técnica atualmente é composta por profissionais autônomos que se agregaram à Sociedade
Sergipana Monte Sião. Dessa forma, é integrado pelo Engenheiro José João Bittencurt e pela
Estudante de Engenharia Juciléia Gomes que desenvolve a função de Mestre de Obras.

O projeto urbanístico é composto por condomínio fechado constituído de cinco torres


de edifício habitacional, sete pavimentos com oito unidades habitacionais por pavimento e
86
dois elevadores em todas as torres e uma escada que garantem a circulação vertical. O projeto
abrange 280 unidades habitacionais adaptáveis distribuídas em duas tipologias, sendo uma
com 50,16m² (tipologia de dois quartos) e outra com 60,87m². (tipologia de três quartos).

O Trabalho Social está sendo desenvolvido por profissionais da própria EO e


corresponde à psicóloga Inaiara e alguns funcionários que auxiliam no acompanhamento das
famílias. Entretanto, no corpo da assessoria social também houve alterações; no início, o
projeto contava com uma psicóloga (a atual) e duas assistentes sociais que elaboraram o
Projeto do Trabalho Técnico Social (PTTS), todavia, optaram por sair ainda na metade do
projeto por não se identificar com o modelo de gestão, o que ocasionou algumas dificuldades
que são abordadas na subseção 4.2.

As principais origens da população beneficiária se dão pelos bairros Santa Maria, São
Conrado, Bugio, Coroa do Meio e Augusto Franco, em que residem majoritariamente em
condições precárias de moradia, casas cedidas e de aluguel; as suas rendas variam de 0 a 3
salários mínimos, entretanto, sua média equivale a 1 salário mínimo vigente. Assim, 57% da
população se referem à mulheres chefes de família, 7% à pessoas idosas e 3% com alguma
necessidade especial.

A definição do estudo de caso foi dada pela necessidade de se trabalhar na esfera de


um programa que possibilitasse a prática da produção autogestionária, logo, o Condomínio
Getúlio Alves Barbosa foi escolhido por estar no âmbito do Minha Casa Minha Vida -
Entidades (MCMV-E) - por este ser o único que hoje possibilita a prática dentro desses
moldes.

O objetivo do estudo de caso é investigar dentro dos processos do empreendimento, a


autogestão presente nas suas práticas de caráter participativo e no reflexo produto dessas
ações; pela compreensão de que, por estar inserido em um programa que permite o seu
exercício mas ao mesmo tempo submete o processo a diferentes arranjos 80, é possível obter
múltiplos resultados que podem contemplar ou apenas permear o conceito de autogestão.

Para isso, observou-se a necessidade de explorar as partes principais do


empreendimento que caracterizam as relações nele existente, ou seja, desde o processo de
seleção das famílias, mobilização feita pela Entidade Organizadora (EO), aquisição do

80
Os arranjos compreendidos nos processos autogestionários são compostos pelas diferentes relações entre seus
agentes, ou seja, as interações entre Estado versus Agente Financiador (CEF) versus Entidade Organizadora
(EO) versus Assistência Técnica e Social versus famílias beneficiárias.
87
terreno, concepção dos projetos arquitetônicos e urbanísticos, as relações no canteiro de obras
pela mão de obra assalariada e pelos mutirantes, assim como a atuação das assistências
técnica e social e a percepção das famílias beneficiárias sobre a sua presença neste modelo de
gestão.

Assim, a análise se baseou nas visitas de campo feitas ao canteiro de obras, à sede da
Entidade Organizadora; assim como, na análise dos dados coletados com a EO, com a Caixa
Econômica Federal (CEF) e, em entrevistas realizadas em campo e divididas em quatro
grupos de atuação. O primeiro, que se refere à Entidade Organizadora do projeto; o segundo,
às Famílias Beneficiárias do programa; o terceiro, à Assistência Técnica e Social envolvida; e
o quarto, a funcionários da Caixa Econômica Federal que acompanham o processo de
execução do empreendimento; para isso, os integrantes entrevistados das famílias
beneficiárias são identificados por letras a fim de preservar a sua identidade.

O método utilizado para o estudo de caso se baseia na sua análise a partir de três eixos
norteadores: o Acesso à Terra, que investigará os processos e estratégias para obtenção do
terreno dentro dos moldes do programa por parte da Entidade Organizadora (EO) e, o
envolvimento das famílias nessa etapa; Aspectos Produtivos, que fará a relação entre o
projeto e a obra a partir da qualidade arquitetônica e urbanística, da relação do mutirão com o
canteiro de obras, a atuação da Comissão de Acompanhamento de Obras (CAO) e da
Comissão de Representantes (CRE) e a relação entre Entidade Organizadora (EO) e a mão de
obra assalariada, assim como a atuação das assessorias técnica e social a partir da sua relação
com as famílias beneficiárias e com a Entidade Organizadora e a atuação do Trabalho Técnico
Social (TTS); a Autogestão, enquanto prática resultante da estrutura organizacional da
atuação da Associação para o acompanhamento e gestão da obra a partir do processo de
inclusão das famílias, o seu credenciamento, a mobilização política, espaços de formação, a
atuação da Comissão de Representantes (CRE) e, a administração financeira do
empreendimento. Dessa forma, os eixos norteadores para a análise foram divididos nas
subseções que se seguem como uma melhor forma de compreensão para o objeto estudado.

88
4.1 O ACESSO À TERRA

A busca pelo terreno foi feita pela Entidade de forma autônoma, sem ajuda de
corretores imobiliários e se iniciou juntamente à busca pelas famílias para integrar o projeto,
logo, estas não participaram do processo da busca e escolha do terreno. A primeira
dificuldade para acessar a terra se deu pela burocratização do processo de cadastro da
Entidade com o Ministério das Cidades que exigia Entidade registrada com CNPJ ativo há no
mínimo três anos e sem dívidas diante a Receita Federal.

Dessa forma, o grupo que compunha o que hoje é a Entidade (Sociedade Sergipana
Monte Sião) inicialmente atuava somente enquanto movimento social de base nas ocupações,
e em seguida resgatou a Associação Monte Sião81 a fim de legitimar a sua atuação na luta pela
moradia. Para isso, a Entidade necessitou prover de um alto investimento para quitar as
dívidas da antiga associação e instituí-la agora enquanto Sociedade Sergipana Monte Sião,
apta a se cadastrar no Ministério das Cidades.

O acesso à terra se caracterizou um difícil processo pela falta de recursos que


pudessem financiar um terreno bem localizado para a implantação do projeto. Sendo assim, a
busca passou a ser centrada nos bairros mais periféricos pelo seu baixo valor de mercado;
entretanto, a forma de pagamento seria uma nova etapa a ser vencida. Durante a procura, um
terreno localizado no Bairro Santa Maria fora encontrado e, embora a localização não fosse a
mais desejada, o valor do terreno foi o fato decisivo na escolha. Logo, o Bairro Santa Maria
possui sua caracterização socioeconômica muito abaixo dos demais bairros da cidade,
conforme pode ser visto na Figura 16.

81
Explicitado na seção anterior, p. 81
89
Figura 16_ Rendimento médio familiar por Bairro

Fonte: Adaptado de Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano De Aracaju – Diagnóstico Municipal, 2015

Enquanto consequência do baixo preço do terreno nessa localidade, tem-se um espaço


desprovido de equipamentos de lazer, cultura e praças públicas, assim como a escassez de
postos médicos, escolas e hospitais públicos. A sua distância até o Centro da Cidade é de
aproximadamente 13km e em relação à mobilidade, o ponto de ônibus mais próximo, localiza-
se à aproximadamente 328m (trezendos e vinte e oito metros) enquanto o Final de Linha do
loteamento à aproximadamente 1km (um quilômetro). Entretanto, o trajeto até o ponto de
ônibus mais próximo se caracteriza pelas casas com muros que não permitem uma boa

90
visualização da rua, o que ocasionam o seu isolamento em relação a ela e a escassez de
pessoas transitando, o que gera uma sensação de insegurança. 82

Figura 17_ Trajeto do empreendimento até o Bairro Centro

Fonte: Elaboração da autora/ Google Earth, 2017

82
"(...) devem existir olhos para a rua, os olhos daqueles que podemos chamar de proprietários naturais da rua.
Os edifícios de uma rua preparada para receber estranhos e garantir a segurança tanto deles quanto dos
moradores devem estar voltados para a rua. (...) a calçada deve ter usuários transitando ininterruptamente, tanto
para aumentar na rua o número de olhos atentos quanto para induzir um número suficiente de pessoas de dentro
dos edifícios da rua a observar as calçadas." (JACOB, Janes. Morte e Vida de Grandes Cidades, ANO: p. 35-36)
91
Figura 18_Rua sem pedestres no trajeto do ponto de ônibus mais próximo até o empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora no dia 13 nov. 2017

Atualmente, existem nove linhas de ônibus que integram o Bairro Santa Maria às
demais localidades da cidade; ainda assim, somente três linhas chegam até o ponto mais
próximo do empreendimento e o tempo de espera entre um ônibus e outro, dura em torno de
40 minutos, além de que o ponto de ônibus não possui sinalização e infraestrutura adequada,
ficando resumida a um banco de madeira produzido pelos próprios moradores, mas que
encontra-se em mau estado de conservação.

Figura 19_ Ponto de ônibus mais próximo do empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora no dia 13 nov. 2017.

92
Figura 20_ Localização do Condomínio Getúlio Alves Barbosa

Fonte: Elaboração da autora/ Google Earth, 2017

Figura 21_ Famílias após o mutirão no ponto de ônibus mais próximo ao empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora em 11 nov. 2017

No trâmite de negociação com a proprietária do terreno, duas questões importantes


facilitaram o acesso à terra. Primeira, o preço era acessível - e isso se deu em consequência da

93
sua localidade83 -, e segunda, a então proprietária aceitou a condição de pagamento por meio
do parcelamento.

Dessa forma, o valor do terreno que custou R$350.000,00 (trezentos e cinquenta mil
reais), foi dividido pela quantidade de unidades habitacionais - no caso, 280 - e, dividido em
18 parcelas fixas. Assim, cada família aracaria com R$1.250,00 (mil duzendos e cinquenta
reais) para a compra do terreno e cada parcela ficaria aproximadamente em torno de R$70,00
(setenta reais).

Ainda existem famílias inadimplentes com relação ao pagamento da terra, em que,


algumas já foram excluídas ou substituídas e outras estão sendo encaminhadas para esse
processo. Assim, a EO arcou com a parte das famílias inadimplentes, o que se configura
enquanto mais uma problemática do acesso à terra, uma vez que a Entidade não possui capital
de giro e mantém os seus custos através da arrecadação das taxas de filiação dos associados.

Logo, algumas famílias encontraram dificuldade de se encaixar nesse molde financeiro


se levado em consideração o valor do salário mínimo vigente no ano de 2012 - em que foi
efetuada a compra do terreno -. Nesse ano, o salário mínimo custava R$622. Assim, o valor
do terreno equivalia à 11,25% do salário, em que, se acrescido à taxa de filiação que é
cobrada pela EO a todas as famílias associadas no valor de R$25,00 (vinte e cinco reais) - em
2012 -, o gasto fixo por família no investimento da sua casa própria equivalia à 15,52% do
salário mínimo.

Logo, embora o MCMV-E seja destinado à famílias com renda de até três salários
mínimos, a maioria das famílias beneficiárias do projeto não constiutem essa realidade de
renda máxima, em que a média de renda dos beneficiários equivale à um salário mínimo.84 Ou
seja, ainda dentro de um programa voltado para a produção da habitação de interesse social, o
acesso à moradia ainda está muito ligado ao valor comercial do uso da terra, em que, quem
não consegue se inserir na sua lógica financeira, não se encaixa nos moldes do programa.

Assim, é possível perceber a importância da implementação do instrumento da compra


antecipada (CA), que passou a liberar o subsídio necessário para a compra do terreno e
elaboração da proposta, a partir de uma prévia contratação, uma vez que, na disputa pelo solo
urbano, constutoras e grandes empresas possuem um poder de compra muito maior que as

83
Conforme mostram as Figuras 14 e 15
84
Informação contida no levantamento feito no Projeto do Trabalho Técnico Social.
94
famílias que se inserem na realidade do défict habitacional brasileiro; o que tornava injusta a
disputa pelos espaços no MCMV-E, em que, o acesso à terra se dava enquanto uma primeira
dificuldade a ser enfrentada pelas famílias e Associação para dar os passos iniciais que
viabilizassem estudos para o projeto arquitetônico e urbanístico para garantir o
empreendimento do projeto.

Entretanto, aqui é preciso ressaltar que ainda com o instrumento da CA, as localidades
para os projetos se inserem na lógica de mercado e, como acontece com o caso do
Condomínio Getúlio Alves Barbosa, estes acabam por se inserir em locais distantes da área
central da cidade em um contexto com escassez de infraestrutura e empregos, o que faz com
que os beneficiários continuem tendo que se deslocar por longas distâncias para trabalhar, o
que reforça a segregação socioespacial na cidade.

Dessa forma, além dos instrumentos viabilizados pelo Porgrama Federal (MCMV-E),
a questão do acesso à terra está subordinado aos Poderes Municipais, uma vez que, os
recursos contidos no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano são trabalhadas para garantir
o acesso á moradia e a função social da propriedade urbana.

Nesse contexto, o Bairro Santa Maria, no macrozoneamento estabelecido no Plano


Diretor de Desenvolvimento Urbano de Aracaju (PDDU - 2000), se localiza na Zona de
Adensamento Básico (ZAB), enteretanto, as diretrizes estabelecidas para a zona, não é
implantada. Ou seja, o dever de promover e monitorar a implantação de equipamentos e
espaços públicos85, assim como "ordenar e estimular a implantação de atividades de comércio
e serviços, apoiando o desenvolvimento de sub-centros", não são executados.

85
Prefeitura Municipal de Aracaju, Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Aracaju, 2000
95
Figura 22_ Recorte do Macrozoneamento PDDU - Aracaju

Fonte: PMA, Macrozoneamento, PDDU, 2000 - Edição feita pela autora.

Logo, em relação à caracterização do entorno do empreendimento, é possível


identificar algumas deficiências referentes à sua infraestrutura. De acordo com a observação
durante a visita de campo, a paisagem do entorno se mostra inóspita. Foi possível identificar a
predominância de lotes residenciais e algumas pequenas mercearias, em que muitas vezes
dividem espaço com as próprias casas, ausência de áreas verdes, praças ou qualquer outro tipo
de equipamento coletivo.

96
Figura 23_ Comércio local na rua do empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora em 13 out. 2017

Figura 24_ Entorno do empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora em 13 out. 2017

97
Figura 25_ Entorno do empreendimento

Fonte: Foto tirada pela autora em 13 out. 2017

É importante ressaltar também, que o Condomínio Getúlio Alves Barbosa, localiza-se


em área muito próxima às Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS) estabelecido pelo
PDDU vigente; com isso, deve-se evidenciar o atraso que se encontra a revisão do PDDU -
cujo já ultrapassa os dez anos limite estabelecido pelo Estatuto da Cidade -; e assim, alertar
para a necessidade de uma maior abrangência nessa área de modo a contemplar áreas que
carecem da mesma atenção e investimento.

Figura 26_Recorte das Áreas de Diretrizes do PDDU - Aracaju

Fonte: PMA, Áreas de Diretrizes, PDDU, 2000 - Edição feita pela autora.
98
Com isso constata-se que se a AEIS tivesse sido extendida e, logo, compreendesse o
terreno em que localiza-se hoje o Condomínio Getúlio Alves Barbosa, a Entidade juntamente
às famílias, teriam instrumentos legais que viabilizariam o empreendimento sem as
dificuldades que envolveram o acesso à terra e o trabalho da assessoria técnica - melhor
abordado no subcapítulo 4.2, -. Para isso, destaca-se os artigos seguintes que compõe o
PDDU:

Art. 140 - Constitui objetivo das Áreas Especiais de Interesse Social - AEIS, o
aumento da oferta e disponibilidade de utilização do solo urbano, para
habitação social, dentro do território do município.

Art. 142 - As Áreas Especiais Interesse Social, destinam-se à produção, manutenção,


recuperação e construção de habitações de interesse social, e compreendem:

II - glebas ou lotes urbanos, isolados ou contínuos, não edificados, subtilizados


ou não utilizados, necessários para implantação de programas habitacionais de
interesse social;

Art. 144 - O Executivo Municipal deverá, elaborar Plano de Urbanização para cada
AEIS, que definirá:

§ 1º - Nos programas que adotarem as formas de co-gestão e autogestão, será


garantida assistência técnica à população;86 (PMA, PDDU Aracaju, 2000: p. 50-
51)

Ou seja, mesmo sendo uma área ainda não edificada e não utilizada, ela poderia ter
sido compreendida enquando Área de Especial de Interesse Social e, assim, instrumentos
previstos no Estatuto da Cidade (EC), poderia ter sido utilizado para conceder o uso da terra
para o fim da habitação social, logo, a Entidade poderia requerer o apoio do Executivo
Municipal para a concessão da terra - desonderando-os no processo de compra do terreno -,
em que, tratando-se do modelo autogestionário, esta deveria prover de assistência técnica, o
que isentaria a Entidade e as famílias dessa despesa, garantindo assim uma melhor
fiscalização e a prevenção de problemas técnicos; na qual, a Lei de Assistência Técnica87,
reforça o compromisso que o estado tem com as populações de baixa renda.

Dessa forma, percebe-se como o acesso à terra se configura enquanto medida


priomordial para a garantia da implantação de programas habitacionais de interesse social,
uma vez que a sua disputa é dada pelo seu valor de mercado, sendo motivo para instaurar a
cidade segregada; mas que, ainda assim, as legislaçõe vigentes dão margem para
interpretações e atuações que contemplem as ações de interesse social. Logo, é necessário o

86
Todos os grifos feitos pela autora.
87
Lei Nº 11.888, de 24 de Dezembro de 2008.
99
interesse do Poder Público em garantir a sua aplicação e isso pode ser dado a apartir do seu
monitoramento e fiscalização por parte da população.

Assim, passando-se a etapa de aquisição da terra, outros processos serão abarcados na


concepção e execução do projeto, cujos determinarão os projetos arquitetônicos e
urbanísticos, os trabalhos exercidos pelas assessorias técnica e social, assim como a
participação das famílias dentro e fora do canteiro de obra e a relação da Entidade
Organizadora nesses aspectos; para isso, será abordada na subseção seguinte os aspectos
produtivos que estabelece a união desses fatores.

4.2 ASPECTOS PRODUTIVOS

Um edifício habitacional pode ser considerado enquanto um produto complexo que


abarcará uma série de arranjos que se interseccionam durante as fases do projeto desde a sua
concepção, desenvolvimento, execução, uso e ocupação do edifício; em que os níveis
técnicos influenciarão o produto final. (COSTA, 1995 apud NOIA, 2017) Tais arranjos
ajudam a compor e justificar o produto adquirido no âmbito das expectativas do futuro
usuário.

Assim, na esfera da produção da habitação social, existe o estigma envolta desse


produto, principalmente, pela sua produção estar inserida na lógica de mercado, uma vez que
contará com variantes como a contratação de mão de obra e diferentes tipos e qualidades de
material que diretamente influenciarão no modo como será enxergado o seu resultado. Ou
seja, vale ressaltar a relevância dos espaços construídos a partir da autogestão e analisar os
seus aspectos, uma vez que esse modelo parte do pressuposto de uma auto administração por
parte dos organizadores e beneficiários e não visam o empreendimento na perspectiva do
lucro, se diferenciando, portanto, de demais modelos de gestão os quais incluem uma
construtora ou incorporadora ao projeto.

Para analisar os aspectos produtivos do Condomínio Getúlio Alves Barbosa, estes irão
corresponder às características do espaço projetado e construído abarcando o processo da sua
concepção, a relação do mutirão e da mão de obra no canteiro de obras e o seu produto a
partir também da influência da atuação das assessorias técnica e social.

Na elaboração do projeto tanto arquitetônico quanto urbanístico para o


empreendimento, é observada mais uma dificuldade enfrentada pela Entidade dada pela sua

100
falta de recurso para investir em um profissional com qualidade no acervo técnico. Dessa
forma, os projetos iniciais foram desenvolvidos na época (2011-2012) por um estudante de
engenharia e somente revisado e assinado posteriormente por um engenheiro que viria a ser
responsável inicial pelos projetos.

O projeto foi entregue à Caixa Econômica Federal (CEF) em julho de 2012 e assinado
somente em agosto de 2014, recebendo logo em seguida (outubro) a primeira parcela
correspondente ao financiamento. Entretanto, a segunda parcela que só saíra em maio do ano
seguinte (2015) não foi liberada em sua totalidade porque foi reconhecido pela CEF
problemas técnicos já no início das obras, o que começou a acarretar atrasos para o
andamento do projeto.

Assim, em dezembro de 2014, foi diagnósticada a incompatibilidade do projeto de


fundação com o estudo de solo e dessa forma, houve a necessidade da chamada de um
calculista que pudesse reverter a situação e a consequente substituição do primeiro engenheiro
que assinou o projeto entregue. Esses trâmites demandaram tempo e durante os meses de
dezembro - quando diagnosticado o problema - à maio - quando liberada a verba parcialmente
- o novo projeto estava sendo elaborado pelo novo engenheiro responsável e que se instiuíria
legalmente diante à CEF enquanto responsável da obra, visto que o primeiro não possuía o
acervo técnico exigido e havia elaborado o projeto com essas deficiências.

Após o primeiro atraso para liberação da verba, começaram a surgir também


problemas adminsitrativos decorrentes do atraso da folha de pagamento de funcionários e
fornecedores. A situação foi se perdurando por alguns meses e é relatada por funcionários da
Entidade enquanto algo que começou a se acumular e fugir do controle.

Nesse contexto, a mão de obra passou a evitar o trabalho no canteiro de obras, gerando
ainda mais atraso nas atividades e a dificuldade de relação com a Entidade Organizadora.
Assim, a CEF ao se colocar para fazer as medições de acompanhamento, chamadas medições
de PLS (Planilhas de Levantamento de Serviço)88, constatavam o atraso e acarretava em um
novo atraso para a liberação da verba.

88
"Documento assinado pelo responsável técnico pela execução da obra destinado a identificar os serviços
executados no período, quantidade realizada e a exata localização no empreendimento, apresentada para cada
medição de obra." (Caixa Econômica Federal, CADERNO DE ORIENTAÇÕES TÉCNICAS –
ACOMPANHAMENTO DE obras - FAR E MERCADO. Disponível em:
101
A liberação da verba por parte da CEF acontece por partes; elas correspondem à partes
de 8% do valor do financiamento. No início de cada mês é liberado 4% desse valor e somente
após a medição e comprovação dos serviçoes executados correspondentes à esses 4%, são
liberados mais 4% para finalização da etapa prevista. Essas planilhas são de responsabilidade
do técnico responsável pela obra, cabendo à CEF somente fiscalizar se o que foi produzido
corresponde ao que foi previsto.

No meio do acúmulo dos problemas, e levando-se em consideração o quanto já havia


percorrido nos processos do empreendimento, os fornecedores que sofriam com atraso de
pagamento instruíram à Entidade a contratação de uma empresa especializada em reconhecer
cenários críticos de administração financeira, a F2 Project. Uma reunião realizada na Diretoria
de Habitação da CEF, na qual englobou representates dos fornecedores, da Entidade
Organizadora, o Diretor de Habitação da CEF e representante da nova administração, serviu
para estabelecer acordos de modo a retomar a obra. Assim, enquanto início para as soluções,
acontece a a substiuição - novamente - do engenheiro responsável, uma vez que ficava a cargo
dele a adminsitração do que dizia respeito à obra em si.

Neste ponto, é preciso apontar que a participação da Comissão de Acompanhamento


de Obras (CAO) se dava de forma pontual, durante a semana em visita ao canteiro de obras;
em que, essa supervisão não evitaria os problemas que já haviam se inciado; ficando assim as
suas ações restritas ao acompanhamento e não à deliberações, somente enquanto cumprimento
das normas que o programa estabelece.

Os problemas técnicos que se iniciaram, são decorrentes de irresponsabilidade técnica


e poderiam ser evitados; entretanto, é necessário fazer a análise das possibilidades financeiras
restritas da Entidade. Iniciado o projeto anteriormente à implantação do instrumento da
Compra Antecipada (CA) que, para além da liberação da verba para aquisição do terreno,
prevê gastos com a asssitência técnica para elaboração da proposta inicial. Ou seja, coube
totalmente aos recursos da Entidade arcar com as necessidades primordiais.

Fabricio et al. (1999) defendem que o estabelecimento de parcerias entre


construtoras pode ampliar a eficiência global do processo de construção. Alega que,
caso a gestão seja conduzida para uma Gestão por Processo, envolvendo como um

<http://www.caixa.gov.br/Downloads/credenciamento-terceiros-
engenharia/COT_Acomp_eQualObraFAReMercado_FEV2015.pdf> Acesso em: 15 nov. 2017

102
todo os agentes externos à construtora, subcontratados, há maior certeza de se
alcançar qualidade e produtividade superior. (Noia, 2017: p. 176)

Dessa forma, poderia ter havido uma parceria da Entidade com uma construtora,
entretanto, isso não aconteceu visando um melhor produto das unidades habitacionais uma
vez que ela incorporaria um lucro para a execução das atividades, o que não acontece no caso
da Entidade; contudo, foi desconsiderado as problemáticas que poderiam haver durante o
processo, dando credibilidade ao responsável técnico contratado.

Visto o porte do empreendimento estudado, a Entidade embora houvesse comprovado


a experiência técnica para essa escala construtiva - medida exigida pela CEF para construções
verticalizadas -, não se isentou das problemáticas técnicas. Para isso, vale ressaltar que o
primeiro engenheiro contratado para assinar os projetos, não cumpria esses requisitos e, por
isso, ele não consta no histórico dos técnicos já envolvidos no projeto. Embora o projeto fora
aprovado inicialmente dessa forma; o primeiro engenheiro registrado enquanto responsável
técnico, somente aceitou a sua inserção após o contrato por parte da Entidade, de um
calculista que pudesse refazer o estudo de solo e reestabelecer o projeto de fundação;
entretanto, a fundação já havia começado a ser executada nessas condições.

Ou seja, configura-se um ato de precipitação por parte da Entidade e ineficiência no


monitoramento da CEF, no qual, ainda com o posterior cumprimento da norma com a
inclusão do engenheiro, não foi possível reverter o quadro que havia se estabelecido porque
embora comprovasse a experiência técnica exigida, a assessoria que na época comandava a
execução das atividades na obra, não conseguiu na prática comprovar a sua capacidade de
gestão de obra, valendo assim o questionamento sobre os critérios estabelecidos, uma vez
que, a comprovação desse acervo não fui suficiente para habilitá-lo às funções de
gerenciamento. A Entidade, por sua vez, não possuía experiência em construções desse nível
e assim, não lhe couberam as resoluções imediatas necessárias.

Nesse contexto, é possível encontrar três falhas no processo de concepção, execução e


fiscalização dos projetos. O primeiro se refere à ineficência dos critérios exigidos pela Caixa
Econômica Federal (CEF) para a comprovação dessa experiência em construções
verticalizadas, uma vez que eles não foram suficientes para assegurar o bom início das obras e
seu andamento sem atrasos; o segundo, se refere à Entidade Organizadora por confiar a
responsabilidade técnica de um empreedimento de grande porte a profissionais não bem
capacitados; e a terceira, aos Poderes Municipais na ausência de uma vistoria nesse aspecto

103
pela falta de programas, leis e incentivos governamentais direcionados à aplicação de uma
assistência técnica, na qual é reforçada a sua participação pela Lei de Assitência Técnica.89

Anteriormente aos problemas técnicos, e em relação à concepção do projeto


arquitetônico que fora elaborado inicialmente, e no âmbito participativo das famílias
beneficiárias nessa etapa, foram realizadass assembleias de apresentação do projeto, votações
foram abertas para decidir o programa de necessidades de acordo com o o consenso do grupo.
Assim, em consequência também do aumento do número de famílias cadastradas para o
empreendimento, foi necessária a compra de mais uma parcela do terreno para a implantação
de mais um bloco de apartamentos. Questões como a quantidade de unidades habitacionais
por bloco e o gabarito de altura do prédio, também foram deliberadas no decorrer das
assembleias com as famílias, assessoria técnica e coordenação da Entidade Organizadora.

Dessa forma, o programa de necessidades definitivo e que está sendo executado,


corresponde à duas tipologias de unidades habitacionais; uma com dois quartos e outra com
três quartos. A primeira, tem área útil de 50,16m² e a segunda, de 60,87m². Esse processo de
revisão do projeto e adequação às deliberações do grupo pelas assembleias, se deu
gradativamente e o processo de concepção não foi realizado durante as reuniões. Ou seja, o
processo participativo contido nessas ações, é de caráter de consulta e não envolveu as
famílias na formulação das ideias em si conforme consta em outras experiências citadas na
esfera do Minha Casa Minha Vida - Entidades (Seção 2.2).

89
Lei Nº 11.888, de 24 de Dezembro de 2008. A lei assegura o direito das famílias de baixa renda à assistência
técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse social, a qual deve ser
promovida mediante o apoio financeiro da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para a
execução de serviços.
104
Figura 27_Projeto Arquitetônico Condomínio Getúlio Alves Barbosa - Tipologia 01

Fonte: Acervo Sociedade Sergipana Monte Sião

A CEF dentro das instruções para elaboração do projeto, previa área útil mínima e
37m² no período em que foi contratado o emprendimento (MCMV II), embora hoje já na sua
terceira fase (MCMV III), este se estabeleça em 39m²90.Contudo, ainda que dada enquanto
dimensões mínimas, este é o padrão reproduzido na maioria das unidades habitacionais do
programa.91

90
Portaria nº 269, de 22 de março de 2017
91
"Boa parte dos empreendimentos MCMV são executados com áreas exíguas, próximas às especificações
mínimas ditadas pela Caixa, mesmo em casos de gestão pela modalidade entidades." KOKUDAI, S et. al, 2016:
p. 59)
105
Figura 28_Projeto Arquitetônico Condomínio Getúlio Alves Barbosa - Tipologia 02

Fonte: Acervo Sociedade Sergipana Monte Sião

Visto isso e de acordo com as plantas baixas das tipologias apresentadas, constata-se
que estas fogem da metragem convencional que perdura nos projetos concebidos na esfera do
programa e da qualidade na concepção dos espaços se comparadas às produções do Minha
Casa Minha Vida - Entidades feitos por empreitada global. A garantia dessa qualidade deve
ser atribuída ao modelo autogestionário que, ao excluir o lucro que haveria no caso da
mediação de uma construtora, consegue revertê-lo em um programa mais acessível.

Entretanto, com a ausência de croquis que possam explicar a evolução das ideias pra a
concepção do projeto arquitetônico, não é possível identificar os caminhos que foram traçados
a partir da colocação da opinião dos beneficiários nesse processo. As tipologias foram
apresentadas às famílias pela equipe técnica nas assembleias, e a partir dos pedidos para
aumento da dimensão dos cômodos, a equipe foi reajustando e apresentando novamente até
chegar a essa tipologia apresentada nas Figuras 27 e 28. Ainda assim, a partir das dimensões
106
dos cômodos, e por se tratarem de tipologias adaptáveis - prevê circulação para portadores de
92
necessidades -, os espaço de circulação entre o layout previsto, são satisfatórios, assim
como, os espaços para ventilação e iluminação dos cômodos atendem às normas estabelecidas
no Código de Obras Municipal.93

O espaço reservado para a varanda anexa à sala de jantar, é visto como um ponto
positivo, uma vez que não é frequente a inclusão desses espaços em tipologias apresentadas
ao Minha Casa Minha Vida - Faixa 1, que por se tratar da camada mais baixa, tem os seus
programas enxutos ao mínimo possível como forma de garantia do retorno necessário quando
produzido por construtoras; ou seja, uma das vantagem de se trabalhar no Minha Casa Minha
Vida - Entidades, através da autogestão, possibilita às tipologias uma maior liberdade para
ampliação do programa de necessidades, garantindo uma vivência mais confortável aos
futuros beneficiários.

Figura 29_Sala de Estar/Jantar em fase de obra - Tipologia 02

Fonte: Foto tirada pela autora em 10 out. 2017

92
De acordo com a NBR9050
93
Lei Nº 13 de 03/06/1966
107
Figura 30_ Cozinha em fase de obra - Tipologia 02

Fonte: Foto tirada pela autora em 10 out. 2017

A cozinha e área de serviço de ambas as tipologias, possuindo 8,91m² oferece um


espaço razoável e que se compara às produções das unidades para classes mais altas
oferecidas pelo mercado. A área de serviço, de acordo com o layout proposto, tem espaço
reservado para lavanderia e máquina de lavar e conta com "sobra" de espaço, ainda assim. Ou
seja, embora não sejam tipologias térreas que permitiriam soluções de expansão do imóvel
para futuras alterações que pudessem se fazer necessárias para os moradores, os ambientes
apresentam dimensões relativamente confortáveis para o seu uso.

108
Figura 31_ Quarto 02 em fase de obra - Tipologia 02

Fonte: Foto tirada pela autora em 10 out. 2017

Figura 32_ Bloco Tipo

Fonte: Elaboração da autora/ Acervo Sociedade Sergipana Monte Sião

109
O projeto urbanístico de implantação prevê, para além da construção dos cinco blocos
de unidades habitacionais, espaço para estacionamento, uma quadra poliesportiva, parque
infantil, guarita, depósito de lixo, espaços de convivência nas zonas entre os blocos e um
Centro Social que inclui salão de festas, brinquedoteca e uma sala de vídeo e jogos. Além da
doação de 1000m² para utilização da Entidade Organizadora com a implantação de um Centro
Comercial para alugueis de lojas como forma de gerar recursos para que a Entidade possa se
manter em funcionamento. A prioridade de aluguel desses espaços será dada às famílias
beneficiárias através do aluguel social. A construção desse último equipamentos (Centro
Comercial), não tem previsão de implantação pois ainda acontecerá a busca pelo recurso, uma
vez que não entra no valor de subsídio oferecido pela Caixa Econômica Federal.

Figura 33_Implantação

94
Fonte: Elaboração da autora

94
Elaborado a partir das maquetes e plantas baixas fornecidas pela Sociedade Sergipana Monte Sião.
110
Figura 34_Maquete Eletrônica - Equipamentos de Implantação

Fonte: Edição da autora/ Acervo Sociedade Sergipana Monte Sião

Figura 35_Maquete Eletrônica - Espaço de convivência em zona entre blocos

Fonte: Acervo Sociedade Sergipana Monte Sião

O projeto de implantação dos blocos do Centro Comercial, Centro Comunitário e


espaços de convivência entre os blocos, foi desenvolvido pelo Arquiteto Wilson Santos e,
embora não tenha sido disponibilizado croquis de desenvolvimento, plantas arquitetônicas e
nem foi possível o contato com o Arquiteto; a partir da Figura 33, analisa-se a proximidade
entre o Centro Comercial e o Bloco 01 das unidades habitacionais, a falta de espaços
reservados para estacionamento - há necessidade de reservar esses espaços, uma vez que se
trata de edificação comercial -. Ainda assim, a sua implantação conjuntamente ao

111
Condomínio Residencial, favorecerá a vitalidade das calçadas na rua do empreendimento,
porque atrairá um público, hoje, escasso nessa rua. (Figura 24)

O projeto arquitetônico do Centro Social, também não foi disponibilizado; entretanto


sabe-se que o seu programa, que compreende salão de festas, brinquedoteca e sala para jogos
e vídeos e, a partir da análise da maquete eletrônica apresentada; é preciso questionar sobre a
manutenção desses espaços após a sua construção, em que, a gestão condominial para
arrecadação de gastos para manter o funcionamento dos espaços, deverá ser bem elaborada.
Logo, para isso, a Entidade prevê a destinação de parte do lucro obtido com o Centro
Comercial, para arcar com os custos do condomínio.

Figura 36_Canteiro de Obras - Cond. Getúlio Alves Barbosa

Fonte: Foto tirada pela autora em 10 out. 2017

O regime de construção do empreendimento é o regime misto, ou seja, parte conta


com a mão de obra assalariada e parte com o trabalho feito pelos beneficiários por meio de
mutirão aos finais de semana. A contribuição das famílias nesse espaço começou logo nos
primeiros momentos da obra e logo após a aquisição do terreno. Ainda no fim de 2014, as
famílias foram responsáveis pela limpeza do terreno e pela construção da cerca que a
princípio fazia a divisão entre o lote e a rua.

Ao se inciarem as obras de fundação, o mutirão na obra somente voltaria a acontecer


com a construção mais avançada; entretanto, pela pouca mão de obra nesse momento inicial,
alguns beneficiários que tinham experiência com construção, também ajudaram no momento
da construção dos chamados barracões do canteiro de obras - que compõe a parte
administrativa, armazenamento etc.

112
As atividades desenvolvidas pelo mutirão são realizadas aos finais de semana e ficam
restritas à limpeza do canteiro de obras e movimentação de materiais. Elas são previstas para
acontecerem semanalmente, oito horas diárias no sábado ou oito horas diárias no domingo,
ficando a critério das famílias a escolha do dia. Durante os dias de atividades, eles tentam
fazer o revezamento entre quem limpa, transporta materiais, faz parte da comissão de crianças
- cuidando das crianças das demais mães mutirantes - ou faz o trabalho de assistência levando
água aos mutirantes durante o trabalho.

Figura 37_ Famílias em mutirão na obra

Fonte: Foto tirada pela autora em 4 nov. 2017

113
Figura 38_Famílias em mutirão na obra

Fonte: Foto tirada pela autora no dia 11 nov. 2017

Figura 39_ Famílias em mutirão na obra

Fonte: Foto tirada pela autora em 11 nov. 2017

A relação do mutirão com o canteiro de obras se dá a partir dessas atividades primárias


que possibilita uma economia na contratação de mão de obra por parte da Entidade revertendo
114
o gasto e aplicando em outros aspectos. As famílias que não podem comparecer por todos os
finais de semana, tem a opção de pagar uma taxa no valor de R$80,00 a suprir
monetariamente o seu trabalho, e possibilitar à Entidade de aplicar esse valor em outros
serviçoes especializados, uma vez que eles não entram para a folha de pagamento de
funcionários que fica restrita aos repasses feitos pela CEF.

Assim, os serviços especializados contratados pela Associação foram a execução do


telhado - totalmente em estrutura metálica -, gesso e assentamento de pisos. A mão de obra
dos demais serviços no canteiro de obras, foi contratada diretamente pela Entidade e sem
mediação de uma empreiteira; priorizando profissionais da região do Santa Maria e arredores,
como forma de movimentar o local econômicamente.

Ainda que essa parcela de funcionários possa corresponder à uma quantidade ínfima,
vale ressaltar a importância contida nessas ações, as quais, não seria praticada caso a obra
estivesse sendo executada a partir de empreitada global e mediação com uma construtora;
uma vez que ela já possui a sua mão de obra, em que, muitas vezes terceirizadas. Ou seja, isso
confere um ponto positivo na relação que o novo empreendimento estabelece com a
localidade e sua população.

A assiduidade das famílias dentro dessas atividades, se estabelece de forma


problemática; o projeto que conta com 280 famílias beneficiárias, tem possuído um quorum
que não ultrapassa 120 famílias se considerado os dois dias do final de semana. Essa
dificuldade não é recente e contribuiu em certo nível para o atraso do andamento das obras.
Esse quadro de inadimplência, acarretou diversas retiradas, substituições dos beneficiários ou
desistência, em que, a Entidade Organizadora permanece até hoje atualizando a lista de
beneficiários porque, por exigência da CEF, eles deverão elaborar e assinar os contratos
individuais por família até dezembro deste ano.

O motivo para a falta da consciência participativa e do valor do trabalho coletivo que


atinge a maioria do grupo, não pode ser explicada a partir de um fato obejtivo e totalmente
determinante. É preciso reconhecer a dificuldade em se trabalhar coletivamente em um grupo
grande. Embora todas as normativas do programa tenham sido revistas nas assembleias, é
necessário fazer a análise a partir da novidade que é esse modelo de gestão para essas pessoas.

A noção da moradia enquanto uma propriedade individual, a qual é estabelecido um


valor de troca, ainda permanece enraizada e mesmo tratando-se de habitação de interesse
115
social, essa lógica não se quebra sem muito trabalho de conscientização e incentivo aos
programas autogestionários como forma de legitimação diante da população que muitas vezes
pouco tem acesso ao seu histórico e dinâmica de funcionamento. Ou seja, não será tarefa fácil
somente estabelecer as normas, determinar a necessidade de assiduidade na participação e
cobrar um retorno, se esse modelo, ainda não está familiarizado.

Para auxiliar nesse processo de reconhecimento e adaptação das famílias, existe o


Trabalho Social que consiste no conjunto de estratégias, processos e ações que devem ser
definidos a partir de estudos diagnósticos e executados por equipe multidisciplinar,
constituída por profissionais com experiência de atuação em Trabalho Social.

O Projeto do Trabalho Técnico Social (PTS) do empreendimento estudado, contava


com uma psicóloga e uma assistente social que o elaboraram inicialmente. Entretanto, no
decorrer da obra, a assistente social desistiu de fazer o trabalho alegando preferir trabalhar em
outros setores do mercado e a psicóloga acabou abandonando as atividades por motivos
pessoais desconhecidos.

Assim, foi posta uma nova assistente social para dar continuidade ao trabalho;
entretanto ela não se identificava com o modelo autogestionário; e o trabalho que era
desenvolvido na prática com as famílias passou a ser dificultado. A assistente social passou a
desestimular as famílias e a se recusar a fazer a discussão da autogestão nas instâncias da
obra. Isso demonstra a dificuldade de acesso à profissionais que entendam a autogestão e
aceitem trabalhar com essa prática.

'Isso é coisa de movimento que quer ser do contra. Não existe isso, quem já viu, família
construir?' Eu tive um trabalho de mais de três anos discutindo com as famílias, mostrando
pra elas que elas iriam participar do projeto e, infelizmente, o social que nós contratamos,
desestimulou as famílias com esse discurso. Quando se reuniu aqui com as famílias foi
colocando que isso não existe, não. Dizendo que a parte delas do social é só fazer os cursos.
Então a questão da autogestão que eles tinham que tá levando, eles não trouxeram. Justamente
porque nós temos deficiência no Estado de pessoas que querem trabalhar dessa forma."
(Jussara Barbosa - Coordenadora da Entidade, em entrevista concedida em 7 nov. 2017)

Com isso, acontece o retorno da psicóloga que atualmente desenvolve o Trabalho


Social juntamente a outros funcionários da Entidade Organizadora. O Trabalho Social é
dividido em três etapas: etapa pré-obra, obra e pós-obra. A etapa pré-obra se inicia a partir da
assinatura do contrato até o início das obras, a etapa da obra se inicia ao se iniciarem as obras
e é concluída após o seu término juntamente a mudança das famílias e a etapa pós-obra se
refere à conclusão da obra e o acompanhamento deve durar de 6 a 12 meses.

116
A atuação do Trabalho Social durante as etapas prevê ações diversas de inclusão e
mobilização das famílias nos processos que envolvem o desenvolvimento do projeto, além de
promover atividades de capacitação e requalificação profissional como forma de encaminhá-
los ao mercado do trabalho.

Assim, dentro das atividades que vem sendo desenvolvidas no âmbito do Trabalho
Social executado pela Entidade, estiveram assembleias e palestras de instrução ás famílias ao
que estava sendo desenvolvido; estímulo à participação das famílias nos momentos
deliberativos, como exemplo as assembleias para apresentação dos projetos; palestra sobre
gestão condominial de modo a familiarizá-los nessa nova forma de organização na qual irão
se inserir; e cursos foram ofertados como a exemplo curso de pintura predial, culinária,
padeiro, corte e costura, artesanato, encanador, eletricista e está previsto o curso de rejunte de
pisos; este para prepará-los para essa etapa na obra, a qual será realizada pelos beneficiários
em mutirão.

As dificuldades encontradas pela Entidade Organizadora para realizar o Trabalho


Social com as famílias, vão além da falta de vontade dos profissionais que se envolveram
nessa etapa. É preciso levantar o questionamento que, não adianta as normas do programa
estabelecerem um trabalho social a ser executado e simplesmente, exigi-lo, se não é previsto
um espaço de capacitação também para os profissionais, uma vez que, a autogestão ainda não
está enraizada nesses processos.

Assim, o exercício da autogestão enquanto processo participativo, dependerá de tempo


para que alcance a todos em um mesmo nível, porque trata-se de indivíduos de diferentes
origens, pensamentos e ideologias, os quais não são fáceis de serem rompidos; e isso é
comprovado ao se constatar que as famílias mais assíduas dentro desses processos hoje, são
aquelas que estavam desde o início da obra ou beneficiários novatos, porque nesse processo
quem não se identificou com o projeto ou não conseguiu assimilar, foi se retirando; assim
como aconteceu com os profissionais envolvidos. Para isso, será abordado na subseção
seguinte, o eixo que determina a autogestão vivenciada e estabelecida no caso estudado.

117
4.3 AUTOGESTÃO

A ação política não está dada de princípio ou diretamente no resultado, mas


nos meios e formas de obtê-lo, na miríade de conflitos e possibilidades que vão
forjando uma possível consciência crítica do processo. (Usina Ctah, Usina: Entre o
Projeto e o Canteiro, 2016: p.100)

A autogestão enquanto forma de organização para a produção da habitação de


interesse social se caracteriza pela gestão participativa e democrática por parte das famílias
beneficiárias em todos os âmbitos que confere a formação da casa; desde a administração dos
recursos, compra de materiais, contratação de mão de obra e outros encargos, até a elaboração
dos projetos arquitetônico e urbanístico e a fiscalização da obra.

Na esfera do Programa Minha Casa Minha Vida - Entidades, para garantir o devido
acompanhamento e a avaliação da execução do projeto, exige-se a formação de duas
comissões. A Comissão de Representantes (CRE) e a Comissão de Acompanhamento de
Obras (CAO). Ambas devem ser compostas por, no mínimo, três participantes, dos quais um
necessita ser membro da Entidade Organizadora (EO) e dois, são futuros beneficiários do
empreendimento, em que, os membros não devem se repetir nas duas comissões. 95

A CRE, é responsável por acompanhar as questões financeiras da obra, assim como,


pela abertura e movimentação da conta bancária que receberá os recursos. E, além disso,
deverá prestar contas aos demais beneficiários quanto à aplicação dos recursos liberados.

A CAO, deve acompanhar a execução do empreendimento e/ou acompanhar a


elaboração, apresentação e aprovação dos projetos, junto aos demais beneficiários e Entidade
Organizadora; devendo também prestar contas aos beneficiários sobre o desenvolvimento do
projeto ou, no caso de construção, sobre o andamento das obras, segurança e guarda das
obras e do material adquirido.

As comissões precisam ser eleitas em assembleia convocada pela Entidade


Organizadora, com registro em ata e, previamente à contratação do financiamento. Dessa
forma, o programa lança instrumentos legais que tem a capacidade de regular a
implementação de uma prática que está contida no contexto da produção autogestionária.

95
Caixa Econômica Federal - Manual de Implementação MCMV-E Disponível em:
https://www.caixa.gov.br/Downloads/habitacao-minha-casa-minha-vida/MANUAL_MCMV_ENTIDADES.pdf
Acesso em: 02 out. 2017

118
Entretanto, para que a autogestão aconteça, dependerá de questões que irão além do
acompanhamento do projeto e obra, porque ela se configurará a partir dos arranjos
organizacionais do grupo e da sua compreensão de pertencimento sobre o projeto, bem como
a consciência política da sua participação nele; logo, essa é a margem que existe para a
interpretação de uma prática autogestionária em diversos níveis, em que, nenhum deverá ser
desconsiderado, uma vez que, os diferentes contextos sociais e políticos em que são aplicados,
diferenciará o seu molde nesses aspectos.

Dessa forma, existirão pormenores para garantir a consciência política da sua atuação
e a noção de pertencimento dentro do grupo; em que, serão considerados a sua mobilização
política, espaços de formação e outras comissões que se façam necessárias durante o projeto
de modo a contextualiza-los nessa esfera. Ou seja, ao tratar-se da organização de um grupo de
pessoas com diversas origens, pensamentos e ideologias, será necessária uma formação de
base que possa conscientiza-los do seu direito de atuação dentro das políticas que a autogestão
busca fomentar enquanto processo emancipatório.96

Partindo então do processo de seleção das famílias que começou no ano de 2011 a
partir da divulgação pelo Jornal Cinform e boca a boca, as pessoas passaram a ter
conhecimento do projeto. Assim, aos poucos as pessoas começaram a se dirigir à sede da EO;
em que, no momento do credenciamento era verificado os documentos comprobatórios de
renda, assim como a verificação se a família já continha Cadastro Único97 e caso contrário, a
orientação para o cadastro. No momento do cadastro, as famílias passaram a ser associadas à
Sociedade Sergipana Monte Sião, o que acarretou um pagamento mensal à Entidade como
forma de manutenção dos seus gastos, uma vez que ela se instituí enquanto entidade sem fins
lucrativos.

A fim de atrair a atenção das famílias para o cadastro, a Entidade divulgou os cursos
previstos para serem realizados durante as etapas do projeto. Os cursos oferecidos eram
variados: pintura predial, culinária, padeiro, corte e costura, artesanato, entre outros. Com
isso, a ideia de ministrar esses cursos para as famílias, partia da ideia do aprendizado de uma
nova atividade que pudesse servir como base para oportunidades de trabalho no futuro; além

96
É o que afirma FÁTIMA, (2011), ao analisar as diferentes percepções que observam a prática autogestionária,
em que, a autogestão enquanto ferramenta de transformação social emancipatória se constitui a partir da
realidade dos grupos organizados.
97
Instrumento de coleta de dados e informações com o objetivo de identificar todas as famílias de baixa renda
existentes no país. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2010/03/cadunico Acesso em:
06 nov. 2017
119
de que, o curso de rejunte de cerâmicas, foi estimado com o fim de treinamento para que as
famílias pudessem atuar no mutirão realizado no andamento da obra.

O primeiro contato com parte do conceito da "autogestão" por parte das famílias, se
deu no momento da filiação à Entidade, em que foi explicitado o modelo de gestão no qual
estavam se inserindo.98 Entretanto, somente ao longo das assembleias, as famílias que até hoje
se mantém no projeto, foram ganhando confiança e passaram a entender esse novo modelo de
funcionamento que se diferencia do já conhecido Minha Casa Minha Vida destinado às
construtoras.

Foi uma amiga que me apresentou, me falou como era e perguntou se eu acreditava.
Eu falei que ia ver. Aí quando chegou a reunião que teve a palestra e a explicação
tudo direitinho e que Jussara explicou tudo; a gente acreditou e tá no projeto.
(Beneficiária A, em entrevista realizada no dia 04 nov. 2017)

Dentro dos processos do Condomínio Getúlio Alves Barbosa, as comissões previstas


pela CEF foram determinadas na primeira assembleia realizada com os beneficiários no ano
de 2011. As Comissões CAO e CRE, foram determinadas a partir de autocandidatura seguida
de votação entre as famílias. No projeto apresentado e aprovado pela CEF, a CRE é composta
por dois componentes das famílias beneficiárias e um componente da Entidade Organizadora.
Entretanto, embora tenha sido estabelecida dessa forma, na prática o acompanhamento por
parte das famílias não se dá de forma satisfatória e em geral, existe um esvaziamento nos
espaços de atividade e deliberação administrativa coletiva. Segundo entrevista concedida pela
coordenadora do projeto, as famílias encontram dificuldades de assimilar sobre essas funções;
o que não permite pôr em prática de modo totalmente satisfatório. A psicóloga responsável
pelo acompanhamento do Trabalho Técnico Social, atribui essa dificuldade ao pensamento
voltado para a lógica mercadológica contida na aquisição da moradia: "Funciona, mas não da
forma como deveria; eles chegam aqui achando que vão só comprar"; contudo, outras
comissões que não são regulamentadas e atuam de forma paralela, ajudam no processo
coletivo.

Em visita ao canteiro de obras em dia de mutirão com as famílias, é possível perceber


como essas outras comissões acontecem de maneira espontânea. Por exemplo, a Comissão de
Acompanhamento das Crianças - explicitada pela coordenadora -, tem a função de cuidar das
crianças que são levadas pelas mães mutirantes e que não possuem quem cuide delas em casa;
98
Em entrevista realizada no dia 04 nov. 2017, a Beneficiária A explica que no momento da filiação foi descrito
que todos os processos do projeto envolveriam eleições, votações e reuniões, onde tudo seria acordado entre
todos.
120
entretanto, essa função é definida na hora, no momento em que dividem os grupos de trabalho
diário, e por isso não tem seu caráter totalmente demarcado. Não existe um espaço físico
próprio para acomodá-las, entretanto, elas ficam na sala em que os materiais de proteção são
armazenados e a Associação disponibiliza livros e brinquedos para que elas possam se
distrair. Contudo, é preciso ressaltar que essas comissões são sempre formadas por mulheres,
enquanto os homens se encarregam de funções que exigem mais esforço; ou seja, essa
situação reforça o estereótipo do que representa as "funções masculinas" e as "funções
femininas", não havendo assim uma divisão do trabalho baseado na equidade.

Figura 40_ Crianças no escritório do canteiro de obras em dia de mutirão

Fonte: Foto tirada pela autora no dia 04 nov. 2017

Em relação à administração financeira do projeto, cujo acompanhamento é


responsabilidade da Comissão de Representantes (CRE), um escritório especializado em
análises de cenários financeiros e que oferece o serviço de administração, foi contratado sob
recomendação dos representantes que sofriam com atrasos de pagamento, a fim de reverter o
quadro que passou a atrasar o andamento do projeto em diversos níveis. O empreendimento
passou a ter dificuldades financeiras advindas do seu gerenciamento, no qual a má elaboração
do projeto de fundação passou a acarretar dificuldades já no início das obras; com isso, houve
atraso para a liberação da verba por parte da CEF e consequentemente atraso para o
121
pagamento de funcionários e representantes, gerando assim uma situação desordenada no
corpo técnico e da mão de obra e por conseguinte nos âmbitos administrativo e financeiro do
projeto. 99

Desse modo, a CRE faz o acompanhamento dessas ações dentro das reuniões
convocadas pela Entidade Organizadora juntamente às outras famílias beneficiárias e atua
enquanto representantes nas reuniões convocadas pela Caixa Econômica Federal. Nas
assembleias, um parecer das ações administrativas e financeiras são dados, assim como, a
justificativa sobre as mudanças de materiais ou outras ações nessa esfera que se façam
necessárias. Assim, esses espaços são de caráter informativo, e as famílias não tomam
decisões no que diz respeito ás definições administrativas e financeiras. Contudo, visto a
quantidade de famílias no projeto (280 famílias), a autonomia dentro desses processos se
tornaria dificultoso; com isso, faz-se a ressalva da necessidade de atuação da CRE nesse
momento determinante juntamente à equipe administrativa, uma vez eleitas pelos demais
beneficiários enquanto procuradora.

Ainda assim, as comissões previstas na estrutura do MCMV-E, são instrumentos de


manutenção dessas atuações nos espaços decisórios; entretanto, mesmo o bom funcionamento
delas de forma isolada, tangencia o conceito de autogestão, por se tratar de um grupo
pequeno.

A prática autogestionária em grupo multicultural, não é um fácil exercício. Despertar a


noção de pertencimento dentro do projeto e a ideia da responsabilidade contida na assiduidade
dos beneficiários nos espaços deliberativos, se configura uma tarefa difícil para a Entidade
Organizadora e os instrumentos da CRE e CAO determinados pelo Programa, não suficientes
para que isso aconteça. Ou seja, a CEF somente aprovará o projeto mediante à apresentação
dessas comissões formadas, mas isso não garante a sua posterior atuação e quiçá garantirá um
contexto participativo generalizado.

Dentro das tantas variantes que entremeiam a prática da autogestão, o modo como as
famílias se sentirão inseridas no processo, será produto de uma vivência dentro de espaços
que a façam desenvolver a consciência coletiva. Logo, neste âmbito, a EO no caso estudado,
elaborou um Trabalho Técnico Social pautado no planejamento de atividades que contemplam
a prática em sociedade. Foi prevista a realização de palestra com o tema "Vida em

99
Melhor explicado na subseção 4.2
122
Coletividade" e oficina sobre Liderança. Para além disso, a prática do mutirão no canteiro de
obras, estimula a percepção empática sobre o outro e reflete a autogestão contida nas ações de
cunho colaborativo.

É tipo uma cooperativa em que um ajuda o próximo, porque aqui todo mundo
precisa de uma habitação que não tem condições de comprar uma casa. Então se
reúne todo mundo, faz uma equipe. Todo mundo ajuda um ao outro pra poder
construir o sonho da gente que é ter nossa própria casa. Então foi por isso que a
gente acreditou. Eu mesma acreditei na cooperativa porque é uma cooperativa que
trabalha com união. Eu tô limpando aqui, não sei se é meu mas eu faço como se
fosse meu. Por amor. Independente de quem seja ou de quem vai ser. Eu acho bonito
porque é tipo assim; o que Jussara faz, ela realiza um sonho de pessoas que não tem
condições de ter uma casa. Que paga um aluguel sem ter condições com um salário
mínimo, um salário e meio. Então, é um ajudando o outro pra no futuro ter uma vida
melhor. (Beneficiária A, em entrevista realizada no dia 04 nov. 2017)

Figura 41 _ Reunião com as famílias no canteiro de obras em dia de mutirão

Fonte: Foto tirada pela autora no dia 04 nov. 2017

Os momentos destinados aos cursos, palestras de formação, reuniões e assembleias -


sejam deliberativas ou não - e durante os mutirões na obra, garantem o que fortalece o
relacionamento entre eles favorecendo uma melhor convivência na pós ocupação do
condomínio. Para além disso, todos os espaços os quais eles precisam estar presentes e ao
destinar um tempo e esforço para estarem alí, garantem a valorização da moradia e o
reconhecimento da luta para conquistá-la se diferenciando de outros modelos que giram em
torno da lógica mercadológica. Isso foi perceptível no momento das entrevistas com as
123
famílias beneficiárias ao serem perguntadas sobre como se sentem em um projeto
autogestionário e a diferença entre o padrão de gestão do Minha Casa Minha Vida e o Minha
Casa Minha Vida - Entidades:

É que não sabe valorizar aquilo que tem. Assim, por exemplo, se eu tenho isso aqui,
eu vou ter mais cuidado. Não vou quebrar, vou zelar mais. Então essas pessoas que
ganham fácil do MCMV que é só chegar, dar o nome e receber a casa é diferente
porque não suou. (Beneficiária B, em entrevista realizada no dia 04 nov. 2017)

Eu gosto de tá aqui porque você tá vendo o crescimento daquilo que é seu. Então é
suado, é tempo, é desgaste. Tem uma coisa que não dá certo um dia, você sabe o
motivo o qual não deu certo. Eu não conheço uma forma diferente; no caso, eu não
conheço como é participar de um outro processo. Mas eu gosto de tá aqui.
(Beneficiária C, em entrevista realizada no dia 11 nov. 2017)

Assim, constata-se como a autogestão na prática não se estabelece de forma


pragmática. Dentre as variantes que a determinam, é preciso considerar que as experiências
não atingirão todo o grupo da mesma forma e no mesmo nível. Embora hajam espaços de
formação política de base, didáticas que estimulem o pensamento coletivo e até a regulação de
comissões que prevejam o acompanhamento das ações do projeto, é preciso relevar que ela
poderá atingir somente à uma parte mais sensível das pessoas do grupo.

Entretanto, é indiscutível como a obrigatoriedade nos espaços de construção coletiva


dado aos finais de semana no mutirão da obra, acabam por forçar o interrelacionamento entre
os beneficiários, em que, após certo tempo lutanto por um mesmo objetivo, o envolvimento se
torna quase inerente ao processo. Assim, os valores contidos nessas práticas, giram em torno
do reconhecimento empático pelo outro, ainda que as ações de cunho deliberativo para a
adminsitração da obra, não sejam exercidas.

Assim, diante das dificuldades que se estabelecem para o exercício da autogestão, é


necessário considerar o contexto da cidade no qual está inserido o caso estudado e reconhecer
a falta de políticas que incentivem essas práticas. Com isso, dentro do Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano de Aracaju (2000) vigente, a seção que trata da habitação dentro
das políticas sociais, estabelece que o Poder Executivo Municipal deve "garantir processos
democráticos na formulação e implementação da política habitacional".100 Embora a diretriz
se mostre abrangente, não existe a formulção de políticas com esse cunho participativo, no
qual, poderia ser inserido a autogestão. Ou seja, com a falta de instrumentos que a incentivem,
a ausência da fomentação da cultura da autogestão, dificultará o acesso da população à essas

100
Prefeitura Municipal de Aracaju, Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, 2000: p. 34
124
informações. Para isso, é importante ressaltar que no ano de 2015 101 foi elaborada uma nova
revisão para o PDDU102, no qual, estabelece-se na seção específica para a habitação de
interese social a atribuição do Sistema Municipal de Habitação sobre o incentivo de planos,
programas e projetos por meio de cooperativas habitacionais, com utilização do processo de
autogestão, e capacitação por meio de assistência técnica; entretanto a revisão não foi
aprovada no Legislativo.

No caso do Condomínio Getúlio Alves barbosa, embora haja uma assessoria técnica e
social, foram encontradas dificuldades de atuação, uma vez que, a experiência com esse
modelo é pioneira. Ou seja, a falta de incentivos, programas e ações que a regulamentem,
juntamente à escassez de profissionais para atuar enquanto assessoria técnica e social, se
mostra uma problemática na implantação da autogestão enquanto alternativa para a política
habitacional.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A autogestão na habitação consiste em um processo de autogerenciamento e


autoadministração na concepção do projeto de moradia e, logo, tem a ideia de permitir uma
autonomia dentro desses processos. Ela surge no Brasil a partir da luta dos movimentos
sociais no momento em que se uniram à academia, técnicos da arquitetura, urbanismo e
engenharia, enquanto uma alternativa voltada para a produção democrática na habitação
social e enquanto ferramenta de inclusão de uma população que até então permanecia alijada
dos processos de formação da política habitacional.

As políticas habitacionais no Brasil, em sua maioria, se basearam na lógica


mercadológica da sua atuação, na qual, os discursos que mais se aproximavam de uma
aplicação voltada para as camadas de renda mais baixa - que correspondiam ao déficit
habitacional -, serviram enquanto ferramenta de legitimação do Governo diante do povo.
Assim, em momentos de crise financeira, percebe-se o aparecimento de novos programas
habitacionais, entretanto, eles sempre se fundaram na aposta da construção civil reestabelecer
a economia do país, uma vez que ela engloba diversos setores econômicos na sua aplicação;
ou seja, desde às lojas de materiais de construção, até a loja de móveis e eletrodomésticos que

101
Disponível em: <http://www.aracaju.se.gov.br/userfiles/anteprojeto-de-lei-pddu.pdf> Acesso em: 14 nov.
2017
102
Antes disso, foram feitas revisões nos anos 2005, 2010 e 2012, entretanto, nenhuma delas foi aprovada pelo
Poder Legislativo, permanecendo assim o PDDU 2000 vigente até os dias de hoje.
125
seriam procuradas no momento de entrada nas novas casas, fundada em uma ideia do "sonho
da casa própria" presente em muitas(os) brasileiras(os).

É fato, que de acordo com o grande número que representa o déficit habitacional do
país, ele não seria combatido sem o mercado da construção por este conseguir estabelecer
uma construção em massa. Contudo, o déficit habitacional não deve ser encarado somente na
esfera quantitativa, mas sim, qualitativa, principalmente no que diz respeito ao processo de
concepção das políticas habitacionais na qual irão se embasar. Ou seja, não adianta promover
uma política habitacional baseada em números, se não é levada em consideração a inserção
urbana dessas moradias, a qualidade projetual dos empreendimentos e a inclusão das famílias
de uma forma mais democrática e participativa.

Desse modo, ainda havendo uma produção habitacional voltada para as faixas de
renda mais baixa, a quantidade produzida é ínfima se comparada às produções voltadas para
as classes mais altas; ou seja, uma atuação contraditória que se repetiu por muitos programas
e permanece no retrato da produção do Minha Casa Minha Vida (MCMV), Programa de
Arrendamento Residencial (PAR) e demais programas atuais.

Durante o percurso de inclusão da produção autogestionária no Brasil, houveram


Governos que estimularam esses processos com a inserção de programas que voltavam para
esse conceito - a exemplo os programas executados na Gestão de Luiza Erundina, em São
Paulo -, todavia, com as renovações de mandatos e partidos no "poder", esses programas
sofreram com a descontinuidade das suas ações; o que dificultou o enraizamento da
autogestão enquanto política habitacional e acentuou a luta dos movimentos de moradia com
o Estado.

Contudo, com o primeiro Governo Lula, e enquanto resposta ao que pleiteavam os


movimentos sociais, a autogestão foi de certa forma, impulsionada a nível federal partir dos
Programas Crédito Solidário e Minha Casa, Minha Vida – Entidades; programas que inserem
os movimentos sociais enquanto protagonistas da produção da moradia. Ainda assim, é
notório como, embora forneça instrumentos que permitam essa aplicação, a concorrência que
se estabelece entre as associações e as construtoras acaba por ser desproporcional, uma vez
que as construtoras possuem capital de giro e, assim, maior facilidade para antecipar o valor
da compra de terrenos, por exemplo.

126
É certo que, com a possibilidade da Compra Antecipada dentro do Minha Casa Minha
Vida - Entidades, tentou corrigir um pouco essa distorção. Porém, ao mesmo tempo,
enfraquece os movimentos na conquista de terras públicas para Habitação de Interesse Social,
uma vez que, isenta o Estado a partir dessas alternativas. Para além disso, embora hajam
instrumentos legais, como a Lei de Assistência Técnica, que poderia ser utilizada enquanto
aliada, visto a escassez de profissionais a se inserir nesses espaços e a dificuldade encontrada
pelas associações na esfera dos problemas técnicos. Ou seja, isso é resultado de uma falta de
incentivos por parte do Poder Público, em tornar cada vez mais recorrente essas práticas.

Essas problemáticas também se estabelecem no âmbito local. As políticas de habitação


em Aracaju são marcadas pelas várias transferências dos órgãos responsáveis, o que gera uma
dificuldade na continuidade dos programas. Embora tenham havido programas que
tangenciam o conceito da autogestão, como os que aplicaram regime de mutirão, estes foram
feitos com a mesma ideia de legitimação do Governo e nunca voltado para o fortalecimento
desse regime, estabelecendo um caráter assistencialista. Logo, com a falta de incentivos que
delineiem essa política, outras dificuldades serão acarretadas e é o que mostra o estudo de
caso apresentado na pesquisa.

O estudo de caso desenvolvido na esfera do Programa Federal Minha Casa Minha


Vida - Entidades, demonstra o quanto a experiência autogestionária, nesse caso, se apresenta
de forma embrionária e contida nos detalhes que permeiam o processo. As dificuldades no
acesso à terra e a falta da inserção do projeto nas áreas que possuem infraestrutura na cidade,
se mostra problemática. A associação que iniciou o projeto antes do instrumento da Compra
Antecipada, ficou submetida junto às famílias aos encargos da compra do terreno e ao mesmo
tempo, subordinadas à má localidade do projeto, uma vez que estas são as terras que "sobram"
para a habitação social.

Assim como, as complicações com as assistências técnica e social demonstram uma


falta de preparação de técnicos para trabalhar nessa modalidade; a abstenção do Poder Público
em fornecer auxílio para essas situações e; a comprovação de que os critérios estabelecidos
pela Caixa Econômica Federal para a formação das comissões e, critérios técnicos e sociais,
acabam funcionando de modo superficial e enquanto cumprimento de regras, deixando de
lado um melhor suporte de assessoria que poderia ser fornecido às Entidades.

127
Entretanto, o trabalho de conscientização do processo estabelecido pela Entidade com
as famílias, embora passando por dificuldades de aceitação e grande inadimplência nos
momentos participativos, demonstra conseguir atingir - ainda que incipiente -, conceitos
contidos na prática autogestionária como as questões de coletividade e a ideia do rompimento
com a lógica da moradia enquanto um produto, mas sim, conscientizando-os do processo.

Assim, a pesquisa chega ao seu objetivo final e consegue analisar a autogestão


enquanto alternativa para a produção da Habitação de Interesse Social, e perceber as
dificuldades contidas nesse processo marcado por resistência e luta por parte dos movimentos
sociais, técnicos e academia e em contrapartida, abstenção do Poder Público para instituir esse
modelo.

Logo, fica clara a relevância do tema abordado, na qual se faz urgente a sua discussão,
visto o contexto de golpes e contenção de gastos destinados a essa habitação. Assim, espera-
se que a pesquisa contribua para o entendimento da autogestão na habitação social e as suas
dificuldades de inserção, a fim de contorná-las para a construção de uma política habitacional
que caminhe para uma governança democrática.

No mais, a luta prossegue.

128
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARRETCHE, Marta T. S.. Políticas sociais no Brasil: descentralização em um Estado


federativo. Rev. bras. Ci. Soc. [online]. 1999, vol.14, n.40. Disponível em: <
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-
69091999000200009&script=sci_abstract&tlng=pt> Acesso em: 15 ago. 2017

AZEVEDO, Sérgio. Vinte E Dois Anos De Política De Habitação Popular (1964-86):


Criação, Trajetória E Extinção Do BNH. In: Revista Adm. Pública, Rio de Janeiro. 1988.

AZEVEDO, Sérgio; ANDRADE, Luís. Habitação e Poder: da Fundação da Casa Popular


ao Banco Nacional Habitação. Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, Rio de Janeiro: 2011.

BARAVELLI, José. O cooperativismo uruguaio na habitação social de


São Paulo: das cooperativas FUCVAM à Associação de Moradia Unidos de Vila Nova C
achoeirinha. São Paulo: dissertação de mestrado, FAUUSP, 2006.

CAMPOS FILHO, Candido Malta. Cidades brasileiras: seu controle ou o caos. 4 ed. São
Paulo: Studio Nobel, 2001.

CARVALHO, Lygia Nunes. As políticas públicas de localização da habitação de interesse


social induzindo a expansão urbana em Aracaju- SE.
São Paulo: dissertação de mestrado, FAUUSP, 2013.

CORREA, Roberto Lobato. Sobre agentes sociais, escalas e produção do espaço: um texto
para discussão. In A produção do espaço urbano. / Ana Fani Alessandri Carlos, Marcelo
Lopes de Souza, Maria Encarnação Beltrão Spósito (organizadores) – São Paulo: Contexto,
2011

FRANÇA, Sarah Lúcia Alves França. A produção do espaço na Zona de Expansão de


Aracaju/SE: dispersão urbana, condomínios fechados e políticas públicas. (Dissertação)
Mestrado em Arquitetura e Urbanismo - Universidade Federal Fluminense, 2011.

FRANÇA, Sarah Lúcia Alves França. Estado e Mercado na produção contemporânea da


habitação em Aracaju-SE. (Tese) Doutorado em Arquitetura e Urbanismo - Universidade
Federal Fluminense, 2016.

FRANÇA, Vera Lúcia Alves; Aracaju: Estado & Metropolização. Aracaju: ed. UFS. 1999.

129
JACOBS, Janes. Morte e Vida de Grandes Cidades. São Paulo: 2010

KOKUDAI, S.; HUGUENIN, J.; SILVA, V.; BURGUIÈRE, E.; GHILARD, F. Produção
Social Da Moradia No Brasil: Panorama Recente e Trilhas Para Práticas
Autogestionárias. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2016.

LAGO, L. at al, Produção Social Da Moradia No Brasil: Panorama Recente E Trilhas


Para Práticas Autogestionárias. Letra Capital. Rio de Janeiro: 2016.

LOPES, João Marcos. O Anão Caolho. . In: Revista Novos Estudos, 76, São Paulo, pp. 219-
227, Novembro 2006.

MARICATO, Ermínia. A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil Industrial.


Alfa-Omega, São Paulo: 1982.

MARICATO, Ermínia. Política Habitacional no Regime Militar. Editora Vozes Ltda,


Petrópolis: 1987.

MEDEIROS, Sara Raquel Fernandes Queiroz de. BNH: Outra perspectiva. 2015. Artigo
publicado e disponível em:
http://www.cchla.ufrn.br/cnpp/pgs/anais/Artigos%20REVISADOS/BNH,%20outra%20pespe
ctiva.pdf . Acesso em: 09 ago. 2017

MOREIRA, Fernanda Accioly. O lugar da Autogestão no Governo Lula. 2009. 195 f.


Dissertação (Mestrado - Área de Concentração: Habitat) – Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.

OLIVEIRA, Francisco de. O Vício da Virtude: Autoconstrução e acumulação capitalista


no Brasil. In: Revista Novos Estudos, 74, São Paulo, pp. 67-85, março 2006.

OLIVEIRA, Sandro Barbosa de . Nas tramas da reprodução autogestão e heterogestão na


produção de habitação popular. 2012. (Apresentação de Trabalho/Seminário).

______. Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano. Prefeitura Municipal de Aracaju, 2000

RODRIGUES, Evaniza L. A estratégia fundiária dos movimentos populares na produção


autogestionária da moradia. 2013. 233 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e

130
Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2013

RONCONI, Reginaldo. Habitações construídas com gerenciamento pelos usuários,


com organização da força de trabalho em regime de mutirão:
o Programa FUNAPSComunitário. Dissertação de Mestrado. São Carlos: EECSC, 1995.

ROYER, Luciana. Política habitacional do estado de São Paulo: estudo sobre a


Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo
(CDHU). Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - FAPESP. USP-FAU, São
Paulo. 2002.

______. Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Estratégico Municipal de


Assentamentos Subnormais. Prefeitura Municipal de Aracaju, 2001.

SILVA, Jéssica Moreira Mariquito Naime. Os interesses em torno da Política de Habitação


Social no Brasil : a autogestão no Programa Crédito Solidário. Dissertação (Mestrado em
Planejamento Urbano) - IPPUR. UFRJ, Rio de Janeiro, 2009.

SOUZA, Bárbara Cecília Machado Fontes de. Desenvolvimento Regional E Região


Metropolitana: Reflexões A Partir Da Política Habitacional Na Região Metropolitana
De Aracaju. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional e Gestão de
Empreendimentos Locais) - UFS, São Cristóvão, 2009.

SOUZA, Leda. Análise Comparativa das Políticas Habitacionais nos Governos Fernando
Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Dissertação (Mestrado em Gestão de
Políticas Públicas) - UNIVALI, Itajaí. 2005.

TAGATIBA, Luciana.; TEIXEIRA, Ana. Efeitos combinados dos movimentos de moradia


sobre os programas habitacionais autogestionários. Rev. Sociol.
Polit. vol.24 no.58 Curitiba. 2016.

VI A A, caro; CONSTANTE, Paula (orgs.). Usina: entre o projeto e o canteiro. ão


Paulo: Edições Aurora, 2016.

ZULIN, Fabricia. Conjuntos Verticalizados Minha Casa Minha Vida conduzido por
Entidades: casos na região Metropolitana de São Paulo. 2016. (Apresentação de
Trabalho/Congresso).

131
SÍTIOS ELETRÔNICOS

http://taniamaria-5dezembro.blogspot.com.br/2011/06/primeira-assembleia-autogestao.html.

http://www.usina-ctah.org.br/taniamariae5dedezembro.html.

http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2016/10/caixa-inicia-financiamentos-da-faixa-1-5-do-
programa-minha-casa-minha-vida.

http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,verba-para-moradia-cria-guerra-de-movimentos-
sociais,10000005764

http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2014/12/familias-de-taboao-da-serra-sp-recebem-
moradias-do-mcmv

https://www.brasil247.com/pt/247/favela247/182060/Exemplo-de-autogest%C3%A3o-no-
Minha-Casa-Minha-Vida.htm
http://autogestao.unmp.org.br/categoria/programas-habitacionais/minha-casa-minha-vida-
entidades/normas-do-programa-mcmv-entidades/
http://autogestao.unmp.org.br/videos/como-funciona-o-minha-casa-minha-vida-entidades-e-
como-funciona-a-autogestao-veja-aqui-a-reportagem-da-nbr/
http://www.redebrasilatual.com.br/cidades/2013/04/imoveis-construidos-por-entidades-sao-
maiores-e-mais-baratos-que-feitos-por-empreiteiras

132

Você também pode gostar