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Resumo
O presente artigo apresenta os resultados de uma pesquisa que objetivou conhecer e compreender
as crenças de alunos nativos em espanhol que participaram de um curso preparatório cujo foco foi
o ensino de português brasileiro para a realização da prova de proficiência Celpe-Bras. Ao final do
estudo, percebemos que as crenças dos referidos aprendizes se dividiram em dois momentos:
anteriores e posteriores ao contexto de imersão linguística e cultural, o que sugeriu que temas tais
como a facilidade de aprendizagem de português por hispanofalantes são crenças que devem ser
debatidas.
Palavras-chave: Português para estrangeiros; crenças de hispanofalantes; Exame Celpe-Bras
Abstract
This article presents the results of a research project that aimed to investigate the beliefs of
Spanish-speaking students who participated in a preparation course designed to develop students’
skills to take the Brazilian Portuguese proficiency test – Celpe-Bras. At the end of this study, we
noticed that the beliefs of the referred students could be divided into two different significant
moments: after and before the linguistic and cultural immersion, which suggested themes such as
learning Portuguese by Spanish native speakers with ease are beliefs that are to be debatable.
Key words: Portuguese as a Foreign Language; Spanish-speakers beliefs; Celpe-Bras Certificate.
Introdução
Em função desta procura, a instituição onde esta pesquisa foi desenvolvida vivenciou,
recentemente, mudanças subsequentes, dentre as quais destacam-se a) a contratação de um
professor para atuar no ensino, pesquisa e extensão na área de Português como Língua
Estrangeira, b) a criação de um projeto de extensão universitária (CELIPE - Curso de Extensão de
Língua Portuguesa para Estrangeiros) para oferecer cursos de Português para a comunidade
41 Graduada em Letras Português-Inglês pela Universidade Federal de Viçosa (MG) e em Estudos
Portugueses pela Universidade de Coimbra, Portugal. contato: maridepaulo@gmail.com
42 Mestre em Letras pela Universidade Federal de Viçosa (MG). Professor de Línguas Estrangeiras,
Departamento de Letras – UFV; Foreign Language Teacher Assistant na área de Português para Estrangeiros
pelo programa Capes-Fulbright (2013-2014) no School for International Training (SIT) Graduate School,
Brattleboro (VT, USA). contato: glauberhsampaio@gmail.com
Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e
Ciências Sociais – Ano 13 Nº32 vol. 03 – 2017 ISSN 1809-3264
A análise do material coletado foi desenvolvida em duas etapas. Inicialmente, fez-se uma
leitura criteriosa do material coletado. Em seguida, os dados foram categorizados de acordo com a
similaridade dos temas sobre os quais versavam. Por fim, desenvolveu-se o exame de cada grupo
categórico. No decorrer desses passos, forma utilizadas as contribuições metodológicas de análise
de dados prescritas por Creswell (1994).
43 O Manual do Celpe-Bras (BRASIL, 2013) descreve o exame de proficiência como o único em Língua
Portuguesa para Estrangeiros cujo certificado é reconhecido oficialmente pelo governo do Brasil. Tal
iniciativa foi desenvolvida e outorgada pelo Ministério da Educação em parceria com o INEP sendo que a
sua aplicação acontece tanto no Brasil quanto no exterior. Como pontua Dell’Isola et al (2003), o Celpe-
Bras possui caráter comunicativo e objetiva aferir a competência de uso oral e escrito do português brasileiro.
Logo, os aspectos que o exame se propõe a avaliar refletem a utilização da língua em situações reais de
comunicação. Dentro desse objetivo, o teste prevê a ênfase no uso da língua, a utilização de textos autênticos e a
avaliação integrada da compreensão e da produção (oral e escrita) (BRASIL, 2015, p. 8), a partir das quais, estrangeiros,
de diferentes nacionalidades, podem chegar a obter certificados em quatro níveis de proficiência na língua
portuguesa: intermediário, intermediário superior, avançado e avançado superior (BRASIL, 2015, p. 8).
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Em busca de uma definição para nortear este estudo, adotamos a definição de Barcelos
(2006) que entende as crenças como sociais (e ou individuais), dinâmicas, contextuais e paradoxais,
e vistas como construções da realidade, maneiras de ver e perceber o mundo e seus fenômenos, coconstruídas em nossas
experiências, resultantes de um processo interativo de interpretação e (re)significação (BARCELOS, 2006,
p.18). As crenças estão relacionadas às experiências que cada indivíduo vivencia e ao processo de
internalização pelo qual elas passam dentro de cada sujeito. Por esse ângulo, se pensarmos apenas
em nossas próprias experiências e nas diferentes visões que a elas destinamos, provavelmente,
discorreremos sobre um universo de construtos que é passível de influenciar, quer a prática
discente, quer a docente. Sobre a pesquisa em crenças, Barcelos (1995) explicita que nem sempre
existe uma correspondência direta entre as crenças e as estratégias de aprendizagem dos alunos,
porque, em função de variados fatores (abordagem de ensino do professor, material didático, etc.)
as mesmas são modificáveis. O papel do pesquisador é, entretanto, estudar as crenças e guiar os
discentes pelo caminho da reflexão. Essas considerações são importantes neste artigo uma vez que,
como professores dos participantes dessa pesquisa, estivemos diretamente ligados a alguns dos
fatores que podem levar os mesmos à reflexão de suas opiniões influenciando, portanto, na
qualidade do modo como aprendem. Baseados nestas questões, apresenta-se a seguir a análise das
crenças que foram categorizadas a partir dos dados fornecidos pelos participantes da pesquisa aqui
relatada.
Três dos participantes expressaram, de diferentes maneiras, que antes de viverem no Brasil
acreditavam que aprender português seria uma missão relativamente simples. A crença comum
entre os participantes sobre a proximidade e semelhança entre as línguas pode os ter levado a
acreditar também na consequente facilidade em aprender o português (ROJAS, 2006; FANJUL,
2002 e ALMEIDA-FILHO, 1995). Dos participantes investigados, apenas um declarou ter
estudado a língua antes de vir para Brasil. Diferentemente dos demais, tal participante expressou
sua consciência de que as línguas, embora próximas, diferem-se em vários fatores e, logo, há a
necessidade de um conhecimento prévio anterior à chegada ao país. A mesma consciência parece
não fazer parte das concepções das participantes Marisa e Catarina:
Excertos 01 e 02: nunca cheguei a estudar até chegar no Brasil [...] (Marisa. N. 22/04/2016); [o
primeiro contato com a língua portuguesa aconteceu] no Brasil, quando cheguei no 2010 a
estudar na Universidade. (Catarina. N. 18/04/2016)
Os excertos sugerem a existência de uma relação entre a crença da semelhança das duas
línguas e a não necessidade de uma preparação formal e mais aprofundada da mesma como pré-
requisito para inserirem-se no novo contexto interacional. A partir do momento em que os
primeiros passos são dados no Brasil, surgem desafios que parecem ir de encontro à crença inicial.
Essa necessidade faz com que passem a ser repensadas. Ao chegarem ao Brasil, sofrem um
confronto com a realidade. Problemas com o uso da nova língua e a impossibilidade de se
comunicarem efetivamente com os interlocutores brasileiros reconfigura a crença da facilidade:
Excerto 03: Foi um choque, não entendia nada do que o povo falava na rua [...] foi difícil, porque a
gente chegou aqui e o primeiro contato foi procurar apartamento, procurar móvel e tal e eu não
entendia nada do que o pessoal falava nas ruas, foi meio frustrante, porque eu não tinha essa
sensação, eu tinha a sensação de que ia chegar e ia entender todo mundo. (Marisa. N.
22/04/2016)
Excerto 04: Cheguei aqui e minha percepção mudou, porque percebo que a pronúncia dessas palavras
pode variar muito, além de que pessoas nativas falam muito rápido, e não falam as palavras
corretamente [...] Penso que para alguém que fala espanhol pode ser fácil de aprender, quando
comparado com outras línguas de origem não latina, mesmo assim pode ser um pouco difícil
para compreender os nativos da língua quando falam. Quando cheguei no Brasil percebi que
sabia muito pouco. (Rony. N. 09/04/2015)
Rony relembra a percepção que teve ao chegar no Brasil destacando a pronúncia das
palavras e o modo como variam nas situações de fala cotidiana como sendo o fator que o
impossibilitava de manter uma conversa com um nativo. Aponta que pelo fato de os nativos
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Após três anos resididos no Brasil, Marisa demonstra ter modificado suas crenças. Apesar
de não ter estudado português em seu país, muda sua crença sobre a similaridade e facilidade
quando inicia seus estudos da língua portuguesa.
Excerto 05: Passei a ver a língua diferente, sem dúvida, mas é que a gente acha que vai ser mais
acessível por essa proximidade mas é difícil[...] (Marisa. N. 22/04/2016)
Excerto 06: A principal diferença na aprendizagem destas línguas com (sic) respeito ao
português é que em todas elas tive aulas de língua nas que estudei gramática e
vocabulário. O português tive que aprender na rua mesmo, falando com
pessoas pelo que o aprendizado foi muito menos sistemático e demorei mais
para conseguir um nível bom. (Marisa. Q. 22/04/2016)
Excerto 07: [o domínio da língua] é bom porque já tenho anos morando no Brasil,
assim essa experiência no uso cotidiano do português me faz ter um domínio
bom da língua, não fico com vergonha, como acontecia quando cheguei no
Brasil. Não é excelente, já que cada vez que entrego um projeto para que
corrijam ele volta cheio de vermelhos [...] (Rony. Q. 09/04/2016)
Um dos objetivos desta pesquisa foi apontar as crenças que os participantes deste curso
possuem (e possuíam) sobre o exame Celpe-Bras. Abaixo, apresentam-se algumas das percepções
dos participantes.
Excerto 08: (...) uma prova com grão (sic) alto de dificuldade. (Catarina N.
18/04/2016)
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Excerto 09: Eu não tinha a mínima ideia de como era aquela prova, mas achei
que podia ser difícil, tipo uma prova TOEFL. (Rony N. 09/04/2016)
Excerto 10: não pesquisei muito sobre a prova, imaginei que teria que escolher
o nível. Eu fiz prova de outras línguas que tem que escolher, prova do nível B1,
B2, aí dependendo do nível que você escolher mais difícil a prova, mas achei
bom não ter que escolher, porque em português acho que seria prejuízo para
mim, porque as vezes um se julga ou que fala muito bem ou muito mal [...] eu
achei melhor nesse sentido.
(Marisa N. 22/04/2016)
Marisa acredita que se tivesse que escolher um nível, isto seria um “prejuízo” para muitos
examinandos. Por fim, novas crenças surgem posteriormente a participação do curso de preparação
e do exame. A este respeito, os participantes fizeram as seguintes considerações:
Excerto 11: Melhorou minha confiança da prova, sentir mais segura e tranquila ao
fazer a prova. A prova não é fácil mais (sic) não impossível. (Catarina N.
18/04/2016)
Excerto 12: A prova não achei difícil, achei difícil estar sentada essas horas e escrever
quatro textos, mas acho que em qualquer língua seria difícil [...] As vezes
porque quero fazer um bom texto, um texto que seja agradável de ler, para mim
a dificuldade foi isso, daí demorei, por exemplo, artigo de opinião, quando se
está cansado, ter que escrever como se fosse para um jornal. (Marisa N.
22/04/2016)
Excerto 13: A prova do Celp-Bras é uma boa forma de quantificar a proficiência das
pessoas estrangeiras na língua porque esta composta de escuta, escrita e oral, da
prova somente não concordei com a escrita porque deveriam ter um jeito de
qualificar a prova e entender direitinho, em meu caso eu não tirei um melhor
nível na prova porque com certeza meu qualificador não entendeu minha letra
o qual acho injusto já que a prova não e de caligrafia. (Marilu N. 13/04/2016)
Considerações Finais
Sobre o exame, as impressões são bastante diversas, indo desde a crença de que o teste é
difícil e cansativo, ou até mesmo fácil e de objetivos claros se bem preparados. As crenças também
se modificaram a partir do momento em que tomaram consciência do formato do teste e se
submeteram a ele. Ao compara-lo com outros testes proficiência, consideraram o Celpe-Bras mais
vantajoso por não ser preciso se candidatar a um nível.
Finalmente, foi possível compreender dois fatores essenciais: a especificação das diferenças
entre o português e espanhol e a necessidade de se refletir sobre a existência dessas especificidades.
O contexto, quer seja de imersão ou não, influencia as crenças dos participantes considerando-se o
fato de serem encontradas modificações nas crenças a partir da alteração dos espaço e estágio de
experiências em que os citados estudantes encontravam-se. Além disso, cabe fazer referência ao
mito de que o português e o espanhol são idiomas similares, sendo esta, possivelmente, uma crença
cerne a partir da qual algumas outras se desenvolvem e/ou à qual estão interligadas. No que diz
respeito a aplicabilidade dos dados examinados, concluiu-se que, ao saber no que os estudantes
abordados acreditam e que influências essas crenças podem ter sobre a maneira com a qual
aprendem português, devem ser desempenhadas atividades que proporcionem a discussão das
percepções e particularidades da língua alvo em relação à espanhola, bem como a abertura de
espaços destinados à reflexões com estes discentes sobre o ensino.
Em conclusão, espera-se que esta pesquisa possa contribuir com reflexões iniciais aos
professores de alunos hispano-falantes, em especial ligados ao desenvolvimento das habilidades
comunicativas esperadas pelo exame Celpe-Bras, considerando-se a necessidade de
aprofundamento sobre o que os alunos pensam sobre a língua estrangeira, sobre a preparação para
o teste, o próprio exame de certificação e o modo como são avaliados em prol de viabilizar o
melhor preparo possível para o uso da língua portuguesa.
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