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PÁGINAS MATINAIS - MORNING PAGES - ISSUE #1 04/2020

Páginas Matinais – Morning Pages #1

Por uma questão de hábito, vou começar hoje dia 1 de Abril de 2020 a praticar as minhas
páginas matinais para gerar no meu subconsciente uma nova rotina que se torne
automática. E se Deus, o Universo, a Natureza, ou essa Força Suprema que tudo governa e
cada povo, era, civilização atribuiu o seu próprio nome, permitir, em algumas semanas, sem
querer parecer demasiado presunçoso ou optimista – é que na verdade estou a contar com
o facto de já praticar a escrita intermitentemente – serei um verdadeiro escritor.

Tenho estado a lutar com aquilo que se designa Writer’s Block / Bloqueio Artístico, embora,
permitam-me que vos diga outra vez, sem querer parecer presunçoso, porque acho que a
tal condição só é possível acontecer em Artistas/Escritores, certo? Então se eu ainda estou a
lutar para ser um, como posso já padecer de uma doença/condição que afecta particular ou
exclusivamente aquela classe?

Uma questão interessante, para a qual eu não pareço estar minimamente interessado em
reflectir a fornecer uma resposta agora. Agora estou simplesmente interessado em dar
vazão ao que a minha mente vai despejando aleatoriamente, o meu vómito cerebral, esse
orgasmo intelectual...Ups, estou a divagar e a resvalar em conceitos, cuja noção não parece
estar bem clara na minha mente. Mas talvez esse exercício seja exactamente isso, abrir a
torneira da alma e deixa correr sem travas, sem diques, sem represas, sem amarras, sem
balizas, sem empecilhos.

A imaginação precisa de pernas, rodas, asas e espaço para se espalhar, derramar, expandir
e deixar ao acaso, pois formas extraordinárias poderão surgir desse expandir desregrado.
Poderão surgir questões filosóficas com as quais os homens mais eruditos da história não te
tiveram que se confrontar...questões que encerram em si mesmas as respostas para as
maiores ansiedades da humanidade.

Aproximo-mo das 300 palavras das pouco mais de 100 que devo escrever diariamente, pelo
menos para esse exercício e começo a sentir adrenalina a ser bombeada no meu organismo,
talvez porque esteja a alternar esse exercício mental com o físico, estou a fazer flexões e
agachamentos, é o básico que posso fazer num quarto 2x3m. Mas de qualquer for, como ia
dizendo, não sei qual dos exercícios está a ser responsável pela produção da adrenalina,
talvez ambos. Preciso de pesquisar um pouco mais nessa área, não gosto de me debruçar
sobre assuntos sobre os quais começo a titubear...gosto de me expressar com propriedade
como se fosse o autor do artigo, do tema, como se fosse versado no tópico.

Enche-me de prazer falar de coisas com domínio e passar uma informação clara, precisa,
científica aos meus interlocutores. Talvez pensem que seja uma espécie de narcisismo. Mas
não. Porque mesmo sozinho eu sinto isso, quando me apercebo que consigo me manifestar
sobre um assunto com um certo à vontade.

De um modo geral, estou na esperança e tenho quase a certeza que esse exercício, vai
reinstalar ou dispor noutras maneiras a cablagem no meu cérebro. Vai permitir que se
estabeleçam novas sinapses, pelo menos para a actividade da escrita, que permitam que
vos diga, é altamente difícil, é tão ou mais difícil que resolver exercícios matemáticos,
álgebras, geometria, etc. Porque nos exercícios matemáticos, basta dominares as fórmulas
e aplica-las em cada novo exercício, desde que consigas identificar exatamente a que
domínio pertence o problema. Já com escrita não é tão linear. A escrita é arte e na arte não
existem fórmulas para se criar arte. Embora cada peça de arte se encaixe numa categoria
de arte, como a gravura, pintura, escultura, música, etc., e cada uma delas tenham uma

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espécie de teoria geral que traça em modos gerais as directrizes para que uma obra tenha
os requisitos para se encaixar na dada arte, mas não existe uma fórmula universal que se
possa aplicar. E aplicar em quê? A Arte não é um problema, nem uma solução. A Arte é,
ponto final. É claro que subjectivamente uma dada categoria das Artes ou uma peça de arte
em si, possa ser a solução, o escape, o meio para catarse de alguém. Cá estou eu
novamente a falar sobre algo que ainda não pesquisei e não aprofundei as minhas noções.
Mas diga-me você, meu prezado leitor, concorda comigo, ainda que parcialemente?

É sem sombra de dúvidas uma das actividas mais complexas, mas ao mesmo tempo
bastante recompensadora e não me refiro a compensação pecuniária que resultaria de
sucesso comercial. Me refiro a recompensa que sentimos que nos estamos a realizar por
meio da arte. Quando aquilo que elaboramos, antes de agradar sentidos alheios, agrada
inicial e fundamentalmente o autor.

Sim, se uma pessoa não está satisfeita com aquilo que produziu, por que haveria de
disponibilizar para o mundo? É questionável.... Porque a pessoa pode ser extremamente
perfeccionista e aquilo que ela considera não estar ainda ao seu nível de perfeição ou
excelência pode muito bem ser uma das melhores coisas testemunhadas pelos sentidos
comuns. A questão é, deve ou não disponibilizar a obra para que a humanidade possa
desfrutar dela, ainda que no seu âmago, o autor saiba que a obra está inacabada pelo
menos para os seus rígidos e exigentes padrões?

O autor poderá eventualmente desfrutar de sucesso comercial, mas no seu âmago, a sua
consciência irá torturar-lhe, martirizar-lhe, porque ele vai se sentir culpado de uma suposta
fraude. Na sua mente e espírito, ele concebeu a peça com determinadas características,
com certo grau de imponência, grandeza, mas por limitações quiçá de tempo, meios,
instrumental, habilidades, ele não consegue materializar a obra na sua grandeza imaginada.
Na verdade, se ele conseguir materializar a obra conforme concebida no espírito, a
grandeza será muito maior. Então a questão da fraude também é questionável. Uma pessoa
que deveria recebe 1000 e recebe 1500, está de facto a cometer uma imoralidade ao ficar
em silêncio. Mas uma pessoa desfruta de menos louros do que deveria, que recebe 1000
quando na verdade deveria receber 5000 e ainda assim fica em silêncio, do que poderá ser
acusada? Glória insuficiente? Falsa modéstia?

Talvez existam no mundo inúmeros artistas nessa condição. A verdade é que nunca
saberemos, a menos que as pessoas se abram ao público e revelem essas verdades. Mas de
que adiantaria? Vejam por exemplo Van Gogh, as suas obras só começaram a ser
apreciadas postumamente, depois de muito tempo de ele ter partido. Será que ele imaginou
que o mundo teria a sensibilidade para apreciar a grandeza das suas obras? Ou nem ele
mesmo sabia o quão imponentes eram as suas peças? Essa é uma questão com 2 lados.

Do mesmo modo que alguém pode ser subapreciado, também pode ser sobrestimado. Por
exemplo, existem pessoas que caiem nas boas graças do público acidentalmente. Hoje mais
ainda, quando temos o poder do Marketing Digital e as Medias Sociais a realizarem milagres
nas carreiras de pseudo-artistas com pseudo-obras artísticas “dignas de apreciação ao mais
alto nível”. E dum modo geral, o mundo está cada vez menos exigente no que toca a
qualidade do produto. O que dita se uma pessoa é ou não um grande artista, são as
estatísticas. Mas as estatísticas podem ser altamente influenciadas pelos mecanismos
mencionados atrás.

O problema mesmo é a moral das pessoas que controlam essas máquinas de projecção de
marcas. Hoje um artista de sucesso é uma marca. Mas o sucesso pode ter vindo por
necessidade de tornar a marca em algo viral. As pessoas por trás da projecção podem estar

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conscientes de que a marca não tem grande qualidade e peca bastante em aspectos
fundamentais na sua categoria. Mas eles precisam de vender, e vão empregar todos os
meios ao seu alcance para vender.

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