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Introdução

Gonadotrofina coriônica humana (hCG)

A hCG é também conhecida como coriogonadotrofina ou


gonadotrofina placentária. Desde 1927, ficou demonstrado que o
sangue e a urina de mulheres gestantes continham um hormônio que
era capaz de induzir hiperemia ovariana e formação de corpo lúteo.
Acreditava-se, entretanto, que essa substância era produzida na
hipófise da gestante. Foi chamada primeiramente de prolan A, e
somente em 1932 ficou caraterizada a procedência placentária da
substancia, razão pela qual foi dado o nome de gonadotrofina
coriônica humana. Pesquisas realizadas posteriormente utilizando
métodos histoquímicos, imunológicos e microscopia eletrônica
indicaram, de forma definitiva, que a hCG se forma no
sinciciotrofoblasto.

Sabe-se na atualidade, que existe correlação entte maiores


concentrações séricas de hCC e o maior número de células
trofoblásticas, o que ocorre entre 8 e 10 semanas de gestação. As
vilosidades coriônicas são responsáveis pela maior parcela da
produção de hCG e órgãos fetais como fígado, pulmão, ovário,
testículos e, sobretudo, os rins, ainda que em menores quantidades,
também sintetizam o hormônio.

A hCG é uma glicoproteína com peso molecular da ordem de 36.000


a 40.000 dáltons. A parte proteica representa 70% da molécula e a
porção glicídica, os outros 30%. A porção proteica contém 237
aminoácidos distribuídos em duas cadeias (subunidades alfa e beta),
que se ligam de maneira não covalente.

Os hormônios glicoproteicos hipofisários (FSH, LH, TSH) também


são constituídos por subunidades alfa e beta:

 A subunidade alfa desses hormônios tem idêntica estrutura


química àquela apresentada pela hCG.
 A subunidade beta determina as diferenças estruturais e
biológicas entre esses hormônios polipeptídicos.

Estudos mostraram que proteínas híbridas formadas pela associação


da subunidade alfa do TSH com a subunidade beta do LH, por
exemplo, resultavam em hormônio com atividade biológica somente
do LH. Por sua vez, a união da cadeia alfa do LH com a cadeia beta
do TSH dava origem a uma substância que era capaz de estimular a
tireoide. As subunidades isoladas não tem atividade biológica.
Entretanto, quando novamente reunidas, passam a ter a ação da
subunidade beta presente na molécula reconstituída.

A subunidade alfa do hCG e o LH hipofisário, na espécie humana, são


indistinguíveis, e as subunidades beta desses hormônios possuem
extensa identidade. Apenas os 30 últimos aminoácidos presentes na
extremidade carboxílica da subunidade beta são característicos da
hCG, não sendo encontrados em nenhuma outra subunidade de
nenhum outro hormônio.

Graças a essa semelhança estrutural entre as subunidades alfa, a


hCG apresenta reação imunológica cruzada com as subunidades alfa
dos demais hormônios glicoproteicos. A identidade dos anticorpos
produzidos se dá, também, com os hormônios completos (presença
das duas cadeias unidas). Existem soros específicos para a hCG que
contém anticorpos para a subunidade beta desse hormônio. Por
radioimunoensaio, esses soros podem discriminar a hCG do LH
produzido pela hipófise.

As subunidades da hCG, quando separadas não apresentam atividade


biológica intrínseca. Admite-se que a subunidade alfa tem pelo
menos duas funções: proteger o hormônio da depuração rápida e, ao
se associar à subunidade beta, ser capaz de assumir conformação
apropriada para se acoplar ao receptor específico do hormônio.

A hCG é produzida pelas vilosidades coriônicas desde fases muito


precoces da gestação. Nas primeiras semanas, os níveis do hormônio
dobram a cada 1,7 a 2 dias e atingem valores máximos entre 60 e 80
dias de gravidez, quando são detectadas concentrações de 50.000 a
150.000 UI/ mL na urina. Depois, há gradual declínio até
concentrações de 3.000 a 10.000 UI/mL, as quais permanecem
praticamente inalteradas até o termo da gestação. A concentração
sérica atinge de 500.000 a 1.000.000 UI/mL, no seu pico, caindo para
valores de 80.000 a 120.000 UI/mL no termo.

As curvas de concentração de hCG na urina e no plasma materno se


comportam de maneira semelhante às curvas de concentração desse
hormônio placentário no sangue do cordão umbilical, no plasma fetal
e no líquido amniótico. A hCG produzida pelas células trofoblásticas
é quase toda transferida para a circulação materna (90%), e apenas
uma pequena fração (10%) é levada ao feto pela veia umbilical. A
concentração de hCG no sangue do cordão umbilical do feto apenas
l:570- 800 da concentração hormonal observada no sangue materno
na gestação próxima ao termo.

No inicio da gestação, a hCG atua na manutenção morfológica e


funcional do corpo lúteo (função luteotrófica semelhante ao LH
hipofisário). As células luteinizadas do corpo lúteo contém receptores
com alta afinidade para a hCG; o estímulo para a síntese de
progesterona pelo corpo lúteo se faz pelo sistema monofosfato de
adenosina cíclico (AMP cíclico).

Alguns autores defendem que a hCG protege o embrião da rejeição


imunológica materna. ln vitro, a hCG inibe a produção de anticorpos
pelos linfócitos estimulados pela fito-hemaglutinina. Com base
nessas observações e também pela constatação de altas
concentrações de hCG na superfície do trofoblasto voltado para a
decídua, foi sugerido que a hCG desempenharia importante papel
imunossupressor in vivo. Mais estudos precisam ser realizados para
confirmação desse fato.

A hCG tem atividade tireotrófica intrínseca, com apenas 1:4.000 da


potência do TSH humano. Na presença de níveis muito elevados
desse hormônio, como observado na doença trofoblástica
gestacional, essa atividade tireotrófica intrínseca pode ser suficiente
para provocar hipertireoidismo clínico.

A transformação genital inicial do feto masculino, interna e externa,


se faz por ação da testosterona e de seu derivado, a di-
hidrotestosterona. Admite-se que a hCG possa agir na gônada fetal,
sendo importante nessa diferenciação sexual; ela estimularia, a
partir de 7 semanas de gestação, as células de Leydig dos testículos
do feto a produzirem andrógenos na primeira metade da gestação.
Existem também estudos indicando que a esteroidegênese no córtex
da adrenal do feto depende da hCG.

A hCC é, possivelmente, o primeiro sinal da presença de tecido


trofoblástico no organismo materno; sua identificação constitui
ferramenta importante no diagnóstico precoce de gestação. A
pesquisa da subunidade beta por radioimunoensaio é o teste mais
especifico e sensível para tal finalidade, pois tem sensibilidade de 5 a
40 mUl/mL de plasma, com tempo de execução de 1 a 2 horas. Com
esse teste, o diagnóstico de gestação pode ser feito antes mesmo do
atraso menstrual. A sua realização exige material de dosagem
sofisticado, substâncias radioativas e técnicos diferenciados e, por
isso, o teste não está à disposição em todos os laboratórios. Esse
teste é importante ferramenta para o diagnóstico precoce de
gestação em pacientes inférteis, naquelas propensas a abortamento
muito precoce e para o diagnóstico de gravidez ectópica. Essa
técnica se impõe, ainda, para monitorizar as concentrações séricas
do hormônio na doença trofoblástica, sem risco de reação cruzada
com o LH, contribuindo também para a detecção precoce da recidiva
do coriocarcinoma em pacientes tratadas.

Há outros testes que também podem ser utilizados para o


diagnóstico de gestação e se baseiam na inibição da hemaglutinação
pela hCG na urina ou no plasma, em lâmina ou tubo. Esses exames
não discriminam a hCG do LH e, portanto, são menos específicos do
que o radioimunoensaio para a subunidade beta. Esses exames são
de execução mais rápida e têm menor sensibilidade;
consequentemente, os resultados falso-negativos são mais
frequentes. Tomam-se positivos de 16 a 90 dias após a concepção e
são úteis na prática clínica diária, por serem mais baratos e de
execução mais simples. O método por radioimunoensaio é vantajoso
por ser qualitativo e quantitativo, ao passo que os exames baseados
na inibição da hemaglutinação pela hCG apenas fornecem resultados
qualitativos.

Bibliografia

MEDEIROS; NORMAN. Formas moleculares da gonadotrofina


coriônica humana: características, ensaios e uso clínico. Revista
brasileira de ginecologia e obstetrícia, 2006.

ZUGAIB, Marcelo. Zugaib obstetrícia. 3 ed. São Paulo: Manole, 2016.

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