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Introdugao ATOLATICA DO UNIVERSALISMO HOJE EALDIA AAs manchetes dos jornais do mundo esto chelas de palavras cconhecidas: Al Queda, Iraque, Kosovo, Ruanda, gulag, globa- lizagao ¢ terrorismo. Flas Iembram imagens instantaneas aos leitores,eessasimagens foram criadas para nds por nosso ideres politicos e pelos comentaristas do cendrio mundial. ara muitos, ‘9 mundo de hoje € uma luta entre as forgas do bem e do mal. E todos nés desejamos estar do lado do bem, Apesar de eventual- mente debatermos asabedoria de certas politcas para combater ‘omal, tenddemos anio ter dividas de que é preciso combaté-loe com frequéncta, nfo emos nenhusma dala quantoa quem eo {que o encarmam, 26 ‘A retorica dos liferes do mundo pan-europeu sobretudo, mas nfo 6, dos Estados Unidos e a Gra-Bretanha—, da grande imidia e dos intelectuais do esalslmentestdcheia de apelos 20 tuniverslismo como justificatva hisica para suas politica, 10 acontece principalmente quando falam das politiasrelativas aos *outeos" (os paises do mundo no europea populaso dos pases _maispobrese “menos desenvolvidos")-O tom costuma ser mora- lista,itimidadorearrogante,masa polticaésempreapresentada como se refletisse valores ¢ verdades universas. a trés tiposprincipas de apelo a0 universalism. O primeito 0 argumento de que a politica seguida pelos lideres do mundo Ps coisa chamada “democracia" © segundo acompana 0 jargi0 do choque entre civilizagdes, no qual sempre se pressupe que a vilizagio “ocidental”€ superior s “outras” chlizaes porque curopeu defende os “direitos humanos” e promove uma, a Gnica que se baseia nesses valores e verdades universis. Eo terceto € a afirmacio da verdade ciemtifca do mercado, do con- ceito de que “nao hg alternativa" para os governos seo aceitar «age de acondo com as leis da economia neoliberal ‘Quem ler qualquer discurso de George W. Bush ou Tony Blair ros tltimos anos (e mesmo os discursos ce seus antecesores), ‘ou de qualquer um de seus muitos acdlitos, encontrard a telte ragio constante dessestrés temas. Nio se trata, entretanto, de temas novos. Como tentarei demonstra neste livro,naverdade io temas velhissimos, que constituiram a retGrica bisica dos ppoderosos ao longo da histéria do sistema-mundo moderao, A rotirica wo UNivERsstiswo Hoje eM DIA pelo menos dese o século XVI. Hi uma histéria dessa retérica Eh uma histéra da oposiso a ews retdrca, No fundo,o debate sempre girou em torno do que queremos dizer com univer salismo, Tentarei mostrar que 6 universalismo dos poderosos| sempre foi parcial edstorcido, um universiismo que chamo de “niversaismo europeu” por ter sido promovid por lideres € intlectuais pan-europeus na tentativa de defender os interesses do estrato dominante do sistema-mmundo moderno, Além disso, dlscutite como, ao contririo, podemosavangar rumo aum uni versilsmo genuino, que chamo de “universaismo universal” A Tuta entre o universalismo europeu € 0 universalismo universal é lta ideokigica central do mundo contemporiineo ‘o tesultado seré fator importantisimo para determinar como seri estruturadoosistema-mundo futuro, no qualentraremos nos _prximos vine cinco acinquenta anos. Nao podemos deixar de tomar partido, Endo podemos recuar para uma posgdo supra- particularista na qual invocamos a validade equivalente de todas as ideas particulaistas apresentadas no mundo intero. Afinal, ‘© supraparticularismo nfo passa de uma rendigao disfarcada is Forgas do universaismo europet e aos poderosos do momento, que buscam manter 0 seu sistema-mundo nfo democratico € no igualitci, Se qusermos construir uma alternativa real 10 sistema-mundo vigente, teremos de encontrar 0 caminbo para enunciar e insitucionalizar © universlismo universal: um ni versilismo possvel de conseguir, mas que nao se concretzari de modo automitico ou inevitive n Csconcetos dedemacracia ede direitos humanos de superio- dade da eivilizagio ocidental ~ porque baseada em valores € -verdades universais— ede inescapabilidade da submissfo a0 “mer cadlo” slo apresentados como iia evcentes por 6s, Mas elas pniosio nada evidentes,Trata-sede leas complexas que precisam ser analisadas com atengdoe despidas de seus parimettos nocivos «eno esencias para que sejam avaliadas com sabriedace e postas| «a serviso de todos e no de poucos, Compreender como, por {quem e com que objetivo se comegaram a afirmar ess ideias € parte necessiria da tarefa de avalias3o, tarelaparaa qual este livre pretende contribu 1 QUEM TEM © DIREITO DE INTERVIR? (0S VALORES UNIVERSAIS CONTRA A BARBARIE “7A hth AS encom to odemo em do h fande ee i ™economia-mundo capitalist. Na maloria das regices do mundo, BB oo ag mqecieonoricmeani apenas etcibea OU O Tceenceny eee ce jn ee ene eee a an ide etges mate oi an daa ee eau ease gg aR ‘mado de cvilizgdo,crescimentoe desenvolvimento econdmico fou progresso, Todas essas palvras foram interpretadas como oo ‘expresio de valores univers, inerustados no que se costuma sso afirmou-se que ssa expansio nfo -mbistoricamente chamar dele natural. sé fo benéicaparaalhumaniade como també irc. Tinguagem utizada para desreveresaatvkade ora foi teolgjc, ora devivou de uma perspectivaflosfica secular. Felaro queaeaidadesocal do que oorreufsimenosgloriost doque oquadro ane apresentado plas justifcatwvasintelectus 35 ustfcavas fol duramente | dlscrepincia entre a realidae sentia e express de virias maneiras pelos que pagaram 0 preso ‘navida pessoal ecoletiva. Masela também foi notada por diversos intelectusis oriundos dos estratos dominantes. Asim, a hist6ria dosistema-mundo moderno envolveu igualmente um c debate intelectual sobrea moralidade do prépriosistema. Um dos primis e mais interesantes debates acorreu muito cedo, no to da conquista espanhola de boa século XVI, dentro do context parte das Américas. Em 1492, Crstovdo Colombo, depos de longa srdua viagem pelo oceano Atkintico a camino da China, atracou em diversas iIhas do Mar do Caribe, Nao encontrou a China, mas chou algo inesperado que hoje chamamos de Américas Logo outros espa- nhs segiram seus pass, Fm poucas décadas, os conguistadores cspanheis haviam destrudoaestrutura pot Iimpérios d thando varegado de seus seguidores reivindicow aterrac procurou utilizar forcaeimpiedosamenteo trabalho das populagbes ess impériosedo resto das Américas para lcrar com aterrade que dos dois maiores fas Américas, 0 asteca © inca. Imediatamente, um apossaram. Dalia meio sécul, grande parte da populago indigena havin sido aniguilada elas armase pelas doencas. O mimeroexato tem sido tema de debates tanto no século XVI quanto nos anos [p6s-1945. Hoje, amaioria ds especiaistasacredita quese trata de nte grande! Aoi um personagem consagrado da época, Nascido«e 1484, chegou 3s Américasem I5f2eonenouse «em 1510;folo primeito padre a ser ordenaslo no Novo Continent a0 sistema espanhol de exomienda, que A principio, fo fivor ‘envolviaadivsdo(epmimiens) de amerindios como trabalhadores lorgados entee os espanhis queadministravam propriedades ag ‘las, pastoris ou mineitas,e dele partcipou. Mas em 1514 passou por uma "conversfo” espisitual e enunciou asuaparticipasio no iio obra de systema de encamende;evoltou &Espanha para dar su vida: condenae as injustigas causadas pelo sistema Las Casas tentou influenciar a politica espanbolae da Igreja prtiipando de muitascomissoeseescrevendo livtose memoran- os, voquentou os altos citculos,além deser recebidoe, 3s vezes, Javorerido pelo imperador Carlos V (rei Clos Ida Espanta). ve alguns sucessosiniiss para causa queabragou.Em 1597, on dels Gaseceve, 82a eine adelaide si lit devant aopingopobcadaspunbanadpocs, 1943 abe dsc acenuado ds pools ndigenaé iy eens. na ceaimportante de Sherburne, Cocke Woodrow Fon Pir sy Mean te Cane gue prover bt copapa Paulo pubicoua hula Stns Des, na gual determinava que os amerinios no poxeriam ser escravizados es poderiam ser evangelizadospor meiospaiics, Em 1543, Carlos Vdecretou as Lees Nuevas que estabeleciam muito do que Tas Cases propusera paraa América, inclusiveo fim de novasconcesses de eke [No entanto, a bula papal e o decreto real sofreram resisténcia considerivel por parte dos exomendease seus amigos partidtios ‘na Espanha e ma Ipreja, A bula papal eas Lees Nurs aps certo tempo. foram suspensas, Jim 1543, ofereceram a Las Casas o bspado de Cuzco, que cle recusou; depois, aceitou © bispado menor de Chiapas, na Guatemala (hoje localizado no sul do México). Gomo bispo, insist no cumprimentoestrito das Leyes Nes, ordenando que fs confessores impusessem como peniténcia aos encomenders a compensagio dos amerindios, cat sua iberacto das obrigasdes dda enarends De certo mado, essa interpretagio ampliavao de- jue no se aplicava as excomindas concedidas creto de Carlos V. “anteriormente; em 1546, Las Casas abandonou o bispado de Chiapas e voltou 3 Espana. Licenfrentou osesforgos sstemiticos deseusadversiios para ‘efutarseusargumentos em teemos teol6gicoseintelectuas. Um personagem-chave nes crnpreitad ofinGhnesdeSePONE8, O primero liv de Seplveda, Dente prime escrito em 153 ‘eve negado o direito de publcasio, Mas Sepalveda insistiu. Ey sSS Carlos V convocou um ‘init da contovérsitentteSepalvedae Las Casi jr ousia aambossucessvamente mas tudoindicaque auntano chegou a.um veredicto defini, Quando, alguns anos depois, Carlos V foi sucedido no tomo pelo iho Felipe, © ponto de vista de Las Cass pendeu forsa na corte ‘Tudo o quetemos hojesio osclocumentos que os dois debate- doces prepararam paraa discussio. Como esti claro queesses do- ‘camentos fazem uma pergunta fandamental comaqualo mundo sina hoje se preocupa— gg temvSaSRS err guaNO, (Gecomat vale apena cover com atengio seus arguments. Scpvednevcreva ura sega Hiv peiicaments par cove debate: Demir eg, Tra subttalo Da mated vv conto nds, Net Sapusedupresentoxl quatro argumen, i rents em dn das ples do governo espanol, do Bones comocrum interpretadas execute pelos exomendont escntou como embasamento urn longs rie de ctagBex das Woridades intelectuais mais respetadas da época, em especial \teles santo Agostino e santo Tomas de Aquino. yniramente, Sepilveda argumenta que os amerindios 0 os, spr, letrados eno instruids, brats torlmente ese spencer qualquer coisa que ni sj atviade mec elivio vcs, crugisedetal tipo queseaconsethaquesejam pos pr outro. z he Sepia eras ap De jc gr ss a contea ae diving e natural com os quas esta0 manchados, pri. ‘ipalmente idlati costume impio do scrifcio human, A terceira rao 6 que os espanhiéis so obrigados, pea le diving enavural,a limped o mal eas grandes calamidades [qe nos infigiam,¢ “que aquelesquesinda nfo esto soho domino espanhol continuam hojeainigi a grande nimerodepesoasinocentesacrficads sos Holos todos oF anc. A segunda tese diz que + os ndiosdevem acetarojugoespanho mesma que noo quciam, como repifcas2olemind,cmenkevar pun por seus eximes | Bo quarto angumento é que o domino espanhol facia evan _gelizagao cris ao permitr que ospadescatlics preguem "sem, sco sem serem mortos por governantes esacerdotes pages, | como aconteceu tr ou quatro vezes, dase ayers do resume dor arguments Sepaveds eto por Las Cass em Apo Fada er amr de del ley ee pci p68 O rie ¢anitncae jut, como pode ver em ink sid 0 ili coepiads por Angel Loads yar ent ep de Sepals emtém opus pico “Gert contra anos Seats 1) serio natal, 19-9:2)eradcraWolaris os acon Ihuranon 8-6: 3) Berto nocencr de serem saciid. 1-4) propaasto da religion crt. 6€ (p12) 0 indce€ mas eve que @ sumo de as Cars, mem ena 3 mesma cls. ero prlivoexto seeped, prncipsmene bre sds princi tgument, poco serecets 30 este dens opines (Como se pode ver, eses so os quatro arguments bisicos que témsido usados parajusticar todas “intervengdes subsequentes dos “iviizados" do mundo mederno em zona “nao civilizadas” barbie dos outros, o fim de piticas que violam os valores uni- versa, a defesa de inocentes em meio aos crus ea posibilidade de diseminar valores universais. Maselaro que esasintervengies ‘6 poem ser realizadas quando se tem poder politico-miltar para isso, como fo ocas0-na conguista espanhola de prande parte das Américas, no século XVI Por mais que os argumentos tenham servido como forte incentivo moral 20s conquistadores, est claro que foram altamente respaldados pelos beneficios materiais imeaiatos que obtiveram com a conquista Logo, quem esivese inserido na comunidade conquistadorae quiseserefuar tals teses teria antes de enfrentar uma jornada exaustiva. Essa pessoa teria de argumentar tanto conta crengas como contra interes, Foi a essa jormala que Las Casas se dedicou. Ao argumento de que ha pessoas naturalmente hiebaras, Las Casas respondeu de virlas maneiras, Una dela foi observar as _miitiplas formas bastante frouxas com que se usow a palayra “hirbaro’. Las Casas disse que, salguém é defnide comobirbaro porque tem comportamento selvagem, entao podemos encontrar tais pessoas em toxas as partes do mundo. Se alguém é conside rado birbaro porque sua Kinga no € esrita, enti essa ingua poderiaseresritae, ao fazé-lo, descobriremos queela¢ to racio- nal quanto qualquer outa, No entanto, se limitarmos a palavra ‘sirbaro” osignificado de comportamento monstruoso de lito, ppode-se dizer que ese tipo de comportamento é bastante raro ¢ socialmente restringido mais ou menos no mesmo grat em todos os povos. A objesto de Las Casas ao argumento de Sepllveda fia ge neralizsdo a um povo inteiro ou a uma estrututa politica do ‘comportamento que, no maximo, seriade uma minoria—minoria, uj equivalents seriam tofices de encontrar tanto no grupo utodefinid como maiscivilizado quanto no grupo considerado bizharo, Ele lembrou ao leitor que os romanos haviam definido ‘como birburo os ancestrals dos espanhéis. Las Casas propunha ‘© argumento da equivaléncia moral media de todos os sistemas soriaisconhecidos, de modo que ndo havia ierarquia natural entre eles que justificasse o dominio colonial, Seo argumento sobre a arkrie moral era abstrato,o de que ‘os ndos haviam cometido crimes e pecados que deviam ser cor- ‘igidose punidosera multo mas concreto. Nese caso espectco, 4 acusasZo concentravarse na idolatra e no sacrficio humano, ‘Aqui, Las Casas tratava de questdes que despertaram com muita ‘rapide a repugnincia moral dos espanhis do século XVI, que ‘io comsegulam entender como se podia permiti que alguém Fosse id6latra ou realizase sarificios humans, A primeira questio que Las Casa levantou fol a jurisisdo, Destacou, por exemplo, que os udeuse mugulmanosque vivian ‘emterra cists podiam ser obrigados aobedecerisleis do Estado, as Gas op disp 14 _mas no podiam ser punidos por seguir seus proprios preceitos religisos. Essa seria uma verdade aft caso os judeus ou mu- jrulmanos vivessem em terras que niofossem govermadas por um ‘cristo. Esse tipo de jurisdigzo 6 poderia ser exerci, deferdia le, sobre um herege cristo, porque o herege era alguém que havia violado o voto solene de obedecer & doutrina da Igreja Se «4 Tpteja nao tinha jurisiigdo sobre os no crstdos que habitavam terras crisis, seria portanto ainda menos sensato argumentar {que a Igrejatinka juisdigio sobre os que nunca haviamn ouvide falar de sua doutrina. Consequentemente, aidoateia poderia ser Julgada por Deus, mas naoestavasujetad jurisdigio de um grupo ‘humano externo a0 grupo que a praticava B claro que hoje considerariamos o argumento de Las Casas «como defesa do relativismo moral ou, pelo menos, do rlativismo legal. Naquela época, porém, assim como hoje ele estavasujeto 3 acusacio de que esse ponto de vista demonstrava indferengs pelo sofrimento de inocemtes, vtimas de priticas contri let natural. Fssaeraa tercera tese de Sepiilveda,€a mais forte Las ‘Casas tratou-a com prucénci Em primero lugar, insist que & ‘obrigacto de lbertarinocentes |. ndo existe quando hi alguém mals adequado para liberté-los". Em segundo lugar, dise que, sea Tgrejaconfiara a um soberano cristo a tarefa de ibertar 0s Inocentes, “outros no deveriam agir ness caso, muito menos |hvé-lo com petulinca": Mas finalmente,e mab 38 +o uNivensatiswo eunorey Embora dmitamos que grea tem obrigaso de impedir a morte injusta de inocentes,¢ssencilque iso sea Feito com moderasio, Ihave cuidado para que nose faga um mal maior a outros povas, ‘que seria um impediment asus alco e tornariainfeuterae incomypreendia a paixio de Cristo? Esse era um ponto fundamental para Las Caras ele oilustrou ‘com a questio moralmente complicada dos eituais em que se ‘comiam corpos chacinados de criangas, Comesou observando {que mio era costume de todos os grupos indigenas em eram muita as criangas sacrfcadas naqueles grupos que se dedicavam essa pica, Mas iso tera sido Fie & questo se Las Casas no enfrentasse a realidade de uma eseolha. E aqui ele defendew o principio do mal menor Aléma so, um mlincomparavelmente menor que mottam pou ‘on inocentesdo que o nfs blsferem contrac nome adorvel de Crito,eque a relgiocsta sea difamadac detest por ves poses -equttos que dela saibam, quando ouvem dizer que muita vans, sos emulberes desuaraga foram mortessem motivo pelos criss, como part logue acontee na ira da guerra como ocoreeu* Las Casas fotimplacivel contrao que hojechamariamos de “dan colateral"E pecado que merece a danagao eterna fer e mata “Inocentes para punir os culpados, pois sso €contrario a justiga™ a er, p17 ie, 9.29 E apresentou uma razao final pela qual nao seria lito que 0s cspanhéis nis os indi plo pecados que estes poseriam cometer contra inocentes, "a grande esperana presunso de quetasini serio convertidose origin seuserts||iahe] ‘nfo cometem tas pecados obstinadamente, mas com certe |] «em virtude desu ignordncia de Deus" E Las Cass terminoU dlscussio com uma peroragio: (0s spans penetaram, certamente com muita audi, nessa parte nova do mundo, da qual nunca haviam ouvido falar nos séculos anteriores. ena qual, contra avontade de seu solberano,cO- -meteram crimes monstrucsoseexteaordinsros. Mataram milhares de homens, queimarat sus lds, tomaram seu gad, dest ram suas eidads ecometeram crimes aborinives sem desculpa demonstrvel nem especifc,¢com monstruoss crusade contra teva pobre gente. Pde-severdidetamente dizer que homens 0 sanguindrios,rpaces crutis eweiiosos conbecem Deus cuja dorasioexortam os nds” -Aresposta esa perguntalevou diretamente iquela dal por Las Casas ao timo argument de Sepulveda faciltaraevange- Lizagae (Os homens s6 podem ser levados a Cristo por bvre wons ‘adenine por c68580) Las Cass admit que Sepilveda ex a ‘mesma afrmativa, mas perpuntou sea polities que Sepveda justicavaeram compativeis com 0 conceito de livre arbitra + ie p25 idem, p.256 P = 2 0 (Que coagiomair pode haverdo que aquelamposts por uma orga armada que ave fogo com arabuzese hombres, cujo hotel ‘amor, ainda que nto tenba nenhum outro efit, dea todos sem flego, poe mais fortes que sejams ainda mas aqueles que nde ‘ém conecimento dessas armas ndosabem coma funcionamn? Se ‘os potes de barroexplodem com o bombardcio, <0 chia teme,e.0 use nblacom pores grows, secs lhe osjovensess mulheres caem eascabunasstodestruids,e tudo parece absladopeairia de Belona, nda demos vendateirsmente que forgestsedo uaa pars arto acta af" as Casas acreditava que a guerra nio era um mein de preparar as almas para suprimir aidolatria.“O evangelho ndo 6 espalhade com langas, massim coma palavra de Deus, com uma vida crst ‘eaagio darazio", A guerra “engendra édio,e nfo amor, a nossa, religito |] Os indios devem ser tazides a f€ com dogura, com ‘aridade, com a vida santa a palavra de Deus™, Se consagrei tanto tempo a explicar os argumentos dos dois te6logos do século XVI. € porque nada se disse desde eno que acrescentasse algo essencial ao debate, No século NIX, as potén- cas europeiasproclamaram que tinham uma missocivilizadora ‘no mundo colonial”. Lorde Curzon, vie-rei da india, exprimiu dem, 298, dem p30. dem 360 Harald PscherTinée Michal Mann (ors) Cain a Cig Main Cal gy Bn, them esse ponto de vista ideoldgico num discurso que fer no Clube Byculla em Bombsim (atual Mumbai),em 16denovembro de 1905, para um grupo compost principalmente de administra- ores coloniais britinicos: [o propesto do impéro| é lta plo dreit, retro impereto, fo injusto co cruel, no pendr nem para a mio dirita nem para ‘s esquerda, no culdar por lsonjs nem aplausox nem Shs nem fens) mas im recordar que o Tado-Poderoso ps vosa mio Jina umm powco mais ‘no maior dos Seusaados [pata levar al 4 frente em vosso tempo, sentir ue em algum lugar, em meio “ages milhdes, deiastes urn pouco de justiga ou felicidad ou prospeidade, uma sensagio de hombridade ou dignidade moral, ‘uma fnte de patriots umaaurora de exlarecimento intelectual fou umainctagda uo dever onde tes no exist, Iso basta ast a justiicaiva do homem ings nani" em para povoiniano do que preci ode Curzon acs dinstradores colonia com quem avs, os aceores de Cargo dveram edetar ala menos de meosculo dep, on IA Ter xinglses de Curzon no tena decd ui, fide ou prosperiade sucientes. Ou tlvertenbamestims- lado hombridade, digndade morale patriot demais— este Gran “Tiere pon th Patho renee Jeg of Mora and Mater Progress fda ~ An ntaucony Ey” em HataldFocher-Ting eMishae Mann (or)-0P- ct P25 2 ‘limo em prol do pais erzado. Ou talver o esclarecimento inte Jetual que os administradores colons britanicos promaverar permitiu que os colegasdle Jawaharlal Nehru irassem conclusdes Aerentesa respeito dos méritosdo dominio britinico. Outalvez, azo mais esmagadora de todas,o povoindlanoconcordassecom ‘0 famoso gracejo de Mahatma Gandhi em resposta perguntade ‘um reporter: ~ Sr Gandhi 0 qu acha da cuilizaso ocidental? ~ Ach gue sera sma boa iis respondeu Gandbi ‘A segunda metade do século XX fo um periodo de desco- lonizagioem mass pelo mundo fora. A causaea consequéncia imediatas dessa descolonicao foram umamudanga importante na dindmicado poder no sstemainteestades, como resultado do alto prau de organizagio dos movimentos de libertagd0 nacional Uma a uma, em efeito cascata, as antgascoldnias tomaram-se Estados independentes, membros das Nagas Unidis, protepdos pela doutrina de no imtervengio de Esta- dos soberanos nos assuntosinternos uns dos outros ~doutrina entranhada tanto na lel internacional em evolusso quanto no Etatuto das Najes Unidas Em teois, sso deveriasigniicaro fim da iterferénca, Mas 6 pr que no foto que ocoreu.£verdade que no avia maisa fostticaiva da evangelzasi crit para.o controle imperial leg timo nem aguela do conecito mais neutro, em termos religiosos «da misao ciiliadora das poténcias colonia. lingvagem reti- ‘ica passou entio a um conceito que veio a ter nove significado « forsa na época pis-colonial:osdfeitos humanos. Em 1948, as "Nagdes Unidaserigiram, como seu eio ideoldgico, a Declarasao Universal dos Diteitos Humanos, atifeada por quase todos osseus ‘membros sta no constitui uma ll internacional, mas encarna ‘uma série de ideas com os quis, em prineipio, as nagdes da ONU se comprometem. Nao € preciso dizer que, desde entio, tem havido atos repet dos, eneralizados enotGrios que violam a Declarago, Como a ‘maioria dos governos baseou sua politica externa em uma visio dita realista das relagdes entre Estados, no houve quase nenbiu- rma ago intergovernamental que se possa dizer que refit essa preocupagio com os diteitos humanos, embora a violagio da Declaragdo tena sido regularmenteinvocada como propaganda de um governo para condenar outro. ‘A inenisténcia na priticada preocupacio intergovernamental com asquestdes dos direitos humanos levou a criagdo de muitas ‘organizagdes dita ndo governamentais (ONGs) para preencher a lacuna, As ONGs que asumtiram o facdo da ago direta de defesa dos direitos humanos mundo afora eram de dois tipos prinipas. De umlado, havi tipo representado pela Anita Internacional, {gue se especializou em divulgar prsbes de individuos conside radasilegtimase violentas, Buscava mobilizar a opinito piblica internacional, deforma direta por meio de outros governos para provocar mudangas da politica dos governos acusados.E de outro lado, havia o tipo representado pelos Médicos Sem Fronteras, que buscava levar asistencia humanitétia a zonas 4e conflita politico sem aceitar 0 manto da neutralidade que hi ‘muito tempo tem sido o principal escudo estratégico da Cruz Vermelha Imernacional sa atividace mio governamental tingly certo graude sucesso «6 como consequénca, dsseminou-se, principalmente a pattie dda década de 1970, Além disso, ese avango em favor dos dircitos hhumanos recebeu o apoio de algumas aividades novas de nivel Intergovernamental. Em 1975, o8 Estados Unidos, a Unio Sovig- tica, o Canadie a maior parte dos paises europeus reuniram-se ‘na Conferencia sobre Segurangae Cooperacio na Europa (SCE) teassinaram os Acordos de Helsingue, que obrigava todos os Es tadossignatiris a obedecer & Declaragio Universal dos Direitos Humanos. Noentanto,como nesseacordo nao havia mecanismo punitvo,criou-se uma estrutura ocidental nio governamental, «Helsinki Watch, para assumir atatefa de pressionar os governos dobloco sovitica para que respeitassem esses dieito, ‘Quando se tornou presidente dos Estados Unidos, em 1977, Jimmy Carter afirmou que a promosso dos direitos humanos seria ponto central desua conduta politcaeampliou o conceito para além de sua aplicasao no bloco soviéico (onde, em termos _geopaliticos,os Estados Unidos tinham pouca possbilidade de cexercer 0 poder), para os regimes autoritciose repressores da América Central (onde, em termes geopoliticos, s Estados Uni- dos tinham possibildade considerivel de exercer © poder). Mas politica de Carter nfo durou muito, Qualquer que tenha sido seu impacto na América Cental ela foi praticamente revogada durante 0 governo seguinte, de Ronald Reagan, esse mesmo periodo, houve teés importantes intervenses diretas na Africa e na Asia, onde um governo atacout 0 outro com base no argumento de que 0 pas atacadoviolava os valo- res humanitirios. Frimeiro, em 1976, um grupo guerrllheiro palestino sequestrou tum avigo da Air France com israclenses a bordo elevouo para Uganda, com a anuéneia ea cumplicidade slo governo ugandense, Os sequestradoresexigiram alibertas30 de determinados palestinos presos em Israel em troca daliberta- ‘lo dos rféns israelenses. Em 14 de julho de 1976, uma unidade de operasdes especais de Israel voou até 0 aeroporto de Entebe, ‘matou alguns guardas ugandenses ¢ resgatou os israclenses. Segundo, em 25 de dezembro de 1978, soldados vietnamitas atravessaram a fronteira do Camboja, derrubaram o regime do Khmer Vermelho e instalaram outro governo. Eterceiro, em outubro de 1978, Idi Amin atacou a Tanzania, que contra-atacou « cujos soldados alcangaram a capital ugandense e derrubaram Idi Amin, instalando outro presidente (© que hideigual nesses tréscasos que ajusificativa, do ponto de vista dos interventores, eram os direitos humanos:impedir a _manutenso de reféns no primero caso e derrubar regimes ex- ‘tremamente cruéis edtatoriais nos outros dis. claro que, em «ada caso, podemos dscutir solide ¢ a veracidade da acusagao ‘até que ponto no exstiria alternativa mais legalista ou paciica Também podemos discutir as consequéncias de cada um desses 7 stos, Masa questdo é que 0s interventoresafirmavam e acredi- tavam estar agindo de modo a maximizar a justgae, portanto, cstavam moralmente justlcados segundo a lei natural, ainda {que no tivessem justiicativa legal diante da lel internacional Além disso, todos os interventores buscaram receber, e de fato receheram, aprovagio considerivel no sé de suas pripeiascomt- nades como de outras no sistema-mundo, com base naidia de {quesomenteomeioviolentoutlizado e aria omalevidente {que airmavam estar ocotrendo, (©-que vimos foi uma inversio histrica da teorizasao sobre 0s cbdigos moras ejuridicos do sistema-mundo. Por um longo periodo, mais ou menos do século XVI até primeira metade de século XX, predominou a doutrina de Sepilveda~alegivimidade dla violencia contra os hirbaros o dever moral de evangelizar «eas objegdes de Las Casas constitufam uma posigdo claramente 'minoritaria. A partir dat, com as grandes revoluGes anticoloniais sdemeados doséculo XX eem especial no periodo de 1945.4 1970,0 Aireito moral dos povos oprimidos de recusar a supervise patce- nasa dos povos quese diziam cvilizadospasou ater leghimidade ainda maior nas estruturas politicas mundi Talvec o auge da institucionalizagio coletiva desse novo principio tenha sido a adogio pela ONU, em 1960, da Declarasio ‘de Concessio da Independéncia aos Paes e Povos Colonia, a- unto que fora totalmente escamoteado no Estatuto das Nacoes Unidas, escrito apenas quinze anos antes, Paecia finalmente que {as ass tera suas opines adotadas pela comunidade mundial, Mas, assim que a validasao do ponto de vista de Las Casas se tornou doutrina oficial, a nova énfase nos direitos humans dos inivduos dos grupos tornou-se tema de dstague na poltica ‘mundial eiso comesoua minaro direto de rejetarasupervisio paternalista. Em esséncia, a campanha pelos direitos humanos restaurou a énfase de Sepilveda no dever dos civilizados de su- primira barbie Foinesse momento que o mundo assist ao colapsoda Unido Soviticae& derrubada de governos comunistasem todaa Europa fetal e central, Ainda era possvel acreditar que esses acon ‘ecimentos se encaixavamn no esprito da declaragio das NasSes Unidas sobreo diretoaindependéncia, No entanto,asubsequente livisio da lugoslivia entre as replicas quea constitufam levou a Lumasérie de guerras,ou quae guerras, nas quaisalutapelainde- pendéncia se vinculava a politica de *purificasao étnica", Havia n aantiga Replica muito tempo, as repablicas que const ig Rep Federal Socialista da lugoslivia mestravam clara énfase étnica, mas todas também tinham minorias nacionais importantes Assim, quando se dvr em Estados separa, proceso que urou alguns anos, houve presio politica interna considerivel, ‘em cada uma dela, para reduzir ou remover por completo as rminorias étnico-nacionaisdos novos Estados soberanos. Iso levou! aconllitose guerras em quatro das antiga repOblicas iugoslavas Crofcia, Bosnia, Sérvia © MacedOnia. A histria de cada uma foi muito diferente, assim como seu resultado, Mas em todas pu rifcago €tica tornou-se questo fundamental 6 Ocontinuoatto devil, queinclietupremas rede cs lnouaspalosinenengiocaidenlpacmeaons ‘aoe ani unpaéncadeguanimidde plea ca eno asimse argument. Eas inervenydoocereusebte, ‘opeimentema Bina (onde hava trv etnas nar oe ren semana dene) «no Koo (gi dav om gr epuls2lbans), Quando oegovernorocilenasber nag Sates es ONCs dese pus preionntamsistnadane on sew Exadsaimterit efoto que fnaimeme esse For vires, apres no governamental fa ul forte Fang, ond um grup de iniecasFundou wo ean mundo todo. claro que os prodtores em reagido na arena politica contra dl tributos sobre os produtores ‘esse aumento de ustos, buscando reduziro custo damio de obra, resistindo &internalizacao do custo de producao e diminuindo a carga tnbutisis,E nisso que comsiste o movimento “neoliberal” dos tiny vintee cinco anos: uma tentativa de reverter os custos crescentes, As eamadas capitaistastiveram sucess periiicos € ‘epetdos nese tipo de contra ofensiva. Masa redusfo dos custos sempre foi menor do que seu aumento no periodo anterior, de modo que a curva geral €ascendente, Maso que crise estrutural dasistema-mundo tema ver com as estruturas de saber, os sistemas universitiios do mundo ¢ ‘6 universalismo clentiico? Tudo! As estruturas de saber nao ‘stdo divorciadss do funcionamento bisico do sistema-mundo ‘moderno, Sio elemento essencial do funcionamento e da legitimacdo das estruturas politcas, econdmicas e socials do sistema, As estruturas do saher desenvolveram-se historica- mente em formas ites manutengae do nossa sstema-mundo ‘vigente, Examinaremos tésaspectos das estruturas do saber no sSstema-mundo moderno: o sistema universitirio moderno, 2 linha divisriaepistemoldgica entre as chamadas duas culturas «papel especial das cigncias socias. Todos os ts se constr ram, em exsénci, no século XIX, E todos o tes est¥o hoje em dlesalinho como consequéncia da crise estrutural do sistema- mundo moderno, Falamos muitas vezes da universidade como insttuigto de- senvolvida na Europa ocidental durante a Idade Média, E uma linda histria e nos permite usar roupas bonitas nas ceriménias Masso na verdad & wm mito, A universdade aropeia medieval, insti cereal d grej Cte, basen mente desapareceu com 0 surpimento do stema-mundo mo- dermo:Do século XVtao XVI sobreviveu apenas o nome, que ela estva pratcamente morbunds durante ese prio, Com certezanio ea o las ental da produsio nem da reprodugio deconhecimentonaguela pce E posse datar de meados do sculo NIX o esurgimgento & 2 trnsformasao da universidade,emborao comeso dese pro- eso sea do final do séclo XVI As caractersticas principals

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