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As Confissões da Carne
Relógio D’Água Editores
Rua Sylvio Rebelo, n.° 15
1000-282 Lisboa
tel.: 218 474 450
relogiodagua@relogiodagua.pt
www.relogiodagua.pt
ISBN 978-989-641-902-8
História da Sexualidade IV
As Confissões da Carne
Edição estabelecida por
Frédéric Gros
Tradução de
Miguel Serras Pereira
Antropos
Advertência1
dos aphrodisia (sob o título O Uso dos Prazeres). Cf., sobre a história deste texto,
a nossa notícia comum relativa a L'usage des plaisirs e Le souci de soi na edição
da “Bibliothèque de la Pléiade”, in M. Foucault, CEuvres, t. II, pp. 1529-1542.
24 Subjectivité et vêrité, edição de F. Gros, Paris, Gallimard, Le Seuil, “Hautes
Études”,2014.
25 Malfaire, dire vrai. Fonction de l’aveu en justice, edição de F. Brion e B. Har-
court, Lovaina, Presses universitaires de Louvain, 2012.
26 Dire vrai sur soi-même, edição de H.-P. Fruchaud e D. Lorenzini, Paris, Vrin, 2017.
27 Texto [“Les techniques de soi” (N. T.)] retomado em Dits et écrits, edição de D.
Defert e F. Ewald, Paris, Gallimard, 1994, n.° 263. O mesmo se passa ainda cerca
de seis meses mais tarde com a conferência sobre “A Cultura de Si” na Univer
sidade da Califórnia de Berkeley, em Abril de 1983 (La Culture de soi, ed. H.-P.
Fruchaud e D. Lorenzini, Paris, Vrin, 2015).
As Confissões da Carne 13
H?; 28 L’herméneutique du sujet, ed. F. Gros, Paris, Gallimard, Le Seuil, “Hautes Etu-
t "des”, 2001.
E:' 29 No dossier conservado por Pierre Nora, que contém a versão dactilografada ori-
11 ’A gmal das edições Gallimard, há uma etiqueta colada dizendo: “Outubro de 1982.”
, - 30 Le Gouvemement de soi et des autres, ed. F. Gros, Paris, Gallimard, Le Seuil,
“Hautes Études”, 2008; Le Courage de la vérité, ed. F. Gros, Paris, Gallimard, Le
Seuil, “Hautes Études”, 2009. Cf. também a série das lições dadas em Berkeley
& (Universidade da Califórnia) no Outono de 1983 sobre a parrêsia: Discours et
vérité (ed. H.-P. Fruchaud e D. Lorenzini, Paris, Vrin,2016).
14 Advertência
tido da citação, ou, mais classicamente, com três pontos [...], indicando passagens
voluntariamente excluídas.
35 No entanto, quando as menções de nota correspondem a proposições demasia
do gerais para ser possível determinar o seu conteúdo, indicámos simplesmente:
[Nota vazia].
,36 Não acrescentámos, todavia, as traduções quando o texto de Foucault fornecia
indicações suficientes para a compreensão da frase.
37 Quanto aos títulos, optámos pela sobriedade descritiva, excepto talvez no que
i se refere ao capítulo “A libidinização do sexo” — mas é o próprio Foucault quem
fala, no corpo do texto, de “libidinização do acto sexual”. Quanto às subdivisões,
conservámos as presentes no manuscrito. Os títulos “O baptismo laborioso” e “A
’.arte das artes” são de Foucault. Encontram-se num projecto de plano (caixa XC,
segunda folha da pasta 1).
38 Encontramo-las principalmente agrupadas nas caixas XXI, XXII e XXIV.
Venfica-se de cada vez, e para o conjunto dos Padres da Igreja, a consideração de
s uma literatura crítica importante, mas também o regresso sistemático aos textos
jí de origem (as mais das vezes ou presentes na colecção “Sources chrétiennes” das
■ Éditions du Cerf, ou directamente na Patrologie, grega ou latina, de J.-P. Migne).
39 Cf. as suas notáveis edições de: Le Gouvernement des Vivants, La Volonté de
: savoir, “Omnes et singulatim. Vers une critique de la pensée politique”,4®ê^@iB-
^bat'dé'lá'chasteté’’.
a 40 P. Chevalier, Michel Foucault et le christianisme,Lyon, ENS Éditions, 2011.
16 Advertência
FRÉDÉRIC GROS
I. CRIAÇÃO, PROCRIAÇÃO
[II. O BAPTISMO LABORIOSO]
[III. A SEGUNDA PENITÊNCIA]
[IV. A ARTE DAS ARTES]
I
CRIAÇÃO, PROCRIAÇÃO
nem por isso devemos deixar de ver, nestas leis da existência quoti
diana, um ensinamento do próprio Logos', devemos, na conduta que
se lhes submete, reconhecer a acção recta que conduz à vida eter
na, e devemos, nessas acções rectas em conformidade com o Logos,
reconhecer uma vontade unida a Deus e a Cristo.
Estas palavras que Clemente utiliza no momento em que vai
apresentar as suas regras de vida são muito significativas. Indi
cam claramente o duplo registo a que devemos reportá-las: segun
do o vocabulário estoico, estas regras de vida definem com efeito
condutas convenientes (kathêkonta), mas também acções racio
nalmente fundamentadas nas quais o homem que as cumpre se
reúne à razão universal (katorthômatag, e, segundo a temática
cristã, definem não só os preceitos negativos que permitem ser-se
acolhido na comunidade, mas a forma de existência que conduz à
vida eterna e constitui a fé13. Em suma, o que Clemente propõe
nos ensinamentos de O Pedagogo é um corpus prescritivo em que
o nível das “conveniências” não é mais do que a face visível da
vida virtuosa, a qual é por seu turno caminho para a salvação. A
omnipresença do Logos, que comanda as acções convenientes,
manifesta a recta razão e salva as almas unindo-as a Deus, asse
gura a solidariedade dos três níveis14. Os livros “práticos” de O
Pedagogo que se abrem imediatamente a seguir a esta passagem
pululam de precauções minuciosas cujo carácter de pura e sim
ples conveniência pode surpreender. Mas é necessário recolocá-
-los na intenção global a que pertencem, e o detalhe dos ka-
thêkonta, em que parecem extraviar-se com frequência as reco
19 Demócrito e Heraclito são citados urna vez; Crísipo sob o nome dos “estoicos” em
geral. Platão é-o mais vezes, não contando aqui com as numerosas citações implícitas.
20 Sobre a distinção dos dois ensinos: CLEMENTE DE ALEXANDRIA, O Peda
gogo, I, vii, 60,2. Sobre a sua continuidade, ibid., I, x, 95,1, e sobretudo I, xi, 96,
3 (“Era por intermédio de Moisés que o Logos era Pedagogo”) e 97, 1.
As Confissões da Carne 29
< diência a estas diferentes lições pode dar à relação conjugal pro-
", criadora o valor de urna “sinergia” com Deus.
Podemos compreender melhor a distinção aparentemente um
pouco arbitrária que Clemente introduz entre o facto da progeni
tura que deve ser o “alvo” das relações sexuais e o valor da des-
cendéncia que deve ser o seu “fim”. Este constitui bem um acaba
mento — teleiotês — para o procriador, como os estoicos diziam:
procriador leva aqui a cabo aquilo para que a natureza o fez e
®|que o liga, através do tempo, aos outros homens e à ordem do
‘. mundo. Mas esta “bela descendência”, que com a ajuda de Deus o
.. homem fez nascer, Clemente mostra que ela constitui para Deus
.. .um objecto digno de amor e uma ocasião de manifestar a sua bon-
|||dade. Subordinadas ao “alvo” da “fabricação de filhos”, e depois,
além disso, a uma finalidade que se une à da Criação inteira, as
relações sexuais devem submeter-se a uma “razão”, a um Logos,
que, presente na natureza inteira e até mesmo na sua organização
material, é também a palavra de Deus. Colocadas à cabeça da sua
^ãhálise, a distinção e a articulação entre alvo e finalidade permi
tem a Clemente inscrever solidamente a regra das relações sexuais
iynuma grande “lição da natureza”: “Devemos atender à escola da
¿'¡natureza e observar os sábios preceitos da sua pedagogia para o
‘jí^tempo oportuno da união.”54 Lição da natureza que está no próprio
i,,; ensinamento do Logos. “Lógica”, poderiamos dizer, de uma natu-
reza que deve ser entendida num sentido muito amplo, e sob os
p 1 seus diferentes aspectos: “lógica” da natureza animal, “lógica” da
. natureza humana, e da relação da alma racional com o corpo, “ló-
¿!gica” da Criação e da relação com o Criador. São estas três lógicas
que Clemente, sucessivamente, desenvolve.
54 Ibid., II, x, 95, 3. Este tema da natureza “ensinante”'é um tema estóico. Cf.
por exemplo HIÉROCLES: “dikaia de didaskalos hê phusis” (ESTOBEU, Flo-
j i rilegium, ed. Meineke, p, 8). Mas é visível o deslocamento do sentido efectuado
por Clemente.
42 Michel Foucault
55 Por várias vezes, Clemente indica que lhe acontece falar por meio de exemplos
negativos: O Pedagogo, I, i, 2,2, e I, iii, 9,1.
56 [Cf. infra, n. 64, p. 44. Foucault anota: IV, 192, sem que saibamos a que cor
responderá isso.]
57 Esta crença, referida por ARQUELAU, teria sido extraída do PSEUDO-
-DEMÓCRITO (Geoponica, XIX, 4; cf. OVÍDIO, Metamorfoses, XV, 408-410).
58 ELIANO, Natura animalium, 1,25.
As Confissões da Carne 43
truos são bem, com efeito, uma substância impura83. Mas, além
disso, como dizia o médico Sorano, “a semente é diluída no sangue
e, rejeitada por ele”84. Arrasta pois consigo a semente que nele se
mistura, arrancando-a assim ao seu alvo que é a matriz, e ao seu
fim que é a procriação. Uma vez que a semente constitui para “as
razões da natureza” um receptáculo material e uma vez que detém
ás forças que, desenvolvidas segundo a sua ordem racional, darão
origem a um ser humano, não merece nem ser exposta ao contacto
das impurezas, nem ser destinada a uma expulsão brutal.
c. A interdição das relações durante a gravidez constitui a recí
proca do princípio anterior. Porque, se devemos preservar a semen
te de toda a evacuação impura, do mesmo modo devemos proteger
a matriz depois de esta ter acolhido a semente e iniciado o seu
trabalho. Devemos respeitar o ritmo espontâneo que Clemente evo
ca como se segue: vazia, a matriz deseja procriar, procura acolher
a semente e a cópula não pode então ser considerada como uma
falta, uma vez que corresponde a esse desejo legítimo85. Aqui, uma
vez mais, Clemente ecoa um ensinamento médico perfeitamente
corrente: “nem todo o momento é favorável à semente projectada no
útero pelas aproximações sexuais”, é no momento em que cessa o
escoamento menstruai e em que a matriz se encontra vazia que “as
mulheres são impelidas ao acto venéreo e o desejam”86. Esta alter
nância nas disposições do corpo mostra bem, segundo Clemente, a
razão que preside à sua natureza, e define os justos limites de uma
conduta temperante. Mas O Pedagogo desloca a significação deste
ritmo e da regra de temperança que dele se deriva. Os médicos
desaconselhavam durante a gravidez as relações sexuais “porque
87 Ibid.
88 CLEMENTE DE ALEXANDRIA, O Pedagogo, II, x, 93, 1. A frase remete
explicitamente para os primeiros capítulos sobre a cooperação entre a criatura e o
Criador no nascimento dos homens.
89 DEMÓCRITO, Fragmento B 32, ed. H. Diels.
90 GALENO, Comentário das Epidemias de Hipócrates,III,3,em que cita Demó
crito; cf. também De utilitate partiam, XIV, 10.
91 RUFO DE ÉFESO, CEuvres, ed. Daremberg, p. 370.
As Confissões da Carne 53
97 II, x, 100,1.
98 Lucas, 20,27-37.
> • As Confissões da Carne 57
109 Sobretudo a partir de 34,3 (O Pedagogo, I, vi), onde comenta a Primeira Epís
tola aos Corintios, 3,2: “Dei-vos leite, e não alimento sólido.”
110 “Sungeneia dia to haiina [...]. Sumpatheia dia tên anatrophên”, CLEMENTE
DE ALEXANDRIA, O Pedagogo, I, vi, 49,4.
i As Confissões da Carne 61
importou para o seu cristianismo uma moral que lhe fosse estra
nha. Sobre um código já formado, constituiu um pensamento e
uma moral cristãos das relações sexuais, mostrando assim que não
havia mais do que uma possível, e portanto que seria inteiramente
abusivo imaginar que foi “o” cristianismo que, por si mesmo e
pela força das suas exigências internas, impôs necessariamente
esse estranho e singular conjunto de práticas, de notações e de
regras a que se dá o nome de “a” moral sexual cristã.
E que, seja como for, esta análise de Clemente mantém-se mui
to distante dos temas que se encontrarão mais tarde em Santo
Agostinho e que, esses, terão um papel muito mais determinante
na cristalização “daquela” moral. Entre Clemente e Agostinho, há
evidentemente toda a diferença entre um cristianismo helenizante,
estoicizante, inclinado a “naturalizar ” a ética das relações sexuais,
e um cristianismo mais austero, mais pessimista, que não pensa a
natureza humana senão através da queda, e afecta por conseguinte
as relações sexuais de um índice negativo. Mas não nos podemos
limitar à constatação desta diferença. E, sobretudo, não é em ter
mos de “severidade”, de austeridade, de maior rigor no interdito,
que podemos avaliar a mudança que se produziu. Porque, se con
siderarmos somente o código propriamente dito e o sistema dos
interditos, a moral de Clemente não é mais “tolerante” daquilo que
se lhe seguirá: o kairos que legitima o acto sexual exclusivamente
no casamento, em vista exclusivamente da fecundação, nunca du
rante as regras ou a gravidez, e nunca noutro momento do dia ex
ceptuada a noite, não lhe abre vastas possibilidades111. E, de todas
as maneiras, as grandes linhas divisórias entre o permitido e o
proibido continuaram, no essencial e nas suas linhas gerais, a ser
as mesmas entre o século neo século v112. Em contrapartida, no
113 [Passagem rasurada por Foucault na versão dactilografada: “Em breve o es
quema do código, da repressão e da interiorização dos interditos deixa de ser capaz
de dar conta desses processos que permitem precisamente aos códigos tomarem-se
condutas ou às condutas delinear códigos — a saber, os processos de ‘subjectiva-
ção’. A carne é um modo de subjectivação.”]
[II]
[O BAPTISMO LABORIOSO]
119 JUSTINO, Primeira Apologia, 61. É de notar que este segundo nascimento é
descrito através do vocabulário que caracteriza o acto virtuoso e a sabedoria.
120 IRENEU, Adversas haereses, IV, 33,4.
121 HERMAS, O Pastor, Similitude IX, 16,3-5.
122 JUSTINO, Primeira Apologia, 61.
123 Didakhê, I-IV. Sobre o conteúdo e a forma desta catequese, ao longo do sécu
lo ii, cf. A. TURCK, Évangélisation et catéchèse aux deux premiers siècles, Paris,
1962.
124 [JUSTINO, Primeira Apologia, 61,2.]
.' As Confissões da Carne 67
As Confissões da Carne 75
144/Wd.,VI,9.
145 “Ceterum ratio ejus, quam cognito Domino discimus, certam formam tenet”
[“De resto, a regra da penitência que conhecemos ao mesmo tempo que o Senhor,
está submetida a fórmulas certas”, trad. E.-A. de Genoude], ibid., II.
146ZWd.,VII.
147 Ibid., II.
As Confissões da Carne 77
148 Ibid.
149 [TERTULIANO, De baptismo, X, 6.]
150 TERTULIANO, De paenitentia, VI.
151 TERTULIANO, De baptismo, XX, 1.
78 Michel Foucault
As Confissões da Carne 79
s'
•' Estas análises de Tertuliano não são nem isoladas nem premo
nitórias, ainda que tenham uma tonalidade diferente das do seu
contemporâneo Clemente de Alexandria, e ainda que sejam mais
elaboradas do que as de Justino.
Precisamente na época em que Tertuliano escrevia desenvolvia-
•il -se uma instituição nova que tinha por papel organizar, regular e
..í?
controlar essa purificação anterior ao baptismo da qual falava o
De paenitentia. Trata-se menos sem dúvida de uma inovação radi
cal do que de uma institucionalização, segundo um modelo que
tende a dar uma forma geral às práticas de catequese e de prepa
ração para o baptismo. Para esta instauração de um catecumenato,
que ao longo do século m assumiu cada vez mais as feições de
uma “ordem”, ao lado da dos baptizados, os historiadores reconhe
cem várias razões: a afluência dos postulantes, com o que isso
podia comportar de enfraquecimento na intensidade da vida reli-
giosa; a existência das perseguições, acarretando o abandono da fé
pelos que não estivessem suficientemente preparados; a luta contra
as heresias, implicando uma formação mais rigorosa tanto do pon
to de vista das regras de vida como dos conteúdos doutrinais. Ao
que talvez devamos acrescentar o modelo das religiões de misté
s f fr:
MM rio, com o cuidado que nelas se punha na formação dos inicia
dos153. O catecumenato constitui um tempo de preparação, bastan
te longo (pode durar três anos), em que a catequese e o ensino das
verdades e das regras se associam a um conjunto de prescrições
morais, de obrigações rituais e práticas, e de deveres. Além disse
— e é esse aqui o ponto a reter —, essa preparação é escandida
por procedimentos destinados a “pôr à prova” o postulante: quei
dizer, a manifestar aquilo que ele é, a atestar o “labor” que efectua
a dar testemunho da sua transformação e da autenticidade da su<
purificação. Estes procedimentos correspondem a essa “probatio
da qual Tertuliano fazia uma das significações da disciplina de
153 Tais são, em todo o caso, as quatro razões evocadas por [A. TURCK, “Au!
origines du catéchuménat”, Revue des sciences philosophiques et théologiques, t
48,1964, pp. 20-31],
80 Michel Foucault
155 Sobre este ponto, cf. M. DUJARIER, Le Parrainage des adultes aux trois
premiers siècles de PÉglise, Paris, 1962.
156 HIPÓLITO, A Tradição Apostólica, 15-16. Os Cânones atribuídos a HIPÓ
LITO insistem sobre o exame dos motivos que levam a abraçar o cristianismo, de
maneira a afastar aqueles que quisessem ludibriar: “examinentur omni cum perse
verando, et quam ob causam suum cultu respuant ne forte intrent illudendi causa”
|“que aqueles que vêm à igreja para se tornarem cristãos sejam examinados com
muito rigor [...] pelo temor de que queiram entrar por escárnio”, trad. R.-G. Co-
quin] (cânone 10).
82 Michel Foucault
162 É a opinião de A. DONDEYNE, “La discipline des scrutins dans l’Église lati
ne avec Charlemagne”, Revue d’histoire ecclésiastique, t. 28, 1932.
163 Sobre esta impossibilidade de coexistência numa mesma alma do Espírito
Mau e do Espírito Santo, cf. ORÍGENES, Homílias sobre os Números, VI, 3.
164 Esta aproximação é muito frequente. Assim CIRILO DE JERUSALÉM, Pró-
-Catequese, § 9.
165 [SANTO AMBROSIO, Explanado symboli, 1.]
84 Michel Foucault
173 HERMAS, O Pastor, Similitude IX, 16, 2. Como o faz notar A. BENOÍT, a
morte, para Hermas, não tem lugar no baptismo, “o homem está já morto antes
do baptismo em consequência do seu pecado, e, pelo baptismo, acede à vida”, Le
Baptème chrétien au second siècle, p. 133.
174 SÃO PAULO, Epístola aos Romanos, 6,4.
175 TERTULIANO, De ressurectione carnis, XLVII (P. L., t. 2, col. 862).
176 Sobre a relação entre a água e a morte, no baptismo, cf. P. LUNDBERG,
La Typologie baptismale dans l’ancienne Église, Leipzig, 1942. Cf. SANTO AM-
BRÓSIO, De sacramentis, III, 2: “quando te banhas e te levantas, há uma imagem
da ressurreição”.
88 Michel Foucault
177 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XXV Homilia sobre o Evangelho de São João
(3,5),2(P.G.,t. 59, col. 151).
178 GREGORIO DE NISSA, Oratio catechetica magna, XXXV, 4-6 e 10.
179 SÃO PAULO, Epístola aos Romanos, 6,6.
180 ORÍGENES, Comentário sobre São João, VI, 44.
181 SANTO AMBROSIO, De sacramentis, II, 17.
As Confissoes da Carne 89
nar a sua vida. À homoiôsis tô theô que prometia àquele que dela
fosse capaz uma vida de luz e de eternidade, tende a substituir-se
o princípio de uma semelhança a Cristo na sua paixão, e portanto
o de uma vida cristã posta sob o signo da mortificação.
182 [Foucault garatuja aqui: “—0 baptismo resgata / mas é necessária nele a
remissio cordis / Cf. História dos dogmas / — Tudo isto converge em direcção ao
problema do conhecimento de si.”]
[III]
[A SEGUNDA PENITÊNCIA]
Este texto passou durante muito tempo por ser a prova de que,
no cristianismo primitivo, não existira outra penitência senão a do
baptismo, e por testemunho de que em meados do século n fora
instaurado um segundo recurso para os pecadores já baptizados:
recurso único, solene, não repetível, do qual teria resultado por
transformações sucessivas a instituição penitencial. O meu propó
sito não é evocar, nem de longe, as discussões que esta passagem
de Hermas levantou: manifestará a primeira atenuação importante
•de um rigorismo primitivo? Formará uma crítica contra a lição
demasiado estrita de “certos doutores”, que seria necessário saber
quem são? Assentará na distinção entre dois ensinos: o que é dado
antes do baptismo e o que é reservado aos baptizados aos quais é
possível anunciar a possibilidade de uma segunda penitência? Esta
última seria, na perspectiva de Hermas, um Jubileu que não devia
ter lugar senão uma vez, ou um recurso que a parusia de Cristo
tornava urgente, indispensável e necessariamente única184?
Retenhamos somente que a obrigação de uma metanoia, de um
arrependimento-penitência, é incessantemente lembrada aos cris
tãos nos textos do período apostólico. É sem dúvida dito na Epís
tola aos Hebreus que “é impossível que aqueles que foram uma vez
iluminados, que provaram o dom celeste, que se tornaram partici
pantes do Espírito Santo, que saborearam a bela palavra de Deus
e as forças do mundo por vir e que contudo caíram, sejam renova
dos uma segunda vez sendo levados à penitência”185. Mas o texto
refere-se à unicidade do baptismo como acto de “renovação” total
do indivíduo. Não exclui nem a abominação das faltas nem o pe
dido de perdão daqueles que receberam o baptismo: “Todas as
nossas quedas e todas as faltas que cometemos sob a instigação de
um desses adeptos do Inimigo, imploremos o seu perdão.”186 Sú-
184 A tese do Jubileu, aceite no início do século xx, foi criticada por A. D’ALÈS
(L’Éditde Calliste. Étude sur les origines de la pénitence chrétienne, Paris, 1914),
c depois por B. POSCHMANN (Paenitentia Secunda, Bona, 1940); foi retomada e
reelaborada por R. JOLY, em particular na sua edição de O Pastor (1958).
185 SÃO PAULO, Epístola aos Hebreus, 6,4-6.
186 CLEMENTE DE ROMA, Primeira Epístola, LI, 1.
94 Michel Foucault
187 Didakhê, IV, 14. A Epístola do Pseudo-Barnabé, XIX, 12, retoma a expressão
e acrescenta: “tal é a via da luz”.
Didakhê, XIV, 1.
189 CLEMENTE DE ROMA, Primeira Epístola, LVI, 2. Cf. também Didakhê,
XV, 3: “Recriminai-vos uns aos outros.”
190 CLEMENTE DE ROMA, Primeira Epístola, LVI, 1.
191 ZW4.,II.4-6.
192 POLICARPO, Epístola aos Filipenses, VI, 1.
193 Cf. as expressões como: “Deus deu a todos metanoias topon", “metanoias
metaskhein” (CLEMENTE DE ROMA, Primeira Epístola, VII, 5; VIII, 5).
As Confissões da Carne 95
194 Esta ideia, que fora discutida a propósito dos relapsos e a propósito do baptis-
, mo dado para os heréticos, fora claramente rejeitada: “iterandi baptismatis opinio
vana", SANTO AMBROSIO, De paenitentia, II, n, 7.
v 195 Note-se que encontramos por vezes a expressão, mas num sentido metafóri
co e não ritual: CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur, XLII, 14
: (P.G.,t. 9, col. 649).
96 Michel Foucault
203 SANTO AMBRÓSIO, De paenitentia, 1, xi, 52; cf. anotação do mesmo tipo na
carta LV de SÃO CIPRIANO, capítulos 16 e 20.
204 SANTO AMBRÓSIO, Depaenitentia, II, vii, 58-59.
205 SANTO AMBRÓSIO, carta XXV.
206 SÃO LEÃO, carta [108].
207 SANTO AMBRÓSIO, De paenitentia, II, x, [95],
‘ 208 [Nota vazia.]
98 Michel Foucault
- A -
’ 218 “Cor scrutari et mentem perspicere non possumus”, SÃO CIPRIANO, carta
LVII, 3.
219/Wd-, carta LIX, 15 e 16.
220 Ibid.
221 Ibid., carta LV, 18; cf. também LVII, 3.
222 “[Libellus] ubi singula placitorum capita conscripta sunt", ibid., carta LV, 6.
102 Michel Foucault
- B -
231 SÃO CIPRIANO, carta XXII, 2. Cf. J. GROTZ, Die Entwicklung des Busstu
fenwesens in der vornicänischen Kirche, p. 82.
232 Tal é a traço grosso a tese de E. GÖLLER, “Analekten zur Bussgeschichte
des 4. Jahrhunderts”, Römische Quartalschrift, t. XXXVI, 1928. Cf. o que a este
propósito diz R. GRYSON sobre a prática penitencial em Milão no século iv, em
Le Prêtre selon saint Ambroise,pp. 277 e sgs.
233 [SÃO CIPRIANO, carta IV, 4.]
234 SÃO CIPRIANO, De lapsis, XXVII-XXVIII; sobre o sentido a dar a esta
passagem cf. J. GROTZ, [p. 59].
j^s Confissões da Carne 105
235 PAULINUS [PAULINO DE MILÃO (N. T.)], Vita Ambrosii, [P. L., 1.14, col.
27-50].
236 SÃO CIPRIANO, carta XV, 1: “Ante actampaenitentiam, ante exomologesim
gravissimi atque extremi delicti jactam ante manum ab episcopo et clero in pae
nitentiam impositam” [“Antes de qualquer penitência, antes da confissão maior e
da mais grave das faltas, antes da imposição das mãos pelo bispo e pelo clero”,
tradução do cônego Bayard], XVI, 2: “Cum in minoribus peccatis agant pecca-
tores paenitentiam justo tempore, et secundum disciplinae ordinem ad exomolo
gesim veniant, et per manus impositionem episcopi et cleri jus communicationis
accipiant" [“Quando se trata de faltas menores, os pecadores fazem penitência, o
tempo prescrito, e, segundo a ordem da disciplina, são admitidos à confissão, re
gressando depois à comunhão através da imposição das mãos do bispo e do clero”,
tradução do cônego Bayard]. Cf. também cartas IV, 4; XVII, 2.
106 Michel Foucault
249 "Sacco corpus involvere, cinere perfundere, macerare jejunio, moerore confi-
cere, multorumprecibus adjuvari” [“envolver o corpo num saco, cobri-lo de cinza,
consumi-lo pelo jejum, macerá-lo de sofrimento, obter auxílio por meio das ora
ções de muitos”, tradução de C. Épitalon e M. Lestienne], PACIANO, Parínese,
XXIV.
250 [TERTULIANO, Depaenitentia, X, 1.]
.As Confissões da Carne 111
259 Cf. a título de exemplo: HERMAS, O Pastor, Visão I,1,9 e 3, 1; Preceito IV,
1,11; Preceito XII,6,2; Similitude V, 7,4; Similitude VIII, 11,3; Similitude IX, 23,
5 e 28; TERTULIANO,Depaenitentia, VII, x, 12; SÃO CIPRIANO, cartas XXX,
7; XXXI; LV, 7 e 15-17; De lapsis, [XXVIII]; SANTO AMBROSIO, Expositio
Evangelii secundum Lucam, V, 2; X, 66; Enarratio in Psalmum 36,14; De para-
diso, XIV, 70. Para o De paenitentia, cf. o índice da edição de Gryson (Sources
chrétiennes).
116 Michel Foucault
264 “Frustra autem velis occulere quem nihilfallas: et sine periculo prodas, quod
setas esse jam cognitum” [“Seria vão querer dissimular Àquele que sobre nada
enganareis; e nada arriscais em denunciar o que sabeis ser já conhecido”, tradução
Dom G. TISSOT], SANTO AMBROSIO, Expositio Evangelii secundum Lucam,
VII, 225.
265 “Mora ergo absolutionis in confitendo est, confessionem sequitur peccatorum
remissio”, SANTO AMBROSIO, carta XXXVII, 45.
266 “In judiciis saecularibus [...] quaedam tangit judicem miseratio confitentis”,
SANTO AMBROSIO, De Colín et Abel, II, 9.
267 Assim SANTO AMBROSIO, De paenitentia, II, vii, 53: “Si te ipse accusave-
ris, accusatorem nullum timebis." Cf. também De paradiso, XIV, 71.
268 SANTO AMBROSIO, Expositio Evangelii secundum Lucam, VII, 225: “Con
fitero magis, ut intervenía! pro te Christus, quem advocatum habernos aput Po
trera”', cf. SANTO AGOSTINHO, Discurso sobre o Salmo 66,7.
269 SANTO AMBROSIO, Apologia de propheta David, X, 53: “si autem dixeri-
mus quia non peccavimus, mendacem facimus Deum”.
118 Michel Foucault
273 Não sem certo desprezo: “Vai ver a formiga, preguiçoso! Observa os seus
costumes e faz-te sensato” (Prov., 6), SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XVII Homilia
sobre São Mateus, 7 (P. G., t. 57, col. 263).
122 Michel Foucault
278 Cf. I. HADOT, Seneca und die griechisch-römische Tradition der Seelenlei
tung, Berlim, 1969, pp. 64 e sgs.
279 Sobre estes exercícios múltiplos, cf. P. RABBOW, Seelenfiihrung. Methodik
der Exerzitien in der Antike, Munique, 1954.
280 Exemplo: a discussão entre estoicos e epicuristas sobre o problema de saber
se é necessário pensarmos nas desgraças que poderiam acontecer (praemeditatio
malorum) para examinarmos de que maneira a elas reagiriamos.
281 Os versos seguintes seriam mais tardios: “Começa pela primeira e percorre-
-as todas. E a seguir, se achares que cometeste faltas graves, repreende-te; mas, se
agiste bem, regozija-te.”
124 Michel Foucault
282 Sobre o valor mnemotécnico desta prática e o seu sentido como preparação pa
ra o sono e para os sonhos, cf. H. JAEGER, “L’examen de conscience dans les reli
gions non chrétiennes et avant le christianisme”, Numen, t. VI, 1959, pp. 191-194.
283 SÉNECA, De tranquillitate animae, 1,4.
As Confissões da Carne 125
!
>■ 12,,8 Cf. SANTO NILO: "[Philosophia gar esiin] êthòn katorthôsis meta doxês
í tésperi tou ontos gnôseôs alêthous”, [Logos askêtikos, III, P. G., t. 79, col. 721].
;' 299 [SÃO BASILIO, Constituições Monásticas, P. G., t. 31, col. 1321a.]
■,3(10 [“£>í ’ergônphilosophia”, GREGORIO DE NAZIANZO, Discurso VI (P. G., t.
'; 35, col. 721), citado por I. HAUSHERR, Direction spirituelle en Orient autrefois,
i - Roma, 1955, p. 57.]
7301 [Nota vazia.]
■ ■ 302 [Manuscrito: tekhnê tekhnês, mas o texto de Gregorio de Nazianzo diz: “tó
-' onti gar autê moi phainetai tekhnê tis einai tekhnôn kai epistêmê epistêmôn, to
polutropôtaton tôn zôôn kai poikilâtaton”.]
303 [GREGORIO DE NAZIANZO, Discurso II, 16, citado por I. HAUSHERR,
’ Direction spirituelle en Orient autrefois, p. 57.]
ftOfeo
132 Michel Foucault
I. O PRINCÍPIO DE DIRECÇÃO
“Aqueles que não são dirigidos caem cõmo folhas mortas.” Este
texto dos Provérbios™ foi regularmente citado na literatura mo
nástica em apoio do princípio segundo o qual a vida do monge não
312 Tal foi o caso de Pafnúcio, cujas vida e lição são evocadas na III Conferência.
313 J. CASSIANO, Instituições, V, 4, 2. Pouco antes, em contrapartida, Cassiano
considera, segundo o abade Pinúfio, que os cenobitas devem no interior da comu
nidade ligar-se a um único mestre, em vez de procurarem apoio em vários (IV, 40).
314 Sobre este ponto cf. O. CHADWICK, John Cassien. A Study in Primitive
Monasticism, Cambridge, 1950.
^Confissões da Carne 135
BS
>15 Pacómio, na hora da morte, professa ter aceitado as admoestações até dos mais
pequenos (Fragnients captes de la vie de Pacôme, traduzidos por R. DRAGUET,
>n Les Pères du Désert, Paris, 1949, pp. 116-117).
316 “Conheci monges que após grandes trabalhos caíram e acabaram na loucura,
• por terem contado com as suas obras e terem esquivado por razões falsas o manda
mento de Aquele que diz: Interroga o teu pai e ele te informará”, SANTO ANTÃO,
■ P. G., t. 65, col. 88b [tradução in I. HAUSHERR, Direction spirituelle..., p. 16]. A
1 II Conferência, consagrada à discretio, cita uma série de exemplos de monges cuja
i obstinação em se dirigirem só eles a si mesmos conduziu à queda. Significativo
éntre todos é o exemplo do monge que, crendo-se fora de toda a tentação, dirige
com excessiva acrimónia um discípulo e, a título de punição, cai numa tentação da
! qual só o socorro do abade Apoio pôde salvá-lo (§ 13).
317 Instituições, IV, 30-31; Conferências, XX, 1.
318 Conferências, II, 3.
dêtr
136 Michel Foucault
319 Na Regra de SÃO BENTO, é dito dos monges: “ambulant alieno judicio et
império” (capítulo 5).
320 J. CASSIANO, Instituições, IV, 8.
321 Ibid.,lV,9.
Confissões da Carne 137
323 [‘We<? de majorum sententia judices, cujus officium est obedire”, SÃO JE
RÓNIMO,carta 125 ao mongeRusticus (P.L.,t.22,col. 1081).]
324 [SÃO BASÍLIO, De renuntiatione saeculi, 4 (P. G., t. 31, col. 363b), citado
porl. HAUSHERR,Direction spirituelle...,pp. 190-191.]
325 J. CASSIANO, Instituições, IV, 10.
326 DOROTEU DE GAZA, [“Vie de Dosithée”, in (Euvres spirituelles, Paris,
S. C„ 1964, pp. 122-145],
[s .Confissões da Carne 139
f
332 J. CASSIANO, Instituições, IV, 39. Cf. também Conferências, II, 10: “A pri
meira prova da humildade será deixar aos anciãos o juízo de todas as suas acções
àfs Confissões da Carne 141
BilBA
^?>Sob os três aspectos seguintes, a obediência constitui pois um
^■¿exercício da vontade sobre si mesma e contra si mesma. Querer o
^ue os outi < >s querem, em virtude do privilégio intrínseco e formal
't'que a xontade de outrem detém, porque vem de outrem; é a subdi
to. Querer não querer, querer não se opor nem resistir, querer que
m nada a vontade própria ponha obstáculo à vontade do outro: é
>paiientia. Não querer querer, renunciar à mínima das vontades
^óprias: é a humilitas. E um tal exercício da obediência, em vez
% ser um simples instrumento para a direcção, constitui com ela
iim círculo indissociável. A obediência é a condição inicial para
que a direcção possa operar o seu trabalho — daí as provas de
submissão às quais se expõe o postulante antes ainda de ter trans
aposto a porta do mosteiro; é o instrumento essencial da acção do
BJirector; é a forma geral da relação entre este e o dirigido; é final-
í- imente o resultado a que a direcção conduz, resultado que põe o
4
^dirigido em posição de aceitar indefinidamente, em lugar e vez da
(¿^sua, uma vontade diferente. Ocupa assim o lugar de primeira entre
I
as virtudes. Primeira, uma vez que é por ela que deve começar a
instituição monástica e a formação dos noviços. Primeira também,
porque está no princípio de todas as que a direcção pode fazer
5
florir naquele que quer encaminhar-se para a perfeição. Os mon
ges preferem-na, diz Cassiano, “não só ao trabalho manual, à lei
tura ou ao silêncio e ao repouso da cela, mas também a todas as
virtudes, a tal ponto que consideram dever fazer tudo passar a
4
seguir a ela, e sentem-se felizes por sofrer pouco importa que da
no de preferência a que pareça que de alguma maneira a transgre
diram”333.
Compreende-se o lugar que Cassiano, no caminhar para a per
feição, dá à humildade, entendida como estado permanente de
obediência, aceitação de toda a submissão, vontade de não querer,
e dos seus próprios pensamentos, de tal modo que em nada se fie no seu próprio
sentimento; mas em todas as coisas acate as decisões daqueles, e que só da sua boca
queira conhecer o que deve tomar por bom, o que deve olhar como mau.”
333 J. CASSIANO, Instituições, IV, 12.
142 Michel Foucault
338Ibid., II, 2.
339/tóZ.,II,4. .
340 Esta acentuação é mais nítida nas Conferências, consagradas ao caminho que
leva à contemplação, do que nas Instituições, nas quais se trata sobretudo da entra
da do iniciando no cenóbio.
fcíAs.jConfissões da Carne 145
341 Assim Herão [que], ao cabo de cinquenta anos de deserto e de abstinência, ima-
® gina que pode atirar-se a um poço e que os seus méritos o protegerão de todo o peri-
í go; os dois monges que querem atravessar o deserto sem provisões; aquele que quis
■ imitar o sacrifício de Abraão; ou esse outro célebre monge da Mesopotâmia, que
“rolou numa queda lamentável até ao judaísmo e à circuncisão”, ou ainda o mestre
demasiado rigoroso apanhado pela tentação do seu discípulo \(ibid., II, 5-8)].
| 342/èid.,II,2.
lí 343IWd.,II, 16.
344 Ibid., II, 17.
146 Michel Foucault
347 Sobre o modo [de acção] do espírito do mal sobre a alma do homem, cf. a VII
Conferência, capítulos 7-20.
148 Michel Foucault
IV. O EXAME-CONFISSÃO
353 [SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, Que éperigoso para o orador e para o ouvinte
falar para agradar, 4.]
354 O carácter “gestionário” deste exame é, como em Séneca, muito marcado: “Exa
minemos o que é em nossa vantagem e em nosso prejuízo [...]. Deixemos de gastar
mal a propósito e tratemos de substituir os fundos úteis às despesas nocivas” (ibid.).
í As Confissões da Carne 151
-í
É-j
í 1.0 combate interior
365 lbid.
366 Assim SÉNECA perguntava-se se tivera razão ao crer que se podia educar
toda a gente; ou que toda a verdade era boa fosse para quem fosse (De ira, III, 36).
s < ’onfissões da Carne 155
371 Significativo o conselho que Santo Antão teria dado aos solitários: registar
numa tabuinha, como se tivessem de os mostrar a alguém, as suas acções e os mo-
vimentos da sua alma (SANTO ATANÁSIO, Vita Antonii, 55,9).
372 J. CASSIANO, Instituições, IV, 9.
373 J. CASSIANO, Conferências, II, 10.
158 Michel Foucault
Cassiano vai mais longe até. A formulação seria por vezes ex
pulsão material. Com a frase que confessa, é o próprio diabo que
é expulso do corpo. Tal é a lição que deve extrair-se de uma me
mória do abade Serapião. Em criança, fora habitado pelo espírito
da gula e todas as noites roubava um pão; mas “corava ao revelar”
ao santo velho que o dirigia os seus “roubos clandestinos”. Por
fim, um dia, impressionado por uma exortação do abade Teão, não
pôde impedir-se de rebentar em soluços. “Tira do seu seio, cúm
plice e receptador do seu furto, o pão que roubara [...], e produ-lo
diante dos olhos de todos. Prosternado por terra, confessa, pedin
do perdão, o segredo dos seus repastos quotidianos; implora, por
entre as lágrimas, as orações de todos, a fim de que o Senhor o
liberte de um cativeiro tão duro.” E prontamente “uma lâmpada
acesa saiu do seu seio e encheu a cela de um cheiro de enxofre; a
infecção foi de tal ordem que mal foi possível aí continuar”. Ora,
as palavras que, segundo o relato de Cassiano, o abade Teão pro
nuncia no decorrer desta cena são importantes. Sublinham em
primeiro lugar o facto de a libertação não ser directamente devida
a palavras que o director tivesse pronunciado374, mas às do culpado
que confessa: “A tua libertação está consumada; sem que eu tenha
dito uma palavra, a confissão que acabas de fazer foi suficiente.”
Esta confissão trouxe à plena luz do dia o que estava dissimulado
na sombra do segredo: é um jogo de luz. E é, ao mesmo tempo, por
isso mesmo, uma inversão de poder: “O teu adversário conquista
va a vitória; tu triunfas hoje sobre ele; e a tua confissão esmaga-o
mais completamente do que ele mesmo te tinha abatido a favor do
seu silêncio. [...] Enunciando-o, retiraste ao espírito de malícia o
poder de te continuar a inquietar.” E esta inversão de poder traduz-
-se numa expulsão material. Em sentido estrito, a confissão que
expõe à luz o espírito do mal fá-lo abandonar o seu lugar: “O Se
nhor [...] quis que visses com os teus olhos o instigador dessa
374 Há contudo um efeito indirecto, que o próprio Teão sublinha: o discípulo fora
convencido pelo sermão do velho sobre a gula e os pensamentos secretos [(ibid.,
11,21)].
As Confissões da Carne 159
[Ser virgem]
9 Voltaremos adiante a esta ideia de que a virgindade dos filhos tem um valor
sacrificial para o resgate dos pecados dos pais.
r
B
:'V
As Confissões da Carne 171
17 Ibid., 24.
18 “Disciplina custos infirmitatis”,TITO LÍVIO, História Romana, XXXIV, 9.
19 SÃO CIPRIANO, De habitu virginum, 1.
20 Ibid., 3.
21 Ibid.
& Confissões da Came 175
.^cià da virgem foi mais total do que as outras, pois que faz morrer
^jncla “todos os desejos da carne”22. Conservando ao longo de toda
«¿a vida a sua pureza intacta, a virgem começa ainda neste mundo a
^.¿xistência que será reservada, após a morte, aos que se salvarem: a
j^vida incorruptível. “Vós começastes já a ser o que nós seremos um
£j’dia. Possuís ainda neste mundo a glória da ressurreição e passais
»/pelo século sem vos contaminardes da corrupção do século. Quan-
\do permaneceis castas e virgens, sois iguais aos anjos de Deus.”23
/.Assim, do baptismo à ressurreição, a virgindade passa através da
¿.vida sem ser tocada pelas suas contaminações. Está ao mesmo
; .tempo o mais perto que pode estar do estado de nascença — desse
Restado em que se encontra a alma quando nasce para a existência
?, cristã — e o mais perto que se pode estar do que será a outra vida
|jia glória da ressurreição. O seu privilégio de pureza é também um
f privilégio no que se refere ao mundo e no que se refere ao tempo:
í' ci-la já, de certa maneira, no além. Na existência das virgens,
t reúnem-se a pureza inicial e a incorruptibilidade final24.
£•' Esta vida preciosa, Cipriano representa-a ao mesmo tempo co-
- mo frágil — está exposta aos ataques do demônio25 —, e como
. difícil — rude ascensão, suor e pena: “A quem persevera, é dada a
: imortalidade, é oferecida a vida perpétua, e promete o Senhor o
. seu reino.”26 Requer pois auxílio, encorajamentos, advertências,
. exortações27. Cipriano nada evoca que se pareça com uma direc
ção sistemática. Não é manifestamente uma regra de vida o que
propõe. Indica somente que fala como um pai28. Mas sublinha
também que a virgindade não pode consistir apenas numa integri
dade do corpo29. Ora, o conteúdo do texto pode surpreender. As
22 Ibid., 23.
23 ¡bid., 22.
24 Ibid.
25 Ibid., 3.
26 Ibid., 21.
27 Ibid.
28 Ibid.
29 Ibid., 5.
1
176 Michel Foucault
Ibid., 5.
178 Michel Foucault
■if
’ nt> “porto seguro da incorruptibilidade”36. Por fim, o discurso de
Marcela evoca, na economia histórico-teológica da salvação, a
■; ruptura que separa os dois últimos momentos da série anterior
mente descrita. Antes de Cristo, Deus, um pouco como um pai
.{•confiando os seus filhos a pedagogos cada vez mais severos,
conduzira-os à continência. Mas para a passagem desta à virgin-
\v-' dade, que nos permite, a nós que fomos criados à imagem de Deus,
I. assemelharmo-nos a Ele e levarmos esta semelhança ao seu termo,
foi necessária a Encarnação, foi necessário que o Verbo revestisse
,a carne humana e que nos fosse assim proposto “um modelo de
vida que seja divino”37. O primeiro discurso do Banquete entrete-
.ce, pois, numa figura de ascensão única, os três movimentos (gra
ça da salvação, transformação progressiva da lei, esforço de ascen
são individual) que colocam a virgindade — e a virgindade cristã,
’ bem distinta da continência — nesse cume da perfeição em que o
homem se aproxima ao máximo da semelhança a Deus.
38 “To ek tôn osteôn ostoun kai hê ek tês sarkos sarx [...] hupo tou autou tekhni-
tou dêmiourgêthôsi", ibid., Segundo Discurso, I.
39 [Ibid., II], E interessante notar que o prazer próprio da relação sexual é repor
tado, como ao seu tipo, ao sono em que Deus mergulhou Adão, quando.de uma das
suas costelas, tirou Eva. Justificação escriturária do gozo.
40 Ibid., VI.
41 Cf. supra, pp. 38-40.
42 E de resto acolhido por “um rumor elogioso”, “todas as virgens aprovavam o
seu discurso” (Terceiro Discurso, VII); e Taleia reconhece que “nada pode opor-se
à sua exposição” (ibid., Terceiro Discurso, I).
Às Confissões da Carne 181
52ZWd.,XIV.
53 “Hê eis ton paradeison apokatastasis”, Quarto Discurso, II.
184 Michel Foucault
54 Ibid.
55 “Diapherontôs askein”, ibid., VI.
56 Ibid., Quinto Discurso, III.
57 Ibid., IV.
58 Metódio emprega o termo eukhê (ibid.), mas não é certo que se refira a um
voto institucional e ritúalizado.
59 Ibid., IV.
Ás Confissões da Carne 185
vitória”73. Então, tudo o que viam, como que num sonho, sob a
forma de sombras, vêem-no agora, “belezas maravilhosas, radio
sas, bem-aventuradas”74: a própria Justiça, a própria Continência,
o próprio Amor, e a Verdade e a Sabedoria. Em suma, o oitavo
discurso — discurso corifeu — reitera o movimento evocado pe
los discursos precedentes. Mas, enquanto estes prometiam a incor
ruptibilidade, a imortalidade, a felicidade eterna, é a verdade que
é anunciada aqui: as virgens penetram até aos tesouros, e Deus,
em contrapartida, ilumina-as.
E neste sentido portanto que o discurso de Tecla anula todos os
outros. Mas também os funda no sentido em que o tesouro de
verdade que vai agora descobrir se refere à própria virgindade.
E assim que devemos compreender sem dúvida os dois desenvol
vimentos que constituem o corpo do discurso de Tecla e cuja
presença, neste ponto, pode surpreender: uma exegese do Apoca
lipse e considerações sobre o determinismo astral. Num caso,
trata-se de conceber de novo a virgindade do ponto de vista do fim
dos tempos e como forma da sua consumação; no outro, de a con
ceber de novo do alto do mundo e vista de certo modo como que
das esferas celestes mais elevadas.
A passagem do Apocalipse, comentada por Tecla, é a que des
creve “o grande sinal aparecido no Céu”: a mulher em trabalho
de parto, envolta em sóis, e o dragão que precipita sobre a Terra
a terça parte das estrelas. Uma interpretação sem dúvida tradi
cional devia ver aqui a representação da virgem, o nascimento de
Cristo, o combate da serpente com a mulher e a promessa da sua
derrota frente a Cristo75. A este exegese, Metódio opõe-se aspe
ramente76. Faz valer, contra ela, uma impossibilidade textual: o
77 A exegese transpusera o tema hebraico da Aliança de Deus com o seu povo nos
termos de uma relação entre Cristo e a Igreja. Santo Hipólito e Orígenes tinham
assim feito da Igreja a esposa de Cristo.
78 Orígenes via a esposa de Cristo ora na Igreja, ora na alma do cristão. Metódio
parece querer sublinhar pelo contrário que a Igreja, noiva e templo de Deus, é um
“poder em si, distinguindo-se dos seus filhos” e que a alma não pode nascer cristã
senão pelo poder da sua mediação e da sua maternidade. Sobre estes debates ecle-
siológicos, cf. F.-X. ARNOLD.
190 Michel Foucault
80 lbid„ XVII.
81 Levítico, 23,39-43.
82 Em grego o jogo de palavras é agninos — hagneia.
192 Michel Foucault
86 “7o tês parthenias epitêdeuma tekhnê tis einai kai dunamis tês theioteras
zôês”, GREGORIO DE NISSA, Da Virgindade, IV, 9.
As Confissões da Carne 195
P - A -
87 Ibid., Preâmbulo, 1.
88 ATANÁSIO, Apologia ad Constantium, 33 (P.. G., t. 25, col. 640).
196 Michel Foucault
111 SANTO AGOSTINHO, Discurso sobre o Salmo 132,4 (P. L., t. 37, col. 1730).
\s Confissões da Carne 203
— B —
í^'
II
caracterizara a Antiga Aliança —, mas a urna nova forma de rela
u ção entre Deus e os homens.
. E chegamos aqui ao outro aspecto da virgindade: o que se re
porta à salvação da humanidade e ao tempo do mundo. Eis, com
Que a diferenciação dos sexos seja obra de Deus, eis o que ne
gavam muitos movimentos de inspiração dualista. Mas reconhe
cem-no, em contrapartida, os autores reconhecidos pela Igreja:
loucura, diz Santo Agostinho, que se pretenda cristão quem for tão
cego que defenda que “a diferença dos sexos é obra do diabo, e não
de Deus”120. Antes ainda de ser narrada a formação de Eva no
segundo capítulo do Gênesis, o texto sagrado indicava desde a
primeira menção da criação do homem (1, 26-27) que Deus os
criara “homem e mulher”. Esta passagem dava, portanto, sem
equívoco, autoridade à opinião segundo a qual a diferença dos
sexos está presente desde a Criação. Mas levanta logo a seguir
uma dificuldade, na medida em que surge imediatamente após a
afirmação de que o homem foi criado à imagem e semelhança de
Deus. Como pôde Deus, sendo único, criar o homem à sua seme
lhança ao mesmo tempo que na dualidade dos sexos? A esta ques
tão Fílon respondera distinguindo na criatura humana o que era à
semelhança do Criador e o que era marca da criatura: um, o ho
mem, era “semelhante pela sua unicidade ao mundo e a Deus”;
mas era também portador dos “caracteres das duas naturezas, não
todos, mas aqueles que é possível que uma constituição mortal
admita”121. Tal foi a direcção para que se orientou a exegese cristã.
Assim, Orígenes vê na dualidade uma marca de tudo o que foi
criado: “As obras de Deus vão por grupos e estão unidas, como o
céu e a terra, o sol e a lua; a Escritura quis mostrar que, do mesmo
modo, o homem é uma obra de Deus e que não foi realizado sem
o complemento e a união que lhe convinham.”122 Jerónimo marca
rá, entre a semelhança a Deus e a dualidade dos sexos, mais dis
tância ainda: faz notar que o número dois, na medida em que
“rompe a unidade”, não é bom; de resto, o único dia em cujo fim
Deus não disse que a sua obra era boa foi precisamente o segundo;
a narrativa do Gênesis marca assim a significação desfavorável do
131 Também aqui, SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, na XVII Homilía sobre o Géne
sis, é menos preciso do que Gregorio de Nissa; mas admite igualmente uma exis
tência angélica, bem como a intervenção da reprodução Sexual após a queda a fim
de evitar o despovoamento causado pelo reinado novo da morte.
132 GREGORIO DE NISSA, Da Virgindade, XII, 4. O termo aqui utilizado para
designar o primeiro homem tal como sai das mãos de Deus é prôtoplastos.
133 GREGORIO DE NISSA emprega o verbo palindromein.
210 Michel Foucault
Lf
’¿Santo Ambrosio afirma que “aquele que conservou a sua castida-
||de é um anjo”139.
!•: E não é aqui somente num sentido metafórico, ou para designar
‘urna certa atitude da alma que se invoca o angelismo da virginda-
f de. Este é substancial, atravessa a matéria, opera através do mundo
p transfigura as coisas. Não se limita neste mundo de baixo à ex
pectativa de outro mundo: efectua-o realmente. Assim, Crisósto-
* mo descreve a vida de Elias, de Eliseu e do Baptista, “esses autên-
r ticos amantes da virgindade”: “Se tivessem tido mulher e filhos,
; não lhes teria sido tão fácil habitar o deserto [...]. Porque se ti
nham desembaraçado de todos esses laços, viviam na Terra como
í, se estivessem nos céus, não tinham necessidade alguma de pare-
des, de tecto, de leito, de mesa e de outras coisas dessa espécie; o
\-seu telhado era o céu, o seu leito a Terra, a sua mesa o deserto. E
l o que parece condenar os outros homens à fome, à esterilidade do
•’-deserto, era para esses santos homens fonte de abundância [...],
•' fontes, ribeiras, lençóis de água forneciam-lhes uma bebida suave
p e abundante; um anjo preparava para um deles uma mesa admirá
vel [...]. E João [...], não eram nem o trigo, nem o vinho, nem o
azeite, mas gafanhotos e mel selvagem a alimentar a sua vida
corpórea. Eis os anjos na terra! Eis a força da virgindade!”140
Mas na virgindade há mais do que esta interferência, de algum
modo espacial, do céu e da Terra. A virgindade dos indivíduos tem
também o seu lugar na economia dos tempos. Podem resumir-se
os desenvolvimentos muito longos e muito numerosos desta ideia
nuns quantos temas principais.
A história do mundo divide-se em duas partes. A do mundo
L ainda vazio, e a do mundo preenchido. No dia que se seguiu à
Criação o mundo estava vazio, e era a proliferação sexual para os
animais, não sexual para os homens, que devia completá-lo e
conduzi-lo ao seu ponto de acabamento. A queda teve duas conse
quências negativas: impediu a multiplicação não carnal dos ho-
141 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XVII Homília sobre o Gênesis, cf. no mesmo
sentido GREGÓRIO DE NISSA, De hominis opificio, XVII.
142 Como Miriam citada por Gregório de Nissa, Atanásio, Ambrósio; Elias, citado
por Metódio de Olimpos e Gregório de Nissa.
143 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, Da Virgindade, XVI-XVII, e [nota incompleta].
Confissões da Carne 213
||; ao seu louco orgulho, num outro erro, iludindo-se na sua demência
Ê*. sobre essa beleza para a qual o seu pensamento os inclinava.”177
Tornamos pois a encontrar, nesta passagem que abre o último ca-
pítulo do tratado de Gregório sobre a virgindade, vários de entre
í* os argumentos dos quais vimos que serviam para justificar a prá-
tica da direcção em geral.
H Quanto ao papel do director, Gregório de Nissa opõe-no, com
k insistência, à lição escrita, fazendo valer que, na arte da virginda-
de, devemos ser guiados pelos “actos”178. Com efeito, acerca do
$ ensino que permite aprender este difícil estado, o texto é bastante
K; elíptico. Fala essencialmente do papel do dador de exemplo179.
K, Mas fala dele em dois sentidos alternados: por um lado, trata-se de
um modelo, de um “Cânone” para a nossa vida — Gregorio
r
r apresenta-o como um corifeu cujos gestos imitam os que o se
Cí guem; mas, por outro lado, fala dele também como de um ponto
I cie orientação, de uma meta em cuja direcção os olhos se fixam,
porque é nela que se pode ver o que é o estado de virgindade
& quando enfim “abordou o porto da vontade divina”: os que o al
& cançaram “mantêm a alma tranquila em paz e serenidade”.
Mantêm-se impávidos longe da agitação das vagas, o esplendor da
sua vida forma então como que sinais de fogo180. Redescobrimos,
f
pois, aqui, magnificado e levado ao seu ponto de consumação, o
L
lema da tranquilidade virginal. Mas, no mesmo lance, o papel do
director, no labor, os exercícios e os combates que atravessam este
IE estado e o sustentam, não aparece claramente, nem também as
técnicas que emprega, as regras ou os conselhos que dá.
- I -
rica: apresenta-se como um texto prático. O que não quer dizer que
Mas o seu objectivo nem por isso passa a ser menos fixar meios
J reportados a um fim185: trata-se não de ensinar os que já adquiri-
fram o conhecimento do bem, mas de mostrar àqueles que experi-
j. mentam amor por ele como atingir esse bem que desejam. Livro
? de vida, por conseguinte, sem que defina um corpus sistemático
de regras: nenhuma referência é feita a instituições monásticas. E
^somente indicado, nas primeiras linhas, que a obra se destina
jp àqueles que conceberam, graças ao bispo Letoio (ao qual Basilio
se dirige), o amor do bem, mas nada sugere que se trate na circuns
tância de uma comunidade instituída186. Só o desenrolar do texto
& mostra, sem que nenhuma justificação ou explicação suplementar
seja dada, que constitui prescrições de vida para as mulheres. Des
te ponto de vista, está portanto próximo das obras práticas escri
tas, na segunda metade do século, por Evágrio, pelo Pseudo-
181 BASÍLIO DE ANCIRA, Da Integridade da Virgindade, 1.
182 Ibid., 24-29; 36-39.
183 Ibid., 2; 51.
\MIbid., 54e55.
185 Ibid., 1.
186 Em todo o caso, indica também que os seus conselhos podem valer para lei
tores ocasionais.
226 Michel Foucault
187 “Areskei de toiautê hoian autos autên plasai êthelêsen”, ibid., 17. O mesmo
argumento aparecia em CIPRIANO, cf. supra pp. 175-177.
As Confissões da Carne 227
188 A questão da diferenciação sexual nas almas era uma velha questão. Assim
TERTULIANO [(Do Véu das Virgens, 7-8; Da Alma, 27, etc.)].
228 Michel Foucault
YXflbid., 15.
191 Ibid.
192 Ibid., 46.
193 Ibid. AI.
230 Michel Foucault
194 Ibid.
195 Ibid., 43; cf. ibid., 13.
196 Ibid., 61. Contra o eunuquismo, Basilio faz também valer, a partir de consi
derações fisiológicas, os restos de desejo que assombram o corpo e são ainda mais
violentos por não poderem encontrar saída.
l*A' Confissões da Carne 231
- II -
210/Wá.,XII, 10.
211 ZW</.,XII, 11.
mibid.
213 Z¿>k/.,XI, 15.
214 Como veremos, só a graça pode permitir alcançá-lo, e as próprias tentações
são talvez uma graça.
215 ZZu¿., XII, 5.
As Confissões da Carne 237
y
244 Michel Foucault
238 Sobre a história destas listas dos pecados capitais, cf. A. GUILLAUMONT,
[“Introduction” no volume I do Traite pratique d’Evagre le Pontique, pp. 67
e sgs.].
239 EVÁGRIO PÔNTICO, Tratado Prático, 6.
240 [Ibid.]
241 [J. CASSIANO, Conferências, VIII, 13.]
246 Michel Foucault
247 Os sete outros, como já vimos, são a gula, a avareza, a ira, a [tristeza], a acédia,
a vangloria e o orgulho.
248 Cf. infra, pp. 253-255.
250 Michel Foucault
264 Ibid.,XíI,2.
265 Ibid. Cassiano apoia a sua tripartição numa passagem de [SÃO PAULO], Epís
tola aos Colossenses, 3,5.
266 Didakhê, II, 2.
267 Epístola do Pseudo-Bamabé, XIX, 4. Um pouco acima (X, 6-8), a propósito
dos interditos alimentares, o mesmo texto interpreta a interdição de comer hiena
como proibição do adultério, a de comer lebre como interdição da sedução de
crianças, a de comer doninha como condenação das relações bucais.
268 Assim SANTO AGOSTINHO, Sermão, 56,12.
As Confissões da Carne 255
272 O termo usado por Cassiano para designar o facto de o espírito se demorar
em tais pensamentos é immorari. A delectado morosa será, mais tarde, uma das
categorias importantes na ética sexual da Idade Média.
s Confissões da Carne 257
gar durante o sono. Cassiano faz, apesar de tudo, notar que, por se
produzirem desse modo, nem todas são forçosamente involuntarias.
|\Um excesso de alimentação, pensamentos impuros durante o dia são
/ para elas uma espécie de consentimento, senão de preparação. Dis-
! tingue também a natureza do sonho que a acompanha e o grau de
- ■ impureza das imagens. Aquele que é assim surpreendido erraria
í descarregando a causa sobre o corpo e o sono: “É sinal de um mal
que lavrara interiormente, o qual não foi a hora da noite a fazer nas
cer, mas que, enterrado no mais fundo da alma, o repouso do sono
J2' faz aparecer à superfície, revelando a febre escondida das paixões
C que contraímos alimentando ao longo de dias pensamentos mal-
' sãos.”280 E, por fim, resta a polução sem qualquer traço de cumplici-
' dade, sem esse prazer que é prova de que nela se consente, sem o
acompanhamento sequer da mais pequena imagem onírica. Tal é,
f sem dúvida, o ponto a que pode chegar um asceta que se exercite
' suficientemente: a polução não é mais do que um “resto” em que o
sujeito já não toma seja que parte for. “Devemos pois esforçar-nos
por reprimir os movimentos da alma e as paixões da carne até que
. a carne satisfaça as exigências da natureza sem suscitar volúpia, de-
'f sembaraçando-se da superabundância dos seus humores sem qual-
, quer prurido malsão nem suscitar o combate pela castidade281. Uma
vez que não se trata senão de um fenómeno da natureza, só um poder
que é mais forte do que a natureza pode livrar-nos dele: é a graça. E
por isso que a não-polução é marca de santidade, o selo da mais alta
castidade possível, benefício que podemos esperar, não adquirir.
Pelo seu lado, o homem não deve menos do que manter-se, no
que a si mesmo se refere, num estado de perpétua vigilância quan
to aos menores movimentos que podem produzir-se no seu corpo
ou na sua alma. Velar dia e noite, de noite pelo dia e de dia pen
sando na noite que virá. “Como a pureza e a vigilância durante o
dia dispõem a ser casto durante a noite, assim também a vigilância
nocturna fortalece o coração e lhe prepara forças para que observe
Ser casado
1 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, VII Homilía sobre a Epístola aos Hebreus, 4. Cf.
igualmente Contra os Inimigos da Vida Monástica, III, 14.
r
As Confissões da Carne 269
2 Sobre este ponto, cf. [J. DANIÉLOU e] H.-I. MARROU, Nouvelle histoire de
I 1’Églíse, Paris, 1963,1.1, p. 268.
270 Michel Foucault
3 Cf. sobre este apoio e os conflitos que lhe estão ligados, ibid., pp. 282 e sgs.
Cf., sobre o casamento, pp. 362-364.
As Confissões da Carne 271
14 [/¿zá.J
15 A proibição do incesto explicada pela obrigação da ligação a outrem não é
própria nem a São João Crisóstomo nem aos autores cristãos. Encontramo-la em
[nota incompleta].
í "As Confissões da Carne 277
Ft’ 1' *
’’Crisóstomo prossegue dizendo que é da mesma maneira que Cris-
* to “deixou o seu Pai para descer até à Igreja”16: “Sabes agora que
mistério é o casamento, de que grandes coisas é símbolo.”17 Esta
•' ideia vem de Orígenes18. Faz do casamento a figura que represen
ta de maneira sensível o laço que Cristo estabelece com a Igreja:
/ é o Esposo, é a alma e é a cabeça; é ele aquele que comanda19, ao
F passo que ela é a noiva; é o corpo da sua alma e o membro do seu
? corpo; deve obedecer-lhe. Ele veio até ela, por amor, quando os
homens a odiavam, a execravam, a insultavam20. Aceitou-a com
todos os defeitos que podia ter, todas as contaminações das quais
• -?. era portadora; mas, para velar por ela, para a ensinar, a esclarecer
e por fim a salvar. Como esposo perfeito, sacrificou-se por ela,
A tudo sofrendo e dilacerado mil vezes21. Mas em contrapartida o
-• laço de Cristo com a Igreja serve de modelo a todo o casamento:
é a mesma obediência que deve ligar a mulher ao homem; o mes-
mo primado dele sobre ela; a mesma tarefa de educação, e a mes-
>" ma aceitação do sacrifício para a salvar. O laço matrimonial deve
o seu valor ao facto de reproduzir, à sua maneira, a forma de amor
' que liga, o primeiro à segunda, Cristo à Igreja. “O lar é uma pe-
quena Igreja.”22
Duplo fundamento teológico do laço entre marido e mulher: na
’ Criação, por um lado, e na Redenção, por outro, na unidade subs-
” tancial da carne por um lado e na Encarnação por outro, na origem
dos tempos e na aproximação do seu fim. Isto permite a Crisósto-
|'mo aproximar o valor do casamento do da virgindade. Ou, mais
exactamente, não pensar o casamento como sendo apenas uma
incapacidade de uma vida de continência absoluta. E doravante
~ possível dar directamente ao casamento um valor positivo, ainda
9
M1
*
C' 16 |7tó/.,4.]
17 [SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, III Homilia sobre o casamento, 3.]
í 18 [Cf. por exemplo ORÍGENES, Homílias sobre o Cântico dos Cânticos.]
19 [SÃO PAULO, Epístola aos Efésios, 5,23.]
20 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, III Homilia sobre o casamento, 2.
21 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XX Homilia sobre a Epístola aos Efésios, 2.
278 Michel Foucault
23 Ibid., 9.
24 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, VII Homilia sobre a Epístola aos Hebreus, 4.
ík-,
A" 49 íbid.
F 50 \Ibid.}
286 Michel Foucault
71 SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XIX Homilia sobre a Primeira Epístola aos Co-
$
Illi ■intios,l.
Illi 72 Ibid.
73 Ibid.
294 Michel Foucault
>i74 Sobre o casamento como laço entre dois indivíduos livres, cf. [nota incom
pleta] .
,75 Ibid.
76 “Meizona tês dikaiôsunês amartian.”
s
296 Michel Foucault
ser, uma mesma vida, e falais ainda do teu e do meu! [...] Deus
tornou-nos coisas comuns mais necessárias do que as riquezas.”77
Por vezes também faz valer que, se o marido pode considerar co
mo seu o dote da mulher, esta pode assumir justificadamente que
o corpo do seu marido lhe pertence. “Não é estranho que o dote
que ela te traz seja objecto de toda a tua solicitude, e que evites
cuidadosamente tudo o que possa diminuí-lo, e que esses tesouros,
muito mais preciosos do que um dote, quero eu dizer, a continên
cia e a castidade, bem como a tua própria pessoa [...], tu os esban
jes e os corrompas?” A esta analogia dote da mulher/corpo do
marido, Crisóstomo acrescenta imediatamente a seguinte observa
ção que mostra melhor ainda a que ponto semelhante comparação
é inadequada à sua própria concepção da dupla propriedade mú
tua: “Se te sucede tocares no dote da tua mulher, é ao teu sogro
que tens de prestar contas; mas, se atentares contra a castidade,
será Deus a pedir-tas, Deus que instituiu o casamento e de quem
tens a tua esposa.”78 De facto, a partir do momento em que o nas
cimento de uma progenitura deixa de aparecer no horizonte do
casamento, o laço entre a conjunção física e a circulação dos bens
não pode ser mais do que da ordem de uma analogia mais ou me
nos bem fundada. Devemos reter contudo do recurso que a ela faz
Crisóstomo a sua vontade de marcar bem a presença de uma obri
gação de tipo formal e jurídico. Há para ele um direito interno ao
casamento, absolutamente simétrico entre os dois cônjuges, e que
decorre da propriedade mútua dos corpos.
Mas porque é que Crisóstomo pensa o casamento como trans
ferência de propriedade, mais do que como união, fusão, constitui
ção de um só ser — tema que evoca várias vezes mas que não
seria susceptível de fundamentar um laço de tipo jurídico? Preci
samente porque o corpo depois da queda é o lugar dos excessos da
concupiscência; e porque quem se casa para pôr limites a tais ex
cessos pede depois ao outro que assegure essa limitação. Cada um
79 [SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, XIX Homilía sobre a I Epístola aos Corintios, 1.]
298 Michel Foucault
ele. Porquê? Porque foi ela que o impeliu para o abismo do debo
che ao privá-lo da união legítima.”80 Mas, a esta obrigação, dá um
sentido extremamente limitado: concessão a uma necessidade físi
ca que reclama a indulgência e à qual não se deve opor uma recu
sa unilateral81; mas está fora de causa atribuir um valor espiritual
a semelhante concessão: “Não é cumprindo, enquanto esposa, os
seus deveres conjugais que a mulher poderá salvar o seu marido,
mas praticando abertamente a vida do Evangelho; o que muitas
mulheres, de resto, realizaram ainda que fora do casamento.”82
O auxílio que os esposos podem trazer-se um ao outro não passa
por aqui, ainda que tal deva ser conservado: “Não retiro absoluta
mente [à mulher] todo o concurso nas coisas espirituais — nem
Deus o quer! —, afirmo somente que o fornece não no exercício
do casamento, mas quando, embora continuando fisicamente sua
mulher, excede a sua natureza para se elevar à virtude dos homens
bem-aventurados.”83 A relação entre esposos, neste tratado em
que a vida de casado é apresentada nos seus inconvenientes, surge
como aquilo que deve, apesar de tudo, subsistir depois de alguém
se ter desligado suficientemente do casamento, e estar com a sua
mulher “como não a tendo”84. Em contrapartida, nas homilías
86 Muitos outros textos tratam dos mesmos temas: sermões, tratados que cor
respondem a questões pastorais precisas (De bono viduitatis, 414), a posições ju
rídicas (como o De conjugiis adulterinis, 419, a propósito do privilégio paulino).
304 Michel Foucault
- I -
geral liga ao mundo da carne. Mas esta renúncia tinha por corre
lativo — ao mesmo tempo efeito e condição, recompensa e caução
— um laço com Cristo. A alma virgem era a noiva ou a esposa de
Cristo; e, desta união, devia nascer uma infinidade de frutos espi
rituais.
Em Santo Agostinho, as relações entre virgindade, casamento e
fecundidade espiritual são muito mais complexas. Ao mesmo tem
po porque revestem outras formas que não somente a da correla
ção virgindade-núpcias com Cristo; e sobretudo porque estão im
plicadas no conjunto das relações de Deus com a sua Igreja, da
Igreja com Cristo, de Cristo com os fiéis, e de cada um destes com
o todo da comunidade. Além da escansão que isola as virgens re
lativamente aos outros fiéis, além das diferenças de estatuto que
marcam as pessoas casadas, as que o não são ainda, as que são
viúvas, as que levam uma vida de continência, as que se lhe con
sagraram por meio de votos, além da questão das formas e das
regras de vida, Santo Agostinho faz aparecer, através de tudo o
que deve constituir a Igreja como realidade espiritual e única, re
lações que supõem ao mesmo tempo virgindade e casamento,
núpcias e integridade, maternidade ou paternidade e castidade
absoluta. Já não se trata então de caracteres que poderíam afectar
indivíduos e designá-los como virgens, ou cônjuges, ou pais, mas
de um tecido cerrado de laços espirituais em que cada um dos
elementos é ao mesmo tempo, por referência aos outros, virgem e
esposo, progenitor e filho. Assim, virgindade e matrimonialidade,
a este nível, não se opõem como dois modos de vida alternativos,
mas conjugam-se como aspectos permanentes e simultâneos das
relações que formam a Igreja como unidade espiritual. Concebi
dos nestes termos, e sob a forma de virgindade fecunda ou de ca
samento virginal, não há diferença de valor entre virgindade e
casamento. Mas é sobre o fundo desta concepção das relações
espirituais entre Deus e o homem através da Igreja que Santo
Agostinho vai fundar e explicar a hierarquia que devemos respei
tar entre virgindade e casamento entendido no sentido carnal.
As Confissões da Carne 311
que todos aqueles que crêem nele são seus filhos e merecem ser
assim chamados, como diz São Mateus, “os filhos do esposo”107. A
Igreja, quanto a ela, é “a virgem de Cristo”, unida a ele de maneira
espiritual108; corporalmente, não pode ser chamada virgem senão
quanto a alguns dos seus membros, não o sendo quando conside
ramos aqueles de entre os fiéis que são casados109. Esposa-virgem
de Cristo, a Igreja é mãe dos cristãos porque é ela que o faz nascer
no Espírito ao acolhê-los no baptismo110; mas, na medida em que a
comunidade dos santos constitui o corpo místico de Cristo, for
mando-os, gestando-os, é também mãe de Cristo, como o são
aqueles “que fazem a vontade do Pai”; “a Igreja entre os santos que
possuirão o reino de Deus é, segundo o espírito, inteiramente mãe
de Cristo”111. E devemos acrescentar ainda que toda a alma piedo
sa individualmente tomada é filha de Cristo, uma vez que foi dada
à luz a partir das núpcias deste com a Igreja, irmã de Cristo, uma
vez que tal como ele cumpre a vontade de Deus112, e mãe de Cris
to, uma vez que o fez nascer nela, sendo, à imagem de Maria,
aquela que faz o que o Pai quer113.
Santo Agostinho descreve, pois, uma rede de relações espiri
tuais que se reproduzem e se invertem, fazendo de cada um dos
quatro elementos do conjunto — Cristo, Maria, a Igreja, as almas
— virgens e cônjuges, genitores e filhos. Casamento, fecundidade,
virgindade não definem a posição ou a qualidade intrínseca de um
de entre eles, mas permitem descrever as diferentes relações que
simultaneamente cada um mantém com todos os outros. Podemos
por isso dizer que, no sistema das relações espirituais, casamento
e virgindade não podem ser dissociados (e a sua não-dissociação é
manifestada pela sua fecundidade), mas que nenhum dos dois ter-
r '<
: mos pode ser considerado superior ou inferior ao outro. Ora, desta
116ZWrf.,vn(7).
117 Ibid.
As Confissoes da Carne 315
- II -
119 Gregorio de Nissa não supõe que a primeira falta foi sexual: tratava-se somen
te de um abandono ao prazer em geral. Cf. M. AUBINEAU, nota à tradução do De
sancta virginitate,p.42O.
As Confissoes da Carne 317
123 SANTO AGOSTINHO, De catechizandis rudibus, XVIII, 29: “Fecit illi etiam
adjutorium feminam [...] ut haberet et vir gloriam de femiha, cum ei praeiret ad
Deum, seque illi praeberet imitandum in sanctitate atque pietate, sicut ipse essei
gloria Dei, cum ejus sapientiam sequeretur.” [“Depois, para o ajudar, criou a mu
lher [...]. Tinha em vista que para si o homem fizesse da mulher um título de glória,
quando avançasse diante dela direito a Deus e se oferecesse à sua imitação por
meio da santidade e da piedade, tal como ele mesmo seria um título de glória para
Deus, quando imitasse a sua sabedoria”, tradução de G. Combés.]
As Confissões da Carne 319
■
J1! 124 Sobre esta passagem, cf. o comentário de P. Agaesse e A. Solignac in (Euvres
'de saint Augustin, t. 49, De Genesi ad litteram (VIll-XIl), Paris, Desclée de Brou-
wer, Bibliothèque augustinienne, 1972, pp. [516-530], nota 42.
«p 125 [Manuscrito: “capítulo”.]
322 Michel Foucault
126 O que não quer dizer que, no casamento, a mulher não possa desempenhar o
papel espiritual. Trata-se aqui do seu destino originário.
127 SANTO AGOSTINHO, De Genesi ad litteram, IX, 5, 9.
128/Wrf.,IX,9,14 e 15.
As Confissões da Carne 323
130 “Propter quid aliud secundum ipsum quaesitus est femineus sexus adjutor,
nisi ut serentem genus humanum natura muliebris, tamquam terrae fecunditas,
adjuvaref' [“Por que outra razão Deus dotou o homem de uma auxiliar de sexo
feminino semelhante a ele, senão para que a natureza da mulher, como uma terra
fértil, o secundasse na sementeira do gênero humano”, tradução de P. Agaêsse e A.
Solignac], SANTO AGOSTINHO, De Genesi ad litteram, IX, 9,15.
As Confissões da Carne 325
- III -
138 “Propter amicitiam sicut nuptiae vel concubitus", ibid., IX (9). Sobre o “vel
concubitus”, cf. infra, pp. 328-330.
139 “Homo humani generis pars est et sociale quiddam est humana natura”, ibid.,
!(!)•
328 Michel Foucault
deixarão de ter o seu lugar, uma vez que a cidade celeste admitirá
somente relações espirituais. E a que é evocada por várias vezes
noutras passagens141: trata-se então da situação actual do gênero
humano. Agostinho caracteriza-a por um facto e uma tarefa. O
estado de coisas é um povoamento já bastante abundante: foi asse
gurado, e continua ainda a sê-lo, por um grande número de pessoas
que, casadas ou não, não praticavam a continência; oferecendo as
sim uma grande “provisão de sucessões”. A tarefa: é a que consiste
em ligar a partir de tantos seres humanos santas amizades, e em
formar assim, pouco a pouco, através de todas as nações, um “vas
to parentesco espiritual”, uma “sociedade santa e pura”. O presente
deve pois ser pensado menos na urgência do que na longa duração;
menos como um termo iminente do que como um equilíbrio a
deslocar lentamente. O De bono conjugali não anuncia a entrada
numa idade da virgindade, em que o casamento, até então necessá
rio, deverá ser abandonado; mostra antes, mantendo embora, bem
entendido, o horizonte do fim dos tempos, a existência de um pe
ríodo, o nosso, no qual a proliferação do gênero humano, graças às
uniões físicas, será como que a matéria necessária à multiplicação
de parentescos espirituais. Virgindade e matrimonialidade poderão
achar-se portanto associadas, cada uma delas no seu lugar, de acor
do com o princípio de que o conjunto em que se compõem é ainda
mais belo do que a mais bela das duas.
Agostinho redefine assim, em profundidade, a escansão que era
de maneira bastante geral reconhecida antes dele: momento da vir
gindade paradisíaca, na inocência que precede a queda; depois,
tempo do casamento e da fecundidade, sob a lei da morte; depois,
regresso à virgindade, quando chega a salvação e o tempo se acaba.
A escansão que se desenha no De bono conjugali é muito diferente:
não faz alternar num ciclo virgindade e casamento; marca antes as
diferentes maneiras de constituir a societas, que é, em qualquer ca
141 Assim em XIV (32), ibid:. “Na nossa época, é melhor, de todos os pontos de
vista, e mais santo não buscarmos uma descendência carnal [...] e submetermo-
-nos espiritualmente ao único esposo, Cristo.”
330 Michel Foucault
144ZWd.,I(l).
145 Ibid.
146 “Naturalis ín diverso sexu societas", ibid., III (3).
147 “Amicalts quaedam et germana conjunctio", ibid., I (1). Notar que esta con
junção é aqui definida pela relação de obediência e de comando.
332 Michel Foucault
certas condições, está bem que seja assim —, não é dele condição
e a sua ausência não o compromete. E Agostinho apresenta dois
testemunhos de que assim é. O casamento existe entre pessoas
idosas, ainda que a estas seja impossível procriar, ou que os seus
filhos tenham já morrido; em qualquer dos casos, o laço subsiste,
independentemente da progenitura148. Do mesmo modo, o casa
mento não pode ser desfeito quando, contraído em vista de se te
rem filhos, permanece estéril a despeito dos esposos149.
A esta relação o De bono conjugali dá regularmente o nome de
pactum ou à&foedus, cujas conotações jurídicas são evidentes150.
Examinando as coisas de mais perto, Agostinho desenvolve a sua
análise em dois registos. Refere-se, com efeito, ao tema de um laço
que recebería uma caução institucional ou das regras de direito, ou
da lei divina; ora, o direito civil é invocado como revelador a pro
pósito da forma do laço matrimonial: assim, a lei romana manifes
ta o carácter exclusivo deste laço, uma vez que proíbe o marido de
tomar uma segunda esposa enquanto a primeira viver151; ora, as
leis religiosas fazem valer princípios justos que as regras da socie
dade ignoram: assim impedem —diferentemente das leis civis —
o novo casamento de um esposo cuja mulher cometeu adultério152.
Mas Agostinho faz entrar em jogo também o pactum num outro
registo, o das relações entre as almas e entre os corpos: apego das
almas que constitui entre os esposos — e independentemente do
ardor físico, muitas vezes até mesmo com uma intensidade inversa
da sua — um ordo caritatis', mas também laço físico, no sentido
de cada um dos dois cônjuges reservar o seu corpo para o outro.
Na famosa passagem da Primeira Epístola aos Corintios — “o
corpo da mulher não está em seu poder, mas no do marido, e de
modo semelhante o corpo do marido não está em seu poder, mas
no da mulher” (7, 4) —, vê-se geralmente a afirmação do direito
153 [ZWd.,IV(4).]
154 Notar a propósito deste princípio de não-traição a expressão de AGOSTINHO:
“Cui fidei tantum jurís tribuit Apostolus, ut eam potestatem appellaret” ([Subli
nhado por M. F. “O Apóstolo atribui a esta fidelidade um tal carácter de justiça que
lhe chama poder”, tradução de G. Combés]), ibid., IV (4).
334 Michel Foucault
157 Ibid., XXIV (32), cf. também VII (6): “Usque adeofoedus illud initum nuptia-
le cujusdam sacramenti res est, ut nec ipsa separatione irritum fiai” (e a continua
ção) [“O contrato social é a tal ponto sagrado que nem mesmo a separação pode
rompê-lo”, trad. G. Combés).
158 Ibid., XV (17).
As Confissões da Carne 337
Que o acto sexual não seja em si mesmo mau não significa que
seja sob todas as suas formas e em todos os casos aceitável. Agos
tinho faz intervir várias formas de limitações. Umas pertenciam já
à moral antiga. As outras são mais específicas da doutrina cristã.
As primeiras são as que, de um modo geral, prescrevem a “tempe
rança” e a rejeição de toda a forma de “excesso”. Ora, como se
define a temperança? Pela manutenção no “uso natural”168. E este
uso natural é, para Agostinho como para a tradição antiga, o acto
sexual quando tem a forma que permite eventualmente a procria-
ção. Mas, relativamente a este uso natural, podem ser cometidos
dois tipos de faltas, entre as quais Agostinho não marca uma se
paração muito nítida, embora marque entre elas uma grande dife
rença moral. Por um lado, há o simples “excesso” quantitativo; é
aquele a que nos entregamos indo “para lá da necessidade da
propagação”: gestos feitos e prazeres tomados que não são sim
plesmente os que requer o acto sexual “natural”, mas que o acom
panham ou o preparam. Por outro, há os actos contranatura, que
são definidos pelo uso de uma parte do corpo da mulher que a tal
não é destinada169. As primeiras de entre estas faltas não são mui
to consideráveis. As segundas, em contrapartida, são muito graves.
Sob reserva desta hierarquia, Agostinho condena-as numa fórmu
la que poderiamos encontrar entre os filósofos da Antiguidade: “A
honra conjugal é a castidade na procriação.”170
Mas faz intervir também outros princípios de regulação do acto
sexual. Esses mesmos a que se referia Crisóstomo na mesma épo
ca. Abrem a possibilidade de legitimar entre os esposos actos se
xuais que não têm fim procriador: na condição de cada um dos
dois parceiros não ter em vista senão evitar ao outro pecados
maiores — aqueles que cometeríam ou fora do casamento, ou os
que seriam contra as regras da natureza. Aqui já não se trata do
168 A temperança tem por papel "redigere" o prazer, a delectatio, “in usum natu-
ralem”, ibid., XVI (18).
169 íbid.,Xl (12).
nOIbid.
As Confissões da Carne 341
171 Sobre uma outra citação deste mesmo texto e a sua interpretação como regra
de fidelidade, cf. supra, p. [337].
172 De bono conjugali, VI (6).
342 Michel Foucault
178ZWd.,XVI(18).
179 [Retractationes, II, 22 (21)].
180 De bono conjugali, XIII (15).
181 ftírf.,XVII(19).
As Confissões da Carne 345
[A LIBIDINIZAÇÃO DO SEXO]
¿I
A conjunção física dos sexos, quando se faz no casamento
dando-se por fim a procriação, é pois, como diz o De bono conju-
gali, isenta de falta: ihculpabilis^2. Deveremos ir mais longe?
Vimos que tinha o seu lugar, na criação do ser humano, antes
da falta e da queda, ainda que não tivesse então realidade: era a
obra de Deus que a destinava à constituição de um género humano
como “sociedade”. No casamento de hoje, tem ainda esse papel,
uma vez que é necessária à procriação; e esta procriação constitui
um dos fins e um dos bens da conjugalidade. Por conseguinte, não
poderemos considerá-la um bem — um bem originariamente dis
posto por Deus e mantido depois da queda? Não nos arriscaremos
a ser levados a passar do bonum conjúgale ao bonum sexualel
Uma breve evocação, na Cidade de Deus, do que o acto sexual
é na sua forma e no seu desenrolar-se permite-nos cingir o proble
ma. Agostinho retoma aí muito fielmente a descrição clássica do
paroxismo sexual com os seus três pontos essenciais: um abalo
físico do corpo que não é possível dominar, uma comoção da alma
que é arrebatada contra vontade pelo prazer, um eclipse final do
pensamento que parece aproximá-lo da morte. “O desejo {libido')
através qual são excitadas as partes vergonhosas do corpo” não se
- I -
202 “Os seus olhos abriram-se; e então viram que estavam nus, mas com olhos
perversos, aos quais essa simplicidade, indicada pela palavra nudez, parecia ver
gonhosa. E como já não eram simples com ‘folhas de figueira, fizeram para si
umas cintas’, como para se cobrirem e esconderem a simplicidade da qual corava
o seu orgulho astucioso", SANTO AGOSTINHO, De Genesi contra Manichaeos,
11,15,23.
203 SANTO AGOSTINO, De Genesi ad litteram, XI, 31 (41).
Confissões da Carne 357
- II -
213 Ibid., XIV, 16; cf. no De nuptiis et concupiscentia, II,'35 (59), uma alusão ao
excesso de rapidez ou de lentidão através do qual os órgãos sexuais decepcionam
a vontade.
214 Ibid., 1,6 (7).
215 Ibid., I, 8 (9).
362 Michel Foucault
possa bem ser solene, enquanto ainda assim o acto legítimo dos
esposos, “embora aspirando a ser conhecido, não faria corar me
nos a ser visto”216. A distinção entre conjunção sexual e movimen
to da libido, que a reflexão e a exegese permitem em teoria esta
belecer, escapa em contrapartida à vontade e não pode ser
realizada na prática. A esses órgãos destinados à procriação desde
a origem, mas abalados desde a queda por movimentos dos quais
não podem livrar-se, os homens, observa Agostinho, dão o nome
de “natureza”217.
“Natura”, “sui júris”. Deveremos então compreender que a li
bido releva de uma natureza estranha ao próprio sujeito, que se
lhe impõe como um elemento exterior, e que a queda desapossou
de certo modo o sujeito da sua própria carne, a ponto de esta agir
sem ele? Pelo que não se lhe poderia imputar o que nela se passa?
Deveremos considerar que a libido está fora do sujeito? Se é uma
natureza, como não pedir dela contas a Deus — e ser-se portanto
levado ou a vê-la como criação de um Deus mau, como os mani-
queístas fazem, ou a nada nela reconhecer, como fazem os discí
pulos de Pelágio, que seja intrínsecamente mau? Em suma, se é
sui juris, como pode essa natureza ser imputada ao sujeito? Para
responder a estas questões, Agostinho teve de definir por um lado
as relações da libido com a alma (o que assegura o princípio da
imputabilidade) e a fixar por outro lado o estatuto da libido por
referência ao pecado (o que permite estabelecer o que pode ser
imputado).
218 Sobre este tema, cf. o artigo de A. SAGE, “Le péché originei dans la pensée de
saint Augustin”, Revue d’études augustiniennes, t. 15,1969.
219 SANTO AGOSTINHO, A Cidade de Deus, XIV, 13-15.
220 SANTO AGOSTINHO, De nuptiis et concupiscentia, I, 32 (37). Agostinho
fala de mutatio naturae.
364 Michel Foucault
228 A propósito de Abraão, AGOSTINHO diz que Deus lhe devolveu a fecundida-
de que perdera, para gerar Isaac, mas não a concupiscência, que continua a ser no
corpo o que era. Enquanto Juliano de Eclana cria poder extrair da tese agostiniana
a proposição de que Deus deveria ter devolvido a Abraão uma concupiscência de
clarada todavia má, ou que Isaac nascera fora de toda a concupiscência, Contra Ju-
lianum, III, 23. Cf. igualmente SANTO AGOSTINHO, Opus imperfectum, V, 10.
229 SANTO AGOSTINHO, De nuptiis et concupiscentia, 1,25 (28); cf. igualmen
te Opus imperfectum, V, 10.
230 [SANTO AGOSTINHO, De nuptiis et concupiscentia, I, 23 (25).] Cf. o reto
mar desta tese no Contra Julianum, VI, 60.
231 SANTO AGOSTINHO, De nuptiis et concupiscentia, 1,23 (25).
As Confissões da Carne 371
xado de ser ela mesma um pecado, continua a ser aquilo que liga
o pecado original (do qual é estruturalmente efeito) aos pecados
actuais (cujo princípio é geneticamente).
Sob que forma subsiste? Como a projecção, a sombra produzida
pela queda da qual é de certo modo a consequência analógica.
Pelo facto de a queda ser degradação do ser, a concupiscência é ela
mesma fraqueza e enfermidade. No vocabulário médico que é
correntemente utilizado na literatura cristã para designar o peca
do, Agostinho, quando quer fazer valer a diferença das noções,
utiliza de preferência os termos de ferida ou doença para falar do
próprio acto do pecado, e os termos de disposição (affectio ou
valitudò) ou de fraqueza (languor) para falar da concupiscência.
Uma passagem das últimas páginas do De nuptiis et concupiscen-
tia mostra bem este jogo de vocabulário: “As feridas (vulnerã)
infligidas ao corpo fazem manquejar os membros ou tornam difí
ceis os seus movimentos [...]. A ferida a que chamamos pecado
[aqui Agostinho refere-se ao pecado original] fere a própria vida,
da qual o homem vivia segundo a justiça [...]. Assim, através des
te grave pecado do primeiro homem, a nossa natureza presente
nele conheceu a degradação (in deterius commutatd): não só se
tornou pecadora, como engendrou ainda pecadores. E contudo
esta enfermidade ela mesma, que destruiu a força de bem viver,
não é seguramente uma natureza, mas um vício (non est utique
natura, sed vitiuníy, como por certo um mau estado de saúde, para
o corpo (mala in corpore valetudo), não é de maneira alguma uma
substância ou natureza, mas um vício; e as mais das vezes, embo
ra nem sempre, as disposições doentias dos pais são de certo modo
transmitidas pela geração e manifestam-se no corpo dos filhos.”232
Mas o elemento correlativo e indissociável desta enfermidade
que caracteriza a concupiscência é a força dos movimentos da
mesma concupiscência. Aquilo por que é fraca, como a vontade do
232 Ibid.., II, 34 (57). Esta passagem desenvolve as indicações do livro I, 25 (28).
Juliano de Eclana criticara estes dois textos e AGOSTINHO responde-lhe no Con
tra Julianum, VI, 53-56, e no Opus imperfectum, VI, 7.
372 Michel Foucault
233 “Agit autem quid nisi ipsa desideria mala et turpia", SANTO AGOSTINHO,
De nuptiis et concupiscentia, 1,27 (30).
234 Ibid., I, 28 (31).
As Confissões da Carne 373
- Ill -
como mal, era possível juntar, num mesmo tema de combate espi
ritual, o exercício da virgindade e a prática do casamento. Nos dois
estados é do mesmo mal que se trata, é a mesma renúncia à forma
concupiscente da vontade que se exige: sendo a diferença que, no
casamento, o não-consentimento passa por uma certa forma de
uso da qual a virgindade habilmente se afastará. Os dois estados
definem-se como práticas não demasiado diferentes frente à con
cupiscencia da qual há agora uma teoria susceptível de justificar
ambos, com a sua diferença de valor mas também o seu laço in
trínseco. E sobretudo podemos ver que, numa concepção assim, as
noções de consensus e de usus não servem para definir directa
mente as relações entre esposos. Não fundamentam a sua codifi
cação senão através do consentimento (ou do não-consentimento)
que cada um concede à sua própria libido, ou através do uso (bom
ou mau) que cada um faz da sua própria libido. Quer dizer que
toda a regulação das condutas sexuais pode doravante fazer-se a
partir da relação que cada um deve manter consigo mesmo. A
problematização das condutas sexuais — quer se trate de saber o
que são na verdade ou de definir o que deveríam ser — torna-se o
problema do sujeito. Sujeito de desejo, cuja verdade não pode ser
descoberta senão por ele mesmo no fundo de si mesmo. Sujeito de
direito, cujas acções imputáveis se definem e repartem como boas
ou más segundo as relações que ele tem consigo mesmo.
Numa palavra, podemos dizer que o acto sexual no mundo an
tigo é pensado como “bloco paroxístico”, unidade convulsiva em
que o indivíduo se afundava no prazer da relação com o outro, a
ponto de mimar a morte. Deste bloco não se punha a questão de
fazer a análise, era necessário somente ressituá-lo numa economia
geral dos prazeres e das forças. Este mesmo bloco foi dissociado,
no cristianismo, por regras de vida, por artes de condução de si
mesmo e de condução dos outros, por técnicas de exame ou pro
cedimentos de confissão, por uma doutrina geral do desejo, da
queda, da falta, etc. A unidade, no entanto, recompôs-se, já não em
torno do prazer e da relação, mas do desejo e do sujeito. Recompôs-
-se em termos tais que a difracção permanece e que a sua análise
As Confissões da Carne 383
-1 -
- II -
2 [FAUSTE DE RIEZ, Discours aux moines sur la pénitence (P. L., t. 58, col.
875-876), citado in C. VOGEL, Le pêcheur et lapénitence dans 1'Eglise ancienne,
Paris, 1966, p. 131.]
3 J. CASSIANO, XVIII, 15. Notar a expressão “locum paenitentiae suppliciter
postulavit" para significar que Pafnúcio pediu a penitência. Trata-se da forma tra
dicional para se solicitar o estatuto, o lugar de penitente.
394 Anexos
o caso para o abade; o qual por seu turno deve exercer o seu direi
to soberano de julgar. Comporta também um princípio de propor
cionalidade: “É pela gravidade da falta que deve medir-se a exten
são da excomunhão ou do castigo; esta gravidade é remetida para
o juízo do abade.” Comporta uma distinção precisa que separa as
faltas públicas daquelas “cuja matéria é escondida”: as últimas
devem ser reveladas somente ao abade e a alguns anciãos capazes
de “cuidarem das suas próprias feridas e das dos outros”. Compor
ta por fim um princípio de correcção progressiva (as punições não
são as mesmas conforme o culpado tenha mais ou menos de quin
ze anos; a reincidência modifica a pena; o abade verbera o delin
quente e deve velar muito particularmente sobre ele)14.
Numa palavra: a instituição monástica, na medida em que se
apresentava como lugar de vida penitencial permanente, mobili
zou todo um conjunto de procedimentos susceptíveis de garantir a
remissão do mal — expulsando-o, corrigindo-o ou curando-o.
Num extremo encontramos as formas rituais e ostensórias da exo-
mologese; num outro as técnicas de exame e de confissão no dis
curso de exagoreusis; e entre os dois os métodos destinados a
punir em função de um código que define a gravidade das faltas e
dos castigos proporcionais. Entre a manifestação da verdade atra
vés dos “factos e gestos” do estatuto penitencial (espécie de veri-
-ficaçãó) e a sua enunciação numa relação permanente de direc
ção (yeri-dicçãó), a regra monástica faz aparecer o que se tornará
mais tarde, no cristianismo ocidental, a forma mais importante da
relação entre o mal e a verdade, entre o “fazer-o-mal” e o “dizer-
-a-verdade” — a saber, a jurisdição.
14 Regra de SÃO BENTO, XXIV, XLIV, XLVI; cf. Regra do Mestre, XIV.
398 Anexos
17 Ibid.
18 POMÉRIO, De vita contemplativa, II, 7 (P. L., t. 59, col. 451-452).
19 Ao expor as três formas de penitência — a que precede o baptismo, a que
deve caracterizar a vida inteira, e a que deve corresponder a faltas graves, SANTO
AGOSTINHO, no sermão 351 (7), diz [da última] que ela deve ter lugar “pro
illis peccatis [...] quae legis decalogus continent” [tradução: “para os pecados
contidos no Decálogo”]. No sermão 352 (8), falando ainda desta terceira forma
de penitência, diz que se refere aos ferimentos graves: “Talvez seja um adultério,
um homicídio, um sacrilégio; em todo o caso, é uma matéria grave e uma ferida
perigosa, mortal, pondo em perigo a salvação.”
20 Cf. C. VOGEL, La discipline pénitentielle en Gaule, Paris, 1952, p. 91. Esta
lista dos pecados mortais não deve evidentemente ser confundida com os pecados
capitais que relevam de um outro tipo de análise, uma vêz que se trata de definir
a raiz, “o espírito” que pode conduzir ao pecado. Esta definição de oito “espíritos
maus” foi inicialmente de tradição monástica. Encontramo-la em Evágrio e Cas-
siano. Cf. A. GUILLAUMONT, “Introdução” ao Tratado Prático [de EVÁGRIO
PÔNTICO].
400
Anexos
21 SÃO CIPRIANO, De lapsis, XXVIII (P. L., t. 4, col. 488). Notar contudo que
até mesmo no caso das faltas leves São Cipriano parece indicar que se deve tomar
por um tempo o estatuto de penitente, segundo o ritual canónico (cartas XVI, 2, e
XVII, 2).
22 POMÉRIO, De vita contemplativa, II, 1.
23 SANTO AGOSTINHO, Sermão, 351.
As Confissões da Came 401
- III -
46 Zacarias, 10,8.
47 In S. MORENZ, La Religion des Égyptiens, Paris, 1962, p. 94.
48 Salmos, 68,8.
49 R. LABAT, Le Caractère religieux de la royauté assyro-babylonienne, Paris,
1939, p. 352.
408
Anexos
de de cada um. O que quer dizer, em primeiro lugar, que deve ter
em conta tanto quanto possível a mais pequena das diferenças: o
pastor dos homens não deverá nunca esquecer que “entre eles como
entre os actos, há dissemelhanças, além de que nenhuma coisa hu
mana, por assim dizer, se mantém estável”. O que quer dizer tam
bém que a lei, como imperativo geral imposto do mesmo modo a
todos, não é por certo para o pastor das multidões “o procedimento
de governo mais correcto”. O que quer dizer finalmente que aquele
não pode desempenhar o seu papel de pastor a não ser aproximando-
-se de cada ovelha; tendo em conta a sua idade, a sua natureza, a sua
força e a sua fraqueza, o seu carácter e as suas necessidades, deve
“prescrever-lhe com exactidão o que lhe convém”, a ela e a ela só55.
Tal é sem dúvida um dos traços mais característicos da modalidade
pastoral do poder: este tem a seu cargo o rebanho inteiro, mas deve
modular os cuidados a dar a cada uma das cabeças que o compõem.
Poder sobre multiplicidades que unifica e ao mesmo tempo poder
de decomposição que individualiza. Omnes et singulatim, segundo
uma fórmula que continuará a ser por muito tempo aquilo a que
poderiamos chamar o “paradoxo do pastor”, o desafio maior que a
pastoral do poder deverá incessantemente relevar.
58 Graças ao pastor, os animais não sofrem fome nem sede, “o sol e o calor não
os atingem”, [Isaías, 49,10].
59 PLATÃO, Ai Leis, 735a-736c.
60 Comentário rabínico do Êxodo, citado por PH. DE ROBERT, Les Bergers
d’Israel, p. 47.
As Confissões da Carne 411
65 Jeremias, 23,2.
As Confissões da Carne 413
para o pastor de ser tão puro e tão perfeito quanto possível: “Es
tando obrigado pelo seu cargo a retirar do coração dos outros o
que possam ter de impuro, não deve ter impureza alguma no seu
próprio coração.”71 Mas importância também para não cair no
pecado de orgulho, e na cegueira do desconhecimento das suas
próprias fraquezas, de não se atribuir superioridade alguma e até
mesmo de conservar sempre presentes no espírito as suas próprias
imperfeições7273
: servidor de todos, pescador entre os outros, e
mesmo com mais gravidade do que os outros, uma vez que terá de
reconhecer as suas fraquezas nos pecados do rebanho.
e. O que faz com que o pastor não deva tirar nem orgulho algum
por ter sido designado, nem razão alguma por exercer uma domi
nação (potestas)'"'. Seguindo o exemplo de São Gregorio, deve
tremer quando se vê encarregado da condução das almas, apreen
são que não deve nunca perder de vista se quiser esconjurar “o
orgulho, os pensamentos ilícitos, os pensamentos importunos e
iníquos”. E seria, contudo, pecado esquivar-se a esse dever e dei
xar as ovelhas sem pastor74.
Entre o pastor cristão e o seu rebanho, a economia própria do
pecado e da salvação, o contágio e a multiplicação das faltas, a
troca dos sacrifícios, a vigilância sobre si mesmo que não pode
separar-se nunca da solicitude para com os outros estabelecem
laços muito mais numerosos, complexos e sólidos do que os que
encontramos na temática antiga do pastor. E, sobretudo, a indivi
dualidade do laço desempenha agora um papel essencial: devido à
comunicação directa que se estabelece entre cada acto de cada fiel
78 Os que não praticam o que ensinam “destroem por meio dos seus costumes
corruptos o que se esforçam por estabelecer por meio das suas palavras”; são como
pastores que bebem uma mesma água clara, mas a corrompem com os seus pés su
jos e não deixam às ovelhas mais do que uma água enlameada, SÃO GREGORIO,
O GRANDE, Regra Pastoral, livro I, capítulo 2.
79 São Gregorio estabelece também na Regra Pastoral trinta e seis distinções que
é necessário ter em conta para bem se instruírem os fiéis.
80 [Ibid., livro I, capítulo 4.]
81 Ezequiel, 8,8.
82 GREGORIO, O GRANDE, Regra Pastoral, livro II, capítulo 9.
418 Anexos
“Enuncia a tua falta a fim de destruíres a tua falta”, diz São João
Crisóstomo, na segunda das Homilías sobre a penitência.
E lembra-te que Deus, depois do crime, interrogou Caim. Não
que tivesse necessidade da sua resposta para saber o que a voz do
sangue clamava já sobre a terra. Queria somente que o assassino
dissesse: sim, matei. Pedia-lhe que, pelo menos, reconhecesse:
homo homologeis tautà™. E é porque Caim se recusa a reconhe
cer, é porque afirma “não saber”, que Deus vai puni-lo. Duas ex
pressões utilizadas por São João Crisóstomo merecem ser retidas.
Porque Caim não foi o primeiro a dizer a sua falta, Deus recusa-se
não directamente a perdoar-lhe o seu acto, mas a “acolhê-lo na
metanoia”: o que quer dizer que a ausência de confissão retira a
Caim a própria possibilidade de se arrepender, de se converter, de
se afastar (ou ser afastado) do crime cometido; era necessário que
dissesse o crime para dele se desprender. Além disso, e por conse
guinte, o que Deus vai castigar é menos o próprio homicídio do
que a impudência de Caim88 89. Termo importante, o de anaideiat
grande para ser perdoado. Mas esta confissão não vale, porque não foi feita a tempo
— en kairô. Este problema do momento é igualmente importante na doutrina e na
prática da penitência.
422
Anexos
morte e não a sua realização a ficar a dever-se à falta, Deus não teria
falado de uma sucessão temporal, mas de uma implicação necessá
ria; teria dito “se comerdes dele, morrereis”. Devemos, pois, conce
ber que o homem, ao sair das mãos do Criador, trazia em si a possi
bilidade da morte: como um corpo absolutamente são, e que não foi
atingido por forma alguma nem de doença nem de envelhecimento,
pode ser dito mortal. Mas é num sentido diferente que dizemos estar
exposto a morrer um corpo doente. Tal foi o caso da humanidade
depois da queda: “Esta vida, não digo somente desde o nascimento,
mas desde o primeiro instante da nossa concepção, que outra coisa
é senão uma espécie de doença incipiente que fatalmente nos con
duz à morte?”9899 Devemos, por isso, distinguir entre a mortalidade e
a morte, ou antes, devemos definir a mortalidade anterior ao pecado
como condição ontológica do homem tal como foi criado. Longe de
marcar um defeito, era susceptível de marcar a sua virtude e a sua
sabedoria, a partir do momento em que permanecesse em suspenso
a título de condição geral enquanto o homem seguisse fielmente a
lei de Deus. E devemos definir a mortalidade posterior ao pecado
como o caminhar efectivo da morte durante uma vida inteira cuja
falta original faz, para todos os homens, uma espécie de longa doen
ça. A mortalidade da condição humana não é o efeito de uma cor
rupção, ainda que tenha chegado um dia em que todos os homens,
fatalmente, morrem da corrupção dos seus corpos".
Por outro lado e simetricamente, Agostinho dissocia, da corrup
ção, o acto sexual pelo menos no seu princípio e na sua possibili
dade originária. Uma passagem de A Cidade de Deus é sobre este
ponto particularmente significativa. Na preocupação de manterem
o princípio de uma existência paradisíaca incorrupta, muitos exe-
getas negavam toda a relação física entre Adão e Eva antes da sua
falta. A humanidade anterior à queda era, pois, virgem, e a virgin-
A BÍBLIA1
Antigo Testamento
Gênesis
Pp. 53,58,181-182,185,205-206,279, 289,317, 321-322,355,411,425,
. 427
Êxodo
Pp. 403,410
Levítico
Pp. 28,46,50,186,191,339
Samuel
P.422
Salmos
Pp. 404,407
Provérbios
P. 132
Isaías
P.410
Jeremias
Pp. 48,406,411-412
Ezequiel
Pp. 28,401,408-409,417
1 Michel Foucault não se atém nunca a uma só tradução: pode citar a tradução
de Louis Segond, a da Bíblia de Jerusalém (Paris, Éd. du Cerf, 1977) ou a dos
tradutores de tratados patrísticos.
432 índice das obras citadas
Zacarias
P.407
Apocalipse
Pp. 188-190
Novo Testamento
AUTORES ANTIGOS2
Abreviaturas
2 Menciona-se para cada obra a tradução ou edição que Michel Foucault consultou
habitualmente. No entanto, muito pontualmente, poderá referir-se a outra fonte — por
exemplo, para Santo Agostinho: Monsenhor Péronne et al., Paris, L. Vivès, 1869-
-1878; ou para São João Crisóstomo: Padre Bareille et al.,Paris, L. Vivès, 1865-1873,
ou ainda: Padre Joly, Nancy, Bordes Frères, 1864-1867. Há que dizer que as citações
podem ter sido reformuladas por Foucault a partir do texto latino ou grego (de resto,
não hesita em se referir directamente à Patrologia, grega ou latina, de Migne).
As Confissões da Carne 433
SANTO AGOSTINHO
De bono conjugali, texto estabelecido e traduzido em francês por G. Com-
bès, B. A., 1948.
Pp. 273, 303,308,318,321, 325-344,346,349
De bono viduitatis, texto estabelecido e traduzido em francês por J. Saint-
-Martin, B. A., 1939.
Pp. 303,305,309
De catechiz.andis rudibus, texto estabelecido e traduzido em francês por
G. Combès e A. Farges, B. A., 1949.
Pp. 317-318
De conjugiis adulterinis, texto estabelecido e traduzido em francês por G.
Combès, B. A., 1948.
P. 303
De continentia, texto estabelecido e traduzido em francês por J. Saint-
-Martin, B. A., 1939.
Pp. 165, 206,303
Contra duas epistulas Pelagionorum, texto estabelecido e traduzido em
francês por F.-J. Thonnard, E. Bleuzen e A. C. De Veer, B. A., 1974.
P. 351
Contra Faustum, P. L., tomo 42.
P.425
Contra Julianum, texto traduzido por Abade Burleraux, in CEuvres com
plètes de saint Augustin, sob a direcção de Monsieur Poujoulat e Abade
Raulx, Bar-le-Duc, 1864-1872,17 volumes, tomo XVI, 1872.
Pp. 308, 326,347-349,351,354,358,367,370-371, 374-375,379
La Cité de Dieu, texto traduzido em francês por G. Combès, B. A., 1959-
-1960.
Pp. 321,323,325,346-347,351-352,357,359-365,428-429
Discours sur les Psaumes, P. L., tomos 36 e 37.
Pp. 117-118,202,359
434 índice das obras citadas
SANTO AMBRÓSIO
Apologia de propheta David, texto traduzido em francês por M. Cordier,
S. C„ 1977.
Pp. 114,117
De Cain et Abel, P. L., tomo 14.
P. 117
Enarrationes in Psalmos Davidicos, P. L., tomo 14.
Pp. 96,115
Explanatio symboli, texto estabelecido e traduzido em francês por Dom
B. Botte, S. C., 1961.
P.83
Expositio Evangelii secundum Lucam, texto estabelecido e traduzido em
francês por Dom G. Tissot, S. C., 1956-1958.
Pp. 115,117
As Confissões da Carne 435
SANTO ANTÃO
Apophtègmes des Pères, P. L., tomo 65.
P. 135
ARISTÓTELES
Ethique à Nicomaque, texto estabelecido e traduzido em francês por R.
-A. Gauthier e J.-Y. Jolif, Lovaina-Paris, Publications universitaires de
Louvain, 1958-1959.
P.37
Histoire des animaux, texto estabelecido e traduzido em francês por P.
Louis, C.U.F., 1964-1969.
, Pp. 43-44
Génération des animaux, texto estabelecido e traduzido em francês por P.
Louis, C.U.F., 1961.
P.44
SANTO ATANÁSIO
Apologia ad imperatorem Constantium, P. G., tomo 25.
P. 195
Vita S. Antonii, P. G., tomo 26.
P. 157
436
índice das obras citadas
ATENÁGORAS
Supplicatio pro Christianis (Supplique au sujet des chrétiens), texto esta
belecido e traduzido em francês por G. Bardy, S. C., 1943.
P.22
Legatio, texto estabelecido por W. Schoedel, Oxford, Clarendon Press,
1972.
Pp. 166
BARNABÉ, PSEUDO-BARNABÉ
Épitre, texto traduzido em francês por Irmã Suzanne-Dominique e Fr.
Louvei, in Les Ecrits des Pères apostoliques, Paris, Ed. du Cerf, 1979,
tomo III.
Pp. 46,65,94,167,254
BASÍLIO DE ANCIRA
De 1’intégrité de la virginité, P. G., tomo 30; traduzido em francês por A.
Vaillant, in São Basílio, De virginitate, Paris, Institut d’études slaves,
1943.
Pp. 165,199,204,216-217,220,224-226,228-233
De renuntiatione saeculi, P. L., tomo 31.
P. 138
BASÍLIO DE CESAREIA
Constitutions monastiques, P. G., tomo 31.
Pp. 131,149
Exhortation à renoncer au monde, texto in P. L., tomo 31.
P.255
Grandes règles, P. G., tomo 31.
P.255
Règles brèves, P. G., tomo 31.
P.255
SÃO BENTO
La Règle, texto traduzido por A. de Vogüé, S. C., 1972.
Pp. 136,397
CÍCERO
De finibus, texto estabelecido e traduzido em francês por J. Martha, C.U.F.,
1928-1930.
P. 187
As Confissões da Carne 437
CLEMENTE DE ALEXANDRIA
Excerpta ex Theodoto, P. G., tomo 9.
P. 67
Le Pédagogue, texto traduzido em francês por H.-I. Marrou e M. Harl, S.
C., 1960.
Pp. 23-30,32-35, 38-40,42,44-53,55,57-60,128-129,180,257
Le Protreptique, texto estabelecido e traduzido em francês por C. Mondé-
sert, S.C., 1949.
Pp. 24,59
Quis dives salvetur, P. G., tomo 9.
Pp. 95,130
Les Stromates (II), texto estabelecido e traduzido em francês por C. Mon-
désert, H.-I. Marrou e O. Staehlin, S. C., 1976.
Pp. 23,32-34,38,58
Les Stromates (III), P. G., tomo 9.
Pp. 24,32,38,57-59,201,267
CLEMENTE DE ROMA
Première Epitre, texto em francês por Irmã Suzanne-Dominique, in Les
Ecrits des Pères apostoliques, Paris, Ed. du Cerf, 1979, tomo I.
P.93
SÃO CIPRIANO
Correspondance, texto estabelecido e traduzido em francês por Cônego
Bayard, C.U.F., 1925.
Pp. 96-98,101-105,109, 112,115,400-401,414,416
De habitu virginum, P. L., tomo 4.
Pp. 166,171,173-177
De lapsis, P. L., tomo 4.
■ Pp. 104,109,112,115,400
CIRILO DE JERUSALÉM
Procatéchèse, texto traduzido em francês por A. Faivre, Lyon, J.-B. Péla-
gaud, 1844.
P.83
DEMÓCRITO
In Die Fragmente der Vorsokratiker, texto estabelecido por H. Diels e W.
Kranz, Berlim, Weidmann, 1903.
P. 52
438 índice das obras citadas
PSEUDO-DEMÓCRITO
In Geoponica sive Cassiani Bassi scholastici de re rustica eclogae, texto
estabelecido por H. Beckh, Leipzig, Teubner, 1895.
P.42
DIDAKHÊ
Texto traduzido por R.-F. Refoulé, in Les Écrits des Pères apostoliques,
Paris, Éd. du Cerf, 1979, tomo I.
Pp. 66, 84,94,167,254-255
DIOCLES
Du regime, in Oribase, Collection médicale. Livres incertains, tomo III,
texto traduzido em francês por U. Bussemaker e Ch. Daremberg, Paris,
J.-B. Baillière, 1858.
P. 29
DOROTEU DE GAZA
Vie de Dosithée, in (Euvres spirituelles, texto estabelecido e traduzido em
francês por Dom L. Regnault e Dom J. de Préville, S. C., 1964.
P. 138
ELIANO
De natura animalium, texto estabelecido e traduzido em francês por M.
Dacier, Paris, Impr. Auguste Delalain, 1827.
P.42
EPICTETO
Manuel, texto estabelecido e traduzido em francês por A. Jagu e J. Soui-
lhé, C.U.F., 1950.
Pp. 121, 187
EURÍPIDES
Ion, texto estabelecido e traduzido em francês por L. Parmentier e H. Gré
goire, C.U.F., 1959.
P.37
As Confissões da Carne 439
EUSÉBIO DE CESAREIA
Histoire ecclésiastique, livros I-IV, texto estabelecido e traduzido em fran
cês por G. Bardy, S. C., 1962.
P. 168
EUSÉBIO DE EMESA
Homélies, in Clavis Patrum Graecorum. Ab Athanasio ad Chrysosto-
mum, texto estabelecido por M. Geerard, Turnhout, Brepols, 1974.
Pp. 165,199,204,210,216
EVÁGRIO PÔNTICO
Traitépratique, texto estabelecido e traduzido em francês por A. e C. Gui-
llaumont, S. C., 1971.
Pp. 151-152,165,245, 399
FAUSTE DE RIEZ
Discours aux moines sur la pénitence, P. L., tomo 58.
P. 393
FÍLON DE ALEXANDRIA
De opificio mundi, texto estabelecido e traduzido em francês por R. Arnal-
dez, Paris, Éd. du Cerf, 1976.
Pp. 206-207
De specialibus legibus, texto traduzido em francês por S. Daniel e A.
Mosès, Paris, Éd. du Cerf, 1970-1975.
P.50
De agricultura, texto traduzido em francês por J. Pouilloux, Paris, Éd. du
Cerf, 1961.
P.405
GALENO
Commentaire aux Épidémies d’Hippocrate, in Opera omnia, ed. C. G.
Kühn, Leipzig, Carl Cnobloch, 1821-1833, tomo XVII.
P.52
De utilitate partium, in Opera omnia, ed. C. G. Kühn, Leipzig, Carl Cno
bloch, 1821-1833, tomo IV ; tradução francesa de Ch. Daremberg, (Eu-
vres anatomiques, physiologiques et médicales de Galien, Paris, J.-B.
Baillière, 1856.
P.52
440 índice das obras citadas
GREGORIO, O GRANDE
Homélies sur 1'Évangile, P. L., tomo 76.
Pp. 118-119
Le Pastoral, texto estabelecido e traduzido em francês por Abade Boutet,
Paris, Desclée de Brouwer et Lethielleux, coll. “Pax”, 1928.
Pp. 401-402,414-418
GREGÓRIO DE NAZIANZO
Discours 1-3, texto estabelecido e traduzido em francês por J. Bernardi,
S. C., 1978.
Pp. 100,131,402
GREGÓRIO DE NISSA
De la création de 1’homme, texto traduzido em francês por J. Laplace, S.
C., 1943.
P.208
Oratio catechetica magna, texto em francês por A. Maignan, S. C., 1978.
P. 88
De la virginité, texto estabelecido e traduzido em francês por M. Aubi-
neau, S. C., 1966.
Pp. 194-195,199-201,207-210,213,216-218,222-223
HERMAS
Le Pasteur, texto estabelecido e traduzido em francês por R. Joly, Paris,
S.C., 1968.
Pp. 65-66,68-69, 87,92,115-116
HIÉROCLES DE ALEXANDRIA
Fragments, in JEAN STOBEE, Florilegium, ed. A. Meineke, Leipzig,
Teubner, 1856-1864, tomo III.
Pp. 27,41
SANTO HILÁRIO
In P. L-, tomo 9.
P. 129
As Confissões da Came 441
HIPOCRATES
Épidémies, in (Euvres completes, tomo V, texto traduzido por E. Littré,
Paris, J.-B. Baillière, 1846.
P.29
SANTO HIPÓLITO
Canons, texto estabelecido e traduzido em francês por R.-G. Coquin, in
Patrologia Orientalis, tomo 31/2, Paris, Firmin-Didot, 1866.
Pp. 81,84
Tradition apostolique, texto estabelecido e traduzido em francês por Dom
B. Botte, S. C., 1946.
Pp. 80-82
IRENEUDELYON
Adversus haereses, P. L., tomo 7.
Pp. 66,103
ISÓCRATES
Aréopagitique, texto estabelecido e traduzido em francês por G. Mathieu,
C. U.F., 1942.
P.404
JOÃO CASSIANO
Conferences, texto estabelecido e traduzido em francês por E. Pichery, S.
C., 1955-1959.
Pp. 132-135,139-140,142-145,147-149,151-154,156-159,224,234-240,
242,245,247,249-254,256,260,395
Institutions cénobitiques, texto estabelecido e traduzido em francês por
J.-C. Guy, S. C., 1965.
Pp. 132, 134-142, 146, 155-157, 160, 224, 234-235, 239-245, 249-253,
255,259-262, 393-394,396
SÃO JERÓNIMO
Adversas Helvidium De perpetua virginitate B. Mariae, P. L., tomo 23.
Pp. 165,199,213
Adversas Jovinianum, P. L., tomo 23.
Pp. 165,168,196,198-199,207, 304
Lettres, texto estabelecido e traduzido em francês por J. Labourt, C.U.F.,
1949-1963.
Pp. 107,112,138,165, 168,199, 396,414,416
JUSTINO
Apologies, texto traduzido em francês por L. Pautigny, Paris, A. Picard et
fils, 1904.
Pp. 22,66,68,84
SÃO LEÃO
Lettres, P. L., tomo 13.
Pp. 97,99,112, 398
LUCRÉCIO
De rerurn natura, texto estabelecido e traduzido em francês por A. Ernout
e L. Robin, C.U.F., 1920-1928.
P.43
MARCO AURÉLIO
Pensées, texto estabelecido e traduzido em francês por A.-I. Trannoy,
C.U.F., 1925.
P. 187
METÓDIO DE OLIMPOS
Le Banque t, texto estabelecido e traduzido em francês por H. Musurillo e
_ V.-H. Debidour, S. C., 1963.
Pp. 171,177-178,180-187,190-193,215
MUSÓNIO RUFO
Reliquiae, texto estabelecido por O. Hense, Leipzig, Teubner, 1905.
Pp. 27,36,55
OCELO LUCANO
De universi natura, ed. F. W. A. Mullach, Paris, A. Firmin-Didot, 1860.
P.36
444 índice das obras citadas
ORÍGENES
Commentaire sur saint Jean, livre VI, texto estabelecido e traduzido em
francês por C. Blanc, S. C„ 1970.
P. 88
Contra Celsum, texto estabelecido e traduzido em francês por M. Borret,
S. C., 1976.
P.43
Exhortatio ad martyrium, texto traduzido em francês por G. Bardy, Paris,
J. Gabalda, 1932.
P. 118
Homélies sur le Cantique des cantiques, texto traduzido em francês por
Dom O. Rousseau, S. C., 1954.
P.277
Homélies sur la Genèse, texto estabelecido e traduzido em francês por H.
de Lubac e L. Doutreleau, S. C., 1976.
P.206
Homélies sur les Nombres, P. G., tomo 12.
P. 83
OVÍDIO
Métamorphoses, texto estabelecido e traduzido em francês por G. Lafaye,
C.U.F., 1965.
P.42
PACIANO DE BARCELONA
Lettres, P. L., tomo 13.
Pp. 98-99
Parénèse, P. L., tomo 13, tradução francesa in C. VOGEL, Le Pécheur et
la pénitence dans PEglise ancienne, Paris, Ed. du Cerf, 1969.
P. 110
PACÓMIO
Praecepta et Instituía, in Dom A. Boon, Pachomiana Latina, Lovaina,
Bibliothèque de la Revue d’histoire ecclésiastique, 1932.
P. 394
PAULINUS
Vztó Ambrosii, P. L., tomo 14.
P. 105
As Confissões da Carne 445
PLATÃO
Cratyle, texto estabelecido e traduzido em francês por L. Méridier, C.U.F.,
1931.
P.69
Les Lois, texto estabelecido e traduzido em francês por A. Diès e E. des
Places, C.U.F., 1951-1956.
Pp. 50,272,404,410
Le Politique, texto estabelecido e traduzido em francês por A. Diès, C.U.F.,
1935.
Pp. 405,409
La Republique, texto estabelecido e traduzido em francês por E. Chambry,
C.U.F., 1931-1934.
Pp. 272,404,408-409
PLOTINO
Ennéades, texto estabelecido e traduzido em francês por E. Bréhier,
C.U.F., 1924-1938.
P. 187
POMÉRIO
De vita contemplativa, P. L., tomo 59.
P.399
QUODVULTDEUS
Sermones 1-3, texto estabelecido por R. Braun, Turnhout, Brepols, 1953.
P. 84
RÈGLE DU MAITRE
Texto estabelecido e traduzido por Adalbert de Vogüé, S. C., 1964.
P. 397
RUFO DE ÉFESO
(Euvres, ed. C. Daremberg e C. E. Ruelle, Paris, Imprimerie nationale,
1879.
P.52
SÉNECA
De ira, texto estabelecido e traduzido em francês por A. Bourgery, C.U.F.,
1922.
Pp. 127-128,150,154
446
índice das obras citadas
SORANO
Traité des maladies des femmes, in Corpus Medicorum Graecorum, t. IV,
Leipzig, 1927; tradução francesa de F. J. Hergott, Nancy, Impr. Berger-
-Levrault, 1895.
Pp. 51-52
TERTULIANO
Adversus Marcionem, texto estabelecido e traduzido em francês por A.-E.
de Genoude, in CE. T., tomo 1.
Pp. 72,267
De baptismo, texto estabelecido e traduzido em francés por F. Refoulé e
M. Drouzy, S. C., 1952.
Pp. 71-72,77, 84,118
De carne Christi, trad. A.-E. de Genoude, in CE. T., tomo 1.
P.59
De cultu feminarum, texto estabelecido e traduzido em francés por M.
Turcan, S. C., 1971.
P. 173
Exhortatio ad castitatem, trad. A.-E. de Genoude, in CE. T., tomo 3.
Pp. 171-172, 268
De paenitentia, texto estabelecido e traduzido em francés por P. de La-
briolle, Paris, Picard, 1906.
Pp. 71-79,96,108-112,115-116
De pudicitia, texto traduzido em francés por P. de Labriolle, Paris, Picard,
1906.
Pp. 106,109,118,171
De resurrectione carnis, trad. A.-E. de Genoude, in CE. T., tomo 1.
Pp. 87,166,214
Ad uxorem, trad. A.-E. de Genoude, in CE. T., tomo 3.
Pp. 171,173,214,268
De virginibus velandis, trad. A.-E. de Genoude, in CE. T., tomo 3.
Pp. 171-173,215,268
As Confissoes da Carne 447
TITO LÍVIO
Histoire romaine, tradução francesa sob a direcção de M. Nisard, Paris,
Firmin Didot frères, 1839.
P. 174
XENOFONTE
Economique, texto estabelecido e traduzido em francês por P. Chantraine,
C.U.F., 1949.
Pp. 280,283
AUTORES MODERNOS
A. D’ALES
L’Edit de Calliste. Etude sur les origines de la penitence chretienne, Paris,
Beauchesne, 1914.
Pp. 93,103
E. AMMAN
Entrada “Penitence”, Dictionnaire de theologie catholique, Paris, Letou-
zey et Ane, 1933, tomo XII.
P. 103
A. BENOIT
Le Bapteme chretien au second siede. La theologie des Peres, Paris, PUF,
1953.
Pp. 65,87
J.-P. BROUDEHOUX
Mariage et famille chez Clement dAlexandrie, Paris, Beauchesne, 1970.
P.62
O. CHADWICK
John Cassien. A Study in Primitive Monasticism, Cambridge, Cambridge
University Press, 1950.
P. 134
448
índice das obras citadas
A. DELATTE
Essai sur la politique pythagoricienne, Paris et Liege, Bibliothéque de la
Faculté de Philosophie et Lettres de l’Université de Liege, 1922.
P.404
F. J. DÖLGER
Der Exorzismus im altchristlichen Taufritual: eine religionsgeschichtli
che Studie, Paderborn, F. Schöningh, 1909.
P. 82
Sphragis, Paderborn, F. Schöningh, 1911.
P.65
A. DONDEYNE
“La discipline des scrutins dans l’Église latine avant Charlemagne”, Revue
d’histoire ecclésiastique, XXVIII, 1932.
P. 83
R. DRAGUET
Les Peres du Désert, Paris, Pion, 1949.
P. 135
M. DUJARIER
Le Parrainage des adultes aux trois premiers siécles de l’Eglise, Paris,
Éd. du Cerf, 1962.
P. 81
H. FRANKFORT
La Royauté et les Dieux, trad. J. Marty e P. Krieger, Paris, Payot, 1951.
P. 403
C. J. GADD
Ideas of Divine Rule in the Ancient East, Londres, Oxford University
Press, 1948.
Pp. 403,406
E. GÖLLER
“Analekten zur Bussgeschichte des 4. Jahrhunderts”, Römische Quartals
chrift, XXXVI, 1928.
P. 104
As Confissoes da Carne 449
J. GROTZ
Die Entwicklung des Busstufenwesens in der vornicänischen Kirche,
Fribourgen-Brisgau, Herder, 1955.
Pp. 98, 104
R. GRYSON
Le Pretre selon saint Ambroise, Lovaina, Ed. Orientalistes, 1968.
Pp. 99, 104
J.-C. GUY
“Examen de conscience (chez les Peres de l’Eglise)”, Dictionnaire de Spi
rituality, Paris, Beauchesne, t. IV, 1961.
P. 128
I. HADOT
Seneca und die griechisch-römische Tradition der Seelenleitung, Berlim,
De Gruyter, 1969.
P. 123
P. HADOT
“Theologies et mystiques de la Grece hellenistique et de la fin de l’An-
tiquite”, Annuaire de l’Ecole pratique des hautes etudes, 5.a secgäo, t.
LXXXV, 1970.
P. 142
A. VON HARNACK
Die Mission und Ausbreitung des Christentums in den ersten drei
Jahrhunderten, Leipzig, J. C. Hinrichs, 1906.
P. 166
I. HAUSHERR
Direction spirituelle en Orient autrefois, Roma, Pont. Institutum Orienta-
lium Studiorum, 1955.
Pp. 131,135,138,139,149
H. JAEGER
“L’examen de conscience dans les religions non chretiennes et avant le
christianisme”, Numen, VI, 1959.
P. 124
450 índice das obras citadas
• R.LABAT
Le Caractere religieux de la royaute assyro-bahylonienne, Paris, Librai-
rie d’Amerique et d’Orient, 1939.
P.407
P. LUNDBERG
La Typologie baptismale dans Tancienne Eglise, Leipzig, Ed. A. Lorentz,
1942.
P. 87
I. MAGLI
Gli uomini della penitenzia,Bologne, Capelli, 1967.
P.392
E. E. MALONE
Martyrdom and Monastic Profession as a Second Baptism, Düsseldorf,
Vom christlichen Mysterium, 1951.
P. 118
S. MORENZ
La Religion des Egyptiens, trad. L. Jospin, Paris, Payot, 1962.
Pp. 407-408
J. MORINUS
Commentarius historicus de disciplina in administratione sacramenti
paenitentiae, Anvers, 1682.
P. 103
J. PARGES
Les Idees morales et religieuses de Methode d’Olympe, Paris, Beauchesne,
1929.
P. 187
B. POSCHMANN
Paenitentia secunda, Bona, P. Hanstein, 1940.
Pp. 67,93,103
<s Confissões da Carne 451
1. VON PREYSING
Ehezweck und zweite Ehe bei Athenagoras”, Theologische Quartals
chrift, CX, 1929.
P.22
QUATEMBER
Tie christliche Lebenshaltung des Klemens von Alexandrien nach dem
Pädagogus, Viena, Verlag Herder, 1946.
P.29
RABBOW
eelenführung. Methodik der Exerzitien in der Antike, Munique, Kösel-
-Verlag, 1954.
P. 123
1. RAHNER
La doctrine d’Origene sur la penitence”, Recherches de science religieu-
se, XXXVII, 1950.
P.99
H. DE ROBERT
es Bergers d’Israel, Genebra, Labor et Fides, 1968.
Pp. 403,410-411
L. SAGE
Le peche originel dans la pensee de saint Augustin”, Revue d’etudes ati-
gustiniennes, XV, 1969.
P.363
L. TURCK
Evangelisation et catechese aux deux premiers siecles, Paris, Ed. du Cerf,
1962.
P.66
Äux origines du catechumenat”, Revue des sciences philosophiques et
theologiques, XLVIII, 1964.
P.79
,. VERHEIJEN
iouvelle approche de la Regle de saint Augustin, Begrolles-en-Mauges,
Abbaye de Bellefontaine (Vie monastique, VIII), 1980.
P.307
452 índice das obras citadas
P. VEYNE
Le Pain et le Cirque, Paris, Le Seuil, 1976.
P.406
F. DE B. VIZMANOS
Las vírgenes cristianas de la. Iglesia primitiva, Madrid, La Editoral Ca
tólica, 1949.
P. 196
C. VOGEL
La Discipline pénitentielle en Gaule, Paris, Letouzay et Ané, 1952.
P. 399
Le Pécheur et la pénitence dans l’Eglise ancienne, Paris, Éd. du Cerf,
1966.
P.393
A. VOÓBUS
History ofAsceticism in the Syrian Orient, Lovaina, Secretariat du Corpus
Scriptorum Christianorum Orientalium, 1958.
P.394
/
Indice
Advertência, por Frédéric Gros
Anexos
Anexo 1
Anexo 2
Anexo 3
Anexo 4