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AULA 13 – UMA LONGA INTRODUÇÃO AO SEGUNDO

REINADO
1. Introdução
O objetivo desta exposição é amarrar tudo o que já foi dito, além de compreender um pouco
alguns dos problemas contemporâneos a partir de resoluções que o próprio período inicial do
golpe republicano já demonstrava que iriam acontecer. Não é uma aula que defenda
ideologicamente o sistema monarquista. Quando se toca nos problemas da Constituinte
Republicana, faz-se justiça a este objeto e mostra-se o que ele realmente foi.

2. Abolição
Dom Pedro II observou o seguinte fato, que está marcado na história brasileira:
“Tivemos, assim, o aparecimento de uma camada de brasileiros de côr, perfeitamente
integrados na cultura portuguêsa. Graças à miscegenação e a certas formas
costumeiras de alforria, além de condições mais favoráveis em Minas para a auto-
manumissão, tivemos logo, uma imensa e variada categoria de prêtos e mulatos livres,
mesmo ocupando cargos de relêvo na sociedade.
(...)
Assim, como se sabe, os brasileiros geralmente não conservavam na servidão os filhos
que tinham com suas escravas e era considerado dever de justiça, libertar as mães. Isto
se fazia à larga, e Gilberto Freyre encontrou entre brasileiros que volveram para a
África após à Abolição e tornaram-se pessoas poderosas e senhores de escravos na
terra de seus antepassados, a presença de tais costumes” TORRES, João Camilo de
Oliveira, História das Ideias Religiosas no Brasil, pags. 76 e 77, Editora GRIJALBO,
São Paulo, 1968.

A história da abolição brasileira é também a de negros notáveis. Além disso havia uma
intervenção do clero, nem que fosse aquela da própria consciência. Ainda que o senhor traísse
a sua esposa com a escrava, essa intervenção católica tocava na própria consciência, e isso é
um ponto importante que João Camilo indica, assim como Gilberto Freyre.
Dentro das prerrogativas legais, aprovadas por Dom Manuel Monteiro da Vide, em suas
Constituições Primeiras, do Arcebispado da Bahia, encontram-se coisas que tocam, por
exemplo, em um comprometimento do senhor que “era proibido vender o marido para um lado
e a mulher para outro”. E ainda outras como a seguinte:
“mais notável abuso, que pode haver nesta matéria, é a publicidade com que os
senhores de Engenho mandam lançar a moer aos Domingos e dias Santos, mandamos
a todos nossos súditos de qualquer qualidade que sejam, se abstenham de tôda a obra
servil per si, ou per outrem, guardando inteiramente o preceito da Lei de Deus, que
proibe trabalhar nos tais dias”. TORRES, João Camilo de Oliveira, História das Ideias
Religiosas no Brasil, pag. 80, Editora GRIJALBO, São Paulo, 1968.

Observa-se que havia uma intervenção dos bispos frente ao mal que era a escravidão. Isso
quer dizer que apesar de um clero que muitas vezes se omitiu, houve também bons sacerdotes
e bispos que não ficaram calados diante de importantes assuntos, como a escravidão. Nesse
sentido, o martírio pintado de maneira ideológica pelos contemporâneos sobre a escravidão no
Brasil não se faz verdadeiro.
Dom Pedro II, como dito, foi abolicionista de maneira pessoal, além de ser um homem reto
em suas condutas, porém amarrado às próprias circunstâncias do parlamento que era sustentado
por senhores de café e mão de obra escrava. Sendo assim, a abolição enfraquece ainda mais a
base de apoio do Imperador. Os problemas podem ser somados:
 A Questão Romana enfraqueceu Dom Pedro II com parte do clero e da sociedade católica;
 Soma-se a isso a Questão Militar promovida a partir da Guerra do Paraguai;
 Ainda se acrescenta o positivismo e seu ambiente de disseminação;
 Soma-se a isso o contexto da abolição e seu elemento tardio, o que enfraqueceu o
Imperador com os abolicionistas e também com os barões: há um enfraquecimento
duplo no que envolve o abolicionismo no país.
 A imagem da Princesa Isabel enquanto futura Imperatriz também ficou desgastada, não
por sua culpa, mas pelas conjecturas.

3. Queda monárquica
Dentro então dessa “conta matemática”, houve a queda monárquica por causa de todo esse
enfraquecimento. Além do que foi citado, ainda existem os casos menores, como a doença de
Dom Pedro II, um ambiente intelectual fraco no sentido de manutenção da monarquia, ainda
que com notáveis como Oliveira Lima, Barão do Rio Branco etc. Havia pouca participação
direta nos debates por estes, pois estavam sendo relegados e passaram a ser símbolo de um
Brasil que não existia mais. Homens como Carlos Gomes, Nabuco e Carlos de Laet inclusive
sofreram censura, o que é algo marcante, pois Dom Pedro I e Dom Pedro II preocuparam-se
com a liberdade. Quanto a isso João Camilo diz que:
“Carlos de Laet, jornalista do visconde de Ouro-Prêto, redator da Tribuna Liberal,
entra para a História como a primeira vítima da censura no Brasil, depois da
Independência – o govêmo de Deodoro, passado o momento de espanto e surpresa do
inesperado fim do Império, começa a ser objeto da reação do povo, que não Ihe poupa
críticas: daí a adoção da censura, em dezembro de 1889, pondo fim ao regime de
liberdade plena, que D. Pedro I, ainda regente, inaugurara em 1821. A Tribuna
Liberal, não tendo o que fazer, cerra as portas. Laet, cuja ironia era famosa, sugeriu
ao leitor que, daí por diante, se contentasse com o Diário Oficial...”. TORRES, João
Camilo de Oliveira, História das Ideias Religiosas no Brasil, pag. 80, Editora
GRIJALBO, São Paulo, 1968.

Observa-se que ele sai da tribuna liberal e passa a indicar que as pessoas leiam o Diário
Oficial, ou seja, indica que as pessoas leiam os escritos do governo, pois está sendo censurado.
Na história da censura brasileira há, portanto, um primeiro episódio que inaugura a infeliz
tradição destes atos que até hoje acontecem.
Além disso, há um fato pode ser somado àquela linha dos problemas que mataram o
Império: a abolição não só alimentou a República, mas, por ter se materializado na Princesa
Isabel, adiciona uma rejeição a sua pessoa. Ela sai do evento marco do dia 13 de maio de 1888
muito popular, e há descrições de Nabuco sobre esse dia, encontradas em seu diário: o ambiente
e o tumulto do Paço, a agitação popular, os discursos etc. Ela foi aclamadíssima.
Se Isabel personificava o ultramontanismo; se ela era mulher e personificava a antítese de
um ideal da “mão firme” que os barões muitas vezes esperavam de Dom Pedro II; se ela
personificava a abolição e com isso ficou popular, ainda que o Brasil nunca tenha tido um
caráter racista institucionalizado e ainda que nunca tenha tido um movimento antiabolicionista,
encontra-se na Princesa, com a abolição, um adicional de repulsa a sua pessoa. Os que a
rejeitavam não queriam correr o risco de que o país se tornasse “carola” com um possível
Terceiro Reinado. Ela tinha popularidade, foi uma heroína no momento da assinatura da Lei
Áurea e foi até saudada pela Guarda Negra liderada por José do Patrocínio.
A contrariedade aos abolicionistas era de caráter muito mais combativo a um prejuízo
financeiro do que necessariamente a preservação da mão de obra negra. A mão de obra escrava
estava em jogo, não necessariamente a mão de obra negra.

4. Deodoro e o golpe militar


No que tange a Deodoro, a seguir tem-se outro trecho de Oliveira Torres:
“realmente a República foi proclamada porque estavam certos oficiais descontentes
com o Império, descontentamento que passou à história com o nome de Questão
Militar e daí praticamente a verdadeira e única origem imediata da mudança de forma
de governo operada em 1889. Ora, o positivismo tornou-se a verdadeira causa da
Questão Militar que não foi mero produto de indisciplina pois, se assim fosse, o
conflito entre a tropa e o governo nada mais produziria do que uma mudança de
gabinete. O positivismo, através de Benjamin Constant, foi a causa de que Deodoro
contra a sua vontade depusesse Dom Pedro II e instalasse a República, e além disso,
foi o positivismo a causa do republicanismo no Exército”.

Este trecho sintetiza um pouco essa confusa manifestação do Marechal Deodoro da


Fonseca, que tinha até amizade com o Imperador, e que diferente de Carlos Gomes, deixou-a
em segundo plano.

5. Constituição de 1891
Oliveira Viana, no seu ensaio O Idealismo da Constituição, faz uma análise penetrante
sobre o desenvolvimento da Constituinte da República. A seguir tem-se alguns trechos:
“Estava muito longe da grandeza épica da Constituinte Imperial a Constituinte
Republicana.
Na Constituinte Imperial os nomes que nella concorriam eram os maiores do paiz
pelo prestigio da cultura, da intelligencia, do caracter ou da situação social. Os grandes
estadistas que consolidaram o Imperio e constituíram o poder politico da nação,
sahiram della ou nella estavam, com excepção de Feijó e Bernardo de Vasconcellos.
(...)
Na Constituinte Republicana nada disto. Já as proprias fontes da sua autoridade
não eram de pureza absoluta: o mandato que receberam não lhes vinha de uma
delegação nacional, comparavel a de que resultára a Constituinte Imperial; mas, sim,
de um embuste formidavel, conscientemente preparado, atravez do famoso
<regulamento Alvim>, com o fito declarado de abafar qualquer manifestação do povo
contraria à ideia republicana. Emanando de fontes tão suspeitas, a Constituinte
Republicana não podia ter, de certo, grande autoridade moral sobre o paiz – e,
realmente, não a teve: o seu presidente, Prudente de Moraes, homem austero e digno,
confessara, ao encerra-la, que a Constituinte fôra recebida <com muito desfavor e
muita prevenção pela opinião pública>.
O grupo republicano, por occasião do movimento de 89, era, realmente, uma
minoria relativamente insignificante, disseminada pelo paiz, tendo como centros de
maior actividade o Rio e São Paulo. O grosso da massa politicante se distribuia entre
as duas facções tradicionais: a liberal e a conservadora. Com a irrupção republicana,
esses velhos quadros partidarios desappareceram, quebrando-se em milhares de
fragmentos, cada um constituido de um pequeno clan aggrupado em torno de um
pequeno chefe”. VIANNA, Oliveira, O Idealismo da Constituição, pags. 19, 20 e 21,
Terra de Sol, Rio de Janeiro, 1927.

Ele ainda tece mais alguns elogios aos constituintes do Império, e faz uma comparação
com os da República.
É possível ver, com o que foi exposto, o início de uma decadência: substituição das elites,
o que é um dos problemas sérios que permanece até hoje. Elas são importantes, mas surge um
problema quando são ruins, como as que existem atualmente.

6. A industrialização
Por fim, é importante mencionar que a escravidão no Brasil deixou o país defasado no que
envolvia o processo de industrialização. Ainda que tivesse uma rica economia – ele não era
vanguarda, mas era rico – ela era muito agrária, e com isso o Segundo Reinado termina com
atrasos.

7. Conclusão
A queda monárquica não se deu de maneira simples, mas por uma série de motivos que
impossibilitaram um Terceiro Reinado. Durante estas exposições, foi feito um apanhado
cultural, nomes foram destacados e questões foram levantadas. O objeto de estudo – o Segundo
Reinado – não foi esgotado, mas luzes foram apresentadas para uma melhor compreensão do
período, algo tão necessário nos dias atuais.

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