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O termo familia está etimologicamente relacionado com famulus, que significa ‘escravo’, e
legalmente designava a parte do agregado familiar (mulher, filhos e escravos) que estavam
sob a patria potestas, ‘poder/ autoridade paternal’ do paterfamilias, que sobre eles tinha
ius uitae necisque, «direito de vida e de morte» e controlava todos os bens até à morte. O
termo família aplicava-se mais aos escravos e aos descendentes que partilhavam um
nomen.
A favor:
o Continuidade do clã (em contextos religiosos, políticos e sociais favoráveis);
o Segurança na velhice dos pais das famílias mais pobres;
Contra:
o Riscos para as mulheres associados ao aborto;
o Risco elevado de morte prematura (25% a 30% no 1º ano de vida; 50% nos
primeiros 10 anos de vida; só metade chegava à idade adulta);
o Necessidade de dote para o casamento das filhas;
o Prática comum de adoções de jovens e adultos;
o Filhos como limitações à liberdade dos pais;
o Falta de meios das famílias pobres para cuidar dos filhos;
Com a exposição de um filho, não se livrava o pai dos seus deveres nem
automaticamente cessava a patria potestas, antes ficava suspensa, pois o pai podia,
por muito tempo e sem compensação, reclamar o filho;
No caso das relações entre o paterfamilias e uma escrava, o filho herdava a
condição da mãe, enriquecendo o património do dono da escrava. Um escravo
podia ser meio-irmão de um homem livre;
O filho nascido de um escravo e uma mulher livre herdava a condição da mãe, e a
sociedade partia do pressuposto de que ele era filho do paterfamilias;
Crianças livres e escravas podiam ser companheiras de brincadeira de infância (cf.
Séneca e o seu escravo Felicião, filho de Filosito, em Cartas a Lucílio 12);
O poeta Marcial (Séc. I-II d.C.) desenvolveu um grande afeto pela escravinha
Erócion e isso a todos causava surpresa (epigramas 5.34 e 37);
Esta linha ténue entre escravatura e liberdade também funciona para o outro lado:
Exemplos:
o Horácio era filho de um pai liberto;
o Epicteto, grande filósofo estoico, tinha sido escravo;
Estes casos revelam uma grande mobilidade social nas estruturas do Império;
Um escravo liberto desenvolve uma relação com o antigo proprietário de cliente e
patrono:
o No caso de um escravo ser adotado este continuava a estar sob a pátria
potestas do antigo proprietário, se fosse só liberto esse não seria o caso;
Trabalho e Linhagem
Os filhos das famílias pobres começavam a trabalhar com menos de 10 anos e por volta
dos 12 ou 13 aprendiam um ofício. Neste ponto, talvez se assemelhassem às crianças
escravas.
Os filhos legítimos não eram a única forma de perpetuar o nome da família: os escravos,
uma vez manumitidos, passavam à condição de libertos e, como clientes, herdavam o
nomen do seu antigo senhor (agora patrono):
Marco Lívio Salinator (senhor que passa a ser patrono) liberta Andronico (escravo
de guerra trazido de Tarento para Roma) que adota o nome Lívio Andronico;
O nome das famílias também se perpetuava através dos filhos adotivos:
Uns dizem que se mantinham distantes até estes atingirem uma idade não tão
crítica para reduzir o risco de amarem um filho e este não sobreviver;
Outros defendem que estes amavam os filhos desde muito novos;
As crianças desenvolviam, desde cedo, a relação com as nutrices, ‘amas de leite’ (escravas
ou mulheres livres de baixa condição) e com os paedagogi, ‘acompanhantes’, que Séneca,
em Cartas a Lucílio 99.14, para consolar um pai pela morte prematura do filho, lhe diz que
a ama o conhecera melhor do que ele:
«Não tenho dúvidas de que a filosofia te terá sido de grande utilidade no dia em que
conseguires recordar com tranquilidade um filho que ao morrer conhecia melhor a
ama do que o próprio pai!» Trad. de J. A Segurado e Campos (1991). Lúcio Aneu
Séneca. Cartas a Lucílio;
Isto revela que, com ou sem desenvolvimento de afeto paterno, a relação da criança
com a sua ama é de muito maior proximidade na fase inicial da sua vida do que a
relação com os pais;
Com base na inexistência de quartos nas casas destinados aos filhos legítimos, alguns
investigadores admitem a possibilidade de eles dormirem nas cellae ou cellulae dos
serviçais que deles tomavam conta.
Importa, no entanto, ter presente que a esposa de Catão-o-Antigo, Licínia, para além do
próprio filho, amamentava escravos (fazia isto, não porque os amava, mas sim para os
controlar e os tornar mais obedientes).
Casamento
A mulher considerava-se pronta para casar a partir dos 12 anos, mas as das classes sociais
inferiores faziam-no entre o início e o meio da adolescência ao passo que as das superiores
o faziam no final. Não quer dizer que não houvesse exceções:
Octávia, filha do imperador Cláudio, casou com o seu meio-irmão Nero com cerca
de 13 anos (Nero c. c. de 15);
A lei considerava os rapazes prontos para casar a partir dos 14 anos, mas os 30 anos eram
a idade ideal. Entre os 14 e os 16 anos, os jovens aristocratas trocavam a toga praetexta
pela toga uirilis. A diferença de idades entre esposa e marido, andaria nos 10 anos.
O jovem necessitava da autorização paternal para contrair matrimonium, ao passo que os
escravos podiam apenas viver em regime de concubinato com as suas parceiras, pois a lei
não lhes reconhecia o status familiae. Na condição de liberto, o escravo podia resgatar a
sua companheira.
Patria Potestas
Os investigadores dividem-se quanto à duração da sujeição dos filhos à patria potestas:
Uns dizem que 20% das crianças teria o avô paterno vivo;
Outros dizem que no início do Império Romano entre 37 e 50% da população com
25 anos de idade teria os pais vivos;
Da população com com 30 anos, só ¼ estaria sob a patria potestas;
A diferença de idades entre pais e filhos andaria pelos 40 anos;
Do mesmo modo que muitos jovens livres eram criados por agnados (parentes por linha
masculina), cognatos (parentes por linha feminina) e escravos, também muitos escravos
de guerra eram trazidos para Roma e criados por outras pessoas que não os pais
biológicos. Quanto à população escrava, pode ter oscilado entre os 15 e os 35% da
população da Itália romana entre o fim da República e o início do Império.
Manumissão
A manumissão em Roma, ao contrário do que sucedia em outras civilizações antigas, não
só era facilitada pela lei (Tábua 2.1) como atribuía a cidadania romana ao antigo escravo e
novo liberto (ciuis Romani liberti, «de um liberto cidadão romano», Tábua 5.8). Há quem
sustente que, para alcançarem a manumissão, os escravos tinham de ser escravos durante
30 anos. Há vários exemplos de manumissão na história romana: