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ARTIGO - Uma Interpretação Higienista Do Brasil - Medicina e Pensamento Social No Império
ARTIGO - Uma Interpretação Higienista Do Brasil - Medicina e Pensamento Social No Império
Introdução
pelo editor francês desde 1824. Mais tarde, em 1827, participou ativamente
do lançamento do mais famoso e bem-sucedido empreendimento comercial
de Plancher, o Jornal do Commercio, do qual foi editor. Foi também, naquele
mesmo ano, um dos editores do Aurora Fluminense, jornal político-literário
criado por ele junto com José Apolinário de Morais e o cirurgião Francisco
Crispiano Vaderato.
A dupla Sigaud-Plancher teve grande importância para a história da
imprensa brasileira do Primeiro Império e do período regencial,
particularmente para a história periodismo médico. Foi deles a iniciativa
de publicar o primeiro periódico médico brasileiro, O Propagador das Ciências
Médicas, que circulou entre os anos de 1827 e 1828. Em 1835, eles
lançaram um outro periódico destinado ao público médico, o Diário de Saúde,
que circulou até o início de 1836.
Foi como editor que Sigaud ficou conhecido no Rio de Janeiro. Sua
experiência européia como secretário da Real Academia de Medicina de
Marseille e a de editor de periódicos médicos fez com que fosse procurado
para participar da criação da SMRJ. Sigaud foi o principal formulador das
idéias higienistas defendidas por aquela instituição.
Na SMRJ Sigaud apresentou, em 1832, o primeiro trabalho onde
expunha suas idéias a respeito do problema sanitário brasileiro: Discurso
sobre a Estatística Médica do Brasil. A idéia de elaboração de uma estatística
médica do Brasil ajustava-se perfeitamente aos propósitos da SMRJ, uma
vez que um dos motivos que levaram à criação daquela entidade médica foi a
constatação de que no país desconheciam-se os mais elementares cuidados
com a saúde pública. Foi nessa ocasião que Sigaud apresentou o
argumento de que o estudo das complexas relações entre o clima e as
doenças constituía a abordagem científica que possibilitava a real elucidação
das causas das endemias, epidemias e doenças esporádicas que se
manifestavam no país. Para ele, a complexidade do quadro nosológico
brasileiro seria expressão direta da diversidade geográfica e climática país.1
Originalmente pensado como um projeto coletivo da SMRJ, a
1
Discurso sobre a Estatística Médica do Brasil, lido na Sociedade de Medicina do Rio de
Janeiro na Sessão Púlbica de 30 de Junho de 1832, aniversário de fundação da
Sociedade, pelo Dr. José Francisco Sigaud, Presidente da mesma Sociedade. Rio de
Janeiro, Tipografia Imperial e Constitucional de E. Seignot-Plancher, 1832, pp.16-17
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2
Breve notícia biográfica dos treze membros da Academia Imperial de Medicina que
faleceram no período de 1850 a 1857, lida na sessão anual de 1858, em presença de S. M.
Imperial, pelo Sr. Dr. Antônio Félix Martins, membro efetivo da dita Academia.
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Discurso sobre as moléstias que mais afligem a classe pobre do Rio de Janeiro; lido na
sessào pública da Academia Imperial de Medicina, a 30 de junho de 1835, pelo seu
presidente José Martins da Cruz Jobim. Rio de Janeiro, Tipografia Fluminense de Brito e
Cia.
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uma vez que nenhuma doença semelhante podia ser encontrada na Europa.
Mesmo assim, haveria medidas preventivas passíveis de serem adotadas
para evitar o acometimento. O principal cuidado recomendo pelo higienista
dizia respeito à necessidade de se alterar a alimentação típica dos grupos
sociais afetados (escravos e trabalhadores livres pobres), formada
basicamente de milho, mandioca, arroz e feijão.
Apesar de contestada desde do final da década de 1860, a tese
climática da origem da opilação esteve em voga até o final dos século XIX
(Edler, 1999). O declínio da hipoemia intertropical coincidiu exatamente com
a ascensão do movimento sanitarista que, durante a primeira república,
contestou o determinismo climático e racial na explicação da singularidade
patológica e social brasileira (Lima & Hochman, 1998; Lima 1999). Nesse
contexto, a opilação alcançou ainda mais evidência, sendo descrita como
uma doença parasitária - ancilostomose - que, ao lado da malária e da
doença de Chagas, compunha o quadro das três mais importantes doenças
do homem brasileiro.
Uma vez que o clima brasileiro não ser visto como uma ameaça
incontornável à saúde, Sigaud podia considerar como perfeitamente viável a
aclimatação do europeu no Brasil. Na verdade, o problema da adaptação do
imigrante europeu aos trópicos não deveria ser buscado no clima mas sim na
cultura alimentar inadequada às condições de vida sob calor e umidade
intensos. Por isso, recomendava o abandono dos hábitos alimentares típicos
do velho mundo em favor de uma alimentação mais sóbria que excluía o uso
de bebidas alcoólicas e do leite, além da adoção de certos cuidados
higiênicos como, por exemplo, a moderação na atividade sexual.
Finalmente, essa visão relativamente positiva do quadro climático
brasileiro, de cuja ação patogênica se destacavam apenas as “febres
palustres” e a hipoemia intertropical, ficava ainda mais realçada pela análise
desenvolvida por Sigaud da história das epidemias do Brasil. Para o
higienista, ainda que tenha sido comum, durante o período colonial, a
ocorrência de graves epidemias de varíola, sarampo, gripe, disenteria e, é
claro, de “febres palustres”, era preciso notar que, no território brasileiro, não
havia registro de ocorrência de epidemias dos três maiores flagelos da
história médica de então: a peste, o cólera e a febre amarela. Essa teria sido
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Considerações finais
Referências Bibliográficas