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O SUPERCRÂNIO
Autor
KURT MAHR
Tradução
RICHARD PAUL NETO
Digitalização
VITÓRIO
Revisão
ARLINDO_SAN
As semanas enervantes passadas em Vênus chegaram ao
fim. Perry Rhodan voltou para Terrânia, a capital da
Terceira Potência.
Mas na Terra uma surpresa desagradável o aguarda.
A Terceira Potência defronta-se com um inimigo forte e
perigoso — um inimigo que também dispõe de um exército de
mutantes bem treinado. Esse inimigo é O Supercrânio.
= = = = = = = Personagens Principais: = = = = = = =
— O chefe anunciou sua chegada para pouco depois da meia-noite — disse o coronel
Freyt, dirigindo-se a seu ajudante.
Sorriu enquanto proferia estas palavras. Não se julgava incapaz de cumprir a missão
que lhe fora confiada: representar Rhodan, durante a ausência deste, em Terrânia, a base
que a Terceira Potência havia instalado no deserto de Gobi. A sensação de alívio que o
regresso de Rhodan provocava em sua mente se devia mais ao fato de saber que os
empreendimentos a que Rhodan se lançava no espaço eram muito perigosos, e que um dia,
mesmo um homem como Perry Rhodan, poderia encontrar um poderoso inimigo, ou ser
vitimado num acidente.
Freyt estava convencido de que de Perry Rhodan dependia não apenas a existência do
Estado conhecido como a Terceira Potência mas, em grau ainda maior, o bem-estar de toda
a Humanidade.
Tudo isso constituía motivo suficiente para que se alegrasse pelo fato de que Rhodan
havia saído são e salvo de mais uma de suas aventuras, e que se encontrava a caminho da
Terra.
— Será como das outras vezes? Nenhuma recepção? — perguntou o ajudante.
Freyt confirmou:
— Nenhuma recepção.
***
***
***
Rhodan realizou o inventário dos danos. Todas as informações colhidas pelos grupos
de pesquisa na área do bloco G e no local em que estiveram estacionados os destróieres
foram reunidas, gravadas em fitas de impulsos e introduzidas no cérebro positrônico, que
as interpretaria.
O cérebro positrônico desincumbiu-se da tarefa à sua maneira. Encontrou duas mil e
quinhentas explicações possíveis para a explosão ocorrida no bloco G, e três mil e
oitocentas para o desvio dos destróieres.
Entre esse total de seis mil e trezentas alternativas, Rhodan mandou selecionar
aquelas cujo índice de probabilidade ultrapassava determinado grau. Dessa forma chegou a
um total de cem soluções.
Essas cem possibilidades foram introduzidas na combinatória. As informações
extraídas da mesma coincidiam em larga escala com aquelas elaboradas por seu cérebro.
Na interpretação final foi ajudado por Crest, o arcônida.
Crest, um cientista alto de cabelos brancos, era um dos dois sobreviventes de uma
expedição exploradora destruída na Lua por foguetes terrestres de fusão nuclear. Ao
contrário de Thora, que era a outra sobrevivente e comandara o cruzador espacial dos
arcônidas, desde o início colocara-se inteiramente ao lado de Rhodan. As faculdades
transmitidas a este permitiram a formação da Terceira Potência, que salvou a Terra do
aniquilamento total pela guerra atômica.
Crest e Rhodan estavam ligados por uma estranha amizade. Quem não os conhecesse
veria aqueles dois homens lado a lado por dias seguidos, sem notar nada que tivessem em
comum. Mas subitamente, nos momentos de perigo, perceberia a sintonização instantânea
daqueles dois espíritos, a atuação harmoniosa, que não dependia de perguntas e respostas,
já que resultava do nível de conhecimento mais elevado já atingido por qualquer
inteligência no âmbito da galáxia.
No correr dos anos, Crest passara a se interessar na evolução da Terra quase tanto
como Rhodan, embora sob outro ângulo. As ocorrências espantosas da noite anterior não o
deixaram menos exaltado que este.
— Tem alguma idéia? — perguntou em tom sério.
Um sorriso um tanto obstinado se esboçou no rosto de Rhodan.
— Não tenho nenhuma idéia enquanto a máquina ainda está interpretando os dados
— respondeu.
Crest fez um gesto contrafeito.
— Não venha me contar que ainda não teve qualquer idéia sobre quem pode ter
mandado para os ares o bloco G e subtraído os destróieres.
Rhodan fez de conta que não ouvia.
Depois de algum tempo levantou a cabeça e fitou Crest.
— Sim — confessou. — Tenho uma idéia.
***
***
Essa conferência de Rhodan foi realizada nas primeiras horas da manhã do dia 20 de
julho.
Quase no mesmo dia e mês; alguns anos antes, a seguinte ocorrência verificara-se em
Gardiner, uma pequena cidade situada na divisa dos Estados norte-americanos de
Wyoming e Montana:
O homem que por ora nos interessa só vivia há poucos dias em Gardiner. Embora à
primeira vista não parecesse nada simpático, tinha um aspecto de abastança. Em Gardiner
havia dois hotéis; ele residia no mais caro.
O povo da cidade era curioso. Gardiner não era propriamente uma cidade de turistas,
embora ficasse na entrada do parque nacional de Yellowstone. Os forasteiros eram uma
raridade, e todo mundo começou a se interessar por aquele homem.
Ficaram sabendo que seu nome era Monterny, e que era cientista. Monterny não era
muito alto; em compensação era bastante gordo. O enorme crânio sem cabelos, os olhos
bem afundados na órbita, levava à conclusão de que, no interior daquele cérebro havia
bastante substância cinzenta para proporcionar um saber notável ao cientista.
O povo de Gardiner descobriu tudo isso. Mas não descobriu uma coisa: o que
Monterny pretendia na cidade.
Não fazia nada senão passear. O lugar era formado praticamente de uma única rua,
ladeada de casas, geralmente de um só pavimento, em que moravam seus duzentos
habitantes. As vielas que desembocavam nessa rua quase não contavam. Por isso um
homem que aparecesse em Gardiner teria pouco motivo para passear. Dali logo surgiu o
boato de que Monterny esperava por alguém.
A atenção misturada de curiosidade que lhe foi tributada de todos os lados não
escapou a Monterny. O negócio que pretendia realizar em Gardiner não comportava a
menor dose de curiosidade. Por isso, Monterny já estava começando a ficar nervoso,
quando finalmente naquele dia encontrou aquilo que procurava.
Foi no fim da tarde, durante um dos seus passeios, que geralmente o faziam percorrer
a rua principal em ambas as direções. Teve sua atenção despertada por um jovem que
desceu de um carro esporte um pouco desengonçado e entrou numa loja para comprar
alguma coisa.
De pé do lado oposto da rua, Monterny observou o jovem com a cabeça esticada para
a frente. O jovem não percebeu nada; entrou na loja. Monterny atravessou a rua e parou
diante da loja.
Quando o jovem voltou a sair da loja, Monterny dirigiu-lhe a palavra.
— Olá, meu jovem! Podia me fazer um favor?
O jovem estacou, perplexo.
— De que se trata? — perguntou em tom reservado.
Monterny fez um gesto meio amável, meio embaraçado.
— Não gostaria de falar sobre isso em plena rua. Moro no Hotel Wolfreys Place. O
senhor se importaria de ir até lá comigo?
O jovem já tinha uma recusa na ponta da língua, mas Monterny o interrompeu em
tempo.
— Podemos ir no seu carro.
Era uma sugestão ridícula, pois o Wolfreys Place ficava apenas a alguns passos da
loja, mas o jovem sentiu-se orgulhoso porque alguém se dispunha a viajar em seu carro
desengonçado.
— E prometo-lhe uma coisa — prosseguiu Monterny. — O senhor não sairá
perdendo.
Este argumento acabou por convencer o jovem.
Entraram no carro, foram ao Wolfreys Place e subiram ao quarto de Monterny.
— Sente — disse Monterny em tom ligeiramente menos amável do que o usado até
então e apontou para uma poltrona.
O jovem sentou. Monterny tomou lugar à sua frente. Pôs-se a fitar o jovem. Por
algum tempo o jovem suportou o olhar com um sorriso amável, depois com um sorriso
embaraçado e finalmente com uma careta de obstinação. Finalmente olhou para o lado e
passou a examinar o aposento, para não fitar mais os olhos de Monterny.
Quando chegou à conclusão de que aquilo já estava ficando demais, Monterny pôs-se
a falar.
— Já me viu alguma vez?
O jovem parecia espantado:
— Não.. Passei quinze dias com amigos em...
— Idaho Falls! — interrompeu-o Monterny. — É verdade?
O jovem não parecia muito surpreso.
— Isso mesmo. Como soube? Falou com meus pais?
Monterny sacudiu a cabeça.
— Não; nunca vi os seus pais. Seu nome é Freddy MacMurray. Seus amigos
apelidaram-no de Tigre, porque gosta de usar blusas com desenho de tigre. Em Idaho Falls
você tem amigos porque até poucos anos atrás morou lá com seus pais. Seu pai, que é
técnico de reatores, foi aposentado antes da idade normal, isso porque foi ferido num
acidente. Você nasceu um ano depois do acidente. Há poucos dias você conheceu duas
moças em Idaho Falls: Sue e Dorothy. Ainda não sabe qual das duas lhe agrada mais. Não
é verdade?
MacMurray levantou-se de um salto.
Depois das primeiras palavras de seu interlocutor, esteve a ponto de protestar contra
o tom íntimo usado pelo mesmo; mas as revelações feitas deixaram-no sem fala. A maior
parte do que Monterny acabara de dizer seria simples de descobrir, mesmo por quem não
possuísse qualquer dom telepático. Mas o fato de que, em Idaho Falls, tivera relações com
duas moças não era conhecido por ninguém a não ser ele mesmo.
— De onde... de onde... — gaguejou Freddy.
Monterny interrompeu-o com um gesto.
— Sei muito mais a seu respeito; para falar a verdade, sei tanto quanto você. Antes
de mais nada, sei que você possui um talento especial, sobre o qual você ainda não falou
com ninguém, embora se trate de um fenômeno único no mundo.
Freddy empalideceu e voltou a mergulhar na poltrona. Seus olhos emitiram um brilho
ameaçador quando indagou:
— E o que tem isso?
Monterny não deu a menor atenção à pergunta.
— Basta que você feche os olhos e deseje estar em Idaho Falls, e logo você estará lá.
É ou não é verdade? Esse dom é chamado de teleportação, e você é um teleportador. Qual
é a maior distância que você já conseguiu vencer?
— Trezentos... — respondeu Freddy precipitadamente, mas logo se interrompeu.
— Quilômetros — completou Monterny satisfeito. — Para o início é muito bom;
ainda poderá ser melhorado.
Levantou-se e prosseguiu na sua fala, enquanto caminhava tranqüilamente de um
lado para outro.
— Desde que você descobriu seu dom, vive sonhando que um dia será um grande
homem. Pois eu lhe darei uma chance para isso. Você vai trabalhar para mim; no começo
ganhará mil dólares por mês, além do reembolso das despesas, sem limite. Está entendido?
Voltou-se e encarou Freddy.
— É verdade — disse este com uma segurança surpreendente na voz. — Há anos
sonho em ser um grande homem. Mas também sonho em atingir meu objetivo por meios
decentes. O que o senhor acaba de me oferecer não deve ser muito decente; se fosse, teria
adotado uma atitude mais sincera, falando com meus pais. Não preciso dos seus mil
dólares, nem de sua conta de despesas. O motivo é simplesmente que não gosto do senhor.
Fez meia-volta e saiu. Monterny não o deteve. Por algum tempo lançou um olhar
odiento para a porta que acabara de se fechar atrás de Freddy MacMurray.
Depois fechou os olhos e se concentrou em alguma coisa.
Freddy já saíra correndo do hotel. Uma multidão de pensamentos revolvia
furiosamente seu cérebro; não conseguia reter nenhum deles. Saltou para dentro do carro,
cometeu uma infração às regras de trânsito ao dar volta no meio da quadra e pretendia
voltar para a casa de seus pais.
Subitamente uma força estranha se apoderou de sua mente com a violência de uma
martelada. A confusão de pensamentos foi afastada como por encanto. Um único desejo
ocupava a mente de Freddy: voltar para junto do estranho.
Deu marcha à ré, voltou a colocar seu carro diante do hotel, desceu e, passando por
Mr. Wolfry, que lhe lançou um olhar de espanto, subiu a escada.
A porta do quarto de Monterny estava aberta. Freddy entrou sem bater.
Monterny recebeu-o com um sorriso.
— É assim que eu gosto! — disse.
Por algum tempo examinou cuidadosamente a figura de Freddy. O jovem tinha os
olhos imóveis e vidrados, que Monterny esperava encontrar numa pessoa submetida ao seu
poder mental.
— Você vai voltar para a casa de seus pais — ordenou Monterny — e dirá que o
levei ao hotel por tê-lo confundido com outra pessoa. Nos próximos vinte dias levará a
vida de sempre. Não realizará nenhum salto de teleportação e não contará a ninguém que
possui esse dom. Daqui a vinte dias, guarde a data: 7 de agosto, às cinco da tarde, você se
transportará por teleportação a Salt Lake City Conhece o grande templo dos mórmons?
Freddy fez que sim.
— Muito bem. Eu o esperarei junto à entrada principal. E não se esqueça de uma
coisa: por meu intermédio você poderá se transformar num grande homem; mas sempre
estarei acima de você.
***
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***
***
— É uma dica formidável, Mr. Adams — disse Bradley exultante. — Desde ontem
os papéis de Hanson & Sons subiram doze pontos.
Aquela explosão de entusiasmo não deixou Adams muito impressionado. Sorriu com
uma ligeira ironia e disse:
— Tenha um pouco de paciência. Subirão ainda mais. Pelo menos trinta pontos,
segundo os meus cálculos.
Bradley sentou do outro lado da escrivaninha. Nos últimos dois dias comparecera
pelo menos duas vezes por dia ao escritório de Adams. Este o recebia numa pequena sala,
que não traía a real qualidade de seu ocupante.
Por várias vezes indagara de si para si o que o levava a gostar tanto de Elmer
Bradley. Não encontrou resposta. Gostava daquele jovem, e era só.
Gostou tanto dele que no dia em que o conhecera emprestou-lhe trinta mil dólares
para que pudesse recuperar o prejuízo. Bradley mostrara-se digno da confiança depositada
nele, apresentando a Adams as ações que adquirira. O próprio Adams dera-me a dica
relativa aos papéis de Hanson & Sons, revelando um ótimo faro. Desde anteontem houvera
uma alta total de vinte e um pontos nas ações dessa empresa, o que significava que Bradley
conseguira um lucro com aqueles trinta mil dólares.
— Tenho uma coisa para o senhor! — disse Bradley de sopetão, com a cara de quem
acaba de comprar um presente de natal.
Adams ergueu as sobrancelhas.
— Ah, é? Deixe ver.
Bradley tirou do bolso um papel dobrado várias vezes, com aspecto de jornal. O
primeiro exame revelou que se tratava de um prospecto particular da bolsa.
Adams submeteu o papel a um cuidadoso exame. À medida que lia, tornava-se cada
vez mais nervoso.
— Isso é uma coisa nunca vista! — exclamou depois de algum tempo. — Esse
homem deve ser um idiota.
Bradley parecia um tanto embaraçado.
— Eu pensei que isso o interessaria — disse. — Mas, para falar com franqueza, não
entendo muito da coisa. Poderia me explicar?
Com um gesto animado da cabeça, Adams principiou:
— Um certo sujeito, um peruano, diz ter descoberto uma rica mina de ouro. A jazida
aproveitável é calculada em mais de dez milhões de toneladas. Existem pareceres técnicos
nesse sentido. O homem gastou todo o dinheiro de que dispunha para comprar o terreno e
agora quer fundar uma sociedade por ações para explorar a mina. As leis financeiras do
Peru são bastante elásticas. O homem divulgou sua idéia. Até o momento não encontrou
nenhum sócio. Avalia a propriedade imobiliária, juntamente com a mina, em trinta por
cento do capital da sociedade a ser criada, e convida qualquer um que tenha vontade para
adquirir os restantes setenta por cento, e com isso a maioria absoluta da empresa.
Os olhos de Adams, geralmente inexpressivos, começaram a brilhar. Pouco lhe
interessava que Bradley tivesse ou não tivesse entendido sua explicação. Saiu de trás de
sua escrivaninha e correu mancando em direção à porta. Bradley esperou-o por mais de
uma hora. Só depois disso convenceu-se de que naquele dia não o veria mais e foi embora.
Nesse meio tempo Adams desenvolveu uma atividade de vulcão em plena erupção.
De seu verdadeiro escritório, transmitiu instruções aos bancos da General Cosmic, para
que preparassem a importância que se tornava necessária para a compra das ações da
empresa peruana. Segundo um cálculo superficial essa importância atingia cerca de um
bilhão e meio de dólares, e um cálculo também superficial revelava que a mina de ouro
proporcionaria à General Cosmic um lucro de pelo menos seis bilhões de dólares.
Meia hora depois de ter lido o prospecto, Adams manteve uma prolongada
conferência telefônica com o senhor Ramirez, residente em Callao, proprietário do terreno
em que seria instalada a mina. Ramirez estava mais que satisfeito por ter encontrado tão
depressa um sócio para seu projeto, e prometeu enviar os pareceres dos geólogos ainda no
mesmo dia.
Na noite daquele dia a General Cosmic Company — conhecida pelas iniciais G.C.C.
— realizou a maior compra singular jamais registrada pela história das finanças.
Homer G. Adams adquiriu um bilhão quatrocentos e cinqüenta e um milhões setecentos e
oitenta e oito mil dólares de ações de uma empresa recém-fundada, a Peruvian Gold.
Isso representava setenta e um por cento do capital.
Naquela noite, nem mesmo Homer G. Adams, geralmente tão calmo, conseguiu
conciliar o sono.
***
— Pare! — gritou Raleigh, exaltado ao extremo. — Não atire! Precisamos dele vivo
— explicou. — Como vêem, apenas blefou com essa arma. Prendam-no.
Rhodan aguardara em vão um instante em que a atenção dos guarda-costas se
desviasse o suficiente para que pudesse pegar o radiador térmico sem correr maiores
riscos. A qualquer momento, ao menos três daqueles homens se mantinham de olhos fitos
nele.
Apesar disso a intervenção de Raleigh representou a salvação.
Tudo correu sem a menor dramaticidade. Em uma das duas portas que os guarda-
costas de Raleigh haviam deixado abertas, surgiu a figura morena e corpulenta do capitão
Farina.
Empunhava uma pistola automática do modelo mais recente.
Rhodan foi o primeiro que o viu. Um instante depois, os dois homens que se
encontravam atrás dele também o descobriram.
— Nada de nervosismo — disse Farina em tom tranqüilo. — Acho que vieram até
aqui porque acreditavam que, com a maior facilidade, conseguiriam capturar um
prisioneiro. Acontece que as coisas estão mudadas. Qualquer movimento mais precipitado
custará imediatamente a vida de quem o fizer.
Esperou que suas palavras produzissem o efeito desejado. Depois comandou em tom
enérgico:
— Deixem cair as armas.
Hesitantes, os homens largaram as pistolas, que caíram ruidosamente ao chão.
Rhodan voltou a guardar o projetor mental no bolso e tirou a arma de impulsos
térmicos. Em tom ligeiramente irônico disse:
— Foi sobre isto que lhes falei há pouco tempo.
Farina amarrou os homens, enquanto Rhodan os mantinha sob controle. Nenhum
deles fez qualquer tentativa de escapar.
Farina viera em seu carro. Seguiu logo atrás do carro de Rhodan. Subiram as
montanhas da Serra Nevada. Durante a viagem Rhodan transmitiu uma mensagem
radiofônica para Terrânia.
Pela meia-noite os dois veículos chegaram ao lago Tahoe, que ficava num lugar
solitário. Uma nave transportadora da Terceira Potência já os aguardava. Rhodan entregou
os prisioneiros e enviou uma mensagem escrita a Reginald Bell, para que o resultado do
interrogatório lhe fosse comunicado pelo caminho mais rápido.
À zero hora e quinze minutos, a pesada máquina decolou da margem do lago e
desapareceu em meio à noite.
***
***
***
Durante todo o dia chegavam as notícias enviadas pelo tenente Richman. Não eram
muito animadoras:
— Por enquanto nada de novo. Continuo na pista.
Mas ao menos provava que Richman continuava a cuidar do assunto.
No quarto dia não chegou qualquer notícia. Rhodan estava preocupado; já o capitão
Farina aumentou sua dose de otimismo.
— Com Richman — observou — isso significa que encontrou alguma coisa.
Por isso não se preocuparam mais com ele.
Na noite do mesmo dia leram nos jornais que a polícia de Salt Lake City havia
descoberto um cadáver nos depósitos situados nas proximidades da estação da Union
Pacific. A notícia estava acompanhada de uma fotografia e a descrição do cadáver, tão
minuciosa que não havia a menor dúvida: o cadáver era do tenente Richman.
***
Naquela mesma noite, Farina e Rhodan foram a Salt Lake City. Farina nunca estivera
tão calado como naquelas horas. Percebia-se perfeitamente que se recriminava por sua
leviandade.
Em Salt Lake City comunicaram-se com a polícia. O capitão Farina se identificou,
enquanto Rhodan continuou a fazer o papel de Mr. Wilder, cujo interesse no assassínio do
tenente Richman não foi revelado à polícia.
As indicações que receberam foram simplesmente miseráveis. O cadáver foi
encontrado por dois policiais da ronda. Segundo o parecer do médico-legista, Richman
morrera cerca de três horas antes da descoberta do cadáver. Não havia qualquer pista.
Havia uma certa probabilidade de ter sido morto no lugar em que foi encontrado seu
cadáver, não tendo sido arrastado para lá depois de ter sido assassinado.
O proprietário do depósito era um homem de conduta irrepreensível, que conseguiu
provar dentro de poucos minutos que não era o assassino e nada tinha que ver com o fato.
Farina e Rhodan passaram a noite num hotel. Ao raiar do dia, quando surgiram os
primeiros jornais, havia uma nova sensação para o mundo. Era uma sensação que pouco
interessava a Farina, mas em compensação era de bastante interesse para Rhodan, que
imediatamente interrompeu sua permanência em Salt Lake City e voltou para Nova Iorque.
Um único acontecimento enchia os jornais:
De um dia para outro a General Cosmic perdia um bilhão e meio.
3
***
Naquele instante, esse homem nem de longe estava tão satisfeito como seria de
esperar.
Sem dúvida pudera registrar uma série de êxitos. Mas, ao comparar esses êxitos com
aquilo que esperava alcançar através da ação empreendida, verificou que os mesmos não
correspondiam sequer a cinqüenta por cento dos seus planos.
A partir do seu quartel-general, que ficava a trinta metros abaixo do solo e,
juntamente com a casa que se erguia acima dele, representava uma fortaleza inexpugnável
em meio a uma área civilizada, manteve uma palestra de TV com o jovem que se
apresentara a Homer G. Adams com o nome de Elmer Bradley.
Quando o rosto do jovem surgiu na tela, não parecia irradiar uma dose maior de
otimismo do que na oportunidade em que pela primeira vez se encontrara com Adams.
— Que besteira foi essa? — gritou Monterny. — O senhor recebeu instruções para
causar um prejuízo de pelo menos dez bilhões de dólares à General Cosmic. E o que
conseguiu? Por um cálculo otimista, cerca de quatro bilhões. O que é isso?
Elmer Bradley residia numa casa pequena e modesta, situada numa cidade também
pequena e modesta do norte da Califórnia. As comunicações com Monterny, o
Supercrânio, desenvolviam-se através de canais que estavam imunes a qualquer tipo de
vigilância.
O próprio Monterny nunca surgia na tela. O tubo de imagem do aparelho de Bradley,
quando este se achava ligado, produzia apenas um confuso tremeluzir branco em fundo
negro.
— Não tenho certeza — disse Bradley em tom desanimado. — Os dados que o
senhor me forneceu eram tão transparentes que, de início, nem acreditei que pudesse ser
bem sucedido. Não era possível que um homem como Adams caísse naquilo.
— Como vê — respondeu Monterny em tom áspero — ele caiu.
Bradley respondeu com um aceno de cabeça; parecia cansado.
— É verdade. De qualquer maneira fiquei satisfeito em poder dar o fora.
Subitamente a voz saída do receptor tornou-se gelada.
— O senhor me estragou um golpe, Bradley! Um golpe que por pouco não me faz
atingir o objetivo fixado nos meus planos. O senhor teve tempo de sobra para preparar o
grande golpe contra a General Cosmic. A quantia de dez bilhões de dólares representava o
limite inferior. Para um homem dotado das suas faculdades teria sido fácil atingir o dobro,
o triplo e até mais. Se uma empresa do porte da G.C.C. perde mais de dez por cento de seu
capital, isso geralmente significa o fim. Tudo isso estava ao seu alcance, Bradley! E o
senhor deixou escapar a oportunidade. Por puro medo o senhor agiu precipitadamente. E
com isso só conseguiu que nas minhas próximas investidas contra a General Cosmic terei
de agir com uma cautela toda especial, se é que ainda me posso dar ao luxo de atacá-la. O
senhor terá que se submeter a um novo treinamento, Bradley.
Bradley estremeceu.
Assim que Monterny descobrira nele um telepata de primeira ordem, Bradley teve de
se submeter a um treinamento. Estava firmemente convencido de que nem no inferno
havia coisa pior. O único objetivo desse treinamento consistiu em ativar a faculdade
parapsicológica de Bradley até o limite de sua capacidade, e em familiarizá-lo com os
objetivos do Supercrânio; e também com a idéia de que não haveria qualquer objeção
contra os mesmos.
Bradley que, fora de seus dons extraordinários, era um homem absolutamente
normal, inclusive no que dizia respeito às suas idéias, procurara por duas vezes se subtrair
à influência de seu senhor.
Por duas vezes sentira o poder brutal do Supercrânio. Por duas vezes sentira a
martelada espiritual que, de uma hora para outra, apagava sua vontade para que
prevalecessem exclusivamente as ordens do Supercrânio. E essas ordens teriam de ser
cumpridas imediatamente.
Bradley poderia imaginar perfeitamente que o segundo treinamento não seria mais
agradável que o primeiro. Mas não formulou qualquer objeção.
— Amanhã passará alguém por aí para levá-lo — disse o Supercrânio. — Vá com
essa pessoa e o senhor se transformará num outro homem.
Monterny deu por terminada a palestra. A confusão de linhas ofuscantes na tela do
aparelho de Bradley se apagou.
De seu quartel-general, Monterny transmitiu instruções para que dali por diante as
atividades de seu grupo fossem transferidas para a filial japonesa.
Esperava alcançar mais com as ações planejadas se elas partissem de um ponto mais
próximo à base inimiga.
***
Nesse meio tempo, em Terrânia, as pesquisas psicológicas dos presos, realizadas por
Crest, o arcônida, haviam atingido um estágio em que se esperava obter as primeiras
informações importantes.
Raleigh passara os últimos dias num estado de transe. Não ofereceu a menor
resistência quando Crest se esforçou para penetrar em seu inconsciente.
Crest sabia que as informações que Rayleigh pudesse fornecer se revestiriam da
maior importância para Rhodan. Pediu a Thora que lhe prestasse auxílio na pesquisa
decisiva.
Nos últimos dias, Thora, a arcônida, não tivera outra coisa a fazer senão se recuperar
do choque que lhe rendera a aventura de Vênus.
Thora e Crest pertenciam à tripulação de um cruzador espacial de exploração, que
saíra do planeta de Árcon, situado a mais de trinta mil anos-luz, com a incumbência de
realizar pesquisas neste setor da Via Láctea. A nave, comandada por Thora, ficou presa na
Lua, onde Perry Rhodan a descobriu durante sua primeira viagem espacial. Na época,
Crest precisava de auxílio dos humanos. Estava doente, e nenhuma das pessoas que se
encontravam a bordo da nave estava em condições de curá-lo. Rhodan providenciou o
auxílio de que precisava e reconheceu as possibilidades imensas que lhe oferecia o
cruzador arcônida, produto de uma tecnologia com um avanço de milênios sobre a da
Terra.
Crest apoiou-o, primeiro por gratidão, depois em virtude de uma compreensão
íntima. Thora se opôs; só estava interessada em retornar quanto antes ao seu mundo natal.
Mas o caminho de volta lhe foi barrado pelas potências terrenas, informadas sobre o
pouso de uma raça estranha sobre a Lua. Foguetes terrenos destruíram o cruzador avariado.
Além de Crest, que na época se encontrava na Terra, só restou Thora e uma pequena nave
auxiliar esférica com sessenta metros de diâmetro.
Essa nave e os equipamentos que trazia a bordo conferiram a Rhodan uma
supremacia técnica absoluta para o Estado recém-criado, a Terceira Potência. Rhodan
impediu uma guerra que teria trazido o fim de toda e qualquer civilização terrestre, e
acabou sendo reconhecido pelas grandes potências. Repeliu os ataques desfechados por
inteligências extraterrenas, atraídas pelo sinal de emergência irradiado pelo cruzador
arcônida, e alcançou uma decisão favorável aos agredidos numa guerra travada no sistema
Vega, situado a vinte e sete anos-luz. Apresou, das mãos de uma raça que por sua vez a
havia tirado de alguém, uma supernave arcônida, que foi transformada no núcleo de seu
poderio. Numa viagem erradia de vários anos encontrou o mundo da vida eterna, um
planeta artificial habitado por uma raça que levava uma vida espiritual coletiva e que
percorria uma estranha órbita não-matemática em torno de uma série de estrelas fixas.
Rhodan experimentou em seu próprio corpo o fenômeno inacreditável da renovação
celular e alcançou a imortalidade, cabendo-lhe, todavia, visitar a cada sessenta e dois anos
aquele mundo artificial, que chamara de Peregrino, para submeter-se a novo tratamento
pelo fisiotron. Também Reginald Bell foi transformado num imortal.
Mas a inteligência coletiva espiritualizada negou o tratamento aos arcônidas. Seu
tempo já havia passado; a vida eterna só seria concedida a raças jovens e ambiciosas.
Logo depois, Rhodan retornou à Terra. A situação da Terra, que se apresentava tão
estável quando de sua partida, começara a balançar. O Bloco Oriental revoltara-se. Em
Vênus instalara-se uma divisão espacial inimiga, cuja tarefa consistia em conquistar a base
da Terceira Potência juntamente com o poderoso cérebro positrônico.
Rhodan atacou imediatamente. Dispersou a divisão para os quatro cantos, deixando
vivo um número suficiente de pessoas, para que as mesmas, depois de terem aprendido a
viver no mundo venusiano, acabassem formando uma colônia desligada de toda ambição
política. Depois disso regressou à Terra e removeu um obstáculo à união final da Terra,
que havia sido colocado pelo Bloco Oriental.
Durante todo esse tempo, Thora tivera de se consolar com a promessa de que Rhodan
permitiria seu regresso a Árcon assim que a situação na Terra apresentasse um grau
suficiente de segurança.
Thora esperara por vários anos da escala de tempo terrestre; depois resolveu agir por
conta própria. Apoderou-se de um dos destróieres recém-construídos e foi a Vênus.
Pretendia acionar a hiperestação situada naquele planeta para enviar um pedido de socorro
a Árcon. Mas não sabia que o emissor de sinais codificados, sem o qual não se podia
ingressar na área da base, ainda não havia sido instalado naquela nave. O destróier foi
derrubado e Thora tornou-se prisioneira dos homens que ainda restavam da divisão
espacial do Bloco Oriental.
Rhodan, que imediatamente saiu no encalço de Thora, não teve outro destino.
Utilizou um destróier do mesmo tipo e também foi repelido e derrubado pelas instalações
positrônicas da base.
Sem quaisquer recursos, já que o cérebro positrônico, alarmado por aquelas
ocorrências surpreendentes, bloqueara todo o planeta, não permitindo que ninguém de fora
o atingisse, Rhodan pôs-se a lutar pela libertação de Thora. Saiu vitorioso; mas por várias
vezes teve de encarar a morte pela frente.
Levou Thora, uma Thora tímida e abatida, de volta para a Terra e obteve dela a
promessa de que esperaria até que pudessem ir juntos a Árcon.
De certa forma Thora sentiu-se satisfeita porque Crest pedia seu auxílio. Sem que se
desse conta disso, estava ansiosa por uma oportunidade de demonstrar a Perry Rhodan que
não servia apenas para fazer bobagens e criar confusão. Quem sabe se essa possibilidade
não surgiria durante o exame psicológico do prisioneiro.
Crest já a esperava. A sala em que Rayleigh estava deitado era ampla, mas naquele
momento estava tão atulhada de instrumentos de todos os tipos que não se podia vê-la de
lado a lado.
— O que pretende fazer? — perguntou Thora.
— A rastreação — respondeu Crest laconicamente.
Thora aspirou fortemente no ar.
— Não existe mais nenhuma outra possibilidade?
Crest sacudiu a cabeça.
— Nenhuma. Se é que ainda existe uma memória, esta se localiza em camadas tão
profundas que só podemos alcançá-la pelo rastreamento.
Thora fez um gesto com a cabeça; parecia pensativa.
— Tomara que resista.
Crest aproximou o complicado aparelho de rastreamento, preso a um carrinho,
colocando-o junto ao leito em que se encontrava o prisioneiro.
— Quer segurar os eletrodos? — perguntou Crest. — Eu observarei o indicador.
Sem dizer uma palavra, Thora pegou as duas peças em forma de espula, ligadas por
um cabo ao aparelho propriamente dito, e prendeu-as a um suporte, fixado acima do crânio
de Raleigh, de tal forma que as extremidades apontavam diretamente para a cabeça.
— Pronto? — perguntou Crest.
Thora verificou a posição das duas espulas.
— Pronto!
— Aí vem a corrente.
O pequeno aparelho emitiu um leve zumbido. Thora observou as espulas.
Mantinham-se imóveis.
— Potência máxima! — disse Crest. Na tela surgiram linhas de luzes verdes, das
quais ainda não se podia concluir nada. Crest se certificou de que o registro de imagem
estava funcionando. Com base nas imagens gravadas, o cérebro positrônico estaria em
condições de decifrar a memória de Raleigh.
As linhas que se entrelaçavam na tela estavam nítidas e bem estendidas, o que
provava que os impulsos irradiados à potência máxima eram refletidos da maneira usual.
Raleigh possuía um cérebro normal.
— Inverta a posição das duas espulas! — ordenou Crest depois de algum tempo.
Thora trocou as espulas. Um novo período de irradiação forneceria quadros que
representariam o complemento dos anteriores.
O exame não durou mais de quinze minutos.
— Pronto! — disse Crest.
Uma chave foi desligada com um estalo. O zumbido cessou. Não se notava qualquer
alteração no rosto de Raleigh. Sua respiração era tranqüila.
— Parece que resistiu — observou Thora.
Mas Crest já estava ocupado em outra coisa.
— Quer ajudar também na interpretação? — perguntou.
Thora sorriu.
— Será que está doente, Crest? Meu diagnóstico é o seguinte: um acesso de ativismo
terrano. Acaba de fazer numa hora o trabalho que em Árcon não teria realizado num dia.
Crest retribuiu o sorriso.
— A atividade é uma coisa contagiante — respondeu. — Será que preferia ficar
deitada embaixo de um observador fictício, contemplando os modelos de ondas?
Thora riu.
— Não. Prefiro ajudá-lo.
***
***
Rhodan gastou seu tempo examinando o caso de Homer G. Adams. Aceitou de bom
grado o auxílio da Federação de Defesa da Terra, comandada por Allan. D. Mercant, e por
intermédio dos agentes deste soube que a impressora que havia produzido o prospecto
fictício da Bolsa ficava no Japão.
Rhodan pediu que lhe indicassem o local exato — era num subúrbio da cidade de
Osaka — e examinou o caso. A impressora pertencia a um particular, e o proprietário não
negou que, quinze dias antes, aparecera alguém e lhe pedira que imprimisse o prospecto.
A pista terminou ali mesmo.
Rhodan regressou a Terrânia. Esperava que nesse meio tempo Crest tivesse
conseguido alguma informação de Raleigh.
***
***
O que mais os preocupava era o fato de que o próprio John Marshall não tinha a
menor idéia de como o intruso faria notar sua presença. Era a primeira vez que se
defrontava com uma tarefa como esta.
Marshall passou a ocupar um pequeno apartamento na periferia da cidade. Ficava no
vigésimo primeiro pavimento de um edifício residencial e servia de posto de vigia aos
quatro telepatas.
Dividiram o dia em quatro períodos de seis horas, durante os quais cada um ficaria de
plantão. Cada um dos dois teleportadores ficaria de prontidão por doze horas. O telepata e
o teleportador passavam o tempo jogando baralho ou discutindo. Assim mesmo sentiam
muito tédio enquanto não acontecia nada.
Quem mais se empenhou em sua tarefa foi Betty Toufry. Betty era a telepata mais
potente da Terceira Potência, e, além disso, possuía em elevado grau o dom da telecinésia.
Acompanhara a longa viagem e a permanência no planeta Peregrino.
Naquele dia John Marshall veio substituí-la às seis da tarde. O rosto de Betty
exprimia a tristeza e o desânimo.
— Ainda não houve nada, Marshall — disse.
Marshall sorriu.
— Não tenha medo, Betty. Um dia destes vai acontecer alguma coisa.
Betty confirmou com um aceno de cabeça.
— Vai prestar muita atenção? — perguntou em tom insistente.
— Muita! — prometeu Marshall.
Tako Kakuta estava deitado num sofá que havia na sala do pequeno apartamento e lia
uma revista. Marshall não via seu rosto, mas ouviu que o japonês bocejava.
— Boa tarde, senhor teleportador em serviço — cumprimentou Marshall.
Kakuta largou a revista.
— Boa tarde. Quais são as novidades?
Marshall fez um gesto de desânimo.
— Nenhuma novidade. O que vamos fazer? Jogar uma partida de pôquer ou de
xadrez, conversar, ler?
O japonês refletiu.
— Vamos jogar xadrez — disse depois de algum tempo — se não tiver nenhuma
objeção.
Marshall sacudiu a cabeça.
— É indiferente de que forma mato o tempo.
Kakuta levantou-se e arrastou a mesa para junto de si. Marshall pôs cuidadosamente
no chão a pasta com livros que trouxera consigo e abriu o pequeno armário em que
estavam guardados o tabuleiro e as pedras de xadrez.
A coisa aconteceu quando a caixa com as pedras foi tirada das profundezas do
armário e, ao se erguer, Marshall bateu com a parte traseira do crânio na quina do armário.
Alguma coisa estranha e meiga parecia agarrar seu cérebro. No início parecia hesitar,
mas depois tornou-se mais forte e assumiu a forma de instruções concretas — instruções
dirigidas a um desconhecido que naquele instante penetrava no território da Terceira
Potência.
Marshall deixou cair a caixa com as pedras. O barulho fez com que o teleportador se
pusesse de pé.
— Chegou — fungou Marshall. — No edifício da administração, entre o vigésimo e
o trigésimo andar. Tem instruções de prender Crest e levá-lo consigo. Vamos logo! Dê o
fora!
Por uma fração de segundo, Tako se manteve imóvel, com o rosto inexpressivo,
como se não tivesse entendido o que Marshall acabava de dizer. Depois o ar começou a
tremeluzir, e de um instante para outro o japonês desapareceu.
Marshall pôs-se em movimento. Com um simples movimento de mão estabeleceu a
ligação de telecomunicação com o edifício da administração. O major Nyssen, que naquele
instante substituía Bell, recebeu o aviso de alarma e providenciou para que o respectivo
setor do edifício fosse evacuado imediatamente. Era de esperar que o teleportador inimigo
não perceberia a operação, pois levaria algum tempo para se orientar. Para ser bem
sucedido Tako Kakuta precisaria ter o campo livre.
Rhodan foi avisado de que pretendiam raptar Crest. A informação deixou-o bastante
preocupado. Crest era a coisa mais preciosa que a Terceira Potência poderia perder. E o
desconhecido parecia ter bastante certeza de que conseguiria atingir esse objetivo. Era
necessário descobrir por que se sentia tão seguro.
Por ordem de Nyssen, John Marshall deixou seu posto e instalou-se no interior da
área protegida pelo campo energético, diante do edifício da administração. Dali mantinha
contato permanente pelo micro-telecomunicador com Nyssen e com o quartel-general, e
poderia dar aviso imediato ao major quando surgisse alguma novidade.
As sensações que Marshall experimentava pouco se modificaram quando ele se
aproximou do edifício da administração. Teve a impressão de que as mesmas não
dependiam muito da distância. Não saberia descrever a sensação que tomava conta de seu
espírito. Era um tipo de dor de cabeça, uma pressão constante que, todavia, ao contrário de
uma dor de cabeça comum, vinha acompanhado de uma informação sobre sua origem. A
pressão estava ligada a uma série de impulsos perfeitamente distinguíveis. Eram as
instruções destinadas ao teleportador desconhecido.
Marshall assumiu seu posto bem na entrada do gigantesco edifício. Transmitiu a
seguinte informação ao major Nyssen:
— Acabo de ocupar nova posição, major. Por enquanto não há nenhum
acontecimento extraordinário. O homem move-se muito devagar: não está executando
nenhum salto de teleportação.
***
***
***
Só por uma fração de segundo, o japonês pôde lançar os olhos em torno, ao chegar ao
destino. Reconheceu uma sala de tamanho médio, cujas paredes, soalho e teto eram de
concreto. Via-se uma mesa, três cadeiras velhas e um armário com uma fechadura de
enrolar antiquada. Não havia nenhuma janela. A iluminação provinha de um tubo
luminoso de um metro e meio, preso ao teto.
Na outra extremidade da sala, a poucos metros de distância, o desconhecido acabara
de surgir do nada. Tako esteve prestes a dirigir-lhe a palavra. Foi quando uma força
desconhecida atingiu seu cérebro com uma violência indescritível.
Tako caiu para a frente. O radiador de impulsos térmicos caiu-lhe da mão. Tako
comprimiu o rosto contra o soalho frio e segurou as têmporas para afastar a dor
insuportável.
Por uns trinta segundos não conseguiu fazer qualquer movimento. As ondas de
amplitude variável da influência estranha percorriam sua cabeça, faziam-no esquecer por
que viera e transformaram-no num pedacinho choroso de gente.
Só depois de algum tempo lembrou-se de que possuía um dom que lhe permitia
transportar-se para um lugar seguro. Concentrou-se o mais rápido possível, e com a maior
intensidade que a dor lhe permitia, sobre o lugar de onde viera. Quando a influência
estranha reduziu-se, apenas por uma fração de segundo, a um nível suportável, saltou.
Sentiu que a dor martelante e ondulante abandonou-o de um instante para outro. A
tração e as tensões produzidas pela teleportação não representavam nada em comparação
ao que suportara nos últimos segundos.
Sentiu-se grato ao ver que as estrelas cintilantes voltaram a surgir acima de sua
cabeça. Ouviu um farfalhar e sentiu uma areia grossa sob os joelhos. Lançou os olhos em
torno.
As luzes de Terrânia brilhavam a oeste. Descera a menos de dez quilômetros do
destino.
A estafa tomou conta de seu corpo. Quando tentou levantar, as pernas se dobraram.
Inconsciente, caiu estendido sobre o pedacinho de areia amarela do deserto que,
enfrentando todas as operações de irrigação artificial, conseguiu se manter entre duas
extensas áreas ajardinadas.
4
***
***
***
***
Clifford Monterny sentira seu primeiro fracasso de grandes proporções, por assim
dizer, por transmissão direta.
Mantivera-se em contato telepático unilateral e imperceptível com o japonês Tako
Kakuta, até que o bloqueio hipnótico a que o mesmo estava sujeito foi removido por via
psicológica. Antes que pudesse restabelecer o contato interrompido, um contrabloqueio foi
incutido na mente de Tako, e este era tão poderoso que nem mesmo o Supercrânio
conseguia rompê-lo.
O que mais preocupava Monterny era o fato de que não podia atinar com o motivo
pelo qual Rhodan havia previsto o atentado que se planejava. Tako Kakuta não se traíra
com nenhuma palavra, com nenhum gesto. Enquanto esteve submetido a tratamento
médico, cuidaram em primeira linha de seu bem-estar físico. O exame mental foi tão
superficial que nem mesmo um bloqueio hipnótico muito mais mal instalado teria sido
percebido.
Contudo...
Monterny acreditava que Rhodan não era nenhum mutante; ou melhor, ele tinha
certeza quase absoluta disso. Não possuía qualquer dom profético, telepático ou de outra
natureza que lhe permitisse ver o interior do japonês.
Apesar disso soube o que iria acontecer. No momento exato abrigara-se atrás de um
campo energético e com um sorriso assistiu ao espetáculo do tiro mortal repelido pela
parede energética protetora. A dor que o choque elétrico produziu em Tako foi tão intensa
que até Monterny chegou a senti-la.
E para que foi tudo isso?
Uma vez que estava convencido de que Rhodan não era nenhum mutante, só podia
supor que sua conduta diante do atentado resultava de uma capacidade de raciocínio quase
sobre-humana. E essa idéia deixou-o tão furioso que, por muitas horas, não esteve em
condições de conceber uma idéia clara.
Além da sede de poder, o Supercrânio ainda estava imbuído da convicção de que um
mutante é um homem superior. Para ele não podia haver coisa pior do que saber que um
homem comum havia desmascarado seus planos.
Na manhã do dia seguinte, Monterny teve uma palestra prolongada com MacMurray,
seu melhor confidente.
MacMurray era o único entre os mutantes de Monterny que já vira o Supercrânio face
a face. Foi naquele primeiro contato, e depois disso o fato repetia-se constantemente.
A influência hipnótica a que MacMurray estava submetido era tão intensa que sua
verdadeira personalidade se perdera há muito. Enquanto isso, suas capacidades
parapsicológicas haviam crescido. Um salto destinado a vencer distâncias planetárias já
não constituía o menor problema para aquele jovem, que no meio tempo havia chegado aos
vinte anos. Durante o salto produzia um campo transicional tão amplo e intenso em torno
de si que podia perfeitamente levar consigo objetos de grandes dimensões.
Era justamente em virtude dessa faculdade que MacMurray costumava desempenhar
um papel importantíssimo nos planos de Monterny.
***
***
***
— O senhor já conhece sua tarefa — disse o Supercrânio em tom amável. — Não se
esqueça de que muita coisa depende do sucesso desta missão.
Acostumara-se a dar a MacMurray o tratamento de senhor, depois que fizera dele seu
confidente.
MacMurray confirmou com um aceno de cabeça.
— Não me esquecerei.
— E não cometa o mesmo engano desse idiota do Bradley. Não se apresse. Pelo que
sei, o senhor não correrá o menor risco.
MacMurray confirmou com um aceno de cabeça.
— Aguardo seu relatório pontualmente na hora combinada — advertiu-o o
Supercrânio.
Mais uma vez MacMurray confirmou com um aceno de cabeça.
Depois saiu. No seu quarto — se é que se podia chamar aquilo de quarto, pois não
tinha janelas, a única luz provinha do tubo branco-azulado e as paredes eram de concreto
maciço — reuniu as poucas coisas de que precisava para sua tarefa. Principalmente a
pistola automática, que era o único instrumento em que um teleportador podia confiar
quando, depois de um salto, surgisse em meio aos seus inimigos.
Os objetos encheram uma mala de tamanho médio. MacMurray segurou a mala
embaixo do braço e parou no meio do quarto, como se refletisse para se lembrar se havia
esquecido alguma coisa.
Poucos instantes depois seus contornos começaram a se apagar, e logo depois
desapareceu por completo.
MacMurray pusera-se a caminho, com a finalidade de, agindo segundo as intenções
do mestre, desferir contra a Terceira Potência o golpe mais pesado que a mesma já sofrera.
***
A noção que Nyssen tinha sobre aquilo que poderia e não poderia fazer em Osaka era
de uma precisão confortadora.
Uma das coisas que envolviam um risco excessivo seria, por exemplo, uma visita à
impressora que confeccionara o prospecto da Bolsa. O próprio Rhodan visitara a mesma
poucos dias atrás, e se esta mantinha qualquer tipo de relacionamento com o misterioso
desconhecido, conforme era de supor, essa visita teria sido cuidadosamente registrada,
mesmo que Rhodan não tivesse sido reconhecido.
Nyssen pretendia desempenhar seu papel por muito tempo sem dar-se a conhecer.
Numa cidade do tamanho de Osaka não havia nada mais fácil, com os meios de que
dispunha, do que encontrar pessoas que se dispusessem a tirar as castanhas do fogo para
ele.
Nyssen deu uma olhada pela cidade. Passou uma manhã inteira passeando na zona
portuária, e os resultados correspondiam inteiramente às expectativas.
Mais de uma dezena de pessoas envolveram-no numa palestra no curso de várias
horas, dando a entender que eram exatamente as pessoas que estava procurando. Nyssen
ficou satisfeito ao saber que pareciam ler em seu rosto que estava à procura de
colaboradores.
Escolheu muito. Pelas dez horas, por pouco não contrata um jovem que tinha uma
expressão de desespero no rosto, o que levaria qualquer um a indagar como viera parar
num ambiente desses. Havia um risco muito grande que, um dia, tivesse um acesso de
moralismo e corresse à polícia para descarregar suas preocupações. Por isso, Nyssen
mandou-o embora.
Acabou por se decidir a favor de um homem pequeno de olhos matreiros, que
atravessou seu caminho pelas onze e meia e disse num péssimo inglês:
— Eu Michikai. Michikai fazer tudo. O senhor pagar bem, Michikai ser seu homem.
Nyssen sorriu. Michikai aparentava uns quarenta anos e era cerca de vinte
centímetros mais baixo que ele.
— Mim Jeremy. Jeremy pagar bem, o senhor fazer tudo.
Disse-o em japonês, esforçando-se para imitar o péssimo inglês de Michikai. Este
parecia perplexo. Depois riu, e quando Nyssen também se pôs a rir, o contrato estava
praticamente fechado.
O resto foi combinado num restaurantezinho. É claro que Nyssen não explicou a seu
novo colaborador a verdadeira finalidade de tudo aquilo. Apenas lhe disse que gostaria de
obter informações sobre as instalações daquela impressora. A tarefa pareceu tão fácil a
Michikai que ele se espantou bastante quando Nyssen lhe pagou trinta dólares de
adiantamento e lhe prometeu outros trinta dólares quando tivesse todas as informações em
que estava interessado.
Nyssen combinou com seu colaborador que, dali em diante, seus contatos seriam
exclusivamente telefônicos. Para esse fim Michikai permaneceria durante certas horas num
restaurante que lhe era conhecido, e onde Nyssen poderia encontrá-lo.
Não se previu qualquer possibilidade de contato em sentido oposto; Nyssen quis
resguardar-se contra qualquer interferência do desconhecido.
***
Freddy MacMurray admirou a cidade. Nunca a vira. Ela lhe parecia mais bela que
tudo que seus olhos já haviam contemplado.
Surgira na margem norte do lago salgado, cuja superfície cintilante interpunha-se
entre ele e a cidade de Terrânia.
MacMurray admirou o panorama até que o Supercrânio se fizesse sentir. A ordem só
foi irradiada com uma dose minúscula de energia, mas MacMurray entendeu-a
perfeitamente.
“Eu lhe disse que não se apressasse, mas não lhe pedi que perdesse seu tempo
olhando para as coisas que encontrasse pelo caminho. Comece logo!”
MacMurray pôs-se a correr. Sabia perfeitamente o que havia incomodado o
Supercrânio. Não era o fato de ter contemplado a cidade. De um agente seu esperava-se
que examinasse a área em que iria desenvolver sua atividade.
Monterny conhecia os pensamentos de seus colaboradores. Percebera a admiração
que MacMurray sentira durante alguns segundos por essa cidade. E isso o deixara zangado.
MacMurray caminhou pelas áreas ajardinadas desabitadas até enxergar perfeitamente
os detalhes das casas situadas na extremidade norte da cidade. Depois saltou para lá.
O Supercrânio seguiu-o atentamente. Sabia que a tarefa de MacMurray encerrava
certo risco para ele, Monterny. Sabia perfeitamente de que maneira fora localizado o outro
teleportador, em cujos calcanhares Tako Kakuta se havia grudado. Sabia que no Exército
de Mutantes de Rhodan havia telepatas muito potentes, e que não era só MacMurray, mas
também seus planos que corriam perigo se mantivesse contato permanente com aquele
jovem.
Para observá-lo, acompanhou as emanações irradiadas por MacMurray. Só em caso
de extrema necessidade o próprio Monterny funcionaria como emissor.
A tarefa era importante demais.
***
Nyssen telefonou e pediu que chamassem Michikai. Este deu seu nome verdadeiro.
Nyssen disse:
— Os pessegueiros já começaram a florir no sul de Kiushu?
Michikai pigarreou e respondeu:
— Ainda não. Mas em Hondo a floração quase chegou ao fim.
— Está bem — disse Nyssen. — O que há de novo?
— Já dei uma olhada naquela impressora.
— Discretamente?
— Muito discretamente. Disse que pretendia fazer um pedido de vulto, mas não
conseguia chegar a um acordo com o proprietário quanto ao preço. Por isso fui embora. Já
havia visto tudo. Ou melhor...
— Ou melhor?
— Quase tudo. Ainda há uma sala em que não consegui entrar. Mas aposto que não
tem mais de quinze metros quadrados, e que nela só há uma porta, pela qual consegui dar
uma olhadela.
— Você tentou entrar lá? — perguntou Nyssen.
— Sim. Ao sair fiz de conta que me enganei na porta. O proprietário da impressora
não gostou. Quase chegou a se zangar. No último instante conseguiu dirigir meus passos
para o outro lado.
— Hum — fez Nyssen. — Viu alguma coisa do que havia lá dentro?
— Vi, sim. Um videofone.
— Nada mais?
— Nada.
— Está bem. Preste atenção, Michikai. Na agência do correio da estação central da
estrada de ferro há uma caixa cujo número é 7.415 — sete, quatro, um, cinco. O
funcionário só a abrirá a quem lhe disser a senha Hokaido. É lá que seus cinqüenta dólares
estão depositados. Nos próximos dias voltarei a telefonar.
Na outra extremidade da linha Michikai soltou um grito agudo.
— Só cinqüenta dólares? Com tudo...
Nyssen não ouviu mais nada. Desligara.
Nos próximos trinta minutos ficou refletindo sobre a hora mais propícia para a visita
planejada.
***
Face às informações minuciosas de que dispunha, sabia quase tudo sobre o dia-a-dia
de uma grande metrópole. Não havia qualquer hora realmente tranqüila, apenas períodos
de um relativo alívio.
Nyssen escolheu o período entre uma e as quatro da madrugada. Segundo pensava,
três horas seriam suficientes para realizar um exame minucioso numa pequena impressora.
Dormiu o resto da tarde, jantou bem e foi a um cinema cuja sessão terminava pouco
antes da meia-noite.
Depois voltou ao hotel e equipou-se com as coisas que julgava necessárias ou úteis.
Eram mais de vinte objetos; mas, face ao avanço da micro técnica arcônida, apenas
ocupavam dois bolsos da calça e um do paletó.
É bem verdade que o pesado radiador de nêutrons teve de ser carregado sobre o
ombro.
Pouco antes da uma encontrava-se nas proximidades da tipografia. Ficou satisfeito ao
constatar que a rua estava praticamente vazia. Se conseguisse abrir a porta do edifício
dentro de três minutos, praticamente não correria o menor perigo.
Gastou três minutos e meio; mas não apareceu ninguém que o perturbasse. Tinha
certeza de que ninguém o observara.
Face à descrição de Rhodan e de Michikai, Nyssen já conhecia a sala de recepção, os
pequenos escritórios e a oficina ligada aos mesmos. Não perdeu tempo em revistar essas
peças. Sem maiores problemas penetrou no escritório maior e mais bem instalado e
procurou a porta de que Michikai lhe havia falado.
No escritório havia um total de cinco portas. Aquela que Nyssen procurava era a
única que se haviam dado o trabalho de trancar.
A fechadura era de um modelo simples. Não resistiu mais de vinte segundos às micro
ferramentas de Nyssen.
A pequena sala que ficava além dessa porta não tinha janelas. Nyssen fechou a porta
atrás de si, acendeu sua pequena e forte lâmpada permanente e procurou um lugar em que
pudesse colocá-la.
Além do videofone a que Michikai havia aludido só havia uma cadeira. Nyssen
colocou a lâmpada sobre a cadeira e refletiu sobre o lugar em que devia iniciar as buscas.
Pensou que estava sendo um pouco ridículo quando começou a percutir as paredes.
Alguns lugares pareciam ocos, mas quando os iluminava com o pequeno bastão de raios-X
constatava que apenas se tratava de um pouco de emboço caído entre os tijolos.
Gastou uma hora nessa atividade. Aos poucos se convencia de que nada encontraria.
Subitamente ouviu um zumbido grave atrás de si. Voltou-se apressadamente e viu
que a tela do videofone começou a se iluminar.
Afastou-se da parede e contemplou a tela. Era estranho que um videofone começasse
a funcionar por si. Geralmente a tela só se iluminava depois de estabelecida a
comunicação. Aqui isso não poderia ter acontecido, pois ninguém havia levantado o fone.
Nyssen nem sequer ouvira o sinal de chamada.
Colocou-se numa posição em que o transmissor de imagens não pudesse captá-lo e
esperou.
No momento em que, num movimento rápido, desligou a lâmpada, ouviu o estalo no
receptor.
O fone estava colocado no suporte, mas apesar disso falava.
Nyssen foi se esgueirando junto à parede, chegando um pouco mais perto do
aparelho. Ouviu a voz metálica que começara a falar. O videofone parecia ter um
amplificador ultra potente. Mesmo sem levantar o fone, Nyssen entendia praticamente
todas as palavras.
— ...uma conferência importante amanhã às vinte horas... na minha casa. Todos
devem comparecer...
A atenção de Nyssen foi desviada em parte pela imagem estranha que surgiu na tela.
Consistia numa confusão inextricável de linhas. À primeira vista parecia se tratar de
alguma interferência; mas Nyssen logo percebeu que havia certa regularidade naquelas
linhas trêmulas e ondulantes.
Tirou sua pequena máquina fotográfica e deixou que a mesma registrasse as linhas.
Não conseguiu desempenhar toda sua potencialidade micro técnica, pois a transmissão
logo cessou. Mas Nyssen esperava que os peritos conseguissem extrair algum resultado da
fotografia.
Mal e mal percebera que as palavras transmitidas não continham qualquer indicação
importante. Só se falava em coisas das quais os sócios da misteriosa organização já sabiam
onde se encontravam, motivo por que não havia necessidade de outras explicações.
As esperanças de Nyssen concentraram-se na fotografia que acabara de fazer.
O tempo estava ficando curto. Nyssen não mais bateu nas paredes. Tinha certeza
quase absoluta de que nada havia atrás delas.
Preferiu dedicar sua atenção ao admirável videofone que começou a funcionar sem
que ninguém o ativasse e cujo fone falava quando ainda se encontrava no suporte.
Havia um fio comum, um tanto fino, que desaparecia na parede pouco abaixo da tela
de imagem. Nyssen iluminou a parede e viu que o fio a atravessava em sentido horizontal.
Voltou ao escritório maior e procurou um caminho que o conduzisse ao lado oposto
da parede. Havia uma porta que dava para um pátio dos fundos. Uma das paredes desse
pátio era exatamente a que Nyssen procurava.
Nyssen não gastou muito tempo. Viu perfeitamente o fio um tanto fino que saía da
parede, descrevia uma dobra e subia ao telhado.
E em cima do telhado havia uma antena robusta e alta.
Nyssen soltou um assobio entre os dentes. Tal qual os telefones, os videofones
estavam ligados a uma rede. Recebiam os impulsos visuais e auditivos através de fios que,
dentro da cidade, eram colocados embaixo da terra e, na zona rural, eram presos a postes
de madeira ou plástico. Um videofone não precisava de antena; neste ponto era igual a um
telefone.
Aquilo não era um videofone comum. Era um receptor e transmissor que funcionava
sem fio. Apenas fora disfarçado sob a forma de um videofone, para enganar os visitantes.
Foi por isso que aquilo começou a trabalhar sem que o fone tivesse sido levantado.
Bastante pensativo, Nyssen interrompeu sua visita noturna. Ainda continuava
pensativo quando abriu a porta de seu quarto de hotel.
Como de hábito, tirou em primeiro lugar os instrumentos de medida e colocou-os
cuidadosamente sobre a mesa.
Passou à leitura dos instrumentos, ainda mergulhado em pensamentos e convencido
de que os mesmos não indicariam nada.
Radiatividade, nenhuma.
Temperatura, que bobagem. Ele não teria deixado de perceber se tivesse penetrado
numa onda de calor. Normal!
Influência telepático-hipnótica...
Os instrumentos eram tão pequenos que Nyssen teve de recorrer a uma lupa para ler
as respectivas escalas. Praguejando baixinho, mas com violência, tirou a lupa do olho
esquerdo e colocou-a no direito.
Mas o quadro era o mesmo.
Influência telepático-hipnótica, oscilação do instrumento: escala seis.
Nyssen deixou que a lupa caísse do olho e fitou o espaço diante de si.
Pelo que dizia o instrumento de medida, ele, Nyssen, sofrerá influências hipnóticas.
A escala seis correspondia a seis microfreud, o suficiente para hipnotizar uma dúzia de
homens adultos.
Mas não percebera nada. Ou será que percebera?
Ainda estaria submetido a alguma influência hipnótica?
“Pois bem. Não seria difícil encontrar uma explicação para o fato de não ter
percebido nada. Cada cérebro tem sua faixa peculiar de freqüência. É bem possível que
alguém tenha transmitido por outra freqüência, à qual meu cérebro não é acessível. A
medição do instrumento é integral no que diz respeito à freqüência. Mede tudo que
aparece sob a forma de influência hipnótica.”
Mas, com os mil demônios, de onde teria vindo essa influência hipnótica?
Quando a única explicação possível ocorreu a Nyssen, este esteve prestes a pegar
novamente seus instrumentos e fazer mais uma visita à tipografia. Mas depois de ter
olhado para o relógio desistiu da idéia. Eram três e meia, tarde demais.
As ondulações refletidas na tela não eram nenhuma interferência, nem constituíam o
produto de uma estranha fantasia geométrica. Tratava-se de uma transmissão hipnótica!
5
***
Rhodan estava convencido de que nada mais poderia ser tirado do modelo de salto
que o Dr. Manoli havia extraído do cérebro de Kakuta.
O diâmetro do círculo traçado no mapa fora reduzido para cinco quilômetros.
Só um trecho muito pequeno da cidade de Osaka ficava dentro do círculo. A
probabilidade de que o objetivo ficasse fora da cidade era muito grande.
Isso facilitaria as buscas. No Japão uma casa que tivesse um porão de concreto seria
considerada muito grande.
Depois de ter reunido todos os resultados, Rhodan chamou Crest.
Crest não respondeu.
Rhodan telefonou para Thora.
Fazia mais de três horas que Thora não via Crest.
Rhodan deixou que alguns minutos se passassem e voltou a chamar Crest.
Mais uma vez Crest não respondeu.
Rhodan lembrou-se da tarefa que fora confiada ao teleportador desconhecido, que
havia atraído Tako Kakuta a uma armadilha tão perigosa.
Ordenou uma busca geral.
Dali a uma hora não havia mais a menor dúvida de que Crest já não se encontrava no
território da Terceira Potência.
E não avisara a ninguém onde poderia ser encontrado.
Crest fora raptado.
***
Uma extrapolação retrospectiva indicou a hora provável do rapto: entre as vinte horas
e as vinte e trinta. Pouco depois Rhodan fizera a primeira tentativa de falar com Crest.
Àquela hora o serviço de vigilância estivera a cargo de Ishi Matsu, uma japonesinha
delicada. Ishi informou que, pouco depois das vinte horas, captou um impulso isolado
relativamente forte, mas indecifrável. Uma vez que o impulso não se repetiu, não se
preocupou com ele.
Rhodan informou a Thora de que Crest havia sido raptado. Nunca vira a arcônida tão
apavorada.
— O que... o que pretende fazer? — perguntou.
Rhodan olhou-a com uma expressão de espanto.
— Pretendo atacar. Não acha que é o mais acertado?
— Onde? Pois...
— Já disponho de todas as informações de que preciso. É possível que Nyssen tenha
descoberto mais alguma coisa. Partiremos imediatamente.
— Vai usar o hipertransmissor de matéria?
O hipertransmissor de matéria era um aparelho que Rhodan trouxera da viagem em
busca do planeta Peregrino. Substituía, em quem a ele recorresse, o dom parapsicológico
da teleportação, transportando a pessoa pelo espaço de cinco dimensões até um ponto em
que se encontrasse um receptor ajustado para a mesma freqüência.
Rhodan sacudiu a cabeça.
— A partir daqui, não — respondeu. — Os dados que conhecemos ainda não são
suficientes. Nas próximas cinco horas um destacamento nosso voará para Osaka.
Levaremos hipertransmissores e, uma vez conhecido os detalhes da situação, não
deixaremos de usá-los.
O tempo entre as seis e as sete horas da manhã era uma das horas em que Michikai
devia permanecer em seu restaurante, aguardando o chamado de Nyssen.
Este dormiu duas horas. Chamou pouco depois das seis. Foi informado de que
Michikai não estava.
Meia hora depois Nyssen repetiu o chamado; mas Michikai ainda não havia
aparecido. Nyssen pensou que no dia anterior tivesse apanhado seus cinqüenta dólares e
desaparecido. Isso não o preocupava, mas naquele momento o incomodava; bem que
precisaria de Michikai.
Contrariamente ao que havia decidido antes, foi ao restaurante em que Michikai
devia estar a essa hora. Talvez o dono pudesse dar alguma informação sobre seu paradeiro.
***
Para Crest tudo havia sido tão rápido que ainda não chegara a compreender o que
tinha acontecido. Subitamente um jovem surgiu em seu quarto e abateu-o.
Ao despertar, viu-se numa sala que muito se assemelhava à que Tako Kakuta
descrevera.
Crest quase não sentiu nenhuma dor de cabeça; por isso acreditou que a pancada não
devia ter sido muito forte, e que o desmaio não fora prolongado. Mas, pelo que dizia
Rhodan, a sala em que se encontrava ficava no Japão, isto é, a milhares de quilômetros de
Terrânia.
Como chegara tão depressa até lá?
Quem sabe se nas imediações de Terrânia não existiam outras instalações desse tipo?
Só depois de algum tempo Crest lembrou-se da possibilidade de que, entre os
inimigos, podia haver algum teleportador suficientemente forte para transportar um
homem inconsciente num salto. Depois de refletir por algum tempo, Crest admitiu que a
explicação verdadeira era esta.
Levantou-se e examinou a única porta daquela sala. Era feita de chapa de aço
bastante sólida e não podia ser aberta do lado de dentro. O mobiliário da sala consistia
numa cadeira e numa mesa.
Crest sentou na cadeira e esperou. Lamentou não ter o hábito de carregar
constantemente uma arma consigo. Entre os potentes radiadores térmicos dos arcônidas
havia alguns suficientemente pequenos para terem boa probabilidade de escapar a uma
revista pessoal.
Cerca de uma hora depois de ter despertado, a porta se abriu e um homem que nunca
vira antes gritou:
— Venha comigo!
Crest ergueu as sobrancelhas e continuou sentado.
— Para onde? — perguntou.
O homem exibiu uma pistola automática.
— O senhor vai ver! — gritou, furioso. Crest levantou-se e, passando perto do
homem, saiu da sala. A sala à qual foi ter não era mais confortável que a primeira. Uma
cadeira e uma mesa.
Mas a outra continha, além desses móveis, um videofone.
— Pegue a cadeira e sente diante da tela! — ordenou o homem que segurava a pistola
automática.
Crest obedeceu. O homem ficou parado na porta. Crest esteve a ponto de lhe
perguntar o que aconteceria, quando a tela no videofone começou a se iluminar.
Não mostrou nenhum quadro, mas apenas um conjunto de linhas brancas trêmulas e
ondulantes.
No mesmo instante Crest sentiu aquela estranha pressão na cabeça, acompanhada de
um zumbido.
Reagiu imediatamente. Não era difícil a um cérebro arcônida, ainda mais a um que
possuísse o grau de treinamento do de Crest, resistir a qualquer espécie de influência
telepática ou hipnótica.
Mas compreendeu o significado do comando hipnótico:
— Daqui em diante você vai trabalhar para mim. Preciso de um homem como você.
E saberei recompensá-lo pelos serviços que você me prestar. Você será meu servo fiel.
Crest compreendeu tudo que estava acontecendo.
As linhas onduladas que surgiram na tela de imagem representavam a emanação
reforçada de uma transmissão hipnótica e exerciam influência sobre quem contemplasse a
tela.
Dali se concluía que as suposições de Rhodan foram falsas: o desconhecido não
dispunha apenas da força de seu cérebro, mas ainda possuía recursos mecânicos destinados
à produção de comandos hipnóticos, embora os mesmos ainda fossem primários e de
potência reduzida.
Uma voz antipática começou a falar depois que a transmissão hipnótica havia durado
cerca de dois minutos.
— Então; consegui agarrá-lo, não é?
Crest achou que não valia a pena responder.
— De hoje em diante o senhor vai trabalhar para mim! — prosseguiu a voz.
Crest resolveu usar franqueza.
— Não vou fazer nada disso! — respondeu.
Por alguns segundos o desconhecido pareceu perplexo.
— Ah! Então não fez efeito! Muito bem! Como vê, já conheço sua freqüência
pessoal. Não acredite que poderá resistir por muito tempo. Levem esse homem.
Crest foi levado de volta à sala em que despertara uma hora antes. Sentou à mesa e
pôs-se a refletir.
***
***
***
Incrédulo, o Supercrânio fitou o quadro que se projetava na tela do aparelho de
advertência e vigilância.
Um estranho!
Estava de pé na pequena área interna existente no meio do complexo quadrático
formado pela casa de campo. Usava uma vestimenta que Monterny jamais havia visto e
trazia na mão uma arma grosseira, de cano curto.
O Supercrânio viu que o homem olhava em torno de si, como se estivesse procurando
alguma coisa.
Um instante depois desapareceu.
Mais um instante, e voltou a aparecer em outro lugar.
Não! Não era o mesmo homem. Era mais baixo e tinha ombros mais largos.
Monterny sentiu que suas mãos tremiam.
Dois homens haviam conseguido burlar todos os dispositivos de vigilância,
penetrando na área interna, e, além disso, sabiam se tornar invisíveis à vontade.
Monterny deu o alarma.
Mas os dois homens haviam desaparecido e por enquanto não voltaram a aparecer.
***
***
***
Exatamente uma hora depois de ter sido preso, Nyssen começou a martelar a porta
com toda força dos seus punhos. Martelou-a durante quinze minutos; depois ouviu passos
rastejantes.
Continuou a martelar até que a porta se abriu. Só então foi para o lado e se abaixou.
O vigia trazia a pistola na mão; mas Nyssen não veio da direção que ele supunha.
A borda da mão de Nyssen atingiu o alvo com a precisão de um centímetro. O vigia
soltou um grito selvagem, largou a arma e rodopiou.
Seus movimentos eram lentos em comparação com os de Nyssen. Um soco bem dado
atirou-o sobre o chão de concreto.
Ficou inconsciente por um minuto. Nesse tempo Nyssen pegou a arma e certificou-se
de que, no corredor, não havia nada que pudesse perturbá-lo.
— Preste atenção! — disse ao vigia. — Preste muita atenção! Você sabe
perfeitamente que me encontro numa situação terrível. Preciso de você para sair daqui.
Não faço a menor questão de ser capturado mais uma vez. Gostaria disso tão pouco que o
matarei assim que fizer qualquer coisa de que eu não goste. Entendeu?
O vigia era um japonês. Respondeu com um apressado aceno da cabeça. Nyssen tinha
certeza de que apenas se encontrava sob uma influência pós-hipnótica relativamente débil.
— Há outro prisioneiro por aqui — afirmou Nyssen. — Onde está?
O vigia fez um gesto desolado em direção ao corredor.
— Quantos vigias existem aqui embaixo?
— Cinco.
— Leve-me ao outro prisioneiro, mas de tal maneira que não nos encontremos com
nenhum dos outros vigias.
Por alguns minutos o japonês levou Nyssen de um canto para outro.
Finalmente encontraram Crest.
O arcônida levou algum tempo para compreender a sorte que estava tendo. Só com
grande dificuldade Nyssen conseguiu expor seus planos.
— Ainda falta muito para estarmos em segurança — disse Nyssen em tom decidido.
— O desconhecido ainda mantém firmemente a sua base. Temos de pôr a mão no radiador
de nêutrons que me tiraram.
Finalmente Crest compreendeu. E concordou com todas as sugestões de Nyssen.
Gritou com a porta aberta a toda a força de seus pulmões, e o vigia, que acorreu para ver
qual era a origem de tamanho barulho, foi abatido por Nyssen, à traição, é verdade, mas
em compensação sem a menor resistência.
Passaram sorrateiramente junto aos outros três vigias. Segurando a arma de que se
haviam apoderado, Crest ficou de sentinela junto ao elevador, enquanto Nyssen e o
japonês subiram. O próprio japonês deu-lhe uma indicação sobre o lugar em que poderia
encontrar a arma neutrônica. Era na mesma sala em que um dos seqüestradores havia
desaparecido por um instante, logo à sua chegada.
Embora não estivesse informado sobre o número de pessoas que se encontravam
naquela casa, Nyssen tentou reaver sua arma e foi bem sucedido. Acompanhado de seu ex-
vigilante, retornou ao subterrâneo.
Uma vez lá, manipulou a arma, no que foi apoiado pelas indicações de Crest, e
depositou-a num lugar que julgava suficientemente eficaz e seguro.
Finalmente Crest e Nyssen puseram-se em movimento.
***
Poucos minutos depois, Rhodan e seus homens avançaram sem disfarce para a casa
de campo, vindos de duas direções. O ataque do oeste foi iniciado cerca de dois minutos
antes do que vinha do sul. Face a isso a casa ficou praticamente desguarnecida do lado do
sul.
Nyssen e Crest aproveitaram o tempo. Correram para junto dos homens de Rhodan,
quando os mesmos se encontravam a uns cem metros da casa.
Rhodan foi avisado e imediatamente mandou suspender o ataque. Um dos homens de
seu grupo, equipado de microfone e alto-falante, penetrou na área interna da casa e
explicou em volume tão alto que seria ouvido por todos, inclusive pelos vigias que se
encontravam no subterrâneo:
— A casa deve ser evacuada imediatamente. Dentro de cinco minutos explodirá uma
bomba que destruirá toda vida num raio de cem metros.
O efeito do aviso foi nulo. Os que se encontravam no interior da casa acreditavam
que se tratasse de um truque. Dirigiram-se ao Supercrânio em busca de conselho, mas o
mesmo não quis falar com ninguém.
Esperaram. Quando os cinco minutos se passaram sem que nada tivesse acontecido,
todo mundo exultou.
A radiação neutrônica não pode ser vista, ouvida ou cheirada. Nem mesmo um fluxo
muito reduzido.
Os homens da equipe do Supercrânio só perceberam que a bomba havia explodido
quando de um instante para outro sua pele tornou-se vermelha e começou a arder. Logo
após perderam a visão. Tomados de pânico, saíram correndo pelos corredores e
procuraram sair da casa. Mas era tarde.
Apenas dois vigias de prisioneiros que tinham atendido ao aviso escaparam à
catástrofe.
***
As autoridades japonesas só tiveram sua atenção despertada para os acontecimentos
estranhos que se desenrolaram ao norte da grande via de acesso quando alguém constatou
um nível extraordinário de radiatividade naquela área.
Isso aconteceu cinco horas depois da detonação da bomba. Àquela hora Rhodan já
havia saído do país e retornado a Terrânia, acompanhado dos dois prisioneiros e da
experiência que as ocorrências lhe renderam.
***
***
Perry Rhodan em pessoa levou Betty Toufry ao avião que a levaria para Nova Iorque.
Rhodan falava baixo, mas em tom insistente, e Betty era uma ouvinte muito atenta.
— Existe muita coisa que você não compreenderá, Betty — disse Rhodan. — Ao
menos metade do que pretendemos fazer depende de que a General Cosmic Company
continue viva. Você vai a Nova Iorque a fim de proteger Mr. Adams de qualquer inimigo
que dele queira se aproximar às ocultas. Você terá de ficar com os olhos bem abertos,
Betty!
Betty parou e lançou um olhar sério para Rhodan.
— Ficarei de olhos bem abertos.
Poucos minutos depois Betty estava a caminho de Nova Iorque.
Naquela mesma noite o capitão Farina transmitiu uma mensagem de Salt Lake City.
Informou que ainda não havia encontrado qualquer pista. Disse textualmente:
— Se não tivesse visto o cadáver de Richman com meus próprios olhos, não
acreditaria que alguém o assassinou. É o crime perfeito, Mr. Rhodan. Nenhuma pista,
absolutamente nada.
Face a isso, as pesquisas em torno do assassínio de Richman foram definitivamente
suspensas.
Quando Rhodan concluiu a palestra com Farina, Thora entrou na sala. Deixou que a
porta de enrolar baixasse silenciosamente atrás dela e não interrompeu Rhodan quando ele
lançou um olhar pensativo sobre as luzes coloridas do grande painel do telecomunicador.
De início pensou que não tivesse notado sua presença. Mas depois de algum tempo
disse de repente:
— Ainda temos muita coisa a fazer, Thora. Já pensou nisso?
Thora aproximou-se.
— Sim; posso imaginar — respondeu.
Rhodan olhou-a.
— Já notou que existe uma pergunta para a qual ainda não encontramos nem um
princípio de resposta?
Thora sorriu.
— É a explosão no bloco G, não é?
— Exatamente. Podemos imaginar de que forma foram subtraídos os destróieres.
Basta um teleportador dotado da capacidade do que seqüestrou Crest. Pode introduzir seus
cúmplices no território da Terceira Potência, um por um ou talvez ao mesmo tempo, e
fazê-los descer na sala de comando das naves. Quanto ao resto, não haverá mais problema.
Mas ainda não sabemos como alguém pode provocar uma explosão num pavilhão de
montagem sem que nele se encontre um miligrama de material nuclear.
Houve uma ligeira pausa.
— Será que acredita que um homem como você levará muito tempo para descobrir a
explicação? — perguntou Thora.
Rhodan encarou-a; parecia perplexo. Procurou um sinal de ironia em seu rosto; mas
não o encontrou.
— Se isso foi um elogio — disse depois de algum tempo, com um sorriso — foi um
elogio muito gentil.
***
**
*
Na época em que a Terceira Potência foi fundada, Perry
Rhodan mandou que seus ‘captores de mutantes’ corressem mundo
para lhe trazer os elementos com que pudesse criar seu Exército de
Mutantes.
O Supercrânio teve a mesma idéia. Em silêncio montou sua
organização secreta, e agora achava que ela já era suficientemente
forte para enfrentar a Terceira Potência. E é assim que se trava o
Duelo de Mutantes, título do próximo volume da série Perry Rhodan.