Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Índice
Direito Administrativo como “Direito Constitucional Concretizado” ........................................... 2
Poder Administrativo ................................................................................................................. 2
Administração Pública e Constituição........................................................................................ 2
Princípio da Legalidade .............................................................................................................. 4
Legalidade e Juridicidade ....................................................................................................... 5
Poderes Discricionários e Vinculados ........................................................................................ 7
Outros Princípios fundamentais da atuação administrativa – na CRP e CPA ........................... 18
“Viagem ao Centro” do DA – Procedimento e Relação Jurídica Administrativa ......................... 23
Das Conceções Clássicas à Atualidade .................................................................................... 23
Natureza do Procedimento ..................................................................................................... 25
Codificação .............................................................................................................................. 29
“Marcha do Procedimento Administrativo na realidade Portuguesa” ................................... 30
Funções do Procedimento na Relação Jurídica Multilateral ................................................... 33
ATO ADMINISTRATIVO ................................................................................................................. 36
Origem e Evolução do Conceito de Ato Administrativo ........................................................... 36
Validade do Ato ....................................................................................................................... 40
Regulamentos – art. 135º e ss. CPA ............................................................................................. 49
Contratos Públicos/Administrativos ............................................................................................ 51
Formas de atuação administrativa que não têm dimensão jurídica ............................................ 51
1
DFA: É preferível falar-se em poder administrativo, em vez de poder executivo, pois compreende o poder
executivo do Estado o outro poder público das entidades administrativas não estaduais.
2
Que subsiste por razões de especialização funcional e já não na lógica da infância difícil do juiz-
administrador
2
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Vital Moreira: a par com o Direito Penal, o Direito Administrativo tem uma forte presença na
CRP. A “constituição administrativa” é direito constitucional administrativo ou direito
administrativo constitucional.
➢ Onde se encontram as bases do direito administrativo.
➢ Direito constitucional formal (e também material), as normas constitucionais
administrativas são direito administrativo material.
➢ Princípios constitucionais da atividade administrativa material – art. 266º CRP
o Concretizados no CPA de forma a robustecer os valores fundamentais que
devem reger toda a atividade administrativa de um Estado de Direito
Democrático.
Hoje em dia há fenómenos de Direito Adminsitrativo Global, não regulados por nenhum Estado:
caso das companhias de aviação e circulação aérea; caso da internet (autorregulada no quadro
do exercício da função administrativa realizada por entidades privadas).
Também há uma dimensão regional no quadro da UE – impõe regras aos Estados que têm uma
dimensão constitucional (material).
• Portanto, também há uma dupla dependência entre o Direito Europeu e o Direito
Administrativo: UE estabelece principais políticas públicas em certas matérias (como o
ambiente) que são executadas pelas Administrações dos Estados-membros
Direito Administrativo deixou de estar ligado apenas à lei e passou a depender também da
Constituição, a depender também do Direito Europeu, do Direito Internacional e do Direito
Global.
➢ Ocorreu, pois, uma transformação radical da lógica do princípio da legalidade.
3
Diferentes conforme os tipos de Estado.
3
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Princípio da Legalidade
Grande contributo dos liberais para o Direito Administrativo.
Liberais olhavam para o Direito Público como para o direito de propriedade e tinham uma
conceção real do Direito Público – até naquilo que corresponde à lógica do entendimento da
legalidade7:
• Reserva de lei – domínio em que a lei atuava. Do outro lado da cotada a Administração tinha um espaço
livre em que podia atuar como quisesse. Nenhum ato de categoria inferior à lei pode ser praticado
sem fundamento no bloco de legalidade (DFA)
• Preferência de lei – dentro do domínio em que a lei atuava devia preferir-se a vontade da lei e não a da
Administração, protegendo os particulares. Consiste em que nenhum ato de categoria inferior à lei
pode contrariar o bloco de legalidade, sob pena de ilegalidade (DFA)
4
Pela polícia, internamente e pelas forças armadas, internacionalmente.
5
Só que o Parlamento emanava poucas leis (versando a liberdade e a propriedade), portanto, havia uma
grande quantidade de matérias de que a lei não se ocupava e em que a Administração era livre de atuar.
6
VPS: Administração liberal saiu ao pai. Saia ao pai pois era uma Administração agressiva e o paradigma
do exercício do seu poder era o ato de polícia.
• Estado Democrático liberal tinha 2 pais e 2 mães.
o Pais: Hobbes e Rosseuau – Estado com origem democrática mas que depessa se transformava
num leviatã e absorvia todas as vontades individuais
o Mães: Locke e Monstesquieu – Estado com lógica de separação de poderes e garantia dos direitos
individuais.
7
Entendimento dos liberais da legalidade como terreno. Expressões ainda ficaram até aos nossos dias e
que DFA aplica
8
Que Marcello Caetano ainda concebia como uma “exceção ao princípio da legalidade” (há sempre 2
elementos vinculados por lei – competência e fim – sendo enquadrado e condicionado normativamente
4
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Princípio da legalidade já não se define pela negativa (o que a Administração não pode fazer) e
abarca todos os aspetos da atividade administrativa.
➢ Lei não é apenas um limite à atuação da Administração e é também o fundamento da
sua atuação.
o Princípio da Competência e não da Liberdade.
➢ Conformidade à Ordem Jurídica
Reserva de lei – atuação administrativa tem que ter fundamento numa norma jurídica (que define
as atuações administrativas possíveis).
• Exprime-se na necessária autoridade do fundamento jurídico-normativo da atuação
administrativa (precedência de lei).
• Tese maioritária em Portugal da precedência total de lei – nenhum ato da
Administração, em qualquer esfera da sua atividade, pode deixar de se fundamentar
na lei.
o Exprime-se na necessidade do mesmo fundamento jurídico-normativo possuir um
grau de pormenorização suficiente para permitir antecipar adequadamente a
atuação administrativa em causa (reserva de densificação normativa).
o Norma habilitante da atuação Administrativa tem que ter determinada densidade
(grau específico de pormenorização, dos pressupostos e dos meios de tal
atuação)
Legalidade e Juridicidade
Administração não está só subordinada à lei que provém do Parlamento, mas a toda a ordem
jurídica – legalidade tem que ser entendida no sentido de juridicidade.
• Lógica mais ampla do que a simples legalidade – vindo da doutrina alemã e por cá
adotada por Rogério Soares, Maria da Glória Garcia.
Art. 3º CPA (e art. 266º/2 CRP) – Administração tem que se subordinar à lei e ao Direito
• Referência ao “Direito” introduz a ideia de juridicidade – todo o Direito que obriga a
administração: direito é o direito supralegal, o direito constitucional, o direito europeu,
o direito internacional, o direito global e é todo o direito infra legal.
• A legalidade também se manifesta na própria atuação da Administração.
o exercício deste poder), juntamente com a teoria do estado de necessidade (hoje há cobertura legal ao
estado de necessidade e relativamente ao não cumprimento dos preceitos do Código) a teoria dos atos
políticos (ao abrigo do art. 3º/3 CRP estes anos não podem ser ilegais)
5
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
6
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
2. Freitas do Amaral: rejeita estes conceitos binários pois qualquer ato administrativo tem
uma margem de vinculação e de discricionariedade10 – olhando os poderes, é o ato específico
que diz qual predomina, pois não há atos totalmente vinculados nem totalmente discricionários.
Permite controlo mais amplo da atuação da Administração – significa que o Tribunal pode
apreciar esses casos, uma vez que os poderes são suscetíveis de controlo jurisdicional
(considerando todo o Direito e os atos vinculados no âmbito do poder discricionário); Tribunal
controla ambos os poderes no quadro da sua tutela jurisdicional.
➢ Distinção não é nos atos, mas sim nos poderes: mesmo os próprios poderes têm essas
duas componentes.
➢ Falava no poder discricionário como livre – VPS crítica pois não faz sentido falar-se de
liberdade quando se alude a vontades normativas de realização do ordenamento
jurídico.
o DFA mudou de posição e hoje concorda com Viera de Andrade quando diz que
a discricionariedade não é uma liberdade, mas sim uma competência, uma
tarefa, correspondente a uma função jurídica11. Não pode fundar na sua
vontade as decisões que toma e o agente não procura só uma solução para o
caso, procura a solução que considere, fundamentalmente, a melhor do ponto
de vista do interesse público.
9
Com este entendimento, abarca-se a ideia de que a Administração está vinculada a todo o Direito e não
é necessário introduzir no nosso ordenamento jurídico o princípio da juridicidade.
10
Atos administrativos são sempre o resultado duma mistura/combinação entre o exercício de poderes
vinculados e poderes discricionários – quase todos os atos administrativos são simultaneamente
vinculados e discricionários, dependendo do aspeto em apreço.
O que faz sentido é indagar em que medida os atos são vinculados e discricionários.
Ex: cobrar imposto é poder vinculado, mas o ato tributário tem ainda uma margem de discricionariedade
pois a Administração pode escolher o momento do dia e da hora a que pratica o ato. A nomeação de um
gestor público é um poder discricionário mas a nomeação em si é um ato vinculado pois há requisitos
mínimos a preencher-se e a competência para a nomeação também tem de ser aferida (competência é
sempre vinculada, mesmo nos atos discricionários) bem como o fim do ato administrativo é sempre
vinculado.
11
Nunca se exclui o caráter jurídico da discricionariedade – mesmo para o aplicador do Direito, cuja
decisão é sempre fundada nos critérios indicados pela lei, embora a concreta definição da fisionomia
relevante do caso exige uma reconstrução que tenha em conta os dados da realidade de facto.
Discricionariedade não é uma liberdade mas um poder-dever jurídico, derivado da lei: só existe quando a
lei o confere e na medida em que a lei o configura; além de se fundamentar na lei, só pode ser exercido
por aqueles a quem a lei o atribuir, para o fim que a lei conferir e de acordo com os princípios jurídicos de
atuação.
7
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Quando a lei remete para regras extrajurídicas estamos no campo da vinculação – pois ao
remeter para elas, a lei fá-las suas e incorpora-as na ordem jurídica, tornando-as juridicamente
obrigatórias (impondo-as à Administração) em termos tais que a violação dessas normas é, para
todos os efeitos, uma violação da lei que para elas remete. Ex: lei que diz que a Administração
tem de obedecer a regras de ordem técnica
➢ Se a Administração não respeitar estas normas, sofrerá sanção como se violasse
diretamente uma norma jurídica.
➢ Vinculação que só indiretamente é jurídica, mas, não é de todo um caso de
discricionariedade.
8
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
➢ Não se move num plano de liberdade e está subordinada ao princípio da legalidade pelo
que só pode atuar pelo que é normativamente permitido.
➢ Mas, as decisões administrativas são tomadas no caso concreto, com base em
elementos retirados desse mesmo caso para uma maior justiça e adequação da
aplicação do Direito.
O Tribunal pode apreciar a razoabilidade com que a Administração preencheu o conceito13. Mas
o Tribunal não poderia intervir na discricionariedade da Administração e vir ele próprio fixar
como se preenche o conceito, teria era que alertar a Administração para ela ponderar o
conceito. Explicita as vinculações legais e aponta o que deve ser tido em conta, mas não vai,
ele próprio, definir o que cabia na discricionariedade da Administração (resulta do art. 71º/2
CPTA). Devolve a questão à Administração para ela decidir, nunca se substitui à Administração
e apenas lhe diz para ela ponderar o ato.14
12
A legalidade de um ato administrativo – conformidade dos aspetos vinculados do ato com a lei aplicável
– pode ser sempre controlada por Tribunais Administrativos e pela Administração.
O mérito de um ato administrativo – conformidade dos aspetos discricionários do ato com a conveniência
do interesse público – só pode ser controlado pela Administração.
13
DFA: Não há, em bom rigor, um controlo jurisdicional do exercício do poder discricionário mas sim um
controlo administrativo sobre o bom ou mau uso do poder discricionário ou, por outro lado, um controlo
jurisdicional sobre o acatamento ou não das prescrições legais que condicionam o exercício de poderes
administrativos que, para além de aspetos vinculados, sejam poderes discricionários.
14
Administração tem legitimidade democrática indireta e Tribunal não é eleito – não têm legitimidade
para controlar o mérito, cujas opções poderiam ser diferentes.
Tribunais controlam a atividade administrativa com base na lei (não no mérito) – mas não substitui a
Administração que é ela que tem de decidir
Ex: cidadão que não goste de obras não pode por ação para CM não fazer mais obras, ela tem legitimidade
democrática para assim decidir. Se não tiver relacionado com a legalidade o Tribunal não pode decidir.
9
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Decisor parte do caso concreto para as opções de atuação legalmente conferidas – atividade
que envolve a formulação de juízos de prognose (estimativas cerca da evolução futura de
situações da vida).
15
Cujos aspetos a reter são:
1. Conceitos indeterminados na previsão normativa são discricionariedade (que existe
quando determinada norma jurídica não preveja ou não conceda a informação total
sobre os conceitos de que faz menção ao seu aplicador)
2. Não se conseguindo demonstrar que o conceito indeterminado foi mal preenchido
(havendo erro manifesto), a Administração é que tem a prerrogativa de decidir
3. Administração teria que fundamentar as suas opções de forma consistente para o
preenchimento destes conceitos
10
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Liberdade avaliativa
• Se assentar em pressupostos objetivos normativamente fixados então a avaliação é
vinculada;
• Se assentar na avaliação de situações de facto em que a lei confere à Administração uma
última palavra, então estamos na margem de livre apreciação.
16
Cuja utilização não tem sempre como consequência a criação de margem de livre apreciação, se assim
fosse a atividade da administração suscetível de ser controlada pelos tribunais era reduzida. E mesmo
para a Administração há margem de autonomia na apreciação do conceito, mas não decide em abstrato
qual a definição do conceito.
Para DFA:
• Conceitos indeterminados que apenas envolvem operações de interpretação e subsunção da
lei (conceitos-classificatórios: Rogério Soares) – indeterminação é somente condicionada pela
linguagem e solucionável através de raciocínios teorético-discursivos. Ex: quando a lei fala em
período noturno; urbanidade no tratamento e etc.
• Conceitos indeterminados cuja concretização apela a preenchimentos valorativos Objetivos –
averigua as conceções éticas efetivamente vigentes e que enformam o pensamento ético-
normativo do ordenamento jurídico; é possível admitir-se a fiscalização judicial da atividade
administrativa concretizadora do sentido de tais conceitos indeterminados objetivo-normativos.
Ex: saber se combates de boxe ao ar livre atentam contra os bons costumes
• Conceitos indeterminados cuja concretização apela a preenchimentos valorativos Subjetivos –
apela a que a Administração ajuíze com base na sua experiência e convicções. A Administração
tem um “espaço de conformação” em que se autoriza o órgão aplicador do Direito a considerar
como vinculante e justa a valoração por ele pessoalmente tida como justa. Escolha orientada,
pela lei, de alternativas que se extraem da atividade criativa de valoração (individual e
autónoma) dos pressupostos de facto.
17
É sindicável em tribunal quando o particular demonstre que a Administração apreciou os conceitos
indeterminados mas cometeu um erro manifesto de interpretação.
11
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Se o legislador conferir o poder discricionário havendo conceitos indeterminados que não dizem respeito
aos pressupostos de facto (na previsão) e que constituem discricionariedade (criativa, sendo utilizados na
estatuição), o legislador aponta simultânea e expressamente os seus limites, sobretudo o princípio da
proporcionalidade.
Dois tipos:
A. Vinculações legais – estabelecidas pelas próprias normas que conferem a margem de
livre decisão e podem dizer a quase todos os requisitos de legalidade específicos de
determinada conduta administrativa. 4 são vinculações permanentes
a. fim a prosseguir com a conduta administrativa habilitada;
b. competência subjetiva para a sua adoção;
c. vontade (normas jurídicas que conferem poderes para a prática de atos
jurídicos);
d. própria existência de margem de livre decisão (não pode ser totalmente
vinculado, se estivermos a falar dum poder discricionário)
12
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Poderá a Administração fixar, validamente, critérios gerais e abstratos de exercício da sua margem de
livre decisão, de modo a que, verificados determinados pressupostos, venha a adotar uma mesma
conduta? Pode a Administração autovincular-se ao exercício da margem de livre decisão?
Permite minorar a incerteza, imprevisibilidade e insegurança e aumenta a
desburocratização, simplificação e celeridade da atuação. Mas, poderia por em causa o
princípio a igualdade ao petrificar critérios e isso era algo que a lei queria evitar, conferindo
esta margem.
➢ Autovinculação é permitida se os critérios não forem imutáveis e possam
ser revistos (é possível a autodesvinculação); se o decisor puder, à luz das
circunstâncias concretas, ponderar uma diferente solução.
18
≠ DFA: A própria Administração elabora normas genéricas em que enuncia os critérios a que ela
obedecerá na apreciação de cada caso futuro – Administração tem poder discricionário mas decide
autovincular-se. Os atos que praticar a despeito das normas que ela própria elaborou serão ilegais, porque
violam normas estabelecidas pela própria Administração que constituem uma autovinculação do poder
discricionário. Fundamentalmente pode mudar o critério de decisão, pois o interesse público é variável
(art. 152º/1/d CPA). Autovinculação não pode ter eficácia externa (desrespeitando art. 112º/5 CRP) e
interpretar, integrar, modificar e etc. qualquer preceito legal que confere poder discricionário.
13
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
4. Vasco Pereira da Silva – Concorda que dentro de cada poder há as 2 margens de decisão.
Indica um 3º momento inicial: Interpretação da lei (que é também um ato discricionário na 1ª
margem de responsabilidade da Administração – aplicador cria o Direito no caso concreto).
Interpretação da norma não é uma realidade vinculada.
➢ Administração começa por interpretar a norma, fazendo escolhas com base no texto da
norma – está vinculada ao texto, mas as escolhas com base na interpretação são no
âmbito discricionário.
Muitas vezes estes momentos são ao mesmo tempo e compreendidos na mesma lógica –
coexistem num continuum
Baseia-se numa interpretação culturalista do Direito e rejeita o pensamento positivista (do séc.
XIX), que entendia só haver uma única interpretação da lei, sendo, portanto, um poder
vinculado. Mas isto não é assim e a primeira escolha é a escolha da interpretação da lei, e
começa logo aí a discricionaridade da Administração Pública.
Há um texto, há uma lei, que tem de ser interpretada e tem de ser aplicada – tudo isso implica
uma realidade recriadora e que permite distinguir como em cada poder há aspetos
discricionários e aspetos vinculados, em que as coisas se misturam num quadro de uma
decisão que é da responsabilidade da Administração, mas que os Tribunais podem sempre
controlar, em todos os aspetos vinculados.
Mesmo nos casos em que a escolha está vinculada, há uma margem mínima do que se pode
fazer. Mas, se não se cumprir os aspetos vinculados há uma ilegalidade.
14
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
discricionariedade e vinculação – eu não posso escolher pão de forma nem papo seco, porque isso é
vinculado, mas, tenho a possibilidade de escolher pão alentejano, pão da padeira, pão de segunda, mil e
uma coisas.
Fatias têm que ter 1,5 cm de espessura – e isto é vinculado. É que se tiver 1,4 cm ou 1,6 cm não tem
problema, já se tiver 1 cm ou 2 cm é que fica diferente. Ou seja, mesmo aqui em que há vinculação, esta
vinculação, apesar de tudo, ainda permite uma ligeira margem de escolha, mesmo que a escolha esteja
muito limitada. É uma escolha que pode na prática não existir e ser limitada a zero.
Ovos. São ovos de galinha, não posso fazer isto com ovos de codorniz ou outra coisa do género. Agora
se são ovos de galinha do campo, ou da cidade, ou das criadas em aviário, ou criadas numa casa de família,
é uma escolha. Eu não posso é utilizar ovos de codorniz, se não estou a violar a receita. É a mesma coisa
que a Administração perante uma lei, tem a mesma margem de escolha e a mesma possibilidade: se eu usar
ovos de codorniz eu vou estragar a receita, se eu não cumprir essa regra vincula, eu estou a cometer uma
ilegalidade. Portanto, tenho margem de escolha em relação a todos os aspetos discricionários, não tenho
margem de escolha em relação aos aspetos que são vinculados.
Trinta gramas de manteiga, não serve margarina, não serve planta, mas manteiga pode ser de vários
tipos e vai condicionar a escolha, pode ser a manteiga rançosa, dos Açores ou então podem ser aquelas
manteigas que não sabem a nada- O gosto vai ser diferente, mas isso cabe a mim a escolha, cabe a mim a
receita, é a minha criação enquanto intérprete de direito e aplicador da lei. Já se eu usar margarina eu estou
a violar a receita, se eu não cumprir a regra vinculada eu estou a desrespeitar a lei.
Há sempre uma margem de escolha, e aspetos vinculados, a escolha nunca é total e nunca é livre, é
uma escolha balizada pelas opções do legislador, e uma escolha que tem sempre aspetos vinculados, aspetos
estes que nunca podem ser postos em causa (podem decorrer de princípios constitucionais).
Aquilo que eu fiz foi uma interpretação, que agora vai ser necessária quando apreciar as coisas com as
quais vou fazer esta receita, decididindo em função da realidade concreta.
Corte o presunto em pequenos cubos, deite-os na manteiga derretida, e deixe-os torrar durante dois a
três minutos. Cortar o presunto em cubos, cubos é razoavelmente vinculada, e portanto, se eu cortar em
pedacinhos demasiado pequenos, eu estou a estragar a receita, estou a fugir à vinculação. Se forem
retângulos, não calculo que haja grande problema por causa disso, até porque ninguém nos disse quantos
centímetros têm os cubos, isto corresponde à minha escolha, isto corresponde à minha discricionariedade
ao fazer esta receita.
Deite-os na manteiga derretida, tenho que derreter manteiga, e deixe-os torrar durante dois a três
minutos. O que é que é torrar? Torrar não é alourar, aí tenho um conceito indeterminado que tenho de
começar por interpretar. Não nos diz se o lume é branco ou se o lume é no máximo, e isso vai ter
consequências, até no modo de saber se são dois ou três minutos, e portanto eu vou deixar aquele presunto
na frigideira até que ele tenha uma cor castanhinha, se é castanho mais claro ou castanho mais escuro, a
opção é minha, se continua da cor do presunto, vermelho vivo, ou se fica preto, a receita está estragada, e
portanto a minha escolha baliza-se entre estes dois aspetos vinculados, e a minha escolha existe dentro da
possibilidade do castanho escuro ou do castanho claro, o negro é ilegal e o vermelho é também ilegal.
Corte quatro lascas de uma fatia de pão saloio e aloure-as na mesma frigideira.
Barre um prato côncavo para ir ao forno. Barre, deve ser com manteiga, mas não dizem, será que pode
ser margarina, será que pode ser banha de porco, temos que interpretar? Ora bem, um prato côncavo, se eu
em vez de um prato concavo usar um pirex, não deve haver problema, aqui a palavra chave é ir ao forno, a
forma do prato é relativamente discricionária, portanto é uma matéria da minha responsabilidade.
Disponha neste prato as fatias finas de pão, deite sal e pimenta. Sal e pimenta? Quanta? Não diz.
Conceito indeterminado que gera um problema de interpretação, gera um problema de apreciação e gera
um problema de decisão, aqui temos pura e simplesmente, deite sal e pimenta. Se eu não deitar sal e se não
deitar pimenta estou a violar a regra. Se eu deitar a mais estou a estragar o prato. São os dois limites da
vinculação. Porque eu já sou um cozinheiro experimentado e já é a segunda vez que faço esta receita, vou
tomar ainda o cuidado de não deitar muito sal, porque o presunto já tem sal. Isto não me é dito! Eu sei
porque fiz várias vezes, já experimentei e sei que isto tem consequências no prato. Se eu deitar mais sal
para além de presunto corro o risco de deitar sal a mais. E eu não quero deitar sal demais. E temos aqui
uma margem de discricionariedade que resulta da prática culinária, resulta de eu já ter feito esta experiência
no outro dia e ter chegado a essa conclusão.
15
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Conclui-se que os próprios poderes têm aspetos vinculados e aspetos discricionários – não o
próprio ato.
➢ Existem 3 momentos: quando Administração interpreta a norma, quando a
Administração aprecia as circunstâncias de facto e as valora no quadro da lei e quando
a Administração decide/faz a escolha balizada pela lei.
➢ Lógica evolutiva entre a interpretação e a decisão – aplicador do Direito precisa de saber
em que aspetos a decisão é sua e em que aspetos é vinculada
Administração encontra limitações muito fortes (nos novos princípios do CPA, inclusive) que
alargam o âmbito de controlo da legalidade.
Ao nível da Competência
tem de existir sempre pois os órgãos administrativos atuam no quadro das suas legítimas
competências. Nunca há discricionariedade nisto. Pode haver discricionariedade no momento
em que se exerce a competência.
Incompetência dentro da mesma pessoa coletiva, dentro das mesmas atribuições da pessoa
coletiva – menos grave – Relativa – sanção da anulabilidade
Incompetência na utilização de competências na falta de atribuições – mais grave e fora da
mesma pessoa coletiva, invade-se competência alheia – Absoluta – ato administrativo é nulo
Distinção tem a ver com o facto de estarem a ser prosseguidas competências
diferentes (relativa) ou atribuições diferentes (absoluta).
Distinção importante que marca uma dimensão de ilegalidade que é sindicável em
Tribunal.
16
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Ao nível do Fim
Normas têm fins que justificam a existência dos poderes da Administração e se se extravasa esse
fim há ilegalidade – a prossecução de um fim diferente do fim de interesse legal gera a
ilegalidade da decisão administrativa
VPS não gosta da expressão: Desvio de Poder, mas esse é o nome que se dá quando não
se prossegue os fins que a lei prescreve.
Administração explica porque decide – daí que a prova seja mais fácil no Direito Administrativo
do que no Direito Penal, olha-se à fundamentação da Administração e através dessa
fundamentação podemos ver onde apanhamos a Administração em falta.
Antes a doutrina ficava pelo controlo da competência e pelo controlo do fim e dizia que tudo
mais era da responsabilidade da Administração e o Tribunal não podia sindicar.
➢ É preciso acrescentar todas as vinculações autónomas que decorrem dos princípios que
regem a Administração.
➢ Vínculos autónomos que existem sempre e permitem ir além da própria legalidade e
controlar o mérito.
➢ Princípios constitucionais são imediatamente aplicáveis e vinculam diretamente a
Administração.
17
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Princípio da Proporcionalidade
Permite controlar o próprio modo como é exercido o poder discricionário.
Envolve 3 aspetos:
• Adequação (medida tomada deve ser causalmente ajustada ao fim que se propõe
atingir);
• Necessidade (além de idónea para o fim que se propõe alcançar, a medida
administrativa deve ser, no universo das medidas idóneas, aquela que em concreto lese
em menor medida os direitos e interesses dos particulares);
• Equilíbrio (benefícios que se esperam alcançar com a medida administrativa adequada
e necessária, têm de suplantar os custos que ela acarretará)necessidade, adequação,
não prejuízo excessivo.
• Ex: se há fogo na baixa de Lisboa é ilegal que, em virtude disso, proíba os barcos de
entrarem num porto do Algarve
Princípio da Justiça
Menos aplicabilidade à partida. Significa que as decisões do ordenamento jurídico além de
cumprir a lei têm de cumprir o valor da justiça.
Decisão injusta é ilegal. Ex: orçamentos prevêm medidas que têm a ver com necessidades
anuais; num ano orçamenta-se uma medida tributária para fazer face a certa despesa
emergente nesse ano; no ano seguinte se já não se prever essa determinada despesa, a medida
não pode ser orçamentada – já não é justo e os motivos que presidem a essa medida já não se
verificam.
19
É positivo que o legislador tenha colocado novos princípios, o que reforça a expressão dos mesmos no
ordenamento jurídico.
➢ VPS critica a adoção de noções restritas desses princípios – leva a que se interpretem de forma
mais expansiva (recorrendo à CDFUE para alguns)
18
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Princípio da Imparcialidade
Administração Pública deve tomar decisões determinadas exclusivamente com base em
critérios objetivos de interesse público, adequados ao cumprimento das suas funções
específicas.
2 vertentes:
• Negativa (art. 69º a 76º CPA);
o Administração não pode decidir se tiver algum interesse na causa – não se
podem favorecer pessoas do mesmo partido político, família, clube de futebol,
seita religiosa – mesmo que seja a pessoa mais adequada para o caso! Não podia
ser ele a decidir e teria que ser outro órgão a decidir, que de facto poderia
escolhe-los, mas não foi ele. Os titulares dos órgãos não podem nunca intervir
em decisões que lhes digam respeito, ou que digam respeito a algum dos seus
familiares – é passível da decisão ser anulada (pois a decisão é ilegal)
• Positiva (dever da Administração ponderar todos os interesses públicos secundários e
os interesses privados legítimos, equacionáveis para o efeito de certa decisão, antes da
sua adoção – deteta-se essa ausência de ponderação através da análise da
fundamentação do ato decisório)
Princípio da Boa Fé
DFA: Surge pela necessidade premente de instalar um clima de confiança e
previsibilidade no seio da Administração Pública.
➢ Concretização possibilitada pelo princípio da tutela da confiança legítima e
princípio da materialidade subjacente.
CPA
Legislador pega nos princípios constitucionais e concretiza-os mais a fundo.
20
Legislador andou bem ao consagrar a boa administração (era irrelevante consagrasse ou não, porque
não consagrando haveria sempre a aplicabilidade da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,
que é Direito Constitucional Europeu, mas ao consagrar esclareceu essa dúvida), só que consagrou em
termos restritivos.
19
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Sem resposta há uma omissão – que é uma ilegalidade que pode ser impugnada em Tribunal
(pois a Administração tem dever de praticar um ato – o de responder);
➢ O contencioso administrativo serve para reagir contra ações e omissões
(comportamento da Administração)
Deixou de existir a ficção do ato tácito de indeferimento – legislador em 2004 foi ao encontro
das posições doutrinárias que o criticavam e diziam que a Administração poderia ser condenada
por omissão.
20
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
VPS: não faz sentido continuar a existir o ato tácito de deferimento – apesar de se dizer que é
positivo, pois era um “sim” da Administração. No entanto, não protege o particular pois não
acautela valores de segurança jurídica com o “sim” explícito que o assegura – o que protege os
particulares é ter uma resposta. Ex: ter alvará para construir é um sim.
Legislador peca por defeito e não regula efetivamente esta realidade – se os meios manuais e
eletrónicos fossem igualmente acessíveis deviam se ser equiparados
DFA: Não impõe este modelo da Administração eletrónica, proclama-se apenas uma
preferência por ele – criou-se uma habilitação normativa genérica para a utilização pela
Administração dos meios eletrónicos e prevê uma regulação de alguns aspetos
estruturantes da utilização dessas vias (o que contribui para a segurança jurídica)
21
Hoje em dia é assim mas o Direito reagiu com muita resistência à realidade informática – uma coisa era
a técnica e outra era o Direito.
a lógica de consideração dos fenómenos informáticos obriga a trata-los como fenómenos jurídicos e a
fazer a equiparação entre as atuações informáticas e as atuações administrativas, portanto o que está em
causa tem a ver com esta realidade.
Ex: semáforos – quando atravessam o sinal verde estão a responder a uma realidade que é produzida por
um computador e que produz uma atuação administrativa, que é geral, porque se destina a todas as
pessoas que passam naquele sitio e que é concreta: porque estão a passar naquele sitio, naquele
momento. VPS: é um ato que, sendo geral, é um ato concreto e, portanto, geral e concreto em simultâneo, e está
realidade condiciona o comportamento das pessoas, porque há o regulamento que corresponde à programação
daquele sinal de trânsito e que manda passar de amarelo a vermelho e, de vermelho a verde de tantos em tantos
segundos – esta programação corresponde a um regulamento administrativo, e depois o funcionamento do sinal de
trânsito corresponde a um ato plural, um ato que tem uma multiplicidade de destinatários mesmo se passa num sitio
concreto, e estar lá o sinal de transito não é a mesma coisa que estar lá um sinaleiro, porque se estivesse o sinaleiro,
estaríamos perante um ato concreto e que se aplicava àqueles particulares que estavam ali naquele momento.
21
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Temos de distinguir o que é aberto e o que não é, apesar de existirem zonas de fronteira.
➢ É preciso distinguir muito bem entre aquilo que é o principio da administração aberta
que tem a ver com a publicidade de tudo aquilo que seja matéria de interesse público
com tudo o que seja informações pessoais em que aí há uma regra de confidencialidade
e uma regra de privacidade porque da defesa dos direitos das pessoas (só se pode dar
acesso desses dados a quem tiver um interesse legítimo na sua divulgação).
DFA: Previsto de forma restritiva pois requer a previsão expressa no direito da UE sendo
que o campo útil do princípio seria a previsão, de forma aberta, dum dever de
cooperação leal mesmo na ausência de regra a fixar e determinar em concreto o âmbito
da cooperação.
22
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Ato Administrativo
Construções doutrinárias clássicas, positivistas, tinham o Ato Administrativo como centro.
• Protagonista do Direito Administrativo e todo o Direito Administrativo se reportava ao
Ato Administrativo – definição autoritária da posição do súbdito face à Administração
(Otto Mayer)
o Administração definia o direito em termos que se permitia a execução mesmo
contra a vontade dos particulares.
Ato era tudo e todas as coisas – em função do Ato criava-se todo o Direito Administrativo,
mesmo no domínio processual (não havia partes e a Administração estava na mesma posição
hierárquica que o juiz)
➢ Realidade que se mantém até aos anos 80 em Portugal – lógica do “ato definitivo
executório” (Marcello Caetano).
Quando se está a cristalizar a centralidade do Ato, a Administração está a mudar para uma
Administração prestadora (e a lógica clássica que alberga a construção do Ato Administrativo
como centro do Direito Administrativo não tinha em conta o ato prestador).
• Ato perde protagonismo e passa a ser uma realidade entre outras – Administração
moderna pode escolher a forma de atuação mais adequada – passa-se “da farda única
do ato administrativo para o pronto-a-vestir da atuação administrativa”.
• Ato deixa de explicar tudo e desloca-se do centro – crise do Ato com a sua perda de
centralidade, leva a uma crise do próprio Direito Administrativo que procura um novo
centro.
o Doutrina procura um novo centro, i.e., realidade que existisse em todos os
fenómenos do Direito Administrativo e com importância fundamental para a
conceção do Direito Administrativo
23
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
VPS
A lógica do centro só pode ser tendencialmente aceite23.
A haver centro ele é a Relação Jurídica Administrativa – existe em todos os momentos
do Direito (substantivo e adjetivo) e enquadra-o.
➢ Ligação constituída pelo direito entre dois ou mais sujeitos (Bauer)
DFA
Não é possível fazer uma construção dogmática adequada do Direito Administrativo, nos
quadros dum Estado de Direito Democrático, sem reconhecer e utilizar amplamente,
sempre que for caso disso, o conceito e a teoria da relação jurídica administrativa. Mas,
não esgota a parte geral do Direito Administrativo e não é o conceito central do Direito
Administrativo.
22
Relação jurídico-administrativa: toda a relação entre sujeitos de direito, públicos ou
privados, que atuem no exercício de poderes ou deveres públicos, conferidos por normas
de direito administrativo.
23
Pois o entendimento de centro, como realidade positivista, não faz qualquer sentido-
24
Francisco Paes Marques: relação administrativa multipolar
➢ VPS: o que acontece no Direito Administrativo não é uma relação entre pólos e sim um feixe de
relações entre todos os sujeitos (que podem ser múltiplos, tanto do lado da Administração como
do lado dos particulares). As relações jurídicas administrativas não são fechadas.
24
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Natureza do Procedimento
A partir dos anos 70 o procedimento ganha dimensão nova no quadro do Direito Administrativo
– obriga a considerar a sua dimensão relevante.
➢ Não só na decisão mas na formação da decisão.
Noção de procedimento – art. 1º CPA (não era obrigado a dá-la e se calhar era aconselhável não o fazer).
• Não obriga a doutrina e não tem consequências por si só – definições legislativas servem
apenas para ajudar a explicar o âmbito de aplicação das respetivas normas e não têm
opção doutrinária.
• Construção que corresponde a uma das visões do procedimento – autonomia relativa
dos fenómenos procedimentais.
o Fórmula parecida à que se usou em Itália.
o Criticada já desde 1991 mas mantida em 2015: visão ultrapassada
subalternizadora do procedimento em face das formas de atuação da
Administração.
o Definição de acordo com o modo como o legislador olhou para o procedimento
– traduz-se em normas jurídicas que espelham esta realidade.
Não era considerado juridicamente o procedimento que levava à toma de decisões, não era
valorizado autonomamente
➢ Ao apresentar-se o ato administrativo não referiam nem os procedimentos nem as
formalidades, só importava a forma
o Ótica contenciosa conduz a que se trate conjuntamente a forma e as
formalidades (e só na referência às formalidades é que se considerava o
procedimento administrativo).
o Confusão entre forma e procedimento (desde Laferrière)
Legislador português não adota esta posição mas cometeu ato falhado que tem os vícios desta
conceção negativista:
• Art. 161º/2/g – legislador, como La Ferriere, fala em atos que careçam em absoluto de
forma legal (referência à forma tem de ser entendida como abrangente do
procedimento)
o Falta a referência ao procedimento e não está autonomizada no âmbito da
teoria da nulidade25
25
Apesar de estar a regular o procedimento ele não dá a devida importância ao fenómeno do
procedimento e não considera as causas procedimentais
25
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Influência desta corrente foi tão grande que CPA 1991 utilizou nos trabalhos preparatórios duas
outras versões que eram processualistas, organização que considerava que a base do
procedimento era de natureza processual.
26
Que já não fala em processo administrativo gracioso (Marcello Caetano) mas não questiona a identidade
da natureza do processo e do procedimento. O procedimento é modalidade de processo
26
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Visão subordinada do procedimento – por um lado autónomo e por outro lado uma realidade
funcionalizada à decisão administrativa.
Influência de algumas codificações – como as que surgiram na Alemanha nos anos 60.
• Vem de uma norma alemã muito criticada no quadro das invalidades procedimentais
em que se há violação de procedimento, mas tal não afeta o ato, considera-se
irrelevante o procedimento (se o ato tivesse a solução adequada não interessava se o
procedimento tivesse sido respeitado).
o Influenciou norma do legislador português – art. 163º/5 CPA
▪ VPS: Como se pode saber que o ato é idêntico se não se seguiu o
procedimento? Não há forma de comparar se o interesse foi
prosseguido.
▪ Até na Alemanha, de onde veio a norma, se consideram exceções:
direitos fundamentais (Gerlish diz que qualquer direito fundamental
implica uma garantia de procedimento – não é possível aplicar uma
decisão administrativa se não houver garantia dos direitos
fundamentais. Se não forem respeitados, a norma é inconstitucional)
▪ Art. 163º/5 só pode ter sentido útil se for limitado – é preciso que se
diga que isto não pode valer contra qualquer direito fundamental dos
particulares
▪ Freitas do Amaral vs. MRS (e VPS) – o facto de estar em causa um direito
procedimental consignado pela CRP implica que esta norma nunca
possa ser aplicada, quer seja nula quer não.
➢ Perspetiva VPS: por um lado há que limitar a norma a um
conjunto de soluções mínimas para não violar direitos
fundamentais processuais e procedimentais e mesmo em casos
que não haja essa lesão, tem que se adotar conceção restritiva
sob pena de se estar a violar a CRP e a lei.
VPS: procedimento deve ser considerado de um modo autónomo e não apenas em função do
seu resultado final, para além de que deve consistir numa realidade flexível e adaptável às
circunstâncias
• Rogério Soares: procedimento é o conjunto de atos funcionalmente ligados com vista a
produzir um certo resultado, um efeito final único – noção funcionalista que entende o
procedimento como a forma da função administrativa
27
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
VPS: procedimento vale por si mesmo enquanto instrumento de correção e eficácia das
decisões administrativas, assim como de garantia de proteção antecipada dos direitos dos
particulares, e não vale apenas em razão dos resultados a que se possa chegar – procedimento
tem valor próprio e não pode ser afastado.
• Dimensão da multifuncionalidade do procedimento, não é só realidade funcionalizada
e dele decorrem múltiplas funções27:
A. Função Legitimadora – órgãos administrativos têm legitimidade que decorre do
cumprimento das regras legais e precisa de ser completada com uma
legitimação que decorre do procedimento, através da participação dos
particulares na elaboração da tomada de decisão;
B. Função Racionalizadora – o procedimento racionaliza a tomada de decisão da
Administração
▪ Decisão é resultado de uma racionalização da atuação da
Administração.
▪ Realidade procedimental é instrumento organizativo da Administração
e estabelece não apenas uma realidade formal, mas contribui para a
decisão como realidade material;
C. Função de Determinar/Construir o Interesse Público – relacionado com a
aplicação das normas àquele caso concreto, comparando-se diferentes
interesses públicos e os interesses privados.
▪ Administração considera os diferentes interesses públicos e privados de
forma a decidir. Ex: construção de uma ponte – tomada de decisão e
qual a melhor realização do interesse público depende do ministro que
toma a decisão – ambiente que no menos poluente, finanças no mais
barato, economia no melhor das margens.
▪ Procedimento serve também para se conhecer os interesses privados a
serem tidos em conta. Ex: Quercus fez queixa no TJUE na construção da
Ponte Vasco da Gama – fez bem, porque serviu para se apurar todos os
interesses na questão
▪ Interesse público não é algo abstrato e é construído no procedimento,
na lógica de procurar uma decisão que por ser mais informada é mais
adequada.
▪ Participação dos particulares introduzem elementos novos para a
tomada de decisão e é algo que só pode acontecer no procedimento
Administração cria relação com os particulares para se eles quiserem
participarem com a Administração no quadro das decisões
administrativas.
D. Função de Tutela Preventiva dos Particulares – Particular pode intervir antes
que a atuação da Administração ameace os seus direitos. Antes de particular ir
a Tribunal, a Administração já tem que considerar o interesse e como o
particular vai ser afetado.
27
No quadro da valorização do procedimento há conjunto multifuncional desempenhadas pelo
procedimento e só podem ser desempenhadas por eles – não se pode descartar pois descartar-se-iam
essas funções.
28
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
• O ato administrativo interessa como forma de atuação mas também como realidade
construída pelo procedimento.
A. Não interessa só o resultado final.
Codificação
Em Portugal pela primeira vez em 1991, na sequência da CRP 1976 estabelecer essa tarefa.
➢ Codificação tardia que seguiu modelo germânico de ter uma codificação alargada e que
trata de mais coisas do que as matérias procedimentais.
28
Funcionou em Itália e quase que viviam sem Governo pois a Administração Pública funciona muito bem.
Toma decisões neutras e imparciais que fogem aos controlos partidários e Administração ganhou um
prestígio que se impõe aos próprios governos.
29
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Critério do objeto:
• Procedimento decisório – têm por objeto preparar a prática de um ato da
Administração. Podem ser de 1º ou 2º grau.
• Procedimento executivo – têm por objeto executar um ato da Administração
• Procedimento administrativo comum – regulado pelo próprio CPA e que deve ser
seguido em todos os casos em que não haja legislação especial aplicável
• Procedimento administrativo especial – regulados por leis especiais (embora se
subordinem aos princípios da atividade administrativa do CPA e outras normas que
concretizem preceitos constitucionais)
Tendo em conta art. 32º/10 CRP quanto à natureza punitiva ou não do ato final do procedimento
• Procedimento administrativo sancionatório – dá lugar à prática de um ato punitivo
• Procedimento administrativo não sancionatório – não dá lugar a ato punitivo
30
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
29
No final de qualquer fase pode ser necessário que se tomem medidas provisórias (art. 89º) que podem
caducar (art. 90º).
31
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
5. Fase da decisão – fase que termina o procedimento (art. 93º). Pode terminar pela
prática de um ato administrativo ou pela celebração de um contrato (art. 126º).
a. Aplicam-se as regras dos art. 135º e ss. que disciplinam genericamente o
regulamento, ato ou contrato administrativo conforme o caso.
b. Prazos: art. 128º e 129º.
c. Outras causas de extinção do procedimento: art. 130º a 133º.30
30
Atos Tácitos: art. 130º - situações em que a lei atribui ao silêncio da Administração um determinado
significado (de deferimento) do qual advêm efeitos jurídicos. Sujeitos ao regime dos atos constitutivos de direitos.
➢ Criticados por VPS
31
Não de validade, pois nos seus elementos intrínsecos é totalmente perfeito
32
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
33
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Anos 50: ato administrativo com eficácia em relação a terceiros/efeito duplo – dirigido a um e
que vai afetar terceiros
Anos 70: começa a trabalhar-se no âmbito da relação jurídica multilateral – abrangia a relação
que se estabelecia entre Administração e concreto destinatário e outros sujeitos também
afetados por tal.
➢ Relação jurídica abrangia de forma mais omnicompreensiva a relação entre a
Administração e os sujeitos que eram visados pela atuação Administrativa (diretamente
e indiretamente).
➢ Pelo menos há uma relação triangular: Administração no topo e na base os interesses
dos particulares em colisão.
Administração Pública no exercício das suas competências vai afetar uma multiplicidade de
interesses e não apenas de um único destinatário.
• “Não só dos destinatários mas também de terceiros”
o VPS e Paes Marques não gostam porque eles não são verdadeiramente terceiros
– estão no raio de alcance do poder de atuação/conformação da
Administração, todos são destinatários da ação administrativa.
o Muitas vezes há sujeitos que à partida não estão reconhecidos nem
determinados, mas, são todos considerados destinatários pois a atuação da
Administração vai conformar também a sua esfera jurídica e não só daquele
que suscitou a incitativa.
Como se constituem?
Temos que olhar para as regras de legitimidade do art. 68º
➢ Titulares de direitos e interesses legalmente protegidos têm estatuto de interessados na
decisão decorrente do procedimento administrativo.
Quando a iniciativa é dum particular e advém do requerimento que faz à Administração, adota
uma prerrogativa que o enforma como interessado.
Aquele que se considerar afetado pelo procedimento desencadeado por outrem também se
pode constituir como interessado no procedimento, sabendo que ele está em curso
➢ Precisa de alegar/provar um direito ou interesse legalmente protegido, dado por norma
jurídica que lhe dá esse direito subjetivo específico, distinto do interesse geral da
comunidade.
o E se não sabem que o procedimento está a ocorrer?
34
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
32
Doutrina que comentou CPA 1991 falava dos interessados obrigatórios (de 1º grau) – com todos os
direitos procedimentais; interessados facultativos (de 2º grau) – constituição no procedimento não era
obrigatória pelo que não levava à invalidade do resultado da decisão administrativa.
➢ Vantagem: se algum não estiver presente no procedimento não há invalidade automática da
decisão adotada.
Faz sentido esta distinção? Não faz e CPA não os distingue.
➢ Considerar que todos eles sejam interessados obrigatórios não significa que a decisão da
Administração não possa vir a ser aproveitada caso haja alguma falta.
35
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
ATO ADMINISTRATIVO
Devido ao desenvolvimento dos conceitos de Procedimento e Relação Administrativa
Multilateral, que não devem de ser encarados como omni-explicativos como no tempo do
positivismo jurídico, surge uma crise das construções em que o Ato Administrativo era o centro.
• Otto Bachof: ato administrativo é uma fotografia instantânea de relações jurídicas em
movimento.
Críticas VPS
1. Administração não tem de definir o direito, quem o faz é o juiz.
• Administração apenas utiliza o direito para a satisfação de necessidades
coletivas.
• Os efeitos jurídicos do ato não correspondem a nenhuma definição do direito.
2. Não é mais o Governo que apenas decide, há desconcentração da Administração e
multiplicação de pólos decisórios.
• Qualquer órgão dotado de competência pode praticar atos administrativos.
3. Procedimento é juridicamente relevante e interessam todas as decisões tomadas no
decurso de um procedimento.
4. Não há nenhuma noção executória no ato administrativo
36
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
• Não existe na maioria dos atos administrativos, que são favoráveis aos
particulares.
• E há mesmo casos em que a execução forçada está proibida por lei. Ex: sanções
pecuniárias e execução coativa por dívidas.
Estado Social – Administração Prestadora, lógica do ato favorável, que atribui vantagens aos
particulares.
• Não cabia na lógica tradicional do ato de polícia.
• Administração prestadora que presta bens e serviços também na lógica do ato
administrativo.
• “atos constitutivos de direitos” – o que hoje em dia ainda é mais amplo
VPS: noção ampla e aberta do CPA é adequada para reproduzir o conceito de ato
administrativo nos dias de hoje – cabem os atos de definição de direito (que hoje são uma
minoria mas ainda existem atos de polícia) e todos os atos prestadores e infraestruturais.
Discussão doutrinária quanto ao artigo:
• Noção restritiva de ato regulador
• Noção ampla e aberta de ato administrativo
37
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
• DFA era adepto de noção ampla do ato administrativo, embora reduzido para efeitos
contenciosos numa aceção de apenas ato definitivo executório. Na edição mais recente
mudou de opinião, devido às mudanças no quadro da realidade administrativa
portuguesa.
• VPS: ato definitivo e executório é conceito absurdo que já não faz qualquer sentido
desde que a CRP afastou esse entendimento (revisão 1989), embora o sistema já estava
cheio de exceções e que já tinha afastado com a prática da justiça administrativa (o
contencioso estava aberto a outros atos que não eram definitivos, dizendo-se que isso
era uma exceção33;).
• Rogério Soares: não interessa se o ato é suscetível de execução coativa ou não, interessa
apenas se produz efeitos ou não.
o Mas o ato tem que ter algo de regulação, efeito de regulação em que há efeito
jurídico novo, que acrescenta algo de novo à ordem jurídica (tese da Escola de
Coimbra).
o VPS: não tem de haver nenhum efeito novo (efeito regulador) e basta que sejam
os efeitos já previstos na lei – artigo do CPA não fala em ato regulador.
2. Expressão “externos”
• DFA: novo CPA vem introduzir a referência à sua aptidão para produzir efeitos externos
– como já defendia Rogério Soares – atos administrativos produzem efeitos jurídicos no
setor do ordenamento jurídico geral, constituindo ou modificando relações
intersubjetivas, alterando as relações entre o ente público e o particular.
o Atos internos não são atos administrativos pois não assumem relevância no
ordenamento geral, aquele que tutela as relações entre figuras subjetivas
autónomas.
• VPS preferia noção do CPA anterior pois legislador resolveu colocar a tónica da questão
na parte do caráter externo da questão – dizendo que os atos internos não são atos
administrativos.
• Conceito a meio caminho entre a posição de Marcello Caetano/DFA e VPS.34
o VPS: Distinção não serve para nada e não mudou absolutamente nada na noção
de ato administrativo, pois a produção de efeitos jurídicos são forçosamente
externos, já que diz respeito a uma realidade que produz efeitos para fora –
produção de efeitos é algo que tem haver com a produção de efeitos na
realidade jurídica.
o Não faz sentido dizer que os atos internos têm regime privilegiado.
33
Dizia-se “o contencioso só está aberto aos atos que são o termo do procedimento”, mas, estava aberto
a todos os outros que, não sendo o termo, terminem uma parte especial do procedimento, ou seja, está
aberto a todos os outros menos aqueles que são o final do procedimento; e depois dizia-se “se o ato
excluiu alguém, apesar de este ser um ato inicial, ele já é definitivo para alguém e, portanto, é outra
exceção”; o sistema estava com tantas exceções que a regra já não existia
• Se se diz que “só são admissíveis contenciosamente os atos definitivos, com exceção de todos os
que não são definitivos”, que correspondem a uma realidade que é quase igual a todos os outros,
significa que esse não é um critério legal, portanto, não fazia sentido continuar a utilizar esse
critério, que, de resto, já tinha caído em desuso pela própria prática da justiça administrativa e
pelo próprio funcionamento do contencioso administrativo.
34
Efeitos práticos desta tese de Mário Aroso de Almeida diz que os projetos de urbanismo não são atos
administrativos – mas isto produz efeitos e podem ser levados a Tribunal (VPS)
38
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
VPS: não têm razão aqueles que dizem que a palavra “decisão” implica noção restrita de ato
administrativa nem têm razão aqueles que dizem que a palavra “externos” também reduz o
conceito de ato administrativo.
➢ Legislador adotou noção ampla e aberta, não se tendo que substituir à doutrina na
elaboração de conceitos e deve limitar-se a elencar as situações em que se podem
aplicar os conceitos.
DFA
Ato administrativo é o ato jurídico unilateral praticado, no exercício do poder
administrativo, por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada
para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado pela
Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
• Ato jurídico – conduta voluntária produtora de efeitos jurídicos
• Ato unilateral – provém de um só autor, cuja declaração é perfeita (acabada, completa)
independentemente do concurso de vontades de outros órgãos ou sujeitos de direito.
o Por vezes um ato administrativo depende da aceitação de um particular
interessado, mas essa aceitação funciona apenas como uma condição de
eficácia do ato e não integra o conteúdo do próprio ato, nem é condição da sua
existência ou validade.
o Ampla participação dos particulares no procedimento não o torna um contrato
pois a decisão última do caso concreto cabe sempre à Administração, que
manifesta a sua vontade própria
• Ato praticado no exercício do poder administrativo – praticado no exercício de um
poder público, ao abrigo de normas de direito público e para o desempenho de uma
atividade administrativa de gestão pública
• Ato de um órgão administrativo – que têm a competência, definida na lei, investindo-
os com poderes de autoridade para praticarem o ato
• Ato decisório – só é ato administrativo a decisão final do caso visando produzir efeitos
jurídicos diretos no ordenamento, os atos preparatórios desenvolvem apenas uma
função auxiliar aos atos administrativos e são apenas atos instrumentais, atos jurídicos
menores não produtores de efeitos jurídicos diretos no ordenamento geral, embora
com autonomia funcional
• Ato que versa sobre uma situação individual e concreta – conteúdo individual e
concreto (não geral e abstrato como o regulamento)
39
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Validade do Ato
No Direito Administrativo há diferença importante entre regras de validade e regras de eficácia.
• Diferença em relação ao Direito Privado, onde é costume ligar a eficácia à validade.
o No quadro do Direito Administrativo não é isso que sucede, devido à natureza
da função administrativa.
o A existência da função administrativa obriga a dissociar a legalidade
(conformidade do ato administrativo com o ordenamento jurídico) da
produção dos efeitos jurídicos.
Eficácia – efetiva produção de efeitos jurídicos pelo ato, a projeção na realidade da vida dos
efeitos jurídicos que integram o conteúdo de um ato administrativo.
• Para o ato ser eficaz tem de cumprir todos os requisitos de eficácia exigidos pela lei.
o Ineficácia – fenómeno da não-produção de efeitos jurídicos num dado
momento.
35
Nova posição de DFA
40
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Invalidade
Durante muito tempo considerava-se que a única fonte de invalidade era a ilegalidade – todo o
ato administrativo ilegal era inválido e todo o ato administrativo inválido o era por ser ilegal.
Hoje em dia há outras fontes de invalidade.
Outras fontes de invalidade: ato pode ser inválido, e portanto nulo ou anulável, por
razões que nada têm a ver com a sua ilegalidade (pode ser por motivos comuns ao
direito privado como o erro, dolo, coação, simulação e etc.)
➢ Nesse caso o ato é ilícito e há pelo menos quatro casos: ato administrativo
não viola a lei mas ofende um direito subjetivo ou interesse legítimo dum
particular; ato administrativo viola um contrato não administrativo; ato
administrativo ofende a ordem pública ou os bons costumes; ato
administrativo contém uma forma de usura.
➢ Também pode haver vícios da vontade se particular engana Administração
que age por dolo ou pratica ato sob coação. A vontade da Administração
deve ser sempre livre e esclarecida.
Ilegalidade do ato administrativo – quanto o ato é contrário à lei (entendida como todo o
bloco de ilegalidade).
• Pode assumir várias formas: vícios do ato administrativo (formas específicas que a
ilegalidade do ato administrativo pode revestir).
41
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
36
Classificação em vícios resulta da História, corresponde à evolução histórica francesa com alargamento
progressivo dos vícios.
37
De forma a que nenhuma ilegalidade fique excluída de fiscalização contenciosa pelo facto de a lei
estabelecer tipologia oficial de vícios, a violação de lei é vício residual, “vala comum” onde cabem todas
as ilegalidades insuscetíveis de reconduzir a qualquer um dos outros vícios.
42
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
VPS: lista ilógica que não esgota os vícios existentes e deixa muito a desejar, do ponto de vista
científico. É desnecessária pois em nenhuma lei desde os anos 80 se fala nestes vícios. O que a
ordem jurídica portuguesa exige é que haja um pedido e uma causa de pedir – particular não
tem de invocar os vícios nem se tem de utilizar esta lista.
• André Gonçalves Pereira: teoria dos vícios é absurda – lógica de fazer corresponder cada
um dos vícios a um aspeto do ato administrativo está viciada pois o mesmo aspeto do
ato pode dar origem a mais vícios (competência dá origem a 2 vícios); vício de forma é
chamado a desempenhar uma função que não é dele38, pois corresponde a duas
realidades do ato administrativo (procedimento e forma); aspeto material é dividido e
cria-se uma falsa distinção (violação de lei transformação em violação DA lei – não tem
qualificação e cabem todos os atos ilícitos).
• De fora ficam os vícios de vontade da Administração.
VPS: esta qualificação era incompleta pelo que se deveriam considerar outros vícios que não
estes. Só discorda de Gonçalves Pereira quando este queria autonomizar o vício de falta de
causa.
Hoje em dia nada obriga a que se utilize esta qualificação, mas continua a ser usada.
Identificar os vícios é a forma de identificar a causa de pedir.
VPS utiliza sempre a designação lógica, embora por vezes admita que se possa aludir
historicamente aos vícios.
➢ O importante é qualificar elemento material e isso não passa pela teoria dos vícios do
ato administrativo.
38
Pois não se autonomizava o procedimento.
39
Correspondência entre vícios e formas de invalidade
• Usurpação de poder = nulidade
43
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Um ato administrativo pode ser ilegal por se verificar apenas um dos vícios ou vários (eles são
cumulativos).
Art. 161º CPA estabelece noção ampla e aberta de nulidade e no nº2 faz numeração
exemplificativa e não taxativa – seja qual for o vício, o que qualifica como nulidade ou
anulabilidade é a gravidade do ato em causa
Ver o elenco do artigo que correspondem aos vícios.
Nulidade
• Forma mais grave da invalidade
• Ineficaz desde o início – ato nulo não tem apetência para a produção de efeitos jurídicos
e se produzir efeitos jurídicos têm-se como não produzidos. Em casos excecionais eles podem
produzir alguns efeitos a título putativo, apesar dos efeitos não serem válidos, consideram-se como tal por exigências da
boa fé.
• Insanável pelo decurso do tempo (art. 162º/1) e nem por ratificação (art. 164º/1) –
invocável a todo o tempo.
• Podem ser reformados ou convertidos (art. 164º/4)
• Particulares e funcionários públicos têm direito a desobedecer a atos nulos. Particulares
têm direito de resistência passiva (art. 21º CRP)
• Pode ser conhecido, impugnado e declarado a todo tempo (art. 162º/2)
• Também pode ser conhecida por qualquer órgão administrativo (art. 134º/2)
• Natureza meramente declarativa da declaração de nulidade – tribunal não anula um ato
nulo, apenas declara a sua nulidade.
44
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Anulabilidade
• É juridicamente eficaz até ao momento em que venha a ser anulado (art. 163º/2)
• Sanável pelo decurso do tempo (art. 164º/1) logo, se não for anulado dentro de um
certo prazo torna-se um ato inatacável.
o Mas se ninguém fizer o pedido do afastamento ou a Administração tomar a
iniciativa de os afastar, os atos continuam a produzir efeitos. Continuam a ser
ilegais e será sempre possível ir a tribunal para pedir a verificação da legalidade,
mas enquanto isso não acontecer eles vão produzir efeitos.
• Só pode ser impugnado num tribunal administrativo
• Tem efeitos retroativos e tudo se passa na ordem jurídica como se o ato nunca tivesse
sido praticado
• Regra geral – art. 163º/1; só é nulo pelo art. 161º/1, isto por razões de certeza e de
segurança da ordem jurídica pois com o tempo o ato fica sanado e isso faz com que
deixe de pairar uma dúvida sobre os atos da Administração.~
o VPS: é um disparate, não há convalidação, o particular pode continuar a pedir
ao Tribunal a restituição dos seus direitos porque o ato continua a ser ilegal –
passar o prazo significa que o particular não pode afastar o ato da ordem
jurídica, mas, ainda pode pedir sentença em tribunal para que os seus direitos
sejam acautelados à luz da ilegalidade desse ato.
▪ Essa ideia da convalidação vem de Marcello Caetano em que se
equiparava o caso julgado ao caso decidido.
▪ Prazo de impugnação é meramente adjetivo e o particular pode sempre
fazer valer os seus direitos.
▪ Ex: um ato inválido que não contava certo tempo de trabalho aos
funcionários é descoberto 40 anos depois quando se vai pedir a
reforma. Já não se pode pedir o afastamento desse ato da ordem
jurídica mas os particulares podem fazer valer os seus direitos e que
esse tempo conte para o pedido da reforma.
▪ CPTA: Ato já não pode ser impugnado porque passou o prazo mas o
particular pode levar o caso a juízo de forma a que se condene a
Administração (considera o ato ilegal para efeitos de condenação da
Administração)
Opera por:
• Ato administrativo secundário (art. 164º)
• Pelo decurso do tempo – quando há prazo na lei para se puder impugnar
contenciosamente.
45
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Atos administrativos de conteúdo negativo com efeito de fazer cessar os efeitos de um ato
anterior (afasta os efeitos jurídicos produzidos por um ato anterior).
➢ Não tem nenhuma dimensão de natureza positiva e é um ato que afasta um ato
administrativo.
➢ DFA: atos são de natureza negativa, ou destrutiva e através deles o órgão administrativo
extingue os efeitos de um ato anterior, por ilegalidade, inconveniência, ou a título de
sanção, e com isso destrói ou elimina da ordem jurídica uma determinada decisão.
Pode ser por razões de mérito – Administração descobriu uma melhor forma de realizar o
interesse público.
Pode ser por ilegalidade – Administração, vinculada ao princípio da legalidade, está a reparar a
ilegalidade de um ato que produziu.
Diferença quanto ao motivo determinante / finalidade quanto ao ato de conteúdo
negativo altera os efeitos do ato, se há eficácia retroativa ou não:
mérito – não; ilegalidade – sim
O autor do ato revogatório exerce uma competência dispositiva idêntica à que está na origem
do ato revogado, desenvolvendo, ao revogar, uma função de administração ativa.
➢ Fim do ato é a prossecução do interesse público atual, tornado possível com uma
reapreciação do caso concreto e fazendo cessar os efeitos jurídicos do ato anterior.
Implica juízo de mérito da Administração, fundamento é a inconveniência.
46
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Posição do legislador foi ao encontro das critica de VPS ao CPA anterior e alargou o exercício da
competência para revogar e/ou anular.
Na revogação é preciso saber quem tem competência – quem praticou o ato, o superior
hierárquico, o delegante em relação aos atos do delegado e o órgão que tem tutela revogatória
gozam desses poderes.
Quem deve ser considerado o autor do ato?
• DFA: órgão que efetuou efetivamente o ato mesmo que seja incompetente, o titular da
competência não poderia revogar porque não o praticou
• Gomes de Andrade e Marcello Caetano: só o órgão competente é que poderia revogar.
• VPS: discorda de todos. Devem-se juntar as duas perspetivas e quer o autor do ato, quer
o órgão materialmente competente devem gozar da competência revogatória.
Solução que agora está no CPA (art. 169º/1 e 3)
47
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Há o dever de anular dos atos, com fundamento no Estado de Direito democrático onde a
Administração Pública está subordinada aos princípios da constitucionalidade e da legalidade.
Ato administrativo pode ser suspenso por um de três modos distintos: por força da lei, por ato
administrativo e por decisão de um tribunal administrativo.
Outras disposições:
A. Retificação - ato administrativo secundário que visa emendar os erros de cálculo ou de
erros materiais contidos num ato administrativo primário anterior.
B. Ratificação - ato administrativo pelo qual o órgão competente decide sanar um ato
inválido anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia.
C. Reforma - ato administrativo pelo qual se conserva de um ato anterior a parte não
afetada da ilegalidade.
D. Conversão - ato administrativo pelo qual se aproveitam os elementos válidos de um ato
ilegal para com eles se compor um outro ato que seja legal.
48
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Geral e abstrato
• Pluralidade de sujeitos definida de forma abstrata e que dizem respeito a uma série de
destinatários.
• Esses destinatários não são suscetíveis de serem determinados em concreto.
• Não há só uma situação da vida a que se aplica aquela situação e sim uma multiplicidade
de situações a que se podem aplicar.
Ambos correspondem a normas jurídicas daí que se deve dizer ato geral ou abstrato. Tem que
haver uma delas. Basta uma das características, portanto o regime do regulamento pode aplicar-
se a toda a realidade administrativa.
49
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Regulamento pode ter uma forma especial de invalidade (VPS) e tem um regime próprio suis
generis – art. 144º CPA.
50
Sebenta Administrativo II – 2016/2017 DNB
Contratos Públicos/Administrativos
Acordo de vontades pelo qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídica
administrativa.
Contratos Públicos – contratos celebrados pela Administração Pública, quer sejam regulados
pelo direito administrativo, quer pelo direito privado, que a lei submeta a um especial
procedimento de formação, regulado por normas decorrentes do DUE.
51