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Índice
Identidade do Direito Internacional Público ............................................................................... 3
Noção DIP .................................................................................................................................. 3
Terminologia e Intitulações....................................................................................................... 5
Um Direito difícil de conhecer................................................................................................... 5
Disciplinas Afins ......................................................................................................................... 6
Disciplinas Aliadas ..................................................................................................................... 6
Ordens Normativas não jurídicas .............................................................................................. 7
Comparação DIP e Direito Interno ............................................................................................ 7
Não há UM DIP .......................................................................................................................... 8
Evolução Histórica DIP ................................................................................................................ 10
Longo período Gestação ......................................................................................................... 10
Período Clássico: Paz de Vestefália (1648-1815) ................................................................... 14
Período Moderno (1815-1945)............................................................................................... 17
Período Contemporâneo (1945 - dias de hoje) ..................................................................... 19
Juridicidade do DIP ..................................................................................................................... 24
Fundamentos Teóricos ........................................................................................................... 24
Correntes Doutrinárias quanto à origem do DIP................................................................. 24
Posição Marilu ..................................................................................................................... 25
Funções Sociais ....................................................................................................................... 26
Fontes do DIP .............................................................................................................................. 28
Art. 38º ETIJ ............................................................................................................................. 28
Fontes Tipificadas .................................................................................................................... 29
a) Convenção Internacional................................................................................................ 29
b) Costume Internacional ................................................................................................... 33
c) Princípios gerais de Direito ............................................................................................. 36
d) Jurisprudência e Doutrina .............................................................................................. 37
2. Equidade – ex aequo et bono......................................................................................... 38
Fontes não tipificadas ............................................................................................................. 39
Atos Unilaterais .................................................................................................................. 39
Soft Law............................................................................................................................... 43
Codificação e Desenvolvimento DIP........................................................................................ 43
Hierarquia de Fontes e de Normas ......................................................................................... 44
Direito dos Tratados ................................................................................................................... 46
Nascimento ............................................................................................................................. 46
Negociação, adoção e autenticação do texto (art. 9º e 10º, CVDT) ................................. 46
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
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Pluralidade de fontes
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
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É um verdadeiro ordenamento jurídico que coexiste com outros – realidade de ordenamentos jurídicos
cada vez mais plural e com várias normas potencialmente aplicáveis à mesma situação e no mesmo espaço
– é uma pirâmide normativa de Kelsen independente
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Comunidade Internacional ≠ Sociedade Internacional?
Linguagem comum: não
Linguagem jusinternacionalista: sim
o Diferença é na dicotomia sociológica (obra de Ferdinand Tönnies, finais do séc. XIX, em
que se abordam os agregados humanos) se, mutatis mutandi, entre os estados se
estabelece uma relação comunitária ou societária
Entre os Estados há os dois tipos de relação e a Carta da ONU tem ambos elementos
Art. 2º, relações intergovernamentais em que na origem é societário
Cap. 7, segurança coletiva em que há uma relação comunitária (pois os 15 do
conselho decidem pelos 193 e dentro desses 15, decidem 5 e desses 5, 1 pode
vetar)
Marilu: prefere a noção de comunidade internacional – os Estados aceitam abrir mão
de parte da sua soberania em nome do bem individual e coletivo – que leva à subsistência
do DIP
Mas ainda é de base intergovernamental com características mais societárias
que comunitárias.
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Terminologia e Intitulações
Bentham – 1780, “An introduction to the principles of moral and legislation” – International
Law regula as relações entre Estados (por contraste ao National ou Municipal Law)
O termo público surgiu na edição Suíça (1802) e nos países francófonos e a eles mais
ligados (como Portugal) surgiu o termo Público – que traduz melhor a natureza e o
âmbito desta disciplina jurídica
Bentham preocupou-se que fosse suficientemente análogo à designação tradicional de Direito
das Gentes – que sobreviveu na Alemanha por ser mais abrangente na perspetiva de direito
comum às “gentes”, incluindo povos e pessoas e não apenas nações e Estados)
Outras propostas:
Jessup – 1956 – Direito Transnacional: transcende fronteiras e está acima dos Estados impondo-
se (Marilu: ideal comunitário que é mais exercício de vontade do que realidade)
Cassese – Direito Global: função de ius commune
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Cassese – admite a oposição entre a facilidade enganadora da interpretação literal e os riscos de uma
legalidade emergente e de contornos ainda incertos, cuja base tradicional e sólida foi o Estado soberano
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Disciplinas Afins
Direito Internacional Privado – regula relações jurídico-privadas resultantes de situações de
vida plurilocalizadas que põe em contacto várias ordens jurídicas potencialmente competentes
para regular o litígio.
Distingue-se pela natureza privada
Distingue-se por ter normas indiretas (técnica das normas sobre conflitos de lei) – sendo
que no Público são diretas
Tem-se vindo a aproximar do público através da aprovação de convenções
internacionais que vinculam. Ex: Convenção de Haia (1954) sobre processo civil;
Haia e Luxemburgo (1980) sobre guarda de menores – sobretudo ocorre na UE
numa harmonização, Convenção Roma (1980) sobre a lei aplicável às obrigações
contratuais)
Aplica-se às relações jurídico-privadas, ainda que envolvam Estados.
Direito da União Europeia – natureza atípica porque não é Direito Estadual nem (ainda é) Direito
Internacional – Conjunto de regras e princípios que regem a existência e o funcionamento da
UE; exprimindo ordem jurídica própria e autónoma.
UE e Comunidade Internacional são distintas
Na UE há objetivos de integração económica com recurso a instrumentos de integração
jurídica (como tribunais comunitários) – emancipação do DUE em relação aos modelos
tradicionais de criação e aplicação do DIP
Internormatividade em que existe uma relação de influência recíproca –
“comunitarização” do sistema de proteção dos direitos do homem (desde o
Protocolo 11 e a partir de 1998 com o sistema da Convenção Europeia dos
Direitos do Homem) poderá influenciar a jurisdicionalização e aperfeiçoamento
dos instrumentos de garantia dos direitos humanos no plano regional, e
porventura universal; fontes DUE é também o DIP através de convenções e
normas não pactícias, sendo uma questão controverdida a conciliação da
vinculação às resoluções do Conselho de Segurança e os standards europeus de
proteção direitos do homem (ex: terrorismo)
Disciplinas Aliadas
Cumplicidade científica em que influenciam o raciocínio técnico-jurídico relevante para a ciência
do DIP – aproxima-se da perspetiva flexibilizadora.
Ciência das Relações Internacionais/Teoria das Relações Internacionais – DIP congrega no
dever-ser das normas jurídicas enquanto a Teoria das Relações Internacionais lida com a
realidade internacional na sua expressão fáctica do que é e do que acontece.
Partilham da mesma matéria-prima mas não são regras jurídicas e si, regras de atuação
previsível em função de uma realidade internacional – definem regras sobre as quais
assentam teorias, cenários e modelos de explicação
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Muitas vezes socorrem-se do DIP para “inglês ver” e com efeito retórico em
situações de conflitos assimétricos entre Estados com expressão militar e/ou
económica desigual5 – avaliam-nos à luz de uma perspetiva que hegemoniza a
história dos factos e aceita a autoridade absoluta da força – perigo está em
convocar o DIP para apoiar e legitimar essas construções teóricas ou estratégias
de política externa (uso forçado e artificioso da argumentação jurídica, com o
intuito de legitimar uma decisão já tomada). Ex: invasão do Iraque (2003) que
apesar da recusa do Conselho de Segurança da ONU, invocando DIP, legitimou
a invasão; ataques à Síria e crimes de guerra da Rússia, que não assinou Estatuto
de Roma que a sujeitaria ao TPI, EUA acusam, mas também não são membros
DIP como expressão de uma legalidade que se define pelas condicionantes
idiossincráticas da comunidade internacional, orientada pela pauta axiomática
que se ajusta em função dos valores primordiais da paz e da dignidade da pessoa
humana.
Não é pelo dever-ser do DIP não ser respeitado que deixa de ter juridicidade
Globalização das relações económicas desenvolveu o ius commune e cuja aplicação depende
dos instrumentos normativos próprios do Direito Internacional.
Cortesia Internacional – Comitas Gentium – regras de trato social que ajudam e promovem as
relações entre os indivíduos no plano internacional; muitas vezes na condição específica de altos
dignitários do Estado e de outras entidades internacionais (protocolo por razões de tradição,
conveniência, respeito mútuo). Ex: receber Chefe de Estado no aeroporto com tapete vermelho;
mandar flores quando um Chefe de Estado morre.
TIJ: Não têm natureza vinculativa de comando jurídico mas podem facilitar a resolução
de um litígio
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DIP foi muito desenvolvido por pequenos Estados (escola Austríaca) que têm do seu lado o Direito e a
esperança que a norma se imponha; não contando com o poderio bélico
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
A comparação tem que ser num sentido mais exigente de encontrar e interpretar analogias e
equivalências.
Céticos chegam a conclusões radicais que não existe por não ter legislador, polícia e juiz.
Legislador – tem centros de decisão normativa mas não sob a forma estadual típica. Há
um multilateralismo à escala universal com importantes conferências (ex: Rio de
Janeiro, 1992, donde surgiu Protocolo de Quioto; Organização Mundial do Comércio,
1986-94, com vários acordos firmados).
No plano das organizações internacionais de âmbito regional a decisão normativa
compete a órgãos de composição restrita (ex: Comissão Europeia) ou de natureza
parlamentar (ex: Parlamento Europeu) – sob a forma de atos jurídicos unilaterais em
tudo equivalentes a atos legislativos dos Estados
Polícia Internacional – poderes de controlo e de sanção no caso de violação da lei
internacional estão confiados pela Carta da ONU, no cap. VII, à ONU (nunca foram
utlizados e são insuficientes); acabam por ser os Estados que impõe a paz pelo uso ou
ameaça da força (ex: superpotências, NATO).
Polícia ad-hoc, de funções interinas, cuja legitimidade e o fundamento jurídico
dos seus poderes se questiona. A sua atuação suscita, por outro lado, fundadas
preocupações sobre o efeito de desautorização e enfraquecimento da ONU.
Juiz Internacional – desde o Tribunal Permanente de Justiça Internacional no quadro da
Sociedade das Nações em 1921, que se têm instituído instâncias jurídicas próprias;
desde tribunais de âmbito universal ou regional, de competência genérica ou
especializada – Tribunal Internacional de Justiça (1945), Tribunal Internacional do
Direito do Mar (1994), Tribunal Penal Internacional (2002) e etc.
Fragilidade de terem caráter facultativo (jurisdição facultativa) dependendo de
uma aceitação dos Estados.
Tem crescido a adesão ao modelo de tribunal de competência obrigatória – ex:
TEDH (1998) funcionando como tribunal permanente e de jurisdição obrigatória
Poderes têm aumentado na sequência do crescente abandono gradual do dogma da
soberania dos Estados – tendência mais recente é a da jurisdicionalização das relações
internacionais.
Não há UM DIP
Há várias áreas de incidência da lei internacional – tendo diferentes classificações e divisões de
forma a ordenar a pluralidade do DIP.
Como DIP exprime uma ordem jurídica própria e autónoma, tem as consequências de se dividir
em vários ramos do Direito – havendo fenómenos de internacionalização das matérias que
propicia a expansão do espetro material de aplicação do DIP
Pai do DIP, Hugo Grócio, em 1625 fundava a distinção entre Direito da Guerra (ius ad bellum) e
Direito da Paz (ius pacis).
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Em 1945, a guerra foi proibida pela Carta da ONU – DIP continua a regular o uso da força mas
não é apenas Direito dos Conflitos Armados porque a sua função de estatuto jurídico da
Comunidade Internacional alargou e diversificou o espaço de incidência normativa.
Configuração da sistematização em
Critério Geográfico – constata a existência de um Direito de aplicação Universal ou para-
universal e outro Direito de âmbito não universal (Regional)
Pode o Direito Regional derrogar o Direito Universal? Podem definir regimes
normativos diferentes e mesmo de alcance derrogatório, salvo se tais matérias forem
objeto de “normas imperativas de direito internacional geral” (ius cogens)
Critério relativo ao Objeto de Regulação – temos de distinguir o
1. DIP Institucional: regras e princípios que definem a estrutura da ordem jurídica
internacional e o funcionamento das organizações internacionais
2. DIP Material: desdobra-se num conjunto vasto de ramos e sub-ramos, ora resultantes
de necessidades específicas de regulação das relações internacionais ora refletindo a
projeção no plano internacional de ramos do Direito de génese estadual.
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Manifestações Antigas
3010 a. C. – primeiro tratado internacional entre Lagash (e o seu soberano Eannatum)
e Umma – acordo de paz entre cidades da Mesopotâmia rivais
1279 a. C. – Tratado de Qadesh entre o Faraó Ramsés II do Egito e Hattusi III, Rei dos
Hiitas – símbolo antigo do espírito de paz selado através de tratados
o No mundo antigo os tratados traduziam uma política de alianças entre os cinco
grandes reinos ou impérios6 e versavam sobre a guerra, as condições de paz e
as regras de exercício do comércio
o Os tratados invocavam as divindades supremas que castigariam o
infrator/incumpridor – mais tarde, nos países de credo cristão assinava “em
nome da Santíssima e Indivisível Trindade” como ainda se pode ler na ata final
do Congresso de Viena de 1815.
6
Babilónia, Egito, Reino Hiita na Ásia menor, Reino Mittanni na Mesopotâmia, Assíria
7
Antecessor do atual regime de proteção consular
8
Séc. VI a. C – 12 cidades-estados na anfictionia do santuário de Delfos
9
Liga de Delos, 476 a. C.
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Queda do Império Romano (476) – invasões dos povos bárbaros em que só no séc. XI
estabilizaram os reinos cristãos, aprofundando-se as relações comerciais com o exterior,
verificadas as condições políticas e económicas para o estabelecimento de relações
internacionais.
Idade Média – disputa entre o Papa e o Santo Império pelo poder supremo da Civitas
Christiana. Visão cristã do mundo de igual dignidade humana por serem todos “filhos
do mesmo Deus”
o Carlos Magno em 800 aceita o Império Romano do Ocidente
o Ceptro Imperial é alcançado por Otão I, em 962 formando o novo Império
Romano-Germânico, que desafia o poder do Papa no seio da Respublica
Christiana (era a cabeça da comunidade cristã e superior ao dos monarcas)
Instabilidade devido à incerteza dos limites entre o poder espiritual e
temporal
Até ao séc. XIV – Direito Canónico como direito comum – limita o poder
do monarca e há uma fragmentação do poder (disperso pelos senhores
feudais e depois as funções centralizaram-se no Estado)
O Ius Commune11 (também com influências do Direito Romano) era
elemento fundamental de unidade funcional e na sua dimensão
internacional aplicava-se em dois regimes normativos
1. Lex Mercatoria: regulava as trocas comerciais no âmbito da Liga
Hanseática (associação de cidades germânicas e de Veneza e
Génova); decisões expeditas em tribunais formados por
mercadores, aplicando usos corporativos e a boa fé
10
Versão contemporânea e altamente contestada nos fundamentos e eficácia: pax americana
11
Não é ainda DIP pois é de fonte e ação unilateral do Papa
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
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Bem como o Libre del Consolat de Mare, de Barcelona no séc. XIII até séc. XVI foi instrumento de
formação de um Direito marítimo europeu, quase comum.
13
Séc. XV em que há uma evolução de um período feudal para um período de poder institucionalizado –
institucionalização do poder com limitação e separação de poderes rompe com o paradigma feudal
Maquiavel (1469-1527) – objetivo maior de preservar o Estado contra as alianças e ataques dos inimigos
externos justificava certos meios, mesmo contrários à lei natural, devido à “razão de Estado” (que ganhou
afloramentos para as violações dos Estados e hoje em dia ainda tem aplicação restrira se as causas de um
Estado justificarem a cessação de vigência de um tratado – cláusula rebus sic stantibus
14
Devido ao desenvolvimento de estudos jusinternacionalistas e florescimento das universidades
12
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Comunidade internacional tinha por base, como a comunidade política interna, o Direito
Natural – orbis possuía caráter próprio à qual se aplicava um direito natural de sociedade
e de comunicação que regulava as relações recíprocas (Direito entre as gentes).
Os valores comuns prevalecem sobre as comunidades políticas particulares,
sublinhando cariz universal desta entidade e do direito aplicável.
Direito das gentes faz parte do Direito natural destacando-se a vontade humana para
criar direito positivo sob a forma de leis justas que convenham a todos
Frei Serafim de Freitas (1570-1633) – Universidade de Valladolid, em 1625 tem a obra Do Justo
Império Asiático dos Portugueses
Defende a tese do mare clausum – como resposta direta ao opúsculo de Grócio15 –
embora defendendo que o mar é coisa comum16
Defendeu os direitos privativos de navegação como prerrogativa dos Portugueses17 na
Índia, reconhecida por delegação pontifícia, baseada em títulos de ocupação, de
descoberta e de alianças com os poderes locais – pretensão portuguesa e ibérica do
domínio das terras descobertas18
A opinião de Serafim de Freitas foi contrariada pelo equilíbrio de forças europeias e o
princípio da liberdade dos mares prevaleceu a partir de 1648 e tornou-se pedra angular
do Direito Internacional do Mar
Hugo Grócio/ Huig de Groot (1583-1645) – nascido em Delft na Holanda e evadiu-se para França
onde teve um papel determinante na secularização do fundamento jusnaturalista do DIP19
Em 1625 publica De Iure Belli ac Pacis que passa a ser uma obra de alicerce teórico para
o tratamento sistemático e integrando várias questões do DIP moderno
15
Parecer jurídico encomendado pela Companhia Holandesa das Índias Orientais
16
Diferente de Selden que no livro Mare Clausum sustenta tese de direitos territoriais e exclusivos de
navegação mas na zona marítima fechada e patrimonial britânica.
17
Defendia o monopólio das rotas marítimas do Atlântico Sul e Índico
18
Como corolário do Tratado de Tordesilhas de 1494 e do princípio de partilha do Mundo, energicamente
contestado pelas demais potências marítimas e impossível de manter no contexto do séc. XVII
19
A perspetiva secular completou a construção do DIP sendo um homem de génio que aproximam uns
dos outros os elementos já existentes de uma ciência, insuflando-lhes o sopro da vida (Marcello Caetano)
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Jusnaturalista de base racional (em nome da própria razão humana) na esteira de Bodin
com o Estado Soberano como “aquele cujos atos são independentes de qualquer outro
poder superior e não podem ser anulados por vontade humana”
o As potências soberanas não se podem fechar sobre o seu próprio império da
vontade, porque necessariamente integram uma sociedade regida pelo
Direito
o E esse é o direito natural de raiz secular e modelado pela razão que “consiste
em certos princípios da razão reta que nos fazem reconhecer que uma ação é
moralmente honesta ou desonesta consoante a conveniência ou inconveniência
necessária que ela evidencia com uma natureza razoável e sociável”
Base racional laica e sem fundamentação divina ia ao encontro do apoio
teórico duma necessidade do seu tempo de conciliar as facções
religiosas em confronto.
o Ideia poderosa de um Direito das gentes aplicável a todos os aspetos das
relações entre nações – passando o DIP a ter uma maturidade e autonomia,
afirmando o modelo europeu do Estado soberano (Jomi)
Aprofunda doutrina de Suarez sobre a distinção entre direito natural e direito
voluntário
o Direito voluntário era resultante da vontade das nações sob a forma de acordo
com o princípio essencial pacta sunt servanda
E apesar disso não podem contrariar direito natural – condicionando os
seus comportamentos e as respetivas escolhas políticas nas relações
dos Estados
Fala do respeito do direito da guerra pois os Estados têm essa legitimidade porque não
existe autoridade superior que os possa substituir nessa decisão
o Retoma os conceitos de guerra justa e injusta – achando-a justa quando o
Estado procura reagir a uma injustiça e cabe ao direito natural determinar as
causas possíveis de legítima defesa dos direitos e de existência de identidade dos
próprios Estados
o Aos povos oprimidos assistia o direito de resistência contra os tiranos e o direito
à independência
o Na defesa do Direito da Guerra consagrou regras a respeitar enquadradas pelo
princípio fundamental de temperança e humanidade.
20
Periodificação Marilu com base em guerras – que provocam rasgão entre os Estados e ao fazer a paz
cosem o rasgão com novo tecido (mudança de paradigma)
Jomi tem outra periodificação e diz que DIP surge no séc. XV e o Clássico vai até 1945 começando
aí o Contemporâneo
14
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) – longa e intensamente devastadora teve origem
religiosa e política
o 1) Luta de influência entre França e Espanha (a partir de 1635)
o 2) Imperador Fernando II pretendia aniquilar os hereges protestantes e
restaurar a autoridade do Sacro Império Romano-germânico
Foi oposto pelos Estados protestantes, Holanda e Suécia, e França (que
no campo católico não aceitava a pretensão da hegemonia germânica)
Termina em 1648 com os Tratados de Osnabrück e de Munster – dois tratados
bilaterais21 que estabeleceram a Paz de Vestefália
o Derrotados: Fernando II e Príncipes alemães
o Vencedores: Rainha Cristina da Suécia e França com Luís XIV
o 5 anos de negociações de paz com um enquadramento pactício assente em
regras costumeiras
21
Tratato Bilateral entre duas partes (Alemanha com Fernando III e França com Luís XIV) pois há dois
grandes polos de interesses, mas, com muitos signatários (aliados + aderentes)
22
Passagem do modelo dual de obediência feudal para o modelo dos Estados soberanos
23
Liberdade religiosa como a liberdade de cada monarca escolher a religião do seu reino
24
Surge primeiro modelo jurídico do DIP europeu e que a doutrina qualifica como Carta Constitucional da
Europa
15
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
A. Pacta Sunt Servanda – observância dos tratados pelos Estados celebrantes que os
devem respeitar e cumprir
B. Negociação político-diplomática – como via de ultrapassar conflitos que ameaçavam a
paz
C. Direito da Guerra – uma guerra iniciada sem justa causa seria contrária ao Direito e os
Estados partes nos tratados de paz deviam zelar pela reposição da ordem (incluindo o
uso da força contra o Estado infrator)
Não se proíbe a guerra mas acordou-se num sistema de regulação da guerra em
que só os Estados soberanos25 a ela podem recorrer para resolver conflitos com
outros Estados soberanos (ius ad bellum)
Princípio do equilíbrio no plano político e geopolítico das relações externas dos
estados – objetivo de garantir uma relação equilibrada e negociada entre as
várias Potências.
25
Titulares de suprema potestas
26
Inspirados por movimentos pacifistas que surgiram de base às comunidades europeias
16
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Síntese:
Sujeitos – Estados
Matérias versadas – Armistícios
Fontes predominantes – Costume; surgimento do Tratado Bilateral (na sua maioria, pois
havia uma lógica de isolacionismo como afirmação da soberania)
Após a derrota definitiva de Napoleão Bonaparte, que prolongou por 25 anos, ciclos sucessivos
de guerras de conquista na Europa27, sela-se a paz nos Tratados de Paris e de Chaumont.
O Congresso de Viena (1814-1815) é epílogo em que se aprova a Ata28 Geral do Congresso de
Viena – tratado multilateral sob a forma de declaração subscrita pela Áustria, França, Grã-
Bretanha, Portugal, Prússia, Rússia, Suécia e Espanha (em 1817).
Tratado multilateral passa a ser o instrumento privilegiado nas relações internacionais,
pois adequa-se melhor à regulação das questões de cooperação internacional no
contexto de uma comunidade internacional que alberga um número maior de Estados
e tem um leque mais alargado de interesses comuns – exigência básica da
institucionalização das relações internacionais.29
Negociações pela via informal de contactos com os representantes das potências
(Portugal tinha lá Pedro de Sousa Holstein, António Saldanha da Gama e Joaquim Lobo
da Silveira)
Anfitrião com autoridade negocial: Metternich; Mestria diplomática do representante
de França que coloca o país derrotado no grupo dos vencedores: Talleyrand
27
Portugal: 1807-1808; 1809; 1810-1811
28
= Tratado = Pacto = Estatuto = Protocolo; Acordos de Vontades -> Convenção
29
O Estado já tem perceção que há problemas que não consegue resolver sozinho e tem que cooperar
entre Estados.
30
Primeira experiência informal de uma organização internacional e primeira tentativa de instalar
comunidades europeias com projetos federalistas e pan-europeus
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Celebração de tratados para acudir aos problemas concretos e reais contribuiu para alentar a
componente positivista – reforço da corrente filosófica do positivismo de Comte e da doutrina
jusinternacionalista de filiação positivista (Holtzendorf e Bluntschli).
Nas vésperas da I Guerra Mundial, o DIP correspondia ao sistema jurídico que regulava as
relações entre Estados civilizados numa comunidade internacional insuficientemente
institucionalizada que não incluía todos e porque não admitia autoridade superior aos Estados
cuja independência era sinónimo de soberania ilimitada.
I Guerra Mundial31 leva à queda e desmembramento dos grandes impérios centrais: Alemão,
Austro-Húngaro, Otomano, Russo.
Derrota da Alemanha e perda de território + pagamento de avultadas indemnizações de
guerra aos países vencedores (vítimas de agressões da Alemanha e aliados)
Conclui-se a paz no Tratado de Versalhes (28/6/1919)
o Tem vários anexos e um deles era a concretização dum objetivo do Plano dos
Catorze Pontos (presidente Woodrow Wilson ao congresso dos EUA em 1918) –
aprovação do Pacto da Sociedade das Nações32 (em vigor a 10/1/1920
SDN já era Organização Internacional de âmbito universal e de atuação
política. Apesar de ter falhado, começou a metamorfose do DIP.
o EUA não participaram nessa Liga das Nações (pois o Senado não o ratificou) que
prometia oferecer garantias recíprocas de independência política e integridade
territorial dos grandes e pequenos Estados
o Primeira organização de segurança coletiva com vocação universal – criou a
Organização Internacional do Trabalho que ainda hoje existe como organização
especializada no sistema da ONU
31
“Guerra que acabou com a paz” – Margaret MacMillan
32
Outro anexo era o tratado que cria o Tribunal Permanente de Justiça -> Estatutos do Tribunal
Permanente de Justiça
18
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Transição dum recorte interestadual que regula relações entre Estados e interesses
dos Estados para um DIP que alarga a sua esfera de proteção à pessoa humana, na sua
dimensão individual e na sua dimensão social e coletiva
Criação Tribunal Permanente de Justiça Internacional em 1921, em Haia – percursor do
atual Tribunal Internacional de Justiça
o Esgrime conflitos entre os signatários do Pacto
Sociedade das Nações chegou a integrar 57 Estados (entre eles Portugal como membro
fundador) e teve função relevante na prevenção e solução de alguns conflitos mas, sendo uma
cooperação administrativa em que não há um papel político eficaz, não conseguiu impedir as
políticas belicistas e de agressão da Alemanha nos 6 longos anos da II Guerra Mundial em que
a barbárie ocupou o lugar do Direito.
Síntese:
Sujeitos – Estados
Matérias versadas – problemas transfronteiriços
Fontes predominantes – Tratado Multilateral; codificação do costume (influência
positivismo jurídico.
Entrada em vigor da Carta das Nações Unidas33 (24/10/1945) cria a organização internacional
como o projeto de uma nova ordem jurídica mundial com um sistema de segurança coletiva,
em que concretiza a proibição do ius belli (cap. VII sobre o Conselho de Segurança – órgão de
composição restrita e poderes inigualitários entre os membros) com poderes de autoridade
33
Tem também vários anexos sendo que um deles é a convenção que cria o Tribunal Internacional de
Justiça -> Estatutos do Tribunal Internacional de Justiça, que espelham mais DIP moderno do que
contemporâneo pois foram recuperados muitos preceitos do ETPJ
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Surge uma estrutura institucionalizada como um “governo mundial” que tem uma atuação
política (já não apenas administrativa) num âmbito muito vasto.
Não resistiu às dificuldades do antagonismo bloco de leste vs bloco ocidental – Guerra
Fria provocava uma cisão de natureza político-ideológica no seio da comunidade
internacional (refletida em momentos críticos de beligerância – ex: Guerra da Coreia,
Guerra do Vietname, crise dos mísseis de Cuba)
Recuperou o equilíbrio e desanuviou voltando a um coexistência pacífica da política –
tendo em conta outras cisões como o Norte rico e desenvolvido e o Sul pobre e
dependente dos outros países (marca histórica da desigualdade inscrita na matriz
eurocêntrica das relações internacionais)34
Com a queda do Muro de Berlim (9/11/1989), cai também a lógica tendencialmente bipolar de
afiliação dos Estados e povos.
O colapso da URSS e desagregação da Jugoslávia voltou a colocar na agenda
internacional a questão clássica das nacionalidades articulada com o principio da
autodeterminação dos povos
Na geopolítica internacional os EUA surgem como potência hegemónica que prejudicou
o multilateralismo das relações internacionais e enfraqueceu o papel da ONU – embora
tenha triunfado com a Organização Mundial do Comércio desde 1995, sendo as
negociações do Uruguay Round as maiores e mais importantes na liberalização do
comércio mundial.
34
Reação por parte da Conferência de Bandung (1955) surgindo Movimento dos Não-Alinhados (1961)
cujo objetivo fundamental era acabar com a ordem internacional da miséria através do Direito
Internacional do Desenvolvimento
20
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Os primeiros tratados de DIP contemporâneo e que dão direitos aos indivíduos são os Pactos
de Direitos Económicos Sociais e Políticos celebrados pela ONU na década de 1960.
Ainda não torna os indivíduos sujeitos de DIP e só em 2000 com o Tratado de Roma, que
aprova Estatuto do Tribunal Penal Internacional – elenca um conjunto de crimes em que
os indivíduos podem ser demandados como réus
Entra em vigor em 2002 e o indivíduo já é passível de ser sujeito de DIP à luz do ETPI
o Tribunal com estrutura permanente e diferente dos tribunais ad-hoc que antes
se experimentou (em que depois de acontecer é que se instituía uma estrutura)
Na Europa, há uma maior proteção do indivíduo como sujeito de DIP – TEDH aplica Convenção
Europeia dos Direitos do Homem – órgãos no seio do Conselho da Europa.
Multilateralidade regional com 2 orientações face às linhas de institucionalização:
I. Federalista/Supraestadual – método comunitário ou de integração; desde 1951 com a
criação do CECA -> CEE -> UE
II. Unionista/Intergovernamental – método de cooperação internacional; desde 1949
com o Conselho da Europa em que o caráter vanguardista é só na proteção do indivíduo
(aprovam CEDH e criam TEDH).
Características do ciclo:
1. Institucionalizado e Multilateral – criação de um número cada vez maior de
organizações internacionais com papel decisivo, de tipo comunitário, com participação
e colaboração dos Estados (com caráter universal ou regional). Estados assumem
obrigação de prestar contas pelo exercício das suas competências perante órgãos de
controlo político, judicial ou administrativo. Criação de tribunais internacionais
competentes para exercer poderes.
2. Democrático – oposição ao pendor oligárquico do DIP clássico e moderno; temos um
direito de base multilateral e inclusivo tendo a sociedade civil global um papel
interventivo (através de ONG) mantendo abertos canais de negociação entre os Estados
e os restantes atores internacionais.
3. Expansivo – regulamentação internacional estende-se às mais variadas áreas de
relevância jurídica transnacional verificando-se um movimento de codificação.
4. Internormativo e Prevalecente – sem prejuízo da autonomia inerente a uma ordem
jurídica própria, DIP é parte integrante destas ordens jurídicas assegurando (por
35
Jonatas Machado define como término de um período e início de outro
21
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Síntese:
Sujeitos – Estados e Organizações Internacionais
Matérias versadas – Direito Humanitário e afirmação do ius cogens (identificam-se pela
fundamentalidade material do seu conteúdo como 1) concretização do princípio da
DPH, sendo 2) princípios estruturantes em relação aos Estados): a Declaração Universal
dos Direitos do Homem surge como fonte mediata pois é ato jurídico que espelha a
36
Hoje em dia questiona-se se o princípio clássico da não ingerência nos assuntos internos dos Estados
ainda deve ser estritamente seguido. Mais do que um direito de soberania, há um dever de soberania que
se pode traduzir num dever de ingerência por razões humanitárias.
Responsability to Protect – conceito importante do DIP contemporâneo que funciona como
exceção ao princípio da não ingerência
o Comunidade Internacional intervém para proteger os cidadãos dos Estados que estão
a violar os Direitos Humanos
o DIP contemporâneo vai além do previsto no cap. VII CNU e desenvolveu “targeted
sanctions” (alvos são pessoas e congelam-se bens e etc. para limitar os sujeitos) como
resposta para os conflitos armados que ainda surgem
22
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
vontade dos Estados (AGNU não produz atos normativos embora a aderência a esses
valores possa ser considerada como costume)37
Fontes predominantes – Convenções (Tratado Multilateral): período contemporâneo
marcado por uma forte sistematização e codificação do costume – pela Comissão de
Direito Internacional (na ONU).
37
Não é tratado pois não houve vontade dos Estados se vincularem no seu exercício de ius tractum. É
apenas o ato produzido por membros de 1 órgão que por acaso representam Estados.
23
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Juridicidade do DIP
O DIP existe mesmo?
Há autores que assumem que o DIP não existe;
Marilu discorda – existe porque tem de existir: alternativa seria um não-Direito, caos e violência.
Fundamentos Teóricos
A justificação existencial encontra-se no plano filosófico.
Não se deve confundir o fundamento teórico da juridicidade do DIP e o problema relativo às
suas características de obrigatoriedade e efetividade.
Autores que negam o DIP, assumem que a existir é ius imperfectum (fundamento no
direito romano da falta de coercibilidade) – mito normativo que nos separa da
verdadeira natureza do DIP como um espaço de juridicidade.
i. Uma norma jurídica não perde sua natureza vinculativa, como fonte de direitos
e deveres, em virtude da sua violação e/ou insuficiência de mecanismos
institucionais de garantia da efetividade
ii. Coercibilidade é característica do sistema jurídico e não de cada norma ou
regime normativo que o compõe
iii. No direito Interno também há normas destituídas de sanção específica
iv. Deve-se relativizar o incumprimento das normas internacionais pois na
generalidade dos casos, as regras são respeitadas – a censura internacional
(mediática) associada à violação de normas funciona com caráter preventivo e
substitutivo da sanção coerciva (se bem que tem havido uma evolução no
sentido de instituir-se sanções contra os Estados agressores e contra indivíduos
e organizações não estaduais)
24
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Qual a relação das normas internacionais com o mundo dos valores e com o conjunto das
condicionantes sociais, políticas e conómicas?
Teorias Não voluntaristas
Teoria Normativista – Kelsen, Verdross e Kunz – proposta de modelo de compreensão
do Direito que é autorreferencial e sistematicamente autossuficiente. Assimila-se a
existência do Estado a um complexo ordenado de normas (ordenamento jurídico) pelo
que a função primordial do Estado é a unificação e aplicação do Direito, sendo que
Estado e Direito não se distinguem e a força vinculativa do Direito é a da ordenação
hierárquica das normas. Fundamento jurídico convencional é o princípio pacta sunt
servanda enquanto que o costume retira a sua obrigatoriedade de regra hipotética ou
pressuposta
Teorias Substancialistas
o Fileira sociológica: rejeita a noção dogmática e explicativa da soberania e
interpreta DIP como expressão da relação de solidariedade que se estabelece
entre os membros da sociedade internacional e que são, na sua dimensão
sociológica e biológica, os indivíduos.
o Fileira jusnaturalista: identifica DIP com o direito natural (como a escolástica
divina de S. Tomás de Aquino e a origem racional para Grócio) e adapta a outras
fontes axiomáticas de relevância omnicompreensiva de base institucionalista
(Santi Romano, Hauriou), de base objetivista (Le Fur) ou de base humanista e
personalista.
Reconduzem os fundamentos do DIP a um conjunto de valores
suprapositivos, pauta axiomática que justifica a sua autoridade e
orienta os seus conteúdos normativos – dominante na doutrina
jusinternaconalista (por cá: André Gonçalves Pereira, Fausto de
Quadros, JOMI, Jónatas Machado, Bacelar Gouveia)
Posição Marilu
Fundamento do DIP é social, contratual e racional
DIP é consequência necessária da natureza social do Homem (ubi homo, ibi societas) e
das exigências normativas, no plano organizatório e substantivo, da sociedade humana
(ubi societas, ibi ius) – negar o seu fundamento era pressupor a aceitação da
comunidade internacional como expressão de mera correlação de forças entre atores
internacionais em risco permanente de desagregação (caos ou anarquia)
25
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Funções Sociais
Sendo o estatuto jurídico da comunidade internacional, vincula os destinatários mediante vários
tipos de regras.
38
Contrato social da comunidade internacional faz abdicar da liberdade e soberania para as garantir.
26
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
27
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Fontes do DIP
Formas de criação e revelação de normas jurídicas.
É um dos critérios de identificação de uma ordem jurídica autónoma – nos diversos
sistemas jurídicos há diferentes formas de se revelar normas (a diferença surge na
relação e relativa importância de cada fonte)
O art. 38º remonta ao texto do Estatuto do Tribunal Permanente de Justiça Internacional e foi
escrito em 1920 (quadro da Sociedade das Nações)
Muitas características de DIP moderno – visão Estado-cêntrica
Não foi pensado como norma sobre normas – daí não ter o rigor técnico-jurídico que
lhe seria exigível sendo essa a função originária (que era a de ser roteiro para o juiz
aplicar normas e resolver litígios)
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Críticas:
A. Desatualização: faltam as fontes em sentido formal que são os Atos Jurídicos Unilaterais
das Organizações Internacionais com Caráter Normativo (ex: resoluções Conselho de
Segurança)
B. Falta de rigor conceptual: associação fontes formais (convenção e costume) e fontes
materiais (princípios gerais, jurisprudência e doutrina – alínea d) é apenas meio auxiliar
para aplicação imediata do Direito) + confunde “verdadeiras fontes” com “pretensas
fontes” –> ex aequo et bono, que é critério extra-jurídico, moral ou social (North Sea
Continental Shelf, TIJ, 1969)
C. Falta de rigor terminológico: anacronismo da alínea c) + alínea b) em que o costume
não é prova de nada
Marilu: Não se pode exigir mais do art. 38º do que este pode dar – é fruto de negociações e
compromissos, concluindo uma disposição de alcance geral, mas cuja relevância no respeitante
a uma teoria geral das fontes do DIP é mais indicativa que impositiva.
Irrelevância prática da classificação das fontes – pois ao intérprete é pedido que identifique a
norma positiva sobre a matéria em apreciação (de fonte convencional ou costumeira) e procure
a solução mais justa e integrada com as “tendências” (Tunísia c. Líbia, TIJ).
Fontes Tipificadas
Fontes Imediatas – fontes de normas; criam normas sendo atos gerais e abstratos
Fontes Mediatas – olham para as normas e observam a sua radiação normativa; vêm o seu
âmbito – doutrina e jurisprudência39
a) Convenção Internacional
Instrumento contratual típico do DIP.
Têm múltiplas designações em que muitas são equivalentes embora algumas sejam específicas
Concordata – acordo Santa Sé e Estado
Modus Vivendi – acordo temporário e provisório ou regime de alterações/adaptações
de tratado base (ex: protocolos adicionais à CEDH).
Convenção é o termo mais abrangente – embora é equivalente de Tratado
39
Nos sistemas de common law seria fonte imediata mas no DIP não
29
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Quanto aos efeitos, o TIJ analisa e valoriza as especificidades do caso concreto de acordo com
a natureza o ato, nos seus termos e condições em que ocorreu (Plataforma Continental do Mar
Egeu, Grécia c. Turquia, TIJ, 1978)
40
Existem instrumentos de base jurídica contratual que não são tratados, na medida em que a respetiva
base jurídica é o direito interno, ainda que aplicado num quadro de transnacionalidade.
41
Movimento codificador para se ultrapassar dúvidas
42
Na prática, há dúvidas sobre a natureza jurídica ou política de alguns dos elementos que compõe o
acordo e sobre a relevância consensual ou meramente unilateral de atos imputáveis aos Estados.
30
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Convenção tem a essência fundamental de ser um acordo vinculativo para as partes – princípio
pacta sunt servanda de origem consuetudinária e explicitado no art. 26º CVDT – é um contrato
no contexto internacional.
Figuras Afins: diferentes na sua natureza e regime jurídico – questão importante na
determinação das regras aplicáveis (qual o órgão competente do Estado para aprovar e
etc.)
o Importância crescente destas figuras contratuais atípicas devido: 1) ao peso dos
interesses económicos globais na definição de relações externas
(mercantilização das relações internacionais); 2) direito aplicável
convencionado é preferencialmente de direito privado e jurisdição interna ou
arbitral privada (privatização das relações jurídicas internacionais); 3)
complexidade técnica que alterou as circunstâncias de negociação saindo dos
tradicionais canais diplomáticos e passando por funcionários e técnicos
mandatados para celebrar acordos de natureza administrativa
(administrativização do procedimento de vinculação internacional)
Pode ocorrer entre Estados ou entre Estados e outras coletividades de direito público
internacional ou interno – decide-se expressamente aplicar o direito interno de um dos
Estados contraentes ou de um terceiro Estado.
o Outorgantes têm personalidade jurídica internacional mas agem como
contratantes privados excluindo o DIP
Pode ocorrer entre Estados e pessoas de direito privado – pode ser contrato
internacional privado que remete para o DIPrivado ou um contrato privado
internacional que define como aplicável um direito interno; pode ser também um
tratado se remeter para o DIP que é o “ordenamento regulador em bloco do acordo”
o TPJI, 1929 – qualquer contrato que não é um contrato entre Estados na sua
qualidade de sujeitos DIP é regulado pelo Direito interno dum Estado.
31
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
43
Correia Baptista: “tratado entre um Estado e uma OI que corporiza um mútuo”
44
Regimes diferentes (dos bilaterais e dos multilaterais) quanto às reservas, derrogação e suspensão por
tratados escritos, invocação de causas de invalidade ou extinção dos tratados.
32
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
b) Costume Internacional
Escola Voluntarista – Triepel, Anzilotti, Tunkin – norma só pode existir como
manifestação da vontade dos Estados: expressa num acordo e tácita se for costume.
o Fundamento do costume seria o acordo tácito – natureza próxima da
convenção e sem se poder impor a um Estado se da sua prática não se pudesse
deduzir a aceitação da regra em causa como jurídica.
Teoria do Objetor Consistente – afastar-se-ia a aceitação dum Estado se
existisse da sua parte uma oposição expressa e reiterada a essa norma
o Rejeitada pela maioria da doutrina pois 1) a norma costumeira pode vincular
um Estado mesmo na ausência da sua participação ou aceitação, 2) formação
do costume quanto ao apuramento da convicção do Estado não depende da
manifestação de vontade dos órgãos competentes, 3) costume é de aplicação
direta e imediata a todos
Escola Objetivista – Scelle, Vissgher (período entre Guerras) – costume é resposta a
necessidade social que nasce do tipo de relações existentes entre os membros da
comunidade internacional e que os leve a atuar entre si sob o império de certas regras
jurídicas de sedimentação social.
o Marilu: resposta cultural e construída – justificada por uma pauta de valores e
princípios de estruturação societária, absorvida pelo tecido social – a uma
necessidade identificada de regulação normativa
Costume subordina a vontade dos Estados e demais sujeitos
internacionais
O conjunto de normas costumeiras representa uma espécie de base ou pano de fundo sobre a
qual se desenvolvem as relações internacionais – permite a formação de um regime jurídico,
geral e uniforme, que exprime o consenso historicamente assumido pela comunidade
internacional sobre o conteúdo dos direitos e deveres dos seus membros.
Eficácia erga omnes sem procedimentos de receção ou aceitação pelos Estados
Função primordial de criação de normas
Necessita do elemento material/objetivo + elemento psicológico/subjetivo
45
Também no caso das OI há diferença: se é “sob os auspícios” da organização que promoveu e facilitou
o processo negocial, ou se é “no seio” da OI quando um dos seus órgãos elaborou projeto do tratado (art.
5º CVDT)
33
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
46
Presunção ilidível pelos próprios Estados: caso Haya de la Torre
47
Elementos objetivos de análise para a prova: prática diplomática, jurisprudência (internacional e
interna), doutrina, legislação nacional, convenções internacionais celebradas, recomendações e
declarações na AGNU, tomadas de posição e etc.
48
Com o desacordo de autores jusnaturalistas
34
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Por se positivar “prática geral”, não se exclui a existência de costumes regionais, locais e
bilaterais.
Ex1: direito asilo nos países América Latina, TIJ reconheceu costume regional ou local
(Colômbia c. Perú, 1950, TIJ)
Ex2: costume bilateral foi reconhecido no caso Portugal c. República da Índia (1960)
sobre o direito de passagem – único caso em que se reconheceu “explícito e categórico
costume formado pela prática de apenas 2 Estados e só eles vinculando”
o Alguma doutrina defende que tem uma natureza mais convencional de acordo
tácito e que no futuro se deve resolver criando obrigações jurídicas recíprocas
através de atos unilaterais.
35
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Prática dos Estados e jurisprudência invocam, amiúde, os princípios gerais reconhecidos pelo
DIP – 1970, Resolução 2625 da AGNU, Declaração de princípios de DIP que devem reger as
relações de amizade e de cooperação entre os Estados em conformidade com a Carta.
Princípios Aplicáveis: generalidade pressupõe que sejam comuns, sem exigir a universalidade.
Conclusão favorável ao caráter geral depende das circunstâncias do caso concreto e da
apreciação do tribunal internacional sobre o elemento relevante de conexão ou de analogia com
o direito interno.
TJUE considera como princípios gerais os comuns à generalidade dos Estados-membros
e outros que, não sendo comuns, se afiguram mais adequados a dirimir o litígio em torno
da aplicação das normas eurocomunitárias, sendo compatíveis com o “quadro e
estrutura dos objetivos da Comunidade” (Acórdão TJ, 1970) – adequação funcional.
49
Que desconstrói o princípio da não ingerência vestefaliano
36
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
d) Jurisprudência e Doutrina
Considerados meios auxiliares pois não criam novas normas e cabe-lhes propor uma abordagem
das normas.
Jurisprudência – sentenças e decisões judiciais têm valor obrigatório inter partes (art. 59º ETIJ
+ art. 94º CNU).
Princípio do precedente jurisprudencial – não é reconhecido no DIP e a jurisprudência
configura-se um precedente atípico, passível de invocação mas apenas como
manifestação de determinada interpretação de norma convencional ou
reconhecimento de princípio jurídico geral (TIJ cita frequentemente sentenças e
pareceres proferidos no sentido de jurisprudência constante – aplicada e uniforme)
o Sem prejuízo do efeito relativo ao caso, afeta a situação jurídica de outros
Estados.
Áreas recentes – lugar decisivo, substituindo em certa medida a falta de acordo entre
os Estados para avançar com novos instrumentos normativos. Ex: Órgão de Resolução
de Litígios no seio da OMC; jurisprudência europeia na proteção de direitos
fundamentais em que o papel do juiz pode ter um alcance inovador (quase equivalente
à função normativa) na determinação e interpretação da norma.
Abrange também a jurisprudência dos tribunais nacionais – atendível na prática
estadual a considerar para a formação de norma costumeira.
Além da jurisdição dos processos contenciosos, o TIJ também tem a função de dar pareceres
consultivos – art. 65º ETIJ + art. 96º CNU.
37
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Doutrina – no final do séc. XIX eram frequentes as remissões para as obras dos juspublicistas
clássicos do séc. XVII e XVIII; nos dias de hoje o desenvolvimento jurisprudencial do DIP limitou
a necessidade e conveniência de procurar amparo na doutrina consagrada e reverenciada50.
Função apreciável no respeitante à interpretação e determinação de estratégias de
prevalência da norma internacional:
o Declarações de voto dos juízes publicadas junto das decisões judiciais
o Trabalhos Comissão Desenvolvimento de Direito Internacional: órgão auxiliar da
AGNU com tarefa de estudo, codificação e preparação de projetos de
convenções
o Trabalhos Institut de Droit International + International Law Association +
Instituto Hispano-Luso-Americano de Derecho Internacional: associações
criadas para estudo e divulgação do DIP, desenvolvendo o DIP e cujas
considerações são ponderadas no iter argumentativo das instâncias judiciais
internacionais
o Conclusões fundamentadas dos advogados-gerais no TJUE: intervêm no
processo como jurisconsultos e o seu contributo doutrinário também se
estende ao DIP. Ex: Conclusões Advogado-Geral Yves Bot, 2013
Princípio ex aequo et bono – as partes escolhem que o juiz não julgue pela regra escrita e sim
pelo critério do que é igual e bom, critérios pessoais de avaliação e eventualmente
extrajurídicos para se determinar a solução mais justa.
Nunca foi celebrado um acordo destes no TIJ (nem no antecedente TPJI)51 – Correia
Baptista: óbito por desuso da norma; Marilu: a mera ausência de prática não é
suficiente para ditar a extinção da norma convencional cujo fundamento é vontade
pactícia dos Estados.
≠ Princípios Equitativos: critério geral de aplicação do Direito para uma solução justa e
equilibrada, segundo o “prudente arbítrio” do juiz orientado por critérios de
razoabilidade, temperança e boa fé, num terreno impreciso de “margem de apreciação
livre”. Caso Plataforma Continental do Norte, sobre delimitação marítima, juiz recorre à
ideia de equidade para amparar a flexibilidade dos critérios objetivos – equidade infra
legem – não é a equidade como representação da justiça abstrata, mas a aplicação da
regra jurídica que postula o recurso aos princípios equitativos
o Equidade, sob a forma de princípios equitativos, é vinculativa no DIP como
princípio geral de Direito (Plataforma Continental Tunísia c. Líbia, 1982, TIJ)
50
Muito raro de acontecer – em 139 decisões até 2012, TIJ mencionou doutrina em 22 delas que eram
essencialmente remissivas para o CDI, Institu de Droit International e International Law Association. É
frequente nas opiniões individuais dos juízes.
Ex: El Salvador c. Honduras, 1992, TIJ; referiu a obra de Vallejo, Oppenheim, Gidel
51
Embora a equidade seja frequente nos “contratos internacionais” entre Estados e empresas
estrangeiras sendo os poderes de eventuais tribunais arbitrais
38
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Jurisprudência reconheceu que declarações feitas pelas autoridades dum Estado podem criar,
em certas condições, obrigações jurídicas para esse Estado – caso Ensaios Nucleares, as
declarações das autoridades francesas pelo Presidente e MNE eram vinculativas para a França
(Austrália c. França, 1974, TIJ) – favorabilidade à relevância jurídica vinculativa da declaração
unilateral em que há presunção de vinculatividade, como ato de Estado quando feito por um
representante internacional de altas funções do Estado.
Efeitos jurídicos podem resultar de atos unilaterais com base em norma internacional (externos
ou internacionais, ex: reconhecimento, protesto) ou de atos unilaterais internos (adotados
pelos órgãos de soberania competentes com projeção internacional).
O ato jurídico unilateral pode integrar um processo de formação de outro ato jurídico
internacional (não autónomo – sujeitos ao regime aplicável ao ato subordinante) ou não
(autónomo).
52
Pode também ser o indivíduo no quadro do processo de investigação e de acusação de crimes
internacionais
39
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
O âmbito dos poderes de cada OI e a forma de os exercer dependem das regras inscritas no
pacto fundacional.
Caso de omissão: recorre-se aos poderes implícitos e à prática institucional reconhecida.
Modelo CNU.
o Em alternativa: Comunidades Europeias -> UE
No exercício das competências atribuídas pelos tratados institutivos, OI’s exercem função
normativa direta em que os seus atos são obrigatórios, criando direitos e obrigações na esfera
jurídica de um conjunto plural e aberto de destinatários.
I. Atos de regulação da vida interna – destinatários são os próprios órgãos e funcionários
II. Atos de natureza mista – orçamentos
III. Atos de incidência externa – destinatários são os Estados membros, outras OI’s e
eventualmente Estados não membros (art. 2º/6 CNU)
a. ONU tem poder (art. 2º/6 + art. 25º CNU) de obrigar os estados não membros a
aceitar as decisões do Conselho de Segurança em matéria de segurança coletiva.
Ex: Resolução 1373 (2001) sobre terrorismo internacional; Resolução 1540 (2004) sobre
proliferação de armas de destruição maciça
b. As agências especializadas que integram o sistema de governação multilateral e
parauniversal da ONU são detentoras de poderes de regulação jurídica
internacional (OACI, OMM)
i. Tratados institutivos reconhecem a estas instâncias internacionais os
poderes normativos de limitação da competência soberana dos
Estados, introduzindo mecanismos de salvaguarda:
1. Permitem aos Estados, manifestando essa vontade, ficar fora
do sistema regulado (opting out system) ou garantir que as
regras não lhe são aplicáveis (contracting out system) –
modalidades de combinar poder normativo da OI com a
soberania dos Estados-membros.
Resoluções de âmbito geral das OI não têm eficácia jurídica direta, mas, dependendo do que
está em causa, pode ser muito mais que um mero ato político (como resoluções AGNU).
Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), 1948, resolução codificadora de
direito costumeiro
Resoluções interpretativas da Carta, votadas por maiorias esmagadoras, exprimem o
acordo dos Estados em torno de uma determinada interpretação que se torna
obrigatória – Resolução 2625, 1970
Reconhecimento constitutivo de direitos e obrigações por parte da comunidade
internacional – Resolução XV, 1960, “Magna Carta da Descolonização”
53
Desde decisões (art. 18º CNU sobre AG; art. 25º a 27 sobre CS), recomendações (art. 13º CNU, sobre
AG, art. 36º sobre CS) e resoluções (maior parte dos atos – forma típica dos atos normativos com
preâmbulo dispositivo – pode ou não ter natureza vinculativa)
40
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Simples resolução implica o dever genérico da boa fé aos Estados que os obriga a
examinar e considerar o ato adotado pela OI que integram e com a qual devem
cooperar
Resoluções de conteúdo programático e prospetivo que podem antecipar ou anunciar
futuras normas internacionais54
CDI identificou princípios orientadores aplicáveis à forma, interpretação e eficácia dos atos
unilaterais dos Estados.
54
Doutrina anglófona interpreta como “soft law”
41
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Princípio da boa fé: surge o caráter obrigatório das declarações unilaterais em que se
pode exigir do Estado o cumprimento das obrigações decorrentes da declaração
Qualquer Estado tem capacidade de assumir obrigações jurídicas através de
declarações unilaterais
Determinação do âmbito jurídico depende do conteúdo, circunstâncias e reações
Deve emanar de autoridade interna competente, em virtude da função que exerce ou
do mandato especial que lhe foi conferido
Forma escrita ou oral
Destinatário pode ser comunidade internacional no seu conjunto, um Estado ou vários
e outros sujeitos internacionais
Cria obrigações para o Estado se tiver sido formulada com objeto claro e preciso:
interpretação deve ser restritiva sobre o alcance impositivo da declaração
Também se identificaram limites:
Nula se contrária a ius cogens
Não gera obrigações para outros Estados, salvo se existir, da parte deles, declaração de
aceitação clara.
Não pode ser arbitrariamente revogada pelo Estado declarante (se gerar obrigações)
55
Não se pode “querer sol na eira e chuva no nabal”
42
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Soft Law
Conceito versátil e elástico de manifestação de normatividade em áreas jurídicas em que a
formação da norma é mais difícil e a qualificação de eficácia normativa não é fácil.
Não é inteiramente vinculativo – compreende vasto leque de situações (desde
resoluções de órgãos deliberativos, declarações, acordos políticos, guidelines,
declarações de princípio) o que justifica um tratamento equivalente de quase-direito.
o As normas programáticas ou de conteúdo impreciso previstas num tratado ou
em qualquer tipo de suporte jurídico são vinculativas pelo que não são regras
de soft law – o enunciado genérico e programático (ex: normas direitos
humanos, económicos e sociais) não altera a natureza e função de norma
jurídica
Acelera e favorece o potencial normativo das “efetividades em ação” que poem em
marcha um processo de divulgação e de reiteração de um projeto normativo.
A orientação programática do soft law faz com que os sujeitos DIP assumam um
compromisso que os une a esse conjunto de objetivos
o Há casos de normas precisas constantes de atos que não serão vinculativos56 –
mas há presunção do valor normativo e da inerente eficácia jurídica (apenas
cede se se demonstrar que não era essa a vontade do autor do ato)
56
Ex: Cimeira de Paris – não foi verdadeiro acordo e sim compromisso com diretrizes programáticas (a
serem concretizadas por acordos específicos.
57
Se bem que já no Congresso de Viena de 1815 se regulou o regime de navegação dos rios internacionais,
proibição da escravatura e estatuto dos regulamentos diplomáticos – empenho codificador por parte de
instituições científicas desde 1873.
43
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Em 1949, CDI definiu na sua primeira sessão um plano de trabalho sobre 14 pontos que os
cumpriu quase por inteiro, elaborando ainda projetos sobre outros tópico – é difícil encontrar
um tema no DIP que ainda não tenha sido objeto de trabalho pela CDI (omnipresença jurídico-
científica)
Contribuiu para elaboração de importantes convenções: CVDT-I e II, Convenções ONU
sobre direito do mar que precederam Convenção de Montego Bay.
Nem sempre a preparação e celebração de convenções multilaterais tem finalidade de
codificação do costume – pode ser por exigências de regulação, promovendo
negociação sobre regras novas. Ex: 1967 com o Estatuto jurídico do espaço extra-
atmosférico; hoje fala-se na regulação da Internet cuja iniciativa de negociação devia
partir da ONU
Em caso de conflito de normas não podemos recorrer ao critério hierárquico, nem ao funcional
e sim recorremos ao critério cronológico.
Só não funciona se o costume for expressão de ius cogens, pois as normas nesse caso
são valorativamente superiores, tendo uma autoridade impositiva independente da
fonte formal.
58
Princípios prevalecem hierarquicamente sobre as regras – princípios não se derrogam e coexistem
mutuamente (em concordância prática); as regras podem derrogar-se e há situações que resolvem o
conflito positivo de regras.
59
Ex: interdição da agressão entre Estados, proibição da escravatura e etc. – regras fundamentais de
direito internacional humanitário e regras na relação entre Estados
44
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Art. 53º CVDT determina a nulidade para tratado incompatível, paralisando efeitos de
qualquer norma contrária
É limite absoluto à vontade soberana dos Estados e ao livre arbítrio de outros sujeitos
DIP, incluindo os sujeitos
Jurisprudência tem recorrido a conceitos próximos – embora TPI integrou na sua
fundamentação para a ex-Jugoslávia o caráter expresso de ius cogens da proibição da
tortura; alargando também ao genocídio mas ficando-se por aí
Prevalência hierárquica depende da importância do seu conteúdo e da aceitação
universal da sua superioridade
o Corrente Formalista – exige acordo de todos os Estados
o Outra doutrina – é suficiente a aceitação por maioria expressiva de Estados
2. Âmbito das obrigações jurídicas – decorrentes de normas imperativas de DIP, sendo erga
omnes (podem não resultar necessariamente de ius cogens)
Obrigações erga omnes – perante todos; obrigações da comunidade internacional no
seu todo e que prevalecem sobre as demais obrigações e direitos embora com limites
(Timor-Leste, TIJ, 1950); integram as “normas fundamentais” garantidoras da existência
normativa da comunidade internacional60
Obrigações omnium – de todos
3. Determinação pactícia – art. 103º CNU estabelece primado da Carta sobre outras obrigações
de fonte convencional e admite-se que possam mesmo prevalecer sobre normas costumeiras,
com exceção do ius cogens61.
Aplica-se às decisões da Carta, decisões vinculativas CS e ao direito formado com base
na CNU – alargando a Estados membros e não-membros. Ex: prevalência DUE, art. 351º
TFUE – funciona impedindo os Estados de aplicar normas internas ou internacionais
contrárias a DUE; isto resulta de construção jurisprudencial TJUE e Declaração 17 anexa
a Tratado de Lisboa
60
Havendo ainda uma dissociação entre a natureza imperativa da norma e o caráter facultativo do
controlo jurisdicional, o que resulta na inexistência de mecanismo judicial ou equivalente de tutela em
caso de violação.
61
Tribunal de Primeira Instância da UE/ Tribunal Geral, 2005: “ius cogens é entendido como uma ordem
pública internacional que se impõe a todos os sujeitos de DIP, incluindo instâncias da ONU, o qual não é
possível derrogar”.
45
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Nascimento
Art. 6º CVDT – todo e qualquer Estado tem capacidade para celebrar tratados, dado possuir ius
tractuum como elemento da sua soberania – o titular deste poder é o Estado soberano62 que o
exerce de forma livre, limitado apenas pelo DIP e Direito Interno.
Representação na negociação (art. 7º) -> 1. plenipotenciário com carta de plenos poderes (art.
2º/1/c); 2. estatuto de representante presumido em virtude das funções que exerce:
Chefe de Estado, chefe de Governo, MNE – podem praticar todos os atos relativos à
conclusão de um tratado
Chefes de missão diplomática – podem praticar atos para a adoção do texto de um
tratado (entre Estado acreditante e Estado recetor)
Representantes acreditados dos Estados – podem praticar atos para a adoção de um
texto
62
Eventuais Estados não-soberanos (federados) participarão dependentemente da previsão da
Constituição do Estado.
63
Reuter distingue quatro tipo de tratados com base no critério procedimental: bilateral de procedimento
longo, de procedimento curto, por troca de cartas e multilaterais de procedimento longo e curto
46
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
2. Adoção do Texto significa a sua redação definitiva, que exige muitos cuidados e todos os
Estados (art. 9º/1) devem participar na elaboração do texto e no caso de conferência
internacional, CVDT prevê maioria 2/3 dos Estados presentes e votantes salvo se aplicar regra
diferente (art. 9º/2)
3. Autenticação do Texto é o reconhecimento como verdadeiro e definitivo. Tem 3
modalidades possíveis (art. 10º/b):
Assinatura – pode também ter efeitos de vinculação nos acordos ultrassimplificados
(art. 12º), o que é proibido pela CRP
Assinatura ad referendum e Rubrica – efeito de autenticação é provisório, exigindo
confirmação órgão estadual
No seio de OI, há distinção entre os plenos poderes para negociar e o mandato para assinar –
pois são competências atribuídas a órgãos diferentes64 (art. 7º/3)
Tratados multilaterais tem vários instrumentos negociados e reunidos na Ata ou Ato Final.
Depois de autenticado o texto só poderá ser modificado por acordo das partes ou por erro e
gralha (art. 79º)
Manifestação de Consentimento
Antecede o nascimento do tratado – o acordo tem de ser manifestado de modo juridicamente
adequado, seguindo a regra da escolha livre65.
Depende das cláusulas constitucionais e das regras previstas nos tratados institutivos das OI.
Assinatura – nos acordos simplificados pode vincular o Estado.
Ratificação – ato através do qual a autoridade do Estado que é titular de competência
de conclusão de tratados manifesta, de modo solene, que o Estado se considera
vinculado e se compromete, nos termos do princípio pacta sunt servanda, a dar
execução ao tratado.66
Ato de confirmação formal – caso das OI (art. 11º/2 CVDT-II)
64
Como no caso da UE em que a negociação pertence à Comissão mediante autorização e diretrizes do
Conselho (art. 218º TFUE)
65
Podendo adotar a forma de: assinatura, troca de instrumentos constitutivos dum tratado, ratificação,
aceitação, aprovação, adesão.
66
Expressão da vontade soberana dos Estados – que é livre exceto se houver pacto ou referendo interno
que obrigasse
47
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Reservas
Art. 19º a 23º - é uma declaração unilateral, feita no momento da vinculação, pela qual o Estado
manifesta a vontade de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado
na sua aplicação a esse Estado.68
Só faz sentido em acordos multilaterais (inviabilizaria um bilateral)
1. Admissibilidade da reserva – depende de previsão do próprio tratado, de modo expresso ou
implícito (art. 19º)69, estando sujeita a limites
Limites materiais: enunciação expressa pelo tratado que proíbe a reserva em relação a
certas disposições ou implicitamente quando a reserva é incompatível com o objeto e
fim do tratado.
o Consequência – ineficácia/nulidade da reserva no caso de pretender excluir ou
modificar alcance inderrogável de ius cogens ou sobre matéria regulada por
norma imperativa
o No caso de se codificar regras costumeiras deve-se questionar o fundamento e
não aceitar no caso de normas garantidoras de ius cogens70
Limites temporais: deve ser comunicada durante o processo de conclusão do tratado
(momento da assinatura, ratificação, aceitação ou aprovação).
o Após a conclusão, Estado só poderá limitar invocando art. 46º
Limites procedimentais: exige-se forma escrita e comunicação por escrito aos Estados
Contratantes e outros que possam vir a ser parte (art. 23º).
o Se tratado autoriza reserva – não precisa ser aceite pelos outros (salvo exceções
art. 20º/1)
o Se não autorizar – declaração unilateral tem efeitos dependente da expressão
de vontade das restantes partes.
o Art. 20º/5 – relevância jurídica do silêncio, em que a reserva é considerada
aceite por um Estado quando não formulou objeção à reserva em 12 meses
o No caso de OI, reserva exige aceitação dos órgãos competentes dessa
organização.
2. Efeito das reservas – dependem da reação dos outros Estados; sendo apenas juridicamente
relevante se for aceite pelo menos por 1 Estado Contratante (art. 20º/4/c)
São relativos/relacionais porque apenas se projetam na relação entre o Estado autor
da reserva e os Estados que a aceitaram ou rejeitaram (art. 21º/2)
67
Como no caso da UE tem havido cláusulas de opt-out.
68
É ato unilateral em que um Estado clama para si um regime de exceção face ao regime geral. Mecanismo
em que tratado tem regras que valem para todas as partes menos para uma.
Art. 2º/d CVDT – reserva não é ato jurídico unilateral NORMATIVO, pois não cria direitos nem vinculações
diretas (já que exige a aceitação da contraparte, ou a sua não objeção)
69
Tem havido uma evolução no sentido de flexibilizar e admitir o regime aplicável às reservas.
70
Na Europa, CEDH autoriza reservas no art. 57º mas proíbe reservas de caráter geral
48
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Aceitando, o Tratado funciona na medida do previsto por essa reserva, excluindo a aplicação de
uma parte desse tratado – não podendo exigir ao Estado com reserva o cumprimento das
obrigações inerentes ao regime jurídico afastado.
Se objeção foi acompanhada por manifestação inequívoca de vontade contrária à
entrada em vigor do tratado, o tratado não se aplicará nas relações entre os dois Estados
(art. 20º/4/b)
Se objeção não for interpretada no sentido de oposição à vigência do tratado, este
aplica-se na relação entre ambos os Estados, salvo na parte prevista na reserva (art.
21º/3)
3. Reservas e figuras afins – como as cláusulas de opt out; declarações interpretativas que
precisa ou clarifica o sentido ou alcance ou fazem depender o seu consentimento da aceitação
de uma interpretação específica sobre o tratado ou algumas das suas disposições (reserva
imperfeita que se transforma numa reserva verdadeira se prevalecer a interpretação que o
Estado declarante não pretende aceitar).
Reservas facilitam o processo de ratificação e potenciam a aceitação por um número
mais alargado de Estados – aprovando regimes jurídicos mais exigentes e avançados –
mas pode levar a um efeito de fragmentação do regime jurídico definido pelo tratado.
Estado autor da reserva pode retirá-la a todo o tempo (art. 22º)
Entrada em Vigor
Momento é definido pelo próprio tratado ou em acordo ad-hoc (art. 24º/1).
Na ausência de determinação específica, entra em vigor depois da ratificação de todos
os Estados que tenham participado na negociação (art. 24º/2)
Para um Estado que adere a um tratado que já está em vigor, a data de início de vigência é a
data que ocorreu ato de consentimento (art. 24º/3)
Aplicação a título provisório (art. 25º), incompatibilidade com procedimentos internos devido à
urgência – pelo que o tratado produz efeitos antes da sua entrada em vigor. CRP proíbe (art.
8º/2 CRP)71
71
No entanto, a oposição expressa do representante português pode não ser suficiente para impedir a
aplicação provisória se esta resultar de disposição transitória do próprio tratado, adotado por maioria de
2/3 (art. 9º/2 + art. 24º/4)
49
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Vida do Tratado
Assim que nascem, as convenções estão sujeitas ao Princípio Pacta Sunt Servanda (art. 26º
CVDT)
Princípio geral de DIP que enquadra e comanda todos os tratados numa conduta
pautada pela boa fé em que as partes cumprem as obrigações inerentes ao
compromisso pactício.
o Não se pode invocar o direito interno para se descartar das obrigações
convencionais – art. 27º CVDT
Art. 46º - Ratificações Imperfeitas – mitiga o princípio geral do art. 27º;
preenchidas as duas condições (violação notória de normas internas e
de importância fundamental) não se verifica necessariamente a
nulidade e pode ser a mera ineficácia ou inaplicabilidade.
Efeitos do tratado repercutem-se sob a forma de direitos e obrigações na esfera jurídica das
partes contratantes a partir dos critérios:
I. Temporal – regra da não retroatividade do acordo, salvo por vontade das partes (art.
28º CVDT)
II. Espacial – obrigatoriedade estende-se à totalidade do território das partes, salvo se
outra regra for ressalvada (art. 29º CVDT)
III. Material – é autónomo e autossuficiente, mas não impede os “tratados sucessivos”
(existência de regimes internacionais sobre a mesma matéria em momentos diferentes
e com soluções distintas); prevalência CNU (art. 103º CNU) e art. 30º CVDT estipula
regras de resolução de conflitos de tratados sucessivos incompatíveis
a. Mesma identidade das partes: prevalece tratado posterior, salvo se não houver
relação antónima ou incompatível (art. 30º/3)
b. Não há identidade das partes: nas partes comuns prevalece o posterior; se uma
das partes está num tratado e outra está noutro, para esses Estados resultam
direitos e obrigações ao abrigo do qual ambos fazem parte
72
Exigência dada pelo art. 102º/1 CNU – A ONU assegura a publicação de uma coletânea oficial de tratados
50
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
O dever de considerar acordos e prática posteriores ao acordo (art. 31º/3 CVDT) remete para
uma visão dinâmica do texto em conformidade com a vontade atualizada das partes, tendo
por referência o momento da interpretação (parecer TIJ, 1971).
Relevância do princípio da integração sistémica – de normas convencionais ou
costumeiras aplicáveis inter partes.
O que não deve ser tratado como exceção ao princípio do efeito relativo:
1. Cláusula da nação mais favorecida – comum em tratados comerciais e aduaneiros em
que a aplicação das vantagens preferenciais resulta de disposição convencional entre 2
partes, não se desviando ao consentimento de 3º
2. Sucessão de Estados em matéria de tratados – convenção própria que procurou conciliar
princípios; CVDT tem duas soluções (tábua rasa do art. 16º e vinculação do sucessor no
art. 31º/1 – aqui não há exceção pois o Estado sucessor não deve ser considerado
terceiro)
3. Tratados sobre direitos humanos – criam direitos para os cidadãos nacionais dos
Estados, que os podem invocar em tribunais domésticos ou internacionais criados para
tal efeito; é apenas instrumento de garantia da aplicação efetiva e refere-se ao elenco
dos destinatários das normas.
73
Não sendo consensual na doutrina o valor dos trabalhos preparatórios; TIJ admite necessidade de os
analisar
74
Epítome é a Europa: TJUE, devido ao princípio fundamental da equivalência das línguas nacionais como
corolário do respeito pela igualdade dos Estados-membros, prefere soluções sistemáticas e finalísticas
com um método de conciliação linguística – interpretação é o que o autor pretendia com base na versão
em todas as línguas (TJCE, 1969)
75
Quando há direitos e obrigações -> Marilu: deve exigir-se manifestação escrita
51
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Revisão
Art. 39º - é positivação de regra costumeira do princípio geral que a revisão é por acordo das
partes.
Revisão pode ser adotada por acordo entre a maioria dos Estados partes, mesmo que tratado
inicial tenha sido aprovado por unanimidade – acordo de revisão só aplicável entre os Estados
que o ratificaram
Como ficam as relações bilaterais dum Estado com revisão e doutro sem? Soluções no
art. 21º, 30º/4/b e 40º/4 CVDT.
Modificação
Pode também haver modificação implícita sem revisão – resulta de prática subsequente dos
Estados ou da superveniência de novas regras DIP
Prática ulterior de eficácia modificativa de regras convencionais: caso do art. 27º CNU
(valor da abstenção)
Via consuetudinária forma-se nova regra DIP que muda a aceção dos termos
o Permite a maior adaptação do tratado, cuja revisão seria muito difícil em certos
tratados.
o Modificação informal acarreta riscos de incerteza.
52
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Causas da invalidade estão enumeradas e tipificadas pela CVDT (art. 46º a 53º)
7 referem-se a vícios de consentimento e a última a uma violação de norma substantiva
e imperativa de direito internacional geral
2 modalidades78:
1. Nulidade relativa – causa da invalidade só pode ser invocada pela parte cujo
consentimento foi manifestado ou obtido de modo contrário ao DIP – vício sanável (art.
45º) que não afeta vigência de tratado multilateral
a. Violação de disposições de direito quanto à competência para concluir tratados
(art. 46º)
b. Restrição específica dos poderes de manifestação do consentimento – apenas
invocável se a restrição em causa tiver sido notificada aos outros Estados que
participam na negociação (art. 47º)
c. Erro relativo ao conteúdo79 sendo base essencial do consentimento (art. 48º)
d. Dolo de uma das partes da negociação (art. 48º)
e. Corrupção do representante (art. 50º)
2. Nulidade absoluta – pode ser invocado a qualquer altura pelo Estado prejudicado, por
qualquer parte no tratado e por Estados ou entidades (como um Tribunal internacional)
que não estão vinculadas ao tratado (mas que exercem direito de proteção de interesses
públicos internacionais) – vício não é sanável (art. 45º exclui os art. 51º a 53º) e há
proibição da divisibilidade do tratado (art. 44º/5)
a. Coação sobre representante de um Estado (art. 51º)
76
Consequência do princípio do estoppel
77
No entanto, alguns atos praticados e efeitos produzidos poderão ser mantidos – art. 69º e 71º
78
Marilu: Não excluindo o desvalor máximo da inexistência jurídica, aplicável a casos em que o
representante era intelectualmente incapacitado
79
Os de redação são no art. 79º
53
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
b. Coação sobre um Estado com ameaça do emprego da força (art. 52º), podendo
esta coação ilícita ser estendida a situações que não só a ameaça militar
(também pode ser a económica80)
c. Violação de ius cogens originária (art. 53º)
Violação de ius cogens superveniente, com introdução de nova norma (art. 64º
- estende o regime da nulidade a um momento posterior, sendo que as partes
têm de ponderar o que podem manter ou não pelo art. 71º, que contraria art.
44º/5 e parece admitir divisibilidade)
Desuso – a violação do tratado por prática continuada e reiterada pode ditar a sua extinção com
a consequente substituição pela norma resultante do costume contra legem; na prática pode
também ocorrer pela sua não aplicação
CVDT não regula de modo autónomo e específico a questão das implicações da beligerância
armada na vigência e aplicação dos tratados (art. 73º a 75º)
Rutura de relações diplomáticas entre Estados não obsta a conclusão de tratados, mas,
um tratado concluído nestas circunstâncias não produz efeitos no que diz respeito às
relações diplomáticas e consulares.
80
Longa discussão doutrinária em que Marilu tem esta posição de acordo com Klabbers – não enquadram
nestas situações a pressão para o respeito dos direitos humanos (cláusula democrática)
81
Reuter: factos estranhos à vontade das partes e que a elas não podem ser imputados
82
Marilu: Que não poderia ser proibida pois tal seria contrário ao princípio da autonomia da vontade dos
Estados soberanos
54
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Efeitos da suspensão são temporários e limitados (art. 72º) – sujeitos sempre à boa fé.
Princípio da jurisdição facultativa torna impossível a exigência da arguição judicial das nulidades
e das causas de caducidade e suspensão de aplicação.
No entanto, a boa fé impõe aos Estados partes o respeito de certas regras de
procedimento – art. 65º a 67º que refletem princípios procedimentais e de direito
costumeiro baseados na boa fé (TIJ, 1997)
55
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Além dos casos expressos no art. 161º/i, há outros de reserva material de tratado?
JOMI: sim – as matérias dos art. 164º e 165º
Marilu: não – as matérias mais importantes, do art. 164º e 165º, seja sob a forma de
tratado ou de acordo são da reserva parlamentar, logo, estas matérias passam sempre
na AR e isso é que é essencial.
O Governo, como órgão responsável pela negociação internacional deve ter possibilidade,
respeitando art. 161º/i, de decidir sobre a forma de vinculação mais adequada.
Evolução tem sido no sentido de se escolher formas mais simplificadas.
o Não há risco de governamentalização pois as matérias mais importantes são de
reserva da AR.
83
Justificado pela incerteza da distinção material entre tratado e acordo.
56
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
PR não participa diretamente84 mas deve ser informado do andamento das negociações (art.
201º/1/c) – concertação entre Governo e PR (interdependência dos órgãos de soberania do art.
111º/1)
Governo tem ainda deveres de informação genérico face aos grupos parlamentares (art.
180º/2/j e 114º/3)
Incumprimento tem significado e consequência política, mas sem qualquer desvalor
jurídico
O art. 7º CVDT considera quem pode ser representante em virtude das funções que exercem
(plenos poderes funcionais).
Fora destes, qualquer um pode ser representante do Estado Português, desde que tendo
carta de plenos poderes assinada pelo PR e MNE
Regulado pela Resolução Conselho de Ministros nº 17/8885 – a decisão cabe ao PM
2. Aprovação
Art. 8º/2 CRP não permite que Portugal se vincule internacionalmente com acordos em forma
ultrassimplificada – vinculativos após assinatura do Estado.86
84
Apesar de ter um papel importante e ativo no domínio das relações externas e garante da
independência nacional (art. 120º CRP)
85
Articula-se com art. 197º/1/b; DIP: art. 10º e 11º CVDT ficando vinculado à boa fé do art 18º
Boa fé surge como uma obrigação de non facere
86
DIP admite que os Estados fiquem vinculados com a assinatura, há 3 modalidades de convenções:
1. Ultrassimplificados – CRP proíbe no art. 8º/2 que só admite 2 formas; se Portugal
internacionalmente disser que se vincula por este mecanismo há inconstitucionalidade (questão
interna que não pode ser oponível no DIP – art. 27º) e no DIP há ratificação imperfeita (art. 46º
para tratados em vigor) – art. 11º CVDT
2. Solenes – implica assinatura, aprovação e ratificação (procedimento mais exigente) – Tratado
3. Simplificados – implica assinatura e aprovação – Acordo
57
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Referendo
Pode haver referendo sobre convenções internacionais – art. 115º/3
Apenas sobre questões de relevante interesse nacional88 (com matérias do art. 115º/4
e 589 excluídas) – versa sobre matérias e não sobre a convenção no seu todo90
Acórdão TC 531/98 – exige-se objetividade, clareza, precisão e dalmaticidade
Só terá efeito juridicamente vinculativo se respeitar o art. 115º/11 – se não, pode considerar-
se politicamente indicativo – sendo que sobre o PR impende a obrigação de concluir o processo
de celebração da convenção internacional em causa.
1. Obrigação de meios a cumprir no quadro das competências constitucionais dos órgãos
vinculados, pelo que a conclusão do processo interno de ratificação não é garantia da
efetiva entrada em vigor da convenção internacional, esta dependente de fatores
ligados à vontade das outras partes contratantes
2. Observância substancial da vinculatividade do referendo, de modo que a aprovação com
a formulação de reservas e etc., não abrangidas pelo referendo, não pode servir de
pretexto para esvaziamento do resultado do referendo
3. Referendo vinculativo favorável não prejudica a competência fiscalizadora do TC91, em
sede de controlo preventivo e posteriormente em controlo sucessivo
87
Só em situações de Estado de Necessidade: como o Governo demissionário que assinou Acordo da
Troika
88
JOMI: interpretação restritiva do art. 115º/3 pois só diz respeito a tratado – ele acha que todas as
matérias de interesse nacional são reservas de tratado
89
Certos tratados sobre o orçamento podem originar referendos: caso do Tratado Orçamental, que
instituiu mecanismos de disciplina orçamental e roteiro de políticas de austeridade; em virtude do
levantamento parcial da restrição material do art. 115º/5
90
Exceção do art. 295º relativo a tratados europeus – embora interpretação restritiva do TC impediu os
referendos nos casos do Tratado de Amsterdão e da Constituição Europeia
91
Embora ele já se tenha pronunciado quando escrutinou a propósito da constitucionalidade da proposta
do referendo.
58
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
3. Ratificação e Assinatura
Ao PR compete ratificar tratados (art. 135º/b) e assinar resoluções da AR ou decretos do
Governo que aprovam acordos (art. 134º/b).
Nos ACORDOS: Decreto do Gov. e resolução da AR são, ASSINADAS pelo PR (art. 134º/1/b) –
não é o momento da vinculação, esse foi com a aprovação de Decreto ou Resolução, a assinatura
do PR vale para dar existência jurídica interna (art. 137º); porque externamente considera-se o
Estado como vinculado a partir da aprovação (art. 14º CVDT).
Nos TRATADOS: PR é politicamente livre de RATIFICAR – por razões jurídicas é obrigado a pedir
fiscalização da constitucionalidade ou fazer veto jurídico;
Assinatura é ato politicamente vinculado, não pode recusar por razões políticas, pode
apenas recusar por razões jurídicas, uma vez que a CRP, com esta exigência de
assinatura, quis que fosse o PR a garantir a constitucionalidade.
o JOMI: defende que PR pode recusar a assinatura (não estando vinculado
politicamente) se o que foi acordado lesa relevantes interesses nacionais
(porque ele é o garante da tutela do interesse nacional)
92
Mais tarde, em fiscalização sucessiva o TC pode reiterar a inconstitucionalidade e obrigar Estado
Português a desaplicar a convenção internacional, com eventual violação do art. 46º CVDT
93
Embora ele possa recusar a assinatura por motivos de discordância política o que geraria confusão
jurídica pois internacionalmente o Estado já estaria vinculado.
59
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Estes atos do PR estão ainda sujeitos a referenda ministerial (Marilu: que não pode ser recusada
porque tem natureza certificatória), sob pena de inexistência jurídica (art. 140º).
A vinculação de Portugal aos acordos ocorre quando há aprovação (no caso dos tratados, a
vinculação dá-se com a ratificação do PR) – geograficamente é em Portugal que acontece, para
ter projeção externa, tem de haver depósito ou notificação (art. 16º CVDT + art. 76º e ss CVDT)
Atos praticados por órgãos de soberania ganham projeção internacional pelo art. 16º -
quando um nº mínimo de Estados já aplicam o art. 16º entra em vigor o art. 24º.
É preciso cumprir-se art. 16º e 24º CVDT para valer a convenção em Portugal, pelo art. 8º/2.
Vinculação é diferente da entrada em vigor – art. 24º CVDT conjugando com o nº1 e nº3 pode
definir o número mínimo.
4. Publicação
Nos termos do art. 8º/2, as convenções só vigoram na ordem interna após a publicação, pelo
art. 119º/1/b (e enquanto a convenção vigorar internacionalmente).
Sem a publicação, há ineficácia jurídica da convenção (art. 119º/2)94
A denúncia/ retirada de um Estado enquanto parte contratante (art. 54º a 56º CVDT) é uma
prorrogativa de soberania dum Estado.95
Se a convenção estabelecer procedimento de desvinculação, deve articular-se regime
convencional especial e a CRP, apurando quando devem intervir os órgãos de soberania
competentes. Ex: art. 50º TUE
Governo, condutor da política externa do País (art. 182º e 201º/1/a), exerce as suas
competências de aplicação e execução das convenções que vinculam o Estado Português quanto
à cessação de vigência ou de efeitos com fundamento em causas jurídicas.
94
Ineficácia na ordem interna, podendo já vincular o Estado português a nível internacional. Caso do
Acórdão do TC 32/88
95
Mariulu: aceita-a mesmo se for proibida pelo tratado ou contrária à sua natureza; podendo haver
responsabilidade internacional do Estado por ato ilícito
60
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
96
Marilu: tem um 1 voto dentro dos 28. Se a convenção versasse sobre matérias da competência da AR,
esta deveria aprovar resoluções não vinculativas, mas que deviam ser acatadas por força do equilíbrio
institucional, para o Governo nas negociações internacionais (que deve transmitir à AR a documentação
relativa às diretrizes da negociação)
97
Marilu: princípio da cooperação leal (art. 4º/3 TUE) mas como todos os Estados são soberanos e agem
ao abrigo do DIP, podem-se vincular ou não (ratificação é livre segundo CVDT)
61
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
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Sebenta DIP – DNB 2016/2017
MONISMO
Unidade fundamental entre ordenamento internacional e ordenamento interno – com
vasos comunicantes – apesar da autonomia de cada ordenamento, eles são realidade
única.
Correntes Monistas:
o Monismo com primado do Direito Interno – afirma a falta de autonomia do
DIP, reduzindo-o à dimensão auxiliar de Direito Estadual Externo. Relevância do
DIP depende do grau de tolerância da Constituição e legislação de cada Estado.
Assenta no dogma da autoridade normativa do Estado no quadro das relações
internacionais. É contrariado pelo art. 27º CVDT.
Monismo com primado do DIP – parte importante dessas normas têm existência
objetiva e independente da vontade dos Estados. Kelsen: “primado DIP desempenha
papel decisivo na ideologia política do pacifismo”. Devido às ideias de Kelsen
prevalecem hoje as soluções de modelo moderado: Monismo moderado porque nas
eventuais situações de conflito, a garantia do primado da norma internacional,
enquanto regra preferente, é resolvida através da ineficácia da norma interna contrária
e devido ao art. 46º CVDT
o Art. 46º CVDT – vontade geral da comunidade internacional, se violada, viola o
DIP em geral
o CRP adota primado moderado (art. 8º, 277º/2, 204º)
o Art. 227º/2 – interpretação sistemática e teleológica inclui os acordos e só se
desaplica este artigo se a convenção aprovada for contrária a valores da CRP.
63
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
DIP não regula esta matéria. Galvão Teles: “Estados têm o dever de assegurar o respeito interno
pelo DIP mas é-lhes lícito, em primeiro lugar, escolher o modo de o conseguir”.
Marilu: se um Estado tiver um modelo de transformação com forte condicionalidade,
pode haver problema de violação de obrigações internacionais, gerador de
responsabilidade internacional.99
Maioria das Constituições adota modelo da receção automática – resistência, por
motivos históricos, em Itália e Reino Unido.
Qual o lugar da norma internacional na ordem jurídica interna como parte integrante do direito
aplicável?
CRP reconhece valor supralegal aos tratados, de tal modo que a norma interna de grau
infraconstitucional não a pode contrariar, alterar ou revogar – maioria dos países.
98
Pode depender de normas internas de execução. Pode surgir a dúvida se se deve apelidar de
automática, uma vez que depende de exigências como a da publicação, reciprocidade ou vinculação
internacional. Canotilho, Moreira: cláusula receção condicionada. Marilu e JOMI: não adotam pois estas
são meras condições de eficácia e nada têm a ver com a origem.
99
Ex: Reino Unido aderiu em 1951 à CEDH mas só em 1998 é que, com o Human Rights Act, a Convenção
foi integrada no ordenamento jurídico inglês.
100
Associado a outros termos como o self-executing (aplicabilidade imediata)
64
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Tendência para o “novo dualismo” no mundo aglo-saxónico em que alguns autores defendem
a soberania jurídica dos Estados que devem “filtrar” a entrada da norma internacional no
ordenamento interno.
o Argumenta-se a favor com casos como Kadi (TJUE, 2008) em que a norma
internacional é menos favorável que a interna face à proteção dos direitos
humanos.
Hoje em dia há uma vocação do DIP expansiva com ambição de regulação sobre todas as
matérias relevantes.
65
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
em que a resposta no plano nacional ou regional não seja suficiente para alcançar os
objetivos definidos pela comunidade internacional.
Art. 8º é o pórtico da CRP – no qual se garante a entrada e a eficácia das normas internacionais
e eurocomunitárias no ordenamento português.
Cláusula de Receção Plena – incorpora toda e qualquer norma, ato ou princípio de DIP e DUE
(critério da exaustividade)
Tem função supletiva.
Também se aplica a costume regional, local ou bilateral por interpretação extensiva,
teleológica e sistemática
Produz efeitos jurídicos de forma automática sem necessitar de ato expresso de
aceitação ou aprovação – vinculação imediata e transversal das entidades públicas e
das privadas101
Dá indicações para apurar a posição do DIP na estrutura escalonada da ordem jurídica
portuguesa, tal como o art. 7º/1 e 3 que prevê princípios gerais de autoridade
imperativa e art. 16º/2 em que as normas garantidoras da DUDH, dotadas de força de
ius cogens, terão relevância supraconstitucional – CRP deve ser interpretada no sentido
da conciliação prática com os valores fundamentais da comunidade internacional.
101
E em caso de conflito deverá prevalecer sobre o direito interno
66
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Nestes casos, Portugal não pode por reservas nem se desvincular (ele não é parte contratante)
– essas decisões terão de ser tomadas nos órgãos competentes da OI.
No caso dos acordos mistos há duas cláusulas de receção constitucionais distintas que devem
ser aplicadas como instrumento normativo integrado e interdependente nas soluções que
define.
Vigência interna depende da vigência no DIP em condições que vinculem o Estado Português.103
Exigência de “regularmente ratificadas ou aprovadas” deve ser interpretada
sistematicamente com o art. 277º/2 (que foi inspirado no art. 46º CVDT)
102
Há cláusulas normativas non self-executing que dependem de aprovação de regulamentação interna
para que os particulares as possam invocar
103
Se deixar de vigorar no DIP, a legislação interna adotada na sequência da celebração do tratado
continua vigente na ordem jurídica e, desligada do compromisso internacional, depende da vontade do
legislador que a pode livremente alterar ou revogar.
67
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Desconformidade à CRP tem o desvalor da ineficácia (pelo que não pode ser aplicada pelos
tribunais).
Mas, pelo art. 277º/2104, nem todas as inconstitucionais devem ser desaplicadas. Só
podem estar em causa desvios menos graves à regra da competência e à tramitação do
procedimento de vinculação internacional. Ex: aprovação de tratado pela AR por lei em
vez de resolução; aprovação pelo Governo de tratado, e não acordo, sobre matéria
compartilhada.
Desconformidade com norma legislativa resulta em ineficácia e desaplicação da norma legal
contrária ao pacto internacional.
Art. 46º CVDT: 1 – requisito formal e de competência; 2 – manifesta por outros Estados
(vítimas dessa nulidade) –“objetivamente” não necessita prova e deve ser detetável por
qualquer Estado; 3 – norma violada tem de ser de caráter jurídico-constitucional mas
doutrina exige mais que a dignidade constitucional (exige que esteja a ser violado o
equilíbrio dos órgãos de soberania no processo internacional – repartição de poderes;
tem que ser face a momento importante).
Atos normativos das OI, podem ser convenções que as próprias OI se vinculam ou atos jurídicos
unilaterais com caráter normativo – só aqueles que sejam NORMATIVOS; os atos não normativos
104
Que é extensível aos acordos, por interpretação extensiva e sistemática coerente com o art. 8º/2
68
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
das OI podem entrar no nosso ordenamento jurídico mas pelo art. 8º/1, como princípios gerais
que os Estados aceitam
Ex: “smart sanctions” (vindas do CS) seria incompatível com os direitos fundamentais da CRP e
o primado da CNU (art. 103º), não legitima a violação de princípios constitucionais basilares
que positivam direito internacional geral e imperativo (ius cogens)
“nos termos definidos pelo direito da União” é vago o suficiente para consentir primado DUE –
verdadeira cláusula europeia está no art. 7º/6.
É muito importante a imposição de limites com o “respeito pelos princípios
fundamentais do Estado de Direito Democrático”.
Primado DUE não engendra relação típica de infra e supra-ordenação entre normas –
norma eurocomunitária prevalece sobre a interna porque é materialmente competente
para regular o litígio concreto105.
o Princípio contratualista (Caso Costa c. Enel, 1964) como alicerce do primado
(pois a ideia de autolimitação interna é fundada neste princípio) não põe em
causa as Constituições dos Estados-membros.
o CRP em relação ao primado tem duplo efeito: efeito habilitador e legitimador e
efeito limitador ou de reserva.
o No domínio dos direitos fundamentais é muito residual e mesmo improvável o
risco de colisão.
Art. 53º CDFUE proíbe a interpretação das normas garantidoras no
sentido de restringir ou lesar direitos humanos mesmo que de outras
fontes. Art. 4º/2 TUE impõe à UE e aos seus tribunais o respeito pela
“identidade nacional” em que se consagram as opções constitucionais.
Na aplicação do primado TJUE tem diálogo aberto e dinâmico com os
TC e TEDH.
Não é cláusula de “suicídio constitucional”. O verdadeiro risco para a autoridade normativa das
Constituições nacionais não é a exigência e aplicação do primado DUE, mas os constrangimentos
de natureza financeira e orçamental, embora apresentados como corolário do primado e da
exigência jurídica da prevalência dos Tratados.
105
Relação DUE e Direito Interno constrói-se com base no princípio da competência atribuída e por
referência ao princípio da colaboração ou da complementaridade funcional entre ordenamentos
autónomos.
69
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Ex: Tratado Orçamental, entra pelo art. 8º/2. Não estando a regra de ouro (do limite dos 0,5%
do PIB para o défice estrutural) inscrita na CRP e não beneficiando da autoridade reforçado de
um tratado constitutivo da UE ao abrigo do art. 8º/4, é falaciosa argumentação falar da
relevância supraconstitucional ou paraconstitucional do Pacto orçamental. Não pode ser
invocado para derrogar ou suspender os direitos fundamentais ou princípios constitucionais.
Nas questões administrativas, art. 266º/2, nas referências à lei fala-se de um “bloco de
legalidade” que integra as normas eurocomunitárias.
Caso norma prevista numa instituição europeia for contrária a convenção internacional ou
decisão de OI?
Art. 8º/4 indica que a prevalência está do lado da norma eurocomunitária pois remete
para os termos definidos na ordem jurídica eurocomunitária.
o Tribunais nacionais devem garantir essa prevalência com base em norma de
DUE, paralisando a eficácia jurídica das normas DIP (o que não afetará a sua
vigência em casos futuros que não envolvam norma eurocomunitária
prevalecente).
TC deve procurar o sentido da norma constitucional que se mostre mais adequado à garantia da
eficácia plena na regra eurocomunitária – por força do art. 8º/4 e do princípio da cooperação
leal (art. 4º/3 TUE)
Cidadão pode requerer a Câmara Municipal para que ela cumpra uma diretiva da UE ainda não transferida
e com requisitos mais exigentes que os atuais?
Art. 8º/3: efeito direto (aplica-se diretamente) exceto as diretivas (art. 112º/8 – transposição
diretivas para OJ portuguesa) que em rigor não são diretamente aplicáveis. Se prazo de
transposição já passou, então a norma pode ser invocada em litígio nos tribunais (art. 266º).
Particular pode invocar, mas se não estiver transposta, a Câmara deve respeitar a lei portuguesa
Diretiva pode contrariar CRP? Podia haver diretiva para aplicação de número único contrariando art.
35º/5
Art. 8º/4 – primado DUE subordinado a EDD: princípio da separação de poderes e respeito a
direitos fundamentais tal como as CRP os prevê. Aqui não poderia acontecer essa transposição
pois viola CRP nos seus direitos fundamentais.
106
“Diálogo juiz a juiz”
70
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Sujeitos DIP
Entidades com personalidade jurídica internacional – suscetibilidade de ser titular de direitos e
sujeito a deveres, previstos e impostos pelo ordenamento jurídico internacional107.
Estado
Estado Soberano é paradigma de sujeito DIP e pode coincidir com plenitude de direitos e
deveres – na ordem internacional é o Estado soberano que beneficia de personalidade e
capacidade jurídica genérica, podendo ser titular de todos os direitos que essa ordem venha
a prever.
Sujeitos de capacidade plena – Estados Soberanos
o Plano interno: exerce poder supremo que se sobrepõe a todos os outros
poderes – surgimento histórico do Estado como afirmação face a poderes
internos concorrentes e ao externo do Papa/imperador; monopólio do exercício
da força (Weber)
o Plano internacional: Estados independentes e iguais (modelo vestefaliano)
107
JOMI: Podendo entrar em relações jurídicas sendo destinatário direto de normas.
108
JOMI: Acrescenta-se novo direito aos Estados que é o da reclamação ou impugnação
internacional, destinado à defesa dos interesses dos Estados perante os órgãos políticos e
jurisdicionais de entidades internacionais.
71
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Reconhecimento do Estado
Como sabemos se um Estado existe? Qualidade de Estadualidade (statehood)
Reconhecimento – ato jurídico unilateral em que um sujeito de DIP constata a existência de
determinada situação suscetível de produzir efeitos jurídicos e afirma-a como conforme ao
Direito.
Pode ter natureza Constitutiva ou Declarativa:
Constitutiva – O reconhecimento dá ao Estado a qualidade de sujeito de DIP, eventos
anteriores são irrelevantes
Declarativa – Estado existiria desde que efetivamente se achassem reunidas as suas
condições de existência sendo que se limitaria a verificá-las, havendo efeitos retroativos
109
JOMI: Regiões autónomas e seus poderes internacionais: poderes de prossecução (art.
227º/1/s, t, u, x) que são significativos mas que não tornam as regiões autónomas sujeitos de DIP.
Cooperam com entidades também desprovidas de personalidade jurídica internacional
110
Se não há delegação de competências são só pequenos Estados são soberanos
111
Que, como as Pró-Estatais, são sujeitos de DIP
72
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Marilu: Tese da Legitimidade tem subjacente uma utopia nas relações internacionais (que se
deveriam basear em valores éticos e humanitários – cumprimento dum mínimo ético em que se
cumprem regras fundamentais do direito dos povos) e a Tese da Efetividade assenta no
realpolitik, em que não importa tecer juízo sobre se é legítimo ou sobre a natureza do
regime em apreço
112
Daí muitos questionarem se Vaticano é verdadeiro Estado, pois não tem um povo (e até não se
reproduz)
73
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Organizações Internacionais
Sujeito de DIP sem base estatal.
Capacidade Jurídica Plena está limitada pelos Tratados Institutivos – só podem fazer o que está
no pacto constitutivo (limitação da sua natureza).
Indivíduo
Indivíduos sempre tiveram relevância jurídica, que não equivale a personalidade jurídica.
Para que tenha personalidade jurídica internacional tem que ser destinatário de
normas de DIP e poder relacionar-se com os outros sujeitos de DIP
estabelecendo-se direitos e deveres.
Desde DUDH, 1948, reconhecimento expresso da DPH – individuo ganhou dimensão que o
conduziu a ser sujeito ativo de DIP;
Abandonando princípio da proteção diplomática (em que o Estado se compromete a
proteger os seus cidadãos nos outros Estados) – não como dever, mas como
prorrogativa/faculdade pois só o fazem na medida que o queiram ou possam fazer
(depende das Constituições internas).
o DIP Clássico: proteção ao indivíduo era como sujeito passivo e dependia do que
o Estado podia fazer e o que os outros deixavam fazer.
A partir de 1948 o Indivíduo torna-se:
Sujeito de direitos
Com projeção da sua esfera jurídica a nível internacional
74
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Sujeito a deveres (daí surge TPI, com tipificação de crimes – deveres de não adotar
certas condutas)
Possibilidade de invocar esses direitos (acesso à justiça)
o Evolução no sentido de se criar comités (órgãos administrativos que servem para
receber queixas dos particulares e depois fazerem recomendações aos Estados,
que as analisam)
o Direito de acesso aos tribunais existe mais a nível regional – TEDH, TJUE e etc
onde já fora dos tribunais internos conseguem fazer valer a sua voz.
Organizações Internacionais
São pessoas coletivas de DIP113.
Elemento material/substrato é o agrupamento de Estados e, eventualmente, de outros sujeitos
Congregação de Estados ou outras entidades de DIP – depende do tratado institutivo
Elemento formal é a personalidade jurídica internacional conferida pelo tratado institutivo).
Criadas por tratado (ou outro instrumento de relevância no DIP) – estabelece os fins e
os meios da OI, relações com membros e outros sujeitos de DIP, âmbito geográfico,
caráter aberto ou fechado, sistema de órgãos e respetivas competências e formas de
agir
o Criadas para prosseguir objetivos comuns (atribuições), tendo para isso poderes
próprios
o Verifica-se o âmbito da OI, que só pode fazer aquilo que o tratado institutivo
permitir
o Organização funcional em órgãos comuns (estrutura funcional)
o O seu fundamento e regulação é o DIP
Tratado institutivo é a origem e fundamento da ordem jurídica de cada organização.
Confere-lhes personalidade jurídica, a qual vale quer em relação aos Estados-membros,
quer em relação a terceiros Estados e outros sujeitos de DIP.
Origem
Séc. XIX em que a 1ª OI seria a Comissão de Navegação do Reno (1815) que resolvia questões
práticas; 2ª SDN evoluiu para resolver questões militares e económicas e após 1945 há uma
proliferação de OI.
Várias naturezas:
Parauniversal – ONU, com 193 membros e 17 agências especializadas (família da ONU,
parauniversal e com objetivos específicos e relação umbilical de vinculação à ONU);
Regional – de âmbito geral (Conselho da Europa); de âmbito específico (OPEP)
113
Não se confundem com ONG que são pessoas coletivas de direito interno.
75
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
ONU
Sucessora SDN e pensada quando a guerra ia a meio.
Convenção internacional que positivou muitas normas costumeiras e algumas de ius cogens
(art. 2º/6)
Tem estrutura vasta e aperfeiçoada (face à SDN) e foi investida de poderes jurídicos que lhe
permitem atingir todos os problemas mundiais, tendo sido construída como o repositório dos
grandes princípios das relações entre todos os Estados e tendo primazia sobre quaisquer outras
obrigações internacionais (art. 103º CNU)
Art. 103º CNU – norma de conflitos – primado da Carta relativamente a todas as
obrigações internacionais adotadas pelos Estados.
CNU modificada até hoje, muito parcelarmente, 3 vezes – tema de discussão é o da reforma
institucional e administrativa da ONU em certos pontos.
Sujeita a revisão – art. 108º e 109º - mas nunca foi revista em termos substantivos (só
sofreu adaptações menores) porque há procedimentos diferentes (comum: acordo
expresso de concordância de membros permanentes do CS)
Órgãos:
Assembleia Geral – órgão de participação de todos os Estados em pé de igualdade e,
além do debate da política mundial, orienta a vida interna da ONU – cada Estado, um
voto (art. 18º/1)
Conselho de Segurança – órgão político central de decisão, encarregado da manutenção
da paz e segurança internacionais.
Secretário-Geral – tem poderes próprios e de cariz político.
Art. 57º - “Família da ONU” – instituições/agências especializadas, em princípio
independentes da ONU e cada uma com personalidade jurídica internacional própria,
mas, ligadas à ONU através de acordos celebrados.
Art. 4º CNU – membros (só podem ser membros Estados, que têm vindo a aumentar desde as
descolonizações e etc.)
Recomendações CS (art. 27º) começou a vigorar a “porta aberta” e todos os Estados que
o possam ser, devem ser admitidos (situações como Kosovo e Palestina – que hoje é um não-
membro observador, desde 2012, pois não passou por deliberação do CS porque vem do costume
de se um Estado está numa agência especializada da ONU, pode ser observador)
Áreas de atuação: umas resultam da CNU e outras resultam de costumes (adaptação e evolução
vem de prática internacional, pois a Carta é difícil de rever) – direito onusiano vai além da CNU
Ex costume: operações de manutenção da paz (capacetes azuis) que são órgãos
subsidiários e não previstos na Carta (nem no cap. VI nem VII) – surge das necessidades
da prática. Natureza subsidiária que dá à ONU visibilidade.
76
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Não se aplica cap. VII pois é muito difícil conseguir unanimidade nos membros permanentes no
CS. Mas, se há consenso no CS para criar operações de manutenção da paz, porque não se usa
cap. VII?
Implicações para os Estados, pois está-se a ativar a atuação militar da ONU.
Domínios de atuação em 4 pontos: segurança coletiva; autodeterminação dos povos
(não previsto na CNU pois na Convenção de S. Francisco havia membros com impérios coloniais
– não foi com base na CNU que se fez a descolonização mas sim com base na magna carta da
descolonização); proteção de Direitos Humanos; Responsability to Protect.
Instrumentos/meios jurídicos de ação
Estrutura institucional complexa, art. 7º
Relação dos órgãos – caso de crise internacional: art. 24º define principal responsabilidade
(não é competência exclusiva) do CS; art. 12º estabelece cláusula inibidora (lei travão) em que
AG não deve apreciar questões em que o CS esteja a exercer competências114 (critério da
prioridade: 1º CS e depois AG)
Atos jurídicos: recomendações AG e decisões CS – art. 25º (têm força vinculativa no âmbito do
cap. VII)
114
O que significa estar a exercer competência? Na Resolução Unidos para a Paz, Acheson (1950) – CS
quando não tem condições a AG delibera.
Marilu: disposição contra legem que alterna CNU à margem e adquire-se costume que altera art. 12º e
24º. Mas hoje esta invocação era inaplicável pois AG não tem maioria que ponha em causa CS.
Enquanto CS estiver a ocupar-se de qualquer conflito ou situação no exercício das suas funções,
AG pode discuti-lo mas não poderá emitir nenhuma recomendação sobre esse conflito ou
situação, a não ser que o próprio CS lho solicite (art. 12º/1). Prevalece, nesta hipótese, a
competência do Conselho.
77
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
ONU pode exercer não apenas os poderes da CNU mas também aqueles que, não estando
previstos, são necessários para manter a paz e etc. (princípios como os do preâmbulo) –
compromisso entre poderes necessários e soberania dos Estados.
Há uma lógica de quem pode o mais, pode o menos.
115
Nasce no constitucionalismo dos EUA e no séc. XX passa para DIP e direito das OI sendo corroborada
por pareceres do TIJ (1. Parecer prejuízo, 1949; 2. Despesas da ONU nas operações de manutenção da
paz, 1962)
116
Mas o que é implícito são os poderes e não os fins!
78
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Proteção internacional no plano universal – deriva de uma matriz europeia, pois já há uma
proteção regional na Europa.
Fontes plurais:
Carta internacional Direitos Humanos (consagra DUDH, 1948 – base e matriz para tudo
o que se seguiu tendo direitos civis, políticos, sociais e económicos) e 2 Pactos 1966
(Pacto Internacional Direitos Civis e Políticos e Pacto Internacional Direitos Económicos
e Sociais)118
o DUDH – foi a que foi mais longe em termos de direitos – art. 25º
Não é convenção, mas vincula os Estados porque codifica os princípios
de direito assumidos como costume – princípios contidos ou
refletidos nos artigos da DUDH, quer se entenda que se reconduzem a
fontes materiais ou formais, são princípios gerais de DIP e eles projetam-
se sobre os Estados-membros da ONU e sobre quaisquer Estados.
Foi a partir da DUDH que os princípios atinentes aos Direitos do
Homem se difundiram e começaram a sedimentar-se na vida
jurídica internacional, a ponto de alguns serem elevados a
princípios de ius cogens.
117
Direitos do Homem vem do Francês; Direitos Humanos vem do Inglês (mais abrangente porque
ultrapassa a questão de género)
118
Também a obra das organizações especializadas da “família” da ONU têm sido importantes
da proteção dos direitos do homem. E a existência de pactos é por razões pragmáticas de tornar
mais fácil ou maleável a vinculação dos Estados.
119
Comité dos Direitos do Homem surge na sequência do Pacto de Direitos Civis e Políticos
120
Não deixam o indivíduo sozinho contra o seu Estado.
79
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Na proteção penal existe TPI – criado pelo Estatuto de Roma (1998) e funciona desde 2002 – é
sucessor de tribunais ad-hoc.
Justiça penal internacional assenta em princípios de complementaridade e
subsidiariedade121 (julga-se nos tribunais nacionais crimes de natureza transnacional –
se não se fizer, o TPI pode fazê-lo).
Só pode julgar pessoas nacionais de Estados que ratificaram o Estatuto ou pessoas a
partir de uma resolução do CS no âmbito do cap. VII122 (mesmo que o Estado não tenha
ratificado o Estatuto – art. 27º/2 CNU)
o Jurisdição facultativa
Nível Regional
Conselho da Europa: não se confunde nunca com o Conselho Europeu nem com o Conselho da
União.123
Tem ação política abrangente e cujo legado é proteção DH – matéria central é CEDH124
(assinada em 1950 e entrou em vigor em 1953 – Portugal só aderiu em 1978).
o É o texto da convenção + protocolos adicionais (processuais, de entrarem em
vigor e após todos ratificarem, e sobre direitos, entram em vigor após nº mínimo
de ratificações)
o Ex: protocolo 13º (2003) – está em vigor mas não vincula todos – proíbe pena
de morte e substitui protocolo 6º (que ainda admitia exceções) – dos 47 só 44
ratificaram
É OI criada pelo Estatuto de Londres em 1949 e atualmente tem 47 Estados.
Organização com ideal de democracia, DH e EDD – adesão é através de convite e não de
pedido, após averiguar-se os requisitos mínimos.
Texto dinamizado por revisões e interpretações teleológicas, sistemáticas e ativistas do
TEDH.
Diferença da “grande Europa” do Conselho para a “pequena Europa” da UE (que para proteção
DH tem Carta Fundamental de Direitos, inspirada na CEDH – letra da carta foi-se adaptando;
ex: no ano 2000 a redação art. 12º do casamento já não fala em homem e mulher – anexa à
CEDH mas só vincula 28)
Textos apresentam mínimo de coerência, mas podem divergir – art. 53º é cláusula
aberta como fundamento para o nível mais alto de proteção: aplica-se a norma que
para o caso garanta o nível de proteção mais elevado.
o Interpretação à luz do princípio do tratamento mais favorável;
interpretação à luz de um princípio de progressividade da aquisição dos
121
Qualquer tribunal internacional é complementar e subsidiário aos nacionais, que pelo art. 8º/2 CRP
são obrigados a usar normas de DIP e a julgar (sendo que DUDH tem valor constitucional pelo art. 16º/2)
em Portugal
122
Sendo que 3 dos 5 membros não assinaram o Estatuto e querendo constantemente bloquear
funcionamento do TPI, não parece plausível de acontecer
123
Conselho Europeu: é instituição da UE que reúne chefes de Estado e de Governo dos Estados-
membros. Instituição política de decisão e importante.
Conselho da União: é instituição da UE em que os representantes são ministros. Ex: ecofin e etc.
124
Foi o primeiro texto de proteção a nível regional e que introduziu o acesso direto do indivíduo a uma
instância internacional para defesa dos seus direitos contra o próprio Estado. Veio a ser complementado
por 14 protocolos adicionais (uns acrescentando novos direitos à Convenção e outros regulando matérias
organizatórias ou processuais)
80
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
Mecanismo de queixa – TEDH tem jurisdição obrigatória (desde 1998) e passa a ter instância
aberta às queixas dos particulares – sistema totalmente jurisdicionalizado em que qualquer
pessoa singular o pode fazer (estando sob a jurisdição de um Estado) - art. 24º.
Limites no art. 35º em que só podem apresentar queixa se se tiver esgotado a
possibilidade de defesa nos tribunais nacionais – só não é assim se houver morosidade
na justiça interna e Portugal tem sido condenado por excesso de morosidade e por
violação da liberdade de expressão. Estado viola através dos seus tribunais.
125
TEDH pode receber petições de qualquer pessoa singular, ONG ou grupo de particulares que
se considere vítima de violação por qualquer Estado vinculado pela CEDH.
Não anula nem revoga as decisões dos Tribunais Nacionais. Decide se houve ou não violação dos
direitos garantidos pela Convenção e impõe que se conceda à vitima uma reparação razoável.
126
Não se fez a UE aderir à CEDH e preferiu-se fazer Carta de Direitos Fundamentais da UE, que alarga
substancialmente o acervo de direitos e oferece uma melhor sistematização, embora seja menos
pormenorizada. Nenhuma das suas disposições deve ser entendida como restrição à CEDH.
81
Sebenta DIP – DNB 2016/2017
ANEXOS:
Aula Marilu
20/9/2016 – Abertura da 71ª Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque; sessão prolonga-se
até ao Natal e inauguração tem a maior parte dos chefes de Estado (discussão de política externa
e multilateral de cada Estado)
Objetivos do Milénio foram feitos para mover a organização – o que move as instituições é o ter
objetivos
ONU para e morre se não tiver uma agenda
Foco até 2030 é o desenvolvimento sustentável
2016: 65 milhões de refugiados – exige-se uma resposta urgente e estrutural; para além da
resposta, tem que haver uma mostra de capacidade, já que há falta de vontade política dos
Estados
Problema do Unilateralismo – sem relações com outros Estados
127
Poder de veto no art. 27º - sendo que uma norma costumeira derrogou o preceito que não permitia a
abstenção (e a tomava como veto)
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Enorme expectativa atribuída nos anos 1940; após substituir a “Sociedade das Nações” que falhou ao
não impedir a guerra
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o Países Grandes: posso, quero e mando – EUA, não destroem as relações pois
não se importam de ter relações consigo mesmo devido a serem potências
económicas e militares
o Países Pequenos: Unilateralismo leva ao Isolacionismo
Perigo de marasmo económico, fomes, subdesenvolvimento,
impossibilidade de viajar
Pode evoluir para uma violação das regras internacionais com
movimentos belicistas – ex: Coreia do Norte
ONU tem posição delicada e frágil mas não quer ser tomada como débil e impotente pois se a
organização falhar, falham os acordos dos Estados.
Pode apenas fazer aprovar acordos e declarações mas que só são aplicadas com vontade
política (que não devem ser aproveitadas por motivações eleitoralistas)
Missão de garantir a paz em muitos âmbitos de atuação: UNESCO, UNICEF, OMS, FMI, Conselho
de Segurança, ACNUR
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Capicua
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EUA c. Nicarágua
1981 – os “Contras” (grupo armado, financiado e treinado pelos EUA) iniciam atividades de
guerrilha, na sequência da queda do ditador Somoza (apoiado pelos EUA) em 1979, estando no
poder a frente Sandinista de ideologia marxista.
O caso, acusando EUA de atividades militares e paramilitares, chega ao TIJ em 1984 (contexto
final de Guerra Fria com muitos conflitos)
O TIJ, tendo 15 membros em Haia, é tribunal de competência facultativa (art. 36º CNU)
EUA tinham aceite em 1946 mas com uma reserva de que litígios acerca de tratados multilaterais
todos os Estados tinham que estar envolvidos. 4 dias antes da entrada do processo, os EUA
retiram a aceitação (denunciam o tratado) e pedem para se tirar o caso da agenda.
Maio 1984: TIJ votou por unanimidade (juiz americano também decidiu a favor) uma proteção
cautelar em que EUA tinham de parar de minar o mar e respeitar a soberania territorial e política
Decisão final
Junho 1986: EUA já em 1985 se tinham retirado do processo130; TIJ dá-lhes razão quanto à
reserva de 1946 (pois os outros Estados não estavam no processo, tendo sido persuadidos a não
estar) mas afirmam que o Direito não se esgota nas convenções – há direito costumeiro e é com
base nele que julgam o caso (numa asserção de ius cogens). Apesar de estar positivado, é por
ser costume que a todos vincula que se julga o caso.
Decidem que EUA cometeram ilícito ao violar a regra costumeira de proibição do uso da força,
da não ingerência, da violação de direito humanitário.
Dava-se razão à Nicarágua. Em 1991, com um governo de Direita, Nicarágua desiste de reclamar
a efetividade da decisão (justiça internacional instrumentalizada para a política externa dos
Estados)
Hoje em dia suscita-se a questão de qual o nível de ingerência que se deve ter para evitar
massacres (Responsability to Protect como um dever de soberania) – ainda não é norma
costumeira mas os autores dizem que é um nova realidade do DIP. Sobrevive na charneira entre
a soberania dos Estados (limitada pela segurança) e o princípio da não ingerência.
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Eles tinham alegado legítima defesa coletiva (art. 51º CNU) – mas isso tem de decorrer de uma
agressão armada e tem que seguir trâmites internacionais, tendo uma gravidade tal que o ligue a um
comportamento de um Estado. Tem que ser proporcional à agressão e em princípio é empreendido pelo
Estado vítima.
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EUA violaram Princípio da proibição do uso da força (art. 51º CNU, exceção é legítima defesa a
atividade militar) e Princípio da não ingerência nos assuntos internos (proteção da soberania
estadual) – princípios vestefalianos que vêm desde o período clássico.
Os EUA também faltaram com o art. 18º CVDT pois violaram tratado de comércio, não agiram
com boa fé.
Para responsabilizar os EUA pela ação de particulares a apoiar os “Contras”, os Estados têm que
ter controlo efetivo sobre os particulares.
Decisão da vinculação é por distribuição de poderes, feita pela CRP – vários órgãos de soberania
que decidem, não há vinculação só com um órgão de soberania.
Desde o período entre guerras que se deu o virar da agulha para a mudança em que sega aos
Estados o ius belli – DIP contemporâneo em que há uma positivação das normas e princípios de
fonte costumeira.
Por haver tratados não significa que o conteúdo seja convencional. No caso, recorre-se a
costumes como critérios de julgamento (independentemente de estarem positivados ou não)
É importante saber quais as regras de costume e quais as novas do tratado para saber o alcance.
Todos os princípios de ius cogens são de fonte consuetudinária pois a realidade aflora à
consciência dos Estados nesses princípios que se consagram como costume antes de se verem
reconhecidos por qualquer convenção
Ex: CVDT vem de normas costumeiras e mesmo os Estados que não ratificaram estão vinculados
à maior parte das normas.
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