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Texto 1: SOUSA FRANCO

O conceito de Finanças Públicas

Finanças Públicas vs. Finanças Privadas

Finanças privadas: aspetos tipicamente monetários de financiamento de uma economia ou de os problemas de moeda
e do crédito (mercados onde de transacionam ativos representados por títulos a médio e a longo prazo). Também
qualificado de financial.

Finanças públicas: atividade económica de um ente público tendente a afetar bens à satisfação de necessidades que
lhe estão a ser confiadas. Também qualificado como “financeiro”.

Aceções de Finanças Públicas:

 Sentido orgânico – conjunto de órgãos do Estado ou de outro ente público (incluindo a parte respetiva da
AP) a quem compete gerir os recursos económicos destinados à satisfação de necessidades sociais (ex.:
Ministério das Finanças).
 Sentido objetivo – atividade através da qual o Estado, ou outro ente público, afeta bens económicos à
satisfação de necessidades sociais.
 Sentido subjetivo – disciplina científica que estuda os princípios e regras que regem a atividade do Estado
com o fim de satisfazer as necessidades que lhes estão confiadas.

Segunda e terceiro sentidos – Economia Pública.

SOUSA FRANCO prefere designar por Finanças Públicas o estudo deste fenómeno, quando é feito numa ótica de
economia aplicada, fundamentalmente segundo métodos indutivos e institucionais e em valores monetários (não
reais).

O fenómeno financeiro:
Representa o estado das relações económicas entre as pessoas e as instituições sociais, por um lado, e o
Estado, do outro. Campo de relações concretas entre o poder e a sociedade, bem como das tarefas e funções que
esta leva o poder a desempenhar, e do modo como os grupos/classes sociais se situam perante o poder, beneficiando
dos seus gastos ou suportando o respetivo custo.

A Economia do Fenómeno Financeiro

Economia privada, social e pública:

A atuação económica das pessoas, grupos e da sociedade pode ser exercida de diversas formas.

Economia privada, em regra contratual: indivíduos, famílias ou organizações de base contratual que, na repartição
ou na circulação, atuam como unidades individuais ou como organizações de mera base contratual, na satisfação das
respetivas necessidades, segundo critérios predominantemente individuais.

Economia comunitária, cooperativa ou coletiva (social, “hoc sensu”): organizações que visam satisfazer
necessidades segunda uma lógica corporativa ou coletiva, recorrendo à disciplina institucional interna do grupo, mas
sem a possibilidade de recorrer a mecanismos coativos externos.

Economia pública: organizações políticas que têm por fim o interesse geral de sujeitos indeterminados, indo além da
simples satisfação de necessidades comuns sociais. Para isso socorrem-se de poderes de autoridade. O sujeito atual
mais típico e importante é, claro está, o Estado.

A economia privada baseia-se no livre comportamento dos agentes económicos e em equilíbrios por eles
livremente estabelecidos, de acordo com os seus interesses próprios confrontados com transparência e medidos por
referenciais comuns – os preços formados em mercado. Tem como instrumentos fundamentais os contratos e como
instituição básica de apropriação dos bens, produtivos ou de consumo, a propriedade privada.
A economia social assenta na solidariedade, organizada em grupos de diversa dimensão e nível económico,
na liberdade de comportamento das pessoas e dos grupos, na combinação da propriedade privada com a propriedade
social e comunitária, na cooperação organizada; pode integrar instrumentos de racionalidade e solidariedade orgânica
diversificados, que combinam o individualismo com o solidarismo.
Por sua vez, a economia pública assenta, à partida, na existência de uma solidariedade organizada e dotada
de poder político – portanto, de coação social máxima – à escala da coletividade, numa lógica de direção económica
mais ou menos planeada, com formas de apropriação dos bens pela sociedade através do seus órgãos políticos e
juízos coletivos de utilidade. Impõem-se do centro (órgãos de decisão política) para a periferia (membros da
sociedade).

Hoje, dominantes são a economia privada e a economia pública, constituindo dois princípios opostos de
estruturação e funcionamento da sociedade económica, que podem situar-se fundamentalmente em dois planos
distintos:
 O da definição do sistema económico – caracterizando assim, consoante seja globalmente dominante um ou
outro destes princípios, diversos tipos de sistemas económicos;
 O da adoção dos respetivos modelos ou critérios de comportamento, dentro de um ou outro dos sistemas
económicos, por setores, órgãos sociais ou agentes económicos.

O poder e a economia: Ordenação; Intervenção e Atuação Económicas

Noções prévias:

As relações entre o poder político e a atividade económica pode ser de três tipos principais: a ordenação
económica, a intervenção económica e a atuação económica pública.

(a) A ordenação económica

Cabe aos poderes públicos estabelecer os quadros gerais em que toda a atividade económica tem de
desenvolver-se: da constituição e da legislação económica às próprias diretivas e decisões concretas da
administração económica, estruturando, assim, a atividade económica e condicionando a atuação dos sujeitos
económicos.
Esta atividade económica também decorre no domínio extrajurídico, das diversas instituições sociais (hábitos,
formas de comportamento…).
Tal forma de atuação constitui o domínio da atividade económica/ ordenação económica.

Constituição económica: doutrinas e políticas económicas de índole geral podem especificar-se, tanto em normas
como numa prática jurídico-política. Formulam-se princípios gerais, aos quais deve obedecer toda a vida
económico-social, e também a produção de normas jurídicas ou as situações e relações jurídicas a ela pertinentes.

O Estado pode, ainda, ao abrigo da sua função ordenadora da vida económica, definir normas legais gerais,
que não demarcam já os quadros fundamentais de toda a vida económica, mas a eles se subordinam, seja para toda a
atividade económica, seja para certos setores, tipos de atividade ou conjuntos de relações económico-sociais gerais e
permanentes antes referidos, regulando de forma direta, por exemplo, um setor, um tipo ou uma área de atividade: será
a legislação ou a regulamentação económica – pode abranger as instituições económicas gerais (áreas de produção,
consumo, mercados de fatores de produção) e as específicas, nomeadamente setoriais (agricultura, industria,
comércio…).

Através da Administração ativa ou dos Tribunais, a administração e a jurisdição económica constituem, ainda,
uma forma de ordenação jurídica: prevalecerá a vinculação na função ordenadora, a discricionariedade na intervenção.
O Estado desempenha uma função ordenadora da vida económica.

(b) A intervenção económica

Modelo que visa alterar concretamente o que seria a atividade livre e normal dos sujeitos económicos.
Suponhamos que o Estado considera indesejável que se produzam mais tecidos de fibras sintéticas: poderá
evitar que abram mais fábricas; poderá baixar o preço dos têxteis, levando algumas unidades à falência e outras a
retraírem a produção; poderá restringir o crédito ao setor, poderá fixar quotas de mercado ou limitar por contingentes a
produção de cada fábrica ou empresa, etc. Pode tal resultar em restrições financeiras, agravamento de imposto,
simples movimentos de persuasão ou coação psicológica…
Este modelo tem como forma mais racionalizada a política económica. A intervenção económica pode ser
direta ou indireta, e representa a relação mais flexível, diversificada e variada entre o Estado e a atividade
económica. O que a caracteriza é que o Estado visa alterar o comportamento dos produtores ou dos
consumidores (em suma, os sujeitos económicos) que dispõem de uma certa margem de liberdade: a intervenção
estadual tenta modificar a forma natural como esses agentes atuariam, de modo genérico (políticas económicas)
ou em termos casuísticos (atuações individualizadas). Fá-lo, porém, sem modificar os quadros gerais da atividade
económica, e sem tomar ele próprio decisões relativas à utilização dos bens e satisfação de necessidades sociais ou
estaduais (isto é, sem ele próprio ser sujeito económico).

(c) A atuação económica do Estado

Atividade de sujeito económico coletivo ou social desenvolvida pelo Estado como forma política da
sociedade. Há necessidades que são satisfeitas pela própria sociedade política.
Em todos os tempos, zonas de atividade económica, conexas com os fins e as funções do Estado, foram por
esse exercidas; pois a prossecução de fins de segurança, justiça e bem-estar implica a administração de diversos bens
raros, a qual, de per si, é atividade económica.
Em tais casos – de atuação económica do Estado – este dispõe de bens económicos, cuja gestão e disposição
lhe está atribuída, para os afetar a necessidades sociais que lhe cumpre satisfazer. É pela disposição ou administração
desses bens que ele atua economicamente, fazendo também política ou administração.

Há serviços que só o Estado pode prestar numa sociedade evoluída: a administração da justiça, a defesa e
a segurança interna, certas zonas de administração civil. Para tanto, ele haverá de dispor de bens, de utilizar meios
de financiamento, de remunerar o trabalho e outros fatores produtivos…
Igualmente, há serviços que o Estado, por razões diversas, chamou a si prestar, embora pudesse não o
fazer: correios, telecomunicações, radio e televisão em certos países…
O Estado ao produzi-las é um produtor como outro qualquer.
Mais difícil será entender o caráter económico da polícia ou da defesa nacional, por exemplo. Contudo,
também eles constituem serviços, “pagos” pela coletividade, por via dos impostos (ou taxas); e, ao prestá-los, o Estado
suporta custos, formulando decisões acerca da afetação de bens económicos raros a fins específicos de caráter social.
Nestas situações, que poderemos designar por atuação económica em sentido próprio, o Estado age por si
mesmo como sujeito ou agente económico, formulando escolhas ou opções económicas no interesse da
comunidade (ou da sua máquina ou aparelho estadual).

Texto 3 – MARIA OLIVEIRA MARTINS

Objeto das Finanças Públicas

Quando se fala em finanças faz-se referência a tudo o que tem que ver com os fenómenos de captação de
receitas e de realização de despesas que permitam a satisfação de necessidades económicas.
Quando se fala, em particular, em finanças públicas, aponta-se para a “atividade económica de um ente
público tendente a afetar bens à satisfação de necessidades que lhe estão confiadas”.
Como explica Sousa Franco:
• Sentido orgânico – conjunto de órgãos do Estado ou de outro ente público (incluindo a parte respetiva da AP)
a quem compete gerir os recursos económicos destinados à satisfação de necessidades sociais (ex.: Ministério das
Finanças).
• Sentido objetivo – atividade através da qual o Estado, ou outro ente público, afeta bens económicos à
satisfação de necessidades sociais.
• Sentido subjetivo – disciplina científica que estuda os princípios e regras que regem a atividade do Estado
com o fim de satisfazer as necessidades que lhes estão confiadas.

A disciplina de finanças publicas visa apreciar criticamente os elementos com que trabalha: a receita e a
despesa, segundos juízos de justiça distributiva. Afirma-se também como disciplina que se situa “na confluência
das abordagens da ciência económica, da ciência política e do direito”. Em que medida pode/deve o Estado prover às
necessidades de subsistência do povo? Em que medida podem/devem os cidadãos contribuir para a despesa pública?
Que despesas podem ser financiadas por receitas creditícias?

Como são ordenadas as necessidades em termos de prioridade?

1. Valoração individual – dependendo da importância dos bens e do conjunto das suas necessidades; nas
sociedades democráticas esta valoração seria representada no Parlamento; alguns autores não concordam,
reiterando que o interesse público é fruto da estratégia e da manipulação política. Teorema da
impossibilidade de ARROW – “tudo pode acontecer quando os votos são tomados em conta”. Public
Choice – critica aquilo que se designa de interesse público achado pelos mecanismos democráticos
maioritários, demonstrando que o interesse do Estado está inteiramente dominado por interesses
particulares; parte do interesse próprio (self-interest) - governos como meros mecanismos de agregação das
preferências privadas; alguns economistas assumem a legislação como produto de grupos de interesses
especiais, pondo fim à ingénua ideia que a vida política de limitava à busca da promoção do interesse público.

Filosofia do utilitarismo: visível no processo de adoção de políticas públicas, aparecendo sob formas de análises de
custo-benefício, em que se pesam os custos e os benefícios sociais das decisões públicas. A sua preponderância faz-
se sentir na difusão de um pensamento que visa a promoção do bem-estar, o qual surge associado inequivocamente a
um aumento da intervenção pública, tendente a aumentar a felicidade geral. As escolhas sociais fazem-se, pois,
mediante a ordenação dos estados sociais com base nos níveis de bem-estar atingidos pelos vários indivíduos.
Prevalecerão as medidas que conduzirem a um maior bem-estar social. Este pensamento utilitarista permite testar
a eficiência em termos de consequências sociais de determinada política pública, no sentido de perceber quem
beneficia e quem fica prejudicado com a mesma.

Necessidade do estudo do Direito financeiro: A atividade financeira do Estado

Porque tem o Estado atividade financeira? Que despesas tem que justifiquem a cobrança de receitas?

(A) A atividade financeira baseada em decisões políticas

Não podemos deixar de pensar que a atividade financeira se constrói em função das necessidades em
concreto sentidas por uma comunidade e que são assumidas pelo poder político. Não deixa de ser claro, porém,
que não podemos, nem temos, de satisfazer todas as necessidades. O Estado tem, pois, a atividade financeira que
for ditada pela decisão política = despesa pública de um Estado é ditada por decisão política.
Quando associadas a regimes económicos liberais, as finanças públicas são caracterizadas por uma despesa
pública o mais reduzida possível.
Com efeito, são traços marcantes das finanças liberais/clássicas/neutras: a separação entre economia e
finanças; a abstenção económica por parte do Estado perante o mercado; a organização da atividade financeira pública
de forma a não perturbar a atuação livre dos sujeitos económicos (ex.: quando o Estado cobra impostos deve fazê-lo
de forma a deixar os sujeitos económicos na mesma situação em que se encontravam antes dessa mesma cobrança);
predomínio da instituição parlamentar de forma a assegurar que todos os cidadãos controlam o exercício da atividade
económica por parte do Estado – principio legalidade; importância do imposto; equilíbrio orçamental para evitar que o
Estado tenha de recorrer a empréstimos que iriam necessariamente onerar as gerações futuras e desviar dinheiro do
setor privado para o público (regra de ouro das finanças públicas).
Pelo contrário, os regimes económicos mais intervencionistas são caracterizados por uma despesa pública
mais elevada, devida a uma maior intervenção estatal na economia – princípio do mínimo substituído pela regra do
ótimo. A elevação da despesa pública conduz a uma diversificação das receitas do Estado e ao progressivo abandono
do princípio do equilíbrio tão caro para os liberais.
As finanças intervencionistas/funcionais/ativas são, assim, marcadas por uma integração entre economia e
finanças públicas; pela intervenção/ordenação económica por parte do Estado; e pela consequente complexificação
do fenómeno financeiro, que conduz ao necessário avultar da instituição governamental (Governo como único capaz
de dominar os números de um Estado cada vez maior e com crescentes funções).

(B) A atividade financeira baseada numa racionalidade económica, tendo em vista a prossecução da
eficiência no mercado e da justiça na distribuição de bens

Por detrás de muitos gastos públicos encontra-se uma racionalidade económica – parte desta radica no
paradigma tomado com referência na atuação do Estado: o paradigma do Estado de bem-estar – ainda hoje conduz
o Estado a afetar as receitas na prossecução do ótimo social e à procura de soluções para a manutenção de um
mercado eficiente e justo.

 Eficiência (capacidade de realização de modo eficaz e com o mínimo de desperdício; produtividade):


O Estado de bem-estar parte da existência de um mercado de base individualista, em que as empresas, em
princípio, se encontram em concorrência perfeita, pois só assim se consegue uma afetação de recursos ótima em
termos paretianos.
Desde que se dotem os agentes com os rendimentos adequados (…) através de um processo de transferências
que não provoque desperdícios em termos de bem-estar”; informações perfeitas…
É a busca por eficiência que leva o Estado a atuar no mercado – colmatando as falhas/incapacidades
que este possa apresentar – de forma a promover o aproveitamento ótimo dos recursos produtivos.

 Justiça:
Não se conformando com as distribuições feitas pelo mercado, o Estado pode proceder a uma
redistribuição de rendimentos/correções, de forma a promover uma afetação de recursos socialmente mais
justa.
Como subcritérios a nortear a atuação do Estado destacam-se: igualdade; equidade; critérios utilitaristas;
critérios de aproximação legítima.
Mais, “a utilização da política orçamental como meio de manter o emprego elevando, um razoável grau de
estabilidade do nível de preços e uma apropriada taxa de crescimento económico, com subsídios com efeitos no
comercio e balança de pagamentos, a todos estes objetivos damos o nome de função de estabilização” – que se
reconduz à procura de eficiência e justiça no mercado.

(C) A atividade financeira provocada por falhas de intervenção do Estado

Um grande número de despesas publicas acaba por ser influenciado pelos problemas que se manifestam no
exercício do poder.
Ou seja, a despesa publica acaba também por ser determinada por falhas na intervenção do Estado ou
falhas do Governo:
 Falhas de informação;
 Excesso de burocracia;
 Captura das decisões por parte dos lobbies, que defendem interesses privados;
 Oscilação de ciclos leitorais;
 Corrupção
 …

Falhas de mercado e de intervenção do Estado:

Estamos perante tal situação quando a comunidade carece da produção ou fornecimento de um bem –
necessidade – que não é produzido pelo mercado de forma satisfatória. Isto devido: existência de um desequilíbrio
entre a utilidade individual e a utilidade social na produção e utilização de um bem; ou porque se geram
custos/benefícios para a comunidade sem que esta possa imputá-los quem os provoca; ou porque a produção de certos
bens conduz à destruição da concorrência nesse mercado.

Cinco falhas em que o Estado é chamado a dar resposta:


1. Existência de necessidades coletivas que exigem a produção de bens coletivos, também chamados de bens
públicos puros (aponta para a necessidade de intervenção do Estado). Ainda que o Estado não quisesse
proceder à sua produção, dificilmente se furtaria a produzi-los, pois dificilmente eles são fornecidos pelo
mercado.
Características dos bens públicos puros:
(a) São bens de satisfação passiva – a sua apropriação não depende de nenhum esforço por parte do
consumidor;
(b) Não são exclusivos, não sendo possível privar ninguém da sua utilização;
(c) Não são emulativos – não entram em concorrência para conseguir a sua utilização; não é possível excluir
ninguém da sua utilização.

Exemplos: farol, defesa nacional, justiça.

Em circunstâncias normais não são produzidos no mercado e, quando o são, são insuficientes em relação às
necessidades.
Se esses bens não forem essenciais, a comunidade poderá facilmente prescindir deles. Se forem reputados
essenciais pela comunidade não podem ser deixados de ser produzidos ou fornecidos pelo Estado.
Aos bens a que o Estado é chamado a produzir ou fornecer dá-se o nome de bens coletivos ou bens públicos
puros. O custo de tais bens será financiado pela comunidade, por meio de impostos.
2. Falhas de concorrência ou concorrência imperfeita
Por vezes as empresas deparam-se com monopólios ou oligopólios que dominam o mercado, impedindo ou
dificultando a atividade económica. Estes podem formar-se de duas formas:
 Por haver bens cuja produção se baseia na existência de custos permanentes decrescentes. Uma exceção à lei
das proporções definidas que vale na produção – que diz que existe um ponto ótimo da produção de fatores
produtivos em que o custo de produção por unidade é o mais baixo possível. Até ao ponto ótimo os custos são
sempre decrescentes, até atingir o estádio dos custos crescentes. Quando os custos são decrescentes, as
empresas maiores conseguem sempre fornecer bens a um custo inferior ao das demais empresas – gerando um
monopólio ou oligopólio (ex.: instalação de rede elétrica, sistemas de água, luz, gás). São os designados
monopólios naturais.
 Surgimento de monopólios ou oligopólios por determinação do Governo (ex.: produção de fósforos e
enxofre). Designa-se de monopólios artificiais.

A existência de monopólio ou oligopólio gera o fenómeno conhecido por renda do monopolista – sobrelucro
das empresas. Com efeito, a vantagem de uma ou mais empresas reflete-se necessariamente num aumento de preços:
os preços tendem a situar-se acima do nível normal do preço em concorrência. Existe um limite natural – a
elasticidade da procura: mercando funciona, mas o preço é mais elevado que o custo médio; gerando um consumo
menor. Nesta falha, o Estado pode atuar através: chamar a si a atividade; reduzir a renda monopolista através de um
abaixamento administrativo dos preços; intervir como regulador de mercado. Em Portugal existe a Autoridade para a
Concorrência.

3. Verificação de exterioridade/externalidades positivas e negativas (efeitos colaterais de uma decisão


sobre aqueles que não participaram nela; não atendibilidade)
Correspondem aos efeitos externos dos comportamentos económicos. Positivas ou negativas consoante
provoque, ou não, benefícios a terceiros ou gira custos. A maior parte das externalidades é regulada pelo bom senso
dos sujeitos económicos – relações de vizinhança.
Há bens que provocam benefícios a outros sujeitos económicos sem que os seus fornecedores possa, pelos
mecanismos normais de mercado, receber uma recompensa: construção de escola, estrada, hospital, esgotos
(positivas). Há também bens que provocam prejuízo a ouros sem que se possa impor recompensa – negativas –
lixeiras, ruídos excessivos, despejos nos rios, poluição – é imposto um custo social.
Generalidades positivas: geram um défice no fornecimento de bens, pois é muito difícil impor um
pagamento relativamente à utilidade social causada pelo fornecimento desses bens.
Generalidades negativas: geram uma proliferação das atividades que as causa, uma vez que é difícil a
imposição de uma compensação a quem beneficia dessas atividades.
Estado pode suprimir as falhas através: socialização da exterioridade, promovendo, por exemplo, o
pagamento de taxa de esgotos, o pagamento de taxas aos poluidores, fornecimento publico e gratuito de caixotes do
lixo e a recolha municipal do lixo domestico; estabelecimento de regras no sentido da sua resolução: assegurar a sua
efetivação através do acesso à justiça; recorrer à tributação ao impositor do custo externo (impostos sobre a poluição,
ruído – poluidor-pagador; financiamento de certas atividades (escolas, hospitais).

4. A assimetria de informação -da oferta e da procura


Este fenómeno poderá gerar desequilíbrios entre a oferta e a procura. Ex.: venda de medicamentos ou
alimentos, cuja falta de informação pode gerar desconfiança por parte dos consumidores.
Estado pode intervir impondo fornecimento de mais informação, criado serviços de certificação de qualidade
ou mesmo assumindo alguns serviços de informação.

5. Incompletude dos mercados


Nem sempre o mercado provê todas as necessidades sentidas pelos consumidores.
Esta incompletude pode surgir:
 Em situações de incerteza e de risco – embora próprios, há situações em que estes riscos são tao elevados que
o mercado só aceitará cobri-los com custos desproporcionados em relação ao risco corrido. A incapacidade de
mercado surge quando os iscos que se entendem que devem ser assegurados apenas o são no mercado a preços
muito elevados ou não o são, pura e simplesmente, pelas condições gravosas a que estariam sujeitos. Os
Estados podem assumir, por exemplo, funções de segurador (ex.: segurança social – compensação por
invalidez, doença, velhice).
 Oferta e procura só se encontram quando existe um trabalho de coordenação dos mesmo. Ex.: café não se
vendia sem açúcar – produtor corre o risco de o seu bem se um total fracasso em face da ausência do produto
complementar. Estado é chamado a intervir de forma a promover a cooperação entre os produtores de bens
complementares.
Intervenção do Estado: quem sustenta um paradigma de finanças funcionais.
Não intervenção do Estado: quem defende um paradigma de finanças mais neutras.

Por que razão o Estado intervém?

 Perspetiva de interesse geral;


 Perspetiva temporal limitada e uma capacidade de risco superior à dos outros grupos/associações contratuais;
 Dispõe de poder de autoridade para impor regras de utilização de bens e o seu financiamento;
 Tem uma dimensão que lhe possibilita empreender esforços, que não está ao alcance de instituições e pessoas
privadas;
 Só a sua intervenção permite realizar o bem-estar social em termos que todos achem desejáveis.

Não só por falhas de mercado, a atividade financeira do Estado também se prende com uma certa conceção de
justiça social, promovendo uma redistribuição de rendimentos, de forma a promover uma afetação de recursos
socialmente mais justa.

Sintetizando as principais funções do Estado, Musgrave destaca três:

 Alocação: provimento das necessidades públicas. Satisfação das necessidades sentidas pela comunidade,
por exemplo, resolver os problemas resultantes das falhas de mercado. Traçar as fronteiras da função da
alocação dependerá do lugar que confiramos ao princípio da subsidiariedade nas relações Estado/mercado. Se
entendermos que a subsidiariedade é recebida como princípio constitucional, ficará mais fácil entender
que o Estado só deveria intervir na esfera económica em caso de défice da iniciativa privada e ou de
falhas de mercada. Ao invés, o raio de atuação tenderá a crescer.
 Estabilização: despesa pública utilizada como meio para o aumento da propensão ao consumo de forma
contra cíclica, ajudando à saída da crise, numa situação de depressão económica. “A utilização da
política orçamental como meio de manter o emprego elevando, um razoável grau de estabilidade do nível de
preços e uma apropriada taxa de crescimento económico, com subsídios com efeitos no comercio e balança de
pagamentos, a todos estes objetivos damos o nome de função de estabilização” – que se reconduz à
procura de eficiência e justiça no mercado.
 Redistribuição: promoção pública de transferência de rendimento de uns grupos para outros – valores de
justiça; decisões assumidas segundo o processo democrático.

Texto 5 – TEIXEIRA RIBEIRO

Atividade Financeira

a) Necessidades coletivas
Quem diz finanças, diz meios ou instrumentos financeiros que são o dinheiro e os créditos.
O objeto das finanças é o estudo da aquisição e utilização de meios financeiros pelas coletividades públicas,
dotadas de supremacia ou poder: o Estado, as autarquias locais (ex.: municípios) e as entidades paraestaduais
(ex.: Ordem dos Advogados). Sobressai, contudo, o Estado, onde nos debruçamos sobretudo.
O Estado tem as suas finanças porque precisa de fazer despesa com a produção de bens – aptos para a
satisfação de necessidades. As necessidades que o Estado satisfaz não são necessidades dele próprio, pois não é
um indivíduo, mas uma coletividade de indivíduos – são, portanto, necessidades dos indivíduos sujeitas pela
pessoa coletiva Estado.
Porém, só algumas são satisfeitas pelo Estado, através da atividade financeira, uma vez que a maior
parte delas são satisfeitas pelos indivíduos, através da atividade económico-privada (através de bens que
produzem ou obtêm por troca).

Assim, observa-se que há necessidades satisfeitas pelos indivíduos, e outras pelo Estado. Isto porque:

 Há bens cujo custo de produção tem de ser coberto pelo Estado – muitos que satisfazem necessidades
coletivas;

Há bens que são precisos procurar (alimentação) e outros que basta existirem (exército para a defesa do país)
As primeiras necessidades são as designadas necessidades de satisfação ativa. As se segundo tipo – porque
se satisfazem pela mera existência os bens, não exigindo para a sua satisfação qualquer atividade do consumidor – são
necessidades de satisfação passiva (os indivíduos sentem-se seguros só por saber da existência do exército).

(i) Se a necessidade é de satisfação ativa, o produtor dos bens pode exigir um preço pela utilização deles –
princípio da exclusão: preço exclui os que não podem ou não querem pagá-los.
(ii) Se a necessidade é de satisfação passiva, o produtor dos bens já não pode exigir pela utilização deles
preço nenhum. Ex.: criação do serviço de exército.
Quem cobre então as despesas com a produção dos bens que satisfazem as necessidades de satisfação
passiva? Na generalidade dos casos, os que utilizam passivamente os bens só coagidos contribuem para as
respetivas despesas. Coagir apenas é dado a um ente munido de poder de império, sendo que apenas o
Estado e as restantes coletividades públicas o possuem. Logo, o Estado pode obrigar os cidadãos a custear
as despesas que a produção daqueles bens acarreta. Algumas vezes esses bens só podem ser produzidos
pelo Estado, pois só este dispõe dos respetivos elementos de produção – ex.: redistribuição de rendimento.
Se se entende que o rendimento do país, depois de distribuído, através do mercado, em salários, juros,
rendas e lucros, deve ser redistribuído, de modo a tirar parte do rendimento aos que se julga terem de
mais, para o transferir aos que se julga terem de menos evidentemente que só o Estado pode forçar os
primeiros a cederem parte do que possuem.
Porem, a maior parte das vezes, os particulares dispõem de elementos requeridos para a produção dos
bens que satisfazem necessidades de satisfação passivas, podendo, assim, os bens, ser produzidos tanto
pelo Estado como por uma empresa privada, à qual o Estado pague um preço remunerador.
Sendo o bem inexcluível, há indivisibilidade do consumo e, portanto, irrivalidade – deste modo, a
utilização do bem por A não impede ou prejudica a sua utilização por B.
Contudo, há bens cujo consumo é irrival, sendo, no entanto excluível. Ex.: sala de cinema – todos os
espectadores podem consumir em simultâneo a exibição do filme; o consumo é irrival, mas para tanto
tiveram de pagar o bilhete de entrada – o consumo é excluível.

As necessidades individuais, satisfeitas, em regra, pela própria pessoa, são aquelas que consideram o indivíduo
isoladamente. Exemplos: alimentação, vestuário, transporte e habitação. Em caráter excecional, o Estado ou Poder
Público pode assumir as responsabilidades pelo atendimento das necessidades individuais básicas de certo conjunto de
pessoas. Observe que a Constituição qualifica como direito fundamental social a assistência aos desamparados e
estabelece que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à
seguridade social, e tem por objetivos: a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; b)
o amparo às crianças e adolescentes carentes; c) a promoção da integração ao mercado de trabalho; d) a habilitação e
reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária e e) a garantia de
um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

As necessidades coletivas são aquelas de um conjunto definido de pessoas (classes, categorias, coletivos). Exemplos:
uma ponte que liga duas regiões, urbanização de determinada região.

 Há bens que, para serem produzidos nas condições julgadas convenientes, também tem o Estado de
cobrir o seu custo, no todo ou em parte. São alguns dos bens que satisfazem ao mesmo tempo necessidades
coletivas e necessidades individuais (logo de satisfação ativa, podendo exigir-se um preço pelo seu consumo).

Ex.: serviço de instrução – necessidade de que haja ensino vs. necessidade dos que frequentam as escolas.

Apesar de as necessidades individuais serem de satisfação ativa, podendo exigir-se um preço pelo seu
consumo, há casos em que é necessidade coletiva a satisfação gratuita das necessidades individuais – ex.: ensino
básico; ou em que é necessidade coletiva a satisfação das necessidades individuais a preço inferior ao custo dos
bens – ex.: ensinos secundário e superior. Nestes casos, é claro que as despesas têm se der cobertas com outros
recursos, quase coativamente obtidos. Daí que o Estado intervenha para assegurar o fornecimento de tas bens aos
cidadãos.
Pode o Estado produzi-los ou encarregar da sua produção empresas privadas – ex.: Estado pode produzir o
serviço do ensino secundário ou conceder subsídios a escolas particulares para que o produzam nas condições
convenientes de qualidade e preço.
Há ainda casos em que a necessidade coletiva a satisfação das necessidades individuais a preço igual ao
custo, ou a preço superior ao custo, mas inferior ao que viria a estabelecer-se no mercado se a oferta
pertencesse a empresas privadas – ex.: serviços postais.
Como a satisfação das necessidades coletivas exige a renuncia a todo ou a parte do lucro, e as empresas
privadas não se compadecem com tal renuncia, o Estado tem de intervir, e tomando a seu cargo, geralmente, a
produção de bens.
Só os bens, que satisfazem simultaneamente necessidades coletivas e individuais, cuja oferta pelas empresas
privadas é considerada conveniente é que não suscitam a intervenção do Estado – ex.: pão.

Conclui-se que a passividade no consumo leva o Estado a produzir três categorias de bens:
a) Bens que só satisfazem necessidades coletivas;
b) Bens que satisfazem, além de necessidades coletivas, necessidades individuais gratuitamente ou a preço
inferior ao custo;
c) Bens que satisfazem, alem de necessidades coletivas, necessidades individuais a prelo igual ao custo, ou
superior ao custo, mas inferior ao que no mercado de estabeleceria caso a oferta coubesse às empresas
privadas.

Os bens produzidos pelo Estado e que satisfazem necessidades coletivas são sempre bens públicos, embora
muitos deles satisfaçam necessidades de satisfação ativa.

Bens públicos: limitam-se a satisfazer necessidades coletivas – ex.: serviço de profilaxia.


Bens semipúblicos: satisfazem as duas ordens de necessidades – ex.: administração da justiça.

Quem decide sobre a existência de necessidades coletivas e sobre a conveniência é o Estado – decisão
de caráter eminentemente político obedecendo a critérios variáveis de época para época, consoante a força relativa dos
grupos e classes sociais.

Resumidamente:
O Estado pretende que sejam satisfeitas determinadas necessidades coletivas, para tanto propõe-se produzir
bens; mas a produção de bens implica despesas; o Estado precisa, portanto, de obter receitas para cobrir essas
despesas, isto é, precisa de dinheiro, de meios de financiamento.

b) Meios de financiamento do Estado – o caso das receitas cobradas na produção de bens públicos – para
fazer face às suas despesas na produção de bens

 Os preços dos próprios bens que o Estado produz, oferece e vende.


- Estado tem património de direito privado (terras, fábricas…), daí resultando rendimentos líquidos (lucros e
juros) que podem ser destinados à cobertura das despesas com a satisfação das necessidades coletivas;
- Produz bens semipúblicos e muitas vezes cobra preços pela sua utilização individual;
 Os empréstimos – compreendida aqui neles a criação da moeda, tanto sob a forma de emissão de notas como
de aberturas de crédito junto dos bancos. Esta pode proceder ao contraimento de empréstimos. Se o Estado
recorrer acidentalmente ao crédito tem de lançar meio de outro meio de financiamento para pagar não só os
juros dos empréstimos contraídos, como o próprio capital desses empréstimos.
 Os impostos – principal meio de financiamento. Prestações impostas pelo Estado aos cidadãos, exigindo-lhes
unilateralmente sem dar especificamente nada em troca.

Há receitas que o Estado recebe em virtude de negócios jurídicos:


 Receitas voluntárias – manifestação da vontade de as criar; recitas patrimoniais; empréstimos;
 Receitas coativas – têm origem na ocorrência de determinados factos; taxas; impostos;

Fixação do montante:
 Por via de negócio – negocialmente estabelecido; receita voluntária;
 Por via de autoridade/por força da lei; receita coativa.
O montante tem importância em matéria de preços:
 Preços negocialmente estabelecidos – receitas patrimoniais – resultantes da exploração de bens do
património privado e da utilização individualizada. Ex.: venda de lenhas e árvores.
 Preços autoritariamente estabelecidos – taxas – Estado recebe pela prestação de outros serviços ou bens
semipúblicos. Ex.: pagamento de propinas pelos alunos.
 Importâncias que o Estado preleva sem das especificamente nada em troca – impostos.
 Somas que o Estado obtém através do crédito – empréstimos.

Por vezes os Estados não cobram receitas para obter meios de financiamento, mas para alcançar outros
fins, como, por exemplo, proteger indústrias, ou para impedir a inflação. Cobre-as para através da própria cobrança
satisfazer necessidades coletivas, produzir bens públicos – o bem da defesa da indústria e o bem estabilidade
económica.

Há receitas percebidas para satisfazer necessidades coletivas que não são meios de financiamento:
 Direitos alfandegários – embora não arrecade com o fim de cobrir despesas, a isso as destina logo. Embora
os tenha percebido com fins protetores, emprega-os diretamente na produção de bens públicos.

Em suma: as próprias receitas cobradas na produção de bens públicos são ou acabam por ser meios de financiamento
– podemos definir atividade financeira a atividade do Estado proposta à satisfação de necessidades coletivas e
concretizada em receitas e em despesas.

Finanças Públicas e Finanças Privadas

a) O Estado dispõe de impostos

A empresa privada produz bens, faz despesas, tem de financiar essas despesas… E quais os sues meios de
financiamento? Pode utilizar o dinheiro dos sócios, empréstimos, mas, em verdadeira análise são os preços recebidos
em troca dos bens que produz.
A situação do Estado é similar, contudo, este – Estado - cobra a maior parte das suas despesas com um meio
que só ele dispõe: a receita dos impostos – meio de financiamento próprio do Estado.
Na raiz dos meios de financiamento da empresa privada está sempre uma relação de troca – preços como
contraprestação.
O financiamento do Estado também se realiza com receitas obtidas por atos de troca, mas a maior parte
provém da cobrança de impostos.

b) Nas finanças do Estado não são as receitas que determinam as despesas

Uma empresa privada precisa de reconstituir, através da venda dos produtos e serviços, o valor dos capitais
fixos e circulantes utilizados na produção. Daí que tenha de pautar as suas despesas pelas receitas que possa obter.
Já o Estado pode lançar impostos, obrigando os cidadãos a entregar-lhe, sem contrapartidas, parcelas
do seu rendimento ou capital. “Ele” pode cobrar receitas na medida das despesas que se propõe realizar.
Costuma dizer-se que: Nas finanças privadas o montante das despesas é em função das receitas. Nas finanças
públicas o montante das receitas é função das despesas – despesas determinam as receitas.
No entanto, não é bem assim relativamente às finanças publicas. À medida que o Estado aumenta os impostos,
vai também aumentando a resistência dos contribuintes e não só dos contribuintes dos grupos ou classes sociais
dominadas, como de contribuintes, em número cada vez maior, dos grupos ou classes sociais mais dominantes. A
resistência de uns, a certa altura, torna-se tao forte que o Estado tem de a acatar, deixando de prosseguir no
agravamento dos impostos.
Quer dizer: mesmo admitindo que o Estado se desinteressasse do efeito das suas receitas e despesas, as despesas só
poderiam determinas as receitas dentro dos limites que põe ao aumento dos impostos a resistência vitoriosa dos
contribuintes. Hoje, no fundo, o Estado determina as receitas e as despesas em ordem aos fins que pretende atingir.

c) O Estado propõe-se satisfazer necessidades

A empresa produz bens; faz despesas; vende-os depois; e como os vende realiza receitas – procura trabalhar
no mínimo custo e transacionar as mercadorias pelo máximo preço; propõe-se a obter lucros.
O Estado também produz bens; faz despesas e tenta reduzir ao mínimo as suas despesas. Mas o Estado
ou não vende os bens que produz – caso dos bens públicos, que apenas satisfazem as necessidades coletivas – ou
vende a um preço que não é estabelecido com a mira do lucro, e sim com a da satisfação das necessidades
individuais julgada conveniente – bens semipúblicos.

Ciência das Finanças e Direito Financeiro

a) Finanças positivas e Finanças normativas

A ciência das finanças estuda a atividade financeira – atividade do Estado que se exprime em receitas e
despesas. Contudo, estes dois elementos têm, evidentemente, que estar submetidos a alguma finalidade. O estudo das
Finanças desdobra-se, assim, na ação desenvolvida pelo Estado para a satisfação de necessidades coletivas e no estudo
do que convém ser, da ação mais adequada para a satisfação das necessidades.
Sob o primeiro aspeto – o estudo do que é -, trata-se de Finanças positivas, explicando o comportamento do
Estado. Sob o segundo aspeto – o estudo do que convém ser – trata-se de Finanças normativas, que enunciam as
regras, normas, a que o Estado deve subordinar-se para o melhor cumprimento dos fins. Essas regras e normas
constituem a Política financeira.

b) Política financeira: finanças neutras e finanças intervencionistas – as fianças funcionais

Escola liberal: economia privada assegurava o máximo de produção e a reta distribuição do rendimento; o
Estado não devia cobrar receitas e pagar despesas com o fim de alterar a procura dos produtos e dos elementos
produtivos pelos particulares, nem de corrigir a distribuição de rendimentos que tal resultava.

Finanças neutras: aquelas que não modificam as posições relativas dos particulares, e que, portanto, tiram a
cada indivíduo através da cobrança de impostos, tanta utilidade quanta a que lhe restituem através da prestação de
bens públicos. Crítica: Nem sempre há equilíbrio entre a utilidade que perde e a utilidade que ganha cada contribuinte.

Finanças intervencionistas: finanças que pretendem modificar as condições da economia privada. Crescente
alargamento da ação do Estado; aumento progressivo das receitas e despesas públicas; Estado passou a intervir
frequentemente na vida económica com os seus instrumentos financeiros.

Atualmente o Estado visa três principais finalidades/objetivos capitais:


 Redistribuição do rendimento – transferência dos ricos para os pobres, serviços que os pobres beneficiam;
 Estabilidade económica – estabilidade do emprego e do nível dos preços a curto prazo; que o ritmo do
rendimento nacional ou o ritmo do seu aumento não sofra grandes quebras;
 Desenvolvimento económico – aumento do rendimento potencial a longo prazo, de modo a aumentar o mais
que possível o rendimento por habitante, a capitação do rendimento. Para isso, torna-se muitas vezes
necessário que o Estado atue sobre as estruturas económicas.
Como são objetivos cujo conseguimento mobiliza todas as espécies de instrumentos financeiros hoje fala-se
frequentemente, em vez de finanças intervencionista, em finanças funcionais – traduzindo a ideia de que a escolha
desses instrumentos, das receitas e despesas públicas, deve basear-se na maneira como cada uma delas funciona, nos
efeitos que exerce sobre a economia nacional.
Naturalmente que o Estado diz-se propor a tais finalidades em ordem ao bem-estar, ao aumento do bem-estar
social, mas nem sempre se mostram compatíveis: ex.: uma taxa elevada de desenvolvimento económico, exigindo a
redução do desemprego ao mínimo, dificilmente se coadunará co a estabilidade dos preços, desde logo porque os
monopólios existentes nos mercados dos elementos produtivos usarão do seu poder contratual para forçar a alta dos
preços das matérias-primas e dos salários, provocando a inflação-custo. Bem como uma larga redistribuição dos
rendimentos ode prejudicar o desenvolvimento económico, dado que os rendimentos passam dos ricos para os pobres,
que os vão certamente consumir – traduzindo-se numa redução de investimento.
Em casos de incompatibilidade de objetivos, a estrutura Estado deve decidir qual vale mais. Os factos
mostram que se opta geralmente pelo desenvolvimento económico – talvez por considerar que é capaz de oferecer
vantagens, embora díspares, a todos os grupos sociais, enquanto a estabilidade e a redistribuição têm de cingir-se a
servir interesses de apenas alguns grupos.
c) Direito Financeiro, Direito Tributário e Direito Fiscal

Direito Financeiro: normas que regulam a obtenção, gestão e o dispêndio dos meios financeiros públicos.

Direito Tributário: conjunto de normas relativas à obtenção de receita coativas cujo montante é autoritariamente
estabelecido pelo Estado. Regula, portanto, a aquisição de taxas e de impostos. Em suma: é o segmento do direito
financeiro que define como serão cobrados dos cidadãos (contribuintes) os tributos e outras obrigações a ele
relacionadas, para gerar receita para o Estado (fisco).

Direito Fiscal: conjunto de normas que respeitam à incidência, lançamento e cobrança dos impostos.

Texto 4 – PAULO TRIGO PEREIRA

O conceito económico de bem público

Introdução: bem comum e bem público:

Uma sociedade que seja incapaz de fornecer bens públicos que os seus cidadãos valorizam, corrigir os efeitos
nefastos ou positivos de externalidades, tratar dos seus recursos comuns de forma sustentável, não está a promover o
bem comum. Do mesmo modo uma democracia (a nível central ou local) que toma decisões erradas sobre bens mistos,
ou um mercado, em que certos agentes abusam de uma posição dominante para praticarem preços monopolistas, não
estão a contribuir para o “bem-estar social”.
O conceito mais aproximado de “bem comum” usado pelos economistas é o de “bem-estar social” (social
welfare). Do ponto de vista das políticas públicas o relevante é o efeito no “bem-estar social” de determinadas
medidas de política (ou da ausência delas quando necessárias). Neste contexto, três abordagens importantes são as do
utilitarismo (Jeremy Bentham), do rawlsianismo (John Rawls) e das capacidades básicas (Amartya Sen).

Utilitarismo: Uma política pública aumenta o bem-estar social se o efeito agregado dessa medida em todos os
indivíduos for positivo. O “bem comum”, o bem da sociedade, é assim definido, na perspetiva do individualismo
metodológico, como a soma, não ponderada, dos níveis de bem-estar de todos os indivíduos na sociedade. Se esta
soma aumenta, o bem-estar da sociedade melhora. Fazer uma ponte que liga dois municípios vizinhos aumentará o
bem-estar social se os benefícios para os seus utilizadores superar os custos de bem-estar dos impostos necessários
para a financiar. Com o utilitarismo o “bem comum” assenta, pela primeira vez, no bem-estar individual de todos os
cidadãos. Abordagem consequencialista.

Rawlsianismo: A abordagem de Rawls é no essencial contratualista, e de acordo com ele uma sociedade
“bem ordenada” é uma sociedade justa. Como pode uma sociedade promover o “bem comum” quando existem e
existirão sempre nela, mesmo após deliberação pública, diferentes (e porventura antagónicas) conceções acerca do que
constitui o “bem comum”? Não lhe interessa dar uma resposta direta ao que constitui o “bem comum”, mas sim
perceber que princípios de justiça devem estar incorporados nas instituições que vão deliberar sobre o que é o “bem
comum”. A justiça não tem a ver com “utilidade”, o cálculo do prazer e da dor, na linguagem de Bentham, mas antes
do mais com o acesso à mais extensa gama de liberdades individuais compatíveis com iguais liberdades dos outros.
Em segundo lugar, uma sociedade justa é aquela em que desigualdades económicas e sociais são vantajosas
para todos, isto é, também para benefício dos que estão em situação mais desfavorecida. Assim, para Rawls uma
determinada medida aumentará o bem-estar social se for decidida por instituições justas através de processos também
justos. Enquanto que o utilitarismo é sobretudo uma abordagem consequencialista de avaliação do bem comum a
abordagem de Rawls é mais uma abordagem processual.

 O que distingue os diferentes tipos de bens (públicos, privados, mistos) e quais as consequências que daqui
derivam para o papel do Estado, do mercado e do terceiro sector?
 Que problemas se colocam numa sociedade democrática para a determinação do nível óptimo de provisão de
bens públicos ou o nível ótimo das externalidades e quais as soluções, se existem, para esses problemas?

Bens públicos e privados:

Um bem público puro/coletivo é aquele em que, para a totalidade dos indivíduos de um dado território, não
existe rivalidade no consumo, e onde a exclusão ou não é possível ou caso seja possível não é desejável.
O consumo ser absolutamente rival significa que se um indivíduo utilizar ou consumir um bem (ou serviço),
outro indivíduo fica impossibilitado de o consumir. Se eu como uma maçã ninguém mais a poderá comer. Se dois
indivíduos desejam consumir um bem rival, o consumo conjunto será a soma do que cada um individualmente
consome. Por seu turno, o consumo é não rival se o consumo por parte de um indivíduo não diminui a quantidade
disponível para os restantes indivíduos consumirem.
A defesa nacional, uma atmosfera limpa, a justiça (no sentido abstrato do termo), são exemplos de bens
públicos em que não existe rivalidade no "consumo". Ou seja, se houver mais de qualquer um, todos beneficiam. Uma
outra caraterística que não é necessária, mas que por vezes tem sido considerada essencial para a caracterização de um
bem público, por que muitas vezes lhe anda associada, é a de não exclusão.
Um bem ou serviço é passível de exclusão se é possível excluir um indivíduo do consumo do bem, ou caso
não seja possível excluir, é, contudo, possível monitorar individualmente o consumo (de forma permanente ou
temporária) de modo que é possível praticar um preço associado à utilização do bem por cada indivíduo.
Um primeiro problema associado aos bens públicos é que os mercados competitivos ou não conseguem
fornecer nenhuma quantidade dos bens públicos puros ou conseguem fornecer quantidades insuficientes desses bens.

Diferenças entre bens públicos e privados:

 Os bens privados homogéneos são consumidos ao mesmo preço, mas em quantidades diferentes. A procura de
mercado é a soma horizontal das procuras individuais e os indivíduos ajustam as quantidades que consomem,
a esse preço único de mercado.
 A quantidade do bem público fornecida é única. O que significa que todos dispõem da mesma quantidade
quando ela é fornecida.
 Resumindo, em mercados competitivos, a produção e provisão descentralizada e privada de bens privados é
eficiente, mesmo com comportamentos egoístas de indivíduos atuando de forma atomística. Por outro lado, os
bens públicos colocam problemas diversos de natureza política que terão de ser resolvidos em democracia e
que são essencialmente três.

Externalidades e recursos comuns:

Uma externalidade existe, regra geral, quando a ação de um agente económico afeta (positiva ou
negativamente) o bem-estar de outro(s) agente(s) económico(s) sem que isso seja transmitido através do sistema
de preços. Há externalidades no consumo e na produção. As externalidades partilham as características de não
rivalidade e não exclusão referidas acima.
Se a fábrica da Secil no parque natural da Arrábida, ao processar os resíduos tóxicos, tiver um problema e
poluir a atmosfera circundante, todos os residentes na vizinhança serão afetados por isso e ninguém se poderá excluir.
Neste sentido, as externalidades negativas, como a referida, são consideradas como um “mal público” e as positivas
um “bem público” e mais uma vez se conclui que sem qualquer tipo de intervenção de um terceiro agente (do Estado
ou do “terceiro sector”, incluindo comunidade local), haverá uma afetação de recursos ineficiente e não haverá
promoção do “bem comum”.

Bens mistos sem e com “spillovers”:

Os bens mistos partilham algumas características de bens privados e de bens públicos. São bens de consumo
coletivo, de adesão voluntária, em que geralmente se pratica exclusão baseada num preço, existindo, pois,
partilha de benefícios e de custos entre os utilizadores. Aquilo que costuma caracterizar os bens mistos é que sendo
bens de consumo coletivo e tendo uma capacidade limitada, existe, a partir de um certo nível de utilização, uma
rivalidade parcial no consumo, isto é, agentes adicionais que consomem o bem/serviço geram uma externalidade
negativa nos restantes sob a forma de acrescido congestionamento. Mas por outro lado utilizadores adicionais significa
que (sem alteração da escala) cada utilizador pagará menos – custos marginais.
Uma ponderação destes benefícios e custos marginais de haver mais utilizadores permite determinar o número
de utilizadores ótimo para uma dada escala do bem (por exemplo dimensão de uma piscina, de um museu).
Genericamente é possível determinar qual a provisão eficiente destes “bens de clube”, que satisfaz simultaneamente
duas condições – o número de utilizadores ótimos para uma capacidade dada e a capacidade ótima para um dado
número de utilizadores.
Uma ponderação destes benefícios e custos marginais de haver mais utilizadores permite determinar o número
de utilizadores ótimo para uma dada escala do bem (por exemplo dimensão de uma piscina, de um museu).
Genericamente é possível determinar qual a provisão eficiente destes “bens de clube”, que satisfaz simultaneamente
duas condições – o número de utilizadores ótimos para uma capacidade dada e a capacidade ótima para um dado
número de utilizadores.
No segundo grupo estão todos os clubes propriamente ditos (de golfe, bridge, de futebol, bowling, etc.) e bens
ou serviços coletivos que não geram externalidades positivas significativas para o resto da sociedade.
Esta distinção é essencial do ponto de vista da identificação do que deve ser o papel das políticas públicas
para alcançar o “bem comum”, pois no primeiro caso elas devem existir enquanto que no segundo dever-se-á deixar
ao mercado, ou ao terceiro sector, a eventual produção desses bens. Retomaremos, pois, este tema, quando
abordarmos as decisões políticas na penúltima secção.

A introdução da dinâmica temporal:

Relativamente à exclusão, temos que distinguir uma componente legal e técnica da mesma.
 Componente legal - pressupõe uma definição clara dos direitos de propriedade. A propriedade pode ser
pública, privada ou comunal caso em que a exclusão legal é permitida e em que a entidade que pode praticar a
exclusão é respetivamente uma entidade pública (Estado, autarquia local) uma entidade privada (empresa) ou
uma comunidade através de variadas formas. Por outro lado, caso haja indefinição dos direitos de propriedade
não é possível praticar a exclusão;
 Componente técnica - relaciona-se com a tecnologia necessária para impedir alguém de consumir certo bem,
caso não esteja disposta a pagar o preço associado a esse consumo.

Quanto à rivalidade é preciso ter em conta que afirmar que não há rivalidade no presente, não significa que
não haja rivalidade no futuro.

Não havendo rivalidade e:

(a) Não sendo técnica e legalmente possível a exclusão a baixo preço, tem-se a categoria bens públicos puros (ex.:
defesa nacional, programa de rádio nacional);
(b) se é possível a exclusão, temos, por exemplo: televisão por cabo ou transmissão por satélite exigindo
descodificadores.

Se não há rivalidade no consumo no presente, mas poderá haver no futuro temos a categoria dos bens públicos
locais. Caso não seja possível a exclusão esse bem terá que ser fornecido publicamente. Caso seja possível a exclusão
no futuro quando o bem esteja congestionado, é possível uma provisão privada.

Quando a exclusão não é possível, ou por razões legais ou técnicas, ou porque não se pratica um preço apesar
de haver rivalidade no consumo (ou na produção), temos o caso dos bens e recursos comuns onde há, quer indefinição
de direitos de propriedade, quer definição, mas neste caso não é feita a exclusão (ou autorregulação do uso). Dois
exemplos ilustram os casos restantes. Se houver um terreno baldio, na medida em que ele é um recurso comum, cada
pastor tende a levar o seu rebanho a pastar, desde que haja pasto disponível pois retira benefícios marginais privados
positivos, e não tem custos com isso (os custos marginais privados são nulos14); no entanto, diminui o pasto
disponível para a comunidade e, no limite, com uma utilização intensiva, o terreno pode tornar-se estéril. Há uma
externalidade negativa que não é considerada

A análise da tipologia dos bens depende do regime jurídico (definição dos direitos de propriedade), da
tecnologia (capacidade maior ou menor de exclusão) das condições de mercado (maior ou menor procura
relativamente à capacidade) e de decisões políticas (praticar ou não exclusão no sector público). Não há uma
classificação rígida, única e imutável dos bens, mas antes uma classificação maleável e dinâmica. Isto sem prejuízo de
num dado momento a classificação ser inequívoca.

Mercado, Estado e Terceiro Sector:

O que sugere a tipologia de bens em relação ao papel do Estado, do Mercado e do Terceiro Sector numa
economia mista? Qual das instituições promove melhor o “bem comum”?

As características dos bens acima analisados não tem necessariamente a ver com as formas de provisão dos
bens ou serviços, isto é, as formas de fornecimento a quem os consome. Na realidade é importante distinguir provisão
e produção, pública e privada:
Incluir-se-á no termo produção, a produção do equipamento ou infraestrutura, a sua gestão e a manutenção e
considerar-se-á que ela é pública ou privada.
Por outro lado, a provisão pública é aquela em que o utilizador não paga no ato de utilização/consumo, ou
seja, ela é essencialmente financiada pelo Orçamento do Estado, ou por um orçamento de uma autarquia local, ao
passo que a provisão privada é financiada através de um preço, sendo o utilizador o pagador do serviço.

Forma institucional adequada de fornecer esses bens:

Tratando-se de bens privados que podem ser fornecidos em mercados competitivos, a instituição mercado é a
mais adequada para os fornecer. O mesmo tratando-se de bens mistos, caso não tenham significativas externalidades
positivas. A vantagem da produção e provisão privada de bens mistos, é que se forem rentáveis numa perspetiva de
médio prazo, isto é, se forem de facto bens mistos, serão fornecidos, caso contrário não serão. Neste caso a principal
desvantagem da produção pública de “bens” mistos é que poderão não ser rentáveis e ser produzidos.
Exemplo: Estádio do União de Leiria construído para o Euro 2004, que é um caso típico de um bem misto (ou
de clube) sem externalidades significativas para a população. Só seria construído por privados se, acautelados
devidamente os riscos de procura (previsibilidade de assistência aos jogos), houvesse algum investidor que o
considerasse rentável. De qualquer modo suportaria, privadamente, um eventual erro de cálculo do investimento.
Sendo produzido e financiado publicamente, sem deliberação pública sobre os custos de manutenção futuros, essa
avaliação não foi adequadamente feita levando neste momento a uma situação financeira insustentável.

Em relação a bens mistos, com possíveis externalidades positivas, a primeira questão que se deve colocar é a
avaliação e justificação dessas externalidades. Se elas de facto forem significativas em relação ao benefício privado
dos utilizadores, o que se sabe é que o mercado fracassará parcialmente na sua provisão privada. Para se alcançar uma
solução que corresponda ao interesse público de maximizar a eficiência, a subsidiação poder-se-á justificar.

Finalmente, no que diz respeito aos bens públicos, sobretudo se não se puder praticar exclusão (como nas
questões ambientais que abordaremos no final deste artigo), o mercado fracassa em geral totalmente e será mesmo
necessário alguma intervenção pública.

Democracia e votação sobre bens públicos:

Em democracia a decisão sobre o que são bens públicos, que quantidade se produz e como se financia, são
decisões políticas. O mesmo se trata para a avaliação das externalidades, a sua relevância ou não, pois delas derivam
consequências em termos de políticas públicas.

O nível ótimo de bens públicos e a forma de os financiar:

Quanto se deve gastar em defesa nacional? Quanto se deve gastar em investigação científica? Qual o nível
ótimo de despesa para melhorar a qualidade do ambiente? Em suma, quais os níveis eficientes de produção de bens
públicos?
De um ponto de vista teórico a resposta existe. Deve-se fornecer a quantidade para a qual a soma do que os
indivíduos estão dispostos a contribuir voluntariamente iguala o custo marginal de produção do bem. Já do ponto de
vista prático, visto que não é fácil determinar o que as pessoas estão dispostas a contribuir para o bem público, não é
possível determinar o nível ótimo de provisão.
Para além do problema da quantidade ótima, existe o problema do financiamento que remete essencialmente para
questões normativas de equidade. No fundo trata-se de saber quem deve suportar o ónus dos encargos públicos. Dada
a não rivalidade no consumo, todos potencialmente consomem e o “preço” (fiscal) do bem público pode ser financiado
pela totalidade dos cidadãos de um país (bens públicos nacionais) ou de uma localidade (bens públicos locais).
No caso local, dada a regressividade da maioria dos impostos locais (nomeadamente o IMI), os indivíduos de
menor rendimento financiam proporcionalmente mais os bens públicos locais.

Na realidade dentro das múltiplas modalidades de financiamento de bens públicos convém realçar duas formas
diferentes:
(A) Todos os indivíduos pagarem o mesmo, ou seja, o custo marginal de produção seria dividido uniformemente
por todos os indivíduos.
(B) Cada família contribuir em função do valor do seu património imobiliário num dado município - forma de
financiamento sobretudo usada ao nível dos bens públicos locais.
Votação sobre bens públicos e impostos (I): logrolling e o problema da “common pool”:

Como é que as sociedades atuais resolvem o problema da determinação dos níveis de produção dos bens
públicos nacionais e locais?

A determinação concreta resulta dos processos políticos e das escolhas coletivas quer nacionais quer locais e é
difícil resumir uma vasta literatura de escolhas coletivas e escolhas públicas.
Uma resposta simples ao problema seria que da competição política entre partidos que apresentam plataformas
políticas distintas ao eleitorado - isto é cabazes de bens públicos e de propostas redistributivas diferentes - resulta um
partido ou coligação vencedora que apresenta o “cabaz” de despesa/impostos, mais atrativo.

O problema do common pool pode verificar-se quando os benefícios são localizados territorialmente, mas os
custos são difusos à escala nacional ou europeia. O problema da common pool agravar-se-á se se assumir, como
frequentes vezes acontece, uma dimensão intergeracional. Se o perfil de benefícios e custos for tal que as gerações
futuras suportem uma maior parte dos custos e uma menor parcela dos benefícios, trata-se de uma redistribuição das
gerações futuras em relação às gerações presentes.

O problema do logrolling (ou troca de votos) é algo distinto e pode ser percebido ao nível estritamente local
com três grupos de cidadãos representados politicamente numa assembleia por três partidos de igual dimensão (A, B e
C), sendo que será necessária uma coligação entre quaisquer dois para que uma dada proposta seja aprovada.

Votação sobre bens públicos e impostos (II): a escolha das regras de votação:

Os titulares de cargos políticos, muitas vezes em vez de assumirem a humildade de tentar conhecer as
preferências dos cidadãos relativamente aos bens públicos, um processo que se sabe de antemão difícil, assumem uma
postura elitista, autoritária e por vezes autista de quem considera que por ter a legitimidade democrática sabe o que é
do interesse público. Obviamente que as duas coisas não estão relacionadas. Ter legitimidade democrática significa
tão só ter a capacidade e, em certos casos, a obrigação de decidir sobre bens coletivos. Não significa nenhuma
habilidade especial quer em ler as preferências dos cidadãos, quer em ponderar os diferentes argumentos favoráveis e
contra propostas concretas.
A ideia simples, mas poderosa, é que a existência de um critério mais apertado, isto, é mais consensual, para
se aprovar propostas sobre bens públicos, é uma forma de precisamente de tentar garantir que são bens públicos e
contribuem para o bem comum. Na realidade se uma maioria significativa apoia uma dada proposta, é natural que ela
contribua para a melhoria do bem-estar social, e se ela não reunir um consenso mínimo, muito provavelmente é
porque não se trata de um bem público e o melhor é não ser fornecido.

Democracia, deliberação e o bem comum:

Para alguns autores, a defesa do bem comum exige cidadãos bem informados, participativos e processos
políticos que envolvam a deliberação pública através do acesso público à informação relevante (isto é transparência),
equilibrados, onde argumentos contrários e fundamentados sobre importantes deliberações públicas possam ter lugar.

Conclusões:

A promoção do bem comum faz-se (ou não) através da capacidade de as sociedades democráticas terem
mecanismos institucionais adequados para decidir, através de processos de deliberação e eventual votação, acerca de
uma adequada afetação de recursos que assegure a produção e fornecimento de bens públicos e mistos, e a correção de
efeitos negativos ou positivos associados a externalidades. Também é essencial a existência de mercados
relativamente competitivos e, na sua impossibilidade, regulação de mercados monopolistas ou oligopolistas a favor do
interesse geral, que é entendido como o interesse dos cidadãos atuais e das gerações vindouras.
Porém, mais que analisar a engenharia do voto, é essencial desenvolver uma maior análise em torno dos
processos de deliberação e de tomada de decisão no sector público. Como se chega às decisões? Qual o sistema de
governação e os mecanismos institucionais subjacentes á tomada de decisão? Quais as condições de apreciação das
diferentes propostas em relação ao mesmo problema (seja as estradas, o TGV ou outro)? Quem faz os estudos é parte
interessada na decisão, ou seja, existe imparcialidade?
Texto 9 – SOUSA FRANCO – As receitas tributárias em geral

1. Os Tributos como receitas

(a) Fundamento e importância

Encontram, as receitas tributárias, o seu fundamento na existência de um dever genérico de cobertura dos
encargos públicos, que recai potencialmente sobre a totalidade dos membros de uma comunidade.
Em primeira mão, as receitas apresentam uma forma de organizar a participação dos cidadãos na cobertura das
necessidades publicas.
Pelo facto de constituir sempre uma receita pulica, distingue-se das prestações pessoais por ter conteúdo
patrimonial e normalmente pecuniário: distingue-se das prestações particulares por ser receita do Estado (ou de outra
entidade pública).

(b) O conceito de tributo

São todas as receitas publicas com os seguintes caracteres:

 Coativas ou obrigatórias – imposição obrigatória do Estado;


 Função de financiamento dos encargos públicos pela participação dos cidadãos e outras entidades ou
instituições sujeitas ao poder do Estado na criação de receitas;
 Caráter obrigacional e patrimonial;
 Originários da lei ou de outro ato de autoridade.

(c) Modalidades e regime

 Imposto – modalidade por excelência


 Taxa – resulta da preocupação de delimitar juridicamente os poderes do Estado e o património dos particulares
– consequência da formalização jurídica da ciência dos impostos.

 As contribuições especiais

Têm como fundamentos, ou um benefício individualizado reflexamente resultante da atuação de um sujeito


público, ou a necessidade de compensar o sujeito publico pelo uso anormal dos bens ou serviços públicos por parte de
certos sujeitos, os quais oneram mais gravemente as finanças do Estado ou deterioram bens públicos.
No primeiro caso tributar-se-ão, v.g., as mais valias prediais resultantes de certa obra pública. No segundo
caso, por exemplo a circulação de veículos pesados, que provoca maiores despesas de manutenção e reparação das
estradas.

A satisfação individual é ocasional e indireta – não é intencional e diretamente conexa com os fins da atividade
estadual que lhe dá origem.

Não é contribuição especial:


 Qualquer imposto consignado;
 Um imposto especial (como a contribuição do fundo de desemprego)
 Uma figura como a quotização para a previdência – consignada à criação das próprias utilidades gerais que a
justificam (o que não sucede com a contribuição especial) e não tem como fundamento situações individuais
(ao invés da taxa).

A nossa lei trata-as como meras espécies de impostos, visto que as técnicas seguidas na delimitação do facto
gerador do dever de pagar são idênticas para a contribuição e para o imposto. Os contribuintes haverão de ser
definidos de forma geral e abstrata, pois as satisfações divisíveis que auferem não são individualizáveis com
referência à atuação dum serviço ou ao comportamento de um sujeito. O caráter unilateral da contribuição especial é
mais pronunciado: enquanto na taxa não se pode duvidar da existência de uma verdadeira contrapartida do seu
pagamento, aqui ano é possível pensar nela.
2. As Taxas

a) Conceito

Prestação pecuniária (ou tributo) que pressupor ou dá origem a uma contraprestação específica resultante de
um relação concreta entre o contribuinte e um bem ou um serviço público.

b) Fundamentos

 Concreta relação com um serviço público: ex. custas judiciais. É o condenado que paga as custas; há taxas
que suportam o funcionamento de serviços de fiscalização do contribuinte….
 Na utilização de um bem do domínio público: há um ato de utilização que á origem à obrigação de pagar a
taxa.
 Remoção por ato administrativo de obstáculos jurídicos a um comportamento dos particulares: utilidade
livre e justificativa da dívida de taxa (licença).
 Emolumentos: usualmente atribuídos a funcionários – normalmente correspondem a uma forma de consignar
recetas através do serviço ao pagamento dos seus funcionários ou agentes.
 Diretos de mercê: importâncias pagas pela atribuição de títulos e galardões.

c) Principais modalidades

 Taxas judiciais vs. taxas administrativas:

As primeiras designam-se por custas judiciais, normalmente. Integram:


 Imposto de justiça – determinada % sobre o valor da causa (cofre de conservadores; funcionários da justiça…);
 Imposto de selo – outras % sobre o valor da causa, revertem para o tesouro;
 Encargos – devidos pelo processo, os quais por vezes são afetos a remunerar entidades intervenientes.

Das custas distinguem-se os preparos – entregas, no inicio do processo, de verbas destinadas a garantir ou custar
futuros pagamentos que sejam devidos.

 Taxas gerais – revertem para o Tesouro


 Taxas consignadas a cofres públicos ou entidades com tesouraria especial
 Taxas consignadas à remuneração de funcionários, agentes …

d) Caracteres da taxa

 A taxa pressupõe financeiramente certos tipos de utilização de um serviço ou bem público. É de uma dada
relação que surge o devido pagamento de taxas. Tal relação não consiste necessariamente, contudo, na
perceção em concreto de um benefício, nem sequer presumido: basta uma relação concreto com o
funcionamento, do serviço. Assim, nas custas judiciais, o contribuinte será, em principio, a parte que decaiu.

e) Delimitação entre taxas e rendimentos patrimoniais:

Os rendimentos do património serão sempre e só devidos por utilização dos bens patrimoniais ou remunerações de
serviços que são prestados em regime de mercado.

Normalmente, a taxa será paga em virtude da utilização de bens ou serviços que só o Estado ou entidades públicas
podem prestar, mas pode ser devida por quem não solicitou a prestação de serviços (custas judicias), por quem não
deu azo ao seu funcionamento, ou até por quem foi obrigado “de jure” ou “de facto” a recorrer a ele (registos, selos
fiscais de taxa).

Em suma: a taxa não é o preço de um serviço prestado em regime de mercado.

A taxa é um tributo autoritário, visa cobrir em geral os encargos (no sentido de despesas) públicos.

Critérios de fixação de taxas:


 Facilitar ou dificultar o acesso aos serviços públicos (custas judiciais);
 Proceder à justa distribuição dos encargos públicos.
O que se pretende não é cobrir o funcionamento do serviço, mas sim distribuir os encargos públicos entre os
cidadãos, de harmonia com critérios de justiça, como sucede com os impostos; daí que haja isenções de taxas,
mas não de preços.

As taxas nascem da prestação de serviços necessariamente inerentes ao poder político e de utilidades puramente
imateriais – o que não sucede com os rendimentos do património estadual.

f) Funções e critério da taxa

A utilidade presumida não tem de ser procurada pelo contribuinte, nem há-de ser por ele necessariamente
sentida como tal: basta que o tenha por destinatário individualizado (por ex. a taxa destinada a financiar a fiscalização
à qual o contribuinte está sujeito, que ele não pode desejar, e de apenas o publico em geral será beneficiário).
Um exemplo em que não tenha de facto de existir uma relação concreta são as custas judiciais (por exemplo a
revelia).

A relação com a prestação do serviço que é suscetível de colocar alguém na situação de contribuinte de taca pode ser
de diversas naturezas:

 Utilidade ou benefício concreto (taxas de recuso ao registo predial);


 Simples atribuição de poderes jurídicos aptos a concretizar uma relação jurídica concreta entre o contribuinte e
o serviço (custas judiciais devidas por uma parte);
 Exigência do contribuinte ao funcionamento do serviço (ensino; propinas).

Critérios de fixação. O legislador tem em vista dois princípios básicos:


 Garantir o principio do livre acesso ao serviço (polícia, sanitários), ou desfavorecer o seu uso precipitado e
moderado – principio da oportunidade e conveniência;
 A justa repartição dos encargos públicos – princípios do rendimento discal e justiça distributiva.

Ainda pode aproveitar-se a utilização necessária para obter rendimentos que excedam o custo: então a taxa contribui
para a cobertura dos encargos públicos exatamente como o imposto, havendo até quem haja defendido que estaremos
então perante figuras mistas (taxas devidas, por exemplo, por serviços de fiscalização a que o contribuinte está sujeito;
ou as cobradas por registos obrigatórios).

3. O imposto – figura típica da receita tributária

Gaston Jéze - o imposto como uma prestação pecuniária requerida dos particulares por via autoritária, a título
definitivo e sem contrapartida, com vista à cobertura dos encargos públicos.

Traços fundamentais:

 É uma obrigação legal1 cujo objeto é uma prestação patrimonial quase sempre pecuniária.
 É uma receita definitiva – não provoca qualquer devolução, reembolso…
 É uma receita com função não sancionatória, nem compensatória (multa por ex.).
 É uma receita unilateral – não existe qualquer contrapartida específica atribuída ao contribuinte. Ele terá
apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços públicos estaduais.

4. Os tributos parafiscais

a) Parafiscalidade e “parafinanças”

Ao lado do sistema financeiro clássico foram surgindo outros “sistemas financeiros”, marginais ou laterais,
que se integram também na maquina estadual, mas com diversas estruturas, finalidades e natureza, devido à assunção
de novas funções económicas e sociais por parte do Estado, muitas vezes confiadas a entidades que integram a
administração indireta do Estado, e surgem dotadas de ampla autonomia técnico-económico, com expressão natural no
campo financeiro.

1
Há impostos não criados por lei em certas ordens jurídicas.
A distinção particulariza-se na contraposição de impostos fiscais/orçamentais – cobrados pela administração
central, sujeitos ao principio da legalidade, anualidade e da inscrição orçamental e se subordina ao regime jurídico
comum – e impostos parafiscais.
Não são parafiscais os impostos da administração local – considera-se que nestes há formas próprias de
exprimir o consentimento e o controlo das populações – democracia local.

b) Os tributos parafiscais

Podem ser:
 Impostos
 Taxas;
 Outras contribuições do ponto de vista financeiro

 Natureza tributária geral

Elementos essenciais:
 Prestação obrigatória de carater patrimonial, normalmente pecuniário, não sancionatório e decorrente da
soberania fiscal como o imposto típico;
 Têm em regra desvios de regime em relação à forma normal de criação ou renovação das outras recetas de tipo
tributário (carência de previsão orçamental, anualidade e exigência de legalidade na criação da receita);
 Em regra, estas receitas são criadas e atribuídas para beneficiar IP da administração central ou outras pessoas
coletivas públicas, que não sejam AL, regiões e estados federados (pois a fiscalidade destas é própria), nem
empresas publicas concorrenciais. As contribuições parafiscais são atribuídas apenas e diretamente ao
Estado ou institutos e empresas publicas não concorrenciais.
 Receitas consignadas a funções económicas e sociais do Estado, ou do setor público em geral.
As instituições que mais cobram tributos parafiscais:
 Domínio social: instituições de previdência ou segurança social;
 Domínio económico: organismos de intervenção ou coordenação económica, IP em processo de extinção
devido à integração na CEE (1986).
Em ambos os casos, ou semelhantes, a parafiscalização é expressão tributária da desormentação da AP.

Problemas:

A natureza das contribuições pode encarar-se em duas perspetivas diversas:


 Essência financeira
 Natureza jurídica

No plano financeiro, estas podem ter qualquer uma das naturezas que as receitas de tipo tributário podem
assumir a (taxas, impostos, contribuições especiais…).
Elas surgiram no âmbito da atividade financeira:
 Numa tentativa de esconder, perante as conceções de índole liberal, o crescimento das despesas publicas
 Por relativo formalismo clássico do imposto.

Nas contribuições parafiscais há uma maior agilidade atribuída à AP quanto ao modo de criação e
agravamento e quanto ao próprio regime geral dessas receitas.

O seu traço distintivo não é, pois, uma diferente natureza financeira, mas ante e só a subtração ao regime
clássico da legalidade tributário e do orçamento do Estado.
Texto 10 - TEIXEIRA RIBEIRO – Progressividade e Proporcionalidade

A Justiça Fiscal

Ideia, do ponto de vista dos contribuintes, de uma justa distribuição dos encargos públicos.
A justiça fiscal condiciona a eficiência e o rendimento do sistema, na medida em que uma distribuição injusta
estimulará a fraude e a evasão fiscais e distorcerá comportamentos.

Princípios que concretizam a ideia de justiça fiscal:

 igualdade entre os cidadãos


 legalidade tributária – imposto deve ser estabelecido por lei provinda do Parlamento
 generalidade tributária – todos os residentes num determinado país, por regra, estão sujeitos ao pagamento
de impostos segundo critérios gerais
 capacidade fiscal – deve ser tributado na medida da capacidade

Igualdade Fiscal

a) Modalidades

 Igualdade perante a lei de imposto (106º e 13º CRP) – igualdade de tratamento dos cidadãos pela lei fiscal e
ainda proibição de qualquer privilégio e benefício: daqui resulta a inconstitucionalidade material de isenções
ou outros benefícios fiscais que tenham os fundamentos referidos no art.º 13º/2 CRP.
 Igualdade de sacrifícios – 1º todos pagariam o mesmo imposto, verificada a mesma situação de base – taxa
fixa.

Impostos indiretos – quem consome um quilo de carne de vaca paga x, quem consome dez quilos paga 10 x. Nos
impostos independentes de riqueza = (cada cidadãos paga por cabeça).

Quanto aos impostos diretos, designadamente sobre o rendimento, os clássicos viram adequadamente que a
igualdade de sacrifícios não resulta de um sacrifício igual por cabeça, mas sim a proporcionalidade ao rendimento. Se
A, que dispõe de um rendimento anial de 100, paga cinco de imposto, não será respeitar a igualdade impor o mesmo
sacrifício de cinco a quem tenha um rendimento anual de 10 (B).
O sacrifício real do contribuinte (B) é então muito superior ao do contribuinte A. B pagaria imposto privando-se de
bens necessários à sua subsistência, enquanto A pagaria do seu supérfluo/consumo poupança.

Assim:
 Deveria assegurar-se, por meio de isenções, que o rendimento necessário à satisfaçam de necessidades
mínimas de subsistência não fosse objeto de tributação (isenção o mínimo de existência);
 E haveria de garantir-se que os impostos sobre o rendimento fossem – pelo menos – proporcionais ao
rendimento.

Ano de 1870 – Teoria marginalista do rendimento – permitiu ver que o valor de todas as unidades de rendimento
não era idêntico para os sujeitos económicos. Uma vez que o sacrifício fiscal tem uma desutilidade que é função do
valor de cada unidade de rendimento: e o valor de cada uma destas não é igual, antes é medido pela utilidade
marginal perdida, isto é, pela utilidade da ultima unidade do bem de cada sujeito económico, pela qual se afere o
valor de todas as outras. É este o fundamento da tributação progressiva como forma de restabelecer a igualdade
económica de sacrifício fiscal entre contribuintes com diversos níveis de rendimento

Também a personalização do imposto é uma forma de realizar a igualdade social, tratando igualmente os
iguais e desigualmente os desiguais, e atribuindo efeito compensatório das desigualdades ao próprio sacrifício fiscal
(igualdade compensatória). Aqui há uma igualdade social passiva (ter em conta as desigualdades sociais existentes
antes do sacrifício fiscal) e uma igualdade social ativa (restabelecer condições mínimas de igualdade ou, no mínimo,
reduzir as desigualdades, envolvendo uma função extrafiscal do imposto – a função redistributiva.

Apontam para estes conceitos o art.º 107º CRP.


b) Igualdade, generalidade e uniformidade; igualdade horizontal e vertical

Generalidade: todos devem pagar imposto, sem distinção de classe, ordem ou estamento.
Uniformidade: a repartição dos impostos pelos cidadãos deve obedecer ao mesmo critério para todos.

O principio da uniformidade impõe que todos os que são titulares das mesmas formas de riqueza sejam
tributados da mesma forma (igualdade horizontal).

Se não há uma igualdade na sociedade, só uma desigualdade compensatória na tributação realizara a igualdade mais
profunda.

A igualdade vertical é expressão que informa os critérios de repartição do sacrifício fiscal entre pessoas com
rendimentos diferentes.

A legalidade fiscal

Pondo fim ao absolutismo no domínio fiscal, ela se ligou sobretudo à defesa da propriedade privada na sua
forma absoluta e individualista.

A exigência de autorização parlamentar em matéria tributária, alargando a participação politica e a progressiva


evolução para formas de sufrágio universal, tem como consequências não só a criação de novos impostos como a
alteração do regime jurídico dos já existentes em qualquer ponto considerado como essencial (ex.: taxa), deva ser feita
por lei; e que esse é um direito da pessoa (106º CRP).

A Generalidade Tributária

a) Conteúdo e fundamentos

Na DUDH surgiu um principio da maior importância para o estabelecimento de um sistema fiscal justo: a ideia de
generalidade tributária: todos deverão pagar impostos, não se justificando consequentemente que, em virtude da
pertença a uma determinada classe social, houvesse um tratamento fiscal de isenção.
A cobertura dos encargos públicos passa a ser considerada como uma obrigação geral de todas as classes, não
se aceitando que houvesse substituição do dever de pagar imposto pelas prestações militar da nobreza e pelos deveres
religiosos, educativos, culturais do clero.

b) Exceções à generalidade; os benefícios fiscais

Beneficio fiscal: situação especial mais favorável em que se encontra certo cidadão perante a lei d imposto, em
virtude de concorrerem na sua pessoa ou situação determinadas circunstancias genericamente previstas na lei.

 Tecnicamente inútil cobrar certos impostos – Estado cobrar a si mesmo, ex.


 É condição de justiça fiscal tratar certas situações de modo favorável: isenção do mínimo de existência, ex.
 Para a proteção ou estimulo, quer com objetivos de natureza económica (apoio a exortações) quer de natureza
cultural, social ou politica (isenções concedidas a emigrantes).

c) Modalidades de benefícios fiscais

 Isenção – situação em que alguém recai ou é excecionalmente objeto de uma disposição legal que impede o
nascimento da obrigação fiscal.
 Reduções de taxa – aplicação a determinados contribuintes taxas de imposto inferiores às normais previstas
na lei.
 Dedução à matéria coletável – permite-se que se deduza à matéria determinada um certo valor, tido como
um custo ou gasto socialmente justificado.
 Dedução à coleta – permite-se abater à coleta que o contribuinte deveria pagar uma qualquer despesa por ele
efetuada e que se considera de interesse público.
 Restituição do imposto – a posteriori
A capacidade fiscal

Cada um deve pagar uma parcela adequada dos encargos públicos.

Cada um deve pagar na medida dos benefícios que recebe do Estado – via comutativa do principio do beneficio.
Crítica: seriam os mais desfavorecidos a suportar os maiores encargos

Cada contribuinte deve pagar na medida da sua capacidade, independentemente de qualquer consideração sobre a
estrutura das despesas públicas ou a utilidade que destas retira – principio das faculdades contributivas.

Estes princípios pressupõem que os contribuintes são tratados com igualdade e que os seus pagamentos implicam um
sacrifício igual para cada um deles – igualdade horizontal - e que os contribuintes com diferentes rendimentos
pagam diferentes prestações, com desutilidade o perda de utilidade equivalentes – igualdade vertical.

Como se determinam as faculdades contributivas?

 Rendimento

Controvérsia entre tributação do rendimento ou d o consumo, tendo os defensores da segunda , como principal
argumento, que não se deveria tributar as parcelas de rendimento destinadas a investimento ou poupança, as quais
corresponderiam a aplicações socialmente uteis, ao contrário do consumo, que representava uma mera atitude
improdutiva de satisfação imediata de necessidades individuais.

Pode-se em qualquer caso afirmar a possibilidade de optar por sistemas de tributação mista – tidos como indicadores
quer o rendimento, quer o consumo, quer mesmo a riqueza imobilizada.

A justiça e a repartição da carga fiscal

a) Formulação do problema

Quais os critérios que permitem determinar o sacrifício que será exigido a cada particular?

b) Tributação regressiva, proporcional e progressiva

 Impostos proporcionais – fixando-se a mesma taxa proporcional, determina-se um diferente tratamento de


rendimentos diferentes, tal que em valor monetário vão ser sobrecarregados os mais ricos. A taxa de imposto é
sempre a mesma, qualquer que seja o rendimento. Se, ex., a taxa for de dois por cento e a matéria coletável de
cem, a prestação exigida será de dois, mas se a matéria coletável for de mil a coleta será de vinte.
 Impostos progressivos – o sacrifício nominal é tanto mais elevado em termos percentuais quanto mais o
rendimento. Ex.: para um rendimento de 100 a taxa é de um por cento, mas para um rendimento de 400 a taxa
é de quatro por cento.

c) Critérios de tributação regressiva, proporcional e progressiva

 Impostos regressivos – estabelecidos para reduzir os sacrifícios fiscais dos mais ricos.
 Impostos proporcionais – tributação liberal típica. Séc. XIX enuncia-se que é justo em termos relativos,
porque em muitos casos implica um sacrifício mais gravoso para quem detém menos volume de rendimentos.
 Impostos progressivos – diferentes espécies:

1. Progressividade contínua e por escalões


Continua: qualquer variação de riqueza corresponde a uma variação de taxa de imposto.
Por escalões: as variações fazem-se em relação a grandes classes de rendimentos. Ex:

- Entre 10 e 100 ------- taxa 1%


- De 101 a 500 ----- taxa 2%
- De 501 a 1000 --- taxa 3%
Esta é a progressividade mais adotada. Devido:
 Simplicidade
 Não é a igualda matemática (contínua) que interessa, mas sim uma progressividade justa em termos sociais.

2. Impostos progressivos e degressivos

No segundo parte-se de uma taxa muito baixa que irá aumentar à medida que os rendimentos aumentam. No
primeiro dá-se o inverso.

3. Progressividade limitada e ilimitada; limitações de base e de topo

Limitações ao principio da progressividade:


 Até certo volume de rendimentos, ou não há imposto de qualquer tipo ou há uma taxa proporcional
 A partir de certo montante encontramos grandes variações de taxas
 Acima de um montante já elevado, a taxa volta a ser proporcional, qualquer que seja o montante do
rendimento.

A ilimitariedade é teórica uma vez que a progressividade concreta é sempre limitada. É o caso, entre nós, do
imposto profissional e do imposto complementar – progressivos de força limitada e por escalões.

d) A discussão acerca da tributação proporcional e da progressiva

A prestação tributária, quanto à proporcionalidade, seria sempre constantemente proporcional à riqueza.


No final do séc. XIX, porém, começou a defender-se a progressividade tributária.

Argumentação a favor da proporcionalidade:

 Seguro quanto à sua aplicação


 Fácil para o contribuinte e serviços, uma vez que não exige grande trabalho no cálculo da coleta.
 Justo porque determina uma proporção, considerada justa entre rendimento e riqueza, e neutral, porque não
infere nas desigualdades crescentes em que assenta o progresso de um sistema económico concorrencial
 Considerado o imposto mais adequado à economia de mercado

Argumentação a favor da progressividade (defesa mais complexa):

 Difícil porque desde logo contém em si uma certa dose de arbitrariedade e injustiças concretas suscitadas
pelos casos situados no limite dos escalões
 É mais difícil para serviços e contribuintes sobre quais os rendimentos que estão sujeitos a uma ou outra taxa
 Quanto aos fatores positivos: a progressividade é mais justa que a proporcional – se se tributar pela mesma
taxa os contribuintes, o sacrifício fiscal será muito para os que têm rendimentos muito baixos. Este argumento
foi quantificado por diversos autores a partir da teoria marginalista do rendimento:
Jurisprudência – imposto; taxa; contribuições

O imposto constitui uma prestação pecuniária, coativa e unilateral, exigida com o propósito de angariação de
receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e
que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. O que permite
compreender que os impostos assentem essencialmente na capacidade contributiva dos sujeitos passivos,
revelada através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária).

A taxa constitui uma prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de
prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza
sinalagmática. A taxa pressupõe a realização de uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta
entre o contribuinte e a Administração e que poderá traduzir -se na prestação de um serviço público, na utilização de
um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares (artigo 4.º,
n.º 2, da Lei Geral Tributária).

A taxa tem igualmente a finalidade de angariação de receita. Mas enquanto que nos impostos esse propósito
fiscal está dissociado de qualquer prestação pública, na medida em que as receitas se destinam a prover
indistintamente às necessidades financeiras da comunidade, em cumprimento de um dever geral de solidariedade, nas
taxas surge relacionado com a compensação de um custo ou valor das prestações de que o sujeito passivo é
causador ou beneficiário. Assim, ‘a bilateralidade das taxas não passa apenas pelo seu pressuposto, constituído por
dada prestação administrativa, mas também pela sua finalidade, que consiste na compensação dessa mesma prestação.
Se a taxa constitui um tributo comutativo não é simplesmente porque seja exigida pela ocasião de uma prestação
pública, mas porque é exigida em função dessa prestação, dando corpo a uma relação de troca com o contribuinte’
(Sérgio Vasques, em ‘Manual de Direito Fiscal’, pág. 207, ed. de 2011, Almedina).

Entretanto, a revisão constitucional de 1997 introduziu, a propósito da delimitação da reserva parlamentar, a


categoria tributária das contribuições financeiras a favor das entidades públicas, dando cobertura constitucional a um
conjunto de tributos parafiscais que se situam num ponto intermédio entre a taxa e o imposto (artigo 165.º, n.º 1,
alínea i)). As contribuições financeiras constituem um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas
como taxas coletivas, na medida em que compartilham em parte da natureza dos impostos (porque não têm
necessariamente uma contrapartida individualizada para cada contribuinte) e em parte da natureza das taxas (porque
visam retribuir o serviço prestado por uma instituição pública a certo círculo ou certa categoria de pessoas ou
entidades que beneficiam coletivamente de um atividade administrativa) (Gomes Canotilho/Vital Moreira, em
‘Constituição da República Portuguesa Anotada’, I vol., pág. 1095, 4.ª ed., Coimbra Editora).

As contribuições distinguem -se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações
efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas
presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade
genérica. Preenchem esse requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo
homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de
uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades
que através dessa atividade se pretendem atingir (sobre estes aspetos, Sérgio Vasques, ob. cit., pág. 221, e Suzana
Tavares da Silva, em ‘As taxas e a coerência do sistema tributário’, pág. 89 -91, 2.ª edição, Coimbra Editora). Por via
da nova redação dada à norma do artigo 165.º, n.º 1, alínea i), a Constituição autonomizou uma terceira categoria de
tributos, para efeitos de reserva de lei parlamentar, relativizando as diferenças entre os tributos unilaterais e os tributos
comutativos e obrigando a uma reformulação da discussão sobre a exigência da reserva de lei, relativamente às
contribuições especiais que não se pudessem enquadrar no preciso conceito de taxa.

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