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Desse modo, os escravos passaram a práticas de resistência com fugas, criação de quilombos
e revoltas, como a do Malês.
Em 1835, na província da Bahia, uma quantidade significativa de escravos
alforriados, levantou-se com o propósito de libertar escravos, matar brancos e mulatos
considerados traidores e por fim a escravidão.
Os revoltosos foram delatados e as autoridades locais armaram uma contra
ofensiva, alguns escravos morreram, outros foram a julgamento com sentença entre
açoitamento ao fuzilamento e muitos outros já libertos, foram expulsos e mandados para a
África.
Nesse contexto conflituoso entre dominados e dominadores em território
brasileiro, e a campanha internacional contra a escravidão, sendo a Inglaterra maior oponente
do sistema escravista, fato que favorecia suas atividades comerciais. O governo brasileiro
aprovou a lei Eusébio de Queiroz (1850) proibindo o tráfico de escravos para o Brasil. Com a
proibição do tráfico internacional, os cafeicultores tiveram que recorrer ao tráfico interno.
O discurso abolicionista sob a tese de que a mancha do escravismo desfigurava
a imagem “moderna” e “civilizada” de uma nação associada a Idéias Iluministas de Liberdade
e República favoreceu a aprovação de leis como a do Ventre Livre ‘assegurando’ a liberdade
de filhos de escravos que nascessem após a aprovação desta lei em 1871.
E a Sexagenário (1885) que dava liberdade a todos os escravos com mais de
sessenta e cinco anos, fato este que somente favorecia ao proprietário por não ter que
sustentar os escravos idosos sem condições de trabalho. Como confirma Emilia Viotti da
COSTA (1985): “A abolição libertou os brancos do fardo da escravidão e abandonou os
negros a própria sorte”.
A lei áurea que trouxe alforria aos escravos foi assinada em maio de 1888,
começou nesse momento as dificuldades para integrar os ex - escravos à sociedade. Alguns
plantaram roça de subsistência, outros conseguiram empregos precários em regiões rurais ou
cidade, formando uma mão de obra barata e marginalizada.
Foi grande o número de desempregados e subempregados, todos considerados
na época pelas elites da sociedade como “preguiçosos, malandros e vadios”. Juízos de valor
que em certa medida persistem numa evidência de que o preconceito é continuamente
alimentado por uma situação de inferioridade social.
“Olhamos os negros com rancor como se eles tivessem escolhido vir para cá
“manchar a sociedade branca”. Após escravizá-los, reclamamos de seu caráter
submisso. Após esmagá-los de trabalho, por séculos, falamos de sua preguiça.
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Depois de deixá-los na rua, quando da Abolição, não nos conformamos com sua
pobreza”. (PINSKY, 2000, p. 23).
Em 1890, apenas dois anos depois da assinatura da Lei Áurea, 56% dos
habitantes do Brasil eram negros, sem incentivo a educação. Onde apenas 1% dos 800 mil
escravos libertos foram alfabetizados. Esses também, não receberam apoio governamental
para sobreviver longe do julgo dos antigos senhores ou medidas políticas de preparação e
absorção dessa mão de obra desqualificada na época.
Ao invés de universalizar o acesso à escola e distribuir terras aos ex-escravos,
o Estado incentivou a imigração. Cerca de 3,8 milhões de imigrantes italianos, portugueses,
espanhóis, alemães e japoneses entraram no país entre os anos de 1887 - 1930, para trabalhar
fundamentalmente nas lavouras das regiões, sudeste e sul do país.
À medida, que tirou dos negros as vagas na lavoura e indústria nascente,
resultou num branqueamento da população brasileira. Em 1940, os negros representavam
menos de 36% dos habitantes. Essa parcela da população não conseguia trabalho por não ter
escolaridade e não conseguia educar os filhos porque não possuía trabalho. Assim a
discriminação racial passa a andar de mãos dadas com a fortíssima concentração de renda nas
mãos dos brancos, no Brasil.
A partir da década de 1970, com a redução da taxa de natalidade mais
acentuada entre os brancos, a porcentagem dos negros começou a crescer. Em 1976, o Brasil
contava 57% de brancos e 40% de negros. Em 1987, os negros já eram 43% e, em 2006,
49,5%. Segundo os dados do Ipea, se as tendências de crescimento demográfico não se
alterarem, em 2010 os negros serão maioria absoluta da população brasileira superando o total
de brancos, amarelos e indígenas juntos.
Fazendo uma leitura da realidade de vida enfrentada pela população de baixa
renda no Brasil atual, podemos constatar que boa parte desse quadro são afro – descendentes,
que vivem em situações de riscos. Com baixos índices, quanto à expectativa de vida,
educação, cultura e saúde, pela falta saneamento básico, água, alimentação saudável, escola,
lazer e o direito, de usufruir de meios mínimos para uma melhor organização social.
Contudo, por pesquisas realizadas pelo, (IPEA e PNAD) em 2005 e 2006, são
perceptíveis algumas melhorias na relação e trato com a população afro-descendente no
Brasil. Um relatório elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), baseado
na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), mostra que: a taxa de desemprego
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entre os negros é de 9,3% contra 7,5% entre brancos e que o desemprego atinge 4,5 de negros
e 3,7 milhões de brancos.
Quanto aos pagamentos, 60% dos trabalhadores negros recebem um salário
mínimo e menos de 22% recebem mais de dez salários mínimos. Entre os brancos, essas
porcentagens são de 39% e 76%, respectivamente. Sobre a expectativa de vida e escolaridade,
podemos contatar que: a taxa de mortalidade caiu de 84% para 27%; o índice de
analfabetismo também reduziu no país, em 1995 era de 9,5% entre os brancos e 23,4% entre
os negros. Dez anos depois, essas taxas eram, respectivamente, de 6,5% e 9,5%.
Essas diferenças já foram maiores. A redução começou a ocorrer a partir de
2001, com a implementação de políticas sociais como o Bolsa Família e a valorização do
salário mínimo. A questão da escolaridade ainda é fato de questionamentos e grandes
discussões entre vários grupos sociais e representantes do movimento negro no Brasil.
Um fato que ainda gera polêmicas é o regime de cotas nas universidades, pois
há pessoas que defendem sua aplicação como meio de superação e avanço no índice de acesso
e permanência acadêmica para a população afro-descendente. Enquanto há grupos que
discordam do sistema de cotas afirmando ser uma forma de rotular e discriminar ainda mais
essa população.
Diante desta discussão, é interessante destacar que, embora seja uma fonte de
críticas ou aprovações de diferentes segmentos da sociedade brasileira, os dadosii revelam que
atualmente no país há por volta de 20 mil cotistas negros em universidades brasileiras. E
destaca a função do ProUni, desde 2005, como um sistema que abre caminhos para jovens de
baixa renda, entrar em diferentes cursos de graduação e possíveis inserções ao mercado de
trabalho.
Após essa análise e discussão de dados estatísticos e debates sobre a realidade
social entre brancos e negros no Brasil em processo e construção de cidadania identificando
perdas e avanços. É necessário salientar, que a 121 anos da abolição ainda permanece um
quadro de desigualdade racial seguida de discriminação social. Onde o próprio Governo
Federal, representado pelo Ministro da Igualdade Racial Edson Santosiii reconheceu esse
índice, através de sua fala: “o negro deixou a senzala para morar na favela”.
Tendo esta fala como base e a proposta defendida por Andrelino Campos em
seu livro intitulado: Do Quilombo à Favela a Produção do “Espaço Criminalizado” no
Rio de Janeiro. Ao destacar os negros, os pobres e seus espaços. Relatar as condições de
vida na favela controlada pelo narcotráfico em uma abordagem que considera as relações
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sociais, as questões relativas ao gênero e à idéia do país como multirracial e com sensíveis
desníveis sociais.
Cabe propor um projeto interdisciplinar, utilizando o filme Cidade dos Homens
(uma produção nacional sob a direção de Paulo Morelli - 2007), como ponto de referência
para a contextualização do negro como morador de favela na cidade do Rio de Janeiro e sua
realidade social, ao se inserir neste espaço após a abolição e na atualidade. Esta sugestão se
insere dentro da dinâmica e entendimento do cinema como fonte de pesquisa, passível de
análise e reflexão.
Por conter diversos filmes que pelo seu conteúdo e abordagem trazem
perspectivas metodológicas que se aplicam em um diálogo com o público, pela importância
que esse meio de comunicação exerce na sociedade contemporânea, quanto pela questão da
imagem estar relacionada no processo do conhecimento histórico. Exercendo um papel
importante na vida humana, pois nessas estão contidas as necessidades, os interesses, as
emoções e os desejos.
Desse modo, o documento fílmico não pode ser visto ou analisado como uma
verdade incontestável ou como simples realidade do tema apresentado na obra. Mas é preciso
reconhecer o filme como produto de seu tempo, compreender o contexto histórico de sua
produção, identificar os signos as formas de narrativa e a intencionalidade inserida na obra.
Cidade dos Homens foi ambientado em favelas do Rio de Janeiro, com uma
narrativa que relata a historia dois amigos: Laranjinha e Acerola, que cresceram juntos na
favela carioca do Morro da Sinuca. Quando chegam à maioridade, enfrentam as primeiras
dificuldades da vida adulta. Com um filho de dois anos, um casamento precipitado com a
namorada Cristiane, Acerola sente falta da liberdade. Laranjinha que dirige moto – táxi e faz
sucesso com as mulheres, sofre pela ausência do pai que não conhece.
No mês em que completam dezoito anos, os dois tomam uma decisão: Acerola
quer agitar sua vida amorosa e Laranjinha quer conhecer o pai. Mas, a guerra explode no
morro e as coisas complicam-se para ambos. Madrugadão, que comanda o tráfico no Morro
da Sinuca, perde o posto para Nefasto, seu ex-braço direito.
Laranjinha primo de Madrugadão tem que sumir de casa, assim como Acerola,
que atrai a ira de Nefasto em um lance de azar. Em meio à confusão, Cristiane anuncia que
vai trabalhar na cidade de São Paulo, deixando o filho com Acerola. E com o pai de
Laranjinha, surge uma revelação amarga, que ameaça arruinar a inabalável amizade da dupla.
Cidade dos Homens é um filme que reúne argumentos para a discussão sobre a realidade
social de favelas da cidade do Rio de Janeiro na atualidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Nesta perspectiva, é importante destacar que a lei 10.639/03 é uma das medidas
políticas em ações afirmativas de reparação, reconhecimento e valorização da cultura e
identidade da população africana e afro-descendente. Por tratar-se de uma política curricular
fundamentada em dimensões históricas, antropológicas e sociais quanto à realidade brasileira.
Em um estudo e metodologia de trabalho que resulte na conscientização social sobre a
convivência com a diversidade em suas variadas formas de expressão. Visto que a sociedade
brasileira tem suas raízes fundadas na miscigenação entre povos de nacionalidades diversas.
NOTAS:
i
Graduada em História pela Universidade Estadual de Maringá (2003). Atualmente faço parte do corpo de
funcionários da Secretaria do Estado de Educação de São Paulo, como Titular de Cargo: Professora Educação
Básica II (História), com sede e exercício na Escola Estadual Florivaldo Leal, Diretoria de Ensino de Presidente
Prudente. E-mail e032050a@see.sp.gov.br.
ii
Trecho do “Manifesto em defesa da justiça e constitucionalidade das cotas” entregue ao Supremo Tribunal
Federal em maio de 2008.
iii
Frase mencionada à imprensa nas comemorações dos 120 da assinatura da Lei Áurea. 13/05/2008.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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MUNANGA, Kabengele & GOMES, Nilma Lino. O Negro no Brasil de Hoje: Histórias,
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Como usar o Cinema na Sala de Aula. São Paulo: Contexto, 2009.
OSTERMANN, Nilse Wink. Filmes Contam História. Porto Alegre: Movimento, 2006.
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XAVIER, Ismail. O Cinema Brasileiro Moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
ZALUAR, Alba & MARCOS, Alvito. Um Século de Favela. Rio de Janeiro: (org.), FGV,
2006.