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Da ópera Die Zauberflote de Wolfgang Amadeus Mozart com libreto de Emanuel Schikaneder

A FLAUTA MÁGICA
Adaptação do libreto por Vanessa Dantas

Desenhos de Heloísa Frederico

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PERSONAGENS

A ação se passa em terra egípcia imaginária.

Por ordem de entrada

TAMINO – Príncipe estrangeiro

DAMAS DA NOITE – A serviço da RAINHA DA NOITE

PAPAGUENO – Homem pássaro e também caçador de pássaros

RAINHA DA NOITE – Senhora da noite

MOZART – Gênio

ESCRAVOS – A serviço de MONÓSTATOS

MONÓSTATOS – Mouro cruel

PAMINA – Filha da RAINHA DA NOITE

ORADOR – Do Templo da Sabedoria

ZARASTRO – Sacerdote que governa o Templo da


Sabedoria

PAPAGUENA – Enamorada de PAPAGUENO

Outros

GUARDIÕES

SACERDOTES

SEGUIDORES DE ZARASTRO

ANIMAIS DIVERSOS

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ATO I

CENA I

Uma terrível noite em um lugar rochoso, onde tudo é possível.


Clarões de trovões por vezes se sobressaem à cena. Surgem várias serpentes voadoras.
Entre elas está o príncipe TAMINO, que tenta se proteger do ataque delas. De repente, também pelos ares,
surge a mais monstruosa serpente, que afugenta as demais. Ela parte para cima de TAMINO, voraz.
Nr. 1 – Introdução
(TAMINO, DEPOIS DAMAS)
TAMINO – Socorro! Socorro!
Serei devorado!
Socorro! Socorro!
Estou acabado!
A grande serpente não terá dó
Parece faminta!
É este o meu fim!
É este o meu fim!
Oh, salvem-me!
Protejam-me!
Escutem-me!
Oh, deuses! É o fim!
Oh, deuses! É o fim!

TAMINO desmaia.
De modo fantástico surgem três DAMAS, cobertas por véus,
cada qual trazendo uma lança de prata.

DAMAS 1, 2, 3 (apontam suas lanças) – Morre serpente!


Morre já!

A monstruosa serpente cai morta.

Triunfo! Triunfo!
O monstro mau não vai mais perturbar!

As DAMAS cercam TAMINO.

DAMA 1 – Que belo jovem eu vejo aqui...

DAMA 2 – Tão gracioso assim eu nunca vi...

DAMA 3 – Até desacordado ele sorri...

DAMA 1 (para a DAMA 2) – Corra à rainha


E conte do rapaz
Talvez o jovem possa
Trazer de volta a paz!

DAMA 2 (para as DAMAS 1 e 3) – Não, não! Eu que não vou!


Melhor ir só vocês!

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DAMA 3 (para a DAMA 1) – Por que você não vai?

DAMA 1 (para a DAMA 2) – Por que você não vai?

DAMA 2 (para a DAMA 3) – Por que você não vai?

DAMA 3 – Eu não vou!

DAMA 2 – Eu não vou!

DAMA 1 – Eu não vou!

DAMAS 1, 2, 3 – Não, não!

As DAMAS irritam-se umas com as outras e cada uma emburra em um canto.

DAMA 1 – Eu que não vou!

DAMA 2 – Eu que não vou!

DAMA 3 – Eu que não vou!

As DAMAS cercam TAMINO novamente.


DAMA 1 – Eu cuido!

DAMA 2 – Eu cuido!

DAMA 3 – Eu cuido!

DAMAS 1, 2, 3 – Eu cuido do rapaz!


Sou bem mais capaz!

DAMAS 1, 2, 3 (cada uma à parte) – Esperam que eu vá pra longe,


Mas... Eu digo que:

DAMA 1 - Não vou!

DAMAS 2 E 3 – Não vou!

DAMA 1 - Não vou!

DAMAS 2 E 3 – Não vou!

DAMAS 1, 2, 3 – Não vou deixá-lo pra trás!


Não vou deixá-lo pra trás!
Não vou deixá-lo pra trás!

DAMA 1 – Oh, jovem belo! Seja meu!

DAMA 2 – Meu coração é todo seu!

DAMA 3 – Quem ama mais aqui sou eu!

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DAMA 1 – Se ele fosse todo meu...

DAMA 2 – Se ele fosse todo meu...

DAMA 3 – Se ele fosse todo meu...

DAMAS 1, 2, 3 – Só meu! Só meu!

Claridade de um trovão. As DAMAS se assustam.

DAMAS 1, 2, 3 – Oh não, oh não, oh não, oh não...


Mas isso tudo é ilusão!
Se a Rainha descobrir
Vai ser breve nosso fim!
Nós devemos lhe servir!
É melhor então partir!
Vamos nós três!
Adeus,
Adeus,
Adeus, meu rapaz!
Até,
Até,
Até logo mais!
Adeus belo rapaz!
Adeus!
Adeus!
Adeus!
Adeus meu bom rapaz!
Adeus meigo rapaz!
Adeus lindo rapaz!

As DAMAS desaparecem.
TAMINO acorda e vê a monstruosa serpente imóvel no chão.

Monólogo

TAMINO – Que lugar é este?... Eu ainda sou eu ou apenas sonho que estou vivo? É a minha imaginação ou
o monstro foi ferido? Não! Está morto! Mas quem foi que me salvou deste monstro?

Ao longe se ouve uma flauta de pan, acompanhada suavemente pela orquestra.


TAMINO fala durante o ritornelo.

TAMINO – O que é isso?


Vem alguém aí...
É gente ou bicho?

TAMINO se esconde.

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Nr. 2 Ária de PAPAGUENO
PAPAGUENO entra durante a introdução de sua ária.
Ele carrega uma enorme gaiola nas costas. Em suas mãos há uma flauta de pan.
Diversos pássaros o rodeiam. Durante a ária ele vai atraindo os pássaros para dentro da gaiola.

PAPAGUENO (toca a flauta de pan) – Eu sou Papagueno, sim, sou sim


Saltitante, sempre vou assim
Eu preparo armadilhas, pois sou caçador
Um passarinheiro ao seu dispor!
Andorinha, pardalzinho e até colibri
Quando toco meu apito todos vem pra mim!

(toca a flauta de pan)

Minha vida é feliz


Só tenho uma dor
Meu apito me traz aves,
Mas não traz o meu amor

(toca a flauta de pan)

Eu sou Papagueno, sim, sou sim


Saltitante, sempre vou assim
Se eu tivesse uma rede grande eu não teria dó
Pescaria mil donzelas em uma tacada só

Pediria para elas muitos beijos e carinhos


Mas depois as trocaria por um saco de docinhos

(toca a flauta de pan)

E pr’aquela que me fizesse o seu senhor


Eu daria os meus doces como prova de amor!

(toca a flauta de pan)

Surge TAMINO do esconderijo.

Diálogo

TAMINO – Ei! Você aí!

PAPAGUENO (com medo) – O que é que tenho eu aqui?

TAMINO – Você é um passarinho?

PAPAGUENO (irritado) – Passarinho? Você disse passarinho? Eu não sou um passarinho! Sou gente que
nem você! Gentíssima, fique sabendo! E se agora eu perguntasse quem é você?

TAMINO (acha graça) – Meu nome é Tamino. O meu pai é um rei. Governa muitas terras e homens para
além deste lugar. Por isso todos me chamam de príncipe.

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PAPAGUENO – Existem terras para além deste lugar? E homens também?

TAMINO – Existe, sim.

PAPAGUENO – Hahá! Vou ampliar os meus negócios!

TAMINO – E com o que você trabalha amigo?

PAPAGUENO – Eu sou um caçador de pássaros. No momento capturo aves das mais diferentes espécies
para a Rainha da Noite. Em troca as damas dela me dão de comer e beber.

TAMINO – Rainha da Noite?! E você já viu essa deusa?

PAPAGUENO – Só mesmo um estrangeiro faria uma pergunta estúpida com essa. Ver a Rainha da Noite!
Onde já se viu? Que mortal poderia se gabar de já tê-la visto? Que olhar humano conseguiria enxergar
através do seu negro e misterioso véu? E eu vou logo avisando! Se você vier com mais uma pergunta tola,
eu juro tão certo quanto o meu nome é Papagueno, que eu o prendo na minha gaiola para vendê-lo como ave
de espécie rara às damas da Rainha. E se elas vão fritar ou assar você, isso não será problema meu. O que é
que você está olhando? (aparte) Estou começando a ficar com medo desse olhar... (Para TAMINO) Nunca
viu, não? O que é que foi?

TAMINO – É porque essas penas que o cobrem fazem com que você pareça...

PAPAGUENO – Um passarinho? Se continuar com essa história de passarinho vai se arrepender!

TAMINO puxa uma pena do corpo de Papagueno.

PAPAGUENO – Ai! Faça isso novamente e irá despertar a minha fúria! Sou capaz de acertar quem quer que
seja com a força de um gigante!

TAMINO – Com a força de um gigante?

PAPAGUENO – (aparte) Se ele não ficar logo com medo de mim eu juro que saio correndo!

TAMINO – Então foi você que acertou a grande serpente?

PAPAGUENO – Que serpente?

TAMINO – Esta que está bem aqui atrás de nós.

PAPAGUENO (histérico salta para o colo de TAMINO) – Ela está viva ou morta?!?!

TAMINO – Eu já entendi. Você me salvou e por modéstia não está querendo confessar. Mas devo dizer que
serei eternamente grato pela tua coragem!

PAPAGUENO – Bobagem! O importante é que tudo acabou bem.

TAMINO – Por curiosidade, amigo... Como você conseguiu acertar esse monstro? Você não tem armas!

PAPAGUENO (desce do colo de TAMINO) – E eu lá preciso? A força que tenho vale mais que todas as
armas. O fato é que a serpentinha, coitada - distraída, é claro - deixou o próprio pescoço vir parar em minhas
mãos. E então me deu vontade de dar uma apertadinha. Para ser mais claro, eu a estrangulei! (Aparte) Nunca
fui tão forte como hoje!

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DAMAS EM OFF (enfurecidas com a mentira de PAPAGUENO) – Papagueno!

PAPAGUENO (procura de onde vêm as vozes) – Sou eu!

TAMINO – De quem são essas vozes?

PAPAGUENO – São das damas que servem a Rainha da Noite.

TAMINO – E onde elas estão? São bonitas?

PAPAGUENO – Ah, são feias!... Se fossem bonitas não andariam escondidas embaixo daqueles véus.

DAMAS EM OFF (mais enfurecidas) Papagueno!

PAPAGUENO (fala baixo para TAMINO) – Acho que sinto certo tom de ameaça em suas vozes... (Fala
propositalmente alto) É como eu estava dizendo, amigo! As damas da Rainha? São lindas! Lindas, não!
Lindíssimas! E além do mais são gentis, queridas! (Fala baixo para TAMINO) Pronto! Logo ficam
boazinhas.

DAMAS EM OFF (muito enfurecidas) – Papagueno!

PAPAGUENO se esconde atrás de sua gaiola.


De modo fantástico surgem as DAMAS. Elas rodeiam PAPAGUENO.

DAMA 1 – Como treme a pobre criatura!

DAMA 2 – Será medo de nós?

DAMA 3 – Não pode ser... Ele tem a força de um gigante para se defender.

PAPAGUENO (sem graça) – Estão irritadas comigo porque que estou atrasado com a entrega dos pássaros?

DAMA 1 – Não.

DAMA 2 – Está no prazo.

DAMA 3 – Nos entregue.

PAPAGUENO entrega a gaiola.

DAMA 1 – Muito bem, Papagueno. Agora as suas recompensas.

DAMA 2 – Nossa Rainha manda para você, em lugar de vinho, apenas água.

PAPAGUENO – Água?

DAMA 3 – Sim, pura e cristalina.

DAMA 1 – E ordenou-me que lhe entregasse ao invés de pão, esta suculenta pedra!

PAPAGUENO – Mas eu não consigo comer pedras...

DAMA 3 (retira uma pena de PAPAGUENO) – Que pena!

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PAPAGUENO – Ai!

DAMA 2 – E em vez de figos doces?

DAMA 1 – Que tal um cadeado?

DAMA 3 – Mas só se for para calar essa matraca!

A DAMA 3 coloca um cadeado na boca de PAPAGUENO.

DAMA 1 – Você já deve saber por que a Rainha o está punindo...

DAMA 2 – Para que nunca mais minta para estranhos!

DAMA 3 – E nunca mais se vanglorie de feitos heróicos que não realizou!

DAMA 1, 2, 3 – Foi você que derrotou a grande serpente?

PAPAGUENO faz gesto que não.

DAMA 3 – Não? Oh, querido... Quem foi então?

PAPAGUENO faz gesto de que não sabe.


As DAMAS rodeiam TAMINO.

DAMAS 1, 2, 3 – Fomos nós, príncipe Tamino, que o libertamos dela.

DAMA 2 – Está com medo?

DAMA 3 – É claro que está.

DAMA 1 – Mas não há motivos para temer. Com boas vindas a Rainha da Noite lhe envia o retrato de sua
filha. Se esse rosto lhe for caro, esperam-te a felicidade,

DAMA 2 – a honra...

DAMA 3 – e a glória!

DAMAS 1, 2, 3 – Adeus! (Para PAPAGUENO) Adeus, Monsieur Papagueno.

DAMA 1 – Tome cuidado ao se deliciar com as suas recompensas.

DAMAS 2 e 3 – Pois poderá se engasgar! Háháháhá!

AS DAMAS saem correndo e PAPAGUENO corre atrás delas, implorando perdão.


TAMINO observa o retrato. No mesmo instante é tomado de um amor incontrolável.

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Nr. 3 Ária de TAMINO
TAMINO – A imagem que eu vejo aqui
É a mais bonita que eu já vi!
Pintura... Divina!
O amor me diz
Que junto a ti eu serei feliz!

Uma chama queima aqui dentro!


É o amor um forte sentimento!

Ah, se eu pudesse ter o meu amor...


Ah, se eu pudesse lhe dar meu amor...

Diria...
Não, eu a abraçaria!
E com ela em meu peito
Eu pediria para que fosse eternamente minha!

Ouve-se as vozes das DAMAS em off.

Diálogo

DAMA 1 – Nossa Rainha ouviu cada uma de suas palavras...

DAMA 2 – Leu o amor em cada feição do seu rosto...

DAMA 3– Disse-nos: “Se este jovem tiver coragem e perseverança tanto quanto tem de ternura, então é
certo que ele é o predestinado a salvar minha filha Pamina!

TAMINO (olha o retrato) – Salvar Pamina?

As DAMAS surgem como um passe de mágica.


Elas rodeiam TAMINO novamente, desta vez em tom sombrio.

DAMA 1 – A princesa Pamina foi seqüestrada por um vilão!

DAMA 2 – Um bruxo!

DAMA 3 – Traiçoeiro!

TAMINO – Qual o nome do tirano?

DAMAS 1, 2, 3 – Zarastro!

TAMINO – Como poderei encontrá-lo?

DAMA 1 – Perto daqui há um vale.

DAMA 2 – Um vale muito bonito e resplandecente.

DAMA 3 – Um lugar muito bem vigiado.

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DAMA 1 – Mas cuidado, Tamino!

DAMA 2 – O terrível bruxo traz consigo um medalhão, o poderoso Círculo Solar das Sete Auréolas.

DAMA 3 – Tome o medalhão, resgate a princesa...

DAMAS 1, 2, 3 – E traga-os para a nossa Rainha!

DAMA 1 – Sem o poder do Círculo Solar os atos de crueldade de Zarastro terão fim!

TAMINO – Salvarei a princesa Pamina das mãos desse monstro! Juro pelo meu amor!

Ouve-se um rumor de trovão.


Em tom sinistro, quase em sussurro, as DAMAS preparam TAMINO.

DAMA 2 – Está ouvindo um trovão distante?...

DAMAS 3 – Ele anuncia que nossa Rainha se aproxima...

DAMA 1 – Prepare-se...

Ouve-se agora um estrondoso trovão.


DAMAS 1, 2, 3 – É ela!
Outro estrondoso trovão.
DAMAS 1, 2, 3 – É ela!
Outro estrondoso trovão.
DAMAS 1, 2, 3 – É ela!

A noite desce até a terra.


Acentua-se o clima sombrio, porém a imagem é imponente e fascinante.

Nr 4 Recitativo e Ária da RAINHA DA NOITE


RAINHA DA NOITE – Oh, filho meu! Não temas, não!
És inocente, sábio, bom
Nasceste para ser guerreiro forte
Ajude-me, eu choro a minha sorte!
Eu vivo triste e desolada,
Não tenho mais nenhuma paz...
Pamina foi-me arrancada!
Aconteceu assim, em um zás trás!
Foi ele!
Zarastro,
Quem a levou!

Foi tudo tão terrível!


Pamina tão sensível
Chorava, lutava,
Clamava por mim, ali!

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De nada adiantou ela clamar:
- Oh, mãe! Oh, mãe!
Pois eu não a salvei...
Mas eu tentei! Como tentei!
Foi tudo em vão!
Tudo em vão,
Eu falhei...
Tu, tu, tu,
Pamina tu vais libertar!
Tu serás o seu salvador!
Sim!
Tu serás o seu salvador!
Vá, liberte o seu amor!

Quando voltares vencedor dessa empreitada


Com muito gosto dou-te a mão da tua amada!
Do teu amor!
Do teu amor!

A RAINHA DA NOITE desaparece. Tudo volta a ser como antes.

Monólogo

TAMINO – É mesmo verdade tudo que acaba de acontecer? O retrato em minhas mãos me faz crer que sim.
Oh, deuses! Iluminem meu caminho para que eu possa encontrar Pamina!

TAMINO faz menção de sair e se depara com PAPAGUENO.

Nr 5 Quinteto
(PAPAGUENO, TAMINO, DAMAS)

PAPAGUENO (através de gestos pede para que TAMINO o ajude a se livrar do cadeado) –
Hum, hum, hum, hum,
Hum, hum, hum, hum...

TAMINO – Seu passarinho mentiroso!


Quem mandou ser tão vaidoso!

PAPAGUENO (bravo, faz gestos que expliquem que não é passarinho) – Hum, hum, hum, hum,
Hum, hum, hum, hum...

TAMINO (se faz de desentendido) – Eu não consigo entender


Que tal você me escrever?

PAPAGUENO (faz gesto que explique que não sabe escrever) – Hum, hum, hum, hum...

TAMINO – Você não sabe?


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PAPAGUENO (faz gesto que confirme que não sabe) – Hum, hum, hum, hum...

TAMINO – Eu sinto muito.

PAPAGUENO (com novo gesto explica que quer ajuda para se livrar do cadeado) –
Hum, hum, hum, hum...

TAMINO (se faz de desentendido) – Eu não entendo o que quer dizer.

PAPAGUENO (faz gesto que explique que então irá cortar relações) – Hum, hum, hum, hum...

TAMINO (se compadece) – Você venceu, vou te livrar


(tenta retirar o cadeado)
Não deu, só posso lamentar!

Entram as DAMAS.

DAMA 1 (para PAPAGUENO) – Você foi perdoado


Retire o cadeado!

PAPAGUENO consegue retirar com facilidade o cadeado da boca.

PAPAGUENO – De novo Papagueno fala!

DAMA 2 – Não minta mais (mostra-lhe o cadeado) ou de novo cala!

PAPAGUENO – Eu juro, eu juro! Nunca mais!

DAMA 3 – Essa lição vai te lembrar!

PAPAGUENO – Oh, sim, vai me lembrar!

DAMAS, 1, 2, 3 – Vai te lembrar! Vai te lembrar!

TAMINO, PAPAGUENO – Ah, se vai!

As DAMAS cercam TAMINO.


Elas entregam para ele a flauta mágica.

DAMA 1 – Alteza, o dom que aqui recebe


A nossa soberana lhe concede!

DAMA 2 – A flauta mágica é sua!

DAMA 3 – Misteriosa como a Lua!

DAMAS 1, 2, 3 – A flauta com sua magia


Transforma dor em alegria!

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O mau em bom
Com o seu som.
Desilusão?
De novo é paixão!

PAPAGUENO – Veio mesmo em boa hora


Damas... (Faz Reverências) Vou-me embora!

DAMAS 1, 2, 3 – Um momento, Papagueno!


A Rainha o escolheu!
De Tamino siga o rastro.
O acompanhe até Zarastro!

PAPAGUENO – Eu não vou, não vou, não vou!


Um covarde é o que sou!
Eu estou bem informado.
Não nasci pra ser caçado,
Depenado, Cozinhado,
Desossado e jantado!
Não sou bobo! Eu não vou!

DAMAS 1, 2, 3 – Mas Tamino irá vencer!


Ele irá te proteger!

PAPAGUENO – Ele que vá para o diabo!


Se eu for eu vou morrer.
Não confio nesse príncipe
É o primeiro a correr!

DAMA 2 (entrega a PAPAGUENO uma caixinha) – Um presentinho pra você!

PAPAGUENO (felicíssimo) – Há, há!


O que há dentro?

DAMAS 1, 2, 3 – Há muitos mágicos sininhos!

PAPAGUENO – Posso tocar só um pouquinho?

DAMAS 1, 2, 3 – Agora não, só no caminho!!!

DAMAS 1, 2, 3 – Melodias encantadas


Serão úteis na empreitada!
Agora, adeus!

TAMINO E PAPAGUENO – Adeus, adeus!

Todos vão saindo. De repente TAMINO e PAPAGUENO voltam.

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TAMINO – Oh, damas,
Podem nos dizer...

PAPAGUENO – Qual o caminho a percorrer?

As DAMAS fazem reverência ao alegre gênio MOZART, que surge pelos ares dentro de um balão.
Ele vem acompanhado de duas CORUJAS, que estão empoleiradas no veículo aéreo.

DAMAS 1, 2, 3 – O gênio Mozart vai lhes guiar,


Vai lhes orientar com grande maestria!
Sempre a ele devem escutar,
Sua melodia os conduzirá!
Enfim, adeus!

TAMINO, PAPAGUENO – Adeus, adeus, adeus!

TAMINO e PAPAGUENO seguem o balão. As DAMAS desaparecem.

CENA II

A cena se transforma em uma sala suntuosa, decorada com motivos egípcios.


Nela, três ESCRAVOS rolam de rir. Em seguida entra um quarto ESCRAVO.
Ele observa os outros que riem. Em seguida ri também.

Diálogo

ESCRAVO 4 – Por que estamos rindo? Hhahaahahahh!

ESCRAVO 1 – O nosso amo carrasco!... Hhahahahahaha!

ESCRAVO 2 – Monóstatos, o mouro barrigudo!

Os ESCRAVOS trocam olhares cúmplices.

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 – Barrigudo! Barrigudo! Barrigudo! Hhaahahahahaa!

ESCRAVO 3 – Será enforcado amanhã! Aposto!

Os ESCRAVOS trocam olhares cúmplices.

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 – Enforcado, enforcado, enforcado! Hhaahahahah!

ESCRAVO 4 – A mando de quem?

ESCRAVOS 1, 2, 3 – De Zarastro!

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ESCRAVO 4 – Mas por quê?

ESCRAVO 2 – Pamina fugiu!


Os ESCRAVOS trocam olhares cúmplices.

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 – Fugiu! Fugiu! Fugiu! Hhahahaahahaha!

ESCRAVO 4 – Mas como isso foi acontecer?

Enquanto o ESCRAVO 1 conta a história de como PAMINA fugiu


os ESCRAVOS 2 e 3 encenam o relato.

ESCRAVO 1 – Monóstatos estava escondido pelos jardins de Zarastro espreitando Pamina, que triste e
sozinha colhia flores silvestres. De repente ele deu um bote na moça e a prendeu em seus braços! Tudo ia
bem para ele, que vinha para cá trazendo Pamina consigo a força. Aí se deu o erro. No meio do caminho, o
Mouro a soltou e achando-se galã, começou a se declarar para ela.

ESCRAVO 2 (imita MONÓSTATOS) – Eu te amo, eu te adoro, eu te quero! Casa comigo?

ESCRAVO 3 (imita PAMINA) – Não.

ESCRAVO 2 (imita MONÓSTATOS) – Vai casar, sim! Eu te amo, eu te adoro, eu te quero!

ESCRAVO 1 – Quando ele já se julgava o próprio noivo daquela que ele cobiçava, a moça o enganou:

ESCRAVO 3 (imita PAMINA apontando para um lugar) – Zarastro!

ESCRAVO 1 – E enquanto Monóstatos fazia xixi nas calças pensando ser Zarastro, a moça, esperta como
ela só fugiu pelo rio, em uma canoa. Dizem que remava velozmente em direção aos domínios da Rainha da
Noite. É muito apegada a mãe.

ESCRAVO 4 – Logo Zarastro ficará ciente de quem verdadeiramente é Monóstatos!

ESCRAVO 1 – E mesmo que Zarastro tome Pamina novamente da Rainha da Noite, o mouro não terá
salvação!
Os ESCRAVOS trocam olhares cúmplices.

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 – Não terá! Não terá! Não terá! Hahahahaah!

Ouve-se a voz de MONÓSTATOS e PAMINA.

MONÓSTATOS (em off) – Escravos!

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 (surpresos, tremem de medo) – Monóstatos!

MONÓSTATOS (em off) – Preparem a gaiola!

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PAMINA (em off) – Me largue, bruto!

MONÓSTATOS (em off) – Cale essa boca!

Os ESCRAVOS observam a chegada de MONÓSTATOS e PAMINA.

ESCRAVO 2 – Oh, deuses! Por essa ninguém esperava! Monóstatos conseguiu resgatar Pamina!

ESCRAVO 3 – Reparem como o diabo vem trazendo a coitada arrastada, agarrado a suas mãos delicadas...

ESCRAVOS 1, 2, 3, 4 (tiram um lenço para enxugarem as lágrimas) – Judiação!

MONÓSTATOS (em off) – A gaiola!!!!

OS ESCRAVOS mais do que depressa encontram uma chave e abrem uma grande gaiola de ouro.

Entra MONÓSTATOS trazendo PAMINA arrastada.

Nr.6 Trio
(MONÓSTATOS, PAMINA E PAPAGUENO)

MONÓSTATOS – Mais uma e eu a matarei!

PAMINA – É bom matar ou fugirei!

MONÓSTATOS – Não seja malcriada!

PAMINA – Você não vale nada!


Quanto tormento eu já passei, nem sei!
Eu vou fugir! A qualquer hora eu fugirei!

MONÓSTATOS (para os ESCRAVOS) Vocês! Podem trancá-la!


(para PAMINA) À força eu a terei, sim!

Os ESCRAVOS prendem PAMINA dentro da gaiola.


Depois entregam a chave para MONÓSTATOS.

PAMINA – Vilão! Você vai ver!


Pois muito em breve, eu vou...
Eu vou...
Morrer!

PAMINA desfalece no chão da gaiola. MONOSTATOS e ESCRAVOS a cercam.

MONÓSTATOS (desesperado) – Oh, não! Oh, não!

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MONÓSTATOS ouve o pulso de PAMINA através das grades.

MONÓSTATOS (aliviado) – Ela só desmaiou...

MONÓSTATOS afugenta os ESCRAVOS.


Depois ele se coloca de um lado da gaiola e passa abanar PAMINA.
PAPAGUENO surge na janela que fica do outro lado da gaiola.

PAPAGUENO – Onde eu estou?


Eu me perdi...
Há, há! Uma gaiola!
Vejo uma mocinha ali!

Não há ninguém,
Então eu entrarei!
Ser for Pamina,
Tão fácil a encontrei!

Pelas grades da gaiola MONÓSTATOS e PAPAGUENO dão de cara um com o outro e se assustam.

MONÓSTATOS e PAPAGUENO – Bu!

Os dois ficam de costas um para o outro.

MONÓSTATOS E PAPAGUENO – Não sei quem é


Vou dar no pé!
Se for o cão? (Cada um pensa ser o diabo que veio levá-lo)
Perdão! Perdão!

PAPAGUENO – Tenha dó de mim!

MONÓSTATOS – Tenha dó de mim!

PAPAGUENO – Perdoe-me!

MONÓSTATOS – Perdoe-me!

PAPAGUENO – Bu!

MONÓSTATOS – Bu!

PAPAGUENO – Bu!

MONÓSTATOS – Bu!

MONÓSTATOS E PAPAGUENO – Bu! Bu!

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Ficam cara a cara novamente e se assustam um com o outro.
MONÓSTATOS sai correndo. PAPAGUENO se recupera do susto e tenta abrir a gaiola.
PAMINA acorda.

Diálogo

PAMINA – Quem é você?

PAPAGUENO – Um enviado da Rainha da Noite.

PAMINA – Da minha mãe?

PAPAGUENO – (Consegue abrir a gaiola) Pronto! Está livre!

PAMINA (receosa em sair da gaiola) – Qual o seu nome?

PAPAGUENO – Papagueno.

PAMINA – Então você diz a verdade. Já ouvi minha mãe falar de você. Obrigada, deuses! Obrigada!

PAPAGUENO – Mas agora sou eu que preciso ter certeza que você é mesmo Pamina. Tenho aqui um
retrato da filha da rainha. Vou verificar! Fique sabendo que não sou fácil de enrolar. Sou muito esperto.
Vamos lá: (Observa o retrato) Dois olhos. (Observa PAMINA) Sim, dois olhos! (Observa o retrato) Um
nariz. (Observa PAMINA) Está aqui o nariz! (Observa o retrato) Uma boca. (Observa PAMINA) Temos aqui
uma boca. (Observa o retrato. Depois observa PAMINA) Espere aí... (Volta a observar o retrato) Hum...
Tudo bem... Vou deixar passar essa discordância aqui...

PAMINA – Qual?

PAPAGUENO (mostra o retrato a PAMINA) – Pelo retrato você não deveria ter mãos e nem pés.

PAMINA – Hahaha! Gostei de você. Como conseguiu um retrato meu?

PAPAGUENO – De um modo muito corajoso! Eu o capturei de uma feroz serpente! (Olha para a platéia,
sorri amarelo) Brincadeirinha!... Eu peguei emprestado de Tamino.

PAMINA – E quem é Tamino?

PAPAGUENO – É um príncipe estrangeiro. Ele agradou tanto a tua mãe que recebeu dela esse teu retrato
com a missão de te salvar! Ao ver a tua imagem Tamino foi arrebatado por um amor incontrolável.

PAMINA (apaixonada pela palavra amor) – Amor? Ele me ama, então?

PAPAGUENO – Se ama? Morre de amor por ti!

PAMINA – E onde você entra nessa história?

19
PAPAGUENO – Ah, eu só estou acompanhando Tamino. Quer dizer, estava. Eu me perdi e acabei parando
neste lugar. Mas o príncipe não tarda a te encontrar. Tem como guia ninguém menos que o gênio Mozart!

PAMINA – Então antecipemos nosso encontro. Não podemos continuar aqui. A propósito, muito obrigada
por me libertar. Você tem um bom coração.

PAPAGENO – E de que adianta ter um bom coração se eu não encontro uma companheira?

PAMINA – Os deuses hão de te recompensar com uma passarinha! Vamos, não podemos mais ficar. (Sai)

PAPAGUENO – Passarinha? Ei, eu não sou passarinho! Penso que o príncipe e essa daí foram feitos um
para o outro! Só eles acham que eu sou um passarinho... (Sai)

CENA III

A cena se transforma em um bosque sagrado. Ainda é noite.


Ao fundo pode-se ver um majestoso Templo, o Templo da Sabedoria.
Entra em cena o balão do gênio MOZART, que rege as duas CORUJAS empoleiradas no veículo aéreo.
Através da música eles orientam TAMINO, que os seguiu até ali.

Nr 7 Quinteto
(TAMINO, CORUJAS, MOZART)

CORUJAS – Enfim chegaste ao destino


Sê bravo, corajoso!
É valioso nosso ensino
Sê firme, sábio, silencioso!

TAMINO – Amigos digam, por favor:


Como salvar o meu amor?

O alegre maestro MOZART diverte-se e se inclui no coro com as corujas.

MOZART E CORUJAS – Em breve tu vais descobrir


Sê firme, sábio, silencioso!
Os teus princípios não deves trair
E hás de ser herói vitorioso!

MOZART sai de cena com as CORUJAS e seu balão.

Diálogo

TAMINO (lê a inscrição no portal do Templo) – “Templo da Sabedoria”. A beleza deste lugar indica que o
saber, o trabalho e as artes reinam por aqui. Sendo assim, não sobra espaço para a maldade. Ah, Zarastro não
perde por esperar!
20
TAMINO tenta entrar no Templo.

VOZES DO TEMPLO – Para trás!

TAMINO – Para trás? Tento novamente!

TAMINO tenta novamente.

VOZ DO TEMPLO – Para trás!


Surge o ORADOR.

ORADOR – O que você procura no Templo da Sabedoria, estrangeiro?

TAMINO – O amor e a virtude!

ORADOR – Não os encontrará enquanto teu coração pulsar por ódio e vingança.

TAMINO – Vingança apenas ao bruxo cruel!

ORADOR – Mas não há nenhum bruxo entre nós. Muito menos cruel.

TAMINO – Pois eu lhe digo que há! Zarastro não vive aqui?

ORADOR – Vive, sim.

TAMINO – Pois então eu lhe peço, senhor. Leve-me ao seu governante! Zarastro é um homem mau e
precisa ser punido!

ORADOR – Mas Zarastro é quem governa este lugar.

TAMINO – O que? Não pode ser... Então nesse Templo impera a hipocrisia! Como pode um tirano governar
o Templo da Sabedoria?

ORADOR – Jovem, eu posso lhe afirmar que Zarastro não é um tirano. Ele é um homem sábio, bom e
sagrado.

TAMINO – Não é o que diz uma mãe infeliz que chora por sua filha! O que foi que ele fez com Pamina?
Diga! Ela está viva?

ORADOR – Sim, está.

TAMINO – Então o senhor confessa que o bruxo arrebatou a princesa dos braços da Rainha da Noite?

ORADOR – Isso realmente aconteceu. Mas não tire conclusões precipitadas. Tal mulher o enganou com
suas lágrimas! O envenenou com cada palavra! Se Zarastro estivesse aqui para lhe contar os motivos que o
levaram a cometer esse ato, você lhe daria razão.

21
TAMINO – Explique melhor este enigma!

ORADOR – Tudo tem a sua hora. A verdade nunca tarda a aparecer. Em breve você verá!

TAMINO se distrai em seus pensamentos. O ORADOR desaparece.

TAMINO – Senhor!? Desapareceu! Oh, deuses, eu devo acreditar na Rainha! As palavras e o sofrimento
dela me pareceram verdadeiros! Mas aquele homem... Ele não parecia estar mentindo... Vilão ou vilã? O que
temos nessa história? Oh, noite interminável quando irás clarear? Por hora, não posso esperar aqui parado.
Tenho que encontrar Pamina! Será que a flauta pode trazê-la para mim?

Nr 8 Ária de TAMINO
Inicia-se aqui, muito lentamente, o início do amanhecer. TAMINO toca a flauta mágica.
As flores do bosque desabrocham.

TAMINO – Que prazer, que alegria,


O som da sua melodia
Tem perfeita harmonia!
Lindas flores desabrocham
Para ouvirem o esplendor
Destas notas que espalham o amor!

TAMINO toca a flauta mágica. De repente surgem as feras do bosque, mansas e felizes.

TAMINO – Que magia, que poder tem esse doce som!

TAMINO toca a flauta mágica. Mais feras surgem.

TAMINO – Até as feras se atraem por tão incrível dom!

Minha flauta encantada


Onde está a minha amada?
Pois se até as feras vem...
Por que só Pamina
É que não vem?
TAMINO toca a flauta mágica.
TAMINO – Pamina!?

TAMINO toca a flauta mágica.

TAMINO – Pamina!?
Ouça-me!
Ouça-me!

TAMINO toca a flauta mágica. A Flauta de Pan de PAPAGUENO responde.

22
TAMINO – Acabo de ouvir Papagueno!

TAMINO toca a flauta mágica. A Flauta de Pan de PAPAGUENO responde novamente.

TAMINO – Será que Papagueno a encontrou?


Oh, flauta mágica encontre-os para mim!

TAMINO sai por um lado. Pelo outro entram PAPAGUENO e PAMINA.

Nr 9 Trio, depois Coro


(PAMINA, PAPAGUENO, MONÓSTATOS, ESCRAVOS)

PAPAGUENO, PAMINA – Pés ligeiros! Vou veloz!


Para longe do mouro feroz!
Oh, Tamino seja breve!
Venha logo antes que ele nos pegue!

PAPAGUENO toca a flauta de pan. De outro lugar TAMINO responde com a flauta mágica.

PAPAGUENO, PAMINA – Ouça só! Ele responde!


Mas seu som de onde vem?
Sua flauta é pura e clara!
Mas que sorte se eu o encontrar
Os meus passos eu preciso apressar!
Eu preciso apressar!

Surge MONÓSTATOS que também vem correndo.

MONÓSTATOS – Eu preciso apressar!

PAPAGUENO, PAMINA e MONÓSTATOS se chocam num encontrão.

MONÓSTATOS – Oh! Eu os encontrei!


(Para os ESCRAVOS que ainda não entraram em cena) Tragam logo as correntes!
Essa moça eu educarei
E o passarinho eu fritarei!
Nunca mais vão me enganar!
Não sou fácil de enrolar!
Ei, escravos venha cá!

PAPAGUENO E PAMINA – Qual vai ser a salvação?

Os ESCRAVOS chegam trombando uns nos outros, atrapalhados.

MONÓSTATOS – Seus patetas, atenção!

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PAPAGUENO – Eu já sei! Eu já sei!
A saída eu tenho aqui!
Eles logo vão ouvir!
Vão os meus sinos queridos
Encantar os seus ouvidos!

PAPAGUENO começa a tocar os sinos mágicos e todos se rendem aos encantos da melodia.

MONÓSTATOS, ESCRAVOS, PAPAGUENO E PAMINA – Que alegre! Que bonito!


Dá vontade de cantar!
La La La La La La La La Lá!
É tão doce! Divertido!
Dá vontade de dançar!
La La La La La La La La Lá!
Eu o beijo! O abraço!
Ao amigo mal não faço!
La La La La La La La La Lá!

MONÓSTATOS e ESCRAVOS saem de cena dançando, amorosos.

Nr 10 Dueto, Depois Coro


(PAPAGUENO, PAMINA, SEGUIDORES de ZARASTRO)

TAMINA E PAPAGUENO – Se a todos eu pudesse dar


Sinos com esse valor
Todo o ódio ia se acabar
E reinaria o amor!

Som tão doce eu nunca ouvi


Amizades faz surgir
Oh, tão bom viver
Em harmonia, a sorrir!

Se a todos eu pudesse dar


Sinos com esse valor
Toda a guerra ia se acabar
E reinaria o amor!

Trompetes interrompem PAMINA E PAPAGUENO.

CORO DOS SEGUIDORES DE ZARASTRO (em off) – Saudamos Zarastro,


O nosso amado mestre!

PAPAGUENO – Pamina, o que é isso?


Eu tremo de medo!

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PAMINA – Amigo eu digo que eu também!
Pois sinto que Zarastro vem!

PAPAGUENO – Se eu fosse só um rato


Entrava em um sapato!
Se eu fosse um caracol
Da casca eu dava tchau!
Não sei o que dizer a ele...

PAMINA – Amigo! Amigo!


Vamos ser sinceros!

A procissão dos seguidores de ZARASTRO o precede. O ORADOR e os GUARDIÕES também.


Logo em seguida ZARASTRO surge montado em um carro triunfal, puxado por seis leões.
É dia.

CORO DOS SEGUIDORES DE ZARASTRO – Um viva à Zarastro!


Zarastro é sábio mestre!
Amado conselheiro,
Com fé nós o seguimos!
Sabiamente ele cultiva o estudo e o saber!
O nosso profeta nos mostra o caminho para vencer!

PAMINA aproxima-se de ZARASTRO.

Diálogo

PAMINA (ajoelha) – Eu peço que me perdoe por querer fugir de seus domínios, senhor. A culpa não é
minha. Enquanto o senhor esteve fora, o mouro Monóstatos se mostrou um homem cruel. Chegou até a
fazer-me prisioneira jurando casar-se comigo à força.

Entra MONÓSTATOS, que vêm trazendo TAMINO como prisioneiro.

MONÓSTATOS (empurra PAMINO para o chão) – Ajoelhe-se perante o soberano Zarastro, traidor! (Ao
ver PAPAGUENO empurra-o também) E você também, passarinho de uma figa!

PAPAGUENO – Eu não sou passarinho!

MONÓSTATOS – Cale o bico! (À ZARASTRO) – Mestre, eu encontrei esse tipo aqui que se diz príncipe.
Ele estava rondando o Templo e me confessou que pretendia - junto com o emplumado ali - levar a princesa
Pamina!
Pontuação musical de PAMINA E TAMINO.

PAMINA – É ele!

TAMINO – É ela!

25
PAMINA – É o meu amor!

TAMINO – É ela!

PAMINA – É ele!

TAMINO – É o meu amor!

PAMINA – Eu preciso abraçá-lo!

TAMINO – Eu preciso abraçá-la!

PAMINA E TAMINO – Seja o fim ou que for!

PAMINA e TAMINO correm para o encontro e se abraçam.

Diálogo.

MONÓSTATOS (separa o casal) – Parem já com isso! Vocês não têm vergonha? (A ZARASTRO) Mestre
ordene-me castigar severamente o jovem e o passarinho de estimação.

PAPAGUENO – Eu não sou passarinho...

MONÓSTATOS – Cale o bico! (À ZARASTRO) Mestre, eu já tenho aqui em minha cachola um bom castigo
para o príncipe atrevido. Quanto ao passarinho, fritarei com batatas!

PAPAGUENO – Eu não sou passarinho...

MONÓSTATOS – Já está me irritando com isso! É passarinho sim, dá o pé loro, pronto e acabou! (A
ZARASTRO) O senhor bem sabe da fidelidade deste teu servo! O castigo dos audaciosos será a minha
recompensa!

ZARASTRO – Mereces uma recompensa muito melhor, Monóstatos.

MONÓSTATOS – Muito melhor? (Para TAMINO, PAMINA e PAPAGUENO) Agora vocês vão ver só!
Hehehe! (A ZARASTRO) Ora, mestre. Imagina! Tudo o que faço é só para lhe agradar... Bem, mas já que o
senhor acha que mereço, eu aceito de coração a minha recompensa muito melhor!

ZARASTRO – Que bom! (Para os GUARDIÕES) Dai a este malfeitor apenas setenta e sete estaladas com
vara de marmelo nas solas dos pés!

MONÓSTATOS – Clemência, senhor!

Os GUARDIÕES saem levando MONÓSTATOS.

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ZARASTRO (para TAMINO e PAMINA) – Aproximai-vos e não temeis. Eu conheço o segredo de vossos
corações. Agistes sob influência do amor que sentem um pelo outro. Um amor puro e verdadeiro do qual
faço muito gosto.

PAMINA – Senhor, eu vos imploro. Deixe que Tamino me leve para os braços da minha mãe.

ZARASTRO – Ouça Pamina. Tu sabes que eu e teu pai, o Rei do Dia, sempre fomos muito amigos.

PAMINA – Sim, senhor. E recordo-me com que carinho ele sempre falava dessa amizade, elogiando a sua
bondade, virtude e sabedoria.

ZARASTRO – Bondade, virtude e sabedoria são palavras que a tua mãe despreza! Ela é uma mulher fria e
cruel. E foi com medo de que tu te tornasses uma criatura como ela, que teu pai antes de morrer fez-me jurar
que cuidaria da tua educação. O desejo dele era de que alcançasses um grau de sabedoria superior.

PAMINA – Eu compreendo o desejo do meu querido pai, senhor. Aqui as pessoas e os animais são livres e
felizes. Muito diferente do reino da minha mãe onde todos a temem. Mas eu posso ajudá-la a se tornar
alguém melhor.

ZARASTRO – Tuas intenções são as melhores, mas eu não permitirei que voltes.

PAMINA – Mas senhor, eu acredito que ela se mostrará disposta a mudar. O que ela mais deseja é ter-me
por perto.

ZARASTRO – Não, filha. O que ela mais deseja é o poder! Peço-te um pouco de paciência. Os
acontecimentos que se seguirão hão de lhe mostrar a verdade. Por hora confie em mim. (Para TAMINO)
Príncipe Tamino! Desejas unir-se a princesa Pamina, submetendo-se aos aprendizados do Templo da
Sabedoria?

TAMINO – É o que mais desejo, senhor. Mas antes peço que me perdoe por tê-lo julgado mal.

ZARASTRO – És um príncipe honrado! (Para PAPAGUENO) E tu, Papagueno! Se assim desejares, estás
livre para voltar para os domínios noturnos.

PAPAGUENO – Ah, não, senhor! Se não se importar, eu também gostaria de me juntar ao Templo. Eu
nunca gostei de engaiolar os meus amigos pássaros. Mas se não obedecesse às ordens da Rainha da Noite,
ela me mandava cozinhar no jantar. Não quero voltar para aquela escravidão. Ainda mais agora... Voltar sem
a princesa é certo eu parar em cima de uma mesa com uma maçã na boca...

ZARASTRO – Muito bem. (Para os GUARDIÕES) – Conduzi os estrangeiros até a Casa dos Julgamentos e
que lá eles aguardem a decisão do conselho. Se forem aceitos, terão de passar pelas provas.

PAPAGUENO – Provas?

ZARASTRO – Sim. Elas fazem parte dos aprendizados do nosso Templo!

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Os guardiões vendam os olhos de TAMINO e PAPAGUENO.

ZARASTRO – Vá preparar-te, filha. Tu também passarás pelas provas.

Nr 11 Coro Final
(SEGUIDORES de ZARASTRO)

SEGUIDORES DE ZARASTRO – A Virtude e a justiça


São da máxima importância
Pois despertam a esperança
De um mundo mais feliz!

Tão mais feliz


O mundo pode ser!

Nós escolhemos percorrer


O bom caminho do saber!
Um mundo pleno
Cada um de nós vai ter!

TAMINO e PAPAGUENO são levados pelos guardiões.

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ATO II

CENA I

Instrumental (Marcha dos Sacerdotes)

A cena revela um dos ambientes do Templo da Sabedoria.


ZARASTRO, o ORADOR e os SACERDOTES se reúnem.

Diálogo

ZARASTRO – Irmãos, esse conselho é o mais importante que já tivemos. O príncipe Tamino deseja
submeter-se aos aprendizados do nosso Templo e aguarda a nossa decisão.

SACERDOTE 1 – Ele pratica o bem?

ZARASTRO – Pratica.

SACERDOTE 2 – Ele saberá honrar o silêncio?

ZARASTRO – Saberá.

SACERDOTE 3 – Ele é corajoso?

ZARASTRO – É muito corajoso. E então, irmãos? Julgastes o príncipe digno de passar pelas provas?

SACERDOTES 1, 2, 3 (trocam olhares) – Sim!

ZARASTRO – Esta é a decisão certa. O Rei do Dia e a Rainha da Noite tinham sob seus cuidados o
poderoso Círculo Solar das Sete Auréolas. Mas a Rainha deixou-se deslumbrar pelo poder do Círculo e sua
ganância fez com que a noite se transformasse em trevas. Foi por isso que o Rei, antes de morrer, confiou-
me o Círculo Solar e a educação de Pamina. Ele previu que sua filha seria destinada ao virtuoso e honrado
príncipe Tamino. Era seu desejo que os jovens fossem preparados por nós para que pudessem se tornar os
futuros guardiões, dignos do poder que os espera. Caso eles se mostrem merecedores e suportem as provas
eu lhes entregarei o Círculo Solar.

ORADOR – Senhor, mas e se eles não conseguirem suportar as provas? Elas são tão difíceis e tão perigosas!
Digo isso porque Tamino é apenas um príncipe e Pamina apenas uma princesa...

ZARASTRO – Eles são mais do que isso. Tamino é um homem e Pamina é uma mulher. E nós devemos
apoiá-los, senhores, pois eles são a esperança da humanidade! A Rainha da Noite não medirá esforços para
possuir novamente o poder. Ela deseja dominar o mundo com suas crenças sombrias! Mas acreditai: as
provas do Templo irão preparar e fortalecer o laço de amor entre Tamino e Pamina. Eles serão os futuros
Reis que acabarão de uma vez por todas com as trevas e restabelecerão o equilíbrio entre a noite e o dia!

ZARASTRO e os SACERDOTES se abraçam. O ORADOR tenta se comunicar, mas ninguém lhe dá ouvidos.

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ORADOR – Senhores, senhores, senhores...

ZARASTRO e os SACERDOTES saem.

ORADOR – E o passarinho? Eles se esqueceram do passarinho! Não me parece que ele saiba guardar
silêncio e nem que seja muito corajoso...

O ORADOR sai.
Sugestão para mudança de cenário:
Instrumental da Ária de Zarastro em louvor aos deuses Isis e Osiris.

CENA II

A cena se transforma em um dos ambientes da Casa dos Julgamentos.


Escuridão. Em cena TAMINO e PAPAGUENO.

Diálogo

TAMINO – Que escuridão horrível! Papagueno, você está aí?

PAPAGUENO – Claro! Se bem que estou quase preferindo não estar.

TAMINO – Em que lugar será que nós estamos?

PAPAGUENO – Se não estivesse tão escuro eu lhe responderia com todo o prazer.

Rumor de Trovão.

PAPAGUENO – Ahhhh!!!!

TAMINO – O que é que foi?

PAPAGUENO – Não sei, não vi!

TAMINO – Acho que alguém aqui está com medo.

PAPAGUENO – O que quer dizer com isto? Que eu estou com medo?

TAMINO – Por que gritou então?

PAPAGUENO – Porque às vezes me dá vontade e eu grito. Assim, do nada. Nunca percebeu não?

TAMINO – Já.

PAPAGUENO – Pois então. Grito de alegre. Me faz bem.

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Rumor de trovão mais forte.
PAPAGUENO – Ahhh!!!!!

TAMINO – E agora? Gritou de alegre de novo?

PAPAGUENO – Acho que eu estou passando um pouco mal...

TAMINO – Você pode descer do meu colo, por favor?

PAPAGUENO – Desculpe...
Rumor de trovão ainda mais forte.

PAPAGUENO – Ahhhh!!! Morri!!! Deuses, deuses, deuses!!!! Eu morri!!! Que é que eu faço?

TAMINO – Não seja estúpido! Se você tivesse morrido não estaria falando!

PAPAGUENO – Ah... É mesmo! Não morri não.

TAMINO – Agora pare com esses faniquitos de passarinho! Esse é o momento de você mostrar que é um
homem!

PAPAGUENO – Pra que! Ninguém vai enxergar mesmo!

Entra o ORADOR com o rosto iluminado pela vela que está segurando.

PAPAGUENO (corre para trás de TAMINO) – Socorro!!!

ORADOR – Bem vindos à Casa dos Julgamentos. Vocês estão preparados para enfrentar as provas?

PAPAGUENO – Não!

TAMINO – Sim!

ORADOR – Mesmo que acabem por perder as suas vidas?

PAPAGUENO – Ai...

TAMINO – Eu estou firme! Que a sabedoria seja a minha vitória e a princesa Pamina a minha recompensa!

ORADOR – Pense bem, príncipe. Ainda está em tempo de desistir.

TAMINO – Eu farei todas as provas que forem necessárias, senhor!

PAPAGUENO se levanta.

31
PAPAGUENO (enfim levanta do chão) – Bem, vou indo então... Se ele vai fazer todas as provas então não
vai sobrar nenhuma pra mim... (Ao ORADOR) Foi um prazer vê-lo por aqui!

PAPAGUENO vai saindo.

ORADOR – Ei, você. Não deseja mais juntar-se ao nosso Templo?

PAPAGUENO – Desejar eu desejo. Mas eu não me dou muito bem com provas...

ORADOR – Mas elas poderão lhe trazer sabedoria.

PAPAGUENO – Eu sou um homem da natureza! Se eu puder beber, comer, dormir e quem sabe um dia me
casar, já está de bom tamanho. Vamos deixar a sabedoria para outro momento. Adeus. (Sai)

ORADOR – Que pena... Justo agora que Zarastro encontrou uma mocinha bonita para apresentar a ele...

PAPAGUENO (volta) – Verdade?

ORADOR – É sim. Mas só poderá vê-la se decidir enfrentar as provas.

PAPAGUENO – Não estou interessado. Obrigado. (Sai)

ORADOR – Que falta de sorte dessa mocinha... Fariam um belo par! Ela é igualzinha a ele, só que de saia.
Como é mesmo o nome dela?... (Tira um papel do bolso e lê) Pa-pa-gue-na. Isso mesmo! Papaguena.

PAPAGUENO (volta felicíssimo) – Pa pa Papaguena? Mudei de idéia. Eu aceito enfrentar as provas!


Quando irei vê-la?

ORADOR – Em breve. Mas não poderá falar com ela. E você também, príncipe. A princesa Pamina virá ao
seu encontro, mas você também não poderá falar com ela. Este é o início da primeira prova. Até que ela
termine vocês não poderão falar com nenhuma outra pessoa! Eu disse: nenhuma outra! Entenderam bem? Se
vocês desobedecerem estarão perdidos! Coisas terríveis poderão acontecer. (Ilumina um amontoado de
caveiras) Acho que fui claro. (Para PAPAGUENO) Será que você vai ser capaz de segurar essa língua?

PAPAGUENO (impressionado) – Vou sim!...

ORADOR – Faço votos. (Vai saindo)

PAPAGUENO – Uma dúvida! Sussurrar pode?

ORADOR – Não! (A parte) É cada um que me aparece...

O ORADOR sai.

TAMINO – O homem levou a luz, Tamino... Estamos novamente no escuro... (Pausa) Tamino... Quer
conversar?

32
PAMINO – Quieto, Papagueno. Se concentre!

Surgem as DAMAS da RAINHA DA NOITE.


Durante a cena elas aparecem e desaparecem de modo surpreendente.
Por vezes recorrem a recursos cênicos para aterrorizá-los.

Nr 12 Quinteto, Coro
(DAMAS, PAPAGUENO, TAMINO, VOZES DO TEMPLO)

DAMAS – Não, não, não!


Por que ficar neste horror?
Sim, sim, sim!
Esse lugar é só de dor!
Tamino! Querem tua morte!
E a Papagueno a mesma sorte!

PAPAGUENO – Vou morrer sem ver meu bem!

TAMINO – Fique quieto ou nem sei!


Elas mentem meu amigo!
Tape logo os seus ouvidos!

PAPAGUENO – Eu não sei o que fazer...

TAMINO – Fique quieto e vai vencer!

PAPAGUENO (para si mesmo) – Fique quieto


Fique quieto
Fique quieto
E vai vencer!

DAMAS – Nossa Rainha já vão ver


No Templo irá aparecer!

PAPAGUENO (para as DAMAS) – Oh, não!!! Como é que sabem?

TAMINO – Não prossiga! Por favor!


Não se esqueça das palavras
Que ouviu do orador!

DAMAS – Tamino a eles não dê trela


(Tamino dá as costas para elas)
Do outro lado então ficou?
Esse lugar é uma sela
Aquele homem te enganou!

33
TAMINO – Um homem sábio se assim for
Não acredita em rumor!

DAMAS – Esse lugar é o inferno


E tem fantasma, sim senhor!
Aqui é cheio de caveira
E tem diabo, que horror!
Irão arder, queimar, tremer!
Aqui não há o que fazer!
É certo que irão morrer!
Que horror! Que horror!

PAPAGUENO (desesperado) – O que é que eu vou fazer?


Mas que horror!
Mas que horror!
Eu vou morrer!

Diga Tamino, é verdade?

DAMAS – Na mentira elas vão fundo!


Fique quieto! Fique mudo!

PAPAGUENO – Se com as damas eu falar...

TAMINO – Não seja bobo ou vai penar!


Eu digo para o seu bem!
Fale comigo e mais ninguém!

As DAMAS mudam de tática. Passam a seduzi-los com cafunés.

DAMAS (para TAMINO) – Conosco então você não fala?


E Papagueno hein? Não fala?

PAPAGUENO – Desculpem damas... Mas...

TAMINO (faz gesto de silêncio para PAPAGUENO) – Chits!

PAPAGUENO – Eu não agüento mais!

TAMINO (faz gesto de silêncio para PAPAGUENO) – Chits!

PAPAGUENO (para as repreensões de TAMINO) – Mas que tortura! Coisa chata!

TAMINO – Coisa chata é não honrar


O seu dever de se calar!

34
DAMAS – Já vamos então, pois não vão falar!
A nossa missão nós vamos deixar!

TAMINO E PAPAGUENO – Vieram, mas já vão voltar


Ninguém aqui há de falar!

DAMAS – É certo que vamos voltar


Ninguém aqui há de falar!

TODOS – Ser forte é não fraquejar


Pensar bem antes de falar!

De repente um terrível acorde toma a cena, acompanhado de trovões e relâmpagos.

VOZES DO TEMPLO – As damas aqui dentro


Profanam nosso Templo!

As DAMAS desaparecem num alçapão.

PAPAGUENO (tremendo de medo, finaliza a música) – Ai, ai!


Ai, ai!
Ai, ai!

PAPAGUENO desmaia.
TAMINO o observa e suspira profundamente.

Sugestão para mudança de cenário:


Instrumental da Ária de MONÓSTATOS, onde ele canta que deseja ter PAMINA.

CENA III

Noite. A cena se transforma em um bonito jardim. PAMINA dorme à luz do luar.


MONÓSTATOS vai se aproximando dela sorrateiramente.

Monólogo, depois diálogo

MONÓSTATOS – Ah, aqui está a bela flor. Por causa dela quase perdi a planta dos meus pés! (Observa se
não há ninguém por perto) Penso que por isso eu mereço um beijinho. He, He, He!

MONÓSTATOS se aproxima de PAMINA para beijá-la.


Entra a RAINHA DA NOITE.

RAINHA DA NOITE – Para trás!

MONÓSTATOS sai correndo. PAMINA acorda.


35
PAMINA – Mãe?

RAINHA DA NOITE – Pamina!

PAMINA e a RAINHA DA NOITE correm para se encontrar. Elas se abraçam amorosamente.

PAMINA – Que saudade, mãe!

RAINHA – Onde está o príncipe que enviei para salvar-te?

PAMINA – Ele está entregue aos aprendizados do Templo da Sabedoria.

A RAINHA se afasta da filha.

RAINHA (aparte) – Aquele traidor!

PAMINA – Ah, minha mãe. Estou tão feliz que esteja aqui! Tenho tanta coisa para lhe dizer...

RAINHA – Eu também tenho algo a dizer-te. Antes de morrer teu pai entregou a Zarastro o Círculo Solar
das Sete Auréolas que nos dava poderes. Terás de usar da confiança que Zarastro depositou em ti para
recuperá-lo para mim.

PAMINA – Mãe!... Por que eu deveria fazer isso? Se meu pai confiou a ele esse poderoso Círculo é porque
deve ter tido seus motivos. Zarastro é um homem sábio e bom! (Silêncio) Por está me olhando assim?

RAINHA – Bom? Zarastro é um homem bom? Estás do lado do meu inimigo mortal? Daquele que ficou
com os meus poderes e que te levou de mim?

PAMINA – Não é isso...

RAINHA – Pois então prove que não estás contra tua própria mãe! Estás vendo esse punhal? Deves matar
Zarastro e voltar para os domínios noturnos com o Círculo Solar! Caso contrário não serás mais minha filha!

MONÓSTATOS observa daqui por diante, escondido.

MONÓSTATOS (aparte) – Mas o que é que está acontecendo por aqui?

Nr 13 Ária da RAINHA DA NOITE

RAINHA DA NOITE – Arde em meu peito a chama da vingança!


Com desespero!
Tu tens que odiá-lo assim também!
Vais me vingar!
Zarastro tu deves matar, sim!
Zarastro tu deves matar, sim!
Ou renegada tu serás por mim!

36
Não vais falhar!
Ou então tu vais penar!

Tu renegada por mim!

Por todo sempre vai ser assim!

Serás atormentada!
E amaldiçoada!
Não vais valer mais nada
Sem os laços entre nós!
Eu juro!
Duvides
E vais ver
Do que eu bem sou capaz!
Do que eu bem sou capaz!
Se não morrer
Zarastro em um zás trás
Tu
Vais
Ver!
Ah, Pamina!
Sim!
Pelos deuses!

A RAINHA DA NOITE sai.

Diálogo

PAMINA – Eu não posso fazer isso! Não posso! (Esconde o punhal entre as flores) E agora? O que vai ser
de mim?

MONÓSTATOS – Só depende de você!

PAMINA – Deuses!

MONÓSTATOS – Por que está tremendo? Está com medo de mim? Ou da terrível missão que acaba de
receber da sua mãe?

PAMINA – Então você sabe!...

MONÓSTATOS – Sim! E se eu disser uma só palavra do que sei a Zarastro, vocês estarão perdidas!

PAMINA – Não! Por favor!

MONÓSTATOS – Só há uma maneira de conseguir me calar!

37
PAMINA – Qual?

MONÓSTATOS – Case-se comigo!

PAMINA – Nunca!

MONÓSTATOS (segura PAMINA pelo pulso agressivamente) – Vai casar sim!

Entra ZARASTRO. Lentamente faz-se o dia.

ZARASTRO – Monóstatos!

MONÓSTATOS – Mestre! A Rainha da Noite e a princesa estavam tramando contra a tua vida! Por isso eu
estava aqui. Para vingar-te!

ZARASTRO – Penso então que tu queiras outra recompensa, tão boa quanto a que já recebeste. Resta saber
se teus pés irão agüentar!

MONÓSTATOS – Como, senhor?

ZARASTRO – Eu sei de tudo, Monóstatos. Vai-te daqui, criatura perversa! E não voltes nunca mais!

MONÓSTATOS (aparte) – Já que a filha não quer nada comigo, então vou procurar a mãe!

MONÓSTATOS sai. PAMINA corre para abraçar ZARASTRO.

PAMINA – Por favor, senhor, não se vingue da minha mãe...

ZARASTRO – Vingar? Não, filha. Nestes domínios ninguém conhece a vingança. Tu hás de ser muito feliz
com o príncipe Tamino. E tua mãe finalmente entenderá que o amor é o que há de mais valoroso. Então, as
trevas desaparecerão e a noite voltará a ter estrelas.

Instrumental da Ária de Zarastro, onde ele canta sobre o perdão.


ZARASTRO e PAMINA saem abraçados.

CENA IV

A cena revela a Casa dos Julgamentos.


TAMINO e PAPAGUENO.

Diálogo

PAPAGUENO – Tamino?

TAMINO (faz gesto de silêncio para PAPAGUENO) – Chits!

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PAPAGUENO – Eu acho que você não entendeu a prova. Comigo você pode falar.

TAMINO – Chits!

PAPAGUENO (canta um pedaço da sua primeira ária) – Lá lá lá lá lá lá lá lá lá lá lá...

TAMINO (faz gesto de silêncio para PAPAGUENO) – Chits!

PAPAGUENO se cala por segundos, entediado.

PAPAGUENO – Estou com sede!

Surge uma MULHER VELHA e muito feia, praticamente uma Baba Yaga.
Ela se aproxima em passinhos rápidos, apoiando-se sobre um cajado.
Entrega uma taça com água para PAPAGUENO.

PAPAGUENO – Para mim?

MULHER VELHA – É sim, meu anjo.

PAPAGUENO – Obrigado. Quantos anos você tem?

MULHER VELHA – Dezoito anos e dois minutos.

PAPAGUENO – Dezoito anos e dois minutos?

MULHER VELHA – É sim, meu anjo.

PAPAGUENO – Bonitinha!!!

MULHER VELHA – Obrigada, meu anjo!

PAPAGUENO – De nada, de nada! E você tem namorado?

MULHER VELHA – Tenho sim, meu anjo!

PAPAGUENO – Assanhadinha!!!

MULHER VELHA ri estridente. PAPAGUENO ri também.

PAPAGUENO – E me diga. Ele é assim, tão “jovem” quanto você?

MULHER VELHA (mede PAPAGUENO de cima a baixo) – Não. Ele é dez anos mais velho do que eu!

PAPAGUENO – Mais velho? É praticamente uma múmia então, hein?

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MULHER ri estridente. PAPAGUENO ri também.

PAPAGUENO – E como é o nome dele?

(PAPAGUENO bebe a água)

MULHER VELHA – Papagueno.

(PAPAGUENO engasga e acaba por borrifar a água)

PAPAGUENO – Pa- Papagueno?

MULHER ri estridente. PAPAGUENO ri também.

PAPAGUENO – Quer dizer que eu sou o seu namorado?

MULHER VELHA – É sim, meu anjo.

PAPAGUENO – Sua maluquinha!!! E como é o seu nome?

MULHER VELHA – Pa...

PAPAGUENO – Pa?
Ouve-se um forte trovão. A MULHER VELHA desaparece.

PAPAGUENO – Eu juro que não direi mais nada. Eu Juro!

Surge MOZART e as duas CORUJAS no balão.

Nr 14 Trio (MOZART, CORUJAS)

Eles vêm trazendo a flauta mágica de TAMINO e os sinos de PAPAGUENO.

MOZART, CORUJAS – Pela segunda vez, bem vindos


A este reino de glória e paz!
Tomai de volta a flauta e os sinos
Mestre Zarastro os envia a vós!

Magicamente surge um banquete delicioso.

Um bom banquete não desprezeis


Comei, bebei! Podeis vos fartar!
Quando nos virmos mais outra vez
À alegria vamos brindar!

40
Força, Tamino,
Para triunfar!
Tu, Papagueno!
Tu deves calar!
Chits! Chits!
Tu deves calar!
Chits! Chits!
Tu deves calar!

O balão sai de cena.

Diálogo

PAPAGUENO – Vamos comer, Tamino!!!

TAMINO ignora PAPAGUENO e melancolicamente começa a tocar a flauta mágica.


As comidas começam a flutuar pelos ares, dançando ao som da flauta.
Um guardanapo, magicamente, se ajeita em PAPAGUENO.

PAPAGUENO – Háhá! Isso mesmo! Fique aí tocando essa sua flauta enquanto eu toco tudo pra dentro!

PAPAGUENO pega uma maçã.

PAPAGUENO – Nham! Nham! (Surge uma minhoca sorridente) Ah, que nojo! (Vê um espaguete) Hum!!!
(Puxa um fio do macarrão, porém o prato vai todo para o seu rosto) Hehe! Al dente!

PAPAGUENO pega um dos franguinhos assados e começa a comer.

PAPAGUENO – Zarastro é um bom chefe de cozinha!

Magicamente, uma garrafa de vinho serve PAPAGUENO.


Entra PAMINA.

PAMINA – Tamino! Graças ao som da flauta eu encontrei você! O que foi? Não está feliz em me ver? Não
diz nada?

Com dor no coração TAMINO faz sinal para que PAMINA vá embora.

PAMINA – Quer que eu vá? Papagueno, por favor, diga o que há com ele!

PAPAGUENO (faz gesto de silêncio) – Chits!

PAMINA – Você também? (A TAMINO) O que foi que eu fiz? Você não me ama mais?

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Nr 15 Ária de PAMINA
PAMINA – Breve e amargo
É o meu destino
Foram-se as horas deste amor
Só sobrou a minha dor!

Ah, nem sei por que, amor!


Ah, nem sei! Nem sei! Amor!

Oh, Tamino!
Meu menino!
Seu amor me fez viver
E sem ele eu vou morrer!

PAMINA sai. Percebe-se a angústia de TAMINO.

Diálogo

PAPAGUENO (comendo vorazmente) – Viu, Tamino? Consegui ficar quietinho! Háhá!

Ouve-se um primeiro acorde imponente.


PAPAGUENO – O que é isso?

Ouve-se um segundo acorde imponente. Surge o ORADOR.

ORADOR – Vocês devem me acompanhar. Por aqui, príncipe.

Ouve-se um terceiro acorde imponente.


TAMINO e o ORADOR saem.

PAPAGUENO – Isso mesmo! Podem ir, podem ir! O mais forte fica!

PAPAGUENO abre o richaud à sua frente.

PAPAGUENO – Lagosta! Nham, nham!

A LAGOSTA agarra-se à mão de PAPAGUENO.

PAPAGUENO – Ai, ai, ai!!! Estou sendo atacado! Ei, Tamino!!! Sua lagosta, maldita!! Tome isso!!! E mais
isso!!!

Depois de se engalfinhar com a lagosta, PAPAGUENO consegue se livrar dela. A mesa desaparece.

PAPAGUENO – Chega de comidas perigosas! Tamino!!! Tamino!!! E agora? Como eu saio daqui? Isso
mais parece um labirinto! Eu estou perdido! (Começa a chorar) Tamino...

42
Volta o ORADOR.

ORADOR – Papagueno, você foi reprovado! Merecia ficar aqui perdido para sempre! Mas felizmente está
livre deste castigo. Porém jamais desfrutará dos prazeres da sabedoria.

PAPAGUENO – Já me dou por satisfeito se puder desfrutar um bom copo de vinho.

ORADOR (entrega um copo de vinho para PAPAGUENO) Aqui está.

PAPAGUENO bebe o vinho. O ORADOR desaparece.

PAPAGUENO (um pouco alto) – Dos deuses! Agora só falta mesmo a minha Papaguena!

PAPAGUENO toca os sinos mágicos.

Nr 16 Ária de PAPAGUENO

PAPAGUENO – Uma linda companheira


Quer Papagueno para si
Verdade verdadeira,
Seria a glória para mim!
Gentil, bonita e bondosa,
Que fosse também carinhosa!
Que ela fizesse-me rir,
Seria eu muito feliz!

Oh, deuses!
Concedam
Meu sonho!

Que ela fizesse-me rir,


Seria eu muito feliz!
E se eu jamais encontrar
Então eu vou me amargurar.
Mas se Papaguena chegar
Pra sempre eu vou lhe amar!

Surge a MULHER VELHA novamente.

Diálogo

MULHER VELHA – Aqui estou eu, meu anjo!

PAPAGUENO – Você! Ficou com saudade de mim, hein?

MULHER ri estridente. PAPAGUENO ri junto.

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PAPAGUENO – Ai, ai... Melhor rir do que chorar, não é mesmo?

MULHER VELHA – Quer casar comigo?

PAPAGUENO – Ei! Vamos com calma...

MULHER VELHA – Se você casar comigo, eu vou te amar, e te beijar, e te apertar contra o meu coração.

PAPAGUENO – Que sorte. Só resta saber de quem...

MULHER VELHA – Dê aqui a sua mão.

PAPAGUENO – Dou, não!

MULHER VELHA – Se você não me der a sua mão vai ficar aqui perdido para sempre!

PAPAGUENO – Para sempre?

MULHER VELHA – Sim, sim, sim!

PAPAGUENO – Bem, nesse caso... Está aqui a minha mão. Antes uma mulher velha do que nenhuma, não
é?

MULHER VELHA – Ah, é!

MULHER VELHA ri estridente.


PAPAGUENO ri também e logo em seguida emenda no choro.

MULHER – Você vai ser fiel a mim?

PAPAGUENO – Vou sim.

MULHER – Jura?

PAPAGUENO. Juro sim. (Aparte) Pelo menos até que eu encontre outra mais bonita.

MULHER VELHA tira o disfarce de velha e se revela PAPAGUENA.


Ela está vestida exatamente igual a PAPAGUENO, só que de vestido.

PAPAGUENA – Papagueno!!!

PAPAGUENO – Papaguena!!!

Eles se abraçam. Entra o ORADOR e os separa.

ORADOR – Saia, Papaguena! Ele ainda não merece você!

44
PAPAGUENA sai.

ORADOR (para PAPAGUENO) – Afaste-se!

PAPAGUENO – Nem que um trovão me parta ao meio!

Ouve-se um forte trovão.

PAPAGUENO (protegendo-se) – Brincadeirinha!!!

O ORADOR sai. PAPAGUENO sai correndo atrás dele.

CENA V

A cena se transforma no jardim de antes. É noite. Surge o balão com MOZART e as CORUJAS.

Nr 17 Trio, depois Quarteto


(MOZART, CORUJAS, PAMINA)
MOZART – Lá vem!
Parece ser Pamina!

CORUJAS – Oh, sim, lá vem!

MOZART – Não está bem, não.


Parece escuro o seu coração!
O que fazer para livrá-la
Dessa aflição?
Sofre a dor
Do seu amor
Tão desprezado!
Oh!!!
Tamino não pode falar!
Lá vem!
Lá vem!
Lá vem!
Pamina a chorar!
Vejamos o que vai fazer!
Devemos nós nos esconder!

PAMINA entra em cena e encontra o punhal que havia escondido entre as flores.

PAMINA – O bom punhal


Vai me livrar
De todo mal
Assim será!

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MOZART, CORUJAS – Pamina não quer mais viver!
Salvá-la é nosso dever!

O balão de MOZART pousa no chão.

PAMINA – Oh, dor! Oh, dor!


Tão grande dor!
Quero morrer!
Pra que viver
Sem meu amor?
Pra que viver
Sem meu amor?

MOZART, CORUJAS – Ela está enlouquecida!


Não entregues tua vida!
Oh, princesa!
Não se vá!

PAMINA – Dou adeus a essa dor!


Oh, adeus, meu falso amor!
Se Tamino não me quer...
Oh!
Só a morte vai me ter!

MOZART, CORUJAS – Oh, Pamina pare aí! (MOZART tira o punhal de PAMINA)
Se Tamino a visse assim, hein?
Sofreria muito mais além!
Só a ti pode amar!

PAMINA – Que? Então correspondia?


Calado ele escondia
O amor que tem por mim?
Por que mudo se me ama?

MOZART, CORUJAS – Oh, princesa! Não diremos, não.


Não nos cabe a explicação.
Mas assim que o encontrar
Tu vais logo entender
O porquê de o seu calar!
Vá Pamina, ver Tamino!

PAMINA (abraça os amigos) – Eu já vou!


Eu já vou!
Eu já vou!

PAMINA sai.

46
Ouve-se a flauta de pan de PAPAGUENO.
MOZART e as CORUJAS se escondem dentro do balão.
PAPAGUENO entra em cena.
Pequena introdução musical.

PAPAGUENO – Papaguena?
Papaguena?
Papagueeee-na...
Diálogo

É, ela não liga para mim! Aliás, nenhuma moça liga para mim! Só me resta morrer! (Pega uma corda que
está na cintura e amarra num galho de árvore) Não esganei aquela serpente que quase engoliu Tamino, mas
me esgano agora! (Faz menção de colocar a corda no pescoço) Não, primeiro vou contar até três pra dar
mais suspense! Quem sabe alguma dama aparece para me impedir? (Toca a flauta de pan) Um. (Toca a
flauta de pan) Dois. (Toca a flauta de pan. Como ninguém aparece, ele guarda a flauta de pan no bolso e
ajeita a corda no pescoço, dramaticamente) Adeus, mundo cruel!

Nr 18 Quarteto
(MOZART, CORUJAS, PAPAGUENO)

MOZART, CORUJAS – Não é possível, por favor!


Óh, Papagueno! Vais morrer?
Tu não és gato para reviver!

PAPAGUENO – Estou sofrendo pra cachorro!


Abandonado sem um osso!
Quando eu morrer vocês logo vão ver
A falta louca que eu vou fazer!

MOZART, CORUJAS – Ja te esqueceste dos sininhos?


Deves tocar só um pouquinho...

PAPAGUENO – Eu me esqueci dos meus sininhos!


Eu tocarei só um pouquinho!
Quem sabe o que pode acontecer?
Uma noivinha pode aparecer!
E eu desisto de morrer
Se meu bem aparecer!

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Nr 19 Dueto
(PAPAGUENO, PAPAGUENA)

PAPAGUENO pega a caixinha com os sininhos.


Ao abri-la ela toca sozinha, sem que ele precise dar corda.

PAPAGUENO – Toquem sinos mágicos, toquem para mim!


Tragam uma mocinha linda para mim!

PAPAGUENA surge do balão de MOZART. Estava escondida.

MOZART, CORUJAS – Óh, Papagueno, veja só!

PAPAGUENO – Pa Pa Pa...

PAPAGUENA – Pa Pa Pa...

PAPAGUENO – Pa Pa Pa Pa Pa Papaguena!

PAPAGUENA – Pa Pa Pa Pa Pa Papagueno!

PAPAGUENO – Você é assim, todinha minha?

PAPAGUENA – Eu sou assim, todinha tua!

PAPAGUENO – Quer casar comigo, oh, meu amor?

PAPAGUENA – Eu aceito sim, meu grande amor!

PAPAGUENO e PAPAGUENA – Meu grande amor! Meu grande amor!

PAPAGUENO – Mas que alegria te encontrar!

PAPAGUENA – Mas que alegria te encontrar!

PAPAGUENO – Eu tenho fé que os bons deuses...

PAPAGUENA – Eu tenho fé que os bons deuses...

PAPAGUENO e PAPAGUENA – Muitos filhos vão nos dar


E bem mais vou te amar!
Nós teremos seis bebês!
Seis bebês?
Seis bebês! Seis bebês!
Nós vamos ter seis bebês!
Seis tão pequeninos hão de ser!
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PAPAGUENO – Mas primeiro um Papagueno!

PAPAGUENA – Não, vai ser uma Papaguena!

PAPAGUENO – Mas eu quero um Papagueno!

PAPAGUENA – Não, vai ser uma Papaguena!

PAPAGUENO – Papagueno!

PAPAGUENA – Papaguena!

PAPAGUENO – Papagueno!

PAPAGUENA – Papaguena!

PAPAGUENO E PAPAGUENA – Papague - n (o) (a)!

PAPAGUENA – Nós seremos tão felizes!

PAPAGUENO – Quando os deuses enviarem...

PAPAGUENO e PAPAGUENA –...para nós...

PAPAGUENO – Todos os nossos Papapa...

PAPAGUENO e PAPAGUENA – ...papapaguenos!


Serão as bênçãos de nós dois!
Serão as bênçãos de nós dois!
Serão as bênçãos de nós dois!

CENA VI

A cena se transforma em novo ambiente da Casa dos Julgamentos.


Em cena há dois grandes rochedos, cada um deles contendo um portal.
Entre os rochedos há um relógio de Sol. Entra TAMINO, acompanhado pelo ORADOR.

Diálogo

ORADOR – Príncipe, a tua conduta até agora foi exemplar. Mas ainda restam duas provas muito perigosas.
Aquele que conseguir suportá-las com bravura será purificado através do fogo, da água, do ar e da terra.

Entra PAMINA sem ser vista.

TAMINO – E o que eu terei de enfrentar nessas provas?

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ORADOR – Os teus próprios medos, filho. Portanto somente você poderá responder a essa pergunta. Há os
que temem as trevas, as doenças, as guerras. A morte! Tudo isso poderá ser encontrado nas provas. Depende
dos medos de quem decide passar por elas. Só o que posso lhe afirmar é que há duas possibilidades. Ou o
candidato domina os seus medos ou, muitas vezes até de maneira fatal, os medos dominam os candidatos.

TAMINO demonstra preocupação.

ORADOR – E então? Você desiste ou segue em frente?

TAMINO – Se eu desistir terei sido dominado sem ao menos tentar. Não! Jamais! Eu sigo em frente senhor.

ORADOR – Abram os portais!

Dois GUARDIÕES abrem o portal que há em cada rochedo.


O portal da direita expele fogo e o portal da esquerda apresenta uma cachoeira em um nevoeiro escuro.

TAMINO – Que os deuses estejam comigo!

PAMINA – Tamino!

TAMINO – Pamina! (Para o ORADOR) Eu posso falar com ela? A prova do silêncio já acabou não é?

ORADOR – Já sim.

PAMINA – Então foi isso? Ah, como fui boba! Eu fiquei tão triste...

ORADOR – Você não pode impedir que os pássaros da tristeza voem sobre sua cabeça, mas pode, sim,
impedir que façam um ninho no seu cabelo! Quanto à prova do silêncio, é como já dizia a minha sábia avó:
temos dois ouvidos e só uma boca justamente para escutar mais e falar menos. Mas se for para falar que as
palavras sejam antes bem pensadas! Agora você deve seguir em frente, príncipe!

PAMINA – Eu também vou! Enfrentaremos nossos medos juntos, e até mesmo a morte, caso ela esteja nos
esperando.

PAMINA e TAMINO se abraçam.

PAMINA – Toque a flauta, Tamino! Ela nos protegerá no caminho.

Nr 20 Dueto
(TAMINO, PAMINA)

PAMINA guia TAMINO, que toca a flauta.


Eles entram no portal do fogo, que logo é fechado pelos GUARDIÕES.
Não vemos mais os príncipes, mas podemos ouvir o som da flauta.
Os GUARDIÕES e o ORADOR ficam apreensivos, mas solenes.

50
O relógio do Sol indica que as horas se passaram e então podemos ver a passagem interna dos príncipes.
Eles surgem no centro do cenário, entre o rochedo do fogo e o rochedo da água.

TAMINO e PAMINA – O fogo nós atravessamos!


Mais fortes ele nos deixou!
A força das águas nos aguarde!
Unidos iremos para lá!

PAMINA guia TAMINO, que toca a flauta.


Eles entram no rochedo da água. Não vemos mais os príncipes, mas podemos ouvir o som da flauta.
Os GUARDIÕES e o ORADOR ficam apreensivos. O relógio do Sol indica que as horas se passaram
e então os príncipe surgem pelo portal da água, vitoriosos.

TAMINO e PAMINA – Oh, céus! Vencemos outra vez!


Felizes pra sempre vamos ser!

TAMINO e PAMINA se abraçam.


Os rochedos e o relógio de Sol saem de cena revelando um portal. Dele emana uma luz intensa.

Nr 21 Coro

O visual, acompanhado da música, deve tornar a cena esplendorosa.

CORO – Triunfo, triunfo!


Triunfo dos nossos reis!
Vencestes o medo mais uma vez!
Vencestes todos os perigos!
Entrai no Templo, meus amigos!

De mãos dadas TAMINO e PAMINA passam pelo portal,


juntamente com o ORADOR e os GUARDIÕES.

CENA VII

Noite. A cena se transforma no bosque sagrado.


Ao fundo pode-se ver a frente do majestoso Templo da Sabedoria.
As DAMAS conversam em off.

DAMA 1 (off) – É este o lugar combinado.

DAMA 2 (off) – Todos dormem.

DAMA 3 (off) – Atacaremos à surdina.

DAMA 1 (off) – Tão logo Monóstatos mate Zarastro, eu devo tomar posse do poderoso Círculo Solar para a
nossa Rainha!

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DAMA 2 (off) - Não, não, não! Foi para mim que ela pediu!

DAMA 3 (off) – Que eu saiba foi para mim!

DAMA 1 (off) – Foi para mim!

DAMA 2 (off) – Foi para mim!

DAMA 3 (off) – Foi para mim!

MONÓSTATOS (off) – Calem-se!

Sorrateiramente surge MONÓSTATOS, A RAINHA DA NOITE e as DAMAS.

Nr 22 Quarteto
(MONÓSTATOS, DAMAS, RAINHA DA NOITE)

MONÓSTATOS – Façam silêncio fiquem quietas!


No Templo já vamos entrar!

DAMAS (entre si) – Façam silêncio fiquem quietas!


No Templo já vamos entrar!

MONÓSTATOS – Rainha é bom lembrar


Meu prêmio!
Pamina eu vou desposar!

RAINHA DA NOITE – Eu prometi!


E cumprirei!
Darei Pamina para ti!

DAMAS – Oh, sim! Oh, sim! Oh, sim!


Assim será!
Com a princesa vais casar!

Ouve-se um ruído estrondoso.

MONÓSTATOS – Mas que horrível esse ruído


Parece até um trovejar...

RAINHA DA NOITE e DAMAS – Sim! Um ruído assustador!


Parece até um trovejar...

MONÓSTATOS, RAINHA DA NOITE, DAMAS – Zarastro morrerá dormindo!


Por nós será surpreendido!

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O Templo há de se perder!
As trevas logo vão vencer!

MONÓSTATOS, DAMAS – Oh, todos devem se curvar!


Oh, todos devem se curvar!
A ti, Rainha, nós vamos vingar!

Ouve-se um altíssimo acorde: trovões, raios, tempestade. Imediatamente o Templo da Sabedoria se abre.
Dele emana um grande Sol. MONÓSTATOS, a RAINHA DA NOITE e as DAMAS são ofuscados por ele.

MONÓSTATOS, RAINHA DA NOITE, DAMAS – As luzes! Estamos por um fio!


Restou-nos apenas o vazio...

O quarteto desaparece entre os raios solares. Surge ZARASTRO entre TAMINO e PAMINA.
Eles vêm acompanhados pelo ORADOR, SACERDOTES e pelo balão com MOZART e as CORUJAS.
TAMINO traz em seu peito o Círculo Solar das Sete Auréolas, que antes estava no peito de ZARASTRO.
Já PAMINA traz em seu peito um medalhão com o símbolo da Lua, que esteve com ela durante toda a peça.

ZARASTRO – As trevas expulsas


A luz a brilhar
O dia e a noite
Em paz vão estar!

TAMINO e PAMINA juntam seus medalhões,


formando uma unidade total entre o Sol e a Lua.

CORO – Com força e saber


Foram coroados!
Não há maior poder
Que o amor fortificado!

Salvem os novos guardiões!


Fortes são seus corações!

PAPAGUENO e PAPAGUENA, cada qual com um PAPAGUENINHO nos braços, fecham as cortinas.

FIM

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