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MONÓLOGO

TAMINO
(Acorda e olha assustado em torno de si)
Onde estou?
(Levanta-se e depara com a serpente morta)
Como? A maligna serpente morta aos meus pés?
(Ouve-se ao longe uma flauta pastoril, acompanhada suavemente pela orquestra. Tamino fala
durante o ritornelo)
O que estou ouvindo? Que lugar desconhecido será esse? Ah, uma figura humana se aproxima do
vale.
(Esconde-se atrás de uma árvore)
DIÁLOGO

TAMINO
Ei, você aí!
(Segura Papagueno pela mão)
Quem é você?

PAPAGUENO
Quem sou eu?
(À parte)
Que pergunta idiota!
(Em voz alta)
Eu sou gente, que nem você. E se eu perguntasse quem você é?

TAMINO
Eu responderia que sou de linhagem real. Meu pai é um monarca que reina sobre muitas terras e
pessoas. Por isso me chamam de príncipe.

PAPAGUENO
Terras? Pessoas? Príncipe? Existem, para além desses montes, mais terras e mais pessoas?

TAMINO
Milhares e milhares! Então me diga: em que terras estamos? Como se chama exatamente esse
lugar? Quem manda aqui?

PAPAGUENO
Isso eu posso responder tão pouco quanto se você me perguntasse como vim parar neste mundo.

TAMINO
Como? Você não sabe onde nasceu, nem quem foram seus pais?

PAPAGUENO
Nada!

TAMINO
Mas do que é que você vive?

PAPAGUENO
De comida e bebida, feito todo mundo.

TAMINO
E como é que você consegue comida e bebida?

PAPAGUENO
Trocando. Eu pego todos os tipos de pássaros para a flamejantemente estelar rainha e para suas
damas, e, em troca, elas me dão comida e bebida...

TAMINO
(À parte)
Flamejantemente estelar rainha? Seria ela a poderosa Senhora da Noite?
(Em voz alta)
Diga-me, bom amigo, já teve a felicidade de ver essa deusa da noite?
(À Parte)
Que sujeito estranho...

PAPAGUENO
Ver a flamejantemente estelar rainha? Qual é o mortal nesse mundo que pode vangloriar-se de
jamais ter visto a rainha?
TAMINO
(Á parte)
Foi sobre essa rainha noturna que meu pai me falou tantas vezes. Mas entender como é que eu
vim parar logo aqui está além do meu alcance.

PAPAGUENO
Porque você fica me olhando desse jeito desconfiado?

TAMINO
É que... é que eu estou na dúvida de você seja mesmo gente.

PAPAGUENO
Como assim?

TAMINO
A julgar pelas penas que cobrem seu corpo, eu diria que...
(Aproxima-se de Papagueno)

PAPAGUENO
Que eu sou passarinho? Não! Pra longe de mim! Estou avisando! É bom não confiar em mim, que
eu tenho a força de um gigante quando acerto alguém.
(À parte)
Se ele não ficar logo com medo de mim, eu corro.

TAMINO
Força de um gigante?
(Olha para a serpente)
Então deve ter sido você que me salvou, que lutou com essa serpente venenosa?

PAPAGUENO
Serpente?
(Olha em volta e recua, tremendo, alguns passos)
O que é isso? Ela está viva ou morta?

TAMINO
Mas, por tudo o que há no mundo, amigo, como foi que você lutou contra esse monstro? Nem
armas você tem!

PAPAGUENO
Não preciso! Comigo basta um apertão bem forte de mão, que vale mais que qualquer arma.

TAMINO
Terá você então estrangulado a serpente?

PAPAGUENO
Estrangulado!

AS TRÊS DAMAS
(Chamam e ameaçam ao mesmo tempo)
Papagueno!

PAPAGUENO
Ahh! É comigo! Olha atrás de você, meu amigo!

TAMINO
Quem são essas damas?
PAPAGUENO
Quem são elas exatamente nem eu mesmo sei. Só sei que, todos os dias, elas levam meus
pássaros e me trazem em troca vinho, pão, doce e figos.

AS TRÊS DAMAS
(Ameaçadoras)
Papagueno!

PAPAGUENO
Elas já estão começando a me ameaçar.

AS TRÊS DAMAS
(Ameaçadoras)
Papagueno!

PAPAGUENO
Que crime será que cometi hoje para elas ficarem assim tão zangadas comigo? Aqui, belezas,
estou entregando meus pássaros.

PRIMEIRA DAMA
(Dá a Papagueno uma bela garrafa com água)
Em troca, nossa princesa envia para você, pela primeira vez, em lugar de vinho, água pura e
cristalina.

SEGUNDA DAMA
E a mim, mandou trazer, ao invés de pão, essa pedra. Espero que esteja ao seu agrado.
PAPAGUENO
Quê? Vou ter quer comer pedra?

TERCEIRA DAMA
E, em vez de figos doces, tenho a honra de trancar a sua boca com esse cadeado de ouro.
(Prende o cadeado na boca de Papagueno, que expressa por gestos a dor que sente)

PRIMEIRA DAMA
Quer saber porque a princesa está castigando você de modo tão extraordinário hoje?
(Papagueno faz que sim)

SEGUNDA DAMA
Para que, no futuro, você nunca mais minta a estrangeiros.

TERCEIRA DAMA
Fomos nós, meu jovem, que te salvamos. Nada temas; alegria e delícia te esperam. Olha! Isto foi
enviado pela grande princesa: é o retrato de sua filha. Se não permaneceres indiferente a essas
feições, felicidade, honra e glória te estarão destinadas. Adeus!
(Sai)

SEGUNDA DAMA
Adieu, Monsieur Papagueno!
(Sai)

PRIMEIRA DAMA
E não beba tudo de uma só vez.
(Sai, rindo. Papagueno continua gesticulando. Tamino, desde que recebeu o retrato, pôs-se a
observá-lo, e o amor que o invade não deixa que escute as últimas palavras das Damas.)
DIÁLOGO

PRIMEIRA DAMA
Arma-te de coragem e perseverança, belo jovem! A princesa ouviu cada palavra tua. Ela...

TERCEIRA DAMA
...decidiu fazer-te feliz. Se esse jovem, disse ela, tiver tanta coragem e bravura quanto é delicado,
ah!, então minha filha Pamina estará salva.

TAMINO
Salva?

PRIMEIRA DAMA
Foi arrancado da mãe por um demônio poderoso e cruel.

TERCEIRA DAMA
....Além de um coração perverso, ele tem o poder de assumir todas as formas imagináveis; desta
maneira, conseguiu enganar Pamina.

TAMINO
Ó Pamina! Arrancada de mim... Dizei-me, senhoras, onde fica a morada desse tirano?

SEGUNDA DAMA
Próxima a nossos montes, num vale agradável e encantador. Seu castelo é suntuoso e fortemente
defendido.

TAMINO
Conduzi-me senhoras! Eu vou salvar Pamina!
(Logo se ouve um acorde violento, seguido de música, que faz tremer a cena)
Ó deuses! O que é isso?

AS TRÊS DAMAS
Prepara-te!

PRIMEIRA DAMA
É o anúncio da chegada da nossa rainha!
(Trovão)

AS TRÊS DAMAS
É ela!
(Trovão)
É ela!
(Trovão)
É Ela!

(Trovão. Os montes separam-se e o teatro se transforma em um luxuoso aposento)


MONÓLOGO

PAMINA
(Fala como num sonho)
Mãe! Mãe! Mãe!
(Volta a si e olha em torno)
DIÁLOGO

PAPAGUENO
Será que eu fiquei maluco me deixando assustar assim? Ah, olha só! O belo retrato de moça aqui
de novo! Ei, você aí, filha da rainha noturna!

PAMINA
Rainha noturna? Quem é você?

PAPAGUENO
Papagueno.

PAMINA
Então você conhece a minha boa e carinhosa mãe?

PAPAGUENO
Se você for a filha da rainha noturna, conheço.

PAMINA
Oh! Sou eu, sim.

PAPAGUENO
Vou verificar isso num minuto.
(Observa o retrato que o príncipe recebera das três damas e que agora traz pendurado por uma
fita ao pescoço)
Olhos; lábios; cabelos; tudo confere, menos as mãos e os pés. De acordo com o retrato, você não
devia ter mãos nem pés, pois eles não aparecem aqui.

PAMINA
Deixa-me ver. Sim, sou eu mesma. Como isso chegou às suas mãos?

PAPAGUENO
Há muitos anos eu forneço os mais belos pássaros a sua mãe e às damas do palácio. No
momento em que pretendia fazer a entrego dos meus pássaros, dei de cara com um homem, que
se dizia príncipe. Esse príncipe cativou tanto a sua mãe, que recebeu dela esse seu retrato de
presente e a missão de libertar você. A decisão dele foi tão súbita quanto o amor que sentiu por
você.

PAMINA
Amor?

PAPAGUENO
Isso. E aqui estamos, para pegar você nos braços e, se for possível, correr para o palácio da sua
mãe, tão rápido quanto viemos, ou mais.

PAMINA
Mas, amigo, se o jovem desconhecido, ou príncipe, como ele se diz, sente amor por mim, porque
esta demorando tanto para vir me libertar dessas correntes?
PAPAGUENO
Por segurança, o príncipe teve a ideia de mandar-me na frente para anunciar nossa chegada.

PAMINA
Mas você se arriscou muito, amigo! Se Sarastro encontrasse você aqui!....

PAPAGUENO
Aí eu economizava a nossa viagem de volta, posso imaginar.

PAMINA
Você seria torturado até a morte.

PAPAGUENO
Para evitar esse contratempo é melhor fugirmos a tempo

PAMINA
Então não temos um minuto a perder. Mas e se for uma armadilha? Se esse aí não passar de um
mau espírito do séquito de Sarastro?
(Olha para Papagueno desconfiada)

PAPAGUENO
Eu? Eu sou o melhor espírito do mundo.

PAMINA
Perdão, amigo, perdão se eu ofendi você. Está estampado no seu rosto que você tem um coração
sensível.

PAPAGUENO
Ah, é claro que eu tenho um coração sensível. Mas de que adianta? Papagueno ainda não tem
uma Papaguena!

PAMINA
Mulher?

PAPAGUENO
E isso é triste! Gente como eu também tem, às vezes, umas horas de folga... E aí vem aquela
vontade de conversar...

PAMINA
Paciência, amigo! O céu também vai se lembrar de você. Vai lhe mandar uma namorada, mais
cedo do que imagina!
ATO II

CENA I

SARASTRO
(Depois de uma pausa)
Ó servos dos grandes deuses! Declara-vos, que nossa assembleia de hoje é uma das mais
importantes de nosso tempo. Em poucas palavras: esse jovem quer arrancar o véu noturno que
cobre seu rosto e vislumbrar o santuário da grande luz. Se o julgardes digno, segui então o meu
exemplo.
(Os sacerdotes tocam três vezes os cornes.)
Sensibilizado pela unanimidade de vossos corações, Sarastro vos agradece em nome da
humanidade. Os deuses destinaram a doce e virtuosa Pamina ao jovem príncipe. Por essa razão
tirei-a de sua orgulhosa mãe. Aquela mulher julga-se maior do que é. Espera destruir as sólidas
fundações do nosso templo. Só que não vai conseguir.
(Todos tocam mais uma vez o triplo acorde dos cornes.)

PRIMEIRO SACERDOTE
(levanta-se)
Grande Sarastro, reconhecemos e admiramos teu sábio discurso. Mas conseguirá Tamino
enfrentar as duras provas que o esperam? Ele é príncipe.
SARASTRO
Mais que isso: é um ser humano. Conduzi Tamino e seu companheiro de jornada ao átrio do
templo.
(Ao orador, que se ajoelha diante dele)
E tu, amigo, através de nós escolhido pelos deuses como defensor da verdade, instrui os dois
com a tua sabedoria sobre o humano dever.
(O orador sai acompanhado por um segundo sacerdote. Os demais sacerdotes reúnes suas
palmas no centro do palco.)
TAMINO
Que noite horrível! Papagueno, você ainda está aí?
(Rumor de trovão)

PAPAGUENO
Ai de mim!

TAMINO
Pelo visto, você está com medo.

PAPAGUENO
Não é medo, é só um friozinho gelado na espinha.
(Rumor mais forte de trovão)
Ai de mim!
(Rumor de trovão ainda mais forte)
Ai! Chegou a minha hora!I

PRIMEIRO SACERDOTE
Estrangeiros, que forças vos impele a penetrar em nossos muros?

TAMINO
Amizade e amor.

PRIMEIRO SACERDOTE
Estás pronto a dar a vida para conquista-los?

TAMINO
Sim!

O PRIMEIRO SACERDOTE
Principe! Ainda é tempo de desistir... Mais um passo e será tarde.

TAMINO
Que o aprendizado da minha sabedoria seja a minha vitória; e a graciosa Pamina, minha
recompensa.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Aceita todas as provas?

TAMINO
Cada uma delas.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Estende-me a tua mão.
(Dão-se as mãos)

O SEGUNDO SACERDOTE
(Para Papagueno)
Também que lutar pelo amor ao saber?

PAPAGUENO
Lutar não é comigo. E, para falar a verdade, também não estou procurando o saber. Eu sou um
homem da natureza; me contento com comer, beber e dormir. E se um dia calhar de eu encontrar
uma bela mulherzinha...

O SEGUNDO SACERDOTE
Isso nunca vai acontecer, se você não passar por nossas provas.
PAPAGUENO
E em que consistem essas provas?

O SEGUNDO SACERDOTE
Em submeter-se a todas as nossas leis, sem ter medo nem da morte.

PAPAGUENO
Continuo solteiro!
Continuo solteiro!

O SEGUNDO SACERDOTE
Mas... e se Sarastro tivesse separado pra você uma moça com roupas e cores iguaizinhas as
suas?

PAPAGUENO
Igualzinha a mim? E ela é jovem?

O SEGUNDO SACERDOTE
Jovem e bonita.

PAPAGUENO
E como ela se chama?

O SEGUNDO SACERDOTE
Papaguena.

PAPAGUENO
Papaguena? Essa eu gostaria de ver, por mera curiosidade.

O SEGUNDO SACERDOTE
Ver você pode.

PAPAGUENO
Mas depois que eu tiver visto, aí eu tenho que morrer?
(O sacerdote faz um gesto ambíguo)
Tenho? – Continuo solteiro.

O SEGUNDO SACERDOTE
Ver você pode, mas até passe o tempo previsto, não pode falar uma palavra com ela. Será que
seu espírito tem força de vontade bastante para segurar a língua?

PAPAGUENO
Tem sim!

O SEGUNDO SACERDOTE
Dê-me sua mão. Você vai vê-la.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Também a ti, príncipe os deuses impuseram um silêncio salutar. Um descuido, e estareis perdidos.
Verás Pamina, mas não deves falar com ela. Aqui tem o início o tempo das provas.
PAPAGUENO
Ei, luz! Que luz! Que estranho, cada vez que esses sacerdotes vão embora, não se enxerga mais
nada, nem de olhos abertos.
CENA IV

O PRIMEIRO SACERDOTE
Jovem, tua conduta saiu vitoriosa. Entretanto, tens ainda, pela frente, um caminho árduo e
perigoso que te levará a felicidade. Vamos prosseguir em nossa peregrinação.
(Cobre a cabeça de Tamino com o capuz)

O SEGUNDO SACERDOTE
O que vejo? Levante-se, amigo!

PAPAGUENO
Estou desmaiado.

O SEGUNDO SACERDOTE
Levante-se!

PAPAGUENO
Diga-me uma coisa, se os deuses me destinaram uma Papaguena, porque tenho que enfrentar
tantos perigos para conquista-la?

O SEGUNDO SACERDOTE
Sua razão é que terá que responder. Venha! Meu dever é levar você mais adiante.
(Cobre a cabeça de Papagueno com o capuz)
MONOLOGO

MONÓSTATOS
Ah, aí está a esquiva beldade. E foi por causa dessa plantinha que eu quase apanhei na planta
dos pés. Hm! Qual é o meu crime, afinal? E qual homem que ficaria frio e impassível diante de
uma visão dessas? Pelas estrelas do céu, essa moça ainda me deixa maluco!
(Olhando em torno de si desalentado)
Se eu estivesse certo de estar sozinho, tentaria mais uma vez.
(Abana-se com as duas mãos)
Quem sabe um beijinho seria perdoável?
RAINHA DA NOITE
Para trás!

PAMINA
Mãe! Mãe! Minha mãe!
(Cai nos braços da rainha da noite)

MONÓSTATOS
Mãe? Hm! Temos que observar isso a distância.
(Esconde-se)

A RAINHA DA NOITE
Onde está o jovem que enviei a você?

PAMINA
Consagrou-se aos iniciados de Ísis.

A RAINHA DA NOITE
Ó filha infeliz! Roubaram você de mim para sempre!

PAMINA
Vamos fugir, querida mãe!

A RAINHA DA NOITE
Minha querida criança, com a morte de seu pai, meu poder foi com ele para a tumba.
Deliberadamente legou aos iniciados o poderoso Círculo do Sol de Sete Raios que Sarastro traz
em seu peito. Quando tentei dissuadir seu pai, ele me respondeu, todos os tesouros que me
pertencem são “Sarastro vai defende-lo com a mesma hombridade que o fiz ate agora. Teu dever
é deixar-te conduzir – tu e tua filha – por homens sábios.”

PAMINA
Mãe querida, e isso quer dizer que eu devo perder para sempre o jovem príncipe?

A RAINHA DA NOITE
Para sempre.

PAMINA
Mãe querida, porque não poderia eu amar esse jovem, depois que ele for iniciado, com a mesma
ternura que o amo agora?

A RAINHA DA NOITE
O que estou ouvindo? Amar um homem que, aliado ao meu inimigo mortal, seria capaz de me
levar à perdição a qualquer momento? Esta vendo esse punhal? Foi forjado para Sarastro! Você
deve matá-lo e trazer o poderoso Círculo do Sol pra mim.
(PAMINA só com o punhal na mão)

PAMINA
Matar, eu? Não posso! Não sou capaz!
(Fica pensativa)

MONÓSTATOS
(A parte)
O que devo fazer? Confiar em mim.
(Toma-lhe o punhal)

PAMINA
(Grita assustada)
Ai!

MONÓSTATOS
Porque esta tremendo? Por causa do crime que está sendo tramado?

PAMINA
(Timidamente)
Então você sabe?

MONÓSTATOS
Tudo. Você só tem uma chance de salvar-se e a sua mãe.

PAMINA
E qual é?

MONÓSTATOS
Me amar!

PAMINA
Eu prometi meu coração ao jovem príncipe.

MONÓSTATOS
Que me importa sua promessa. Fale!

PAMINA
Nunca!

MONÓSTATOS
Pois morra, então!
(Sarastro entra e empurra Monóstatos para trás)

MONÓSTATOS
Senhor, minha conduta não merece castigo. Sou inocente! Juraram a vossa morte, e, por isso, eu
quis vingar-vos.

SARASTRO
Eu sei o bastante. Eu certamente o puniria com severidade, não fosse por uma mulher má que, foi
capaz de forjar um punhal para matar-me, você esta livre do castigo! Saia!

PAMINA
Senhor, peço que minha mãe não seja castigada.

SARASTRO
Eu sei de tudo. Que o céu conceda ao jovem príncipe coragem e perseverança em seu proposito!
Então, você será feliz ao lado dele, e sua mãe, coberta de vergonha, voltará para o castelo de
onde veio.
O PRIMEIRO SACERDOTE
Os dois ficaram aqui sozinhos. Voltaremos a nos ver antes da meta ser atingida. E mais uma vez:
silêncio!
(Sai)

O SEGUNDO SACERDOTE
Papagueno, aquele que romper o seu voto de silencio aqui, nesse lugar, será castigado pelos
deuses com raios e trovões. Passar bem!
Tamino senta-se num dos bancos.

PAPAGUENO
(após uma pausa)
Tamino!

TAMINO
(Alertando)
Psshh!

PAPAGUENO
Comigo mesmo eu posso falar. E com você também; nós somos homens...

TAMINO
(Alertando)
Psshh!

PAPAGUENO
(Cantando)
La – la – la – la! Se eles não dão para a gente nem uma gota d’água, quanto mais outra coisa.
CENA IX
Do alçapão surge UMA MULHER VELHA horrorosa, que traz um grande copo d’água.

PAPAGUENO
(fitando-a longamente)
É pra mim?

MULHER
É sim, meu anjo.

PAPAGUENO
Venha, minha velha, venha sentar-se aqui comigo. O tempo passa tão devagar. Me diga, quantos
anos a senhora tem?

MULHER
Quantos anos eu tenho?

PAPAGUENO
É!

MULHER
Dezoito anos e dois minutos.

PAPAGUENO
Dezoito anos e dois minutos?

MULHER
É!

PAPAGUENO
Ha, ha, ha! Tão novinha, meu anjinho! E você tem namorado?
MULHER
Claro que sim!

PAPAGUENO
Ele também é tão novinho quanto você?

MULHER
Não tanto, ele é uns dez anos mais velho.

PAPAGUENO
Uns dez anos mais velho que você? Deve ser um grande amor! E como se chama esse seu
amante?

MULHER
Papagueno!

PAPAGUENO
(Assusta-se; depois de uma pausa...)
Papagueno!... Onde é que ele está, esse Papagueno?

MULHER
Está aí sentado, meu anjo.

PAPAGUENO
Então sou eu o seu namorado?

MULHER
É sim, meu anjo!

PAPAGUENO
(Pega o copo d’água e atira o liquido no rosto da velha)
Me diga, então é qual é o seu nome?

MULHER
Eu me chamo...
(Forte rumor de trovão. A velha sai mancando rapidamente.Tamino levanta-se e ameaça-o com o
dedo)

PAPAGUENO
Não falo nem mais uma palavra!
(Tamino toca a sua flauta)
Fique aí tocando sua flauta, que eu vou tocando o meu almoço. Agora, vamos ver se a adega é
tão bem provida.
(Bebe)
Ah, esse vinho é dos deuses!
(Tamino para de tocar)

PAMINA
(Alegre)
Ouvi a flauta, e, como uma flecha, corri atrás do som. Mas estás triste? Não vais dizer nem uma
palavra a tua Pamina?
(Tamino faz sinal para que ela se vá)
Como? Não me amas mais?

TAMINO
(suspira)
Ah!
(Volta a fazer sinal para que ela se vá)

PAMINA
Tamino! Doce Tamino! Eu te magoei?
(Tamino suspira)
Papagueno, me diga, o que há com meu amigo?

PAPAGUENO
(De boca cheia, segura com as duas mãos a comida e faz sinal para que ela se vá)
Hm! Hm! Hm!

PAMINA
Como? Você também? Explique-me ao menos a razão desse silêncio.

PAPAGUENO
Psst!
(Aponta para fora)

PAMINA
(Pausa)
Meu amado, meu único Tamino!
PAPAGUENO

(Triplo acorde dos trombones. Tamino faz sinal a Papagueno para que o acompanhe)
Vá na frente que eu vou atrás.
(Tamino tenta força-lo a sair)
O mais forte fica.
(Triplo acorde de trombones)
Isso é com a gente! Já vai! Mas escute, Tamino, o que é que ainda vai nos acontecer?
(Triplo acorde de trombones. Tamino arrasta Papagueno dali)
Para que tanta pressa? De qualquer maneira chegaremos a tempo de nos assarem.
(Saem)
SARASTRO
Príncipe, ainda restam dois perigosos percursos em tua jornada. Tua mão, príncipe! Tragam
Pamina!
(Silêncio entre os Sacerdotes. Pamina é trazida coberta com o capuz dos que vão ser iniciados.
Sarastro desfaz os laços que prendem o capuz)

PAMINA
Onde está o meu príncipe?

SARASTRO
Ele te espera para te dar o seu ultimo adeus.

PAMINA
O ultimo adeus? Tamino!
PAPAGUENO
(Entra procurando Tamino)
Tamino!... Tamino! Só por essa vez, não abandone o seu pobre companheiro de viagem.
(Aproxima-se da porta por onde passou Tamino)

UMA VOZ
(detrás da porta)
Para trás!
(som de trovão, acompanhado por fortes acordes; sai fogo pela porta)

PAPAGUENO
Para onde é que eu vou? Se ao menos eu soubesse de onde eu vim.
(Aproxima-se da porta por onde entrou)

UMA VOZ
Para trás!
(Trovão, fogo e acordes, como antes)

PAPAGUENO
Agora não posso ir nem para frente nem para trás.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Homem! Os bons deuses, porém, retiram seu castigo. Mas também você não desfrutará jamais
dos prazeres celestes dos iniciados.

PAPAGUENO
Bem, outros haverá como eu. E para mim, o maior prazer agora seria um bom copo de vinho.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Você não tem outro desejo neste mundo?

PAPAGUENO
Até agora, não.

O PRIMEIRO SACERDOTE
Logo será servido.
(Sai. Imediatamente surge da terra um grande copo cheio de vinho tinto.)

PAPAGUENO
Viva! Já veio!
(Bebe)
Maravilhoso! Celestial! Divino! Eu queria... Eu gostaria... Bem de quê?
A MULHER VELHA entra, dançando, apoiada em sua bengala.

MULHER
Aqui estou, meu anjo!

PAPAGUENO
Que sorte, a minha.

MULHER
Ah, como eu quero abraçar, acariciar, apertar você junto ao meu coração.

PAPAGUENO
Apertar junto ao coração também?

MULHER
Venha. Me de sua mão como penhor de nossa união.

PAPAGUENO
Só que não é tão depressa assim, meu anjo! Uma decisão dessas requer um pouco de reflexão.

MULHER
Papagueno, aconselho você a não hesitar. Sua mão, ou prefere ficar preso aqui para sempre?

PAPAGUENO
Preso? Não. É melhor uma mulher velha do que mulher nenhuma. Aqui esta a minha mão, com a
garantia de ser sempre fiel... a você...
(À parte)
...até encontrar uma mais bonita.

MULHER
Jura?

PAPAGUENO
Sim, juro!
(A mulher se transforma numa moça, que está vestida igual a Papagueno)
Pa... Pa... Papaguena!
(Tenta abraçá-la)

O PRIMEIRO SACERDOTE
(Toma rapidamente a moça pela mão)
Afaste-se mocinha; ele ainda não merece você.

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