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Seminário XIX - … ou pior – Jacques Lacan (1971-1972)

I – A pequena diferença

O lugar vazio

“ … ou pior é, em suma, o que sempre posso fazer”. (p.11).

Lacan então analisa textualmente o título de seu seminário, “para não ficar no sentido,
que como todo sentido, é uma opacidade” (p. 11): pior, adverbio, mas disjunto. Ou seja,
ele não é ligado ao verbo, isso que “é chamado a ocupar um lugar”. Ao invés disso temos
os três pontos “para marcar ou criar um lugar vazio”. “Meu título enfatiza a importância
desse lugar vazio […] essa é a única maneira de dizer alguma coisa com ajuda da
linguagem”. (p. 11).
“O vazio é a única maneira de agarrar algo com a linguagem” (p. 12) e é isso que permite
penetrar na natureza da linguem.

Os prosdiorismos

A lógica, ao confrontar-se com algo que sustenta uma referência de verdade produziu a
ideia de variável, nesse caso variável aparente:
“Uma variável ligada (aparente) é uma variável que foi anteriormente livre, mas tem sido
ligada a um valor específico ou conjunto de valores denomina, a domínio de discurso ou
universo. Por exemplo a variável x torna-se ligada quando escrevemos: Para todo x,
(x+1)²=x²+2x+1; ou não existe x, tais que x²=2. X marca um lugar vazio e para isso
funcionar tem-se a condição de colocar o mesmo significante em todos os lugares
reservados vazios. Essa é a única maneira da linguagem chegar a alguma coisa e por
isso expressou: não existe metalinguagem.
Não existe metalinguagem pois a linguagem objeto, ou seja, a linguagem que é objeto da
metalinguagem é vazio. Por isso a necessidade de que toda metalinguagem seja uma
ficção, ou seja, que a linguagem objeto seja forjada no interior de um discurso.
Então o que ocupa o lugar vazio do título do seminário? Por pior ser um adverbio, seria
um verbo. Entretanto, na lógica, o verbo é o único do qual não se pode fazer um lugar
vazio, pois é o verbo que cria a função, é daquilo que o cerca que é possível fazer um
argumento. Dessa maneira, Lacan, “esvaziar esse verbo, faço dele um argumento, isto é,
uma substância”. Pire → dire, não é dizer, mas um dizer: não existe relação sexual.
Não há relação sexual, “ao sair disso, vocês só farão dizer o pior”.
“Quando digo que não há relação sexual, formulo, muito precisamente, esta verdade: que
o sexo não define relação alguma no ser falante”. Para dizer isso, Lacan parte
exatamente da pequena diferença que existe da mais tenra infância, mas ele não está
dizendo da pequena diferença “que parecerá a um dos dois, quando estiver sexualmente
maduro”.Lacan coloca a relação complexa em relação a esse órgão de maneira
espirituosa, do chiste. Diz de toda uma relação complexa em em relação a esse órgão
inscrita na experiência analítica “pelo qual somos levados pela experiência do
inconsciente, sem o qual não haveria o chiste”.
“relevante notar a importância que a função fálica assume na elaboração das tábuas da
sexuação, pois o semblante fálico se faz presente no inconsciente em detrimento da
diferença sexual que não se escreve”. (Jésus apud Fernanda – Apresentação da Jornada
EBP-MG).

Natureza e discurso

“Todo animal que tem pinças não se masturba? Está aí a diferença entre o homme et
homard (lagosta)”. “A coisa que vocês não vem é que ela contém o não-todo, que de
maneira muito precisa e curiosa escapa à logica aristotélica.
“É com o todo que se estabelece o lugar vazio que falei há pouco”. Para que o x tenha
valor de argumento – aqui colocado […] lugar vazio, de colocar na frente algo que é
chamado para todo x, que convêm à função. Ou seja, o todo se funda a partir de uma
exceção.
“A introdução do não-todo é essencial aqui. O não-todo não é essa universal
negativizada. O não-todo não é nenhum, ou seja, não se trata de nenhum animal que tem
pinças se masturba, é um não todo animal que tem pinças se masturba.
Com isso Lacan não desmonta a máquina, mas ele vai sem maior cerimônia ao furo do
sistema, ao real que nele passa – e como passa!, já que ele nos achata. (?).
“Eu lhes pedi perdão, portanto, quanto à questão da insistência. É na esperança de que a
teoria venha supri-la. (…). A relação do inconsciente com a verdade.
A boa teoria é aquela que desbrava o mesmo caminho em que o inconsciente ficou
reduzido a insistir. Isso não quer dizer que tudo estaria resolvido, mesmo que esse
caminho estivesse aberto, pelo contrário. A teoria daria um bem estar, uma naturalidade,
parecendo não ter nada a ver com isso. “Deveria ter a naturalidade que, até hoje, só os
erros têm”. Naturalidade essa que outros adotam somente como fachada, sembant.
“Foi isso que neguei, no começo, a diferença que existe, […] entre a menina e o menino.
Essa diferença que se impõe como inata é, com efeito, muito natural. […] na espécie se
auto denomina homo sapiens, […] os sexos parecem dividir-se em dois número mais ou
menos iguais de indivíduos”. “É justamente porque o ser é falante que existe o complexo
de castração. Acrescento isto para insistir, para que vocês compreendam bem o que
quero dizer”.
“É aí que o aomenozum, por engano, torna consistente a naturalidade, aliás incontestável,
da vocação prematura, se assim posso me expressar, que cada um sente para o seu
sexo”. Quando isso não funciona, diz-se da menina que é um garçon manqué, que faltou
pouco para ser um menino […] nada impede que lhe imputemos, a essa falta, um
suplemento de feminilidade. A mulher, a verdadeira, a mulherzinha, esconde-se
justamente atrás dessa falta. Esse, aliás, é um requinte em plena conformidade com que
nos ensina o inconsciente, que nunca acerta tanto quanto ao errar (rater).
Nessas condições, para ter acesso ao outro sexo, realmente é preciso pagar o preço, o
da pequena diferença que passa enganosamente para o real por intermédio do órgão […].
U órgão só é instrumento por meio disto em que todo instrumento se baseia: é que ele é
um significante.
É como significante que o transexual não o que mais, não como órgão. […] a loucura de
querer livrar-se desse erro, o erro comum que não vê que o significante é o gozo e que o
falo é apenas o significado. O transexual não quer mais ser significado como falo pelo
discurso sexual, o qual, como enunciado é impossivel.
Isso é a mesma coisa que: “somente a homossexual, escrevem no feminino, sustenta o
discurso sexual como toda a segurança. […] é que elas não correr o risco de tomar o falo
como significante. Fi-donc (Fi donc -eca em frances). […] as coloca em uma cegueira total
sobre o que vem a ser o gozo feminino.
“aquilo graças a que a mulher só saiba gozar numa ausência. A homossexual não está
ausente , em absoluto, no que lhe resta de gozo. Repito: isso lhe facilita o discurso do
amor. Mas é claro que a exclui do discurso psicanalítico, que ela mal pode balbuciar”.

Eles que se virem!


Tudo o que se coloca como relação sexual, instituindo-a por uma espécie de ficção ,
chamada de casamento, que seria uma boa regra para os psicanalistas dizer-se, quanto a
esse ponto – eles que se virem como puder.
O psicanalista ainda não apercebeu que não existe relação sexual, o papel de protetor
dos casais os obceca. […] o analista permanece enfeitiçado, isto é, ouvindo tudo da
maneira errada, ele precisa continuar preso no mastro, no qual vocês não podem deixar
de reconhecer o falo, ou seja, o significado maior, global.
[…] já que, a final, a ausência da relação sexual obviamente não impede, muito longe
disso, tal ligação, mas lhe dá condições.
“[…] vemos com frequência na entrada em psicanálise, e que, no fim das contas, não é
injustificado, ou seja, os temores às vezes manifestados pelos sujeitos quanto a tudo que
possa restringir, afetar as relações interessantes, os atos apaixonantes ou até as
perturbações criadoras exigidos pela ausência de relação.
Eles não sabem que o que evoca tais temores neles é, em suma, confiarem no silêncio
psicanalítico institucionalizado sobre a questão de que não existe relação sexual” (p. 19).

A modalidade e a negação

Lacan introduz uma nova lógica. “Esta deve ser construída a partir daquilo que não é – ou
seja, a partir disto que deve ser formulado em primeiro lugar: nada do que em decorrência
da instância da linguagem pode desembocar, de modo algum, na formulação satisfatória
da relação”. (p. 20).
Essa exploração lógica da não relação impõe limites à linguagem em sua apreensão do
real. Além disso, o seu próprio esforço de abordá-lo ela demonstra o que pode haver de
real na determinação da linguagem. “Será que não há nisso alguma coisa a ser
apreendida?” (p.20). O que há de real na linguagem em sua própria determinação?
No ponto da falha do real (“ela que determinaria todo o discurso”) – indizível – reside as
linhas dessa nova lógica, que são aquelas que descobrimos na experiência analítica. O
que a lógica desenhou, ao relacionar a linguagem com o que é postulado de real, nos
permite encontrar aí uma orientação? “Eis o esforço teórico que designo por esta leveza
que encontraria uma insistência”. (p.20).
“Por que não seria possível imaginar e escrever uma função do gozo? É ao testá-lo que
veremos, se assim posso dizer, se ela tem sustentabilidade ou não”.
O que Lacan formula nessa lição é a função do não-todo. Acreditam, ingenuamente, que
existiria alguma coisa em Aristóteles correspondente ao não-todo. “Mas não basta negar o
não-todo para que […] seja afirmada a existência. É claro que, se a existência é afirmada,
produz-se o não todo. É em torno desse existe que deve girar o nosso avanço”.
Já se chegou a confundir essência com existência, acreditando que existir é mais do que
ser. Decerto existem homens e mulheres e eles não fazem nada além de existir. O uso
correto do existe se faz no momento em que a lógica se descola um pouco do real, essa é
a única maneira que a lógica tem de poder se situar em relação ao real. Ou seja, a partir
do momento em que ela só se certifica daquela parte do real (que é a matemática) em
que é possível uma verdade. Esse existe não é nada além de um número para satisfazer
uma equação. É o manejo da verdade pelo real que faz progredir a lógica. O modo de
existir um número não é o que pode nos manter seguros sobre o que vem a ser a
existência.
Segundo plano referencial: a modalidade em Aristóteles, que seria “aquilo que vem a ser
o possível, o que pode ocorrer”. Aristóteles joga com quatro categorias:
impossível/possível e necessário/contingente. Sobre o necessário define que é o
concernente ao não poder não (ser) → necessidade.
O nosso não todo é a a discordância e a foraclusão é diferente do registro da
discordância. (p.22).
“É nisso que nos permite, sem nenhuma dúvida, fazer uma junção entre o que foi
elaborado da lógica e o que pode fundamentar-se no princípio, considerado como efeito
do real, de que não é possível escrever a relação sexual, ou seja, a função que regula
tudo o que se dá com a nossa experiência.
Ao levanta um questão, a relação sexual, que não existe – no sentido de que não se pode
escrevê-la –, essa relação sexual determina tudo o que se elabora a partir de um discurso
cuja natureza é ser um discurso rompido.” (p.22).

II – A função φx

Lacan começou o capítulo relatando o fato de ter ganho uma canetinha esferográfica e é
a partir daí que ele partiu as suas reflexões: “É quando escrevo que descubro alguma
coisa. […] O que não quer dizer que, se eu não escrevesse, não descobriria nada. Mas,
enfim, talvez eu não percebesse”. (p. 24).
1. Lacan então se propõe a falar sobre a função do escrito, mas começa então a dizer
sobre diferentes formas de escrita: “o escrito pode ser muito útil para eu descobrir alguma
coisa, mas que escrever alguma coisa para me poupar […] do risco, […] isso não dá
muito bons resultados. Mais vale eu não ter nada para ler para vocês. O escrito em que
faço algumas descobertas, de tempos em tempos, aquele em que posso preparar o que
tenho para dizer aqui, não é o mesmo tipo de escrito.
Há também o escrito para impressão, […] que não tem nenhuma relação com isto. […].
Portanto, arrisco-me a dizer uma coisa que é decisiva. A ideia que faço do escrito – para
situá-los, para partir daí, depois poderíamos discuti-lo, bom, enfim, digamos, dois pontos –
é o retorno do recalcado.
É isto, nesta forma, que pode ter-se prestado à confusão em alguns de meus Escritos. Se
em alguns momentos pude parecer que me prestava a que acreditassem que identifico o
significante com a lettre , foi justamente porque é como lettre que ela me toca mais,
talvez, a mim, como Analista. É como lettre que, na maioria das vezes, vejo retornar o
significante, justamente o significante recalcado. Então, que a esse significante eu dê a
imagem de uma lettre, em A instância da letra, é ainda mais legítimo, na medida em que
todo mundo age assim.
A primeira vez que se entra na lógica […] com Aristóteles […], também se recorre a lettre,
mas não, em absoluto, da mesma forma que quando a lettre vem no lugar do significante
que retorna. Ela surge ali para marcar um lugar, o lugar do significante […] que se
espalha, que, pelo menos, pode espalhar-se por toda a parte. Mas, afinal, vê-se que a
lettre foi feita para isso. De tal maneira que é assim que se manifesta inicialmente.
Não sei se vocês percebem bem, […] algo que não é dito naquilo que eu formulo. É
preciso haver uma transmutação que se opera do significante à letra, quando o
significante não está presente, está à deriva, cai fora. Conviria nos perguntar como isso
pode ocorrer”.
“Em 1957, no texto de Lacan A instância da letra no inconsciente, ou a razão desde
Freud, a letra é posta como o conceito pelo qual é marcada a especificidade da cadeia
significante. A instância da letra, sua insistência, como o suspenso do sentido na cadeia
significante, designa a estrutura da linguagem na medida em que o sujeito nela está
implicado; esta implicação é fundadora de toda a lógica que vai se estabelecer” (Elaine
Milmann).
“Ainda sim, a proposito dessa letra, não é possível deixarmos de lidar com um campo
chamado matemático, e no qual não se pode escrever qualquer coisa. […] é nisso que
esse domínio se distingue e que […] trata-se do que poderíamos chamar de matema, que
afirmei ser o ponto pivô de todo o ensino. Em outra palavras, não há ensino senão
matemático, o resto é brincadeira”. Isso é um estatuto diferente daquele que indiquei no
início. “a minha dificuldade […] é que meu próprio matema, em vista do campo do
discurso que tenho que estabelecer, pois bem, ele sempre confina com a burrice (bêtise).
Isso fica evidente com o que eu lhes disse […] a relação sexual, ela não existe. […] Não
convêm confundir – as relações sexuais, naturalmente, são só o que existe. […] Mas os
encontros sexuais, isso é sempre falho, mesmo e sobretudo quando é um ato.
2. A Metafísica de Aristóteles → Lacan diz: “Não é que eu não me admire a estupidez
(connerie). Direi mais, eu me prosterno diante dela. Quanto a vocês, vocês não se
prosternam. São eleitores conscientes e organizados. Não votam nos estúpidos (cons). É
aí que que saem perdendo. Um sistema político bem-sucedido deve permitir que a
estupidez tenha o seu lugar. E, alias, as coisas só imperam bem quando é a estupidez
que impera”.
“Leiam metafísica de Aristóteles e espero que, como eu, vocês sintam que a coisa é
extremamente estúpida. […] Esse caráter de estupidez não pode deixar de impressionar,
quando se lê o texto.
Não se trata da Metafísica de Aristóteles em sua essência, em seu significado, em tudo
que lhe foi explicado a partir desse texto magnífico. […] Esse livro, porque se trata de um
livro, é muito diferente da metafísica […] é preciso distinguir o sentido e o livro.
Naturalmente, uma vez que lhe tenhamos dado todo esse sentido, não é fácil reencontrar
o livro. […] ler o texto com um certo jeito de cair fora do sentido. Quando se examine o
texto é evidente que ocorrem dúvidas.
“A estupidez serve de prova quento à autenticidade. […] Não há nada mais autentico,
aliás, do que a estupidez. Então, talvez essa autenticidade não seja a de Aristóteles, mas
a metafísica – refiro-me ao texto –, ela é autentica. […] O que justifica chamá-la dessa
maneira? A estupidez é aquilo que se entra quando as perguntas são formuladas num
certo nível, que é determinado, precisamente, pela realidade da linguagem, ou seja,
quando se aborda sua função essencial, que é a de preencher tudo que deixa de hiante a
impossibilidade de existir a relação sexual, o que quer dizer que nenhum escrito pode dar
conta disso de maneira satisfatória.
Comecemos a falar de biologia: homem = portador de espermatozoides. Isso pode ser
escrito. Só que não tem nenhuma relação com o real. Não é o fato de isso ser mais
biológico que isso é real. O real é outra coisa:
“O real é o que comanda toda a função da significância. O real é aquilo com que vocês
deparam, justamente por não poderem escrever em matemática seja o que for. […]
Quando vocês tem alguns [significantes], um embrulho deles, não têm outros. Eles são
recalcados. Isso não significa que vocês não os digam, ainda assim. Justamente, vocês
os dizem inter, eles são interditos. O que não os impede de dizê-los. Mas vocês os dizem
censurados. […] isto deve ser a sua verdade primeira”.
Aristóteles […] se interroga sobre o princípio. Naturalmente, ele não faz a menor ideia de
que o princípio é que não existe relação sexual. Mas vê-se que é unicamente nesse nível
que ele se formula todas as perguntas”.
“Ele [Aristóteles] diz a si mesmo: será que o princípio é o Um, ou será que o princípio é o
Ser? Nesse momento, a coisa fica numa embrulhada terrível. É preciso, a qualquer preço,
que o Um seja, e que o Ser seja Um. Enfim, aí perdemos o fio da meada, porque,
justamente, o meio de não fazer besteira é separá-lo severamente. É isso que tentaremos
fazer na sequência. Chega de Aristóteles”.
3. É preciso escrevê-la a todo custo, a outra relação, aquela que barra a possibilidade de
escrever a primeira.
Lacan então recorre mais uma vez à matemática e faz referência ao Elementos de
Bourbaki, que é uma série que tem como objetivo ser um tratamento auto-suficiente das
áreas centrais da matemática. Diferente da série de livros matemáticos, Lacan propõe
desde o início interrogar o que quer dizer as letras “que eu tiver escrito”.
“No ano passado […] julguei poder enunciar e escrever, como na matamática, a função
que se constitui por existir o gozo sexual, que é o que propriamente constitui um
obstáculo à relação sexual. É a função φx.
O gozo sexual abre, para o ser falante, a porta do gozo. Nesse ponto, apurem um pouco o
ouvido e percebam que o gozo, quando o chamamos assim, puro e simples, talvez possa
ser o gozo para alguns, não o elimino, mas, na verdade, não é o gozo sexual”.
“Gozar é usufruir de um corpo. Gozar é abraçá-lo, é estreitá-lo, é picá-lo em pedaços. No
direito, ter o usufruto de algo é justamente isso, é poder tratar alguma coisa como um
corpo, ou seja, demoli-la, não é?”.
“O que expresso com esta notação, φx, é o que a relação do significante com o gozo
produz. Isso quer dizer que o x designa apenas um significante”.
“Um significante pode ser cada um de vocês, precisamente no nível fino que vocês
existem como sexuados. […] porém é muito mais largo na superfície que entre os
animais, nos quais, quando não estão no cio, vocês não distinguem aquilo que falei aquilo
que chamei, durante o último seminário, de menino e menina. Os filhotes de leão, por
exemplo, são absolutamente semelhantes em seu comportamento. Vocês, não, porque é
justamente como significantes que vocês se tornam sexuados”.
“Não se trata de marcar o significante homem distinto do significante mulher e de chamar
um de y e outro de x, a questão é justamente esse – é como nos distinguimos. É por essa
razão que coloco o x no lugar do furo que faço no significante. Coloco o x aí como variável
aparente. O que quer dizer que, toda vez que eu lidar com esse significante sexual, isto é,
com esse algo que se relaciona com o gozo, estarei lidando com o φx. Há entre esses x,
seja ele qual for, φx. Ou seja, aí funciona o que na matemática, é chamado de função. O
que pode se escrever como x,φx.
Φ significa a função que é chamada de castração. […] eu não sei o que significa
castração. […] a castração é algo por que é preciso passar.
Pelo fato de acharem que sabem o que é castração, “vocês ficam reduzidos a futriquinhas
– ou seja, o papai disse que vão te cortar isso fora –, como se essa não fosse a típica
idiotice. Mas há em algum lugar um ponto em que se pode dizer que tudo que se articula
de significante enquadra-se no âmbito de φx, da função da castração”.
“Ainda não falei nada sobre a relação dessa função com um certo significante, mas,
enfim, vamos lá. Essa significante é, por exemplo, um homem. […] Um homem, disse eu,
não o homem. […] Dizemos aos garotos: seja homem; não dizemos seja o homem, e por
quê? O curioso que seja mulher não se diz muito. Em contrapartida, fala-se da mulher, a
mulher, artigo definido. […] aquilo que φx escreve tem como efeito não mais podermos
dispor do conjunto de significantes.[…] E talvez esteja justamente aí uma primeira
abordagem do que ocorre com a castração, do ponto de vista dessa função matemática
que meu escrito imita”.
Em um primeiro momento peço apenas que reconheçam que isso é imitado. O que não
quer dizer que isso não vá muito mais longe. Enfim, há meios de escrever que para todo x
isso funciona.
Analíticos anteriores – Livro I, capítulo 46.
A função do não-todo nunca foi feito na lógica dos quantores e que eu faço […]. Há um
conjunto desses significantes que faz as vezes da função do sexuado no que concerne ao
gozo, num lugar em que é o não todos que funciona na função da castração.
Continuando a se servir dos quantores → Эx, que quer dizer exite. Existe o quê? Um
significante. […] Existe. Esta referência que acabo de fazer não é uma simples digressão:
é para lhe dizer que é aí que existe um sentido. É um sentido precário.
É como significantes que todos vocês existem. Vocês existem, com certeza, mais isso
não vai longe. Vocês existem como significantes. Tentem imaginar-se, digamos,
esvaziados dessa história toda, e depois me contem o que acharam. […] É evidente que
Deus existe, mas não mais do que vocês.
E pode nos interessar com respeito a esse existe, em matéria de significante? Seira que
existe pelo menos um para quem isso não funciona, essa história de castração? Foi
justamente que ela foi inventada. É o chamado Pai e é por isso que o Pai existe pelo
menos tanto quanto Deus, ou seja, não muito.
[…] o Pai é um mito, porque […] φx não funciona no nível de Totem e Tabu. O Pai não é
castrado, caso contrário, como poderia possuí-las todas, vocês se dão conta? Aliás, é só
ali que elas existem como todas, porque é às mulheres que isso convém, o não-todo […].
É a partir desse existe um, é com referência a essa exceção, que todos os outros podem
funcionar. Esse é o mito. Podemos escrever φx negada, ou seja, não é verdade que isso
se castre (esse é o mito). Diferença entre existência e exceção?
Não existe quem? O quê? Por que não seira verdade que a função φx é o que domina o
que concerne ao uso do significante?

III – Da Anedota à Lógica

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