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UMA BELEZA EM CADA ROSTO

“Deus é duro mas é belo” (Adélia Prado)

Eis uma parábola de Kierkegaard, que deseja ilustrar a importância do modo de


ver as coisas deste mundo, cuja beleza só se revela a quem tem olhos para ver.
Dois artistas se encontraram, e o primeiro disse:
- Viajei o mundo inteiro e nunca encontrei um rosto que merecesse ser pintado por mim.
O segundo pintor respondeu:
- Pois eu nunca saí de minha aldeia, e nunca encontrei um rosto que não valesse a pena
pintar.
E o filósofo comenta:
O verdadeiro artista era o segundo pintor. A realidade é a mesma para todos. Os
rostos que encontramos ao longo de nossa
vida são sempre os mesmos. Cabe a cada um de nós ver a sua dignidade e
beleza ou... não vê-la.

A vida é dura – comenta alguém – mas se você não souber encontrar a beleza
nas pequenas coisas desta vida, não a encontrará em parte alguma.
Há sempre uma beleza em cada rosto para quem tiver olhos para vê-la.
“A busca da beleza divina move os cristãos a cuidar da imagem divina deformada
nos rostos de tantos irmãos e irmãs, rostos
desfigurados pela fome, rostos desiludidos por promessas políticas, rostos
humilhados de quem vê depreciada sua própria
cultura, rostos aterrorizados pela violência diária e indiscriminada, rostos
angustiados de menores, rostos de mulheres humilha-
das e ofendidas, rostos cansados de emigrantes que não encontram digna acolhida,
rostos de anciãos sem as mínimas condi-
ções para uma vida digna” (Vita Consecrata, 75).

O Concílio Vaticano II sublinhou a grande importância das artes na vida do ser


humano:
“Elas procuram dar expressão à natureza do homem, aos seus problemas e à experiência
das
suas tentativas para se conhecer e se aperfeiçoar a si mesmo e ao mundo; e tentam
identificar a
sua situação na história e no universo, dar a conhecer as suas misérias e alegrias,
necessida-
des e energias, e desvendar um futuro melhor” (GS, 62).

No final do Concílio os bispos dirigiram aos artistas uma saudação e um apelo


nestes termos:
“O mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para não cair no desespero.
A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coração dos homens, é este fruto
precioso
que resiste ao passar do tempo, que une as gerações e as faz comungar na admiração”.

É a arte que continua a ser uma espécie de ponte que leva à experiência
religiosa.
Enquanto busca do belo, fruto duma imaginação que voa acima do dia-a-dia, a
arte é por sua natureza uma espécie de apelo ao Mistério.
Mesmo quando perscruta as profundezas mais obscuras da alma ou os aspectos
mais desconcertantes do mal, o artista torna-se de qualquer modo voz da
esperança universal de redenção.
Cada ser humano é, de certo modo, um desconhecido para si mesmo. Em contato
com o mundo das artes, a humanidade de todos os tempos espera ser iluminada
acerca do próprio caminho e destino.
Neste sentido foi dito, com profunda intuição, que “a beleza salvará o mundo”.
É a beleza que aviva nas pessoas o assombro. Diante da sacralidade da vida e do ser humano,
diante das maravilhas do universo, o assombro é a única atitude condigna. De tal assombro poderá brotar
o entusiasmo para enfrentar e vencer os desafios cruciais que se prefiguram no horizonte. Com tal entusi-
asmo a humanidade poderá, depois de cada extravio, levantar-se de novo e retomar o seu caminho.
A beleza é chave do mistério e apelo ao transcendente. É convite a saborear a vida e a sonhar o futuro.
Através da beleza das coisas criadas e do ser humano seremos conduzidos àquele Oceano infinito de
Beleza, onde o assombro se converte em admiração, inebriamento, alegria inexprimível.
Texto bíblico: 1Cro. 16,7-36

- A procura de Deus é a procura do seu verda-


deiro Nome, do seu próprio Rosto. É uma
procura sem fim, porque quando descobrimos
algo d’Ele, desejamos ver mais.
- “Tudo o que eu sinto esbarra em Deus” (A. Prado)
- Perceber em si mesmo esta espécie de “centelha”
divina que é a vocação artística: criatividade, sonhos, iniciativa, intuição, sensibilidade...
- Deixar-se iluminar na beleza da inspiração que produz a verdade e a caridade.

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