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BDI

1º DECÊNDIO FEVEREIRO / 2009


ANO XXIX – Nº 4

Uma publicação
BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO
Os serviços notariais e registrais
e o Imposto Sobre Serviços
Gilson C. Sant’Anna (p. 25)

Os contratos de franquia e a decisão do CADE


contra a cláusula de raio em shopping centers
Daniel Bushatsky (p. 3)

Convenção de condomínio
não está acima da lei.
Kênio de Souza Pereira (p. 6)

Transferência ao locatário da taxa


bancária do boleto de aluguel.
Perguntas & Respostas (p. 33)
ISSN 1982 - 4599

39 ANOS 9 771982 459001 DLI - DIÁRIO DAS LEIS IMOBILIÁRIO


Direção:
Dominique Pierre Faga ÍNDICE
Conselho Editorial:
Dominique Pierre Faga
Alberto Prates dos Santos COMENTÁRIOS E DOUTRINA
Heronides Dantas de Figueiredo Contratos de franquia – Cláusula de raio em shopping centers – Parte I (Daniel Bushatsky) .. 03
Julio Cesar Borges
E-mail: redacao@diariodasleis.com.br Convenção de condomínio não está acima da lei (Kênio de Souza Pereira) ............................. 06
Jornalista Responsável:
Julio Cesar Borges, MTB nº 42073
ISSN: 1982-4599 LIÇÕES DE DIREITO IMOBILIÁRIO
Colaboradores:
Adriano Erbolato Melo Direitos e obrigações pessoais, 2ª parte – A solidariedade (Prof. Jorge Tarcha) ........................ 09
Américo Isidoro Angélico
André Luiz Junqueira
Arthur Edmundo de Souza Rios JURISPRUDÊNCIA
Bianca Castelar de Faria
Bruno Mattos e Silva Execução fiscal – IPTU – Legitimidade passiva do compromissário vendedor (STJ) ................ 12
Caio Mario Fiorini Barbosa
Condomínio – Loteamento fechado – Cobrança de despesas de segurança por associação
Carlos Alberto Dabus Maluf
Carlos Antônio de Araújo de bairro (TJSP) .......................................................................................................................... 15
Carlos Roberto Tavarnaro
Daniel Alcântara Nastri Cerveira Compra e venda – Contrato de construção – Atraso na entrega da obra (TJRJ) ....................... 17
Daphnis Citti de Lauro SFH – Contratos celebrados sem cobertura do FCVS – Saldo devedor (STJ) .......................... 18
Dilvanir José da Costa
Felipe Leonardo Rodrigues Locação – Despejo – Denúncia vazia – Direito de preferência (TJSP) ....................................... 20
Fernanda Souza Rabello
Geraldo Beire Simões Despesas condominiais – Substituição de penhora – Inviabilidade (TJSP) ............................... 21
Hamilton Quirino
Iuli Ratzka Formiga
Jaques Bushatsky JURISPRUDÊNCIA CARTORÁRIA
Jorge Tarcha
Registro recusado – Escritura pública de venda e compra de parte ideal (CSM/SP) ................. 22
José Hildor Leal
Kênio de Souza Pereira Registro – Dúvida improcedente – Imóvel dado em integralização de capital social, por côn-
Leonardo Henrique M. Moraes Oliveira
Luis Camargo Pinto de Carvalho juges casados pelo regime da comunhão universal de bens (CSM/SP) ................................. 23
Luiz Antonio Scavone Jr.
Marcelo Manhães de Almeida
Márcio Flávio Lima BOLETIM CARTORÁRIO
Marco Aurélio Bicalho de A. Chagas
Marco Aurélio Leite da Silva Os serviços notariais e registrais e o Imposto Sobre Serviços – Final (Gilson C. Sant’Anna) .. 25
Mário Cerveira Filho Ata notarial – Parte I (João Teodoro da Silva) .............................................................................. 29
Maury Rouède Bernardes
Michel Rosenthal Wagner
Narciso Orlandi Neto
Ricardo Amin Abrahão Nacle PERGUNTAS & RESPOSTAS
Sandro Alexander Ferreira Aluguel – Taxa de boleto bancário – Repasse do custo ao locatário .......................................... 33
Sylvio Campos Lindenberg Filho
Valestan Milhomem da Costa Formal de partilha – Base de cálculo dos emolumentos para registro ........................................ 33
Valmir Gonçalves da Silva
Locação comercial – Momento e requisitos para interpor ação renovatória ............................... 33
Wilson Bueno Alves
Gerência Comercial: Cessão de compromisso de compra e venda de fração ideal a construir ................................... 34
Telefone e fax: (11) 3673-3155 (PABX)
E-mail: comercial@diariodasleis.com.br Compra e venda – Posse não transmitida ao comprador ............................................................ 34
Foto de Capa: www.sxc.hu
Imóvel abandonado pelo locatário que deixa familiares no local – Cobrança de aluguéis em
Impressão e Acabamento:
Gráfica Josemar atraso ........................................................................................................................................... 34
Editora: DIÁRIO DAS LEIS LTDA.
CNPJ(MF) 47.381.850/0001-40
Rua Bocaina, 54 - Perdizes NOTÍCIAS
CEP: 05013-901 - São Paulo - SP
Telefone e Fax: (11) 3673-3155 (PABX) Fiador que se retira da sociedade: Direito de exonerar-se da obrigação .................................... 35
Site: www.diariodasleis.com.br
E-mail: dl@diariodasleis.com.br Construtora condenada por não entregar imóvel no prazo .......................................................... 35
Obs.: Proibida a reprodução total ou par-
cial. Os artigos assinados não refletem ne-
cessariamente
2
a opinião da direção do DLI. ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA ........................................................
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COMENTÁRIOS E DOUTRINA
OS CONTRATOS DE FRANQUIA E A DECISÃO DO CADE CONTRA A
CLÁUSULA DE RAIO EM SHOPPING CENTERS – PARTE I

Daniel Bushatsky (*)

A Secretaria de Defesa Econô- tacionamento, faz ou principais concorrentes,


mica instaurou no dia 25 de julho de não diferença? quais sejam: Eldorado,
2008, dois processos administrativos Neste trabalho, ten- Morumbi, Jardim Sul,
para investigar o uso da chamada taremos fazer um inter- Villa Lobos e Higienó-
“cláusula de raio” nos contratos de relacionamento entre o polis. Ao analisar o mer-
locação comercial firmados por contrato de franquia, que cado relevante4, aferiu
shopping centers de São Paulo possui como um de seus que somente o Shopping
(Shopping Morumbi, Shopping Villa- pilares a cláusula de Eldorado era prejudicado
Lobos, Shopping Jardim Sul e raio, com a decisão do pela cláusula de raio im-
Shopping Higienópolis) e Porto Ale- CADE no caso do posta pelo Iguatemi. Ob-
gre (Shopping Iguatemi, Shopping Shopping Iguatemi. Ou servou, também, que tan-
Praia de Belas, Moinhos Shopping, seja, até onde esta decisão vinculará to o shopping center Villa Lobos, quan-
Shoppings Bourbon e Shopping Rua os contratos de franquia? De ante- to o Shopping Higienópolis nasceram
da Praia) com os seus lojistas. mão, estabeleça-se que a cláusula de e elaboraram seu Tenant Mix5 após
Não é a primeira vez que isto raio é extremamente importante anos de validade da cláusula imposta
acontece. Ano passado a mídia deu como forma de salvaguardar investi- pelo Iguatemi6 aos seus locatários.
grande espaço para a decisão do mentos e, nos casos da franquia, Para finalizar a SDE expôs: “Ou-
CADE de multar o Condomínio impedir o canibalismo entre empre- tro ponto que deve ser observado
Shopping Center Iguatemi de São sas irmãs. com o devido critério é o fato de que
Paulo (“Iguatemi”) por inserir em seus a parte representada já foi condena-
I. O processo administrativo
contratos cláusula de raio ou de da anteriormente por inserir cláusula
no CADE envolvendo o Shopping
territorialidade, atitude que restringe de exclusividade, pela qual os lojis-
Iguatemi.
a livre concorrência e a livre iniciati- tas ficariam impedidos de instalar-se
O processo administrativo foi
va de seus locatários, pois os impe- em determinados shopping centers
instaurado com base nos artigo 21,
de de abrir novas lojas em locais pró- da cidade de São Paulo, o que,
incisos III, IV, e V e no artigo 20, inciso
ximos ao shopping. 1 comprovadamente , afetava o merca-
I , todos da Lei nº 8.884/94, pela Pro-
do de shopping centers de alto pa-
A decisão realmente é importan- curadoria do CADE, que considerou
drão desta cidade, até porque não se
te. É por meio dela que poderemos ilegal a utilização da cláusula de raio
2 restringia a um único agente e era
estudar a viabilidade de novos pelo Iguatemi em seus contratos
objetiva no sentido de indicar sobre
shoppings centers, a modificação do com os locatários.
que agente econômico recairia a
tenant mix de um determinado Desta forma, seguindo o proce- restrição”....e concluiu mais adiante:
shopping, bem como a importância dimento administrativo da Lei de Con- “a restrição aqui imposta não produz
do mercado relevante no estudo da corrência, foram ouvidos, nesta or- efeitos no mercado delimitado”.
concorrência. dem, a Secretaria de Defesa Econô- Já o representante do MPF, dan-
Qual o poder de uma marca na mica3 e o Ministério Público Federal. do aval ao parecer emitido pelo SDE,
atração de consumidores? Importa a Ambos os órgãos, ao contrário do manifestou-se pelo arquivamento
localização do estabelecimento? A CADE, sugeriram o arquivamento do porque: “ Opta-se, pois, por proceder
loja estar localizada na rua ou estar processo administrativo. à análise da denominada cláusula de
dentro de um shopping center, que A Secretaria de Defesa Econô- raio nos shopping centers sob a luz
não só é detalhadamente pensado, mica (SDE) optou pelo arquivamen- da regra da razão, considerando que
como também possui infraestrutura to do processo ao analisar o “merca- esta disposição contratual, apesar de
tais como restaurantes, cinema e es- do relevante” do Iguatemi e seus restritiva, pode não necessariamen-

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COMENTÁRIOS E DOUTRINA

te representar infração a ordem eco- pagamento de multa no valor equiva- ânsia do investidor em franquias. Ele
nômica. Cabe à autoridade antitruste lente a 2% (dois por cento) do seu está atrás da segurança econômica
aferir se o grau de restrição efetiva- faturamento bruto anual, determinan- para investir em determinado negó-
mente decorrente da cláusula se do, ainda, a imediata cessação da cio8, que já consolidado no merca-
mantém no limite razoável, bastante prática, além de outras determina- do, pode lhe dar.
para, por um lado, garantir a viabili- ções, tudo nos termos do voto do Nesse passo, a melhor doutrina,
dade do empreendimento shopping Relator, o qual acolheu requerimento na pena de Jorge Pereira Andrade9,
center, e, por outro, não sobrestar o do MPF, no sentido de que seja ofici- define franquia da seguinte forma: “é
desenvolvimento das atividades co- ada a SDE, a fim de que seja promo- um conceito pelo qual uma empresa
merciais dos lojistas ali instalados”. vida investigação sobre a prática de industrial, comercial ou de serviços,
O CADE, em 04.09.2007, não cláusula de raio pelos demais detentora de uma atividade mercado-
obstante os pareceres supra citados, Shoppings Centers que integram o lógica vitoriosa, com marca notória ou
concluiu pela punição do Iguatemi, mesmo mercado relevante do nome comercial (franqueadora) per-
entre outros motivos porque: (i) a clá- Iguatemi (Eldorado, Morumbi, Jardim mite a uma pessoa física ou jurídica
usula de raio7 deve ser analisada à Sul, Villa-Lobos e Higienópolis). Ven- (franqueada), por tempo e área ge-
luz da razão e da realidade, e o cido o Conselheiro Sicsú”. ográfica exclusivos e determina-
Iguatemi usa não só a citada cláusu- Como não poderia deixar de ser, dos, seu uso, para venda ou fabri-
la, bem como outras que restringem o Iguatemi recorreu ao judiciário, que cação de seus produtos e/ou servi-
a concorrência, tal como a cláusula felizmente vem confirmando a decisão ços mediante uma taxa inicial e por-
de exclusividade; (ii) as cláusulas de da autarquia, dando segurança jurídi- centagem mensal sobre movimento
raio não obedecem a um padrão, pelo ca para novos empreendimentos. de vendas, oferecendo, para isto,
contrário, são de livre arbítrio do Neste sentido o Desembargador todo o seu know-how administrativo,
Iguatemi e, muitas vezes, possuem Federal convocado David Wilson de de marketing e publicidade, exigindo
contornos de cláusula de exclusivida- Abreu Pardo, relator do caso, salien- em contrapartida um absoluto aten-
de; (iii) a estratégia de copiar o tenant tou a impossibilidade do Iguatemi de dimento a suas regras e normas, per-
mix do concorrente é visto pela lite- limitar a concorrência sob o argumen- mitindo ou não a subfranquia”. (grifo
ratura econômica como uma forma to de diminuição do faturamento. Se- nosso)
de atuação do comércio; (iv) as cláu- gundo o magistrado, “eventual redu- A franquia, como todo o negó-
sulas de raio não podem servir para ção de faturamento do Shopping, em cio, possui pontos positivos e negati-
restringir os concorrentes, dando as- razão da exclusão da cláusula de raio, vos que valem ser destacados para
sim, às cláusulas restritivas, o papel pode ser atribuída à própria dinâmi- estudo da cláusula de territorialidade,
que caberia à eficiência e eficácia ca do mercado, e não a uma concor- para entender, principalmente, o que
das ações comerciais; e, por fim (v) rência desleal, ou mesmo a uma con- esta cláusula visa a proteger. São
a cláusula de raio eleva o poder de duta oportunista dos lojistas”. Em pontos positivos para o franqueado:
mercado do Iguatemi, bem como os seguida, acrescentou: “o fato é que a associa-se a uma marca consolida-
preços cobrados por ele. cláusula de raio, na forma como utili- da, desenvolve um conceito de su-
E concluiu com o seguinte zada pelo Shopping, parece prejudi-
cesso, corre menos risco, tem aces-
car a livre iniciativa, a livre concor-
acórdão: “O Plenário, por unanimida- so à profissionalização do negócio,
rência, e, em última instância, a liber-
de, conheceu do presente Recurso pertence a um todo coletivo, obtém
dade de escolha do consumidor, o
de Ofício no presente Processo Ad- melhor relação investimento/retorno,
que não pode ser tolerado pelo Esta-
ministrativo, dando-lhe provimento, conta com a cobertura de uma
do”.
considerando, por maioria, a Repre- corporação consolidada. Por outro
sentada, como incursa no art. 20, II. A Franquia e a cláusula de lado: menor grau de liberdade, em-
inciso I c.c. o art. 21, inciso IV e V, da territorialidade. preendimento ligado a um parceiro
Lei nº 8.884/94, condenando-a ao A palavra segurança resume a remoto, necessidade de assimilar um

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COMENTÁRIOS E DOUTRINA

conceito estabelecido de negócio, ris- A partir destas pequenas consi- “Nesse sentido, para a definição do
co associado ao desempenho do derações, trataremos agora de uma mercado relevante geográfico deste
franqueador. das bases do contrato de franquia: a processo, é necessário delimitar a
Neste sentido, óbvio é que a es- cláusula de territorialidade. A que dis- área máxima em que os consumido-
colha da marca a que o empreende- tância um franqueado deve ficar do res (lojistas/compradores) do
dor será associado/franqueado, bem outro? Shopping Center Iguatemi estariam
como a localização no novo empreen- A exclusividade em determina- dispostos a se locomoverem na hi-
dimento depende de uma análise con- das regiões tem seu fundamento, pótese de um abuso da posição do-
junta de franqueado e franqueador, segundo Adalberto Simão Filho13: “a minante. Isso permitiria conhecer to-
pelo menos na última assertiva. exclusividade territorial é de profun- dos os shopping centers (de alto pa-
É corrente que no contrato de fran- do interesse do franqueado porque drão) que concorrem com o
quia o franqueador seja remunerado delimitará o campo de sua ação e li- Iguatemi”. E concluiu que: “dessa for-
como nos shoppings centers, com por- mitará o acesso de outros integran- ma, define-se, como o mercado rele-
centagem do faturamento da loja, em- tes da rede à zona concedida. Prote- vante deste processo, os shopping
bora distintas as contrapartidas. Pare- ge-se, desta forma, a possibilidade de centers de alto padrão estabelecidos
ce óbvio, então, que dois franquea- uma concorrência danosa sobre o na zona oeste, norte da zona sul e
dos, um do lado do outro, não é do franqueado e racionaliza o processo oeste da zona central da cidade de
interesse do franqueador que terá distributivo, evitando-se a saturação São Paulo, os quais apresentam um
nessas duas lojas a diminuição do de pontos de mercado, quando bem nível de diferenciação corresponden-
faturamento e a concorrência desne- aplicada”.
te ao do shopping Iguatemi: Eldorado,
cessária entre dois franqueados10. Conforme se observa, a cláusu- Morumbi, Jardim Sul, Villa Lobos e
Nesta linha de raciocínio, Frans la de raio14 ou de exclusividade visa Higienópolis (além, obviamente, do
Martins11 coloca que são cláusulas garantir uma interdependência entre próprio Iguatemi)”.
essenciais aos contratos de franquia as franquias, preservando a capaci-
Nessa linha de raciocínio é que
o prazo de contrato, delimitação do dade de atrair o público consumidor
devem ser entendidos o mercado re-
território e da localização, as taxas de ao seu estabelecimento.
levante e a cláusula de exclusivida-
franquia, as quotas de venda, o direi- Não é segredo que a localização de em contratos de franquia16. Ne-
to de o franqueado vender a franquia do estabelecimento comercial influi
cessariamente, deve ser feito pelo
e cancelamento ou extinção do con- no fluxo de público do empreendi-
franqueador (sim, é dele a responsa-
trato12. mento e é por isto que ter como seu
bilidade pelo modelo de negócio e
Ora, nada mais lógico. O inves- vizinho e, pior, sua concorrente,
como ele vai se expandir) um estudo
tidor ao se interessar por ramo co- franqueada de mesma cadeia, não
econômico do ponto de vista do
mercial novo precisa conhecer alguns fará nada bem para o sucesso do
franqueado, analisando-se os bene-
requisitos tais como quanto ele de- negócio.
fícios de serem instalados dois ou
verá aplicar, onde será seu estabele- É por isto que a cláusula de ex-
mais estabelecimentos em locais não
cimento e suas probabilidades de êxi- clusividade deve respeitar o estudo
muito distantes, sob pena de caniba-
to. geográfico de mercado relevante e
lismo.
Que nenhum negócio tenha su- seu poder15, ou seja, qual é o públi-
co alvo do negócio e qual a possibili- Assim, somente poderá ser
cesso garantido, não é novidade.
dade real de estes visitarem e usa- permitida cláusula de raio17 que res-
Mas, ao se investir em uma franquia,
rem o negócio. peite seu fim essencial: proteger o
como já dito, os riscos são menores,
franqueado contra a predação de um
e o poder da marca combinado com No caso do Iguatemi, por exem-
“amigo concorrente”.
o know-how do franqueador devem plo, a SDE em seu parecer observou
refletir uma boa entrada no mundo os seguintes tópicos para a definição (*) O autor é Advogado em São
dos negócios. do mercado relevante geográfico: Paulo, SP.

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COMENTÁRIOS E DOUTRINA

CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO NÃO ESTÁ ACIMA DA LEI

Kênio de Souza Pereira (*)

A convenção é consagrada efeito contra a lei, sendo, portanto,


como a lei interna do condomínio, relevante para a solução do litígio a
pois tem o importante papel de regu- prova pericial, que fornecerá elemen-
lamentar a propriedade. Entretanto, tos que permitirão definir se é correto
equivoca-se quem entende que ela e justo o valor cobrado a título de taxa
está acima das Leis Federais, como de CONDOMÍNIO”. (processo n.º
a Lei 4.591/64 que “Dispõe sobre o 1.0024.06.058069-3)
condomínio em edificações e as in- “AÇÃO DECLARATÓRIA DE
Irmar Ferreira Campos em seu voto
corporações imobiliárias” e o Código NULIDADE DE COBRANÇA C/C
no processo nº 2.0000.00.501.5174/
Civil (CC). CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO -
000, do TJMG:
Os condôminos não têm o direi- JULGAMENTO ANTECIPADO DA
“Interpretando a regra gravada
to de estipular cláusulas que venham LIDE - PROVA PERICIAL - RELEVÂN-
no art. 2.035 do CC/2002 infere-se
a ferir as disposições constitucionais CIA - CERCEAMENTO DE DEFESA
que as convenções contratuais regu-
e nem as leis ordinárias. Portanto, a CARACTERIZADO - CASSAÇÃO DA
larmente estabelecidas não podem
convenção é norma subsidiária, pois SENTENÇA. Os condôminos, por
prevalecer se forem contrárias aos
não pode os 2/3 dos condôminos im- meio da convenção de condomínio,
preceitos de ordem pública, entre os
porem dispositivos que venham a fe- têm a liberdade de estipularem a for-
quais inclui-se a FUNÇÃO SOCIAL
rir o direito de propriedade, gerar ma adequada de rateio das despe-
do contrato. Logo, não há falar-se em
dano a terceiros e consagrar situa- sas condominiais. Aprovada pelo
ofensa ao ato jurídico perfeito, eis
ções injustas ou imorais. quorum regular, a convenção assu-
que, a convenção que fere a FUN-
me status de norma cogente frente
LIMITES DA CONVENÇÃO ÇÃO SOCIAL do contrato não pode
às relações condominiais. Conquan-
A convenção de condomínio predominar, por expresso manda-
to em consonância com as disposi-
emana da vontade dos condôminos mento legal”.
ções legais que regem a matéria, o
e tem natureza de contrato. O art. 422 No mesmo sentido tem-se os rateio com base na fração ideal, pre-
do CC determina: “Os contratantes seguintes julgados do TJMG: visto na convenção de condomínio,
são obrigados a guardar, assim na
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE pode, em determinados casos, ofender
conclusão do contrato, como em sua
REVISÃO DE DESPESAS CONDO- preceitos outros, hierarquicamente su-
execução, os princípios de probida-
MINIAIS C/C CONSIGNAÇÃO EM periores, como a boa-fé objetiva e a
de e boa-fé”.
PAGAMENTO. PERÍCIA. NECESSI- vedação ao enriquecimento ilícito.
Já o § único do art. 2.035 do CC DADE. - Em consonância com as dis- Destarte, é possível que se reconheça
determina:“Nenhuma convenção pre- posições legais que regem a matéria, a abusividade e ilicitude da aplicação do
valecerá se contrariar preceitos de o rateio com base na fração ideal preceito legal e estatutário concernente
ordem pública, tais como os estabe- pode, em determinados casos, ofen- ao rateio das despesas condominiais
lecidos por este Código para asse- der outros preceitos, hierarquicamen- com base na fração ideal das unidades
gurar a função social da propriedade te superiores, como a boa-fé objetiva autônomas. Nesse contexto, afigura-se
e dos contratos”. e a vedação ao enriquecimento ilícito. indispensável à solução da lide a reali-
Aplicando o disposto no referi- - Nenhuma declaração de vontade, zação da perícia indeferida na senten-
do artigo, transcreve-se entendimen- como a CONVENÇÃO de CONDO- ça. Em se verificando a utilidade da pro-
to do Sr. Relator Desembargador MÍNIO, pode prevalecer e produzir va requerida, há de se reconhecer que

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o julgamento antecipado implica cerce- as menores; Minas Gerais constatado, que em al-
amento de defesa.” (1.0024.06.281355- b) cláusula que permita que o gumas convenções de edifícios onde
5/002) síndico não preste contas à Assem- o apartamento de cobertura ou tér-

CLÁUSULAS ILEGAIS PODEM bléia Geral, de forma a tornar as con- reo é penalizado de forma injusta,

SER ANULADAS tas “uma caixa preta”, pois afronta os com cobrança abusiva de taxa de

art. 1.348, VIII e art. 1.350 do CC que condomínio estipulada com base na
A convenção não é um docu-
preveem que o síndico deve prestar fração ideal, que foi criada para divi-
mento imutável, apesar de ter cará-
contas à assembleia anualmente ou dir despesas de construção, vemos
ter normativo, oponível até contra
quando exigidas; que a imposição do rateio de despe-
aqueles que recusaram sua aprova-
sas que favorece o enriquecimento
ção, ou seja, supera o conceito de c) cláusula que impeça a eleição
ilícito das unidades-tipo não pode pre-
simples contrato que tem caráter do síndico em Assembleia ou que crie
valecer.
obrigacional somente perante aos mecanismos que favoreçam a frau-
que pactuaram. de ao impedir que vários condôminos Como os apartamentos-tipo são

participem de forma transparente da maioria no edifício, estes impedem a


Por descuido ou desconhecimen-
votação e apuração, sendo que o art. mudança da convenção pelo quorum
to da lei, pode ela conter cláusulas que
1.347 do CC, estipula que “ A de 2/3 do condomínio, e criam uma
estejam em desacordo com o Código
assembleia escolherá um síndico, situação que impõe a intervenção do
Civil, sendo as referidas cláusulas
que poderá não ser condômino, para Poder Judiciário para que o enrique-
passíveis de nulidade, cabendo ao
administrar o condomínio, por prazo cimento ilícito não prevaleça.
juiz, mediante provocação, anulá-las.
Pois, se o juiz não tivesse tal poder, não superior a dois anos, o qual po- Em abril de 2008, num proces-

quem então poderia? Certamente ne- derá renovar-se.”; so em que atuei como advogado, na

nhum juiz cometeria validar a cláusu- d) cláusula que preveja multa de defesa do proprietário de uma cober-

la que diz que 1/3 dos condô-minos mora de 10% para o inadimplente não tura, que tem uma fração ideal 188%

pode alterar convenção, já que a lei contumaz, sendo que o CC prevê que superior à dos demais apartamentos-

impõe o quorum qualificado de 2/3 do a multa será de 2%. tipo, o Desembargador do TJMG,

condomínio. De acordo com o entendimento Elpídio Donizetti, como Relator, com


de Aclibes Burgarelli, citado na obra a concordância dos Desembarga-
Ao magistrado é concedido o
de Élcio Nacur Rezende Condomínio dores Fábio Maia Viani e Guilherme
poder/dever de impedir os efeitos de
em Edifícios: Luciano Abeta Nunes, consagraram
cláusulas ilegais que possam ser co-
“Na conformidade dos novos que a convenção não pode ferir o
locadas na convenção como, por
princípios que nortearão a socieda- Código Civil e que o rateio de despe-
exemplo:
de brasileira (boa-fé objetiva e fun- sas deve ser revisto com base no efe-
a) cláusula que isenta o constru-
ção social das instituições, por exem- tivo uso e gozo de cada unidade, de
tor do pagamento da taxa de condomí-
plo), a convenção de condomínio, forma a evitar divisão injusta de des-
nio enquanto não vender as unidades.
como ato regra que é, de natureza pesas.
Logicamente, tal cláusula gera enrique-
institucional com função social relati-
cimento ilícito e afronta o art. 1.336, “Ementa: AÇÃO DECLARATÓRIA
vamente a certo grupo, não poderá
inciso I do CC, que prevê que os DE NULIDADE DE COBRANÇA C/C
destoar do novo sistema civil, sob
condôminos devem contribuir para as CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO –
pena de anulabilidade por meio de
despesas do condomínio. Da mesma JULGAMENTO ANTECIPADO DA
ação própria.”.
forma pode ser questionada a cláusu- LIDE – PROVA PERICIAL – RELEVÂN-
la que impõe a divisão de despesas TRIBUNAL DERRUBA NORMA CIA – CERCEAMENTO DE DEFESA
com base na fração ideal, se as uni- CONVENCIONAL CARACTERIZADO – CASSAÇÃO DA
dades maiores não gastam mais que Tendo o Tribunal de Justiça de SENTENÇA. Os condôminos, por

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 7


COMENTÁRIOS E DOUTRINA

meio da convenção de condomínio, xação da quota dos condôminos, des- térreo do edifício.
têm a liberdade de estipularem a for- de que obedecidos os requisitos for- (...)”
ma adequada de rateio das despe- mais, preservada a isonomia e
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
sas condominiais. Aprovada pelo descaracterizado o enriquecimento ilí-
AÇÃO DECLARATÓRIA. RATEIO
quorum regular, a convenção assu- cito de alguns condôminos. O rateio
DAS DESPESAS CONDOMINIAIS.
igualitário das despesas condominiais
me status de norma cogente frente LOJA LOCALIZADA NO ANDAR
não implica, por si só, enriquecimento
às relações condominiais. Conquan- TÉRREO.
sem causa dos proprietários de mai-
to em consonância com as disposi-
or fração ideal.” 1. Descabe ser cobrado dos AA.
ções legais que regem a matéria, o
O Tribunal de Justiça do Estado despesas relativas a equipamentos
rateio com base na fração ideal, pre-
do Rio Grande do Sul, por decisão de segurança, circuito interno de TV
visto na convenção de condomínio,
unânime na apelação cível nº e limpeza, já que deles não se bene-
pode, em determinados casos, ofen-
70020824439, constatou a abusivi- ficiam, por serem proprietários de loja
der preceitos outros, hierarquicamen-
dade de cláusula convencional de localizada no andar térreo, contando
te superiores, como a boa-fé objetiva
cobrança de taxa de condomínio, com entrada independente, sem a
e a vedação ao enriquecimento ilíci-
eximindo uma loja que possuía en- utilização do espaço interno do con-
to. Destarte, é possível que se reco-
trada independente, sem a utilização domínio. 2. Impositivo o recálculo da
nheça a abusividade e ilicitude da
do espaço interno do condomínio, do
aplicação do preceito legal e cota condominial, na forma como es-
pagamento das despesas com as
estatutário concernente ao rateio das tabelecido pela sentença, para dela
quais a mesma não tinha participa-
despesas condominiais com base na afastar as despesas com as quais
ção, dentre elas as relativas a equi-
fração ideal das unidades autônomas. não se beneficiam os AA. NEGADO
pamentos de segurança, diante da
Nesse contexto, afigura-se indispen- PROVIMENTO A AMBOS OS APE-
efetiva comprovação de quem deles
sável à solução da lide a realização LOS. UNÂNIME.
se beneficiam é que se mostra pos-
da perícia indeferida na sentença. Em
sível o aludido rateio. Portanto, a convenção não pode
se verificando a utilidade da prova
requerida, há de se reconhecer que No trecho extraído do voto da se sobrepor o Código Civil e aos prin-
o julgamento antecipado implica cer- Desembargadora Nara Leonor Cas- cípios jurídicos, cabendo aos que se
ceamento de defesa.” tro Garcia, no processo acima cita- sentirem lesados, combater a norma
do, a mesma explana com maestria que for ilegal, e questioná-la em juízo,
No sentido de confirmar que a
sobre a questão em tela: caso o bom senso não prevaleça en-
Convenção é norma subsidiária, não
podendo estipular cláusula que venha “(...) tre os condôminos que devem evitar
a ferir princípios jurídicos e nem esti- Sendo assim, ainda que a conven- a manutenção de normas que cau-
pular rateio de maneira a penalizar ção de condomínio preveja o rateio sem situações injustas.
alguma unidade com a cobrança de comum das despesas condominiais e, (*) O autor é Diretor da Caixa
forma abusiva, ou seja, contrária ao no caso, pagamento diferenciado aos
Imobiliária – Rede Netimóveis, Advo-
que realmente usufrui dos serviços AA., com redução de 35% do valor
gado Especialista em Direito Imobili-
comuns, o STJ decidiu da seguinte devido, nada impede que, mediante
forma:
ário, Vice-presidente do Sindicato do
provocação do condômino, como no
Mercado Imobiliário de Minas Gerais
“Ementa: DIREITO CIVIL - DES- caso, venha o Poder Judiciário a se
(SECOVI-MG), Professor do MBA da
PESAS CONDOMINIAIS - CRITÉRIO pronunciar de forma a redefinir quais
despesas condominiais podem ser co- FEAD-MG – Direito Imobiliário, Árbi-
DE RATEIO NA FORMA IGUALITÁRIA
ESTABELECIDO EM CONVENÇÃO bradas dos AA., afastando do rateio tro da CAMINAS – Câmara de Arbi-
CONDOMINIAL – ADMISSIBILIDADE. aquelas das quais não se utilizam por tragem de Minas Gerais, Tel. (31)
A assembléia dos condôminos é livre não lhes trazer qualquer benefício à 3225-5599 – e-mail – keniopereira@
para estipular a forma adequada de fi- sua unidade autônoma, localizada no caixaimobiliaria.com.br

8 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


LIÇÕES DE DIREITO IMOBILIÁRIO
DIREITO
DIREITOS E OBRIGAÇÕES PESSOAIS
2ª PARTE – A SOLIDARIEDADE

Jorge Tarcha (*)

Na lição anterior estávamos exa- entre os três inquilinos.


minando os elementos que constitu- Veja-se o que diz o Código Civil:
em as obrigações.
Art. 264. Há solidariedade, quan-
São eles: um vínculo jurídico, as do na mesma obrigação concorre
partes e uma prestação. mais de um credor, ou mais de um
Após analisar o vínculo, estamos devedor, cada um com direito, ou
discorrendo sobre o segundo elemen- obrigado, à dívida toda.
to, qual seja, as partes. No caso de pluralidade de cre-
João ser locador de uma residência,
Nesse tópico, começamos a sendo que há três irmãos como loca- dores, ocorre a solidariedade ativa.
abordar a possibilidade da existência tários, a saber: José, Walter e Fábio. Havendo mais de um devedor, tere-
de mais de um sujeito em cada uma mos uma solidariedade passiva. O
Já vimos que se trata de um
das duas partes. Código Civil trata das duas:
caso de pluralidade de sujeitos, vale
Caso quiséssemos complicar as dizer, de uma pluralidade subjetiva. Da Solidariedade Ativa
palavras, diríamos que seria um caso Art. 267. Cada um dos credores
Normalmente, João teria a ne-
de pluralidade subjetiva. solidários tem direito a exigir do de-
cessidade de cobrar 1/3 do aluguel
Dissemos que, nessa hipótese, de cada um dos inquilinos, o que, con- vedor o cumprimento da prestação
poderá surgir a questão da solidari- venhamos é bastante trabalhoso.. por inteiro.
edade entre os vários sujeitos. Da Solidariedade Passiva
Porém, se houver solidariedade
É desse tema que trataremos Art. 275. O credor tem direito a
Porém, seria muito bom se hou-
agora. exigir e receber de um ou de alguns
vesse um mecanismo pelo qual ele
Obrigações solidárias dos devedores, parcial ou totalmen-
pudesse cobrar todo o aluguel, diga-
te, a dívida comum;
Nos contratos em geral, haven- mos, de José.
do pluralidade de sujeitos, prevalece A solidariedade ativa
José, tendo pago tudo, teria o
o seguinte princípio: Sua utilidade prática é muito pe-
cansativo encargo de cobrar 1/3 de
quena. Como acentua SILVIO
Cada credor não poderá exigir Walter e 1/3 de Fábio, por meio de
RODRIGUES, a maioria esmagado-
mais que a sua parte. E cada deve- ações chamadas regressivas, uma
ra dos juristas a vê como injustificada
dor somente responde pelo quinhão para cada irmão.
reminiscência do Direito Romano, só
respectivo. Mas o trabalho do locador João conservada pela força da tradição.
Isto será melhor explicado por seria muito facilitado.
O motivo é que ela é inconveni-
meio de um exemplo. Esse mecanismo é a solidarie- ente para os credores. De fato, qual-
Façamos de conta que João tem dade. quer um deles poderá receber o cré-
um crédito em face de três devedo- Vejam que ocorreram dois tipos dito. Os demais credores ficarão à
res, referentes ao mesmo objeto. de relações: uma externa entre os mercê dele, que poderá receber a
Seria o caso, para ilustrar, de inquilinos e o locador. Outra interna, totalidade da dívida.

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 9


LIÇÕES DE DIREITO IMOBILIÁRIO

É claro que ele deverá prestar A solidariedade é, pois, excep- datárias de uma coisa, ficarão soli-
contas aos demais. Porém, se ele se cional dariamente responsáveis para com o
tornar insolvente, os outros terão pre- Observe-se que a obrigação so- comodante.
juízo. Sem falar na demora do trans- lidária constitui uma exceção. Por Art. 1016. Os administradores
curso de uma ação de prestação de esse motivo, ela não é admitida fora respondem solidariamente perante a
contas. da lei ou do contrato. sociedade e os terceiros prejudica-
A solidariedade passiva Não havendo expressa menção dos, por culpa no desempenho de

Já esta solidariedade tem gran- no contrato e não existindo previsão suas funções.

de importância, pelas vantagens que legal, a obrigação se divide. Cada Art. 1052. Na sociedade limitada,
apresenta. devedor é obrigado apenas à sua a responsabilidade de cada sócio é

Com efeito, como já dissemos quota parte e cada credor tem direito restrita ao valor de suas quotas, mas

acima, o credor não precisa acionar apenas ao seu quinhão. todos respondem solidariamente pela

cada um dos devedores. Ele pode Assim sendo, a solidariedade integralização do capital social.

reclamar, de um ou de alguns dos co- não pode decorrer de sentença judi- Um exemplo da Lei das Loca-
devedores, o pagamento do total, cial. ções (Lei 8.245/91 – consultar o
podendo escolher o mais solvente ou Exemplos de solidariedade portal de legislação do Diário das
o que tenha bens de maior liquidez. instituída por lei Leis)

Regras da solidariedade passiva (Os artigos citados abaixo são Art. 2º Havendo mais de um lo-

todos do Código Civil) cador ou mais de um locatário, en-


1. O credor tem o direito de es-
tende-se que são solidários se o con-
colher o devedor que deverá pagar. Art. 829. A fiança conjuntamen-
trário não se estipulou.
2. O infeliz que foi escolhido terá te prestada a um só débito por mais
de uma pessoa, importa o compro- Isso significa que sempre have-
de pagar o total da dívida.
misso de solidariedade entre elas, se rá solidariedade na pluralidade de lo-
3. Tendo pago tudo, tem ação cadores ou de locatários, a menos
declaradamente não se reservarem
regressiva contra os outros, dos quais que o contrato estipule que ela não
o benefício de divisão.
somente pode receber a quota de ocorrerá.
Art. 942. Os bens do responsá-
cada um. Solidariedade nas incorporações
vel pela ofensa ou violação do direito
A solidariedade não se presume de outrem ficam sujeitos à reparação a) caso de mais de um incor-

do dano causado; e, se a ofensa ti- porador


Veja-se o que diz o Código Civil:
ver mais de um autor, todos respon- Anote-se o teor do artigo 31 e
Código Civil, art. 265. A solidari-
derão solidariamente pela reparação. parágrafos da Lei dos Condomínios
edade não se presume; resulta da lei
Art. 518. Responderá por perdas e Incorporações (Lei nº 4.591/64 –
ou da vontade das partes.
e danos o comprador, se alienar a consultar o Portal da Legislação do
O verbo presumir significa en- Diário das Leis).
coisa sem ter dado ao vendedor ci-
tender, imaginar, supor, conjeturar, ência do preço e das vantagens que Art. 31. A iniciativa e a respon-
suspeitar, pressupor: por ela lhe oferecem. Responderá sabilidade das incorporações imobi-
Sendo assim, ela não se consi- solidariamente o adquirente, se tiver liárias caberão ao incorporador, que
dera presente em todas as situações procedido de má-fé. somente poderá ser:
de débito e crédito. Não se a tem Art. 585. Se duas ou mais pes- a) o proprietário do terreno, o
como certa. soas forem simultaneamente como- promitente comprador, o cessionário

10 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


LIÇÕES DE DIREITO IMOBILIÁRIO

deste ou promitente cessionário com sabilidade Civil na Incorporação Imo- publicidade e corretagem, resultam
título que satisfaça os requisitos da biliária, informa: culpadas pela impossibilidade da
alínea a do art. 32; “A empresa corretora pode so- construção, respondem perante o

b) o construtor ou corretor de frer as sanções cabíveis às pessoas compromissário-comprador solidari-

imóveis. jurídicas que têm a obrigação de não amente.

(...) veicular propaganda de imóvel em Sobre vícios de qualidade e de


condomínio sem mencionar o núme- quantidade, em havendo relação
§ 3º Toda e qualquer incorpora-
ro da incorporação no registro de imó- de consumo
ção, independentemente da forma
veis”. Uma pessoa pode estar adqui-
por que seja constituída, terá um ou
mais incorporadores solidariamen- O renomado autor menciona as rindo uma unidade autônoma de um

te responsáveis..., seguintes ementas: fornecedor.

A norma quer dizer que, caso 1. Contrato – Compromisso de Fornecedor, no sentido técnico,

haja mais de um incorporador, serão compra e venda – Incorporação imo- é aquele que fornece em caráter ha-

todos solidários entre si. biliária – Rescisão – Cumulação com bitual, como atividade profissional e
devolução das quantias pagas e per- não esporadicamente.
b) quanto à concessão do “ha-
das e danos – Corretor de vendas – Após a aquisição, surgiram de-
bite-se”:
Omissão quanto à irregularidade do feitos no imóvel.
Lei 4.591/64, art. 44. Após a con- negócio, firmando , inclusive, os re-
cessão do “habite-se” pela autorida- Se esse for o caso, atente-se
cibos das quantias contratadas – So-
de administrativa, o incorporador de- para o teor do artigo 18 do Código de
lidariedade com a incorporadora –
verá requerer a averbação da cons- Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/
Recurso não provido.
trução das edificações, para efeito de 90 – consultar o Portal de Legislação
2. E, assim, associou-se à do Diário das Leis):
individualização e discriminação das
incorporadora do empreendimento, Os fornecedores de produtos de
unidades, respondendo perante os
que não chegou sequer a ser inicia- consumo duráveis ou não duráveis
adquirentes pelas perdas e danos
do, quer fisicamente, bem como pe- respondem solidariamente pelos
que resultem da demora no cumpri-
rante o Registro Imobiliário. Por isso vícios de qualidade ou quantidade
mento dessa obrigação.
que, nos termos do artigo 159 do que os tornem impróprios ou inade-
§ 1º Se o incorporador não re- Código Civil (de 1916), deve arcar quados ao consumo a que se desti-
querer a averbação, o construtor com os prejuízos causados. nam ou lhes diminuam o valor...
requerê-la-á, sob pena de ficar so-
3. Resultando de ato ilícito a par- Prevalecem, assim, as regras
lidariamente responsável com o
ticipação das rés no negócio, torna- da solidariedade passiva. O consu-
incorporador perante os adquiren-
se irrecusável a solidariedade passi- midor tem o direito de escolha entre
tes.
va de ambas. os participantes do negócio incorpo-
Solidariedade da empresa 4. Empresas coligadas que, na rativo (incorporador, construtor, em-
corretora promoção e incorporação de venda presa corretora), buscando ressar-
Everaldo Augusto Cambler, em e compra de unidades imobiliárias, cimento de um ou de todos conjun-
sua minuciosa obra sobre a Respon- quer no ramo de construção, quer na tamente.

(*) O autor é Advogado, Professor de Direito Imobiliário. Autor dos livros: Direito Imobiliário, Uma Abordagem
Didática, edição particular; Títulos de Crédito, Editora Plêiade; Contratos Mercantis, Editora Graph Press; Despesas
Ordinárias e Extraordinárias de Condomínio, Editora Juarez de Oliveira. Autor do curso a distância, por correspondên-
cia, sobre locação de imóveis, da empresa Diário das Leis. E-mail: jorgetarcha@jorgetarcha.com.br

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 11


JURISPRUDÊNCIA
JURISPRUDÊNCIA
EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – POSSIBILIDADE DE LEGITIMIDADE PAS-
SIVA “AD CAUSAM” DO COMPROMISSÁRIO VENDEDOR POR OPÇÃO
DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA (STJ)
AgRg no Recurso Especial nº 1.070.593 - SP (2008/ STF; e ainda,
0138147-9) b) pela incidência da Súmula 583 do STF.
Relator: Ministro Humberto Martins Sem impugnação. (fl. 156 v)
Agravante: Magnum Comercial e Construtora Ltda É, no essencial, o relatório.
Agravado: Município de São Paulo É vasta a jurisprudência do STJ, que adota o enten-
EMENTA dimento de que é “Legítimo para figurar no pólo passivo
Processual Civil – Execução fiscal – IPTU – Legi- da execução fiscal tanto o compromissário-vendedor como
timidade passiva ad causam – Compromissário ven- o compromissário-comprador, podendo a autoridade ad-
dedor – Possibilidade – Precedentes. ministrativa optar por um ou por outro, visando a facilitar o
procedimento de arrecadação.” (REsp 457.078/SP, Rel.
É vasta a jurisprudência do STJ, que adota o en- Min. Teori Albino Zavascki).
tendimento de que é “Legítimo para figurar no pólo
passivo da execução fiscal tanto o compromissário- Agravo regimental improvido.
vendedor como o compromissário-comprador, poden- VOTO
do a autoridade administrativa optar por um ou por O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):
outro, visando a facilitar o procedimento de arrecada-
ção.” (REsp 457.078/SP, Rel. Min. Teori Albino Mantenho a decisão agravada.
Zavascki). É vasta a jurisprudência desta Corte, que perfilha o
Agravo regimental improvido. entendimento de que é “Legítimo para figurar no pólo pas-
sivo da execução fiscal tanto o compromissário-vendedor
ACÓRDÃO como o compromissário-comprador, podendo a autorida-
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são de administrativa optar por um ou por outro, visando a
partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Se- facilitar o procedimento de arrecadação.” (REsp 457.078/
gunda Turma do Superior Tribunal de Justiça “A Turma, SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki).
por unanimidade, negou provimento ao agravo regimen- Nesse sentido, as ementas dos seguintes julgados:
tal, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”
Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell “Tributário – Execução fiscal – IPTU – Legitimidade
Marques, Eliana Calmon e Castro Meira (Presidente) vo- passiva – Art. 34 do CTN – Violação do art. 535, I, do
taram com o Sr. Ministro Relator. CPC: Inexistência.

Brasília (DF), 11 de novembro de 2008 1. Inexistente contradição no julgado, mas nítido pro-
pósito de rediscussão da matéria, afasta-se a alegação
Ministro Humberto Martins, Relator de ofensa ao art. 535, I, do CPC.
RELATÓRIO 2. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido
O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator): de que o promitente comprador pode ser considerado
Magnum Comercial e Construtora Ltda. interpõe agra- contribuinte do IPTU, conjuntamente com o proprietário
vo regimental contra decisão de minha autoria, que ficou do imóvel, responsável pelo seu pagamento. A existência
assim ementada: (fl. 128) de possuidor apto a ser considerado contribuinte do im-
posto não implica exclusão automática, do pólo passivo
“Processual Civil – Execução fiscal – IPTU – Legiti- da obrigação tributária, do titular do domínio (assim en-
midade ad causam – Compromissário vendedor – Possi- tendido aquele que tem a propriedade registrada no Re-
bilidade – Recurso especial provido.” gistro de Imóveis). Precedentes: Resp 979.970/SP (Rel.
O agravo interno baseia-se nas seguintes razões, em Min. Luiz Fux), dentre outros.
síntese: 3. Legítimo para figurar no pólo passivo da execução
a) pela inadmissão do recurso especial, pois neces- fiscal tanto o compromissário-vendedor como o
sária a interpretação de lei local, incidindo a Súmula 280/ compromissário-comprador, podendo a autoridade admi-

12 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA

nistrativa optar por um ou por outro, visando a facilitar o suidor apto a sofrer a incidência do imposto.
procedimento de arrecadação (Precedente REsp 457.078/ 1. ‘Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o
SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki). titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título,
4. Recurso especial provido em parte.” pode a autoridade administrativa optar por um ou por ou-
(REsp 850.000/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado tro visando a facilitar o procedimento de arrecadação.’
em 21.8.2008, DJe 25.9.2008.) (REsp 927.275/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, 1ª
Turma, DJ de 30/4/2007).
“Processo Civil. Tributário. Execução fiscal. IPTU.
Cobrança. Exceção de pré-executividade. Legitimidade 2. Recurso Especial conhecido e provido.”
passiva. Dilação probatória. Contrato de promessa de (REsp 712.998/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Se-
compra-e-venda. Proprietário e possuidor. Concomitância. gunda Turma, julgado em 4.9.2007, DJ 8.2.2008.)
(...) “Processual Civil – Execução fiscal – IPTU – Legiti-
2. A invocação de ilegitimidade passiva ad causam, midade ad causam – Compromissário vendedor – Possi-
via exceção de pré-executividade, afigura-se escorreita, bilidade.
uma vez cediço na Turma que o novel incidente é apto a 1. Hipótese de cobrança de IPTU de compromissário-
veicular a ausência das condições da ação. Faz-se mis- vendedor cujo nome ainda consta no registro de imóveis.
ter, contudo, a desnecessidade de dilação probatória (ex- 2. A questão refere-se a responsabilidade tributária
ceção secundum eventus probationis), porquanto a situa- que é atribuída ao proprietário, qual seja, aquele que tem
ção jurídica a engendrar o referido ato processual deve a propriedade registrada no Registro de Imóveis.
ser demonstrada de plano.
3. Existência de lei municipal que atribui responsabi-
3. In casu, o indeferimento do pedido deveu-se à lidade tributária ao possuidor indireto.
inexistência de comprovação do compromisso de com-
pra e venda e do registro translatício do domínio no cartó- 4. O entendimento desta Corte é no sentido de que o
rio competente, malogrando o recorrente a infirmação da promitente comprador é legitimado para figurar no pólo
certeza, da liquidez ou da exigibilidade do título, mediante passivo conjuntamente com o proprietário, qual seja, aque-
inequívoca prova documental. le que tem a propriedade registrada no Registro de Imó-
veis, em demandas relativas à cobrança do IPTU. E, as-
4. Ademais, o possuidor, na qualidade de promitente- sim, cabe, ao legislador municipal, eleger o sujeito passi-
comprador, pode ser considerado contribuinte do IPTU, vo do tributo, contemplando qualquer das situações pre-
conjuntamente com o proprietário do imóvel, responsável vistas no CTN.
pelo seu pagamento.
Agravo regimental improvido.”
(Precedentes: REsp 784.101/SP, deste relator, DJ de
30.10.2006; REsp 774720/RJ; Relator Ministro Teori Albino (AgRg no REsp 1022614/SP, Rel. Min. Humberto
Zavascki DJ 12.06.2006; REsp 793073/RS Relator Mi- Martins, julgado em 8.4.2008, DJ 17.4.2008.)
nistro Castro Meira DJ 20.02.2006; REsp 712.998/RJ, “Tributário. Execução fiscal. IPTU. Legitimidade
Rel. Ministro Herman Benjamin, DJ 08.02.2008; REsp passiva. Proprietário e possuidor. Fixação da verba hono-
774720 /RJ, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ rária. Recurso especial. Ausência de prequestionamento.
12.06.2006) Análise do contexto fático-probatório da causa. Aplicação
5. O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do das súmulas 07 do STJ e 389 do STF.
IPTU ‘é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio 1. A falta de prequestionamento da matéria suscita-
útil, ou o seu possuidor a qualquer título’. da no recurso especial, a despeito da oposição de embar-
6. A existência de possuidor apto a ser considerado gos de declaração, impede o conhecimento do recurso
contribuinte do IPTU não implica a exclusão automática, especial (Súmula 211 do STJ).
do pólo passivo da obrigação tributária, do titular do domí- 2. Em matéria de prova, as instâncias ordinárias são
nio (assim entendido aquele que tem a propriedade regis- soberanas, não podendo o STJ, em recurso especial,
trada no Registro de Imóveis). apreciar eventual desacerto na sua análise (Súmula 7/
7. Recurso Especial desprovido.” STJ).
(REsp 979.970/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Tur- 3. O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do
ma, julgado em 6.5.2008, DJe 18.6.2008.) IPTU “é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio
“Tributário. Execução fiscal. IPTU. Contrato de pro- útil, ou o seu possuidor a qualquer título”. Assim, a exis-
messa de compra e venda. Legitimidade passiva do pro- tência de possuidor apto a ser considerado contribuinte
prietário do imóvel não excluída pela existência de pos- do IPTU não implica a exclusão automática, do pólo pas-

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 13


JURISPRUDÊNCIA

sivo da obrigação tributária, do titular do domínio (assim passivo do tributo, contemplando qualquer das situações
entendido aquele que tem a propriedade registrada no previstas no CTN.
Registro de Imóveis). Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o ti-
4. Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito pas- tular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título, pode
sivo do tributo, contemplando qualquer das situações pre- a autoridade administrativa optar por um ou por outro vi-
vistas no CTN. Definindo a lei como contribuinte o propri- sando a facilitar o procedimento de arrecadação’ (Prece-
etário, o titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer dente: REsp 475.078/SP, 1ª T, Rel. Min. Teori Albino
título, pode a autoridade administrativa optar por um ou Zavascki, DJ dia 27.09.2004).
por outro visando a facilitar o procedimento de arrecada- 5.Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta
ção. parte, desprovido.”
5. No caso, porém, o Tribunal de origem, apreciando (REsp 927.275/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
as provas dos autos, considerou o executado parte ilegíti- Primeira Turma, Julgado em 17.4.2007, DJ 30.4.2007.)
ma pois o Fisco já conhecia a transferência da proprieda-
de do imóvel tributado, uma vez que consta de seus ca- “Processo Civil. Tributário. Mandado de segurança.
dastros o nome do novo responsável tributário. Taxas. Legitimidade ativa. Contrato de promessa de com-
pra-e-venda. Proprietário e possuidor. Concomitância.
6. O reexame da adequada aplicação, pelo acórdão
recorrido, dos critérios de eqüidade, previstos no art. 20, 1. O promitente comprador de imóvel possui legitimi-
§ 3º, do CPC, impõe, necessariamente, revolvimento dos dade ativa ad causam para impetrar mandado de segu-
fatos e das provas dos autos, o que não se comporta no rança objetivando efetuar o pagamento do IPTU, indepen-
âmbito do recurso especial, atraindo a incidência da dentemente do pagamento das taxas de conservação e
Súmula 7/STJ. Aliás, sobre a matéria, o STF editou a limpeza, incidentes sobre o imóvel objeto do contrato de
súmula 389, aqui aplicável por analogia: “salvo limite le- promessa de compra e venda, tendo em vista que: I) foi
gal, a fixação de honorários de advogado, em comple- imitido na posse do imóvel, conforme certificado pelas ins-
mento da condenação, depende das circunstâncias da tâncias ordinárias;
causa, não dando lugar a recurso extraordinário”. II) não há, nos autos, qualquer afirmação ou com-
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nes- provação de que o tributo tenha sido recolhido por pessoa
sa parte, improvido.” diversa. Precedente: AgRg no REsp 754.278/RJ, Rel. Min.
Francisco Falcão, DJ 28.11.2005.
(REsp 713.581/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
julgado em 15.4.2008, DJ 7.5.2008.) 2. O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do
IPTU “é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio
“Tributário. Execução fiscal. IPTU. Contrato de pro- útil, ou o seu possuidor a qualquer título”.
messa de compra-e-venda. Legitimidade passiva. Propri-
etário e possuidor. Dissídio jurisprudencial não compro- 3 Deveras, a existência de possuidor apto a ser con-
vado. Sumula 13/STJ. Interpretação de direito local. Im- siderado contribuinte do IPTU não implica a exclusão au-
possibilidade. Súmula 280/STF. tomática, do pólo passivo da obrigação tributária, do titu-
lar do domínio (assim entendido aquele que tem a propri-
1. A divergência jurisprudencial ensejadora do conhe- edade registrada no Registro de Imóveis).
cimento do recurso especial pela alínea c deve ser devi-
damente demonstrada, conforme as exigências dos arts. 4. O possuidor, na qualidade de promitente-compra-
541, parágrafo único, do CPC e 255 do RISTJ, sendo cer- dor, pode ser considerado contribuinte do IPTU, conjunta-
to que a ‘divergência entre julgados do mesmo Tribunal mente com o proprietário do imóvel, responsável pelo seu
não enseja recurso especial’ (Súmula 13/STJ). pagamento. (Precedentes: REsp 784.101/SP, deste relator,
DJ de 30.10.2006; REsp 774720 /RJ; Relator Ministro
2. Ofensa a direito local não enseja recurso especial,
Teori Albino Zavascki DJ 12.06.2006; REsp 793073/RS
aplicando-se, por analogia, a Súmula 280 do Supremo
Relator Ministro Castro Meira DJ 20.02.2006; AgRg no
Tribunal Federal.
REsp 754278/RJ Relator Ministro Francisco Falcão DJ
3. ‘O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do 28.11.2005 REsp 475078/SP Relator Ministro Teori Albino
IPTU ‘é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio Zavascki DJ 27.09.2004) 5. Recurso Especial desprovi-
útil, ou o seu possuidor a qualquer título’. A existência de do.”
possuidor apto a ser considerado contribuinte do IPTU
(REsp 752.815/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Tur-
não implica a exclusão automática, do pólo passivo da
obrigação tributária, do titular do domínio (assim entendi- ma, julgado em 27.2.2007, DJ 15.3.2007, p. 265.)
do aquele que tem a propriedade registrada no Registro “Tributário. IPTU. Responsabilidade tributária. Pro-
de Imóveis). Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito messa de compra e venda de imóvel. Legitimidade passi-

14 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA

va do proprietário. Precedentes: AgReg no AG 628773/MG, Segunda Turma,


1. ‘A existência de possuidor apto a ser considerado Min. João Otávio de Noronha, DJ de 23.05.2005; AgReg
contribuinte do IPTU não implica a exclusão automática, no Resp 623209/MG, Primeira Turma, Min. Francisco Fal-
do pólo passivo da obrigação tributária, do titular do domí- cão, DJ de 25.04.2005.
nio (assim entendido aquele que tem a propriedade regis- 5. Em se tratando de tributos cujo lançamento se dá
trada no Registro de Imóveis)’ (REsp 761088/SP, rel. Min. de ofício, como é o caso do IPTU, o prazo qüinqüenal
Francisco Falcão, DJ de 7.11.2005). para se pleitear a repetição do indébito tem como termo
2. Recurso especial provido.” inicial a data de extinção do crédito tributário pelo paga-
mento. Prevalência da aplicação do artigos 156, I, 165, I e
(REsp 596.757/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 168, I, do CTN sobre o artigo 1º do Decreto 20.910/32.
Segunda Turma, julgado em 14.11.2006, DJ 19.12.2006.) Jurisprudência pacífica nas 1ª e 2ª Turmas do STJ.
“Processual Civil e tributário. Repetição de indébito. 6. Recurso especial a que se dá parcial provimento.”
IPTU. Promitente-comprador. Legitimidade. Taxas. Iden-
(REsp 774.720/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
tidade da base de cálculo. Matéria de índole constitucio-
Primeira Turma, Julgado em 1.6.2006, DJ 12.6.2006.)
nal. Prescrição. Termo inicial.
Inviável a incidência da Súmula 583 do STF, pois não
1. O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do
se trata de bem pertencente à autarquia, como dispõe a
IPTU ‘é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio
literalidade da referida Súmula.
útil, ou o seu possuidor a qualquer título’. Ao legislador
municipal cabe eleger o sujeito passivo do tributo, con- Também não é o caso da Súmula 280 do STF, pois
templando qualquer das situações previstas no CTN. não houve qualquer interpretação de lei local. Apenas foi
demonstrada a interpretação que o STJ vem dando a ca-
2. No caso, o promitente-comprador detém legitimi- sos idênticos ao ora examinado, uma vez que não há no-
dade ativa para pleitear a repetição do indébito relativa ao tícia de que lei municipal tenha eleito o promitente-com-
IPTU, tendo em vista que (a) foi imitido na posse do imó- prador como único ou preferencial contribuinte do IPTU,
vel, conforme certificado pelas instâncias ordinárias; (b) de forma a excluir a proprietária.
não há, nos autos, qualquer afirmação ou comprovação Assim, ficou afastada a única hipótese ventilada pela
de que o tributo tenha sido recolhido por pessoa diversa. doutrina e jurisprudência para a retirada da proprietária
Precedente: AgRg no REsp 754278/RJ, Min. Francisco do imóvel da qualidade de contribuinte do IPTU.
Falcão, DJ de 28.11.2005.
Ante o exposto, não tendo a ora agravante trazido
4. Está assentada na Primeira Seção a orientação qualquer argumento que pudesse infirmar a decisão agra-
segundo a qual as controvérsias acerca da divisibilidade vada, nego provimento ao agravo regimental.
e especificidade de taxas decorrentes da prestação de
É como penso. É como voto.
serviços públicos são inapreciáveis em sede de recurso
especial, porquanto os arts. 77 e 79 do CTN repetem pre- Ministro Humberto Martins, Relator
ceito constitucional contido no art. 145 da Carta vigente. Brasília, 11 de novembro de 2008

CONDOMÍNIO – LOTEAMENTO FECHADO – COBRANÇA DE DESPE-


SAS DE SEGURANÇA POR ASSOCIAÇÃO DE BAIRRO – ADMISSIBI-
LIDADE (TJSP)
Apelação sem Revisão nº 1.112.848-0/9 ACÓRDÃO
Comarca de Limeira - 2ª Vara Cível Loteamento fechado. Bolsão residencial. Cobran-
ça de despesas de segurança julgada procedente.
Processo nº 122/06 Ação movida por associação de bairro. Despesas de-
Apelante: Geraldo Aparecido Dalfre vidas. Sentença mantida. Apelo improvido.
Apelada: Associação de Amigos do Jardim Aquarius Vistos, relatados e discutidos estes autos, os
Turma Julgadora da 36ª Câmara desembargadores desta turma julgadora da Seção de Di-
reito Privado do Tribunal de Justiça, de conformidade com
Relator: Des. Dyrceu Cintra o relatório e o voto do relator, que ficam fazendo parte
Data do julgamento: 31.01.2008 integrante deste julgado, nesta data, negaram provimen-

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 15


JURISPRUDÊNCIA

to ao recurso, por votação unânime. O fato de se tratar de loteamento e não de condomí-


Dyrceu Cintra, Relator. nio propriamente dito, não afasta a obrigatoriedade de
pagamento da contribuição mensal.
VOTO
Em caso semelhante, julgado por esta Câmara e re-
Trata-se de apelação interposta contra sentença que latado pelo desembargador Arantes Theodoro, destaca-
julgou procedente ação de cobrança de despesas com se o seguinte trecho:
segurança em loteamento fechado.
“A recorrente é titular de imóvel inserido em
O apelante, réu, quer a inversão do resultado do jul- loteamento e, como reconheceu a sentença, não integra
gamento. a associação de moradores lá formada.
Aduz que foi cerceado em seu direito de defesa, ten- Essa entidade, segundo revelado pela prova (fls. 37
do em vista a não acolhida de produção de prova teste- e seguintes da cautelar), presta serviços de interesse co-
munhal. letivo relacionados à vigilância e portaria, proteção contra
Alega, em síntese, que não há respaldo legal para a incêndio, atendimento médico emergencial, limpeza de
cobrança da taxa de segurança por não constar da Con- áreas de uso comum, poda de árvores, etc. Além disso,
venção, Regimento Interno ou de Ata de Assembléia Or- capta e distribui água potável aos lotes, isso mediante
dinária. marcação de consumo registrada por hidrômetro.
A apelação foi recebida e regularmente processada. Certo é, então, que ao lado de seu caráter essencial-
Em resposta, a apelada sustenta o acerto da senten- mente associativo - e neste aspecto é que incide o princí-
ça. pio que veda a filiação compulsória (art. 5º, XX, CF) - a
apelada se apresenta, relativamente aos imóveis que in-
É o relatório. tegram o loteamento, como verdadeira administradora dos
Não há que falar em cerceamento de defesa. interesses comuns.
Os elementos existentes nos autos permitem o Disso decorre que aqueles que se beneficiam com
deslinde da controvérsia, sendo desnecessária a prova tais serviços, embora não sejam associados e nem
testemunhal. condôminos, devem mesmo para eles concorrer, como
O apelante possui um imóvel no loteamento “Jardim concluiu a sentenciante, sob pena de se operar o enrique-
Aquarius”, em Limeira, e deixou de pagar as contribui- cimento sem causa.
ções mensais destinadas à segurança do loteamento, sob (...)
alegação de que não se trata de condomínio propriamen- Ao tratar dos loteamentos fechados, exemplificativa-
te dito. mente, Marco Aurélio Viana enfatiza:
Após procedimento administrativo, a criação do ‘O perfil traçado autoriza concluir que o loteamento
Bolsão Residencial foi autorizada pela Portaria Municipal fechado guarda semelhança com a propriedade horizon-
nº 998/1999. tal. Nele temos o domínio sobre coisas que pertencem a
É certo que não se trata de um condomínio propria- todos (cerca ou muro, portaria, portão, quadras de espor-
mente dito, mas a existência de um condomínio de fato é te, piscina, etc.); o direito de uso incidente sobre vias de
incontestável: uma sociedade de moradores do local que comunicação, praças, espaços livres, de domínio do Mu-
tem estatuto registrado no Livro “A” de Registro de Pes- nicípio, havendo, nesse caso, comunhão; a necessidade
soas Jurídicas no 2º Cartório de Registro Civil de Pesso- de numerário para atender aos serviços comuns, à ma-
as Jurídicas de Limeira. nutenção e conservação de serviços e partes comuns,
A associação apelada representa os moradores e, assim a manutenção e conservação dos serviços afetos
além de estatuto, tem Conselho Fiscal regularmente elei- diretamente ao Município ou à concessionária de servi-
to (fls. 34). ços públicos: coleta de lixo, rede elétrica e iluminação,
telefone, água e esgoto, gás, etc. O melhor é que o Muni-
Assim, inegável que a referida associação tem orga-
cípio e as concessionárias respondam diretamente por
nização similar ao daquele sujeito à disciplina da Lei 4.591/
tais serviços, sua manutenção e conservação, o que di-
64 e pode cobrar as importâncias relativas ao rateio de minui despesas e torna menos complexa a vida interna.
suas despesas dos moradores. Ocorre que, dependendo da localização do parcelamento,
O apelante inegavelmente desfruta dos benefícios isso é difícil. A questão merece solução para cada caso
trazidos pela organização daquilo que chama de mero concreto. Finalmente, indispensável que haja uma admi-
loteamento. Tem segurança, limpeza, além da valoriza- nistração que responderá pela gestão do complexo, arre-
ção do próprio imóvel. cadando o numerário, contratando e dispensando empre-

16 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA

gados, adquirindo materiais necessários à manutenção e binado com o artigo 8º, ambos da Lei 4.591/64.
conservação das coisas e partes comuns, etc. O fato de não ter participado jamais de assembléias
(Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal, ed. AIDE, do condomínio não o exclui do rateio.
1ª ed., 1991, p. 57).
Ensina J. Nascimento Franco:
(...)
“Uma vez instituído um órgão administrativo do con-
Não se pode perder de vista, finalmente, que o De- junto, tal como uma associação de moradores, e
creto-lei 271/67, em seu artigo 3º, manda aplicar aos estabelecida uma Convenção, torna-se legal a cobrança
loteamentos a Lei 4.591/64, que regia os condomínios em do que for gasto com os serviços de administração e con-
edificações, e equipara o loteador ao incorporador e os servação das partes comuns, quais sejam, jardins, pra-
compradores de lotes aos condôminos. ças, ruas, captação e distribuição de água, limpeza, cole-
Dada a peculiaridade da situação fática presente ta de lixo, vigilância, seguro, etc. Isto porque, segundo o
nesses loteamentos, pois, que exige um órgão gestor ins- jurista Marco Aurélio Viana, o condomínio fechado guar-
tituído no interesse coletivo, tem a boa jurisprudência en- da estreita semelhança com a propriedade horizontal, na
tendido que não é lícito ao devedor ‘acenar com a liberda- qual prevalece a regra do rateio das despesas com equi-
de de associação, garantia constitucional’, para se esqui- pamentos e serviços postos à disposição de todos os parti-
var das contribuições destinadas à manutenção e à cipantes da comunidade. Nenhum deles pode negar-se
implementação da coisa comum (RT 706/161), eis que ao pagamento de sua parte a pretexto de inexistência de
‘aqueles que adquirem propriedades nessas circunstân- um condomínio, ou de não pertencer aos quadros da as-
cias, sistema de loteamentos com conformação de con- sociação dos moradores criada pela maioria, pois a con-
domínios, têm esse ônus de arcar com as despesas cole- tribuição decorre menos da condição de associado do que
tivas (JTACSP 156/67)” (Ap. c/ Rev. 934.106-0/9, julgada em virtude de poder utilizar dos serviços comunitários”
em 24.08.2006). (Condomínio, RT, 1997, pp. 235/236).
Assim, o apelante é condômino, devendo arcar com Também nesse sentido: 36ª Câmara, Ap. s/ Rev. nº
a cota que lhe cabe relativamente às despesas de condo- 1.015.803-0/3, relator Romeu Ricupero, julgada em
mínio e segurança, de conformidade com o estatuto da 20.07.2006).
associação apelada e com o artigo 12, caput, e § 3º, com- Posto isso, nega-se provimento à apelação.

PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – CONTRATO DE CONS-


TRUÇÃO – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – RESCISÃO DE CONTRA-
TO POR CULPA EXCLUSIVA DA CONSTRUTORA – RESTITUIÇÃO INTE-
GRAL DE TODAS AS PARCELAS RECEBIDAS – DANO MORAL (TJRJ)
TJRJ – Apelação 2008.001.28677 – Des. Conceição Mousnier - Julgamento: 19/11/2008 - Vigésima Câmara Cível
Ação cominatória cumulada com indenizatória por danos materiais e morais. Incorporação imobiliária. Atraso na
entrega de unidade autônoma. Construção inacabada. Sentença julgando parcialmente procedente os pedidos.
Inconformismo da ré. Entendimento desta Relatora quanto à manutenção da sentença guerreada. Relação de consu-
mo. Demora injustificada na entrega de unidade imobiliária. Teoria do risco do empreendimento. A parte ré deve assumir
os riscos de sua atividade, respondendo pelos danos ocasionados ao autor. Inexistência de previsão para entrega da
unidade imobiliária. No caso em exame decorridos mais de 6 anos para entrega do imóvel adquirido pela parte autora,
as obras sequer estão concluídas. Resolução do contrato por culpa exclusiva da construtora inadimplente, a quem
incumbe reparar os danos ocasionados ao autor. Restituição integral de todas as parcelas recebidas. Autor não usufruiu
da unidade residencial adquirida, uma vez que a construção do edifício sequer terminou. Inexistência de inadimplemento
por parte do autor. Incidência de cláusula penal contratualmente prevista. Notório que a situação em exame ultrapassa
em muito os meros aborrecimentos do dia-a-dia, não podendo ser considerada como simples inadimplemento contratual.
Dano moral passível de compensação. Quantum compensatório adequadamente fixado pelo juízo a quo em R$ 20.000
(vinte mil reais), pois em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Conhecimento do recur-
so e desprovimento do apelo.
(Nota da redação do BDI: O inteiro teor do respectivo acõrdão encontra-se disponível em nosso site)

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 17


JURISPRUDÊNCIA

SFH – NOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO CELEBRADOS SEM


CLÁUSULA DE GARANTIA DE COBERTURA DO FCVS, O SALDO DE-
VEDOR DEVERÁ SER SUPORTADO PELO MUTUÁRIO (STJ)
Recurso Especial nº 823.791 - PE (2006/0040972-3) Sistema Financeiro Habitacional com a CEF, de maneira
Relator: Ministro Massami Uyeda que seria indevida a cobrança de eventual saldo devedor
residual. Requerem, assim, a declaração de quitação in-
Recorrente: Caixa Econômica Federal - CEF tegral do contrato, com o conseqüente cancelamento da
Recorrido: Maxwiell Tavares Mendes de Souza e ou- hipoteca incidente sobre o imóvel e a transferência defini-
tro tiva da propriedade.
EMENTA A pretensão foi julgada procedente pelo juízo de pri-
Recurso Especial - Sistema Financeiro meiro grau, em suma, ao argumento de que seria abusiva
Habitacional (SFH) - Contrato de financiamento sem a cláusula que prevê a cobrança de valor residual após o
cobertura do Fundo de Compensação de Variações término do prazo do contrato (fls. 165/173).
Salariais (FCVS) - Pagamento do saldo devedor resi- Interposto recurso de apelação, o egrégio Tribunal
dual pelo mutuário - Cabimento - Recurso especial pro- Regional Federal da 5ª Região negou-lhe provimento em
vido. aresto assim ementado:
1. Nos contratos de financiamento celebrados no “Ementa: Civil. SFH. Contrato. Resíduo. Exclusão.
âmbito do SFH, sem cláusula de garantia de cobertu- Ilegalidade da cobrança de saldo devedor residual
ra do FCVS, o saldo devedor residual deverá ser su- no contrato de financiamento habitacional, regido pelo
portado pelo mutuário. SFH. Jurisprudência do eg. Pleno do TF-5ª Região.” (fl.
2. Tal entendimento não se limita aos contratos 201)
firmados após a Lei n. 8.692/93, mas se espraia para Busca a CEF a reforma do v. acórdão, sustentando,
qualquer contrato de financiamento habitacional em em síntese, a existência de ofensa aos arts. 6º, § 1º, da
que não se tenha pactuado expressamente a cobertu- LICC, 586 do CC/2006 (antigo art. 1.256 do CC/1916), 2º
ra do FCVS. e 3º do CDC e 2º do Decreto-Lei n. 2.349/87. Aduz, em
3. Recurso especial provido. síntese, ser legal os “procedimento da Caixa ao manter o
ACÓRDÃO saldo residual do contrato em tela” (fl. 207).

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são Contra-razões às fls. 223/227.


partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Ter- É o relatório.
ceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformi- VOTO
dade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, a Tur- O Exmo. Sr. Ministro Massami Uyeda (Relator):
ma, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-
lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. A celeuma instaurada no recurso especial centra-se
Os Srs. Ministros Sidnei Beneti e Nancy Andrighi votaram em saber se, em contrato de financiamento imobiliário
com o Sr. Ministro Relator. celebrado no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional
- SFH no ano de 1991, é ou não lícita a cláusula que car-
Brasília, 25 de novembro de 2008 rega ao mutuário a responsabilidade pelo pagamento de
Ministro Massami Uyeda, Relator eventual saldo devedor remanescente após o término do
RELATÓRIO prazo de amortização ajustado.

O Exmo. Sr. Ministro Massami Uyeda (Relator): O inconformismo merece prosperar.

Cuida-se de recurso especial interposto pela Caixa Com efeito.


Econômica Federal - CEF com fundamento no art. 105, É consabido que o interesse público de assegurar
III, alínea “a”, da Constituição Federal. habitação à população conduziu o Estado a arquitetar uma
Verifica-se, da análise dos autos, que o sr. Maxwiell estrutura de financiamento imobiliário com benefícios su-
Tavares Mendes de Souza e outro propuseram demanda ficientes a contrabalançar o elevado custo do capital. Foi
em desfavor da CEF, alegando, em síntese, que já paga- nesse contexto que surgiu o Sistema Financeiro
ram todas as prestações mensais decorrentes do contra- Habitacional, trazido pela Lei n. 4.380/64.
to de financiamento habitacional firmado no âmbito do A propósito, oportuno assinalar que, na história do

18 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA

SFH, sempre se verificou um especial destaque a dois edição de normas restritivas, entre as quais se destaca o
mecanismos favoráveis ao mutuário, quais sejam, a for- DL 2.349/87. Com efeito, após esse decreto-lei, os con-
ma de reajuste da prestações mensais e o Fundo de Com- tratos de financiamento não poderiam conter a cláusula
pensação de Variações Salariais - FCVS. de cobertura pelo FCVS, salvo se o valor mutuado fosse
De um lado, houve a preocupação de eximir o mutu- inferior ao que seria fixado pelo Conselho Monetário Na-
ário dos efeitos imediatos das oscilações dos índices de cional. Ademais, o referido diploma se apressou a afirmar
correção monetária, mediante a sujeição do reajuste das o óbvio: “nos contratos sem cláusula de cobertura pelo
prestações a critérios compatíveis com os seus rendimen- FCVS, os mutuários finais responderão pelos resíduos dos
tos salariais. saldos devedores existentes, até sua final liqüidação” (art.
2º).
Assim, por exemplo, a Lei n. 4.380/64 centrou o rea-
juste das prestações mensais ao redor do salário-míni- Realmente, é evidente que os contratos sem adesão
mo, até ser censurada, nesse ponto, pela Lei n. 6.205/75. ao FCVS carreiam aos mutuários o dever de suportar o
Outrossim - tentando reconquistar o equilíbrio na relação saldo devedor residual.
prestação/salário, abalada notadamente com a citada Lei Acresça-se, por oportuno, que a Lei n. 8.692, de 28
n. 6.205/75 -, veio o Decreto-lei n. 2.164/84 a criar o Pla- de julho de 1993, representou um marco nessa tendência
no de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - de afastar dos contratos de financiamento a cobertura do
PES/CP e a estabelecer que o reajuste das prestações FCVS, porquanto, em seu artigo 29, assentou, in verbis:
“corresponderá ao mesmo percentual e periodicidade do “As operações regidas por esta lei não terão cobertura do
aumento de salário da categoria profissional a que per- Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS)”.
tencer o adquirente” (art. 9º, redação original). Posterior- Essas considerações são relevantes para explicar o
mente, o DL n. 2.284/86, fortalecendo a relação presta- porquê de, nos contratos sem cobertura do FCVS, inexistir
ção/salário, assentou que “em nenhuma hipótese a pres- abuso ou ilegalidade na inserção de cláusulas que
tação do Sistema Financeiro da Habitação será superior explicitem o que, há muito, já integra a lógica do SFH, a
à equivalência salarial da categoria profissional do mutu- saber: o mutuário final deverá arcar com o saldo devedor
ário” (art. 10, § 1º). Mais adiante, a Lei n. 8.004/90, alte- residual.
rando o art. 9º do DL 2.164/84, limitou a prestação mensal
à relação prestação/salário verificada na data da assina- De fato, ao associar a atualização das prestações
tura do contrato, apesar de determinar que o Índice de mensais a modalidades de reajustes diferentes da inci-
Preço ao Consumidor - IPC deverá ser levado em conta dente sobre o saldo devedor, a legislação objetivou, ape-
no reajuste das prestações mensais. nas, livrar o mutuário de suportar, nas prestações men-
O fato é que esse atrelamento do reajuste das pres- sais, a repercussão financeira imediata decorrente das
tações mensais a critérios diversos do aplicável ao rea- variações imprevisíveis da economia. Não buscou, jamais,
juste do saldo devedor gerava, freqüentemente, um con- brindar o mutuário com a redução final do custo do em-
siderável montante ainda pendente de amortização ao fim préstimo.
do prazo contratual. Ao bônus de valer-se, por anos, de uma prestação
Por outro lado, antevendo esse saldo devedor resi- mensal compatível com os reajustes salariais, segue-se
dual, a Resolução n. 25, de 16.06.1967, do Conselho de o ônus de, ao cabo do contrato, arcar-se com o saldo de-
Administração do extinto Banco Nacional da Habitação - vedor eventual remanescente. Realmente, desse encar-
BNH instituiu o Fundo de Compensação de Variações go o SFH somente desonerou aqueles mutuários em cujo
Salariais - FCVS, o qual, em síntese, consiste em uma contrato houvesse a adesão ao FCVS e que, por isso,
espécie de seguro destinado a cobrir esse valor eventual- contribuíram mensalmente para esse fundo.
mente remanescente quando do término do contrato. Em É essa sistemática que foi desenhada pela lei e pela
contrapartida a essa garantia, cumpria ao mutuário de- vontade das partes, de maneira que se revela inviável que
sembolsar, mensalmente, além do valor das prestações o Judiciário a remodele para, a qualquer pretexto, esten-
mensais, uma contribuição destinada ao FCVS. Essa con- der o benefício do FCVS aos mutuários que não contribu-
tribuição mensal do mutuário e o aporte de recursos do íram para esse fundo por terem celebrado contratos de
BNH alimentavam o FCVS. financiamento sem a correspondente cláusula de garan-
Convém ressaltar que, ao longo do tempo, o FCVS tia de cobertura.
imergiu em uma crise financeira notória, na medida em Esclareça-se, desde logo, que, caso o mutuário se
que os saldos residuais dos contratos de financiamento insurja contra o valor do saldo devedor residual, caber-
passaram a ser constantes e em valores expressivos. lhe-á ajuizar eventual ação revisional, e não tentar isen-
Esse crescente solapamento do FCVS ensejou a tar-se da sua responsabilidade de suportar com o custo

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 19


JURISPRUDÊNCIA

total do capital financiado. te a cobertura do FCVS.


Bem de ver que esta Corte, apreciando situação aná- In casu, o sr. Maxwiell e a sua esposa celebraram, em
loga, em que se tinha contrato de financiamento celebra- 24 de outubro de 1991, com a CEF, contrato de mútuo
do após o advento da Lei n. 8.692/93, chegou a conclu- habitacional no qual se pactuou as seguintes condições,
são similar. Confira-se: no que importa à controvérsia: (1) as prestações mensais
“Sistema Financeiro da Habitação. Nulidade de cláu- se ajustarão em conformidade com o Plano de Equivalên-
sula contratual que estabelece parâmetro de atualização cia Salarial por Categoria Profissional - PES/CP; (2) a atu-
do saldo devedor distinto daquele previsto para o reajuste alização do saldo devedor do financiamento será feita de
dos encargos mensais. Objeto impossível. Inexistência. acordo com o coeficiente de remuneração básica aplicável
Contrato celebrado sob a égide da Lei nº 8.692, de aos depósito de poupança e (3) não haverá cobertura pelo
28.7.1993. Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS.

- Previsto em lei, o critério de reajuste do saldo deve- A diferença de reajuste das prestações mensais em
dor (pelos mesmos índices de atualização dos depósitos relação ao reajuste do saldo devedor implicou, na espé-
em cadernetas de poupança) é válido, independentemente cie, um saldo devedor residual, o qual será de responsa-
do parâmetro utilizado para o reajustamento dos encar- bilidade dos mutuários em razão da inexistência de previ-
gos mensais (Plano de Equivalência Salarial por Compro- são de cobertura do FCVS.
metimento de Renda). Diga-se, finalmente, que a presente demanda girou
Não estando preconizada a cobertura do eventual em torno da existência ou não de responsabilidade do sr.
resíduo pelo FCVS (Fundo de Compensações de Varia- Maxwiell e de sua esposa pelo pagamento do saldo deve-
ções Salariais), o que sobejar ao final do contrato é da dor residual, de sorte que não há óbice a que eles ve-
responsabilidade do mutuário. nham, futuramente, impugnar o valor do saldo devedor
residual por outros fundamentos.
Recurso especial não conhecido.”
Dá-se, pois, provimento ao recurso especial, para
(REsp 382875/SC, 4ª Turma, Rel. Min. Barros julgar improcedente a demanda, invertidos os ônus de
Monteiro, DJ 24/02/2003) sucumbência.
Esse entendimento, pelo que já foi exposto, não se É o voto.
limita aos contratos firmados após a Lei n. 8.692/93, mas
se espraia para qualquer contrato de financiamento Ministro Massami Uyeda, Relator
habitacional em que não se tenha pactuado expressamen- Brasília, 25 de novembro de 2008

LOCAÇÃO – DESPEJO – DENÚNCIA VAZIA – DIREITO DE PREFERÊN-


CIA DA LOCATÁRIA – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA QUAN-
TO A RETOMADA DO IMÓVEL – PROCEDÊNCIA DA AÇÃO (TJSP)
Apelação sem Revisão nº 1.130.852-0/3 - Comarca qualquer impugnação especificada quanto aos requi-
de Franca - 1ª Vara Cível - Processo nº 66/05 - Apelante: sitos para a retomada do imóvel locado.
Split do Brasil Comercial Importadora e Exportadora Ltda.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os
- Apelado: Curtume Della Torre Ltda. - Turma Julgadora
desembargadores desta turma julgadora da Seção de Di-
da 32ª Câmara - Relator: Des. Kioitsi Chicuta - Data do
reito Privado do Tribunal de Justiça, de conformidade com
julgamento: 10.01.2008
o relatório e o voto do relator, que ficam fazendo parte
ACÓRDÃO integrante deste julgado, nesta data, negaram provimen-
Locação. Imóvel. Despejo por denúncia vazia. to ao recurso, por votação unânime.
Ação julgada procedente. Alegação de preterimento VOTO
do direito de preferência. Discussão irrelevante para Tratam os autos de recurso interposto contra r. sen-
a retomada imotivada. Direito da locadora. Recurso tença que julgou procedente ação de despejo por denún-
improvido. Na chamada denúncia vazia, a retomada cia vazia. Sustenta o apelante, em apertada síntese, que
se faz tão-só pela conveniência da locadora e eventu- o direito de preferência na aquisição do imóvel locado res-
al preterição ao exercício do direito de preferência não tou pactuado no contrato de locação e há rigor excessivo
obsta prosseguimento da ação de despejo, inexistindo na exigência do registro do contrato de locação, mesmo

20 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA

porque tal requisito é necessário apenas para exercício as partes, o que é suficiente, no caso, para autorizar o
do direito de ação por perdas e danos, nos termos do art. decreto de procedência da ação.
33 da lei do inquilinato. Diz que manifestou interesse na De toda forma, bem se vê que a locatária tomou ci-
compra do imóvel, destacando que a notificação efetiva- ência inequívoca da notificação e, nesse aspecto, como
da é irregular. Pede a improcedência da ação. bem observado pelo magistrado “a quo”, “dela pode ter
Processado o recurso, com preparo e com contra- constado prazo menor do que noventa dias, mas, mais
razões, os autos restaram remetidos a este C. Tribunal de importante do que isso, esta ação somente foi ajuizada
Justiça. depois do decurso desse prazo maior por inteiro. Com
É o resumo do essencial. isso, sem ter efetivamente prejudicado o locatário, por-
Eventual preterição ao exercício do direito de prefe- que, em substância, mais do que quanto à forma, foi res-
rência não obsta prosseguimento da ação de despejo, peitado seu direito, ao prazo maior, integral.” (fl. 143).
tanto que discutido em sede inadequada, inexistindo qual- A r. sentença, assim, deu solução adequada ao caso
quer impugnação especificada quanto aos requisitos para e merece ser mantida integralmente.
a retomada do imóvel locado. Há relação “ex locato” entre Isto posto, nega-se provimento ao recurso.

CONDOMÍNIO – DESPESAS CONDOMINIAIS – SUBSTITUIÇÃO DE PENHO-


RA – INVIABILIDADE – FALTA DE COMPROVAÇÃO PELO RECORRENTE DE
GRAVAME À PARTE ADVERSA – REQUERIMENTO INTEMPESTIVO (TJSP)
Agravo de Instrumento nº 1.145.181-0/4 - Comarca Consoante o disposto no artigo 668, do Código de
de São Paulo - 9ª Vara Cível - Processo nº 92.450/05 - Processo Civil, “o executado pode, no prazo de (10) dez
Agravante: Colônia Azul Empreendimentos S/C Ltda. - dias após intimado da penhora, requerer a substituição
Agravado: Condomínio Edifício Praça da Bandeira - Tur- do bem penhorado, desde que comprove cabalmente que
ma Julgadora da 26ª Câmara - Relator: Des. Andreatta a substituição não trará prejuízo algum ao exeqüente e
Rizzo - Data do julgamento: 28.01.2008 será menos onerosa para ele devedor (art. 17, incisos IV
ACÓRDÃO e VI, e art. 620)”.

Agravo de instrumento - Despesas condominiais No caso em exame, como bem ponderou o julgador,
- Substituição de penhora - Inviabilidade - Requeri- o recorrente não observou o prazo legal para requerer a
mento intempestivo - Recurso improvido. substituição da constrição, nem, tampouco, comprovou a
inexistência de gravame à parte adversa, o que seria ne-
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os cessário. Ainda que a certidão do Registro de Imóveis te-
desembargadores desta turma julgadora da Seção de Di- nha sido juntada a fls. 14/15, tal providência não foi feita
reito Privado do Tribunal de Justiça, de conformidade com oportunamente, na medida em que a praça já havia sido
o relatório e o voto do relator, que ficam fazendo parte designada e as partes, regularmente, intimadas. Vale res-
integrante deste julgado, nesta data, negaram provimen- saltar que é necessária a imposição de um limite tempo-
to ao recurso, por votação unânime. ral para a prática dos atos processuais, sob pena de ha-
VOTO ver uma perpetuação da demanda.
Agravo de instrumento interposto contra decisão pro- Ao propósito do tema, Antonio Carlos Marcato, citan-
ferida em ação de cobrança de despesas condominiais, do lição de Nelton dos Santos, assevera que: “configura
ora em fase de cumprimento de sentença, que indeferiu a verdadeiro tumulto processual permitir o juiz que a parte
substituição da penhora. pratique o ato depois de consumada a preclusão e já se
Inconformada, a agravante brandiu pela reforma do tendo avançado o processo. Cumpre ao juiz, em suma,
“decisum”, afirmando que a permuta não trará nenhum conduzir o processo sem retrocessos e, ao mesmo tem-
prejuízo ao credor, pois o imóvel indicado localiza-se no po, assegurando a mais ampla e eficaz participação dos
mesmo edifício e tem valor e metragem semelhantes ao litigantes” (“in” Código de Processo Civil Interpretado, São
do bem já constrito. Paulo, Editora Atlas S/A, 2004, pág. 479).
Formado o instrumento nesta instância, o agravado Portanto, preclusa a oportunidade própria e adequada
apresentou contraminuta de fls. 37/40. para requerer a substituição da penhora, o indeferimento
É o relatório. era de rigor.
Inconsistente o reclamo. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 21


JURISPRUDÊNCIA CAR
JURISPRUDÊNCIA TORÁRIA
CART
REGISTRO RECUSADO – ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E COM-
PRA DE PARTE IDEAL – IMPLANTAÇÃO DE PARCELAMENTO IRREGU-
LAR DO SOLO – FRAUDE E OFENSA ÀS NORMAS DE SERVIÇO DA
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA (CSM/SP)
ACÓRDÃO Inconformada com a respeitável decisão, interpôs a
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apela- interessada Maria Aparecida da Silva, tempestivamente,
ção Cível nº 932-6/5, da Comarca de São Bernardo do o presente recurso. Sustenta que é detentora de justo tí-
Campo, em que é apelante Maria Aparecida da Silva e tulo, consistente em escritura pública de transmissão do
apelado o 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Do- domínio, lavrada após verificação no registro imobiliário
cumentos e Civil de Pessoa Jurídica da referida Comarca. da viabilidade da negociação, ressaltando que todas as
vendas anteriores, concernentes a partes ideais do imó-
Acordam os Desembargadores do Conselho Superi- vel obtiveram registro sem oposição de qualquer óbice,
or da Magistratura, por votação unânime, em negar provi- encontrando-se, portanto, na hipótese, segundo entende,
mento ao recurso, de conformidade com o voto do Relator de boa-fé. Ademais, acrescenta, conforme certidão
que fica fazendo parte integrante do presente julgado. expedida pela Prefeitura Municipal de São Bernardo do
Participaram do julgamento, com votos vencedores, Campo, a parte ideal adquirida está perfeitamente
os Desembargadores Roberto Vallim Bellocchi, Presiden- identificada, consistindo no imóvel situado na rua das Or-
te do Tribunal de Justiça e Munhoz Soares, Vice-Presi- quídeas, 16, Lote 07 da Quadra B, arruamento Pro-Terra
dente do Tribunal de Justiça. Jardim Ipê, circunstância que autoriza, também sob esse
São Paulo, 04 de novembro de 2008 prisma, o registro pretendido. Por fim, aduz que não se
aplica ao caso o entendimento firmado pela Corregedoria
Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator Geral da Justiça, a partir do decidido no Processo CG n.
VOTO 2.588/2000 (fls. 91 a 105).
Registro de Imóveis. Dúvida julgada procedente. A Douta Procuradoria Geral de Justiça pronunciou-
Negativa de acesso ao registro de escritura pública se no sentido de ser negado provimento ao recurso (fls.
de venda e compra de parte ideal de imóvel em con- 111 a 116).
domínio ordinário. Implantação de parcelamento irre- É o relatório.
gular do solo na área. Incidência do disposto no item
151 do Capítulo XX das NSCGJ. Registro inviável. Exa- O recurso não comporta provimento.
me de qualificação do título que abrange a verifica- A apelante apresentou a registro escritura pública de
ção quanto à ocorrência de loteamento ou venda e compra de parte ideal correspondente a 125,00
desmembramento irregular, fraude e ofensa à lei. Re- m² do imóvel matriculado sob nº 36.132 no Registro de
curso não provido. Imóveis de São Bernardo do Campo, com área de
Cuidam os autos de dúvida de registro de imóveis 12.285,00 m². Todavia, o registro pretendido foi recusado
suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e pelo oficial da aludida serventia.
Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de A recusa do oficial registrador em proceder ao regis-
São Bernardo do Campo, a requerimento de Maria tro mostra-se acertada, no caso, como bem decidido pelo
Aparecida da Silva, referente ao ingresso no registro de Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente da Serventia, em
escritura pública de venda e compra de parte ideal de consonância, ainda, com o parecer da Douta Procurado-
imóvel relacionado à matrícula nº 36.132 da referida ria Geral de Justiça.
serventia predial, recusado pelo registrador. Após regular Com efeito, em conformidade com o disposto no item
processamento, com impugnação por parte da interessa- 151 do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da
da e manifestação do representante do Ministério Públi- Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, é vedado proce-
co, a dúvida foi julgada procedente para o fim de manter a der ao registro de venda de frações ideais, com localiza-
recusa do Oficial em registrar o título, devido à ocorrência ção, numeração e metragem certa, ou de qualquer outra
de burla à legislação do parcelamento do solo urbano, a forma de instituição de condomínio ordinário que desa-
partir do emprego de expediente consistente na aliena- tenda aos princípios da legislação civil, caracterizadores,
ção de partes ideais do imóvel em questão em condomí- de modo oblíquo e irregular, de loteamentos ou desmem-
nio ordinário (fls. 85 a 89). bramentos.

22 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


JURISPRUDÊNCIA CARTORÁRIA
Tal situação, de instituição de condomínio que em presente caso.
verdade implica, de modo oblíquo e irregular, loteamento Assim, adequado o exame do título realizado pelo
ou desmembramento, ao arrepio das normas da Lei n.
Oficial de Registro de Imóveis de São Bernardo do Cam-
6.766/79, encontra-se configurada na espécie.
po. E correta, ainda, a recusa do registro, verificada a ven-
Isso porque no imóvel objeto da matrícula nº 36.132 da de fração ideal de imóvel em condomínio, tendente à
procedeu a Associação Comunitária Unidos Pró-Terra à realização de verdadeiro parcelamento irregular do solo.
venda de inúmeras partes ideais do imóvel a terceiros (fls.
Por fim, cumpre salientar que a circunstância de os
42 a 55), sempre com metragem, localização e numera-
alienantes do bem terem obtido, anteriormente, o registro
ção certas, correspondendo a fração ideal da Apelante,
da aquisição da mesma parte ideal do imóvel não impõe,
como por ela própria admitido (fls. 97 e 98), ao Lote 07 da
só por isso, o registro dessa nova aquisição. Pertinente
Quadra B, situado na rua das Orquídeas, 16, conforme
reafirmar, aqui, o entendimento, já manifestado inúmeras
cadastro existente na Prefeitura Municipal.
vezes por este Colendo Conselho Superior da Magistra-
Trata-se, indiscutivelmente, de parcelamento irregu- tura, de que (...) Não socorre o recorrente o fato de ter
lar do solo, em que se verifica implantação de lotes com obtido anteriormente o registro de outras partes ideais
divisas, localizações e áreas certas, realizado ao arrepio relativas à mesma matrícula, sendo pacífica a jurispru-
da Lei n. 6.766/1979. dência deste Egrégio Conselho Superior da Magistratura
Dessa forma, deve ter-se como caracterizada, no ... no sentido de que erros pretéritos do registro não auto-
caso, a hipótese descrita no referido item 151 do Capítulo rizam novos e reiterados erros, dada a inexistência de di-
XX do Tomo II das NSCGJ, já que houve venda de fra- reito adquirido ao engano (...) (Ap. Cív. nº 41.855-0/1
ções ideais de imóveis em condomínio, onde vêm sendo Comarca de Jaú, Rel. Des. Nigro Conceição, j. 6.2.98)
implantados lotes, circunstância que torna inviável o re- Ap. Cív. n. 72.365-0/7.
gistro da escritura de venda e compra de interesse da
Ademais, não há como ignorar, na hipótese, que, por
Apelante.
ocasião da lavratura da escritura em discussão, a Apelan-
Anote-se, no ponto, que, em conformidade com o já te foi advertida para o fato de que a transmissão de fra-
decidido por este Colendo Conselho Superior da Magis- ção ideal para a formação de condomínio tradicional não
tratura, no âmbito administrativo a qualificação registrária implica na alienação de parcela certa e localizada do refe-
não é um simples processo mecânico, chancelador de rido terreno, tendo, ainda assim, insistido na realização
atos já praticados, mas parte, isso sim, de uma análise do negócio (fls. 23 e v.), sujeitando-se, com isso, às con-
lógica, voltada para a perquirição da compatibilidade en- seqüências da prática do ato, inclusive no tocante aos
tre os assentamentos registrários e os títulos causais (ju- óbices de ordem registral.
diciais e extrajudiciais), sempre feita à luz das normas
cogentes em vigor (Ap. Cív. n. 72.365-0/7, j. 15.02.2001, Portanto, qualquer que seja a ótica sob a qual se pre-
rel. Des. Luís de Macedo). tenda analisar a questão, a conclusão permanece a mes-
ma, ou seja, no sentido da inadmissibilidade do registro
Bem por isso, tal atividade autoriza e impõe a recusa do título apresentado pela Apelante.
do registro sempre que o oficial registrador verifique, em
face da análise de elementos registrais, a existência de Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto,
prática tendente ao parcelamento irregular do solo e de nego provimento ao recurso.
fraude e ofensa à legislação vigente, como se dá no Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator

REGISTRO – DÚVIDA IMPROCEDENTE – IMÓVEL DADO EM INTEGRALI-


ZAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL, POR CÔNJUGES CASADOS PELO REGIME
DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS – INEXISTÊNCIA DE CONFUSÃO
ENTRE O PATRIMÔNIO DOS SÓCIOS E O DA SOCIEDADE (CSM/SP)
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores do Conselho Superi-
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apela- or da Magistratura, por votação unânime, em negar provi-
ção Cível nº 901-6/4, da Comarca da Capital, em que é mento ao recurso, de conformidade com o voto do Relator
apelante o Ministério Público do Estado de São Paulo e que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
apelado Mad Empreendimentos e Participações S/A. Participaram do julgamento, com votos vencedores,

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 23


JURISPRUDÊNCIA CARTORÁRIA
os Desembargadores Roberto Vallim Bellocchi, Presiden- me da comunhão universal de bens.
te do Tribunal de Justiça e Munhoz Soares, Vice-Presi- Em que pese a vedação, contida no artigo 977 do
dente do Tribunal de Justiça. Código Civil, de constituição de sociedade por cônjuges,
São Paulo, 14 de outubro de 2008 entre si ou com terceiros, quando casados pelo regime da
Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator comunhão universal ou da separação legal de bens, não
se trata, in casu, de registro de sociedade civil a ser pro-
VOTO
movido por Oficial de Registro Civil de Pessoa Jurídica,
Registro de Imóveis. Dúvida julgada improceden- sujeito ao controle administrativo pelo Poder Judiciário.
te. Registro de conferência de imóvel dado em
A sociedade anônima, como decorre das certidões
integralização de capital social. Sociedade anônima,
de fls. 05/13 e 20/48, foi constituída em maio de 2005 e
com capital fechado, que tem entre seus sócios côn-
juges casados, entre si, pelo regime da comunhão teve seu registro promovido pela Junta Comercial do Es-
universal de bens. Registro da sociedade, promovido tado de São Paulo, a qual cabia o controle administrativo
pela Junta Comercial do Estado de São Paulo, que da legalidade do ato.
produz todos os efeitos até que, eventualmente, seja O registro pela Junta Comercial, por seu turno, pro-
desconstituído pela via própria. Inadequação do pro- duz todos os efeitos que lhe são inerentes, em especial o
cedimento de dúvida para a impugnação daquele re- de conferir à sociedade personalidade jurídica própria, o
gistro, ou negativa da produção de seus efeitos. Re- que a habilita para adquirir propriedade imóvel.
curso não provido.
E, como visto, o controle administrativo desse regis-
Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Pú- tro, porque atribuído à Junta Comercial, não está inserido
blico do Estado de São Paulo, tempestivamente, contra r. nos limites do presente procedimento de dúvida, que se
decisão que julgou improcedente dúvida que foi suscita- destina ao exame da registrabilidade de determinado títu-
da em razão da recusa do Sr. 2º Oficial de Registro de lo e que não se presta para a obtenção, por via transver-
Imóveis da Comarca da Capital em registrar, na matrícula sa, da declaração de validade, ou não, de ato jurídico que
nº 64.614, a conferência do imóvel dado para integralizar deve, em razão de sua natureza, ser objeto de aprecia-
o capital social de sociedade anônima com capital fecha-
ção na via jurisdicional, em processo contencioso, obser-
do, de que participam marido e mulher casados pelo regi-
vado o contraditório e ampla defesa.
me da comunhão universal de bens.
Ainda que assim não fosse, prevaleceriam, quanto a
Sustenta o apelante, em suma, que o artigo 977 do
possibilidade de cônjuges casados pelo regime da comu-
Código Civil veda aos cônjuges, casados pelo regime da
nhão universal de bens participarem de sociedade anôni-
comunhão universal ou da separação obrigatória de bens,
ma, os fundamentos da r. decisão recorrida, da lavra do
contratar sociedade entre si ou com terceiro. Assevera
MM. Juiz da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca
que a sociedade Mad Empreendimentos e Participações
S.A. tem como acionistas Marco Antonio Vac e Donaria da Capital, Dr. Gustavo Henrique Bretas Marzagão, as-
Vac, que são casados pelo regime da comunhão univer- sim deduzidos:
sal de bens, o que é vedado por lei. Aduz que a sociedade É certo que a Lei nº 6.404/76 não contempla norma
anônima de capital fechado em muito se assemelha às que, a exemplo da prevista no art. 977, do Código Civil,
sociedades limitadas que são disciplinadas pelo novo impeça os cônjuges casados no regime da comunhão
Código Civil cujas normas, nos casos omissos, se apli- universal ou no da separação obrigatória de contratarem
cam às sociedades anônimas por força de seu artigo sociedade entre si ou com terceiros.
1.089. Diz que, neste caso, subsiste a confusão entre o
Contudo, a nova sistemática instituída pelo Novo
patrimônio dos sócios e o da sociedade, que o Código
Código Civil para as sociedades nele reguladas não tem
Civil pretendeu evitar. Requer o provimento do recurso
o condão de criar omissão na Lei das Sociedades Anôni-
para que a dúvida seja julgada procedente.
mas.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo pro-
Isso porque lei posterior geral não cria lacuna na an-
vimento do recurso.
terior especial.
É o relatório.
E, se não há lacuna, não há que se falar em aplica-
Mad Empreendimentos e Participações S.A., socie- ção subsidiária da lei geral, nos termos de seu art. 1.089,
dade anônima de capital fechado, apresentou para regis- do Código Civil.
tro certidão de conferência de bens, para integralização
do capital social, promovida por Marco Antonio Vac e Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
Donária Vac, sócios que são casados, entre si, pelo regi- Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator

24 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


BOLETIM CARTORÁRIO
O Boletim Cartorário, criado em março de 1990, por Antonio Albergaria
4/1

Pereira, é organizado pelo Instituto de Estudos Albergaria - IDEAL, sob a


coordenação de seus Diretores, Valestan Milhomem da Costa e Valmir Gonçalves da Silva.

OS SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS, SUAS CONTRAPRESTAÇÕES


E O IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA – FINAL

Gilson Carlos Sant’Anna (*)

2ª Questão: O serviço notarial imóvel, em conseqüên- do, teremos taxa. (Ha-


e registral é uma atividade de tute- cia de obras públicas; milton Dias Souza e Mar-
la do ordenamento jurídico, carac- II – taxa; co Aurélio Greco, A Na-
terizando-se pelo poder de coação tureza Jurídica das Cus-
próprio e privativo do Estado? III – quaisquer ou- tas Jurídicas, ed. OAB/
tras rendas que possam SP Resenha Tributária,
A jurisprudência e a doutrina provir do exercício de
dominantes enfatizam o fato da ativi- 1982).
suas atribuições e da
dade notarial e registral ser uma ati- utilização de seus bens Essa teoria tem so-
vidade estatal e a utilização com- e serviços. frido várias críticas de
pulsória do serviço como fatores diversos juristas, entre
que conformariam a contraprestação Dessa forma, o item III do art. as quais destacamos:
notarial como taxa. 30 da Constituição de 1946 reunia
realidades distintas em um mesmo – Gilberto de Ulhôa Canto (Taxa
A tese de que o critério jurídico dispositivo – a renda decorrente do e Preço Público. In: Cadernos de
que conforma um ingresso como taxa exercício de atribuições públicas e Pesquisas Tributárias, vol.10, Rese-
ou preço público é o tipo de atividade aquelas provenientes da utilização de nha Tributária, 1985, p.83-110) – O
exercida (“se for atividade econômi- bens e serviços públicos. Tal fato ge- autor argumenta que a concepção de
ca haverá preço; se for atividade pró- rou grande perplexidade doutrinária Greco não encontra fundamento
pria do Estado, taxa”), foi desenvol- e criou-se a distinção entre compulso- constitucional. Da leitura dos dispo-
vida por Marco Aurélio Greco e Ha- riedade da taxa e voluntariedade das sitivos constitucionais vigentes na-
milton Dias de Souza em um parecer demais rendas, para explicar a nor- quela época, pode-se inferir que (a1)
elaborado para a OAB/SP, que ser- ma constitucional e dar coerência a há serviços que a União tem encar-
viu para embasar a argüição de um explícito condicionamento de di- go de organizar e fazer funcionar; (a2)
inconstitucionalidade do Decreto nº reito positivo. alguns desses serviços podem ser
16685/81, do Estado de São Paulo executados por concessionários pri-
Essa situação, segundo os au-
que aumentou o valor das custas ju- vados; (a3) pela maneira como são
tores, foi substancialmente alterada
diciais e dos emolumentos extraju- referidos, tais serviços são de uso
com o advento da E.C. 18/65 que,
diciais (Resp 1094/SP-RTJ 141/430), facultativo. A norma constitucional
modificando o sistema constitucional-
sendo esse parecer, posteriormen- pertinente à instituição e à cobrança
tributário, eliminou a referência a “ou-
te, transformado no livro “A Natureza de taxas (art.18, I) alude a serviços
tras rendas”. Portanto, toda a discus-
Jurídica das Custas Judiciais”. públicos, sem entretanto, extremá-los
são doutrinária a respeito da distin-
Neste parecer, esses autores cri- dos serviços públicos mencionados
ção entre taxa e preço público não
ticam a Súmula 545 do STF que criou nos arts. 8º, XII (serviço postal) e XV
poderia mais calcar-se na compulso-
a distinção entre compulsoriedade da (serviços de telecomunicações, de
riedade ou facultatividade da exação,
taxa e voluntariedade das demais re- pela simples razão de que a discus- energia elétrica, de navegação aérea,
ceitas, para explicar e dar coerência são tinha origem num dispositivo de transportes entre portos marítimos
ao item III do Art. 30 da Constituição constitucional que não existia mais. e fronteiras nacionais e interestadu-
de 1946. Dessa forma, para os autores é o tipo ais), 164 (a União para a realização
Constituição de 1946 de atividade exercida que identifica de serviços comuns, pode estabele-
Art. 30 – Compete à União, aos taxa e preço público: cer regiões metropolitanas) e 167 (es-
Estados, ao Distrito Federal e aos Se for uma atividade econômi- tabelecimento de tarifas para empre-
Municípios cobrar: ca, tal como definida no Título III da sas concessionárias de serviços pú-
I – contribuição de melhoria, Constituição Federal, haverá preço; blicos), nem com eles confundi-los.
quando se verificar valorização do se for uma atividade própria do Esta- Estes, embora sejam serviços espe-
1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 25
BOLETIM CARTORÁRIO 4/2

cíficos e divisíveis, pela sua natu- rágrafo único, III, da Constituição de uma intermediação privada, realiza-
reza, não podem ser remunerados 1988. da sempre em nome do próprio Es-
por taxas. Sendo assim, nos siste- – Adilson Abreu Dallari(Direito tado;
ma de direito positivo daquela épo- Tributário Brasileiro. 8ª ed., São Pau- – o Estado Brasileiro não fugiu
ca existiam serviços públicos cuja lo: Saraiva, 2002,p.42-43). Para o à tradição histórica acima, adotando,
contrapartida era a taxa, e serviços autor, a concepção de Greco trata- por opção do legislador constituinte,
públicos remunerados mediante pre- se apenas de uma “antiga polêmica”, o sistema que delega ao particular o
ço. pois, com o art.175 da atual Consti- exercício da fé pública. Na sistemáti-
– Flávio Bauer Novelli (Opus cit. tuição Federal, o pagamento de tari- ca atual, notários e registradores são
p.104), com base em M.S. Giannini, fas como forma de remuneração de profissionais do direito, delegados de
critica a visão de Greco, argumentan- serviços concedidos tem assento uma atividade estatal, que possuem
do que o autor confunde serviço pú- constitucional. Afirma, ainda, ser per- autonomia administrativa e financei-
blico com serviço regido por normas feitamente lícita a fixação de tarifa ra para gerenciar suas serventias,
de direito público, esquecendo-se de como forma de remuneração de ser- inclusive no que diz respeito às des-
que existem serviços públicos pres- viços públicos concedidos, inclusive pesas de custeio, investimento e pes-
tados de acordo com normas de di- aqueles de utilização compulsória, soal;
reito privado. Novelli afirma que, se- como os serviços de saneamento – o serviço notarial e registral
gundo a interpretação de Greco, se- básico e recolhimento domiciliar do é uma das formas de intervenção
riam taxas as contraprestações típi- lixo. do Estado em nossa sociedade, ten-
cas que tanto a doutrina quanto a ju- As críticas ao critério da do por finalidade a prevenção de li-
risprudência reconhecem como au- compulsoriedade, enquanto caracte- tígios;
tênticos preços públicos ou tarifas, rística isolada da relação, já foram
tais como as que são pagas pela uti- – a Constituição de 1988 ressal-
elencadas acima, evidenciando que ta a distinção entre serviços judiciais
lização dos serviços de água e esgo- tal critério não serve para diferenciar
to, de educação e instrução (anuida- em face dos serviços notariais e
taxa de preço público. registrais. Compete privativamente
des ou mensalidades escolares), de
transporte ferroviário, rodoviário e Analisando-se o atual regime ju- aos Tribunais elaborar seus regimen-
aéreo, de manutenção e limpeza de rídico dos serviços notariais e tos internos (CF, art. 96, I, a, b e d; II,
estações aeroportuárias ou rodoviá- registrais e de suas contraprestações, b, c e d). Os serviços notariais e
rias, de armazenagem, de correios e pode-se afirmar que: registrais estão previstos no art.236;
telégrafos, de telefonia, de forneci- – desde a antiguidade e nas – as serventias do foro judicial
mento de energia elétrica e de gás mais diferentes culturas, a socieda- prestam os serviços forenses, que
em domicílio, e, assim, muitas outras de humana sempre teve algum me- são remunerados por custas /
semelhantes. canismo de preservação da memó- emolumentos judiciais, conforme o
– Luciano Amaro também dis- ria de atos e negócios jurídicos, com art. 24, IV e 98 § 2º da CF/88. Os
corda de Greco e aponta um erro de a finalidade de pré-constituição de serviços notariais e registrais são re-
interpretação na teoria deste autor, provas e prevenção de litígios. Foram munerados por outra categoria
uma vez que a Emenda n.18/65 não surgindo, assim, os encarregados de (emolu-mentos notariais), conforme
eliminou a expressão “outras rendas” redigir e registrar documentos escri- explicita o § 2º, do art. 236 da Carta
com o intuito de restringir a remune- tos e se configurando o que hoje se Magna Nacional e a Lei 10169/2000.
ração dos serviços públicos ao insti- entende por atividade notarial; Além disso, as receitas provenientes
tuto da taxa. A previsão de “outras – os serviços notariais e dos serviços notariais e registrais não
rendas” não se encontrava na E.C. registrais existem atualmente em to- fazem parte do Título VI, Capítulo I,
18/65, assim como não consta no dos os Estados, que os organizam de da CF, que trata do Sistema Tributá-
art.145, II , da atual Constituição, por- formas diversas; rio Nacional;
que aquela norma disciplinou somen- – na história das serventias – a competência para legislar
te receitas tributárias. Ressalte-se notariais e registrais, há uma contí- em sede de serviços forenses é a
que a Constituição de 1967, em seu nua e progressiva dinâmica que concorrente do art. 24, IV da CF; en-
art.160, II, mencionava, de modo transcende os limites do território quanto que a referente a emolu-
expresso, “serviços públicos”, em re- pátrio e, ao mesmo tempo em que mentos é a privativa da União, em
lação aos quais previa que a lei de- coloca essa atividade como fenôme- termos de normas gerais (Lei 10169/
veria estabelecer “tarifas”, dispositi- no gerado no âmbito central do pró- 2000), consoante o disposto no art.
vo que corresponde ao art.175, pa- prio Estado, a desloca, todavia, para 236, §2º; da Constituição. No regime

26 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


BOLETIM CARTORÁRIO 4/3

jurídico das contraprestações qualidade de ente soberano de Direi- o caso do serviço notarial. Dessa for-
notariais e registrais não se aplica o to Público. As receitas provenientes ma, não existe imunidade tributária
disposto no art. 24, §3º, da CF, pois da prestação dos serviços notariais recíproca, pois o artigo 150, §3º da
não se trata de competência legisla- e registrais são preços públicos, a sua Constituição Federal estabelece que
tiva concorrente; cobrança se destina integralmente ao a imunidade recíproca não se aplica
– o termo serventia, contido no notário, e o seu regime jurídico é o ao patrimônio, à renda e aos servi-
artigo 16, da Lei 8935/94, identifica da legalidade genérica do Estado de ços relacionados com a exploração
especificamente o serviço e não a Direito, o qual permite sua regula- de atividades, em que haja contra-
função, esta sim relacionada a car- mentação administrativa, dentro dos prestação ou pagamento de preços,
gos, classes e carreiras, ou seja, a parâmetros traçados pelo Legislativo. ou tarifas, pelo usuário. Sendo assim,
atividades específicas dos funcioná- 5. A definição da contraprestação no tocante ao item 21, subitem 21.1,
rios públicos. As serventias notariais notarial e registral como preço a LC 116/03 atuaria no âmbito de sua
e registrais não são cargos públicos, público e o Imposto Sobre competência, delineada pelo art.146
mas órgãos estatais despersonali- Serviços de Qualquer Natureza da Carta Magna, estabelecendo fa-
zados que, por determinação do le- (ISSQN) tos geradores, base de cálculo e con-
gislador constituinte, tiveram suas tribuintes (III, a) e até regulando as
A introdução da Lei complemen- limitações ao poder de tributar (II), ao
administrações transferidas para par- tar nº 116, de 31 de julho de 2003, no
ticulares, conforme, inclusive, o en- firmar que nem todo serviço público
sistema jurídico brasileiro, instituiu é imune, harmonizando-se, assim,
tendimento mais recente do STF (ADI nova disciplina para o ISSQN. A nova
2602). com o §3º do art.150, da CF/88.
Lei adiciona à antiga lista de servi-
Dessa forma, a prestação do ços tributáveis (Dec. Lei 406/68) cen- 5.2. Segunda corrente de inter-
serviço notarial e registral não confi- tenas de novos serviços e, dentre as pretação: O serviço notarial e
gura exercício de soberania do Po- novas atividades tributadas, encon- registral, sendo remunerado por taxa,
der Público, mas um serviço jurídico tra-se o serviço notarial (art.1º, §3º, não permite a incidência do ISSQN.
de utilidade ou relevância pública, que item 21, subitem 21.1), cujas Os tributaristas Roque Antonio
atende não apenas às necessidades contraprestações foram fixadas pelo Carraza, Osires de Azevedo Lopes
individuais do usuário, mas principal- legislador como preço ou tarifa. Filho, Fernando Neto Botelho, Álva-
mente à necessidade social de se- Com relação à constituciona- ro Mello Filho e Betina Treiger
gurança jurídica e, em consequência, lidade da cobrança do ISSQN sobre o Grupenmacher defendem a tese de
de prevenção de litígios. E, para con- serviço notarial, existem duas corren- que os serviços notariais não estão
cluir, se o serviço notarial e registral tes antagônicas que se diferenciam sujeitos à tributação por meio do
fosse típico do Estado, não poderia conforme o entendimento dado à na- ISSQN. O que se alega é, em resu-
haver transferência de seu exercício tureza jurídica do serviço e da sua mo, o seguinte:
a particulares. contraprestação . Este trabalho propõe – as serventias notariais e
O quadro abaixo sintetiza a na- uma terceira linha de interpretação. registrais são serviços públicos esta-
tureza jurídica das contraprestações 5.1. Primeira corrente de inter- duais, submetidas à disciplina de Di-
das serventias notariais e registrais: pretação: A lei complementar nº 116/ reito Público. O ISSQN, como esta-
belecido no art. 156, III da Constitui-
Critérios Contraprestações Notariais
ção, refere-se aos serviços realiza-
1.Princípio da destinação pública do tri- – dos no âmbito do Direito Privado;
buto. – a atividade notarial e registral,
2. Serviço público que o Estado fornece, – ainda que executada no âmbito de
agindo na qualidade de ente soberano de Di- serventias privatizadas constituem,
reito Público. em decorrência de sua própria natu-
reza, uma função revestida de
De tudo que foi exposto, pode- 03, no tocante aos serviços notariais, estatalidade, sujeitando-se, por isso
se concluir que as contraprestações não desrespeita a Constituição Fede- mesmo, a um regime jurídico de Di-
notariais e registrais não obedecem ral. reito Público. A base desse entendi-
ao princípio da destinação pública do Para essa corrente, que defen- mento encontra-se na jurisprudência
tributo, e nem tampouco se configu- de o ponto de vista dos Municípios, estudada nos capítulos anteriores;
ram como contraprestação de servi- existem serviços públicos que não – ao utilizar a mesma base de
ço público exercido pelo Estado, na são remunerados por taxas, como é cálculo e o mesmo fato gerador de

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 27


BOLETIM CARTORÁRIO 4/4

taxas estaduais (emolumentos auto-organização, autogoverno e a se observar é que a Constituição


extrajudiciais), a Lei do ISSQN fere o autoadministração. adotou uma discriminação exausti-
art.150, VI, “a“, da Constituição da A auto-organização se caracte- va, portanto dotou cada uma das en-
República (imunidade recíproca). riza pela liberdade de as unidades tidades federativas de uma compe-
O STF tem decidido que os federativas elaborarem as suas tência tributária privativa ou exclusi-
emolumentos extrajudiciais são ta- Constituições, obedecidos os princí- va. Dessa forma, os tributos são in-
xas, excluindo a natureza jurídica de pios gerais da União. O autogoverno dividualizados, para que possam ser
preço público. Vale dizer: está-se di- é definido pela capacidade de orga- repartidos. A técnica de repartição,
ante de um tributo municipal (ISSQN- nizar o seu governo, mediante elei- adotada pelo texto constitucional, foi
imposto), incidindo sobre outro tribu- ção. A autoadministração se carac- a de que se dividissem os tributos
to estadual (emolumentos-taxas), o teriza pela faculdade de possuir ad- em modalidades e se adotassem
que, nos planos fáticos e jurídicos, ministração própria, leis próprias para critérios para a sua apropriação.
viola ditames e princípios constituci- o funcionamento dessa administra- O art.145 da Constituição Fede-
onais e tributários. ção, capacidade de gestão de seus ral especifica as modalidades de tri-
Essa doutrina enfatiza, ainda, negócios, arrecadação, fiscalização buto que compõem o nosso sistema:
que o serviço notarial e registral é e aplicação dos tributos de sua com- impostos, taxas, contribuição de
público e específico e sobre ele petência. melhoria. Para que a divisão fosse
incidem os emolumentos (taxas), Em nosso sistema federativo, é rigorosa, foram instituídas as seguin-
conforme previsão dos arts.77 e 79, a Constituição que dá a titularidade tes regras de repartição: para os im-
II, do Código Tributário Nacional. Isso dos tributos à União, aos Estados e postos, foi adotada a técnica da atri-
significa, segundo esses autores, que aos Municípios. No entanto, para que buição da competência privativa (a
o CTN concebe tão somente a taxa o tributo seja criado é necessário que única exceção a essa regra é a do
como contrapartida da prestação de o ente federativo, possuidor da fa- art. 154, II da CF); e, para as taxas e
serviços públicos, sendo vedada a culdade de criá-lo, venha a exerci- contribuições de melhoria, a da com-
instituição de qualquer imposto sobre tar essa competência, através da petência comum. Como corolário,
serviços públicos, como decorrência edição de uma lei, com os requisi- temos que os impostos são enume-
da proibição expressa e direta tos de uma lei tributária, ou seja, com rados pelo nome e discriminados na
insculpida no art.150, VI, “a”, de nos- a definição do fato gerador, da base Constituição, sendo atribuídos, priva-
sa Carta Magna. de cálculo da alíquota e dos sujeitos tivamente, a cada uma das pessoas
ativo e passivo. É a essa lei que se políticas, enquanto que as taxas e
O STJ segue essa mesma linha contribuições de melhoria são
de raciocínio, ao decidir que os ser- reconhece a qualidade de ser cria-
dora do tributo. A titularidade dos tri- inominadas e atribuídas, em comum,
viços cartorários notariais e de regis- a essas pessoas. Tal fato não signifi-
tro não sofrem a incidência do ISSQN butos, dada pela Constituição aos
entes federativos, é intransferível e ca que possam existir taxas e contri-
(Resp 612780/RO – DJ 17/10/05, buições de melhoria que se sobrepo-
p.180). inegociável, o que significa dizer que
qualquer outra pessoa que tente ins- nham, pois a nossa Carta Magna dis-
5.3. Linha de interpretação tituir tributos de competência de ou- tribuiu a competência para o exercí-
proposta: O serviço notarial é remu- tro ente é incompetente, pois não cria cio do poder de polícia, assim como
nerado por preço público e não per- tributo quem quer, mas quem pode e para a prestação de serviços públi-
mite a incidência do ISSQN, pois o de acordo com a Constituição Fede- cos. Dessa forma, só é regulável ju-
município é incompetente para ins- ral. Não existe, no entanto, o dever ridicamente a taxa cobrada com
tituir tributo sobre a prestação nota- de instituir todos os tributos previs- fundamento no poder de polícia ou
rial. tos na Constituição. O não exercício na prestação de serviço público pró-
Um dos aspectos básicos da dessa competência não significa re- prios de quem a instituiu.
nossa estrutura constitucional é a for- núncia, já que essa competência per- Na realidade, o ISSQN não
ma federativa do Estado Brasileiro. manece no campo das virtualidades, incide sobre os serviços notariais e
O regime federativo é variável, mas podendo ser exercida a qualquer registrais, porque cabe, ao Poder
se caracteriza fundamentalmente momento, mediante edição da com- Judiciário Estadual, a competência
pela união de diversos estados autô- petente lei instituidora. constitucional de fiscalizar tais servi-
nomos, sob uma única soberania. Para que não haja conflitos, a ços (CF, art. 236, §1º e Lei 8935/94,
Diferencia-se dos Estados Unitários Constituição Federal estabeleceu Capítulo VII). Assim, cabe ao juízo
pela autonomia das unidades critérios para a repartição da com- competente, na órbita estadual e do
federadas, em sua capacidade de petência tributária. O primeiro ponto Distrito Federal, a fiscalização dos

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BOLETIM CARTORÁRIO 4/5

atos notariais e registrais, o zelo para incidindo sobre uma mesma base de ços públicos não serve como funda-
que o serviço seja prestado com ra- cálculo (emolumentos) – art.145, §2º, mento jurídico para os municípios
pidez, qualidade satisfatória, e de CF. cobrarem ISSQN sobre tais ativida-
modo eficiente, podendo propor a ela- O quadro abaixo resume as prin- des, acontecimento que traria prejuí-
boração de planos de adequada e cipais interpretações da Lei 116/03 zos para os usuários, que são os
melhor prestação desse serviço, se- com relação ao serviço notarial: contribuintes de fato desse tributo.
gundo critérios populacionais e sócio-
Pode-se concluir que a classifi- (*) O autor é Doutor em Direito
econômicos. Logo, é o Estado, atra-
cação das contraprestações dos ser- Econômico, Titular do 1º Distribuidor
vés de seu Poder Judiciário, quem
viços notariais e registrais como pre- de Niterói, RJ.
possui a competência constitucional
para instituir taxa, no exercício do Lei 116/03, Art.1º, §3º, item 21, Base jurídica utilizada
poder de polícia sobre as atividades subitem 21.1.
notariais e registrais. A cobrança do
A cobrança do ISSQN não fere a Cons- Arts. 146, II, III, “a” e 150, §3º,
ISSQN pelo Município implica em uma
tituição Federal. CF.
invasão de competência e, conse-
quentemente, em uma bitributação, As contraprestações notariais são ta- Arts. 150, VI, “a” da CF.
por causa da existência dessa taxa xas e, por essa razão, não podem servir Arts. 77 e 79, II do CTN.
estadual. Note-se que essa bitributa- como base de cálculo do ISSQN.
Jurisprudência do STF (Ane-
ção não ocorre devido à natureza ju-
xo I).
rídico-tributária das contrapresta-
ções notariais e registrais que, como As contraprestações notariais são Art. 236, §1º da CF.
já foi visto, são preços públicos, mas preços públicos. O Município não pode Art. 145, §2º, CF.
devido ao fato de que o nosso siste- cobrar ISSQN sobre essas receitas, por-
que a Constituição Federal atribui ao Po- Lei 8935/94, Capítulo VII.
ma tributário nacional não admite a
existência de dois tributos (taxa de der Judiciário dos Estados a competência
fiscalização estadual e ISSQN) para fiscalizar os serviços notariais.

ATA NOTARIAL – PARTE I

João Teodoro da Silva (*)

1. NOÇÕES do à classificação dos nifestação da vontade humana; ma-


INTRODUTÓRIAS atos notariais e, dentre nifestação da vontade do agente para
Para se ter boa no- eles, isolando a ata aquisição, alteração ou perda de di-
ção do uso especializa- notarial como objeto reitos; documento redigido segundo
do da palavra ata na destes apontamentos. determinada fórmula e suscetível de
expressão de cunho ju- 1.1. ATO – AUTO – ATA produzir consequências jurídicas; de-
rídico ata notarial, as- Ato tem origem na cisão, deliberação ou determinação
sim como para situar a palavra latina actu(m) , do poder público; documento público
sua lavratura no con- forma nominal provenien- em que se exprime decisão de uma
junto das atribuições te do supino do verbo autoridade, etc.
do tabelionato de notas agere (ago, agis, egi, Auto tem a mesma origem de
no Brasil, algumas actum, agere), que signi- ato, só que se apresenta com varian-
aproximações e distin- fica, entre inúmeras ou- te gráfica de acto, popularizada no
ções de significado se fazem neces- tras acepções: agir, atuar, exercer ati- idioma português antigo, exemplar-
sárias, a começar por ato, auto e vidade e, por extensão, fazer. Daí o mente na obra literária do poeta e
ata, passando por fato jurídico, ato sentido etimológico de ato: aquilo que dramaturgo renascentista GIL
jurídico e negócio jurídico, em se- se fez, feito, e, por extensão, o que VICENTE (Auto dos reis magos, Auto
guida por documento, instrumento, se está fazendo, o que se faz ou se da sibila Cassandra, Auto da barca
instrumento público e instrumentos pode fazer; ação, procedimento, ce- do inferno, Auto da barca do purga-
públicos notariais, daí se chegan- rimônia, solenidade, declaração, ma- tório, Auto da barca da glória, Auto
1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 29
BOLETIM CARTORÁRIO 4/6

da lusitânia, etc). Nota-se que, ainda 1.2. FATO JURÍDICO – ATO conducentes a estabelecer, alterar ou
hoje, cada parte de uma peça teatral JURÍDICO – NEGÓCIO JURÍDICO extinguir relações jurídicas, a incluí-
é chamada de ato. A palavra antiga Fato é todo evento, aconteci- rem eles, pois, os atos que se reali-
auto (variante de acto) adquiriu a mento. Quando algo acontecido tem zam independentemente de declara-
acepção jurídica de narrativa escrita, repercussão na esfera do Direito, diz- ção de vontade do agente e que, por
circunstanciada e autenticada de se que é um fato jurídico, porquan- isso mesmo, podem, com base no
qualquer atividade ou diligência judi- to todo direito se origina de um fato art. 185 do Código Civil em vigor, ser
ciária (auto de penhora, auto de (ex facto jus oritur). Consoante a de- designados ATOS JURÍDICOS NÃO
arrematação, etc), administrativa finição de CAIO MÁRIO DA SILVA NEGOCIAIS. Exemplos, em matéria
(auto de infração), ou notarial (auto PEREIRA, completando a de de direito privado: o abandono de
de aprovação de testamento cerra- SAVIGNY, “fatos jurídicos são acon- uma coisa por seu proprietário e o
do). O seu plural autos veio a signifi- tecimentos em virtude dos quais co- empossamento de um bem com âni-
car o conjunto ordenado das peças meçam, se modificam ou se extin- mo de se tornar dono. Exemplos no
de um processo. guem as relações jurídicas” (Institui- âmbito instrumental do tabelionato de
Ata, por sua vez, é a mesma ções, vol. I, tópico 78; 1978,1:396- notas: as atas notariais, as autenti-
palavra actu(m), usada no plural neu- 397). cações notariais de documentos avul-
tro (acta) com o sentido etimológico sos, os traslados e as certidões, que
Eles se apresentam sob duas são atos do ofício sem conteúdo
de ações, feitos, coisas feitas, daí modalidades:
passando a significar registros ou negocial.
assentamentos de decisões e depois 1.2.1. FATOS JURÍDICOS NA- b) ATOS JURÍDICOS EM SEN-
relato escrito do que se passou numa TURAIS, que são TIDO ESTRITO, que são os ATOS
reunião, sessão, convenção, assem- – provocados por fenômenos da JURÍDICOS NEGOCIAIS, ou melhor,
bleia, congresso, etc. natureza, quando estes repercutem NEGÓCIOS JURÍDICOS, em seus
Portanto, ato, auto e ata origina- na órbita do Direito; dois polos:
riamente queriam expressar idéias – involuntários, isto é, não de- b.1 – NEGÓCIOS JURÍDICOS
semelhantes ou afins, com a circuns- pendem da vontade humana, ou para UNILATERAIS, resultantes de decla-
tância de que ata trazia uma noção os quais ela concorre sem ser a cau- rações unilaterais de vontade. Exem-
de pluralidade que o tempo afastou e sa determinante. plos: renúncia de usufruto e testa-
deu ensejo à formação do plural atas, Exemplos: chuva, raio, tempes- mento.
de uso bastante comum, como figu- tade e deslocamento de cursos b.2 – NEGÓCIOS JURÍDICOS
ra na expressão livro de atas. Ao ver- d’água por aluvião; nascimento e BILATERAIS, resultantes de declara-
bete ata o dicionário Novo Aurélio morte (o nascimento de uma criança ções de vontade de partes em posi-
século XXI ainda alude com o mes- pressupõe a vontade humana e esta ções distintas, mas em convergência
mo sentido técnico-jurídico de autos pode influir quanto à morte, mas não para o mesmo fim. Exemplos: os con-
na expressão: o relator leu as atas determina o acontecimento). tratos em geral.
do processo.
1.2.2. FATOS JURÍDICOS HU- Na atividade notarial, importa
Do significado primário de indi- MANOS, que são ressaltar, desde já e por questão de
car nominalmente a ação (actio), con- princípio, que tanto os negócios jurí-
tida no verbo agir, a actuação, o exer- – provocados pelo ser humano;
dicos unilaterais como os bilaterais se
cício da actividade, o fazer, a palavra – voluntários. formalizam mediante o mais impor-
acto, em seu itinerário semântico, tante ato do ofício, que é a escritura
Exemplos: atos jurídicos, que
veio a designar o resultado da ação.
produzem efeitos lícitos segundo a pública.
E, assim, no mundo do Direito, cu-
vontade do agente, e atos ilícitos, que À cata de precisão terminológica
nhou-se a expressão ato jurídico para
produzem efeitos nocivos por vício de com referência ao significado de ato
dar a ideia de manifestação de von- vontade do agente, ou seja, implicam
tade destinada a produzir efeitos ju- jurídico, quis definí-lo o art. 81 do Có-
deveres reparatórios e acarretam
rídicos queridos por seu agente ou digo Civil de 1916, ao dispor que é
sanções para ele.
seus agentes. Apresenta-se então todo ato lícito com o fito imediato de
sob dupla face: o ato jurídico no sen- Isolando, no amplo espectro dos “adquirir, resguardar, transferir, mo-
tido substancial, ou seja, a manifes- fatos jurídicos, os provocados pelo dificar ou extinguir direitos”. Des-
tação das relações jurídicas em seu ser humano e, dentre eles, tão so- sa definição prescindiu, todavia, o
conteúdo, para perpetuação e segu- mente os atos jurídicos, portanto líci- Código Civil vigente. Posto que, no
rança das quais se faz mister seja tos, estes também se mostram sob citado artigo 81, se cuidou de dar re-
materializado por meio do ato jurídi- duas facetas: alce ao ato jurídico em sentido estri-
co no sentido formal, que é o conti- a) ATOS JURÍDICOS EM SEN- to, aquela definição legal, em vista
nente, ou seja, o instrumento que dá TIDO AMPLO, que alcançam todas disso, também se aplicava e continua
visibilidade ao conteúdo. as manifestações de vontade aplicando-se ao negócio jurídico. As-

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BOLETIM CARTORÁRIO 4/7

sim, com o acréscimo de uma ex- ferenciação, CAIO MÁRIO (1978,1: negócio jurídico, uma criação dos ju-
pressão, negócio jurídico pode ser 412), ensina que a noção do ato jurí- ristas alemães com grande aceitação
definido como todo ato lícito que con- dico lato sensu abrange as ações pelos italianos, “se originou da obser-
tenha declaração de vontade e tenha humanas, tanto aquelas que são vação de que existem atos jurídicos
por fim imediato adquirir, resguardar, meramente obedientes à ordem que não se externam sob a forma de
transferir, modificar ou extinguir direi- constituída, determinantes de uma declaração de vontade, embora
tos. Porque, na compreensão de res- consequências jurídicas ex lege, in- produzam modificações no mundo
peitáveis civilistas, ato jurídico e ne- dependentemente de serem ou não externo, tais como a ocupação, a tra-
gócio jurídico são nuanças de uma queridas, como aquelas outras decla- dição, a gestão de negócios alheios,
só realidade. rações de vontade, polarizadas no etc, atos lícitos e voluntários, cujos
Mas, considerando a expressão sentido de sua finalidade, hábeis a efeitos decorrem da lei, independen-
negócio jurídico portadora de concei- produzir efeitos jurídicos queridos. te de saber se o indivíduo os previu
to já assente na doutrina e de ser A esta segunda categoria, cons- ou desejou”. E, comparando, distin-
mais técnica do que a expressão ato tituída de uma declaração de vonta- gue: “Já os negócios jurídicos decor-
jurídico, os elaboradores da reforma de dirigida no sentido da obtenção de rem sempre de uma previsão e uma
do Código Civil – chegada a termo um resultado, é que a doutrina tradi- intenção resultantes de uma decla-
mediante a Lei nº 10.406, de 10 de cional denominava ato jurídico (stricto ração de vontade”.
janeiro de 2002, – fizeram duas op- sensu), e a moderna denomina ne- No entanto, com subsídio nas li-
ções: omitir a definição legal e disci- gócio jurídico. ções de ORLANDO GOMES e
plinar a matéria sob a designação de Leciona ainda CAIO MÁRIO VICENTE RÁO, prognosticando em
negócio jurídico (livro III, título I, ca- (1978,1:413) que a expressão ato sentido contrário à orientação que
pítulos I a V, arts. 104 a 184), dedi- jurídico “é um valor semântico veio a ser seguida pelos juristas
cando aos atos jurídicos não abrangente de um conceito jurídi- elaboradores da reforma do Código
negociais apenas o art. 185, para aí co mais amplo, compreensivo de Civil, ressalvou o mesmo LEIB
consignar “Aos atos jurídicos lícitos, qualquer declaração de vontade, SOIBELMAN, no primeiro volume de
que não sejam negócios jurídicos, individual ou coletiva, do particular seu Dicionário (1973,1:68-69) e no
aplicam-se, no que couber, as dispo- ou do Estado, destinada à produ- tópico destinado ao ATO JURÍDICO
sições do Título anterior”, ou seja, as ção de efeitos”. Tomada, porem, a NEGOCIAL, que “a doutrina do ne-
relativas aos negócios jurídicos. expressão ato jurídico em sentido gócio jurídico constitui um labirinto,
Distingue a doutrina, entretanto, estrito, com o significado de decla- um quebra-cabeça criado pelos ale-
e entende que a conceituação de ato ração de vontade apta a produzir mães e no qual os italianos estão se
jurídico tem sentido abrangente das os efeitos jurídicos queridos, tem- envolvendo a fundo. Quando a con-
esferas do direito público e do direito se que, nesta acepção, as noções fusão aumentar os italianos vão aca-
privado, compreendendo atos de con- de ato jurídico e negócio jurídico se bar abandonando o problema com o
teúdo legislativo, administrativo e aproximam. E, então, CAIO MÁRIO velho argumento de que é preciso
jurisdicional, assim como atos sob o considera que “o negócio jurídico voltar à claridade latina, como já
ponto de vista apenas formal, consis- deve ser compreendido como uma aconteceu com tantos problemas da
tentes em atos judiciais, notariais e espécie dentro do gênero ato jurí- ciência do direito”. O prognóstico,
registrários, de um lado; de outro, dico ”. aqui no Brasil, não vingou, pois aí
atos contratuais, de declaração uni- está o Código Civil reformado, que
Reafirma-se que, no negócio ju- pretendeu descartar a expressão ato
lateral de vontade e até mesmo de rídico, o ponto fundamental é a de-
manifestação volitiva não externada jurídico e prestigiar a designação de
claração de vontade apta a produzir negócio jurídico, mas sem alcançar
em declaração expressa. Os atos ju- os efeitos jurídicos queridos. Pois
rídicos, portanto, tomada a expressão prescindir nem de uma nem de ou-
nem sempre ela se faz presente na tra.
em seu significado amplo, contêm caracterização do ato jurídico, haja
sempre manifestações de vontade vista que, em certas circunstâncias, Como quer que seja, indica a
aptas as produzir seus efeitos, mas configuram-se atos jurídicos decor- doutrina contemporânea ser no con-
nem sempre se trata de exteriori- rentes de um comportamento, os trato onde se vê com mais clareza a
zação volitiva tendente a produzir os quais, por causa dessa peculiarida- figura do negócio jurídico. Assim, para
efeitos jurídicos desejados, pois tan- de, prescindem da declaração que se situe o negócio jurídico com
to uma lei como um regulamento ad- volitiva. Explicou isso com clareza relação à amplitude do conceito e to-
ministrativo quanto uma sentença – LEIB SOIBELMAN (1973,2:409-410), mando como exemplo o contrato,
atos de autoridade – trazem no tópico de seu Dicionário onde, ao tem-se que o conceito de fato jurídi-
consequências jurídicas que discorrer sobre a expressão negócio co é mais amplo que o de ato jurídi-
independem de ser queridas ou não jurídico em consonância com a lição co, o qual é mais amplo que o de ne-
por alguém ou por uma coletividade. de DARCY BESSONE DE OLIVEIRA gócio jurídico, o qual é mais amplo
Num esforço de sintetizar a di- ANDRADE, refere que a teoria do que o de contrato.

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 31


BOLETIM CARTORÁRIO 4/8

Visto que os atos jurídicos em jurídico, é chamado tecnicamente de tabelião de notas (ou seja, a vulgari-
acepção estrita consubstanciam ne- instrumento. Nesse sentido, diz o zada autenticação de cópia de docu-
gócios jurídicos , dos quais é art. 653 do Código Civil atual (corres- mento avulso);
indissociável a declaração de vonta- pondente ao art. 1.288 CCiv/1916) f) o instrumento de protesto de
de em busca de um resultado lícito, que a “procuração é o instrumento do título, o seu registro em livro do tabe-
e, ainda mais, que, sob o aspecto sub- mandato”. lião de protesto e a certidão por ele
jetivo, certas atitudes do ser humano À palavra documento, oriunda do expedida;
configuram atos jurídicos em sentido latim documentu(m), cuja raiz está no
amplo, embora não resultem de de- g) os registros públicos a que se
verbo docere (doceo, doces, docui, referem as legislações civil e mercan-
claração volitiva, mas pressuponham doctum), com o significado de ensinar,
manifestação de vontade por outros til;
atribui-se sentido mais amplo que à
meios que não a fala ou o escrito, a palavra instrumento. Esta, por sua vez, h) as certidões expedidas pelas
exemplo da apropriação de um bem proveniente do latim instrumentu(m), serventias registrárias e por outras
de dono desconhecido (postura ativa) cuja raiz é a mesma do verbo repartições de registro público;
e, em certos casos, do silêncio (pos- instruere (instruo, instruis, instruxi, i) as certidões, os certificados e
tura passiva, como pode ocorrer na instructum), com a acepção de ins- os demais documentos expedidos
aceitação de liberalidade), importa res- truir, está tão próxima do sentido da- por repartições públicas.
saltar que, para o Direito Notarial, in- quela (ensinar-instruir) que, na lingua-
teressam, por sua relevância, os atos Revendo, sob a óptica da ordem
gem jurídica corrente, são ambas
jurídicos em estrito sentido, ou seja, de importância, o elenco exemplificativo
usadas em sinonímia.
os atos jurídicos negociais ou preci- das espécies do gênero instrumento
samente negócios jurídicos, mas mes- O instrumento, à feição do do- público, pode-se afirmar com segu-
mo estes quando resultantes de de- cumento, classifica-se em particular rança que a escritura pública é a sua
claração de vontade expressa por e público. Por instrumento particular principal modalidade. Tanto é que a
escrito, nos casos em que devem (por se entende o documento escrito que expressão instrumento público foi e
exigência legal) ou podem (à livre es- é feito e assinado ou somente assi- continua sendo constantemente em-
colha dos interessados) assumir a for- nado por quem esteja na livre dispo- pregada em vez de escritura pública.
ma de atos notariais, mediante escri- sição e administração de seus bens
No rol dos instrumentos públicos,
tura pública da autoria de especializa- (art. 221 CCiv/2002, correspondente
para o interesse desta exposição, so-
do profissional do direito, a saber: o ao art. 135 CCiv/1916), enquanto por
bressaem os instrumentos públicos
notário com as atribuições, no Brasil, instrumento público se deve conce-
notariais, em cuja referência, nas alí-
de tabelião de notas. ber o documento escrito cuja autoria
neas b, c, d, e, não se acha incluída a
é de agente do poder estatal.
1.3. DOCUMENTO – INSTRUMEN- ata notarial, porque a listagem agru-
TO – INSTRUMENTO PÚBLICO – O instrumento público, tomado pou espécies tradicionalmente conhe-
INSTRUMENTOS PÚBLICOS como gênero, se subdivide em ins- cidas no direito brasileiro, o que não é
NOTARIAIS trumento público judicial e instrumen- o caso da ata notarial, modalidade
to público extrajudicial (administrati- nova entre nós que urge difundir e
Documento é palavra que, em- vo, notarial e registrário), compreen- valorizar, pois ela está prevista na Lei
pregada em sentido amplo, significa dendo várias espécies. A título de dos Notários e Registradores (Lei nº
o meio exterior de perpetuar a exis- exemplo, são apontadas as mais tra- 8.935, de 18 de novembro de 1994),
tência de um fato ou de uma coisa. dicionalmente conhecidas a seguir: entre os atos atribuídos aos tabeliães
Nesta acepção, diz-se documento
a) o conjunto dos atos proces- de notas, no art. 7º, III. Antes, porém,
histórico, por exemplo. Mas a pala-
suais e cada um deles considerados era praticada como algo inerente às
vra é comumente empregada em
de per si, especialmente carta de sen- praxes do notariado de tipo latino e, a
sentido jurídico restrito para indicar o
tença, de arrematação ou de adjudi- seu respeito, já havia um precedente
meio exterior de perpetuar a existên-
cação, formal de partilha e certidão implícito de ata notarial no Código de
cia de um fato jurídico, de um ato ju-
rídico, especificamente de um negó- extraída dos autos judiciais ou Processo Civil de 1973, cujo art. 364
cio jurídico, ou, ainda, de coisas que expedida em decorrência deles pelo preceituou: “O documento público faz
sejam ou possam tornar-se objeto de escrivão; prova não só de sua formação, mas
relação jurídica, a saber: mapas, também dos fatos que o escrivão, o
b) a escritura lavrada pelo tabe-
plantas topográficas, projetos tabelião ou o funcionário declarar que
lião de notas em livro próprio;
arquitetônicos, desenhos, croquis, ocorreram em sua presença” (desta-
c) o auto da lavra de tabelião ques em grifo nesta transcrição). Logo,
fotografias, gravações, etc.
para aprovar testamento cerrado e a o que está faltando é conscientizarem-
O documento escrito, quanto à anotação dessa ocorrência em seu se de sua importância os notários, os
sua origem, classifica-se em particu- livro de notas; magistrados, os juristas e os demais
lar e público. O primeiro formalizado
d) o traslado extraído e a certi- operadores do direito.
sem a interferência de agente do po-
der estatal, ao passo que o segundo é dão expedida pelo tabelião de notas; (*) O autor é Tabelião do 6º Ofício
aquele expedido por agente estatal. e) o reconhecimento de firma fei- de Notas de Belo Horizonte, Especia-
O documento escrito, no âmbito to e a pública forma expedida pelo lista em Direito Notarial e Registral.
32 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4
PERGUNT
PERGUNTAS & RESPOST
GUNTAS AS
RESPOSTAS
TRANSFERÊNCIA AO LOCATÁRIO DA TAXA BANCÁRIA PARA COBRAN-
ÇA DE BOLETO DE ALUGUEL
Pergunta: Nos contratos de locação, é acrescida taxa de cobrança de boleto bancário. Temos sido “metra-
lhados” pelos locatários, se negando ao pagamento. Considerando que as relações locatícias não são discipli-
nadas pelo Código do Consumidor, é ilegal essa cobrança, visto que vem expressamente descrita no contrato
de locação? (F.C. – Paulínea, SP)

Resposta: Será legal a transferência da taxa de cobrança de boleto, desde que prevista em cláusula contratual,
nos termos do art. 22, inciso VIII da Lei 8.245/91, quando diz que o locador é obrigado pagar as taxas, salvo disposição
expressa em contrário no contrato. Inclusive é uma das condições feita ao candidato à locação, se concorda ou não,
para poder ser locatário. O boleto bancário visa agilizar os trabalhos da administradora, beneficiando o locador e,
principalmente o locatário.

FORMAL DE PARTILHA, SENDO PARTES O VIÚVO MEEIRO E HERDEI-


ROS – BASE DE CÁLCULOS DOS EMOLUMENTOS PARA REGISTRO
Pergunta: Um Formal de Partilha foi apresentado a registro, nele contendo um imóvel. Existe o viúvo meeiro,
dono de 50% do imóvel, e existem os filhos herdeiros. Os emolumentos para registro do formal foram calcula-
dos levando-se em conta o valor do imóvel. O viúvo meeiro reclamou, argumentando que o Cartório não pode-
ria cobrar sobre o valor do imóvel inteiro, pois o que estava sendo partilhado era 50% do imóvel, posto que os
outros 50% eram de sua propriedade. À mingua de disposições à respeito no Regimento de Custas, e sendo a
praxe a cobrança do registro dos Formais ser calculada sobre todo o imóvel, e não sobre parte dele, faço a
presente pergunta para que os senhores, se puderem, indicarem se existe no site algum conteúdo à respeito.
(P.M.P.C.S. – Guarapari, ES)

Resposta: Trata-se de assunto polêmico e dependerá das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de
cada Estado, caso não exista dispositivo legal taxativo, bem como de suscitação de dúvidas. Veja as normas de seu
Estado de Federação. Na Revista do Direito Imobiliário do Irib (RDI Edição 62), Ademar Fioraneli diz que “os Emolumentos
pelo registro de formal de partilha é calculado pelo valor total do monte-mor, incluindo a meação do cônjuge supérstite
– 7.º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo. O item 94.3 do Provimento CGJ nº 33/2007 - do Estado de São Paulo,
diz que “ Havendo partilha, prevalecerá como base para o cálculo dos emolumentos, o maior valor dentre aquele
atribuído pelas partes e o venal. Nesse caso, em inventário e partilha, excluir-se-á da base de cálculo o valor da meação
do cônjuge sobrevivente.”

AÇÃO RENOVATÓRIA EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL –


MOMENTO E REQUISITOS PARA INTERPOSIÇÃO DA AÇÃO
Pergunta: Um contrato de locação foi firmado pelo prazo de cinco anos. Posteriormente foi renovado por
mais cinco anos por convenção entre as partes (locador e locatário), somando-se portanto dez anos de loca-
ção. Esta locação poderá ser objeto de “Ação Renovatória” para o prazo de mais 05 anos? (I.R. – São Paulo, SP)

Resposta: Sim, desde que esteja de acordo com os requisitos para tal intento, pois a ação renovatória poderá ser
proposta no prazo decadencial de seis meses a um ano antes de vencer o contrato de cinco anos ou do último contrato
como somatório deste prazo. O locatário somente terá direito à Ação Renovatória se atender os requisitos do art. 51 da
Lei 8.245/91, devendo para tanto ter contrato escrito de cinco anos ou contratos ininterruptos que somados resultem
neste prazo. O entendimento jurisprudencial tem admitido um intervalo de mais ou menos três meses entre um contrato

1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 33


PERGUNTAS & RESPOSTAS

e outro para a possibilidade de soma dos contratos anteriores, para o direito à ação renovatória. Ademais disto, o art. 51
da lei inquilinária tem outros requisitos a serem atendidos, como a prova de três anos no mesmo ramo de comércio,
dentro dos cinco anos de contrato escrito, estando o mesmo não vencido, a prazo determinado.

CESSÃO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE FRAÇÃO IDE-


AL A CONSTRUIR
Pergunta: Compra e Venda de imóvel na planta (condomínio casas). Instrumento particular entre compra-
dor (1) e incorporadora. Entrega do imóvel prevista para Julho 2008. Comprador (1) recebe proposta financeira
mais vantajosa para revender o imóvel para terceiro (comprador 2). Interesse do comprador (2) em pagar parte
do valor à vista e parte através de financiamento imobiliário. Como deve proceder o comprador (1) tendo em
vista que ainda não existe promessa de compra e venda, para resguardar seus direitos relativos à venda, ao
preço e recebimento do financiamento? Ou será melhor que o comprador (1) aguarde a entrega das chaves em
Jul/2008 e faça a escritura de compra e venda? Como proceder visando resguardar os interesses econômicos
do comprador (1) face a vantajosa proposta de compra do imóvel, sem colocá-lo em situação de risco? (D.M.W.F.A
– Rio de Janeiro, RJ)

Resposta: Haverá um compromisso de compra e venda de fração ideal na qual faz parte integrante as unidades
condominiais a serem construídas. Neste caso poderá ser feita uma transferência de titularidade junto à incorporadora,
ou caso contrário, devido a taxa de transferência ou até mesmo ao aumento das prestações, poderá ser feita uma
cessão deste compromisso de fração ideal ou um contrato de gaveta; ou caso desejarem, aguardar a entrega das
chaves com a outorga da escritura, caso o compromisso de compra e venda esteja quitado.

COMPRA E VENDA – FALTA DE ENTREGA DA POSSE AO COMPRA-


DOR
Pergunta: Um cliente comprou um apartamento e firmou um contrato de Promessa de Compra e Venda em
Novembro/07, pagando Arras de 20% do negócio e o restante (80%) em Janeiro/08, por meio de financiamento
na Caixa Econômica Federal (CEF), firmando nesta data a escritura definitiva de compra e venda. Ficou estipu-
lado um prazo de 30 dias (após a assinatura da escritura definitiva, que se deu em 25/01/08) para a entrega das
chaves e desocupação do imóvel, o que porém, não ocorreu. O vendedor alega que não pode desocupar o
referido imóvel pelo fato de seu “novo” imóvel ainda não ter ficado pronto. Pergunto: Qual seria a ou as ações
cabíveis no presente caso? (E.D. – Pelotas, RS)

Resposta: Se já foi outorgada a escritura definitiva, pendente somente a entrega da posse ao comprador, poderá
ser ajuizada uma ação para a entrega da coisa como uma obrigação de fazer, conforme cláusula contratual de entrega
do bem, cumulada com multa cominatória e contratual (Arts. 621 a 628 e 632 a 641 do CPC). No caso não é transferên-
cia de propriedade, já que fora outorgada a escritura - art. 640.

IMÓVEL ABANDONADO PELO LOCATÁRIO QUE DEIXA FAMILIARES


NO LOCAL – COBRANÇA DE ALUGUÉIS EM ATRASO
Pergunta: Administro um imóvel residencial objeto de contrato verbal. O locatário saiu e deixou a pessoa
com a qual vivia e um filho. Já não pagam aluguel há mais de um ano. Que tipo de ação devo mover para a
retomada do imóvel. (R.C. – Curitiba, PR)

Resposta: Deverá ser proposta Ação de Despejo por Falta de Pagamento contra os familiares, atuais ocupantes,
pois a locação é caracterizada como “intuitu familiae”. Poderá ser proposta a ação contra a concubina e o filho do
locatário (se maior) que permaneceram no imóvel. Poderá ser ajuizada também contra o desertor, inclusive para ampliar
a possibilidade do pagamento dos aluguéis, tendo em vista que o contrato de locação é verbal.

34 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4


NOTÍCIAS
NOTÍCIAS
FIADOR QUE SE RETIRA DA SOCIEDADE PODE
SOLICITAR EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO CONTRATUAL
É possível a exoneração da garantia de fiança a partir da saída dos fiadores do quadro societário da pessoa
jurídica afiançada. Esse é o entendimento que vem prevalecendo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi mais uma
vez adotado pela Quinta Turma ao julgar um recurso interposto por dois empresários paulistas.
De acordo com o processo, os fiadores prestaram fiança num contrato de aluguel à empresa Lananda Art Indústria
e Comércio Ltda. porque integravam o quadro societário daquela pessoa jurídica. Entretanto houve uma transferência
da totalidade das quotas sociais e a empresa passou a ter novos sócios, continuando a ocupar o mesmo imóvel. Em
razão disso, os ex-sócios e fiadores enviaram aos locadores notificação extrajudicial para garantir que fossem exonera-
dos de continuar prestando a garantia da fiança.
Os novos sócios da empresa recorreram para tentar garantir o contrato de locação, mas a ministra Laurita Vaz,
baseando sua decisão em precedentes do STJ, concluiu que os fiadores tinham o direito de solicitar a exoneração, uma
vez que se haviam retirado da sociedade. “O entendimento majoritário desta Corte Superior de Justiça é no sentido de
que o contrato acessório de fiança obedece à forma escrita, é consensual, deve ser interpretado restritivamente e no
sentido mais favorável ao fiador. Desse modo, não pode a fiança subsistir à mudança do quadro societário da locatária
sem que, expressamente, tenha o fiador concordado”, esclareceu a ministra em seu voto.
A ministra também ressaltou que os fiadores, para fazer uso do direito de ser exonerados da obrigação contratual
(artigo 1.500 do Código Civil), precisam garantir a segurança jurídica e o exato cumprimento dos contratos comunican-
do a exoneração ao locador por meio de notificação extrajudicial, o que foi devidamente providenciado pelos ex-sócios,
ou ainda por meio de ação judicial, se houver necessidade. Sendo assim, tornou-se irrelevante do ponto de vista jurídico
que o contrato locatício tivesse sido estipulado por prazo determinado e estivesse ainda em vigor.
A Quinta Turma, por unanimidade, acompanhou o voto da ministra relatora.
(STJ, Resp 788469)

CONSTRUTORA É CONDENADA
POR NÃO ENTREGAR IMÓVEL NA DATA CONTRATADA
Uma construtora que não entregou o imóvel dentro do prazo estipulado em contrato terá que devolver todas as
parcelas pagas pelo comprador com correção monetária e juros moratórios de 0,5% ao mês. Motivo da condenação:
terminado o prazo para a entrega do apartamento, a obra sequer tinha sido iniciada.
A ação de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por atraso na obra foi movida por Cornélio
Pinheiro de Faria Junior contra a empresa Aguiar Villela Engenharia e Construções Ltda. O Tribunal de Alçada de Minas
Gerais julgou a ação procedente e determinou a restituição integral das quantias pagas pelo comprador devidamente corrigidas.
A construtora recorreu ao Superior Tribunal de Justiça para modificar o acórdão da Justiça mineira, sustentando
que, da mesma forma que o Código de Defesa do Consumidor favorece o comprador impedindo a retenção total das
parcelas pagas em caso de inadimplemento, sua devolução integral também seria inadmissível.
Alegou, ainda, que, como o comprador não havia quitado todas as parcelas devidas, não poderia exigir o cumpri-
mento da obrigação sem antes cumprir sua parte. Segundo os autos, o comprador vinha pagando pontualmente as
prestações contratadas e só interrompeu o pagamento um mês depois do prazo fixado para a entrega da obra.
Por unanimidade, a Quarta Turma do STJ, acompanhando o voto do relator, ministro Aldir Passarinho Junior,
manteve a decisão do tribunal mineiro. Segundo o ministro, a alegação da construtora é despropositada e não tem
qualquer amparo: “na verdade, a recorrente pretende transformar uma regra protetiva do consumidor no contrário, o
que refoge ao comando legal”.
Quanto à alegada inadimplência por parte do comprador, o ministro ressaltou, em seu voto, que o fato de ele ter
interrompido o pagamento das prestações dois dias antes de ajuizar a ação não caracteriza descumprimento do contra-
to. Para o ministro, ficou claro que a inadimplência foi exclusivamente da construtora.
(STJ, Resp 476481)
1º DECÊNDIO FEVEREIRO/2009 – Nº 4 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 35
ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA
TR POUPANÇA FGV - % IBGE - % FIPE - %
MESES
% % I G P- M IGP/DI I P C -D I IPA-D I INCC-DI INPC IPC - A IPC
Jan./2007 0,2189 0,7200 0,50 0,43 0,69 0,32 0,45 0,49 0,44 0,66
Fev. 0,0721 0,5725 0,27 0,23 0,34 0,19 0,21 0,42 0,44 0,33
Mar. 0,1876 0,6885 0,34 0,22 0,48 0,11 0,27 0,44 0,37 0,11
Abr. 0,1272 0,6278 0,04 0,14 0,31 0,02 0,45 0,26 0,25 0,33
Mai. 0,1689 0,6697 0,04 0,16 0,25 (-) 0,04 1,15 0,26 0,28 0,36
Jun. 0,0954 0,5959 0,26 0,26 0,42 0,09 0,92 0,31 0,28 0,55
Jul. 0,1469 0,6476 0,28 0,37 0,28 0,42 0,31 0,32 0,24 0,27
Ago. 0,1466 0,6473 0,98 1,39 0,42 1,96 0,26 0,59 0,47 0,07
Set. 0,0352 0,5354 1,29 1,17 0,23 1,64 0,51 0,25 0,18 0,24
Out. 0,1142 0,6148 1,05 0,75 0,13 1,02 0,51 0,30 0,30 0,08
Nov. 0,0590 0,5593 0,69 1,05 0,27 1,45 0,36 0,43 0,38 0,47
Dez. 0,0640 0,5643 1,76 1,47 0,70 1,90 0,59 0,97 0,74 0,82
Ano 2007 1,45% 7,70% 7,75% 7,89% 4,60% 9,44% 6,15% 5,16% 4,46% 4,38%
Jan./2008 0,1010 0,6015 1,09 0,99 0,97 1,08 0,38 0,69 0,54 0,52
Fev. 0,0243 0,5244 0,53 0,38 0,004 0,52 0,40 0,48 0,49 0,19
Mar. 0,0409 0,5411 0,74 0,70 0,45 0,80 0,66 0,51 0,48 0,31
Abr. 0,0955 0,5960 0,69 1,12 0,72 1,30 0,87 0,64 0,55 0,54
Mai. 0,0736 0,5740 1,61 1,88 0,87 2,22 2,02 0,96 0,79 1,23
Jun. 0,1146 0,6152 1,98 1,89 0,77 2,29 1,92 0,91 0,74 0,96
Jul. 0,1914 0,6924 1,76 1,12 0,53 1,28 1,46 0,58 0,53 0,45
Ago. 0,1574 0,6582 (-) 0,32 (-) 0,38 0,14 (-) 0,80 1,18 0,21 0,28 0,38
Set. 0,1970 0,6980 0,11 0,36 (-) 0,09 0,44 0,95 0,15 0,26 0,38
Out. 0,2506 0,7519 0,98 1,09 0,47 1,36 0,77 0,50 0,45 0,50
Nov. 0,1618 0,6626 0,38 0,07 0,56 (-) 0,17 0,50 0,38 0,36 0,39
Dez. 0,2149 0,7160 (-) 0,13 (-) 0,44 0,52 (-) 0,88 0,17 0,29 0,28 0,16
Ano 2008 1,6348% 7,9036% 9,8100% 9,1000% 6,0730% 9,8048% 11,8735% 6,4809% 5,9027% 6,1632%
Jan./2009 0,1840 0,6849

SINDUSC ON/CUB - % (*) DÓLAR - R$


MESES IMPOSTO DE R ENDA RETIDO NA FONTE
MG RJ RS SC SP C OM ER C IA L PARALELO
Jan./2007 0,69 0,02 0,36 0,067 0,21 2,124 2,350
Base de Cálc ulo A l íq u o ta ( % ) Parcela a
Fev. 0,19 0,10 0,08 0,32 0,16 2,121 2,300
(R$) Deduzir (R$)
Mar. 0,22 2,44 0,28 0,17 0,15 2,050 2,250 Até 1.434,59 Isento
Abr. 0,31 0,13 0,82 0,56 0,71 2,033 2,200 De 1.43 4,60 até
Mai. 0,36 0,02 0,22 3,17 1,21 1,9289 2,100 2.150,00 7,5 107,59
Jun. 0,23 0,45 2,06 0,16 1,43 1,926 2,100 De 2.15 0,01 até
Jul. 0,35 0,05 0,22 0,75 0,58 1,877 2,090 2.866,70 15 268,84
Ago. 0,24 0,29 0,08 (-) 0,02 0,50 1,962 2,150 De 2.86 6,71 até
Set. 0,40 0,23 0,27 0,26 0,26 1,838 2,100 3.582,00 22,5 483,84
Acima 3.582,00 27,5 662,94
Out. 0,68 0,63 0,45 0,72 0,78 1,744 2,050
Nov. 0,52 0,12 0,23 0,31 0,68 1,783 2,000 DEDUÇÕES:
Dez. 4,19 0,10 0,08 0,55 0,59 1,771 1,990 a) R$ 14 4,20 por depen dente; b ) Pensã o alime n-
Ano 2007 8,64% 4,65% 5,26% 7,20% 7,50% (-) 17,05% (-) 16,03% tar integral; c) R$ 1.434,59 para aposentados,
Jan./2008 0,76 0,37 0,10 0,16 0,07 1,760 2,000 pensionistas e transferidos para a reserva re-
Fev. 0,35 0,88 0,62 0,48 0,38 1,698 1,920 munerada que tenham 65 anos de idade ou
Mar. 0,47 4,80 0,49 0,37 0,20 1,753 1,900 mais; d) contrib uição à P revidên cia Soc ial.
Abr. 0,37 0,22 0,26 0,32 0,41 1,663 1,900 UPC (R$) - Jan. / Mar. - 2009 = 21,67
Mai. 0,73 0,26 1,42 5,55 2,72 1,628 1,850 Salário -Mínim o - Jan. - 2009 = 415,00
Jun. 1,40 0,95 4,53 (-) 0,04 2,14 1,597 1,820 UFE SP(S P) (R$) - 2008 = 14,88 - 2009 = 15,85
Jul. 1,01 0,53 1,28 2,78 0,60 1,566 1,750 UFM /SP (R $) - 2008 = 87,20 - 2009 = 92,09
Ago. 2,94 0,92 1,82 1,03 1,36 1,6344 1,8200 OBSERVAÇÕES:
Set. 0,81 0,76 0,48 0,44 0,74 1,9143 2,0500 TR e P oupan ça - Per centua l corres ponde nte
Out. 0,84 0,61 0,13 0,36 1,69 2,1153 2,2200 ao primeiro dia útil do mês, a ser creditado
Nov. 0,44 0,31 0,35 0,09 0,21 2,3331 2,4500 trinta dias após; D ólar - Co tações do últim o dia
Dez. 0,31 0,44 0,26 0,28 (-) 0,04 2,3370 2,5000 ú t il d o m ê s. ( *) A té 0 2 /2 0 0 7 , c o n f. N B R
Ano 2008 10,9000% 11,1500% 12,2900% 12,3200% 10,9600% 31,9600% 25,6300% 12.721/1999; a partir de março/2007,
Jan./2009 conf. NBR 12.721/2006.

COEFICIENTES ACUMULADOS ATÉ O MÊS ANTERIOR


REAJUSTE EM O UTUBRO /2008 REAJUSTE EM N OVEMB RO/2008
Indexador B i m. T r im . Q u ad r im . Sem. Anual Indexador B i m. T r im . Q u ad r im . Sem. Anual
I G P -M / F G V 0,9978 1,0154 1,0356 1,0595 1,1231 I G P -M / F G V 1,0108 1,0076 1,0253 1,0625 1,1223
I G P -D I /F G V 0,9998 1,0110 1,0301 1,0612 1,1190 I G P -D I /F G V 1,0146 1,0107 1,0220 1,0609 1,1229
I P C /F G V 1,0005 1,0058 1,0135 1,0297 1,0560 I P C /F G V 1,0038 1,0052 1,0105 1,0271 1,0595
I N P C /I B G E 1,0036 1,0094 1,0186 1,0350 1,0704 I N P C /I B G E 1,0065 1,0086 1,0145 1,0335 1,0726
I P C -A / IB G E 1,0054 1,0107 1,0182 1,0319 1,0625 I P C -A / IB G E 1,0071 1,0099 1,0153 1,0309 1,0641
I P C / FI P E 1,0076 1,0121 1,0218 1,0399 1,0651 I P C /F I P E 1,0088 1,0126 1,0172 1,0395 1,0695

REAJUSTE EM D EZEMBR O/2008 REAJUSTE EM JANEIRO /2009


Indexador B i m. T r im . Q u ad r im . Sem. Anual Indexador B i m. T r im . Q u ad r im . Sem. Anual
I G P -M / F G V 1,0136 1,0147 1,0114 1,0497 1,1188 I G P -M / F G V 1,0026 1,0123 1,0134 1,0280 1,0981
I G P -D I /F G V 1,0116 1,0153 1,0114 1,0421 1,1120 I G P -D I /F G V 0,9962 1,0071 1,0108 1,0182 1,0910
I P C -D I /F G V 1,0103 1,0094 1,0108 1,0240 1,0627 I P C /F G V 1,0109 1,0156 1,0147 1,0215 1,0607
I N P C /I B G E 1,0088 1,0103 1,0124 1,0276 1,0720 I N P C /I B G E 1,0067 1,0117 1,0133 1,0213 1,0648
I P C -A / IB G E 1,0081 1,0107 1,0136 1,0265 1,0639 I P C -A / IB G E 1,0064 1,0109 1,0136 1,0218 1,0590
I P C / FI P E 1,0089 1,0127 1,0165 1,0309 1,0686 I P C /F I P E 1,0055 1,0105 1,0143 1,0228 1,0616

OBS .: Para reajuste anual de aluguel: multiplique o valor pelo indexador contratado.
Veja os índices co mpletos em nosso site: www.diariodasleis.com.br

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