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Uma publicação
BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO
Fiança – Natureza jurídica
e seus efeitos
no direito atual.
Carlos Roberto Tavarnaro
(p. 3)
A rigor do que estabelece a le- artigo 8º, do Decreto nº 4.382/02). do poder público, as restrições cria-
gislação fiscal, considera-se imóvel Por esse motivo, a legislação fis- das pelo Código Florestal para um
rural, para efeito de determinação da imóvel rural atinentes às áreas de
cal não só estabelece a forma pela
base de cálculo do ITR, a área contí- reserva legal e de preservação per-
qual o contribuinte apura a área de
nua formada de uma ou mais parce- manente, são de eficácia geral, ple-
seu imóvel rural que deve ser sub-
las de terras, localizada na zona ru- na e imediata, e salvo as exceções
metida à tributação, como também
ral do município, ainda que, em rela- legais deve o proprietário da área
exclui do campo de incidência do im-
ção a alguma parte do imóvel, o su- abster-se de utilizá-la, sendo certo
posto as áreas que, dada a sua qua-
jeito passivo detenha apenas a pos- que para a análise que deve ser feita
lificação legal, não devem ser tribu-
se. É o que se extrai da análise con- para o cálculo do ITR essas áreas po-
tadas (Art. 10, § 1º, II, “a” da Lei nº
junta dos seguintes dispositivos le- dem ser excluídas.
9.393/96).
gais: Lei nº 9.393/96 e Decreto nº O ADA foi criado pela Portaria
4.382/02. Essa última hipótese, que se
Ibama 162/97, cujas informações
refere à não-incidência do imposto
Por tratar-se de tributo sujeito ao nele contidas servem para instruir o
lançamento por homologação, o ITR sobre determinadas áreas, contem- Ibama, dentre outras, com informa-
é apurado e pago pelo próprio contri- pla as áreas de preservação perma- ções referentes às áreas de preser-
buinte, independentemente de qual- nente e de reserva legal previstas vação permanente e de reserva le-
quer procedimento prévio da adminis- pela Lei nº 4.771, de 15 de setembro gal situadas no imóvel rural, e ape-
tração tributária, sujeitando-se, como de 1965 (Código Florestal). sar de sua entrega ser importante
tal, à posterior homologação pelo fis- O que se tem atualmente, é que para fins de apuração do ITR, a falta
co (artigo 10, da Lei nº 9.393/96 c/c o independentemente de qualquer ato do ADA não deve ser confundida com
sua entrega atrasada. introduzido no ordenamento pátrio em pelas normas infralegais, não pode-
Em vista do atraso na entrega 2000 (MP nº 1.956-53/00), assim de- ria ensejar a presunção de que as
do ADA, mesmo diante de um proce- termina: áreas excluídas da base de cálculo
dimento fiscal, no qual solicita-se farta “Art. 10. (...). § 7º. A declaração do ITR não existam.
documentação técnica a respeito das para fim de isenção do ITR relativa Noutras palavras, a apresenta-
áreas de não incidência declaradas às áreas de que tratam as alíneas ‘a’ ção intempestiva de um documento
pelo proprietário, instaurado para e ‘d’ do inciso II, § 1º, deste artigo, não poderia gerar a presunção abso-
apurar se o valor de imposto pago não está sujeita à prévia comprova- luta de que as áreas caracterizadas
(ITR) foi correto diante das informa- ção por parte do declarante, ficando como reserva legal e de preservação
ções prestadas na DITR, vem sendo o mesmo responsável pelo pagamen- permanente não existe, sobretudo
constante as autuações que agentes to do imposto correspondente, com porque, se a própria lei determina que
da RFB vêm promovendo em vista de juros e multa previstos nesta Lei, caso o contribuinte NÃO está obrigado a
não reconhecerem essas áreas de fique comprovado que a sua decla- comprovar, previamente, que seu
não incidência, sem sequer produzir ração não é verdadeira, sem prejuí- imóvel possui áreas amparadas pela
um documento técnico sequer que zo de outras sanções aplicáveis.” isenção do ITR, não pode um instru-
pudesse contrariar os laudos técni- Nota-se, pois, que a declaração mento infralegal fazê-lo, como
cos elaborados por engenheiros do contribuinte, no sentido de que comumente vem sendo alegado pela
agrônomos apresentados nos proce- existe, em seu imóvel rural, alguma RFB ao sustentar seus atos com base
dimentos fiscalizatórios. daquelas áreas legalmente excluídas em decreto e portarias.
Nesse sentido, a despeito de ter do campo de incidência do ITR, como Por essas razões, sobretudo
procedido corretamente à declaração é o caso das áreas de preservação porque comprovada a efetiva existên-
e ao recolhimento do ITR apurado, permanente e reserva legal, ou sob cia e conservação de áreas que de-
considerando verdadeiramente as regime de servidão florestal ou veriam ser excluídas da base de cál-
áreas de preservação permanente e ambiental, NÃO depende de prévia culo do ITR (aquelas que, por lei, não
de reserva legal, o proprietário vem comprovação. integram o conceito de área tributável
sendo surpreendido com a lavratura Nesse sentido, existem diver- da propriedade rural), a autuação fis-
de auto de infração e notificação de sas decisões de nossos tribunais, cal não merece subsistir.
lançamento de imposto a pagar so- como por exemplo: STJ, 1ª Turma, Por fim, a RFB vem esquecen-
bre as áreas de não incidência, e pior, Rel. Min. Denise Arruda, REsp do-se de analisar o estimulo à prote-
sujeitando o autuado ao pagamento 812.104/AL; e 2ª Turma. Rel. Min. ção ambiental a determinadas áreas
de multa e juros moratórios. Eliana Calmon, REsp 665.123/PR; e que a regra de não incidência do ITR
Com relação a esse aspecto, TRF da 3ª Região, 3ª Turma, AMS nº procurou estabelecer, já que, se vem
que se refere à exclusão – pelo pró- 2003.61.02.014652-0/SP, Rel. Juiz autuando proprietários preocupados
prio contribuinte – de áreas que não Silvio Gemaque. em preservar áreas de interesse
estão sujeitas à tributação pelo ITR, ambiental, acaba por desestimulá-
Observa-se, pois, que o Poder
los, embora deva ficar bastante cla-
é importante que se faça o seguinte Judiciário já reconheceu que o ADA
ro, que o respeito a essas áreas deve
destaque: a Medida Provisória nº não é imprescindível para que o con-
ser absoluto, independente de isen-
1.956-53 trouxe, no ano de 2000, lou- tribuinte exclua, da base de cálculo
ção tributária, em vista do que está
vável disposição em favor dos con- do ITR, as áreas de preservação per-
previsto na legislação ambiental, prin-
tribuintes rurais, assegurando-os con- manente e de reserva legal.
cipalmente quanto às sanções crimi-
tra os desmedidos abusos então co-
Aliado ao fato de a exigência do nais e administrativas nos caso de
metidos pelo fisco. ADA para redução da base de cálcu- desrespeito a essas áreas.
Com a redação atribuída pela lo do ITR ser indevida, a sua não- (*) O autor é Advogado da Miguel
Medida Provisória nº 2.166-66/01, o apresentação, ou ainda, a sua apre- Neto Advogados Associados - SP.
§ 7º, do artigo 10, da Lei nº 9.393/96, sentação fora do prazo estabelecido (robertopc@mnadv.com.br)
No estudo que estamos efetuando sobre o inadimplemento de um direito pessoal, apresentamos o conceito de
mora, que é o descumprimento relativo desse tipo de direito.
Vimos na lição anterior algumas consequências da mora, a saber: as perdas e danos e seus dois componentes,
que são o dano emergente e os lucros perdidos.
Citamos, ainda, mais algumas consequências da mora: a incidência de juros, a correção monetária, as multas
(cláusula penal) e o sinal, ou arras.
Nessa menção, apenas sumária, podemos citar a exceção de contrato não cumprido:
Código Civil, art. 476 – “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contraentes, antes de cumprida a sua obrigação,
pode exigir o adimplemento da do outro.”
Algumas dessas consequências da mora serão objeto de um estudo mais detalhado.
Assim, no estudo das perdas e danos como consequência da mora, não poderemos deixar de abordar a questão
dos lucros cessantes.
Vimos na lição anterior as modalidades de perdas e danos, a saber: o dano emergente e os lucros perdidos.
Código Civil, art. 402 – “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidos ao credor,
abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.”
Como preleciona WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO, os danos se enquadram em duas classes: positivos e
negativos.
Os primeiros consistem numa real diminuição do patrimônio do credor da obrigação. No linguajar jurídico dizemos
que ele empobreceu.
Já os danos negativos consistem na privação de um ganho que o credor tinha o direito de esperar.
Em outras palavras: o dano, ou dano emergente, é o deficit no patrimônio do credor, a concreta redução por este
sofrida em sua fortuna.
Já o lucro cessante é o que esse credor razoavelmente deixou de auferir, em virtude do inadimplemento do deve-
dor.
Aqui faz-se necessário estabelecer o que seja um ganho razoável.
Trata-se de um valor a ser examinado em cada caso concreto, segundo o critério do juiz.
Observe-se que a apuração do dano é mais fácil que o conhecimento do valor dos lucros cessantes.
SÍLVIO DE SALVO VENOSA oferece o seguinte exemplo: Um motorista de táxi sofreu um abalroamento em seu
veículo.
Será indenizado pelo valor dos reparos (dano emergente).
Mas, a título de lucros cessantes, deve ser indenizado, de forma razoável, pelos dias em que não pôde trabalhar
com seu instrumento de trabalho.
A apuração dessa indenização por lucros cessantes levará em conta a féria razoável, média, comum, ordinária,
para os dias não trabalhados.
A cautela do juiz deve ser, de um lado, no sentido de não proporcionar uma vantagem ao credor, atribuindo-lhe um
pagamento acima daquilo que ele razoavelmente deixou de ganhar.
De outro lado, não pode o juiz minimizar a indenização a ponto de a tornar inútil.
(*) O autor é Advogado, Professor de Direito Imobiliário. Autor dos livros: Direito Imobiliário, Uma Abordagem
Didática, edição particular; Títulos de Crédito, Editora Plêiade; Contratos Mercantis, Editora Graph Press; Despesas
Ordinárias e Extraordinárias de Condomínio, Editora Juarez de Oliveira. Autor do curso a distância, por correspondên-
cia, sobre locação de imóveis, da empresa Diário das Leis. E-mail: jorgetarcha@jorgetarcha.com.br
1º DECÊNDIO ABRIL/2009 – Nº 10 BDI - BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO 11
JURISPRUDÊNCIA
JURISPRUDÊNCIA
SFH – MÚTUO HABITACIONAL – INADIMPLÊNCIA – EXECUÇÃO
EXTRAJUDICIAL – EXTINÇÃO DO CONTRATO (STJ)
Recurso Especial nº 886.150 - PR (2006/0160511-1) RELATÓRIO
Relator: Ministro Francisco Falcão O Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão: A Caixa Eco-
Recorrente: Caixa Econômica Federal - CEF nômica Federal interpõe o recurso vertente, com arrimo
na alínea “c” do permissivo constitucional, visando à re-
Recorrido: José Vatiro Kimura e outro forma de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Fede-
EMENTA ral da 4ª Região, que restou ementado nestes termos:
SFH. Mútuo habitacional. Inadimplência. Execu- “SFH. Cautelar e Ação revisional de contrato. Carta
ção extrajudicial. Decreto-lei nº 70/66. Adjudicação do de arrematação averbada no cartório de imóveis. Carên-
imóvel. Extinção do contrato de financiamento imobi- cia de ação não caracterizada.
liário. Propositura de ação. Ausência de interesse pro- O encerramento da execução extrajudicial não re-
cessual. presenta a impossibilidade do mutuário discutir, em juízo,
I - Diante da inadimplência do mutuário, foi ins- os critérios de correção da dívida, reclamando, inclusive,
taurado procedimento de execução extrajudicial com a devolução de valores pagos a maior.
respaldo no Decreto-lei nº 70/66, tendo sido este con- Sentença cassada” (fl. 273).
cluído com a adjudicação do bem imóvel objeto do
contrato de financiamento. Defende a recorrente dissentir tal aresto daquele outro
proferido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região,
II - Propositura de ação pelos mutuários, posteri- quando do julgamento da AC n. 1999.01.00.061148-8/PI,
ormente à referida adjudicação do imóvel, para dis- ao argumento de que “ao se deparar com um pedido
cussão de cláusulas contratuais, com o intuito de res- revisional de contrato extinto, a E. Corte prolatora do
sarcirem-se de eventuais pagamentos a maior. acórdão paradigma manifestou sua contrariedade à revi-
III - Após a adjudicação do bem, com o conseqüen- são do pacto após a respectiva extinção, ocasionada pela
te registro da carta de arrematação no Cartório de Re- adjudicação havida em procedimento de execução
gistro de Imóveis, a relação obrigacional decorrente do extrajudicial”.
contrato de mútuo habitacional extingue-se com a Ainda, afirma que “o ato de alienação do imóvel atra-
transferência do bem, donde se conclui que não há in- vés do procedimento de execução extrajudicial previsto
teresse em se propor ação de revisão de cláusulas pelo Decreto-lei n. 70/66 sepulta a relação obrigacional
contratuais, restando superadas todas as discussões com fonte no contrato de mútuo”.
a esse respeito.
Entende, pois, existir dissídio interpretativo acerca do
IV - Ademais, o Decreto-lei nº 70/66 prevê em seu conteúdo dos arts. 3º e 267, VI, do CPC, afirmando ser
art. 32, § 3º, que, se apurado na hasta pública valor notória a falta de interesse de agir dos autores ao propo-
superior ao montante devido, a diferença final será rem ação revisional de cláusulas do mútuo habitacional
entregue ao devedor. após a adjudicação extrajudicial do imóvel objeto do con-
V - Recurso especial provido. trato extinto.
ACÓRDÃO É o relatório.
Vistos e relatados os autos em que são partes as VOTO
acima indicadas, decide a Primeira Turma do Superior O Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator): Te-
Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao nho como satisfeitos os requisitos de admissibilidade
recurso especial, na forma do relatório e notas recursal, pelo que conheço do apelo nobre.
taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo A recorrente sustenta existir dissídio interpretativo
parte integrante do presente julgado. Os Srs. Ministros acerca dos arts. 3º e 267, VI, do CPC, com julgado do
Luiz Fux, Teori Albino ZavasckI e Denise Arruda votaram Tribunal Regional Federal da 1ª Região, pelo qual:
com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o
Sr. Ministro José Delgado. Custas, como de lei. “Processual Civil - Ação ordinária - Contrato - SFH -
Adjudicação do imóvel extrajudicial - Inadimplência - Am-
Brasília (DF), 19 de abril de 2007 pla defesa e contraditório - Decreto lei nº 70/66 -
Ministro Francisco Falcão, Relator Constitucionalidade - Apelação improvida.
1 - O regular procedimento administrativo de execu- que não há mais qualquer interesse processual para qual-
ção extrajudicial, instaurado com base no Decreto-lei 70/ quer das ações ora em julgamento” (fls. 231/232).
66, não afronta os princípios de ampla defesa e do con- Posteriormente, o Juiz Singular procedeu ao exame
traditório. da regularidade do procedimento executivo extrajudicial
2 - Consumada a alienação do imóvel, torna-se im- levado a cabo, entendendo pela higidez da referida exe-
pertinente o questionamento relativo ao reajuste e a for- cução (cf fls. 234).
ma de pagamento das prestações da casa própria (SFH), A controvérsia reside, pois, em se vislumbrar (ou não)
questão que pode ser suscitada judicialmente, porém, remanescente o interesse de agir dos mutuários que, a
antes do leilão do imóvel. despeito de regularmente avisados do trâmite da execu-
3 - É pacífico o reconhecimento da constitucionalidade ção extrajudicial do mútuo habitacional em razão de sua
do Decreto-lei nº 70/66. Precedentes do STF, STJ e TRF’s. inadimplência, decidem ajuizar ação para discutir as
4 - Recurso improvido.” clausulas do referido contrato.
Do inteiro teor do referido paradigma, merece desta- Sabe-se que o interesse processual “se
que o seguinte excerto: consubstancia na necessidade de o autor vir a juízo e na
utilidade que provimento jurisdicional poderá lhe propor-
“...inoportuno o momento para a Apelante rebelar-se cionar” (NERY JR, Nelson e NERY, Rosa Maria de
contra o alegado descumprimento do contrato pelo agen- Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 7ª ed.
te financeiro, pois tomou conhecimento da instauração do revista e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003,
procedimento de execução extrajudicial e nada providen- p. 329).
ciou. Descabida a discussão após a adjudicação do imó-
vel.” Na hipótese em estudo, tem-se que os autores so-
mente após a conclusão do processo executivo
O acórdão ora hostilizado, todavia, entendeu persis- extrajudicial, ou seja, depois de adjudicado o imóvel, in-
tir o interesse de agir dos autores nos seguintes termos: gressaram com ação para discutir as cláusulas do contra-
“...tenho que o fato de ter sido concluído o procedi- to de financiamento habitacional.
mento de que trata o Decreto-Lei nº 70/66, ora reputado O acórdão recorrido vislumbrou a existência de inte-
constitucional, com a expedição da carta de arrematação resse de agir na medida em que, discutidas as cláusulas
em favor dos atuais proprietários do imóvel e averbação do mútuo, se verificados pagamentos efetuados a maior,
de dita carta no Cartório de Imóveis antes do ajuizamento poderiam os autores pleitear por sua repetição.
da ação principal, não elide a possibilidade dos mutuários
ingressar (sic) em juízo para discutir a regularidade do Já o julgado paradigma assere a inexistência do in-
procedimento extrajudicial levado a efeito pelo agente fi- teresse de agir da parte, visto que uma vez concluída a
nanceiro e também questionar os critérios de reajuste das execução extrajudicial do imóvel objeto do contrato de
prestações de demais encargos de financiamento, recla- mútuo habitacional, o que significa que o contrato em si
mando, inclusive, a restituição das importâncias pagas a teria sido extinto, não há por que discutir suas cláusulas.
maior” (fl. 271). Tenho que o melhor direito encontra-se no entendi-
Ocorre que a r. sentença entendera pela carência de mento sufragado pelo acórdão paradigma.
ação apenas no que se referia ao pedido de revisão de Com efeito, o imóvel financiado fora levado à execu-
cláusulas contratuais, visto que ajuizada a actio posterior- ção extrajudicial prevista pelo Decreto-lei nº 70/66 diante
mente à execução extrajudicial do bem financiado, estan- da inadimplência dos mutuários, o que se encontrava de-
do, assim, extinto o contrato, confira-se: vidamente previsto no contrato por eles firmado (cf sen-
“A Caixa Econômica Federal argüiu, preliminarmen- tença à fl. 234).
te, falta de interesse processual dos autores, pois o bem Os mutuários recorridos teriam deixado transcorrer
imóvel dado em garantia hipotecária por ocasião da ob- todo o procedimento executivo do Decreto-lei nº 70/66,
tenção do financiamento já foi arrematado em leilão públi- até o seu termo, com a adjudicação do bem a terceiro,
co por José Kijiro Tsuji. bem como com a transcrição da Carta de Arrematação no
Com razão a ré. Constata-se que o imóvel já foi arre- Registro de Imóveis, para somente aí proporem ação com
matado por José Kijiro Tsuji, que nele já residia na condi- o objetivo de discutir as cláusulas contratuais, sob a
ção de locatário, tendo sido a Carta de Arrematação presunção de que haveriam realizados pagamentos a
expedida em 18 de outubro de 1999 (fls. 104/108). maior.
Dessa forma, com a arrematação do bem, teve fim o Ora, a execução extrajudicial somente se operou em
contrato de mútuo e perdeu o objeto a cautelar, de modo função da inadimplência dos mutuários e, apesar de de-
A execução deve recair então sobre o antigo proprie- Ante o exposto, deram provimento ao recurso.
Depois, citando arestos dos Egrégios Tribunais de priado, sem a necessidade do pagamento prévio e inte-
Alçada de São Paulo, conclui: gral (negritus nosso) da indenização, eis que tal providên-
cia só se aplica no caso de indenização final que precede
“Observa-se, portanto, que o referido Tribunal paulista
a transferência definitiva do domínio” (STF-RT 747/191).
considerou válido o estabelecimento de indenização pe-
las perdas e danos e lucros cessantes, no feito A necessidade de inspeção judicial, nesse caso, de-
expropriatório, desde que devidamente comprovados no verá ser analisada em fase oportuna, quando da realiza-
curso da ação” (Ob. Cit. “A Desapropriação à Luz da Dou- ção da perícia definitiva do bem e não neste momento,
trina e Jurisprudência”, págs. 517/519, 5ª ed.). como querem os expropriados.
Assim sendo, ainda que subsistente a inclusão no Quanto às despesas com desmonte do maquinário
valor da indenização a ser paga aos expropriados do cor- e, conseqüentemente, daquelas necessárias à mudança
desse maquinário, como expressamente admitido pela
respondente ao fundo de comércio, não é no momento da
expropriante em sua manifestação acerca do laudo provi-
imissão provisória na posse que deve ser aferido o res-
sório (fls. 209 vº), deverão ser feitas às suas expensas,
pectivo montante.
não prosperando, por isso, também quanto a este tópico,
Nesse sentido: o inconformismo dos agravantes.
“É constitucional o disposto no artigo 15 do Dec.-Lei Destarte, pelo meu voto, nego provimento ao recur-
3.365/41, que admite, em casos de urgência, a imissão so, para que seja dado regular cumprimento ao mandado
provisória na posse pelo poder público no imóvel expro- de imissão na posse.
na notificação enviada em 10 de novembro de 1999. Sus- cientemente. Assim, tendo desatendido à notificação para
tenta que a apelada deixou de pagar os aluguéis vencidos desocupar os espaços acima descritos, sua posse tor-
em dezembro de 1999 e janeiro de 2000, infringindo a nou-se precária, autorizando a utilização da ação de rein-
cláusula 7ª do contrato que prevê que, em caso de mora, tegração (fls. 29/30). Ressalte-se, a esse respeito, que a
é possível promover a reintegração de posse e cobrar a apelada se comprometeu a desocupar os espaços antes
multa de 20%. Por isso, requer a reforma da r. sentença. de decorrido o prazo de trinta dias previsto na cláusula 2,
Recurso contrariado (fls. 139/146). § 1º do contrato de locação, caso tal conduta fosse ne-
cessária para que a Souza Cruz S/A cumprisse suas obri-
É o relatório.
gações perante o Shopping Paulista (fls. 20, cláusula 2, §
A recorrente firmou com MPK Administração e Ser- 2º).
viços Ltda. contrato de cessão de uso de espaços das
E não poderia ser de outro modo, uma vez que a
áreas comuns do Shopping Paulista e do West Plaza, para
própria apelante já não tinha mais direitos sobre os espa-
viger no período compreendido entre 1º de abril de 1998 e
ços, dado o término do contrato de cessão de uso firma-
31 de março de 1999. Por meio do referido instrumento,
do com a MPK Administração e Serviços S/C Ltda. Tanto
assumiu a obrigação de pagamento de R$ 127.944,00
assim é que a recorrente também foi intimada para
(cento e vinte e sete mil, novecentos e quarenta e quatro
desocupá-los, sob pena de pagamento de multa diária (fls.
reais), como remuneração pela possibilidade de divulgar
26/27).
sua marca e comercializar seus produtos dentro dos es-
paços internos dos shoppings supramencionados (fls. 24/ A cobrança das prestações vencidas em dezembro
25). de 1999 e janeiro de 2000 não merece prosperar. Foram
juntados aos autos os comprovantes de depósito bancá-
Por outro lado, a apelante também firmou com Maria
rio relativos a tais parcelas (fls. 108). E o contrato ressal-
Rosemeire de Aguiar Tabacaria ME um contrato de loca-
va expressamente a possibilidade de pagamento dos alu-
ção de dois quiosques, com 2,3 metros quadrados, loca-
guéis mediante depósito em conta bancária (fls. 21; cláu-
lizados no Shopping Paulista, e previsto para viger no pe-
sula 6, parágrafo único). Assim, não tendo a apelante se
ríodo de 1º de abril de 1998 a 31 de março de 1999 (fls.
desincumbido de comprovar que o pagamento era realiza-
20/23). Por meio de tal contrato, a apelada se obrigou ao
do de outra forma, não há que se cogitar de inadimplência.
pagamento da quantia de R$ 866,00 (oitocentos e ses-
senta e seis reais) mensais (fls. 21; cláusula 6). Compro- Por fim, o contrato previa que o pagamento deveria
meteu-se, ainda, a proceder à venda e veiculação de ser feito todo dia 05 do mês seguinte ao vencido (cláusula
merchandising de produtos da apelante, com exclusivida- 6; fls. 21). O depósito referente a dezembro de 1999 foi
de (fls. 21; cláusula 4). realizado no dia 6, uma vez que o dia anterior era um
domingo, estando, portanto, correto. Já os encargos da
A recorrente afirma, em sua petição inicial, que o
mora deverão incidir sobre o pagamento relativo ao mês
contrato de locação dos quiosques está vinculado a um
de janeiro de 2000, que só foi feito no dia 10 (fls. 108, doc.
contrato verbal de comodato, que tem por objeto o uso
2).
dos espaços na área interior e comum do shopping. O
comodato, por sua vez, só teria vigência enquanto tam- Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a ação
bém estivesse em vigor o contrato de cessão de uso fir- para reintegrar a autora na posse dos quiosques locados,
mado entre ela e a MPK Administração e Serviços S/C bem como para condenar a apelada ao pagamento da
Ltda. Fundamenta sua pretensão no artigo 8º do contrato multa de 20% sobre a quantia de R$ 866,00 (oitocentos e
de locação dos quiosques, o qual estabelece que “o pre- sessenta e seis reais), corrigida monetariamente de acor-
sente contrato está vinculado ao contrato de comodato, do com a Tabela Prática do Tribunal de Justiça e acresci-
firmado entre as partes, tendo por objeto o espaço onde da de juros de 1% ao mês, ambos contados a partir do
se encontra instalado o móvel ora locado”. Em resumo, vencimento, qual seja, o dia 05 de janeiro de 2000. Dada
as partes teriam realizado dois contratos: um verbal, rela- a sucumbência mínima da apelante, condeno a apelada
tivo ao comodato do espaço; e outro escrito, referente à ao pagamento das custas, despesas processuais e hono-
locação dos quiosques. rários advocatícios fixados em R$ 600,00 (seiscentos re-
ais), com fundamento no artigo 20, § 4º do Código de Pro-
Depreende-se, portanto, que a apelada tinha plena
cesso Civil.
ciência da vinculação do contrato de locação dos quios-
ques com o comodato, tanto que a ela anuiu livre e cons- É meu voto.
Recorrente: Francisco Xavier Piccolotto Naccarato e As partes apelaram. O autor, pleiteando a inclusão
outro na condenação das parcelas vincendas, com base no ar-
tigo 290 do Código de Processo Civil. E os réus, por sua
Recorrido: Condomínio Edifício Center Plaza vez, visando a anulação do decisum monocrático, por
EMENTA cerceamento de defesa. A colenda Nona Câmara do Tri-
Recurso Especial - Ação de cobrança - Taxas bunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo deu parcial
condominiais - Critério de rateio expresso na conven- provimento ao recurso do autor e negou o apelo dos réus,
ção - Conformidade com a Lei 4.591/64 - Validade - nos termos da seguinte ementa:
Recurso não conhecido. “Cobrança – Despesas de condomínio – Reforma de
1 - A teor da jurisprudência desta Corte, havendo elevadores – Contradição acerca de provas – Falta de
disposição expressa na Convenção Condominial a res- suma da contestação – Nulidades não caracterizadas –
peito do critério de rateio das despesas comuns, em Preliminar rejeitada – Responsabilidade pelas despesas
conformidade com o disposto no artigo 12, § 1º, da – Reconhecimento – Pavimentos de estacionamentos que
Lei 4.591/64, aquela deve ser observada. são unidades condominiais – Mantida a r. sentença, mas
com a inclusão das prestações vincendas, por força do
2 - Recurso não conhecido. art. 290 do CPC – Negado provimento ao recurso e provi-
ACÓRDÃO do, em parte, o recurso do autor.” (fl. 182).
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam No presente Recurso Especial, interposto com fun-
os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal damento exclusivo na alínea “a” do permissivo constituci-
de Justiça, na conformidade dos votos e das notas onal, sustenta-se que, tendo sido solicitada a produção
taquigráficas a seguir, por unanimidade, em não conhe- de provas a respeito da completa ausência de utilidade
cer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, dos elevadores para os pavimentos onde se situam as
com quem votaram os Srs. Ministros César Asfor Rocha garagens de propriedade dos recorrentes e, por conse-
e Aldir Passarinho Júnior. guinte, de inviabilidade da cobrança, não poderia a ins-
Brasília, DF, 16 de fevereiro de 2006. tância ordinária julgar antecipadamente a lide – indeferin-
do as provas requeridas – para acolher a pretensão. As-
Ministro Jorge Scartezzini , Relator
sim, aduzem, para tanto, violação aos artigos 130, 330, I,
RELATÓRIO e 332, todos do Código de Processo Civil.
O Exmo. Sr. Ministro Jorge Scartezzini (Relator): In- Contra-razões apresentadas às fls. 244/253.
fere-se dos autos que Condomínio Edifício Center Plaza
Inadmitido o recurso pelo Tribunal de origem, foi in-
ajuizou Ação de Cobrança, em desfavor de Francisco
terposto, então, agravo de instrumento, que, por sua vez,
Xavier Piccolotto Naccarato e José Paulo Piccolotto restou provido para determinar a subida dos autos para
Naccarato, objetivando o pagamento pelos réus – propri-
essa Corte, vindo-me conclusos.
etários do 4º, 5º, 6º e 7º pavimento – das despesas de
É o relatório.
reforma dos elevadores vencidas e não pagas, relaciona-
VOTO
das ao período compreendido entre abril/1999 a feverei-
ro/2000. O Exmo. Sr. Ministro Jorge Scartezzini (Relator):
Senhores Ministros, como relatado, insurgem-se os re-
Em contestação, os réus alegaram que os elevado- correntes, com fundamento na alínea “a” do permissivo
res objeto de reforma não lhes ofereciam nenhuma utili- constitucional, alegando, em síntese, cerceamento de
dade, porquanto sem comunicação com os pavimentos defesa no indeferimento, pelas instâncias ordinárias, de
onde se situam as respectivas garagens. Ao final, reque- produção de provas a respeito da completa ausência de
reram a produção de prova testemunhal e pericial. utilidade dos elevadores para os pavimentos onde se si-
O douto juízo de primeiro grau, julgando antecipada- tuam as garagens de propriedade dos recorrentes e, por
mente a lide, acolheu o pedido, condenando os réus a conseguinte, de inviabilidade da cobrança. Em razão dis-
pagarem a quantia correspondente a R$ 7.933,19 (sete so, aduzem violação aos artigos 130, 330, I, e 332, todos
mil, novecentos e trinta e três reais, e dezenove centa- do CPC, que rezam respectivamente, verbis:
“Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento ficar esclarecido que as vagas nas garagens coletivas não
da parte, determinar as provas necessárias à instrução poderão ser alienadas, por não se constituírem unidade
do processo, indeferindo as diligências inúteis ou mera- autônoma, salvo os casos de alienação juntamente com
mente protelatórias. a unidade autônoma. Já no tocante às garagens dos pavi-
Art. 330. O juiz conhecerá diretamente do pedido, mentos 4º ao 7º, contrariamente, a convenção, no art. 50,
proferindo sentença: estabeleceu que poderão ser elas alienadas independen-
temente de o adquirente ser condômino, em evidente clas-
I – quando a questão de mérito for unicamente de sificação dos estacionamentos do 4º ao 7º pavimentos
direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessi- como unidades autônomas.” (fls. 184/185)
dade de produzir prova em audiência.
Assim, posta a questão nestes termos, correta a
Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moral- responsabilização dos ora recorrentes pelas despesas em
mente legítimos, ainda que não especificados neste Có- questão, porquanto em conformidade com a jurisprudên-
digo, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que cia desta Corte. A propósito:
se funda a ação ou a defesa.”
“Condomínio. Loja térrea com acesso independente.
O recurso não merece prosperar. Cotas condominiais. Critério de rateio expresso na con-
Com efeito, inicialmente importa salientar que, para venção de condomínio. Validade.
se apreciar a conveniência ou não no indeferimento de - Havendo disposição expressa na convenção de
provas pelas instâncias ordinárias, seria necessário a in- condomínio, estabelecendo o critério de rateio dos encar-
cursão na seara fática, o que é inviável em sede de Re- gos condominiais ordinários, prescindível é que haja ou-
curso Especial (Súmula 07/STJ). tra regra específica obrigando o proprietário da loja térrea
De outro lado, tal circunstância não assume relevo a arcar com essas despesas.
quando a jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido Recurso especial conhecido, mas improvido.” (REsp
de que, havendo disposição expressa na Convenção 537.116/RS, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ de 05/
Condominial a respeito do critério de rateio das despesas 12/05)
comuns, em conformidade com o disposto no artigo 12, §
1º, da Lei 4.591/64, aquela deve ser observada. “Civil. Condomínio. Convenção aprovada e não re-
gistrada. Obrigatoriedade para os condôminos. Preceden-
Ao que se extrai dos autos, o Tribunal local, tratando tes. Loja autônoma. Despesas comuns. Critério de rateio
do assunto, ressaltou que houve fixação, pela convenção expresso na convenção, conforme art. 12, § 1º, lei 4.591/
condominial, da responsabilidade de todos os condôminos 64. Validade. recurso não conhecido.
pelas despesas dos elevadores, inclusive de reforma, vale
dizer, não houve qualquer isenção quanto a tais encargos I – A convenção de condomínio aprovada e não re-
em favor das unidades pertencentes aos recorrentes. gistrada tem validade para regular as relações entre as
Nesse particular, disse o acórdão hostilizado, verbis: partes, não podendo o condômino, por esse fundamento,
recusar-se ao seu cumprimento.
“No caso, consoante a documentação existente nos
autos, devem os réus responder pelo pagamento dos va- II – É livre a estipulação do critério de rateio das des-
lores cobrados. pesas comuns, pela convenção de condomínio, nos ter-
mos do art. 12 da Lei 4.591/64.
(...) da leitura da convenção condominial, não se vê
III – A verificação da aprovação ou não da conven-
a exclusão da responsabilidade propugnada pelos réus.
ção pelo mínimo de dois terços dos condôminos implica
Os elevadores pertencem ao edifício. A manutenção do
em reexame de provas, vedado a esta instância, nos ter-
prédio, sobretudo do topo exige a utilização dos elevado-
mos do enunciado nº 7 da súmula/STJ.
res. No 18º pavimento, encontra-se a caixa d’água, que
serve a todos, inclusive os proprietários dos estaciona- IV – A simples transcrição de ementas não é sufici-
mentos do 4º ao 7º pavimentos. Todos os condôminos ente para a caracterização da divergência jurisprudencial.”
devem contribuir para as despesas dos elevadores, inclu- (Resp 128.418/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,
sive de reforma. Aliás, como proprietários dos 4º ao 7º DJ de 13/09/99)
pavimentos, incabível qualquer cogitação de que não se- “Civil – Unidade condominial não sujeita às taxas
riam condôminos. A indicação de unidades autônomas cer- gerais.
tamente inclui os proprietários dos estacionamentos. Não I – A jurisprudência e a doutrina firma entendimento
há outra possibilidade de se entender o preceituado no no sentido de que a unidade condominial com acesso di-
art. 41 da Convenção. reto à via pública não está sujeita às taxas gerais atinentes
Importante ver que houve necessidade de, no art. 46, aos demais apartamentos, salvo se a convenção dispõe
2. Em sua petição inicial, afirmou o autor que a loca- em mora também com relação à cláusula penal, que era
ção foi contratada pelo prazo de trinta meses e teve início exigível desde logo.
em 1º de janeiro de 1998. Entretanto, em 21 de dezembro Ora, verificado o inadimplemento de ambas as obri-
do mesmo ano, estando o locatário a dever aluguéis e gações pecuniárias, sobre os respectivos valores devem
encargos e já proposta a ação de despejo, acabou ele por ser computados os juros de mora de 1% ao mês, nos
desocupar o imóvel. precisos termos do artigo 1.064 do Código Civil de 1916
Como deixou de atender ao pagamento de obriga- (art. 407 do atual).
ções e da multa por infração contratual, pleiteou o autor a Bem é de ver, ademais, que a correção monetária
condenação respectiva. nada acrescenta ou tira, apenas mantém o valor da dívi-
Desde logo, impõe-se observar que a restituição das da, de modo a afastar os efeitos da inflação. Traduz, en-
chaves se deu depois de praticamente concluído o perío- fim, o mesmo valor, e por assim ser, é evidente que a
do de doze meses, o que determina o reconhecimento de base de cálculo da multa e dos juros só pode ser o mon-
que houve parcial cumprimento do contrato, determinan- tante corrigido. Pensar de modo diverso seria admitir in-
do a redução proporcional do valor da multa fixada na clá- justo locupletamento, pois deveria o credor obter a exata
usula 11ª do contrato, nos termos do artigo 4º da Lei nº satisfação do seu direito.
8.245/91. Simples análise do demonstrativo apresentado pelo
Entretanto, verifica-se que o valor pleiteado é de R$ credor permite reconhecer que o critério adotado foi exa-
2.561,99, que é exatamente proporcional ao período res- tamente esse, não havendo razão para falar em excesso
tante da locação, ou seja, dezoito meses. Portanto, o lo- de cobrança. Não existe, como claramente se percebe,
cador cobra valor em estrita conformidade com os termos uma situação de bis in idem, como afirmam os apelantes,
do mencionado dispositivo legal, não havendo qualquer pois são verbas distintas incidindo em virtude de previsão
lesão ao direito dos apelantes. legal e contratual.
Superado esse ponto, verifica-se que os apelantes Diante dessas evidências, não há razão para falar
não questionam a existência da dívida, discutindo apenas em cerceamento de defesa, uma vez que se mostrava
os encargos pretendidos. desnecessário qualquer outro complemento probatório
De acordo com o contrato, em caso de inadimplência, (art. 330, I, do CPC). A verificação do conteúdo do de-
são devidos os juros de 1% ao mês e multa de 20%, afora monstrativo não depende de conhecimento técnico espe-
a correção monetária. cializado, de modo que não se justifica a pretendida reali-
A incidência da multa ocorre em virtude da zação de prova pericial, de todo desnecessária (art. 420,
inadimplência, como forma de reparar os danos daí decor- parágrafo único, inciso I, do CPC).
rentes. Por se tratar de cláusula penal moratória, a sua Aliás, tinham os apelantes o ônus de apresentar de-
aplicação é cumulativa. Bem observa Orlando Gomes que, monstrativo com a precisa indicação de suas eventuais
“além do cumprimento da obrigação principal, tem o credor divergências a respeito da forma de calcular as verbas, o
o arbítrio de exigir do devedor que também lhe pague a que deveria ser apresentado com a contestação, e não
indenização prefixada na cláusula. Há, portanto, acrésci- ocorreu.
mo no seu direito de crédito, não tendo a indenização cará- Quanto aos honorários advocatícios, apresenta-se
ter substitutivo, mas, simplesmente, complementar”(1). perfeitamente razoável e adequado o arbitramento efetu-
Assim, no caso em exame, configurada a mora do ado, não existindo razão para acolher o pleito de redução.
devedor nos respectivos vencimentos das prestações (art. Vale destacar que o montante de 15% sobre o débito é
1.056 do Código Civil de 1916, art. 389 do atual), nesse perfeitamente condizente com o trabalho desenvolvido e
momento nasceu a obrigação de efetuar o pagamento da até mesmo com a atuação na via recursal, guardando ple-
multa moratória respectiva. Isto é, o valor do principal pas- na conformidade com o artigo 20, § 3º, do CPC.
sou a ser acrescido do percentual relativo à indenização Enfim, não comporta acolhimento o inconformismo,
dos prejuízos decorrentes do inadimplemento culposo. portanto, devendo prevalecer a solução determinada pela
Desse modo, o cálculo deve compreender a r. sentença.
somatória do valor do principal e da respectiva indeniza-
3. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
ção, que já deveriam ter sido pagos no dia imediatamente
seguinte ao do vencimento. Por isso, incorreu o devedor (1) “Obrigações”, nº 187, p. 189, Forense.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apela- fim de manter a recusa do Oficial em registrar o título,
ção Cível nº 848-6/1, da Comarca de Campinas, em que devido à não apresentação de formal de partilha extraído
é apelante Francisco de Assis Campos Guerra e apelado dos autos do inventário em que se deu a adjudicação re-
or da Magistratura, por votação unânime, em negar provi- interessado Francisco de Assis Campos Guerra,
mento ao recurso, de conformidade com os votos do tempestivamente, o presente recurso. Sustenta que o auto
Desembargador Relator e do Desembargador Revisor que de adjudicação apresentado ao Oficial Registrador é títu-
ficam fazendo parte integrante do presente julgado. lo hábil para ingresso no registro imobiliário, por se tratar
de ordem judicial expedida nos autos do inventário dos
Participaram do julgamento, com votos vencedores,
bens deixados pelo falecimento do pai da cedente dos
os Desembargadores Roberto Vallim Bellocchi, Presiden-
direitos hereditários, única herdeira do de cujus. Assim,
te do Tribunal de Justiça e Jarbas Mazzoni, Vice-Presi-
segundo entende, o título encontra-se entre aqueles
dente do Tribunal de Justiça.
elencados na Lei n. 6.015/1973 como passíveis de ingres-
São Paulo, 1º de julho de 2008. so no fólio predial, não havendo, por outro lado, com o
Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator registro pretendido, qualquer ofensa ao princípio da conti-
nuidade registral, já tendo sido recolhido o imposto de
VOTO
transmissão inter vivos (fls. 39 a 42).
Registro de Imóveis. Dúvida julgada procedente.
A Douta Procuradoria Geral da Justiça manifestou-
Negativa de acesso ao registro de auto de adjudica-
se no sentido de ser negado provimento ao recurso (fls.
ção de bem imóvel lavrado em processo de inventá-
47 a 49). É o relatório.
rio. Documento que não corporifica título passível de
ingresso no fólio real Inteligência do disposto no art. O Apelante pretende o registro de auto de adjudica-
221, IV, da Lei n. 6.015/1973. Exigência, ainda, de com- ção de bem imóvel matriculado sob n. 40.466 no 1º Re-
provação do recolhimento do ITCMD, à luz das nor- gistro de Imóveis de Campinas, lavrado nos autos do pro-
mas dos arts. 1.027, IV, e 1.031, § 2º, do CPC, a menos cesso de inventário dos bens deixados pelo falecimento
que nos autos do inventário tal imposto não tenha sido de Graciano Horta Lisboa, a partir de escritura pública de
considerado devido na hipótese. Recusa mantida. Re- cessão dos direitos sobre referido bem, em que figurou
curso não provido. como outorgante a herdeira Maria da Graça Horta Lisboa
(fls. 10 a 12).
Cuidam os autos de dúvida de registro de imóveis
suscitada pelo Primeiro Oficial de Registro de Imóveis da A recusa manifestada pelo Oficial Registrador mere-
Comarca de Campinas, a requerimento de Francisco de ce ser prestigiada, pois que fundada em motivos legíti-
Assis Campos Guerra, referente ao ingresso no registro mos.
predial de auto de adjudicação do imóvel objeto da matrí- Com efeito, nos termos do art. 221, IV, da Lei n. 6.015/
cula n. 40.466 da referida serventia, recusado pelo regis- 1973, são admitidos a registro, como títulos extraídos de
trador. Após regular processamento, com impugnação por autos judiciais, as cartas de sentença, os formais de par-
parte do interessado e manifestação do representante do tilha, as certidões e os mandados. Trata-se de rol taxativo,
que não admite ampliação, de sorte que não se pode ad- Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator
mitir o ingresso no registro de qualquer outro título estra- VOTO
nho ao aludido catálogo legal (Walter Ceneviva, Lei dos
1. Trata-se de apelação interposta contra sentença
Registros Públicos Comentada. 18ª ed. São Paulo: Sarai-
que julgou procedente dúvida e manteve recusa de regis-
va, 2008, p. 502), como o pretendido auto de adjudicação.
tro de auto de adjudicação.
Observe-se que, diversamente do sustentado pelo
Recorre o apelante, aduzindo, em síntese, que o auto
Recorrente, auto de adjudicação não se confunde com
de adjudicação apresentado ao Oficial Registrador é títu-
mandado, este sim passível de registro. O auto, no caso,
lo apto para se ingressar no registro imobiliário, pois, tra-
nada mais é do que o registro escrito nos autos do pro-
ta-se de ordem judicial expedida nos autos do inventário
cesso de um ato praticado (a adjudicação), não conten-
dos bens deixados pelo falecimento do pai da cedente
do, em si, ordem de qualquer natureza emitida pelo ma-
dos direitos hereditários, única herdeira do de cujus.
gistrado. Já o mandado é uma ordem ou determinação
Destarte, conforme seu entendimento, o título encontra-
escrita emanada da autoridade judicial para que se faça
se no rol da Lei nº 6.015/1973 como passível de ingresso
ou se deixe de fazer alguma coisa.
no fólio predial, não havendo qualquer ofensa ao princípio
Considere-se, ainda, no ponto, que título suscetível da continuidade com o registro pretendido, já que recolhi-
de ingressar no fólio real, na espécie, seria o formal de do o imposto de transmissão inter vivos.
partilha expedido nos autos do inventário, se existissem
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo
vários bens inventariados, além daquele cujos direitos fo-
improvimento do recurso.
ram cedidos ao Recorrente, ou, então, a carta de adjudi-
cação, se não existissem outros bens inventariados ou se É a síntese do necessário.
adjudicado o bem em favor do beneficiário antes da expe- O recurso não comporta acolhimento.
dição do formal de partilha; nunca, porém, o auto de adju-
Com efeito, o artigo 221, inciso IV, da Lei nº 6.015/
dicação.
1973, trata-se de rol taxativo, que não admite ampliação,
Assim, não estando o auto de adjudicação em ques- de modo que não se admite o ingresso no registro de qual-
tão entre os títulos discriminados na lei como passíveis quer outro título estranho ao referido elenco legal, como o
de ingresso no fólio real, impõe-se reconhecer que, na pretendido auto de adjudicação.
hipótese, falta título hábil para autorizar o registro.
Assim, no caso em questão, falta título hábil para
Por outro lado, correta, também, a exigência do Ofi- autorizar o registro, pois, o auto de adjudicação não está
cial Registrador no tocante à comprovação do recolhimen- entre os títulos discriminados na lei como passíveis de
to do ITCMD, já que, nos termos dos arts. 1.027, IV, e ingresso no fólio real.
1.031, § 2º, do CPC, tanto para a expedição do formal de
Outrossim, no que concerne à exigência do Oficial
partilha quanto para a expedição da carta de adjudicação,
Registrador quanto a comprovação do recolhimento do
impõe-se o prévio recolhimento dos impostos devidos e,
ITCMD, também lhe assiste razão, visto que, nos termos
em princípio, do imposto de transmissão causa mortis. A
dos artigos 1.027, inciso IV e 1.031, § 2º, ambos do Códi-
menos que, nos autos do inventário, não tenha sido con-
go de Processo Civil, se impõe de antemão o recolhimen-
siderado devido, na hipótese, o imposto em questão, o
to dos impostos devidos.
que igualmente deve ser comprovado.
Desse modo, nega-se provimento ao recurso.
Como se pode perceber, correta se mostram a res-
peitável sentença apelada e a recusa manifestada pelo 2. Recurso improvido. Registro inviável. Título não
Oficial Registrador. passível de ingresso no fólio real. Exigência de recolhi-
mento do ITCMD.
Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto,
nego provimento ao recurso. Jarbas Mazzoni, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça
1. INTRODUÇÃO
Os princípios são os alicerces de todo ordenamento jurídico. É através deles que são formuladas regras básicas e
gerais, sob as quais se extraem normas de procedimento para a compreensão de um determinado sistema jurídico. A
conduta de um agente aplicador de direito deve estar sempre amparada pelos princípios vigentes nos mais diversos
segmentos jurídicos.
A tarefa de aplicar o direito não se restringe única e exclusivamente ao disposto nas leis escritas. A hermenêutica,
que se define como a arte de interpretar as leis, deve adentrar ao caso concreto desvinculada de apenas um preceito
normativo expresso, mas sim, ancorada por um conjunto de princípios aplicáveis em uma determinada situação.
O Direito encontra-se fundamentado em princípios universais ou restritos à sua área de atuação. Os princípios
universais, também chamados de princípios gerais de direito, são enunciações jurídicas de valor genérico que visam à
compreensão e integração do ordenamento jurídico como um todo. Os restritos em sua área de atuação, por sua vez,
não vislumbram influenciar de maneira difusa a totalidade do ordenamento, tendo eficácia limitada à sua área de atua-
ção.
O sistema registral imobiliário brasileiro está amparado tanto pelos princípios gerais de direito como pelos privati-
vos à sua área de incidência. O conjunto desses princípios formula as regras gerais e básicas, sob as quais todo
registrador de imóveis deve ater-se na análise de um título submetido a registro. Segundo Nicolau Balbino Filho:
Como todo complexo normativo, o direito imobiliário registral fundamenta-se numa série de princípios gerais que
dotam suas normas de um sentido unitário. Esses princípios não são axiomas incontestáveis, mas criações técnicas,
instrumentos idôneos destinados a alcançar finalidades especificas perseguidas pela instituição registral. Tais finalida-
des se legitimam por considerações éticas e úteis, motivadas pela necessidade de proteger a boa-fé e de facilitar o
comércio jurídico ( FILHO, Nicolau Balbino, 2001, pg 35).
Pois bem, passaremos à questão em debate, qual seja, as espécies de princípios registrais imobiliários e a sua
importância no cenário jurídico nacional.
2. PRINCÍPIO DA INSCRIÇÃO
Um dos principais princípios inseridos no sistema registral imobiliário é o princípio da inscrição. Este princípio pode
dividir-se em dois aspectos: o primeiro é o aspecto material, que define a necessidade da inscrição para que a constitui-
ção, transmissão, modificação ou extinção dos direitos reais por ato entre vivos se consubstancie. O segundo, definido
como formal, é o modo sob o qual o assento será lançado no registro.
No Brasil, adota-se a modalidade do registro por extrato, ou seja, constando apenas os pontos principais e indis-
pensáveis do título submetido a registro. Entretanto, nada impede o registro em inteiro teor do título apresentado no
Registro Auxiliar, tal como prevê o artigo 178, VII da Lei 6015/73.
A inscrição opera-se para os bens imóveis da mesma maneira que a tradição para os bens móveis e está prevista
no artigo 1227 do Código Civil: “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se
adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos
expressos neste Código.”
Afrânio de Carvalho define de uma maneira clara e sucinta que:
A inscrição é o modo de aquisição de direitos reais nos negócios entre vivos que são os mais numerosos, mas a
aquisição não se dá apenas nesses negócios, por acordo de vontades. Quando se dá fora deles, por força da lei, como
na herança, também se exige a inscrição dela, a fim de manter sem ruptura a cadeia de titulare (CARVALHO, Afrânio de,
1998, pg 143).
A inscrição, no sistema jurídico brasileiro, não é dotada do chamado efeito saneador, sob o qual o registro compro-
va a absoluta titularidade do bem, independentemente de algum vício anterior a ele. Tal fato está respaldado pelo artigo
1231 do Código Civil. A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário.
O principio da inscrição pode se manifestar sob o efeito declarativo, constitutivo ou extintivo. O primeiro visa a dar
publicidade ao ato registrado, uma vez que a sua constituição se deu anteriormente. Serve apenas para gerar um
caráter “erga omnes” às mutações jurídicas concretizadas antes do título ingressar no registro de imóveis. Um exemplo
dessa modalidade de inscrição é o direito proveniente de sucessão. O direito de propriedade já é transferido aos
herdeiros no momento da morte do “de cujus” (princípio da saisine). A inscrição do formal de partilha tem a função
exclusiva de levar ao conhecimento de todos a existência do referido direito, além de garantir a continuidade da cadeia
dominial existente na matrícula do imóvel.
O efeito constitutivo, por sua vez, é aquele indispensável à formalização do direito. No momento do registro ocorre
a mutação jurídico-patrimonial imobiliária. É o que ocorre, por exemplo, no registro de uma escritura pública de compra
e venda de um imóvel. Todas as condições pactuadas no negócio jurídico estão inseridas na escritura, entretanto o
direito real de propriedade somente consubstancia-se com o registro na matrícula respectiva.
Por fim, temos o efeito extintivo, previsto no artigo 252 da Lei 6015/73: “O registro, enquanto não cancelado, produz
todos os efeitos legais ainda que, por outra maneira, se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido.”
Para que ocorra a extinção de determinado direito averbado ou registrado sobre um determinado imóvel é preciso que
seja levado ao ofício de registro de imóveis competente um título que comprove o cancelamento do referido direito.
Uma averbação de indisponibilidade de bens decorrente de uma ordem judicial, por exemplo, só haverá como cancela-
da quando o oficial de registro, munido da documentação necessária, inscrever o ato na matrícula. Em geral, a inscrição
extintiva se dá por averbação mediante cumprimento de decisão judicial transitada em julgado, a requerimento unânime
das partes que tenham participado do ato, se capazes com as firmas reconhecidas pelo tabelião ou a requerimento da
parte interessada, instruída com documento hábil, nos termos do artigo 250 da Lei 6015/73.
Há doutrinadores que definem, ainda, um outro efeito para a inscrição, o translativo. Este efeito fica no meio termo
entre a inscrição constitutiva e a extintiva e tem a função de fazer nascer o direito para uma parte ao mesmo tempo em
que o extingue para outra, como por exemplo, no registro de uma escritura de compra e venda.
3. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA
Outro princípio de fundamental importância no registro de imóveis é o da segurança jurídica. Este princípio encon-
tra-se intimamente ligado ao Estado Democrático de Direito e aos demais princípios que garantem a funcionalidade
deste, tais como o devido processo legal, o direito adquirido e a irretroatividade da lei, dentre outros.
O registrador, por ser um operador do direito dotado de fé pública, deve se cercar de todas as garantias que
comprovem que o negócio jurídico por ele inscrito está envolvido da totalidade dos aspectos legais previstos. O registro
de imóveis, apesar de dotar de presunção juris tantum, tem a função de garantir aos interessados e à sociedade como
um todo que o bem registrado não será objeto de procedimentos arbitrários, ilegais ou temerários. A segurança jurídica,
inserida no sistema registral, acarreta clareza e presunção de veracidade aos negócios jurídicos imobiliários submeti-
dos a registro.
Filio-me a corrente que defende a idéia de que o “juízo prudencial” do registrador imobiliário deve estar envolvido
da maior seguridade possível. Questões polêmicas, sujeitas a julgamentos distintos entre os mais diversos Tribunais
brasileiros, devem ser precedidas, ao meu entender, de um procedimento de dúvida (artigo 198 da Lei 6015/73). Os
registradores, apesar de serem autônomos, devem se convencer de que o seu ofício visa à segurança jurídica das
partes interessadas e essa só será alcançada, quando se tratar de questões controvertidas na doutrina, com o procedi-
mento do contraditório e da ampla defesa, amparado pelo crivo jurisdicional.
4. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO E DA FÉ PÚBLCA
Os princípios da presunção e da fé pública possuem significados autônomos, apesar de estarem inseridos conjun-
tamente pela grande maioria da doutrina. Afrânio de Carvalho define de maneira concisa e esclarecedora:
Estes dois princípios têm cada qual seu significado próprio, mas foram amalgamados durante certo tempo no
nosso país por uma corrente da doutrina que pretendeu dar ao primeiro, previsto na lei, a eficácia do segundo, omitido
nela. Ao passo que o primeiro reforça a eficácia da inscrição, sem a tornar, contudo, saneadora, pois mantém o primado
do direito subjetivo, o segundo abre uma brecha nesse primado ao admitir que a inscrição se torne saneadora relativa-
mente ao terceiro de boa fé que, confiando nela, adquire o direito. A regra é a tutela do direito subjetivo, ou a segurança
jurídica; a exceção é a tutela do terceiro de boa-fé, ou a segurança do comércio (CARVALHO, Afrânio de, 1998, pg 161).
A presunção no direito brasileiro é restrita (exceto no Registro Torrens), ou seja, admite prova em contrário, não
possuindo o efeito saneador, como já exposto nesta obra. Entretanto, o ônus da prova não caberá à parte portadora de
um determinado direito constante de uma inscrição e sim ao terceiro prejudicado. A presunção significa que o registro
ou a averbação prevalece contra ou a favor da parte nele inserida, até prova em contrário. Uma pessoa que adquire um
imóvel através de uma compra e venda, por exemplo, é tido como proprietária do referido imóvel para todos os efeitos
legais, salvo se comprovado judicialmente que o comprador, por algum motivo, não fez jus a essa aquisição.
A fé-pública, por sua vez, é a proteção provisória do titular de um direito e a garantia de um terceiro interessado de
que o que está expresso na matrícula corresponde à realidade jurídica do imóvel. O artigo 3º da Lei 8935/1994 ao definir
que o oficial registrador é um profissional de direito dotado de fé pública gera certeza à sociedade como um todo de que
todos os títulos submetidos a registro estarão amparados pelo mais alto grau de confiabilidade, respeitabilidade e
eficácia. Ressalva-se, entretanto, que o registro garante a proteção ao direito inscrito e não aos fatos narrados no título
registrado.
Parte da doutrina entende que a qualificação do título pelo registrador deve se restringir à forma do mesmo. Filio-
me, porém, à corrente que defende a qualificação de fundo, ou seja, a análise profunda do título, verificando-se tanto o
cumprimento de todos os requisitos formais quanto à possibilidade da constituição do direito material em si. Somente
dessa maneira, o oficial tornar-se-á merecedor de carregar consigo o instituto da fé pública, acarretando na credibilidade
plena do sistema registral brasileiro.
5. PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE
O registro imobiliário, por ser um serviço público exercido em caráter privado através de uma delegação, deve
estar embutido na natureza administrativa da atividade. Pelo fato da administração pública ter como dever a transparên-
cia dos seus atos, o registro de imóveis também deve seguir tal orientação. O princípio da publicidade registral é aquele
que garante o acesso a toda sociedade dos fatos inscritos nas matrículas dos imóveis. Nicolau Balbino Filho define que:
“[...] a publicidade é um expediente destinado a gerar cognoscibilidade. Alude-se a cognoscibilidade e não a conhe-
cimento, porque, sendo seu destinatário final a pessoa, o efetivo conhecimento dependerá, a final, da atitude e da
vontade do destinatário em conhecer o que se dá à publicidade” ( FILHO, Nicolau Balbino, 2001, pg 145).
A publicidade pode ser material ou formal. A primeira se define como o conjunto de direitos intrínsecos a uma
inscrição. Tais direitos são dotados, no Brasil, de uma eficácia juris tantum. Já a publicidade formal gera a possibilidade
de qualquer pessoa de acessar o conteúdo de um registro. Essa modalidade de publicidade manifesta-se através das
certidões, cuja obtenção está prescrita no artigo 17 da Lei 6015/73: “Qualquer pessoa pode requerer certidão do regis-
tro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido.”
Outra classificação da publicidade se dá quanto aos seus efeitos, podendo ser declarativa ou constitutiva. A decla-
rativa tem como função levar ao conhecimento de terceiros a existência de um determinado direito ou ônus anterior-
mente constituído. Um exemplo é a averbação da penhora, que tem como único objetivo exteriorizar um ônus surgido
anteriormente em um processo de execução. Já a constitutiva surge concomitantemente ao direito, como ocorre, por
exemplo, na compra e venda.
Além das funções já explicitadas, a publicidade é de grande valia para a garantia da oponibilidade erga omnes.
Aquele que teve um direito lesado em um determinado ato inscrito tem o direito de ter o conhecimento do prejuízo por
ele auferido e buscar os meios legais adequados para reverter tal situação. O princípio da publicidade coíbe a inscrição
de atos fraudulentos e ilegais, feitos às escuras. Todos os atos praticados pelo registro de imóveis podem ser conheci-
dos a qualquer tempo por qualquer pessoa.
6. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE
O princípio da especialidade visa a individualizar os dados constantes de um registro, decorrente de um determina-
do título. A especialidade pode ser objetiva, subjetiva ou fato jurídico inscritível. A objetiva está prevista no artigo 225 §2º
da Lei 6015/73: “Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel
não coincida com a que consta no registro anterior .” O imóvel deve estar caracterizado de maneira idêntica no título
apresentado e na matrícula para que um novo registro possa ser efetuado. Por exemplo, se na matrícula consta que o
imóvel situa-se na Rua X e no título consta Rua Y será necessário apresentar uma certidão de alteração de denomina-
ção de logradouro emitida pela Prefeitura Municipal do respectivo Município, para que esta seja previamente averbada
e se promova a congruência entre o constante do instrumento a ser registrado e o mencionado no livro dois do Registro
de Imóveis. A Lei 7433/85 permitiu aos tabeliães consignarem, nas escrituras públicas que tratem de imóveis urbanos,
exclusivamente o número do registro ou matrícula no Registro de Imóveis, sua completa localização, logradouro, núme-
ro, bairro, cidade, Estado e os documentos e certidões constantes do § 2º do art. 1º desta mesma Lei.
A especialidade subjetiva determina que as partes inseridas no título a ser registrado estejam plenamente individu-
alizadas e identificadas, constando o nome, domicilio e nacionalidade das mesmas, bem como o estado civil, a profis-
são, o CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) ou do Registro Geral de Identidade, tratando-se de pessoa física; e a sede
social e o CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas), tratando-se de pessoa jurídica, tudo conforme preconiza o
artigo 176 §1º, II, 3, a, da Lei 6015/73.
Por fim, temos a especialidade do fato jurídico inscritível do título. Essa modalidade prevê que só serão submetidos
a registro, os títulos que cumpram todos os requisitos legais de um determinado negócio jurídico. Parte da doutrina
entende que somente serão passíveis de registro, os títulos elencados no artigo 167 da Lei 6015/73, por se tratar de
uma relação numerus clausus. Penso, porém, de maneira diversa. O direito evolui a cada dia e não há como prever
expressamente todas as situações que poderiam influenciar de maneira direta ou indireta um registro de um imóvel. A
sociedade inova, o direito avança e o pensamento do oficial de registro também deve evoluir. São inúmeras situações
que ocorrem diariamente e que não eram previstas em 1973, quando da elaboração da Lei de Registros Públicos. A
sociedade familiar não constituída por um casamento é um exemplo disso. Entendo ser plenamente possível o registro
de um contrato de união estável, homologado judicialmente, embora tal ato não esteja previsto na Lei 6015. Não há
como fechar os olhos para a realidade fática do mundo atual e os oficiais, como profissionais do direito, devem buscar
o dinamismo e a evolução de sua atividade.
7. PRINCÍPIO DA PRIORIDADE
Um dos principais princípios norteadores do registro imobiliário é o da prioridade. A prioridade se define como a
preferência dada a alguém relativamente ao tempo de seu direito. Na área registral, esse princípio tem como caracterís-
tica garantir primazia ao beneficiário de um direito em oposição a outros direitos constituídos sobre o mesmo imóvel. Tal
prioridade se dá, em regra, pela ordem cronológica dos títulos apresentados, como determina o artigo 186 da Lei 6105/
73: “O número de ordem determinará a prioridade do título, e esta a preferência dos direitos reais, ainda que apresen-
tados pela mesma pessoa mais de um título simultaneamente.” Sendo assim, ao receber um número no protocolo, o
título dota-se de prioridade sobre os que vierem posteriormente e recaírem sobre o mesmo imóvel. A preferência se dá
com a prenotação e não com o registro em si, como preceitua o artigo 1246 do Código Civil: “O registro é eficaz desde
o momento em que se apresentar o título ao oficial de registro e este o prenotar no protocolo.”
Luis Carlos Fagundes Viana dá ao princípio o seguinte significado:
Pela prioridade, que encontra fundamento legal no artigo 186, a apresentação do título assegura a precedência do
direito. Constitui-se, em verdade, em norma de solução de concurso de direitos reais incidentes sobre o imóvel, resol-
vendo-a pela ordem de prenotação (VIANNA, Luis Carlos Fagundes, 2002, pg 17).
Como exposto acima, o princípio da prioridade caracteriza-se pela máxima que define: prior in tempore potior in
jure, ou seja, o primeiro no tempo é o mais poderoso no direito. Entretanto tal premissa comporta uma exceção, as
hipotecas. Nestas, o número de ordem determina a prioridade e esta a preferência entre as hipotecas. Uma hipoteca de
primeiro grau possui primazia sobre a segunda, esta possui prioridade sobre a terceira e assim sucessivamente. Quan-
do se apresentar ao oficial de registro, título de hipoteca que mencione a constituição de uma anterior, não registrada,
sobrestará ele na inscrição da nova, depois de a prenotar, até trinta dias, aguardando que o interessado inscreva a
precedente; esgotado o prazo, sem que se requeira a inscrição desta, a hipoteca ulterior será registrada e obterá
preferência (artigo 1495 do Código Civil).
A prioridade pode ser exclusiva ou gradual. A primeira faz com que o registro de um título exclua possibilidade de
inscrição de outro que garanta um direito completamente antagônico ao registrado. Se o proprietário A vende a B uma
casa cujo registro foi efetivado no registro de imóveis, uma escritura de compra e venda em que A vende a C a mesma
casa não é passível de registro.
A prioridade gradual por sua vez gera precedência ao título prenotado primeiramente em face de um posterior que
ingressar no ofício registral, embora ambos sejam compatíveis entre si. Um exemplo é a hipoteca de primeiro grau, que
como já explicitado, é dotada de preferência sobre a de segundo grau. Contudo, uma matrícula comporta o registro das
duas hipotecas.
8. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE
O princípio da continuidade define que todos os atos praticados pelo registro de imóveis devem obedecer a uma
seqüência lógica, concatenada, sem espaços vazios entre um ato e outro. Tal princípio está intimamente ligado ao da
especialidade e visa a estabelecer uma correspondência entre toda a cadeia dominial de um determinado imóvel. Está
previsto no artigo 195 da Lei 6015/73: “Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o
oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continui-
dade do registro.” E no artigo 237 do referido diploma legal: “Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro
que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.”
Afrânio de Carvalho disserta de maneira elucidativa que:
A sua essência repousa na necessidade de fazer com que o registro reflita com a maior fidelidade possível a realidade
jurídica. Ao exigir-se que todo aquele que dispõe de um direito esteja inscrito como seu titular no registro, impede-se que
o não-titular dele disponha. A pré-inscrição do disponente do direito, da parte passivamente interessada, constitui, pois
uma necessidade indeclinável em todas as mutações jurídico-reais (CARVALHO, Afrânio de, 1998, pg 254).
Existem algumas exceções ao princípio da continuidade. O usucapião extraordinário, por exemplo, não necessita
de justo título e boa fé do usucapiendo para se consumar. Sendo assim, a simples sentença proferida pelo juiz de direito
já é um título hábil para registro, independentemente se há uma matrícula prévia ou se a cadeia dominial do imóvel
usucapido está completa. Mas, de modo geral, o oficial deve sempre se pautar pela continuidade registral, visando a
eliminar obscuridades, incertezas e inseguranças sobre um determinado registro.
9. PRINCÍPIO DA CINDIBILIDADE
O princípio da cindibilidade não está expresso em um texto normativo. Entretanto, quase unanimidade da doutrina
e da jurisprudência o vem adotando. Esse princípio baseia-se no fato de que o registrador é um profissional de direito
dotado da mais elevada capacidade jurídica e que possui um juízo de admissibilidade capaz de extrair do título tudo
aquilo que validamente pode ser inscrito. Numa escritura de compra e venda de vários imóveis, por exemplo, em que
alguns cumprem todos os requisitos legais e outros deixam alguns aspectos pendentes, o oficial tem toda a liberdade
para registrar os que estão aptos e fornecer uma nota de devolução constando todas as exigências dos inaptos. São
vários os julgados neste sentido, dentre os quais podemos citar esta decisão do Conselho Superior de Magistratura de
São Paulo:
AÇÃO CÍVEL N.º 339-6/9 - CARTA DE ARREMATAÇÃO. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS MUNICIPAIS –
IPTU. ITBI – RECOLHIMENTO. CONSTRUÇÃO – AVERBAÇÃO – CINDIBILIDADE DO TÍTULO – PRINCÍPIO DE
INSTÂNCIA – ESPECIALIDADE OBJETIVA. DÚVIDA – PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – TUTELA ANTECIPA-
DA – PREJUDICIALIDADE – CUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIA. DÚVIDA. Não obstante prejudicada a dúvida, é possí-
vel, desde já, ressalvar que a exigência de prévia averbação da edificação indicada na carta de arrematação, como
condição para o registro, poderá ser superada mediante aplicação do princípio da cindibilidade do título, com regis-
tro da arrematação do terreno, ficando para momento posterior a averbação da construção que depende, por seu turno,
do atendimento de requisitos específicos, em especial a apresentação, pelo interessado, do certificado de regularidade
expedido pela Prefeitura Municipal e da Certidão Negativa de Débitos do INSS relativa à obra.
De forma simples e concisa podemos definir a cindibilidade como a possibilidade de o registrador aproveitar todo
o conteúdo do título cujos requisitos legais foram cumpridos, não utilizando o que não pode ser objeto de inscrição.
10. PRINCÍPIO DA INSTÂNCIA
Via de regra, o ato registral é de iniciativa exclusiva do interessado, sendo vedado ao oficial a prática do ato ex
officio. De acordo com Nicolau Balbino Filho:
O princípio de instância, ou de rogação, como também é conhecido, significa que a atividade do registrador não
pode ser espontânea, pois seus atos dependem de provocação da parte interessada. O registrador não pode, inclusive,
expedir certidões ou prestar informações sem que lhe sejam requeridas (FILHO, Nicolau Balbino, 2001, pg 193).
Na maioria das vezes o requerimento do interessado é feito pela via oral, contudo, existem situações em que a lei
exige expressamente a forma escrita, como se observa no parágrafo único do artigo 246 da Lei 6015/73, que prevê a
necessidade de requerimento com firma reconhecida para as averbações de mudança de denominação e de numera-
ção dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis e da
alteração do nome por casamento ou por desquite, ou, ainda, de outras circunstâncias que, de qualquer modo, tenham
influência no registro ou nas pessoas nele interessadas.
O artigo 217 da Lei 6015/73 prevê que o registro e a averbação poderão ser provocados por qualquer pessoa,
incumbindo-lhe as despesas respectivas. Entretanto, não se pode auferir a este artigo uma interpretação restritiva. A
compreensão deve se pautar na idéia de que o requerimento pode ser feito por “qualquer pessoa interessada”. A
unificação de matrículas de imóveis contíguos, por exemplo, só pode ser requerida pelo proprietário dos mesmos
(artigo 234 da Lei 6015/73). O portador do requerimento, por sua vez, pode ser qualquer pessoa, uma vez que este não
exerce direito algum sobre o mesmo, tendo somente o dever de ingressar o título no fólio registral no tempo e modo
acordados com a parte interessada.
Há, porém, situações em que o oficial deve agir de ofício, como na averbação dos nomes dos logradouros, decre-
tados pelo poder público (artigo 167, II, 13 da Lei 6015/73). É também aplicável a intervenção do oficial, independente-
mente de requerimento, quando este verificar erros cometidos por ele ou seus prepostos na transposição dos elemen-
tos constantes do título submetido a registro.
11. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
Por fim, trataremos de um dos princípios basilares de todo o ordenamento jurídico nacional, o da legalidade.
Consagrado no artigo 5º, II, da Constituição Federal (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa,
senão em virtude de lei), o princípio da legalidade deve ser aplicado de maneira incisiva no registro imobiliário. A
aplicação desse princípio, porém, causa divergências na doutrina, dividindo-a em dois segmentos.
O primeiro segmento sustenta que o exame dos títulos submetidos a registro deve ser exclusivamente formal. Ou
seja, o oficial deve se ater somente à qualificação de forma para registrar o ato. Estando cumpridos todos esses
requisitos, a inscrição pode ser efetivada.
A outra parte da doutrina defende que o oficial de registro, por ser um profissional de direito dotado de fé pública,
deve atentar para o cumprimento de todos os requisitos materiais e formais exigidos para que se alcance um determi-
nado direito. Tal verificação, denominada qualificação de fundo, deve atuar inclusive perante os títulos judiciais.
Filio-me à corrente que defende a qualificação de fundo por parte do oficial. A função do registrador é justamente
gerar uma segurança de que o direito inscrito na matrícula corresponde à realidade jurídica. A simples averiguação da
forma acarreta em uma instabilidade da sociedade e em uma falta de credibilidade do registro. A presunção de veraci-
dade dos atos registrais deve ser plena. Vejamos, por exemplo, um formal em que o juiz homologa a partilha conceden-
do direito de representação ao filho de um herdeiro renunciante. Por ser um operador do direito, dotado de notável saber
jurídico, o oficial verifica que tal situação é inconcebível, nos termos do artigo 1811 do Código Civil. Entendo ser perfei-
tamente cabível a formulação de uma exigência, solicitando que tal empecilho seja suprido.
O oficial, ao utilizar-se do princípio da legalidade, deve sempre relacioná-lo com o da segurança jurídica que é
inerente ao registro público. Não há como se inscrever atos manifestamente nulos, simplesmente pelo fato de estarem
cumpridos todos os requisitos formais. O registro deve servir como um filtro, capaz de pormenorizar e eliminar todas as
“impurezas” intrínsecas aos mais diversos títulos a ele submetidos.
12. CONCLUSÃO
Os princípios registrais imobiliários têm a função de direcionar os oficiais na prática dos mais variados atos. A
maioria das soluções para os mais diversos entraves jurídicos não são encontradas única e exclusivamente em textos
normativos, mas sim, na principiologia. Princípio é originado da palavra começo, início. E um problema só pode ser
solucionado, se soubermos a origem dele. Daí a importância principiológica.
Os princípios são de extrema importância na exegese do sistema registral imobiliário. O conhecimento pleno deles
impede os oficiais de inscreverem atos dotados de vícios e incertezas. Os textos legais originam-se de princípios e
estes devem resguardar toda a atividade inerente ao registro de imóveis.
Ao utilizar-se de todos os princípios abordados no presente artigo, os registradores imobiliários contribuirão de
maneira intensa para a maior respeitabilidade da classe, bem como para que o registro de imóveis concretize a sua
principal função, a de guardião dos direitos reais.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Código civil (2002). Código civil. 56. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. (Veja em www.diariodasleis.com.br)
BRASIL. Lei 6015, de 31 de Dezembro de 1973. Dispõe sobre os Registros Públicos, e dá outras providências.
Diário Oficial da União, Brasília, 31 de Dezembro de 1973. (Veja em www.diariodasleis.com.br)
BRASIL. Lei 7433, de 18 de dezembro de 1985. Dispõe sobre os requisitos para a lavratura de escrituras públicas
e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 18 de dezembro de 1985. (Veja em www.diariodasleis.com.br)
BRASIL. Lei 8935, 18 de Novembro de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre
serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, de 18 de Novembro de 1994. (Veja em www.diariodas
leis.com.br)
CARVALHO, Afrânio de, Registro de Imóveis, 4ª ed. 1998, pg 143, Rio de Janeiro, ed. Forense.
CARVALHO, Afrânio de, Registro de Imóveis, 4ª ed. 1998, pg 161, Rio de Janeiro, ed. Forense.
CARVALHO, Afrânio de, Registro de Imóveis, 4ª ed. 1998, pg 254, Rio de Janeiro, ed. Forense.
FILHO, Nicolau Balbino, Direito Imobiliário Registral, 2001, pg 35, ed. Saraiva.
FILHO, Nicolau Balbino, Direito Imobiliário Registral, 2001, pg 145, ed. Saraiva.
FILHO, Nicolau Balbino, Direito Imobiliário Registral, 2001, pg 193, ed. Saraiva.
MELO JR, Regnoberto M., Lei de Registros Públicos Comentada, 1º Volume, Ed. Freitas Bastos.
RIOS, Arthur, Manual de Direito Imobiliário, 3ª ed., 2006, Curitiba, Ed. Juruá.
VIANNA, Luís Carlos Fagundes, Elementos do Registro de Imóveis, 2002, pg 17, São Paulo, Ed. Juarez de
Oliveira.
(*) O autor é Bacharel em direito pela PUC-MG, escrevente do 4º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte.
275). Aliás, em se tratando de prestações periódicas e sucessivas, mesmo que da inicial não conste mencionado pedido,
deverá o juiz determinar o depósito das que se forem vencendo, em face do que dispõe o art. 290 do CPC) (...)” Veja os
seguintes julgados: 1 - CONDOMÍNIO - DESPESAS CONDOMINIAIS - COBRANÇA - PARCELA VINCENDA - JUNTADA
DE BOLETO – DESNECESSIDADE. O fato de não ter o autor juntado boletos referentes às prestações vincendas não
importa em indeferimento do pedido, uma vez que a inclusão delas na condenação deriva do próprio texto legal. 2º TACIVIL
/ SP Ap. s/ Rev. 799.908-00/9 - 6ª Câm. - Rel. Juiz ANDRADE NETO - J. 4.2.2004. SOBRE O TEMA FONTE: Ap. s/ Rev.
799.908-00/9 - 6ª Câm. - Rel. Juiz ANDRADE NETO - J. 4.2.2004, com a seguinte referência: NELSON NERY JUNIOR e
ROSA MARIA DE ANDRADE NERY - “Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante
em Vigor”, Ed. RT, 3ª ed., 1997, pág. 571. 2 - CONDOMÍNIO - DESPESAS CONDOMINIAIS - COBRANÇA - DESPESA
EXTRAORDINÁRIA - PARCELA VINCENDA - INCLUSÃO - APROVAÇÃO PELA ASSEMBLÉIA - OCORRÊNCIA -
ADMISSIBILIDADE - APLICAÇÃO DO ARTIGO 290, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Pode a condenação em ação
de cobrança de despesas condominiais abranger as parcelas vincendas relativas à despesas extraordinárias, desde que
devidamente aprovadas em assembléia condominial, e até o limite das prestações consignadas na ata da assembléia, não
havendo incompatibilidade entre a natureza das despesas extraordinárias e a regra contida do artigo 290 do Código de
Processo Civil. 2º TACIVIL / SP Ap. s/ Rev. 824.529-00/5 - 7ª Câm. - Rel. Juiz AMÉRICO ANGÉLICO - J. 16.12.2003.
Tem sido prática constante nos negócios imobiliários a inclusão de cláusulas que estipulam cobrança de juros
compensatórios nos contratos de aquisição de unidades imobiliárias ainda na planta, a serem construídas com os
recursos despendidos mensalmente pelos compradores, na medida em que avançam as obras.
Essa cobrança ainda durante a fase de construção importa na exigência de encargos justamente dos quais os
empreendedores recebem o capital necessário para o cumprimento da parte que lhes toca no contrato, sendo, portanto,
inegavelmente abusiva e arbitrária a cobrança, porque está descompassada das proteções asseguradas aos consumi-
dores no ordenamento jurídico.
Nessa situação, os juros, que a rigor devem incidir sobre capital cedido a outrem, como forma de remuneração
desses recursos, são cobrados exatamente de quem adianta os recursos para a obra, em completa inversão à lógica
que autoriza a cobrança do sobredito encargo. Isso porque os adquirentes é quem antecipam os valores necessários à
execução da obra, o que torna absurda, antes da entrega das chaves, a incidência de juros sobre gastos suportados
exclusivamente por esses consumidores.
Com efeito, a ilegalidade que se aponta diz respeito aos juros compensatórios, e não propriamente aos juros
moratórios, os quais não se confundem com aqueles porque visam tão somente a retribuir a perda patrimonial do credor
que deixou de receber no tempo devido a obrigação a que tinha direito, sendo a cobrança, a priori, legítima. Diferente-
mente destes, os juros compensatórios incidem sobre capital cedido a outrem, traduzindo forma de remuneração des-
ses recursos, ou, em outras palavras, o preço do dinheiro emprestado (frutos civis), de tal modo que sua cobrança só se
legitima quando tenha havido essa efetiva disponibilização de capital para um terceiro, diferentemente do que se dá nos
contratos que têm por objeto a aquisição de imóveis a serem ainda construídos.
A bem dizer, a disponibilização de capital na fase de construção do imóvel é feita pelos adquirentes em benefício do
vendedor, que é financiado em grande parte pelos investimentos feitos por aqueles primeiros. Os empreendedores se
comprometem a vender imóvel que ainda não existe ao tempo da contratação, obrigando-se a construí-lo e a entregá-
lo dentro de prazo certo, sendo isso o bastante para tornar ilegal a cobrança dos juros compensatórios ainda durante a
fase das obras, à exceção do que diz respeito ao valor correspondente à fração do terreno cujo preço não tenha sido
pago à vista.
A invalidade de tal cobrança é reconhecida pelo item 14, da Portaria 03, da Secretaria de Direito Econômico do
Ministério da Justiça, que considera abusiva a cláusula que ‘estabeleça no contrato de compra e venda de imóvel, a
incidência de juros antes da entrega das chaves’.
A incidência dos juros compensatórios somente é tolerada após a expedição do ‘habite-se’ pelos órgãos compe-
tentes, visto que a partir deste momento é que os empreendedores ficam desapossados do bem, o que justifica a
compensação financeira à conta da cobrança dos juros.
O correto e legítimo é corrigir o preço contratado até a entrega do bem aos adquirentes e, a partir daí, sim, caso
estes optem pelo financiamento, é que poderiam os empreendedores fazerem incidir juros sobre o saldo do preço
corrigido monetariamente, pois somente a partir da entrega do bem é que os adquirentes terão aptidão de usufruí-lo e
os empreendedores ficarão privados do mesmo.
A partir do reconhecimento de que os empreendedores exigiram e receberam quantias indevidas a título de juros
compensatórios, em gesto de indisfarçável violação ao direito de seus parceiros contratuais de somente serem cobra-
dos daquela verba depois de receberem as chaves das respectivas unidades imobiliárias, orienta-se aos adquirentes de
imóveis ‘na planta’ o ajuizamento de ação de repetição de indébito para obterem a devolução em dobro dos valores
pagos (CDC, art. 42, parágrafo único), com juros moratórios e atualização monetária.
(*) O autor é Advogado do C. Martins & Advogados, RJ, Procurador do Estado do Rio de Janeiro, especialista no
setor de advocacia contenciosa, tributária, direito público e consultoria de contratos cíveis e comerciais.
(O Estado de São Paulo, 04.01.2009)
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