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Resumo: A legislação brasileira de contratações públicas está em vias de experimentar sua principal
alteração das últimas décadas. Este artigo analisa alguns dos principais pontos e desafios da futura
lei geral de licitações e contratos administrativos brasileiros.
Palavras-chave: Licitação. Contratos administrativos. Projeto executivo. Matriz de riscos. Eficiência.
Seguro-garantia. Paralisação de obras. Atraso pagamento. Mediação. Arbitragem.
Sumário: Introdução – 1 Breve nota histórica sobre as contratações públicas brasileiras – 2 O Projeto
de Lei de Licitações: inovações fundamentais – 2.1 Projeto executivo como requisito obrigatório – 2.2
Matriz de riscos – 2.3 Contratação integrada e semi-integrada – 2.4 Diálogo Competitivo – 2.5 Seguro
Garantia – 2.6 Parâmetros para suspensão da execução dos contratos – 2.7 Inversão das fases – 2.8
Audiência e consulta pública – 2.9 Fornecimento e prestação de serviço associado – 2.10 Conciliação,
mediação, comitê de resolução de disputas e arbitragem – 3 Uma visão panorâmica sobre outras
inovações do PL – 4 Considerações finais.
Introdução
Desde seus primórdios, as contratações administrativas brasileiras se
depararam com desafios bastante peculiares. Seja devido à estrutura federativa, que
celebra normatividade multinível para o assunto (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios podem legislar a respeito), seja em razão de se imaginar o formalismo
exacerbado como técnica de conter abusos, ou mesmo em vista de puras barreiras
de entrada, fato é que os processos adjudicatórios brasileiros tendem a gerar custos
de transação extraordinários e a inibir a competição.
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1
O Boletim de Compras Públicas – BCP, da Rede Nacional de Compras Públicas do Brasil, aponta que, de janeiro
de 2007 a dezembro de 2017, só as compras – equipamentos, serviços (suporte, engenharia, segurança,
manutenção, limpeza, etc.), subsistência, informática, mobiliários, veículos, utensílios, combustíveis,
materiais de construção, etc. – do Governo Federal movimentaram mais de R$ 510bi – variando de 0,65%
(2007) a 1,25% (2013), com 0,92% do PIB em 2017 (Disponível em: https://www.compraspublicasbrasil.
gov.br/portal/pdf/boletim-de-compras-publicas.pdf. Acesso em: 01 jul. 2019). Ampliar em: MOREIRA, Egon
Bockmann; RIBEIRO, Leonardo Coelho. Centralização de compras públicas no Brasil. In: RAIMUNDO, Miguel
Assis (Org.). Centralização e agregação de compras públicas. Lisboa: Almedina, 2019. p. 65-86.
2
Basta pensar na dita “Operação Lava Jato”, cujos números alcançam os bilhões de dólares. A versão oficial
e suas cifras podem ser encontradas em: http://www.mpf.mp.br/grandes-casos/caso-lava-jato. Acesso
em: 01 jul. 2019.
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3
A concorrência pública era mencionada nos arts. 49 e 50 do Código, in verbis:
“Art. 49. Ao empenho da despesa deverá preceder contracto, mediante concurrencia publica: a) para
fornecimentos, embora parcellados, custeados por credito superiores a 5:000$000; b) para execução de
quaesquer obras publicas de valor superior a 10:000$000.
“Art. 50. A concurrencia publica far-se-á por meio de publicação no Diario Official, ou nos jornaes officiaes
dos Estados, das condições a serem estipuladas e com a indicação das autoridades encarregadas da
adjudicação, do dia, hora e logar desta”.
Porém, desde então, eram fortes as barreiras de entrada – que certamente ecoarão na futura implementação
do acordo UE-Mercosul:
“Art. 53. Em todos os fornecimentos feitos ás repartições publicas federaes serão preferidos, em igualdade
de condições, os proponentes nacionaes”.
4
Cujos arts. 736 a 763 tratavam das “normas gerais” das concorrências, ao passo que os 764 a 802, dos
contratos. (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1910-1929/anexo/And15783-22.
pdf. Acesso em: 02 jul. 2019). Ampliar em: BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Contrato de direito
público ou administrativo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 88, p. 15-33, jul. 1967.
Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/29858. Acesso em: 02 jul.
2019.
5
“Licitações”, em Revista de Direito Público, São Paulo, n. 7, p. 53-59, jan./mar. 1969. O Decreto-Lei
200/1967 dispunha, em seus arts. 125 a 144 sobre “normas relativas a licitações para compras, obras,
serviços e alienações” (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0200.htm#tituloxii.
Acesso em: 02 jul. 2019).
6
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2300-86impressao.htm. Acesso em:
02 jul. 2019. Ampliar em: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Licitações e contratos administrativos:
observações para hoje e para amanhã. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 189, p. 39-57,
jul. 1992. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45280/47707.
Acesso em: 02 jul. 2019; TÁCITO, Caio. A Nova Lei de Licitação. Revista de Direito Público, São Paulo, n.
84, p. 140-145, out./dez. 1987; LOPES, Mônica Sette. Contrato Administrativo. Revista de Direito Público,
São Paulo, n. 85, p. 161-171, jan./mar. 1988.
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7
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 18. ed. São Paulo:
RT, p. 13-71; GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e Contratos Administrativos. 5. ed. São Paulo: Malheiros,
2019, p. 49-61; MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Licitação Pública: a Lei Geral
de Licitações – LGL e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2015,
p. 39-50.
8
Sobre o histórico e a racionalidade da Lei 8.666/1993, ver: ROSILHO, André. Licitação no Brasil. São
Paulo: Malheiros; SBDP, 2013.
9
Texto atualizado disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666compilado.htm. Acesso
em: 01 jul. 2019. Se efetuada pesquisa no site do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que tem a função
constitucional de uniformizar a interpretação das leis ordinárias, aos 01.07.2019 consta o registro de
1.466 (um mil, quatrocentos e sessenta e seis) acórdãos a respeito da Lei 8.666/1993 (Disponível em:
https://scon.stj.jus.br/SCON/). As decisões monocráticas são tantas que o resultado é “Erro no sistema”.
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Já, no Supremo Tribunal Federal – STF, que ostenta a condição de guardião da Constituição, sobre a Lei
8.666/1993 constam 525 (quinhentos e vinte e cinco) acórdãos; 2.667 (duas mil, seiscentas e sessenta e
sete) decisões monocráticas de seus ministros e 118 (cento e dezoito) decisões da presidência (Disponível
em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarConsolidada.asp). Isso sem se falar nos tribunais
estaduais, tribunais regionais federais e cortes de contas.
10
O PL, seu trâmite e apensos podem ser encontrados em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fi
chadetramitacao?idProposicao=16526. Acesso em: 01 jul. 2019.
11
Legislação atualizada disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10520.htm (Pregão)
e http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm (RDC). Acesso em: 02 jul.
2019.
12
Disponíveis, respectivamente, em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8987compilada.htm
(Concessões comuns e permissões); http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/
l11079.htm (PPPs) e http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm (estatais).
Acesso em: 02 jul. 2019. Isso sem se falar nas leis estaduais e municipais, além daquelas específicas
para contratos nos setores portuário, ferroviário, aeroportuário, rodoviário, de publicidade, microempresas
e empresas de pequeno porte, etc. – cada qual com ostentando a condição de lei especial em relação à
8.666/1993.
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“atualizadas” das leis anteriores.13 Assim e bem vistas as coisas, o PL antes retrata
uma consolidação normativa do que propriamente uma lei nova.
Vamos, portanto, a alguns de seus pontos novidadeiros e à tentativa de
compreensão de sua razão de existir no caso brasileiro (harmonizando-os aos
demais dispositivos).
13
O PL que serviu de base a este texto está disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/
prop_mostrarintegra;jsessionid=C5CCA3992601BF85796FAD4AE728C2CE.proposicoesWebExterno2?cod
teor=1667857&filename=SBT+4+PL129295+%253D%253E+PL+1292/1995. Acesso em: 02 jul. 2019.
Sobre este e os demais projetos de lei, ver: NOBREGA, Theresa Christine de Albuquerque; BRITO, Marina
Falcão Lisboa. A nova lei de licitações no Brasil: a licitação diante das transições legislativas. Revista
da AGU, n. 18, v. 2, jul./dez. 2018. Disponível em: https://portalrevistas.ucb.br/index.php/REPATS/
article/view/9151. Acesso em: 04 jul. 2019; HEINEN, Juliano. Projeto de Lei de Licitações e Contratos
Administrativos – Primeira Parte. Revista Colunistas de Direito do Estado, n. 368, 2017. Disponível em:
http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/juliano-heinen/projeto-de-lei-de-licitacoes-e-contratos-
administrativos-primeira-parte. Acesso em: 04 jul. 2019; NÓBREGA, Marcos. Uma nova Lei de Licitações.
Revista Colunistas de Direito do Estado, n. 314, 2016. Disponível em: http://www.direitodoestado.com.br/
colunistas/marcos-nobrega/uma-nova-lei-de-licitacoes. Acesso em: 04 jul. 2019; OLIVEIRA, Rafael Sérgio
de. Os 10 tópicos mais relevantes do Projeto da Nova Lei de Licitação e Contrato. Portal L & C, [s.d.].
Disponível em: http://www.licitacaoecontrato.com.br/lecComenta_detalhe.html. Acesso em: 05 jul. 2019.
14
Lei 8.666/1993, art. 6º, inc. IX (definição de projeto básico) e, sobretudo, art. 7º, §2º, inc. I (“§ 2º As obras
e os serviços somente poderão ser licitados quando: I - houver projeto básico aprovado pela autoridade
competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório” – não exigindo
o projeto executivo).
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15
GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e Contratos Administrativos. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 116.
Aliás, Marçal Justen Filho assim qualifica a licitação sem projeto executivo prévio: “Essa solução é anômala
e excepcional”, a demandar “justificativas satisfatórias”, com “fundamentos técnicos que autorizem a
autoridade administrativa a assumir risco dessa ordem” (Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos. 18. ed. São Paulo: RT, 2019, p. 234). Lamentavelmente, contudo, a ausência de projeto
executivo tornou-se a regra nas licitações brasileiras, especialmente nas mais complexas.
16
Eis a exceção: “§3º Em se tratando de estudo técnico preliminar para contratação de obras e serviços comuns
de engenharia, se demonstrada a inexistência de prejuízos para aferição dos padrões de desempenho e
qualidade almejados, poderá ser indicada a possibilidade de especificação do objeto apenas em termo
de referência, dispensando-se a elaboração de projetos”. Mas, além dela, o PL prescreve também as
contratações integradas e semi-integradas.
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Veja-se, por exemplo, o que escreveu Celso Antônio Bandeira de Mello, ao tratar do equilíbrio econômico-
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Cf. MOREIRA, Egon Bockmann. Direito das Concessões de Serviços Públicos. São Paulo: Malheiros, 2010,
18
p. 108-131; MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Licitação Pública: a Lei Geral de
Licitações – LGL e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p.
118-122.
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Note-se que o PL define o que vem a ser “obras de grande vulto” (aquelas com
valor estimado superior a R$100 milhões de reais – art. 6º, inc. XXII), bem como os
regimes de contratação “integrada” e “semi-integrada” (art. 6º, incs. XXXII e XXXIII
– contratos próximo aos tipos DBT – Design, Build, Transfer ou EPC – Engineering,
Procurement, Construction, a ser examinados no próximo tópico deste artigo).
Essa distinção – escolha discricionária na maioria das licitações e vinculada
apenas em três categorias contratuais (grande vulto em termos quantitativo-mone-
tário; além daquelas que atribuem maiores tarefas aos contratados, ampliando o
escopo e as assimetrias da contratação) – tem sua razão de ser, eis que contratos
simples, que não gerem eventualidades extraordinárias, não têm o condão de gerar
matrizes de risco. Isso implicaria a instalação de custos de transação não justificados.
Contudo, a definição da matriz de riscos em casos de contratação integrada
e semi-integrada pode instalar maiores desafios – afinal, estas são marcadas
pela prévia certeza da assimetria de informações e alocação de responsabilidade
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Sobre o tema, ver: GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e Contratos Administrativos. 5. ed. São Paulo:
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20
RIBEIRO, Mauricio Portugal; PINTO, Lucas Navarro; PINTO JUNIOR, Mario Engler. Regime Diferenciado de
Contratação. São Paulo: Atlas, 2012, p. 29.
21
GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e Contratos Administrativos. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 546.
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Mark Kirby esclarece e detalha essas fases do diálogo competitivo: “a-) uma primeira fase, aberta, de
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qualificação (apreciação da capacidade técnica e financeira) dos candidatos que pretendem apresentar
soluções ao diálogo; b-) uma segunda fase, dinâmica, em que o júri desenvolve com os candidatos
qualificados e que apresentaram soluções que não foram liminarmente excluídas (cfr. art. 212º, nº 2), um
diálogo com vistas a discutir os aspectos previstos ou omitidos nas soluções apresentadas e relativos à
execução do contrato a celebrar, que permitam a elaboração de um caderno de encargos (cf. art. 213º);
c-) uma terceira fase, fechada e rígida, em que os candidatos apresentam soluções admitidas ao diálogo
(e apenas estes), são convidados a apresentar propostas que respondam às exigências do caderno de
encargos elaborado pela entidade adjudicante a partir da solução (única) escolhida (cfr. Artigo 217º) por ter
sido considerada apta a satisfazer as necessidades da entidade adjudicante, sendo que tais propostas,
uma vez apresentadas, não mais podem ser alteradas, em obediência ao princípio da estabilidade dos
elementos essenciais do procedimento, que, nesta fase, opera em toda a linha” (KIRBY, Mark. O Diálogo
Concorrencial. In: GONÇALVES, Pedro Costa [Org.]. Estudos de Contratação Pública. Coimbra: Coimbra Ed.,
2008. v. 1. p. 278-279).
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Conforme se verifica no art. 26, item 4, alínea a, subalíneas, i, ii e iii da Diretiva 2014/24/EU.
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Conforme se verifica no art. 32 da Diretiva 2014/24/EU.
25
KIRBY, Mark. O Diálogo Concorrencial. In: GONÇALVES, Pedro Costa [Org.]. Estudos de Contratação Pública.
Coimbra: Coimbra Ed., 2008. v. 1. p. 286.
26
Idêntica é a percepção de Rafael Sérgio Lima de Oliveira: “Se o legislador brasileiro pretende resolver
problemas ligados à dificuldade de determinação do critério de julgamento das propostas, que importe
para o Direito Brasileiro o procedimento concorrencial com negociação previsto no artigo 29º da Diretiva
2014/24/EU, pois este procedimento sim foi pensado com esse intuito e tem uma marcha adequada
para esse tipo de problema” (OLIVEIRA, Rafael Sérgio Lima de. O diálogo competitivo do Projeto de Lei de
Licitação e Contrato Brasileiro. 34 p. Disponível em: www.licitacaoecontrato.com.br. Acesso em: 09 jul.
2019).
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27
Como bem acentuado por Thiago Marrara: “Dessas características se extrai que a grande vantagem do
diálogo concorrencial reside na possibilidade de se abrir a licitação ao mercado antes mesmo da definição
da minuta contratual, fugindo-se da tradição de contratação por adesão que marca o Direito Administrativo.
Embora eficiente m alguns casos, a presunção de que o Estado seja capaz de elaborar minutas de modo
unilateral e isolado antes da fase externa da licitação, na prática, muitas vezes dá vida a contratos deficientes
ou que não guardam qualquer aderência ao que o mercado oferece. Em piores cenários, a lógica da adesão,
resultante do isolamento dos órgãos contratantes e da impermeabilidade da fase interna, origina minutas
defeituosas, irreais, demasiadamente obscuras ou completamente inviáveis, fazendo fracassar a licitação”
(O “diálogo competitivo” como modalidade licitatória e seus impactos. Consultor Jurídico, 06 jan. 2017.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-jan-06/thiago-marrara-dialogo-competitivo-modalidade-
licitatoria. Acesso em: 10 jul. 2019).
28
PIMENTA, Guilherme. Mais de um terço das obras do Brasil estão paralisadas, informa TCU. Jota, 15 maio
2019. Disponível em: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/mercado/obras-paralisadas-tcu-15052019.
Acesso em: 10 jul. 2019.
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Assim, o percentual seria aumentado dos atuais 5% (cinco por cento) para 20%
(vinte por cento) nas obras, serviços e fornecimentos, sendo que nas contratações
de grande vulto, o percentual seria ampliado dos atuais 10% (dez por cento) para
30% (trinta por cento). De fato, os percentuais que estão em vigor se mostram
insatisfatórios e acabam ocasionando, em certa medida, cobertura insuficiente.
Além da elevação dos percentuais, a maior inovação sobre a temática do
seguro garantia pode ser vislumbrada no artigo 100 do PL:
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“Art. 5º As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei nº
29
8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: (…) §2º Os contratos poderão
prever adicionalmente: I - os requisitos e condições em que o parceiro público autorizará a transferência
do controle ou a administração temporária da sociedade de propósito específico aos seus financiadores
e garantidores com quem não mantenha vínculo societário direto, com o objetivo de promover a sua
reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços, não se aplicando para este
efeito o previsto no inciso I do parágrafo único do art. 27 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995”.
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ter empenhos emitidos em seu nome. Essas relações são multilaterais30 e não
mais podem ser compreendidas apenas a partir de uma visão estrita e estreita de
contratante-contratado.
O PL autoriza que a seguradora subcontrate a conclusão do objeto, o que é
intuitivo, já que o seu negócio não é o mercado de empreitada e sim o de seguros.
A conclusão do remanescente da obra dependerá, assim, de contratação a ser
efetivada pela própria seguradora.
Não honrar com a execução do contrato poderá ser bastante oneroso para a
seguradora, já que o PL prevê que, nesta hipótese, deverá se responsabilizar pela
multa contratual aplicada ao contrato, limitada a 15% do valor do contrato e indenizar
os prejuízos ou sobrecustos decorrentes de uma nova contratação, estando a soma
dessas duas obrigações limitada ao valor total da importância segurada na apólice.
O novo modelo do seguro garantia não é imune a críticas. Maurício Portugal
Ribeiro aponta duas consequências que não devem, de fato, ser desconsideradas
antes da sua efetiva implementação.31
A primeira delas é o inevitável aumento dos custos da obra, em razão das
seguradoras cobrarem que os tomadores do seguro lhes ofereçam contragarantias,
o que dependerá, evidentemente, da disponibilidade de patrimônio das empresas.
A segunda consequência apontada é o risco de que o seguro garantia se
configure como barreira à entrada das sociedades empresárias, porquanto nem
todas terão condições de oferecer as contragarantias, em especial nos contratos
de obra pública de maior vulto.
A introdução do seguro garantia, na forma como concebida no PL, merece
reflexão mais aprofundada, porquanto pode criar sérias distorções concorrenciais
e limitação do universo de competidores.
A fórmula mais próxima do infalível para agregar eficiência às obras públicas
ainda é: (i) elaboração de projetos básico e executivos bem estruturados e que
observem o tempo do planejamento e não o tempo político; (ii) incremento dos
mecanismos de gestão e governança, com fiscalização adequada que evite desvios;
(iii) honrar, pontualmente, os pagamentos devidos aos contratados, evitando o
indesejável ciclo vicioso de relações contratuais dominadas por inadimplementos
de ambas as partes, criando contenciosos administrativos de difícil solução.
30
Cf. MOREIRA, Egon Bockmann. Direito das concessões de serviço público. São Paulo: Malheiros, 2010. p.
279-281.
31
RIBEIRO, Mauricio Portugal. A proposta de usar “performance bond” como critério de seleção em licitações
de obras públicas. Disponível em: http://www.portugalribeiro.com.br/wpp/wp-content/uploads/imprensa-
seguro-garantia-para-tudo-6-final.pdf. Acesso em: 13 jul. 2019.
R. de Dir. Público da Economia – RDPE | Belo Horizonte, ano 18, n. 69, p. 39-73, jan./mar. 2020 59
60 R. de Dir. Público da Economia – RDPE | Belo Horizonte, ano 18, n. 69, p. 39-73, jan./mar. 2020
Não existe fórmula mágica que possa identificar a melhor solução. Apenas
as nuances do caso concreto é que revelarão, em cada hipótese, a medida apta
a atender o interesse público.
Alinha-se o PL a uma visão consequencialista,32 cada vez mais presente no
ordenamento jurídico brasileiro, como se vê da Lei nº 13.655/18, que alterou a
Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro.
O artigo 20 do referido diploma legal prevê que nas esferas administrativa,
controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos,
sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão e o artigo 21
estabelece que a decisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial,
decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa,
deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas.
O artigo 148 do PL converge plenamente com essas diretrizes.
Enfim, as consequências concretas e reais da suspensão de obra pública
não podem ser desconsideradas, seja pelo gestor, seja pelos órgãos do controle.
O artigo 148 do PL procura estabelecer um guia mínimo de parâmetros que,
necessariamente, deverão ser sopesados antes da tomada de decisão que venha
suspender ou paralisar a execução de um contrato administrativo, o que se afigura
extremamente positivo.
Gestores e controladores não podem ficar indiferentes aos parâmetros traçados
no artigo 148 do PL, que, de certo, modo agregam maior ônus argumentativo na
decisão que suspende a execução de uma obra pública. A decisão que vier a
sustar ou mesmo manter o contrato deverá enfrentar cada uma das condicionantes
previstas nos seus onze incisos.
O parágrafo único revela, ainda, que caso a opção seja pela continuidade do
contrato, deverá o Poder Público cobrar a indenização por perdas e danos e aplicar
as devidas sanções, revelando que a paralisação da obra nem sempre é a única
ou mesmo a melhor medida apta a concretizar o interesse público.
da decisão. Prospectar os efeitos da decisão não é irrelevante. O dever de motivar (geral a toda decisão)
passa a ser reforçado, nos casos de decisão baseada em valores abstratos, com o dever de indicar as
consequências antevistas pelo decisor. Mais do que isso, o dispositivo obriga a que as consequências
possíveis sejam avaliadas e sopesadas. E assim exigindo, torna a decisão baseada na aplicação de princípio
controlável (e censurável) quando falhar em vir acompanhado da análise das consequências” (MARQUES
NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Véras de. A nova LINDB e o consequencialismo jurídico como
mínimo essencial. Consultor Jurídico, 18 maio 2018. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-
mai-18/opiniao-lindb-quadrantes-consequencialismo-juridico. Acesso em: 13 jul. 2019).
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“Art. 4º A fase externa do pregão será iniciada com a convocação dos interessados e observará as seguintes
regras:(…) XII - encerrada a etapa competitiva e ordenadas as ofertas, o pregoeiro procederá à abertura
do invólucro contendo os documentos de habilitação do licitante que apresentou a melhor proposta, para
verificação do atendimento das condições fixadas no edital”.
34
“Art. 13. O edital poderá prever a inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento, hipótese em
que: I - encerrada a fase de classificação das propostas ou o oferecimento de lances, será aberto o invólucro
com os documentos de habilitação do licitante mais bem classificado, para verificação do atendimento das
condições fixadas no edital; II - verificado o atendimento das exigências do edital, o licitante será declarado
vencedor; III - inabilitado o licitante melhor classificado, serão analisados os documentos habilitatórios do
licitante com a proposta classificada em 2º (segundo) lugar, e assim, sucessivamente, até que um licitante
classificado atenda às condições fixadas no edital; IV - proclamado o resultado final do certame, o objeto
será adjudicado ao vencedor nas condições técnicas e econômicas por ele ofertadas”.
35
“Art. 12. O procedimento de licitação de que trata esta Lei observará as seguintes fases, nesta ordem:
I - preparatória; II - publicação do instrumento convocatório; III - apresentação de propostas ou lances;
IV - julgamento; V - habilitação; VI - recursal; e VII – encerramento. Parágrafo único. A fase de que trata o
inciso V do caput deste artigo poderá, mediante ato motivado, anteceder as referidas nos incisos III e IV
do caput deste artigo, desde que expressamente previsto no instrumento convocatório”.
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“Art. 39. Sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas
36
ou sucessivas for superior a 100 (cem) vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea ‘c’ desta Lei, o
processo licitatório será iniciado, obrigatoriamente, com uma audiência pública concedida pela autoridade
responsável com antecedência mínima de 15 (quinze) dias úteis da data prevista para a publicação do edital,
e divulgada, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis de sua realização, pelos mesmos meios
previstos para a publicidade da licitação, à qual terão acesso e direito a todas as informações pertinentes
e a se manifestar todos os interessados”.
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Cite-se apenas dois manuais de gigantes do direito administrativo brasileiro: Hely Lopes Meirelles (Direito
Administrativo Brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 1990) e Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso
de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009). Em ambos os casos, ato administrativo,
responsabilidade civil e controle da administração são assuntos-chave e ocupam mais da metade dos
livros.
38
Por exemplo, Celso Antônio Bandeira de Mello qualificou de “Novidade lamentável e, a nosso ver,
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Hoje, especialmente devido ao fato de serem previstas em leis que fazem referência
expressa à administração pública brasileira (Lei de Arbitragem; Lei de Mediação;
Código de Processo Civil; leis estaduais, etc.), não será demais dizer que sua
observância constitui dever administrativo.39 O princípio da juridicidade, ao configurar
as competências primárias dos gestores públicos, lhes atribui expressamente a
capacidade jurídica de resolver os conflitos por meio de mediações e arbitragens
(isso sem se falar nos comitês e negociações administrativas).
Mas, atenção: não se trata de escolha binária, com hipóteses fechadas de
“conflito = solução por meio da mediação” ou “conflito = solução por meio da
arbitragem” (tal como antes havia a regra do “conflito = solução por meio de ações
judiciais”). Tal como Leila Cuéllar consignou, “é preciso que o jurista detenha
conhecimentos necessários acerca dos meios de solução, mas também esteja apto
a avaliar as peculiaridades dos conflitos, do direito material envolvido, da natureza
das partes (e da relação que estas mantêm entre si), dentre outros fatores, para
definir o meio de solução mais adequado ao caso concreto”. Em conclusão: “Não
nos olvidemos de que não é porque existe mediação e arbitragem, por exemplo,
que estes sempre serão os meios que deverão ser utilizados para a solução do
conflito. Inúmeras vezes, a via judicial ainda é a mais adequada para resolver o
caso examinado. Não deixemos que a ‘moda’ nos imponha soluções. Por outro lado,
não nos afastemos da evolução. Esse equilíbrio entre o tradicional e o disruptivo
é o estado da arte da advocacia contemporânea”.40
Com efeito, a depender das peculiaridades do caso concreto e das consequências
práticas, diante do conflito o gestor público haverá de investigar qual a solução
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Art. 149. Nas contratações regidas por esta Lei, poderão ser utiliza-
dos meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias,
notadamente, a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de
disputas e a arbitragem.
§1º Aplica-se o disposto no caput às controvérsias relacionadas a di-
reitos patrimoniais disponíveis, tais como, as questões relacionadas
ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato,
ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das par-
tes e ao cálculo de indenizações.
§2º Os contratos poderão ser aditados para se adequarem ao
disposto no caput.
Art. 150. A arbitragem será sempre de direito e observará o princípio
da publicidade.
Art. 151. A utilização dos meios alternativos de resolução de con-
trovérsias deverá ser justificada mediante análise prévia dos custos
envolvidos e dos benefícios sociais e econômicos resultantes da sua
adoção.
Art. 152. O processo de escolha dos árbitros, colegiados arbitrais
e comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos,
técnicos e transparentes.
Ampliar em: GARCIA, Flávio Amaral. A escolha dos árbitros e das Câmaras Arbitrais: licitar ou não? Revista
41
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não poderia deixar de ser, o PL não exige a licitação – mas qualifica de “processo
de escolha” a seleção daqueles que funcionarão nessa condição.
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43
Cf. SCHIRATO, Vitor Rhein. Legitimidade processual e tipos de processo administrativo. Interesse Público –
IP, Belo Horizonte, ano 12, n. 62, jul./ago. 2010. Disponível em: http://www.bidforum.com.br/PDI0006.
aspx?pdiCntd=68807. Acesso em: 15 jul. 2019; MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 6. ed.
rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 211; ZYMLER, Benjamin. A Procedimentalização
do Direito Administrativo Brasileiro. Fórum Administrativo – Direito Público – FA, Belo Horizonte, ano 2, n.
22, dez. 2002. Disponível em: http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=2848. Acesso em:
15 jul. 2019.
44
Cf. TCU Acórdão 357/2015 – Plenário. Relator: Bruno Dantas. Data da sessão: 04.03.2015; TCU Acórdão nº
187/2014 – Plenário. Relator: Valmir Campelo. Data da sessão: 05.02.2014. TCU Acórdão nº 1542/2019
– Plenário. Relator: Ana Arraes. Data da sessão: 03.07.2019.
45
Cf. art. 6º da Lei nº 12.462/11.
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4 Considerações finais
O PL que pretende uniformizar a fragmentada legislação brasileira de licitações
e contratos é, ao fim e ao cabo, uma costura dos avanços obtidos, principalmente, a
partir do advento da modalidade pregão e do Regime Diferenciado de Contratação –
RDC. Além disso, esforça-se por adaptar alguns dispositivos da legislação europeia
de contratações públicas (nada obstante destoe de sua lógica de incentivo à plena
competição – eis que insiste nos formalismos e barreiras de entrada).
Se comparado com o atual regime da Lei 8.666/1993 – ainda incrustrada
nas mentes dos controladores como a guardiã da moralidade das licitações e
contratos públicos – é inegável avanço, na medida em que incorpora para o regime
geral inovações que deram certo e tornaram as licitações mais ágeis, econômicas
e céleres.
Indubitavelmente, o PL aperfeiçoa o regramento de licitações e contratos
administrativos em vigor, em especial porque a vetusta Lei 8.666/1993 é, finalmente,
revogada. Contudo, foi bastante tímido nas compreensão do que pode vir a ser um
sistema de contratações pautado pela livre concorrência.
A nosso ver, projeto de lei com essa envergadura mereceria maiores debates –
especialmente prospectivos – com a sociedade e com a academia. A rigor, o PL
é uma tentativa de uniformização e concentração, em apenas um diploma legal,
das várias leis que foram sendo editadas para escapar do anacrônico regime da
Lei 8.666/1993.
Talvez a principal crítica continua a ser a excessiva preocupação que o PL
apresenta com a temática da licitação, pouco inovando no regime jurídico dos
contratos administrativos, ainda dotado de excessivas exorbitâncias que aumentam
os custos de transação dos contratos públicos.
Além disso, leis não são mágicas e não mudam o estado das coisas de forma
automática. É preciso que a relação entre o público e privado se estruture a partir
de novas bases. A lógica da desconfiança mútua da Lei 8.666/1993 não deu certo.
A Administração Pública tem que cumprir com os seus deveres contratuais,
em especial com o pagamento pontual das suas obrigações. Direito contratual e
Direito financeiro estão intimamente ligados e não se vê no PL mecanismos que
possam restringir ou inibir manejos orçamentários que acarretem atrasos indevidos
no pagamento aos contratados.
Governança e gestão de contratos são temas fundamentais que, talvez,
merecessem maior protagonismo no PL. A preocupação concorrencial das licitações
e com as práticas colusivas é, também, tema inexplorado.
Enfim, como se procurou demonstrar ao longo do presente estudo, o PL é um
avanço ainda tímido. Mas já é um avanço....
Rio de Janeiro – Curitiba, julho de 2019.
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The project of the new Brazilian bidding law and some of its challenges
Abstract: The Brazilian legislation on public contracting is in the process of its main change in recent
decades. This article analyzes some of the main points and challenges of the future general law of
Brazilian biddings and administrative contracts.
Keywords: Bidding. Administrative contracts. Executive project. Risks. Efficiency. Insurance. Delay.
Conflicts. Mediation. Arbitration.
GARCIA, Flávio Amaral; MOREIRA, Egon Bockmann. A futura nova lei de licitações
brasileira: seus principais desafios, analisados individualmente. Revista de
Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 18, n. 69, p. 39-73,
jan./mar. 2020.
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