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Portal ONLL
Sumário

10 tópicos mais relevantes do projeto


da nova Lei de Licitação e Contrato........................................................................ 3

Sistema de Registro de Preços


na Nova Lei de Licitações........................................................................................... 20

As modalidades licitatórias aplicáveis


à contratação de obras e serviços de engenharia.............................................. 34

A inexigibilidade de licitação para a contratação


de serviços jurídicos à luz da nova Lei de Licitações......................................... 49

Diálogo competitivo: o rito de uma nova modalidade de licitação.............. 56

99 destaques da nova Lei de Licitações................................................................. 61

Critérios de julgamento.............................................................................................. 88

Contratação integrada e contratação semi-integrada


no projeto da nova Lei de Licitações: visão geral............................................... 99

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber............................... 105

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações................................... 113

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração desses direitos.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
10 tópicos mais
relevantes do projeto
da nova Lei de
Licitação e Contrato

Rafael Sérgio de Oliveira1


1
Doutorando em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, Mestre em
Direito, Especialista em Direito Público e Pós-Graduado em Direito da Contratação Pública
pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Procurador Federal da Advocacia-
Geral da União – AGU, Procurador-Chefe da Procuradoria Federal junto à Escola Nacional
de Administração Pública (ENAP) e membro da Câmara Permanente de Licitação e Contrato
da Procuradoria-Geral Federal (PGF). Atua na consultoria e assessoramento de gestores
públicos federais desde 2008. Membro da Red Iberoamericana de Contratación Pública e
professor de Direito Administrativo com ênfase em Licitação e Contrato.

18 de dezembro de 2020

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da Lei nº 9.610/1998.
O Senado Federal aprovou no dia 10 de dezembro de 2020 o Projeto da Nova
Lei de Licitação e Contrato Administrativo. O texto aprovado agora, em sua
essência, é resultante do trabalho da Comissão Temporária de Modernização
da Lei de Licitações e Contratos, criada pela Presidência do Senado Federal
em 2013.

Mencionada comissão apresentou uma proposta de lei, gerando assim o


Projeto de Lei do Senado nº 559/2013. Como casa iniciadora do processo
legislativo, o Plenário do Senado deliberou pela primeira vez acerca da
proposta da comissão em dezembro de 2016 e a aprovou, com algumas
alterações. Em seguida, o texto foi remetido para a Câmara, onde foi
apensado a um outro projeto antigo, motivo pelo qual tramitou nesta
última casa sob o registro de PL nº 1.292/1995. No segundo semestre de
2019, a Câmara aprovou o projeto, mas com significativas modificações.
Por isso, o texto voltou ao Senado, onde recebeu o tombo de Projeto de Lei
nº 4.253/2020, foi diretamente submetido ao Plenário desta última casa
e finalmente aprovado. Na oportunidade, o Senado acatou as alterações
ocorridas na Câmara com algumas ressalvas.

Aprovada pelo Plenário do Senado, a proposta ainda sofrerá modificações


voltadas para consolidação do texto e ajustes de redação. Superada essa
fase, o texto irá para sanção presidencial, oportunidade em que ainda pode
sofrer veto total ou parcial. Em uma lei dessa magnitude, é normal que ocorra
vetos parciais. O chefe do Poder Executivo federal contará com 15 dias úteis
(art. 66, § 1º, da Constituição) para sancionar ou vetar o projeto e, assim,
promulgá-lo, atribuindo-lhe o número oficial. Estima-se que a publicação do
texto em forma de lei deve ocorrer apenas no início do ano de 20211.

O PL em comento vem com o intuito de revogar as Leis nº 8.666/1993, a


Lei do Pregão2 e a Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas –
RDC3. Porém, inicialmente, o texto da nova lei passaria por um período de
convivência de 2 (dois) anos com essas normas. É que o art. 191 do projeto
prevê que a vigência do diploma vindouro se iniciaria com a sua publicação,
mas, durante os 2 (dois) anos seguintes, ainda vigorariam também a Lei

1
https://www.instagram.com/p/CIqHVjGjVdw/?igshid=18gqefl4wbp9d
2
Lei nº 10.520/2002.
3
Lei nº 12.462/2011.

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Sérgio de Oliveira 4
nº 8.666/1993, a Lei do Pregão e a do RDC, cabendo ao órgão ou entidade
licitante escolher se seguiria o novo ou o velho regime (§ 2º do art. 191).

O PL foi elaborado com o objetivo de implantar um novo regime geral de


contratação pública que assimila experiências já vividas com o pregão e com
o RDC, assim como traz a previsão de institutos ainda não experimentados
no Brasil. Com isso, é possível dizer que a vindoura nova lei traz avanços
pontuais. Porém, no seu todo, não traz uma modernização do sistema de
compra pública brasileiro. Como asseverou Joel de Menezes Niebuhr,
o novo texto “reproduz a mesma gênese excessivamente burocrática,
excessivamente formalista e excessivamente desconfiada da Lei nº
8.666/1993”4. Enfim, diante dos objetivos de modernização e compilação
presentes no momento da criação da comissão senatorial da qual resultou
o projeto, se pode dizer que o intuito da compilação foi alcançado, mas o da
modernização não.

Cabe dizer que o regime de contratação pública versado no texto em estudo é


o das entidades de direito público nacionais, que são a Administração direta,
autárquica e fundacional de todas as esferas da federação (federal, estadual,
distrital e municipal). Excluem-se desse sistema as empresas estatais (as
empresas públicas e as sociedades de economia mista), que se submetem à
Lei nº 13.303/2016, conforme determinar o art. 173, § 1º, da Constituição.

A seguir analisaremos os 10 aspectos que, em nossa visão, gerarão mais


impactos nas licitações e contratos brasileiros. Salientamos que esta é uma
análise preliminar baseada na consolidação do texto que foi aprovado na
Câmara e revisado pelo Senado. Ainda virão alterações decorrentes dos
ajustes finais do Senado e dos eventuais vetos presidenciais.

1 – Integração de Elementos da Governança à Legislação de Contratação


Pública

O primeiro aspecto que chama a nossa atenção no projeto é a integração


de elementos gerenciais às normas de licitação e contrato. São diversos

4
NIEBUHR, Joel de Menezes. O grande desafio diante da nova lei de licitações e contratos. Disponível em:
<< https://www.zenite.blog.br/o-grande-desafio-diante-da-nova-lei-de-licitacoes-e-contratos/>>.

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os instrumentos de governança incluídos pelo PL no procedimento de
contratação.

Inicialmente merece destaque pontos ligados à profissionalização, como


a criação da figura do agente de contratação (art. 8º) e a exigência de
promoção da gestão por competências na designação de agentes públicos para
trabalhar na área de licitação e contrato (art. 7º). Salientamos a manutenção
do pregoeiro como o responsável pela condução dos certames na modalidade
pregão (art. 8º, § 5º).

O projeto também incorpora à legislação ferramentas voltadas para o


planejamento da contratação, a exemplo do plano de contratações anual
(art. 12), ferramenta fundamental para imprimir uma maior qualidade aos
processos de licitação.

Outro instrumento previsto é a gestão de riscos (Parágrafo único do art. 11)


com a expressa possibilidade de adoção da matriz de riscos (art. 22), sendo
essa ferramenta obrigatória nos casos de obras e serviços de grande vulto,
contratos com regime de contratação integrada ou semi-integrada (§ 3º do
art. 22).

Por fim, o PL envolve a alta administração no processo de contratação


pública, comprometendo os dirigentes do órgão ou entidade com os
objetivos do certame. É da responsabilidade da alta direção a governança das
contratações e a implementação de processos e estruturas voltadas para a
avaliação, direcionamento e monitoramento dos processos de licitação em
relação aos seus objetivos.

2 – Contratação Eletrônica

A regra para todos os procedimentos de contratação passa a ser a


contratação eletrônica. Nos termos do § 2º do art. 17, “as licitações serão
realizadas preferencialmente sob a forma eletrônica”. Atentemos que, caso
o projeto venha a se tornar lei, todas as modalidades de licitação poderão ser
realizadas na forma eletrônica.

Quanto ao uso da forma presencial, o PL não traz nenhuma condição

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específica, exigindo apenas que o gestor exponha no processo o motivo da
sua opção e que registre a sessão pública em ata e grave o referido ato com a
utilização de recursos tecnológicos de áudio e vídeo (§ 2º e § 5º do art. 17).

Vale ressaltar que se extrai da letra do texto o princípio da virtualização dos


atos da licitação. Isso porque o PL determina que “os atos serão
preferencialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos,
comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico” (art. 12,
inciso VI). Isto é, na lei vindoura os atos praticados de forma física devem
ser evitados, ainda que venham a ser digitalizados posteriormente. Assim,
o sistema no qual se processa uma concorrência, por exemplo, deve estar
adaptado para receber pedidos de esclarecimento e impugnação ao edital
e recursos. Não seria admissível que tais atos fossem interpostos por forma
física para serem digitalizados e depois inseridos no sistema.

Outro relevante ponto no sentido da virtualização do procedimento é


a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas – PNCP, que
terá a missão de divulgar todas as licitações dos órgãos e entidades da
Administração direta, autárquica e fundacional da União, dos estados, do
Distrito Federal e dos Municípios. A ideia é que o PNCP seja, inclusive, uma
plataforma de realização das licitações, cuja adesão será facultativa (art.
174). Uma leitura do texto do PL demonstra que o PNCP será uma grande
fonte de informação para a atividade contratual do Estado.

3 – Orçamento Sigiloso

Conforme já dito, o projeto da novel lei de licitação e contrato revoga a Lei do


RDC, mas incorpora ao regime geral de contratação uma série de institutos
previstos no Regime Diferenciado de Contratações Públicas. Um desses é o
orçamento sigiloso5.

O art. 18, inciso IV, obriga a Administração licitante a elaborar na fase


preparatória do certame o orçamento estimado com a composição dos
preços utilizados para a sua formação. Entretanto, tal orçamento poderá,

5
Atualmente o orçamento sigiloso tem previsão legal expressa no RDC (art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.462/2011)
e na Lei das Estatais (art. 34, da Lei nº 13.303/2016).

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mediante justificativa da autoridade contratante, ser mantido em sigilo até
que se finalize a fase de julgamento das propostas (art. 24). Se for necessário
para a elaboração das propostas, a Administração deverá divulgar o
detalhamento dos quantitativos.

Além disso, se a licitação for julgada pelo critério de maior desconto, o preço
estimado ou o máximo aceitável deverá necessariamente constar do edital.
É que, nesses casos, a publicação do valor de referência da Administração é
essencial para que os proponentes ofereçam seus descontos.

Ressalvamos que o texto obriga a Administração licitante a fornecer o


orçamento base da contratação, ainda que declarado sigiloso, a qualquer
momento para os órgãos de controle interno e externo.

Essa é uma relevante ferramenta para a Administração, pois a depender


do mercado, a divulgação do orçamento estimado no momento da licitação
acarreta o efeito âncora, elevando os preços das propostas ao mais próximo
possível do valor máximo admitido pela Administração.

4 – Modalidades de Licitação

A título de observação inicial acerca do tratamento das licitações no


PL, ressaltamos que, embora de forma muito tímida, o projeto procura
superar, em alguns momentos, a rigidez procedimental contida na Lei
nº 8.666/1993. Um exemplo disso pode ser encontrado no art. 12, inciso III,
que prevê: “o desatendimento de exigências meramente formais que não
comprometam a aferição da qualificação do licitante ou a compreensão
do conteúdo de sua proposta não importará seu afastamento da licitação
ou a invalidação do processo”. Enxergamos neste dispositivo a previsão
do princípio do formalismo moderado, que empresta às formas legais de prática
dos atos uma compreensão instrumental.

O procedimento da licitação, em qualquer das suas modalidades, engloba


no projeto uma série de fases, que devem ocorrer na seguinte sequência:
a) preparatória; b) divulgação do edital de licitação; c) apresentação de
propostas e lances, nos casos em que há lances; d) julgamento; e) habilitação;
f) recursal; g) homologação (art. 17).

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Como se viu no parágrafo anterior, o PL traz para todas as demais
modalidades de licitação a inversão das fases de julgamento e habilitação já
presente no pregão e no RDC. Se aprovado o projeto, todas as modalidades
passam a ser processadas com o julgamento antes da habilitação, pelo que só
é habilitado o vencedor do certame. Ressalvamos o fato de o projeto admitir,
mediante exposição das vantagens, a realização da habilitação antes das
fases de apresentação das propostas e lances e de julgamento (art. 17, § 1º).

Modalidade de licitação no Direito brasileiro significa a marcha do


procedimento pelo qual é escolhido o contratado. Isto é, existem
procedimentos diversos para licitar os contratos a serem firmados pela
Administração, correspondendo cada um deles a uma modalidade de
licitação. Essa variedade existe em razão das diversas espécies de contratos
celebrados pelo Poder Público, pelo que se exige uma adequação entre o
procedimento de adjudicação e o objeto a ser contratado.

O art. 28 do Projeto da Nova Lei de Licitação e Contrato prevê as seguintes


modalidades de licitação: a) pregão; b) concorrência; c) concurso; d) leilão;
e) e diálogo competitivo. A tomada de preços e o convite não constam
no projeto. Já o RDC, considerado atualmente como uma modalidade
licitatória, deixa de existir como tal, embora muitas das práticas desse regime
diferenciado tenham a sua aplicação facultada nas modalidades previstas no
projeto (orçamento sigiloso, contratação integrada, o critério de julgamento
de maior retorno econômico, os modos de disputa aberto e fechado etc.). A
novidade é o diálogo competitivo, pois as demais modalidades previstas no PL
em comento já existem no regime licitatório brasileiro.

Continua valendo a regra que proíbe a criação de outras modalidades além


daquelas previstas no PL, assim como a que impede a combinação das
modalidades entre si (art. 28, § 2º). Vale dizer que essas proibições valem
apenas para o nível infralegal das normas e para as leis estaduais, distritais e
municipais, pois leis federais podem vir a criar novas modalidades. Enfim, a
previsão dessa regra consagra o entendimento já vigente de que modalidade
é matéria típica de norma geral de licitação e contrato, nos termos do art.
22, XXVII, da Constituição, e, por isso, só pode ser tratada por lei federal
(nacional).

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As modalidades previstas são aplicáveis nas seguintes situações:

MODALIDADE CABIMENTO
Contratação de serviços técnicos especializados de natureza
Concorrência (art.
predominantemente intelectual e obras e serviços de engenharia
6º, XXXVIII c/c art.
e arquitetura;Contratação de bens e demais serviços considerados
29)
especiais.

Concurso (art. 6º,


Escolha de trabalho técnico, científico ou artístico.
XXXIX)

Alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou


Leilão (art. 6º, XL)
legalmente apreendidos.

Obrigatoriamente, contratação de bens e serviços comuns, assim


considerados aqueles que possuam padrões de desempenho e
Pregão (art. 6º, XLI,
qualidade aptos a serem objetivamente definidos no edital por
c/c art. 29)
meio de especificações usuais no mercado. OBS.: O pregão não
poderá ser utilizado para licitar obras e serviços de engenharia.

Contratações cujo objeto é complexo a ponto de a Administração


Diálogo Competitivo
necessitar da colaboração do mercado para desenvolver as
(art. 6º, XLII, c/c art.
alternativas capazes de atender a necessidade/unitlidade pública a
32)
ser suprida com o contrato.

Por disposição expressa do projeto, o pregão e a concorrência “seguem


o rito procedimental comum” (art. 29), ou seja, têm exatamente o mesmo
procedimento6. A diferença entre um e outro está apenas no critério
de julgamento das propostas, pois no pregão são aplicáveis apenas os
critérios de menor preço ou de maior desconto (art. 6º, XLI), ao passo que
na concorrência as propostas podem ser julgadas com base nos critérios
de menor preço, maior desconto, melhor técnica ou conteúdo artístico, técnica e
preço e maior retorno econômico (art. 6º, XXXVIII).

6
Vemos aqui uma grande contradição no projeto. Como dissemos, cada espécie de modalidade de licitação
indica um procedimento, ou seja, um rito. Se há modalidades de licitação com mesmo rito, ao fim e ao cabo
o que existe é só uma modalidade. Essa é uma incoerência da norma que pode levar a discussões capazes
de desconfigurar o desenho projetado no texto.

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Cabe dizer que aqui a pretensa nova lei deixou de trazer para o plano da
norma a figura do pregão invertido e, por que não, da concorrência invertida.
O pregão nesses moldes é geralmente utilizado nos casos de contratação
de bens e serviços comuns em que a Administração tem a possibilidade de
auferir renda. Nesses casos, o critério de julgamento das propostas é o de
maior oferta7.

Outro ponto relevante de se anotar é que o pregão passa a ser legalmente


obrigatório para bens e serviços comuns (art. 6º, XLI). Na égide da Lei
nº 10.520/2002, o uso do pregão para licitação de bem e serviço comum é
uma faculdade (art. 1º da Lei do Pregão). No plano federal, por exemplo, a
obrigatoriedade do pregão decorreu dos regulamentos8.

A rigor, é possível dizer que o pregão cresce na sistemática do PL.


Principalmente porque a concorrência foi “apregoada”, já que incorporou a
si as características do pregão. No fim das contas, na sistemática da nova lei
nascente, a concorrência é um pregão com a possibilidade do uso dos demais
critérios de julgamento das propostas.

O concurso e o leilão permanecem basicamente com as mesmas


configurações que possuem na Lei nº 8.666/1993. Quanto ao leilão,
o PL remete para regulamento as normas sobre seus “procedimentos
operacionais” (art. 31).

A novidade é o diálogo competitivo9, cujo escopo é a adjudicação de


contratos dotados de complexidade técnica, jurídica ou financeira. Trata-se
de um instituto oriundo do Direito Europeu cujo foco inicial foi incentivar
os Estados-Membros da União Europeia a promoverem parcerias público-
privadas, as PPP’s. A ideia subjacente nessa modalidade de licitação é a de
que o setor privado pode contribuir para as soluções públicas. Por isso, ele

7
AMORIM, Victor Aguiar Jardim de; OLIVEIRA, Rafael Sérgio Lima de. Pregão Eletrônico: comentários ao
Decreto Federal nº 10.024/2019. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 89.
8
Atualmente, no plano federal, o pregão eletrônico é obrigatório em razão do disposto no art. 1º do
Decreto nº 10.024/2019.
9
Já publicamos artigo de minha autoria sobre essa modalidade de licitação, tendo em conta, inclusive,
a sua regulamentação no PL. Seguem as referências: OLIVEIRA, Rafael Sérgio Lima de. O Diálogo
Competitivo do Projeto de Lei de Licitação e Contrato Brasileiro. Disponível em: http://licitacaoecontrato.
com.br/exibeArtigo.html?assunto=oDialogoCompetitivoProjetoLeiLicitacaoEContratoBrasileiro.

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é apropriado para aquelas situações nas quais o poder público sabe da sua
necessidade, mas não sabe como supri-la. No diálogo competitivo, o objeto da
contratação é concebido no curso da licitação.

A peculiaridade desse procedimento é que antes do julgamento das


propostas há uma etapa de qualificação técnica e econômico-financeira
e outra de diálogo com os candidatos. A qualificação e julgamento das
propostas pouco se diferem do que existe na concorrência na forma como
regulada hoje, sendo a fase de qualificação, digamos assim, equivalente
à habilitação técnica e econômico-financeira. Na etapa do diálogo, cada
candidato apresenta a sua solução à Administração. Reparemos que se trata
de diálogo mesmo, pois cada licitante apresenta sua proposta de objeto
do contrato de maneira individualizada para a Administração. Escolhida
a solução, parte-se para o julgamento das propostas, que deve ocorrer de
acordo com um dos critérios de julgamento previstos no PL.

Essa modalidade é apta para casos complexos, sendo, por isso, de aplicação
restrita. Na Europa, poucos são os países que se valem dessa espécie de
procedimento, apesar de o terem positivado no seu direito interno. Ele é
bastante utilizado na Inglaterra e na França.

5 – Critérios de Julgamento das Propostas

O PL abandona o termo tipo de licitação utilizado pelo art. 45, § 1º, da Lei
nº 8.666/1993, referindo-se aos critérios de julgamento das propostas em
diversos dispositivos, especialmente no seu art. 33.

Cabe registrar que, como uma decorrência lógica dos princípios


constitucionais da igualdade e da impessoalidade (art. 5º, c/c o art. 37, XXI,
todos da Constituição), o art. 5º do projeto mantém de forma expressa
o princípio do julgamento objetivo. Assim, ainda que se entenda que o
PL trouxe maior discricionariedade ao gestor na definição dos critérios
de seleção do contratante, é preciso sempre ter em conta que essa
discricionariedade deve ser exercida de maneira impessoal, de modo que os
parâmetros utilizados para aferir a melhor proposta devem ser objetivos e
funcionais.

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Sérgio de Oliveira 12
Segundo o art. 33 do texto em estudo, as propostas serão julgadas com base
nos seguintes critérios: a) menor preço; b) maior desconto; c) melhor técnica
ou conteúdo artístico; d) técnica e preço; e) maior lance, no caso de leilão;
f) maior retorno econômico.

A maior novidade é o critério de maior retorno econômico. Esse é um tipo


de licitação exclusivo para licitações cujo objeto seja um contrato de
eficiência10 (art. 6º, LIII). Nos contratos de eficiência, o que se pretende não é a
obra, o serviço ou o bem em si, mas sim o resultado econômico mais vantajoso
decorrente de uma dessas prestações11, motivo pelo qual a melhor proposta
nessa espécie de ajuste é aquela que oferece um maior retorno econômico.

Apresentamos na tabela a seguir os critérios de julgamento das propostas


previstos no PL aplicáveis em cada uma das modalidades de licitação:

MODALIDADE CRITÉRIO DE JULGAMENTO

Concorrência (art. 6º, Menor preço; Melhor técnica ou conteúdo artístico; Técnica
XXXVIII c/c art. 29) e preço; Maior retorno econômico; Maior desconto.

Concurso (art. 5º, XXXIX) Melhor técnica ou conteúdo artístico.

Leilão (art. 5º, XL) Maior lance.

Pregão
Menor preço; Maior desconto.
(art. 5º, XLI, c/c art. 28)

Diálogo Competitivo Menor preço; Maior desconto12; Melhor técnica ou conteúdo


(art. 5º, XLI, c/c art. 29) artístico; Técnica e preço; Maior retorno econômico.

10
O critério de maior retorno econômico e o contrato de eficiência são institutos que já vigoram no Brasil
no Regime Diferenciado de Contratação Pública – RDC.
11
JUSTEN FILHO, Marçal. O Contrato de Eficiência na Lei Federal nº 12.462. Informativo Justen, Pereira,
Oliveira e Talamini, n.º 73, Curitiba, março de 2013, disponível em http://www.justen.com.br//informativo.
php?l=pt&informativo=73&artigo=997, acesso em 03/05/2018.
12
Dada as características do diálogo competitivo, não parece razoável que esse critério possa ser adotado
no procedimento. Porém, optamos neste momento de gestação da lei vindoura por uma interpretação
mais formal, baseada na literalidade do texto (sem contar que uma leitura mais aprofundada possa concluir
pela inaplicabilidade do critério ainda com base em parâmetros literais).

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Sérgio de Oliveira 13
6 – Instrumentos Auxiliares das Licitações e das Contratações

O texto projetado para a nova lei classifica alguns procedimentos já


conhecidos das contratações governamentais brasileiras como Instrumentos
Auxiliares. São eles: a) credenciamento; b) pré-qualificação; c) procedimento
de manifestação de interesse; d) sistema de registro de preço; e) e registro
cadastral (art. 77).

Exceto o procedimento de manifestação de interesse, os demais


instrumentos auxiliares estão, ainda que em nível infralegal, no ordenamento
jurídico pátrio vigente.

O credenciamento13 é uma importante ferramenta para contratações


por inexigibilidade. Trata-se de uma maneira de se operacionalizar uma
contratação por inexigibilidade nas seguintes situações: a) necessidade
de contratação simultânea, paralela e não excludente, de mais de um dos
agentes do mercado; b) casos em que o contratante é o Poder Público, mas
o usuário do serviço é um terceiro, a quem cabe a seleção do prestador; c)
situações de mercados fluídos, nos quais a variação dos preços praticados é
frequente a ponto de inviabilizar a realização de licitação (art. 78).

Já tivemos a oportunidade de escrever sobre o credenciamento14, ocasião


em que apontamos as suas principais características: i) número ilimitado
de credenciados; ii) tratamento isonômico entre o credenciados; iii) preço
fixado pela Administração, nas hipóteses dos itens a e b do parágrafo
anterior; iv) publicidade por meio de instrumento de chamamento público; v)
possibilidade permanente de inclusão de novos credenciados.

A pré-qualificação está atualmente prevista no art. 114 da Lei

13
O instituto é definido no art. 6º, XLIII, do PL com o seguinte texto: “XLIII – credenciamento: processo
administrativo de chamamento público em que a Administração Pública convoca interessados em
prestar serviços ou fornecer bens para que, preenchidos os requisitos necessários, credenciem-se no
órgão ou na entidade para executar o objeto quando convocados”. Ainda sobre o conceito do instituto:
OLIVEIRA, Rafael Sérgio de. O que é e quando se aplica o credenciamento? Disponível em: <http://www.
licitacaoecontrato.com.br/lecComenta/o-que-e-e-quando-se-aplica-o-credenciamento-in-52017.html>.
14
OLIVEIRA, Rafael Sérgio de. Quais os requisitos do credenciamento e como ele se operacionaliza?
Disponível em: <http://www.licitacaoecontrato.com.br/lecComenta/quais-os-requisitos-do-
credenciamento-e-como-ele-se-operacionaliza.html>.

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 14
nº 8.666/1993. Nesse regime, é possível pré-qualificar apenas licitantes,
não abrangendo produtos. Além disso, nos termos da Lei nº 8.666/1993 só
é possível fazer pré-qualificação na modalidade concorrência e nos casos
em que a análise da capacidade técnica dos licitantes demande um maior
trabalho por parte da Administração. Outro aspecto relevante da pré-
qualificação nos moldes da Lei nº 8.666/1993 é que ela não admite que a
Administração restrinja o futuro certame aos licitantes já pré-qualificados.

O PL em estudo adota a pré-qualificação de maneira semelhante à do RDC


e à da Lei das Estatais, a Lei nº 13.303/2016. Ou seja, se comparada com o
modelo da Lei nº 8.666/1993, a pré-qualificação do PL vai mais longe.

O projeto permite a pré-qualificação de licitantes e de bens para fins de


licitação processada em qualquer uma das suas modalidades previstas (art.
79). Trata-se de um procedimento prévio à licitação cujo objetivo é antecipar
a verificação dos requisitos exigidos pela Administração referentes à
qualificação do licitante ou do seu produto.

Um importante avanço previsto no projeto é a possibilidade de restringir a


participação no certame àqueles que foram pré-qualificados (§ 10, do art.
79). Essa é uma regra fundamental para o sucesso da pré-qualificação, pois
sua grande vantagem é a antecipação de fases da licitação. Caso se admita
a participação de concorrentes não pré-qualificados, pouco proveito se
tirará do instituto. Isso por dois motivos: a) repetição na licitação de atos já
praticados na pré-qualificação; b) esvaziamento da pré-qualificação, tendo
em vista que ela não oferecerá vantagem alguma ao empresário.

Talvez se possa dizer que a maior novidade nesse campo dos Instrumentos
Auxiliares é o Procedimento de Manifestação de Interesse – PMI (art. 80).
Embora já exista no Brasil, o PMI vigora em solo pátrio de modo limitado.
Sua relevância se deve ao fato de que umas das maiores dificuldades da
Administração Pública nas licitações é suprir a carência de informação
acerca das soluções, práticas e preços existentes no mercado. No intuito

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 15
de suprir essa assimetria de informação15, o ordenamento jurídico de
diversos países tem colocado à disposição das autoridades contratantes uma
espécie de procedimento prévio à publicação do certame, cujo objeto é a
coleta de informações acerca das soluções oferecidas pelo mercado para as
necessidades públicas.

Sobre o PMI, é possível dizer (art. 80): a) é uma solicitação à iniciativa privada
de realização de estudos e projetos para soluções da Administração Pública;
b) tem o objetivo de suprir a assimetria de informação entre a Administração
e o mercado; c) é uma etapa que antecede a licitação.

O Sistema de Registro de Preço – SRP também é uma das espécies de


Instrumentos Auxiliares. Destacamos que a regulamentação do PL avança
em relação a esse instituto porque traz ao nível da lei uma série de questões
que antes eram tratadas apenas em regulamento, a exemplo da possibilidade
de adesão (§ 2º do art. 85). Além disso, o PL inova ao, por exemplo, prevê:
a) o uso de registro de preço para obras (art. 81, § 5º); b) a possibilidade de
vigência da ata por até dois anos (art. 83); c) e admitir o SRP para hipóteses de
contratação direta (§ 6º do art. 81).

Por fim, o Registro Cadastral, uma relevante ferramenta que poderá


comportar um sistema de reputação capaz de conferir incentivos aos bons
contratados (art. 86).

7 – Modos de Disputa

O projeto admite que a licitação pode ser disputada de dois modos, aberto e
fechado (art. 55). No primeiro, os licitantes apresentarão suas propostas por
meio de lances públicos e sucessivos; no segundo, as propostas apresentadas

15
No Brasil, a doutrina já caminhava no sentido de construir a possibilidade de diálogo entre a
Administração e o mercado na fase que antecede a licitação. Nesse prumo, resultou da I Jornada de
Direito Administrativo do Conselho da Justiça Federal o seguinte enunciado: “A Administração Pública
pode promover comunicações formais com potenciais interessados durante a fase de planejamento das
contratações públicas para a obtenção de informações técnicas e comerciais relevantes à definição do
objeto e elaboração do projeto básico ou termo de referência, sendo que este diálogo público-privado
deve ser registrado no processo administrativo e não impede o particular colaborador de participar em
eventual licitação pública, ou mesmo de celebrar o respectivo contrato, tampouco lhe confere a autoria do
projeto básico ou termo de referência”.

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 16
pelos licitantes serão sigilosas até o momento definido no edital para
a divulgação. Ou seja, neste último caso, os licitantes não conhecem as
propostas e os lances dos seus concorrentes.

É relevantíssimo que o legislador ofereça – como de fato oferece no PL


– ao gestor a possibilidade de aplicar um modo ou outro, inclusive com a
possibilidade de combinação entre ambos, de acordo com a realidade do
certame. Todavia, há casos em que um desses modos é obrigatório. Nas
licitações de menor preço ou maior desconto, é vedada a utilização do modo
fechado de maneira isolada, admitindo-se apenas que o gestor mescle no
curso do procedimento os modos aberto e fechado (art. 55, § 1º). Já nas
licitações cujo critério for técnica e preço, não será possível o uso do modo
aberto (art. 55, § 2º).

8 – Contratação Integrada e Semi-integrada

No PL também há alterações substanciais relativas ao regime de execução


dos contratos. Algumas dessas são transpostas do RDC, como é o caso dos
regimes de execução contratual de contratação integrada, que foi acrescido
no projeto da nova lei ainda do regime de contratação semi-integrada16.

Trata-se de regimes voltados para a contratação de obras e serviços de


engenharia. Na contratação integrada, fazem parte de um único contrato a
elaboração dos projetos básico e executivo, a execução da obra ou serviço e o
fornecimento dos bens ou a prestação dos serviços especiais indispensáveis
para a realização da obra ou serviço contratado (art. 6º, XXXII).

Já no caso da semi-integrada, exclui-se apenas do contrato de execução da


obra ou serviço de engenharia a elaboração do projeto básico, restando a
cargo do executor da obra ou serviço de engenharia a elaboração do projeto
executivo, a execução da obra ou serviço de engenharia e o fornecimento dos
bens e a prestação dos serviços especiais indispensáveis para a consecução
do objeto contratado (art. 6º, XXXIII).

Ambos os regimes são instrumentos modernos, na medida em que se

16
A Lei das Estatais, a Lei nº 13.303/2016, já prevê tanto a contratação integrada como a semi-integrada.

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 17
aproximam do modelo no qual se busca a solução para as necessidades
públicas, e não um objeto em si. Com isso, há uma tendência de se retirar do
mercado soluções avançadas e baratas.

9 – Garantia Contratual

Em regra, o projeto continua a prever que a exigência de garantia contratual


é uma opção do gestor público (art. 95). Se decidir pela exigência, caberá ao
contratado escolher entre as opções de caução em dinheiro ou em títulos da
dívida pública, seguro-garantia ou fiança bancária (§ 1º do art. 95).

Nesse campo, a grande novidade está no art. 101 do PL e consiste na


possibilidade de o edital exigir como garantia de contratos de obras e
serviços de engenharia seguro-garantia, estabelecendo que, em caso
de inadimplemento contratual, caberá à seguradora concluir o objeto
contratado. Essa é uma prática internacionalmente conhecida como step
in right, cujo sentido é o de impor ao segurador a assunção da obrigação de
entrega da obra ou serviço no caso de o contratado falhar.

É uma relevante inovação, na medida em que é difícil licitar obra e serviço de


engenharia com execução incompleta. Entretanto, trata-se de ferramenta
que, com certeza, representará um custo considerável para a contratação,
motivo pelo qual deve ser utilizada apenas nos casos em que o risco de
inadimplemento seja significativo ou represente dificuldades para a
continuação do objeto contratual.

10 – Vigência Contratual

No último tópico desta explanação, destacamos o tratamento da duração


dos contratos no Projeto da Nova Lei de Licitação e Contrato. Já de início
ressaltamos que o PL estabelece que a duração dos contratos deverá
ser definida no respectivo instrumento convocatório, observando-se a
disponibilidade orçamentária no momento da contratação e a cada exercício
financeiro (art. 104).

O art. 105 admite a assinatura de ajustes com vigência inicial de até cinco
anos para a contratação de serviço ou fornecimento considerados contínuos,

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 18
desde que seja atestada a maior vantajosidade econômica da contratação
nesses termos. Repare-se que o PL avança ao admitir a possibilidade de
contratação de fornecimento (aquisição) por prazo que supere a vigência do
crédito orçamentário. Tanto no caso de serviço como de compra de bens, o
prazo inicial contratado poderá ser de cinco anos, que serão prorrogáveis por
mais cinco anos, totalizando uma duração contratual de dez anos.

Por fim, destacamos a expressa possibilidade de duração contratual por prazo


indeterminado nos casos de contratos em que a Administração for usuária de
serviço público em regime de monopólio (art. 108).

10 tópicos mais relevantes do projeto da nova Lei de Licitação e Contrato | Rafael


Sérgio de Oliveira 19
Sistema de Registro
de Preços na Nova
Lei de Licitações

Juliano Heinen1
1
Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor
titular na Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP). Professor de pós-graduação
em diversas universidades e instituições, destacando-se a Escola Superior da Magistratura
Federal (ESMAFE), Escola Superior da Magistratura Estadual (AJURIS), UNIRITTER (Laurent
University). Professor convidado da Escola Superior de Direito Municipal (ESDM), Fundação
Escola Superior da Defensoria do RS (FESDEP), da Escola Superior da Advocacia Pública do RS
(ESAPERGS) e da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ). Palestrante.
Parecerista. Procurador do Estado do Rio Grande do Sul.

12 de fevereiro de 2020

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informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
1 Sistema de Registro de Preços

O sistema de registro de preços (SRP) é outro procedimento auxiliar e já não


é nenhuma novidade, até porque, há muito, é previsto expressamente no
revogado art. 15, §§ 1º a 8º, da Lei nº 8.666/93 e no também revogado art. 32
da Lei nº 12.462/11 (RDC). O PL que inaugurará um novo marco nas licitações
e contratos adota esta ferramenta para aquisições, perfazendo uma série de
pequenas modificações que adaptaram este procedimento auxiliar às boas
práticas e à jurisprudência das cortes de contas, especialmente a federal.
Tudo com o fim de viabilizar um procedimento mais célere aos entes estatais.
Embora autoaplicável, o referido dispositivo pode sofrer limitações por
regulamento federal, estadual ou municipal.

Esse último regulamento tem por meta aperfeiçoar as regras que


disciplinavam o sistema de registro aqui mencionado, como, por
exemplo, ofertando regras mais claras à figura da adesão dos órgãos não
participantes, compatibilizando a atuação administrativa com as orientações
jurisprudenciais do TCU. Assim, tentou-se, a todo o custo, preservar a
essência deste procedimento licitatório, sem que, para tanto, fosse desviada
sua finalidade1.

Enfim, pode-se dizer que o sistema de registro de preços é a modalidade de


licitação apta a viabilizar diversas contratações concomitantes ou sucessivas,
sem a realização de um específico procedimento licitatório para cada
uma delas. Este sistema pode servir a um ou a mais órgãos da Administração
Pública. Normalmente é empregado para o caso de compras corriqueiras de
determinados bens ou serviços, quando não é conhecida a quantidade que será
necessária adquirir. Ou, ainda, quando estas compras tiverem a previsão
de entregas parceladas. Visa, com isto, a agilizar as contratações e a evitar
a formação de estoques, os quais geram um custo de manutenção muito
grande, sem contar no risco de que tais bens possam vir a perecer ou a se
deteriorar (v.g. art. 81, § 3º, inciso II, do PL)

Em melhores termos, o registro de preços constitui um conjunto de

1
Contudo, a legislação que tutelava o RDC (falo, aqui, tanto da revogada Lei nº 12.482/11, como do
Decreto nº 7.581/11) deu cabo de cumprir com uma agenda relevantíssima: a regulamentação mais
completa e minuciosa desta modalidade licitatória.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 21


procedimentos para formalizar e anotar a pretensão de certos interessados
em fornecer certos bens ou serviços, inclusive de engenharia (§ 5º do art. 81),
os quais o Poder Público necessitará corriqueiramente, mas em quantidades
variáveis. Então se, por um lado, o Estado fica obrigado a dar, no
mínimo, preferência àquele que ofereceu a melhor proposta para contratar
em iguais condições de outro que se proponha a fornecer o objeto licitado
em situação mais vantajosa, de outro lado, importa notar que o particular está
obrigado a fornecer os produtos ou serviços nas quantidades, preços e condições
previstas no instrumento convocatório – art. 81 “caput” incisos I e II do PL.

O SRP é um sistema muito profícuo para a aquisição de produtos ou para a


prestação de serviços aos entes estatais. Com ele, consegue-se um ganho
muito importante: a potencial participação de empresas menores, uma
vez que o fornecimento é parcelado ao longo do prazo de validade da ata
de registro de preços. E PL, nos arts. 81 a 85, adapta o registro de preços à
realidade atual, no intuito de superar eventuais inconvenientes surgidos a
partir da legislação de outrora.

2 Edital do Sistema de Registro de Preços

Veja que, de plano, o “caput” do art. 81 definiu os requisitos mínimos a serem


alocados no edital de licitação que adote o SRP. E são providências relevantes
e indispensáveis, como, por exemplo (e aqui é uma providência peculiar do
PL), deve ser alocada a especificidades do certame e de seu objeto, inclusive
a quantidade máxima de cada item que poderá ser adquirida (inciso I). Esta
providência procura, entre outras coisas, proteger o contratado, que saberá a
quantidade máxima que deve ser demandado a dispor.

De outro lado, evita que se privilegie certas empresas em detrimento de


outras, caso não existisse limite máximo de aquisição. Explico esta última
frase: imagine que a empresa “X” vença um certame de modo lícito, e, por
casualidade, é próxima do gestor público, contribuiu com sua campanha
eleitoral etc. Ora, nesta situação hipotética, o gestor passa a demandar muito

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 22


mais do que se estivéssemos diante de uma empresa comum. Queremos
dizer com isto que eventual privilegiamento pode ser mais bem controlado.
Também, esta providência evita perda de economia de escala, na medida em
que se fixou balizas objetivas em relação à quantidade que se quer adquirir.
E, ainda, evita-se que uma sucessividade de adesões2 possa também gerar perda
de economia de escala, ou seja, em não se tendo o quantitativo máximo a ser
adquirido, poder-se-ia permitir uma série de novas aquisições, aumentando
sensivelmente a demanda, mantendo-se o preço fixado originalmente –
quando que se sabe que, em termos econômicos, em geral, quanto mais se
adquire, menor tende a ser o custo do produto demandado.

Tudo aquilo que se disse até aqui, especialmente quanto às proteções


pretendidas pelo inciso I, valem ao inciso II: o edital deve fixar a quantidade
mínima a ser cotada de unidades de bens ou, no caso de serviços, de unidades
de medida. Isso também evita privilegiamento ou prejuízos deliberados
a fornecedores próximos ou não do governo de ocasião. Ainda, há mais
objetividade no balizamento dos produtos a serem adquiridos, tentando-
se minimizar o sobrepreço etc. Essa concepção impõe que a Administração
Pública não fique dispensada de mencionar, no instrumento convocatório, o
montante mínimo a ser adquirido. Assim como há a necessidade de estipulação do
quantitativo máximo a ser contratado, até para se auferir, já de início, o quanto
os fornecedores poderão ser demandados, bem como os limites à figura
da adesão, a seguir estudada. Segundo decidiu o TCU, no caso de eventual
prorrogação da ata de registro de preços, dentro do prazo de vigência
não superior a um ano, não se restabelecem os quantitativos inicialmente
fixados na licitação, sob pena de se infringirem os princípios que regem o
procedimento licitatório, indicados no art. 5º do PL3.

O inciso III inova ao permitir que se perfaçam registro de preços respeitando as


peculiaridades de cada contratante, porque os preços podem variar de acordo
com vários fatores. Assim, admitiu-se o edital prever preços diferentes:
(a) quando o objeto for realizado ou entregue em locais diferentes; (b) em
razão da forma e do local de acondicionamento; (c) quando admitida cotação
variável em razão do tamanho do lote; (d) por outros motivos justificados

2
A adesão ou a figura do “carona” é definida no art. 6º, inciso XLIX, do PL.
3
TCU, Acórdão nº 991/2009,Pleno j. 13/05/2009.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 23


no processo. É claro que o órgão gestor da licitação deverá, nos autos do
processo e na fase preparatória justificar com suficiência a hipótese de se
admitir esta variação no edital. Por fim, esta providência permite com que
se maximize os concorrentes, qualificando o princípio da competitividade (art.
5º), bem como se potencialize a possibilidade de se empregar o SRP em nível
nacional ou em larga medida geográfica, na medida em que se admitem toda
sorte de variação de preços, como por exemplo, em relação aos custos de
transporte.

Na mesma linha da qualificação do princípio da competitividade, o inciso


IV permitiu que o edital preveja a possibilidade de o licitante oferecer ou não
proposta em quantitativo inferior ao máximo previsto no edital, obrigando-se
nos limites dela. Isso faz com que empresas de menor porte possam também
participar do certame, quando que não teriam fôlego para fornecer quantias
maiores.

De outro lado, o inciso VI do “caput” do art. 81 permite alterações de preços


registrados. Veja que a legislação foi lacônica neste sentido, cabendo aos
regulamentos infralegais precisar este tema. Isso porque não se podem
permitir alterações no preço quando elas possam prejudicar a igualdade, a
competitividade, a probidade etc. Estas alterações devem ter, no mínimo,
base legal, motivação suficiente em situações em que realmente se exige esta
modificação, não violação de qualquer regra ou princípio, manutenção do
interesse público etc.

O inciso VII do “caput” do art. 81 do PL também veio ao encontro do princípio


da competitividade, porque permite o registro de mais de um fornecedor
ou prestador de serviço, sem qualquer limite, desde que expressamente
mencionada esta possibilidade no edital. Todos os licitantes devem,
igualmente, aceitarem cotar o objeto com preço igual ao do licitante
vencedor, assegurada a preferência de contratação de acordo com a ordem
de classificação. Esta providência também evita o desabastecimento do
Poder Público, que poderá demandar dos demais licitantes, quando os
primeiros na ordem de classificação não puderem ou não fornecerem os bens.
De outro lado, evita-se que se aloque “laranjas” ou “coelhos” a pautarem
propostas muito competitivas e em valor atraente, mas que não conseguem
fornecer toda a demanda reclamada, tendo a Administração Pública de

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 24


demandar do segundo colocado – real beneficiário – por um preço superior.
Como esta providência permite que outros fornecedores sejam contratados
pelo mesmo valor, evita-se esta “fraude”. Veja que o Poder Público pode cotar
com todos os fornecedores que registraram preço, respeitando a ordem de
classificação.

Já o inciso VIII do “caput” do art. 81 do PL é uma providência geral, não


necessariamente ligada ao edital de um SRP: há a vedação a que o órgão
ou a entidade participe de mais de uma ata de registro de preços com o
mesmo objeto no prazo de validade daquela que já tiver participado, salvo
na ocorrência de ata que tenha registrado quantitativo inferior ao máximo
previsto no edital. Esta providência induz o Poder Público a perfazer um
melhor planejamento, bem como a vir a escolher a ata de registro de preços
que melhor lhe convém. Logo, proíbe-se a adoção da contratação simultânea
no SRP, ou seja, a contratação de mais de uma empresa para a execução
do mesmo serviço, em uma mesma localidade, no âmbito do mesmo órgão
ou entidade. Esta providência visa, assim, a assegurar a responsabilidade
contratual e o princípio da padronização.

O edital ainda deverá deixar claras as hipóteses de cancelamento da ata


de registro de preços e suas consequências (inciso IX). Estas providências
maximizam a segurança jurídica, bem como devem respeitar as disposições
legais da lei geral (v.g. casos de revogação ou anulação do certame – art. 70,
inciso II, e §§ 1º a 5º).

3 Critério de julgamento das propostas no Sistema de Registro de Preços

O art. 81, “caput”, inciso V, determinou que o edital preveja somente dois
critérios de julgamento da licitação: o de menor preço ou o de maior desconto
sobre tabela de preços praticada no mercado. Neste último caso, mostra-se
importante que esta “tabela de preços” seja real e atualizada, porque serve
de base de cálculo às propostas formuladas.

De outro lado, podem ser utilizados qualquer dos modos de disputa


previstos No PL, sejam eles combinados ou não. Quanto aos critérios de

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 25


julgamento, determinou-se, como vimos, que este procedimento auxiliar
poderá utilizar os parâmetros de menor preço ou de maior desconto, mas não,
por exemplo de técnica e preço. E isto vale, inclusive, para a contratação
de serviços e bens de engenharia, ou execução de obras. Mas, como dito,
a seleção da melhor proposta poderá se valer de todos modos de disputa:
fechado, aberto ou combinado, todos eles a serem aplicados nos julgamentos
mencionados. O instrumento convocatório ainda poderá prever mais um
critério de seleção da proposta mais vantajosa, dado que o menor preço poderá
ser aferido pela oferta de desconto sobre tabela de preços praticados no
mercado, desde que tecnicamente justificado.

4 Registro de preços para contratação de bens e serviços, inclusive de obras


e serviços de engenharia

O § 5º do art. 81 do PL permitiu que o Sistema de Registro de Preços (SRP) para


contratação de bens e serviços, inclusive de obras e serviços de engenharia. Esta
providência já era admitida, mas com menor aprofundamento normativo,
pelo Decreto federal 8.080/13: “Sistema de Registro de Preços – SRP –
conjunto de procedimentos para registro formal de preços para contratações
futuras, relativos à prestação de serviços, inclusive de engenharia, de aquisição
de bens e de execução de obras com características padronizadas.”. Em verdade, a
parte final do dispositivo mencionado e não mais vigente já enfrentava – de
maneira corajosa, é certo – um tema divergente. Enfim, hoje, não há mais
dúvidas de ser é possível contratar a execução de serviços de engenharia (ou
quiçá de obras) por este sistema. Tal dispositivo deve ser combinado com o
que dispõe o art. 81: “A Administração poderá contratar a execução de obras e
serviços de engenharia pelo sistema de registro de preços, desde que atendidos
os seguintes requisitos: I – existência de projeto padronizado, sem complexidade
técnica e operacional; II – necessidade permanente ou frequente de obra ou serviço
a ser contratado.”.

Primeiro, importante mencionar que o Tribunal de Contas da União sempre


se posicionou de maneira contrária a esta possibilidade4. Ao mesmo tempo,

4
TCU, Acórdãos nº 296/2007, 2ª Câmara; nº 1.615/2008, Pleno; nº 2.545/2008, Pleno; e nº 1815/2010,
Pleno. E mais recentemente, podemos consultar: TCU, Acórdão nº 2006/2012, Pleno.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 26


a Corte de Contas não impedia que obras e serviços de engenharia fossem
contratados pela modalidade licitatória do pregão5, apesar de que ambas
as espécies de procedimentos reclamam a contratação de objetos serviços
comuns6– o que é bastante curioso. Ainda que o grande desafio consista,
justamente, em definir o que se insere na expressão “serviço comum”7.

A previsão legislativa ora indicada visa a materializar uma necessidade


das entidades contratantes que, por vezes, deparam-se com demandas de
pequenas obras ou serviços padronizados, de baixa complexidade técnica
e operacional, que precisam de contratações frequentes e que por isso se
encaixam na sistemática sistema de registro de preços. Assim, consideramos
que é correta a opção do legislador, em permitir a contratação de serviços
de engenharia pela via do SRP, desde que cumpridas algumas formalidades
específicas. Para tanto, é imprescindível que elas adotem uma metodologia
comum, ou seja, sejam padronizadas. Antes, discutia-se muito se este tipo
de contratação seria viável por esta modalidade de licitação, tendo em
vista que uma obra, no mais das vezes, possui peculiaridades casuísticas e
uma complexidade bastante a inviabilizar um padrão. Contudo, na prática,
percebeu-se que, em certas situações, as obras podem receber uma
padronização que franqueie a contratação pelo registro de preços.

De outro lado, consegue-se, além destas vantagens, propiciar a transparência


quanto aos bens e serviços que são frequentemente contratados, uma
vez que qualquer sujeito tem legitimidade para impugnar preço constante na
tabela geral, quando distorcidos ou incompatíveis com o mercado. Por isto,
é necessário, por exemplo, realização prévia de ampla pesquisa de mercado
(inciso I do § 5º do art. 81), bem como “desenvolvimento obrigatório de rotina
de controle;” (inciso III).

5
TCU, Acordão nº 817/2005, 1ª Câmara; TCU, Acordão nº 2.079/2007, Pleno. Havia julgados do mesmo
TCU que vedavam a utilização de pregão (e de registro de preços) à contratação de equipamentos, obras
ou serviços de engenharia (Acórdão nº 3.605/2014, Pleno; Acórdão nº 980/2018, Pleno).
6
“A Lei 10.520/2002 e o Decreto 5.450/2005 [revogados] amparam a realização de pregão eletrônico para
a contratação de serviços comuns de engenharia, ou seja, aqueles serviços cujos padrões de desempenho e
qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado.”
(TCU, Acórdão nº 286/2007, Pleno).
7
De acordo com o que se manifestou o TCU: “[….] os serviços intelectuais não podem ser
considerados comuns, muito menos repetitivos, a exemplo dos Acórdãos nº 1.615/2008-Plenário, nº
2545/2008-Plenário e nº 1815/2010-Plenário”.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 27


Além disto, conforme o inciso II do § 5º do art. 81 do PL, há de se editar
regulamento que defina objetivamente como serão a seleção e os
procedimentos para a contratação de bens ou serviços de engenharia. Claro
que este dispositivo não poderá contrariar as disposições legais pertinentes.

De outro lado, há de se ter atualização periódica dos preços registrados (inciso


IV), até porque muitos insumos no campo da engenharia variam diariamente,
especialmente aqueles classificados como commodities. Claro que a definição
do período de validade do registro de preços (inciso V) é uma providência
importante, a respeitar o prazo máximo de validade do certame.

E o inciso VI repete a possibilidade de “[…] inclusão, em ata de registro de


preços, do licitante que aceitar cotar os bens ou os serviços com preços
iguais aos do licitante vencedor na sequência de classificação do certame e
do licitante que mantiver sua proposta original.”. Com essa modalidade de
licitação quer-se evitar problemas como o desabastecimento de produtos de
que se necessita corriqueiramente, ou a perda de produtos perecíveis quando
não utilizados. Afinal, consegue-se, com o registro de preços, uma aquisição
corriqueira ou em momentos específicos, evitando-se a burocracia de um
procedimento licitatório complexo. Enfim, visa a regularizar situações em que
não se tem a condição de se ter aquisições uniformes.

5 Objeto do Sistema de Registro de Preços

No art. 81 não se estabeleceu claramente quais seriam os objetos desta


espécie de procedimento auxiliar. Coube genericamente ao inciso XLV do art.
6º do PL dizer que o SRP é aplicável: “[…] a prestação de serviços, obras comuns
e aquisição e locação de bens para contratações futuras”. É de se referir que o
registro de preços, com o tempo, passou a ser considerado um mecanismo
muito eficiente a inúmeros tipos de contratações, porque é notadamente
mais ágil, reduzindo significativamente a necessidade de se realizar um
certame para cada objeto idêntico de que se necessitar. Hoje, permite-se que
este sistema possa ser estendido a serviços e a obras, aplicando-o, assim, a outras
situações (art. 84 da do PL).

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 28


Um exemplo interessante de aplicação do SRP pode aclarar o panorama
exposto: a Administração Pública não tem como prever, de antemão,
quantos medicamentos de determinada espécie estará obrigada a fornecer
durante um ano, ou mesmo terá dificuldade de armazenar todo este plantel
de fármacos, caso os adquira de uma só vez. Com o registro de preços, ela
consegue ir adquirindo a quantidade de remédios aos poucos, de acordo com
a demanda da população. Em certos meses, pode necessitar de uma quantia
diversa daquela comprada em outros períodos. Evita-se, ainda, a sobra de
remédios, caso fosse adquirida quantidade fixa, mas a demanda da população
foi bem aquém deste patamar. Neste caso, corre-se o risco de se ter remédios
descartados pelo vencimento de seu prazo de validade.

Com a intenção de qualificar as compras públicas, o SRP que adotar licitação


por menor preço por lote deverá ser excepcional e sempre acompanhado de
justificativa que comprove cabalmente a inviabilidade de se promover a
adjudicação por item. Imagine que se queira comprar por registro de preços
merenda escolar. Então se faz uma lista de alimentos a ser fornecido aos
estabelecimentos de ensino por semana (por exemplo). No caso, deverá ser
evidenciada a sua vantajosidade técnica e econômica que é melhor licitar
fornecendo preço ao todo de alimentos (lista), em vez de se licitar por item
(v.g. concorrer para, no caso, fornecer o pão, o leite, a fruta etc.). Assim,
adotando-se a licitação por menor preço por lote, deve este pormenor ser
indicado no edital o critério de aceitabilidade de preços unitários máximos – tudo
de acordo com o § 1º do art. 81 do PL –, bem como se exigirá prévia pesquisa de
mercado e demonstração de sua vantajosidade para o órgão ou entidade – § 2º do
mesmo art. 81.

O importante é que demonstre ao mercado uma estimativa de custos, ou seja,


quanto pretende gastar em face de determinada quantidade de produtos,
a fim de parametrizar a licitação por esta modalidade. Segundo o TCU8, as
estimativas servem para fixar os valores máximos a serem contratados.
Esse entendimento é correto e vem ao encontro do próprio interessado,
que saberá o maior quantitativo que poderá ser dele demandado. Esta
providência privilegia, então, a competitividade, estando conforme os
postulados da economicidade, da isonomia, entre outros.

8
TCU, Acórdão nº 4.411/2010, 2ª Câmara.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 29


Além disso, a Administração Pública utiliza o registro de preços não só para
produtos de que necessita periodicamente, mas também para quando está
diante de vários entes estatais interessados em contratar o mesmo objeto. Neste
caso, o mesmo produto pode ser objeto de aquisição por mais de um órgão ou
ente públicos, momento em que se racionaliza o procedimento, permitindo,
é certo, que se franqueiem estas várias pretensões contratuais em um único
certame.

Exemplificando: imagine que vários órgãos (que podem pertencer, inclusive,


a entes federados diversos) pretendam adquirir determinado mobiliário.
Sendo assim, estabelece-se a quantidade que cada um quer negociar e se
faz, em conjunto, um único certame pela modalidade de registro de preços.
Visualizam-se, aqui, duas vantagens: racionalizam-se recursos públicos
(porque se faz um único certame), em vez de cada órgão realizar o seu, bem
como se tem a potencialidade de se conseguir preços melhores ao objeto
licitado, porque a quantidade a ser adquirida é maior. Sem contar no ganho
em celeridade.

Então, o objeto do registro de preçosnão se destina a selecionar um fornecedor


para uma contratação específica, como ocorre com os certames comuns
(gerais). Ao contrário, visa a dar cabo de escolher a melhor proposta para
eventuais contratações sequenciais, escalonadas e não específicas, ou seja, que
podem ocorrer repetidas vezes durante o prazo do registro. Em resumo, o
registro de preços é aplicado:

(a) Quando o objeto tiver de ser entregue de maneira parcelada;

(b) Quando a contratação de produtos forem remunerados por unidade ou os


serviços forem remunerados por tarefa;

(c) Quando se tiver a necessidade de contratações frequentes;

(d) Quando o objeto a ser contratado for de interesse de mais de um órgão ou


se prestar a satisfazer um programa de governo;

(e) Quando não se consegue definir a quantidade a seradquirida no momento de

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 30


se perfazer o certame licitatório9.

No primeiro caso (item “(a)”), ou seja, quando o objeto da contratação


deva ser entregue de modo parcelado, a opção pelo sistema de registro de
preços deve ser adotada com cautela. Esta não poderia ser a justificativa
única para a escolha do SRP, porque de antemão se sabe o quanto se quer
contratar. A peculiaridade, na situação em apreço, restringe-se apenas ao
prazo de entrega, o que pode bem ser definido em um cronograma. Aliás, já
se questionou a contratação de objeto parcelado pelo SRP, quando se sabia,
de antemão, quando seriam entregues as parcelas do objeto contratual, bem
como sua quantidade.

Na hipótese de contratações frequentes, consegue-se perceber um


ganho em celeridade no que se refere à economia de procedimentos
licitatórios. Por consequência e igualmente, intenta-se evitar que se gastem
recursos públicos com a realização do próprio procedimento. Contudo,
quando se está diante de objetos com entrega parcelada (em etapas), a
economia não necessariamente é percebida com mais intensidade, porque,
pragmaticamente, o registro de preços não se diferencia da contratação
comum, cuja entrega do objeto seria feita desta mesma maneira10.

6 Etapas e atos do Sistema de Registro de Preços

Operacionalmente, o registro de preços pode ser resumido em três fases


distintas:

(a) Por primeiro, estabelece uma competição entre os interessados a


contratarem com o Poder Público. Cada qual oferta seus lances, gerando o
registro do licitante vencedor, com seus quantitativos e preços ofertados;

9
Nesse último caso, a vantagem da adoção do registro de preços mostra-se muito congruente, porque se
evitam desperdícios com a contratação de quantitativos maiores do que o realmente necessário. A Corte
de Contas federal declarou que não é incompatível com a lei ou com a Constituição Federal a utilização
desse sistema, que o admite, quando, pela natureza do objeto, não for possível definir previamente o
quantitativo a ser demandado pela Administração (TCU, Acórdão nº 0492/2012, Pleno, j. 07/03/2012).
10
Tanto que o próprio TCU apontou como sendo inadequado o uso do registro de preços em licitação para
objeto de entrega parcelada, porque não se justificava a adoção desta modalidade em relação ao certame
comum (TCU, Acórdão nº 3.272/2010, 2ª Câmara).

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 31


(b) Em um segundo momento, passa-se a colher o registro dos demais
interessados que concordam em praticar os mesmos quantitativos e preços do
primeiro colocado, mantendo-se a ordem de classificação obtida na etapa
inicia. Logo, os demais licitantes podem reduzir seus preços para igualá-los ao
primeiro colocado. Todavia, as novas ofertas não prejudicarão o resultado do
certame em relação ao licitante mais bem classificado;

(c) Após e por fim, registram-se os preços e os quantitativos daqueles que não
praticam os valores do primeiro colocado, na ordem de classificação ordenada
pelos lances respectivos.

No que tange ao instrumento convocatório do registro de preços, deve-se


destacar que não necessariamente se terá de indicar a dotação orçamentária
correspondente – como ocorre com o regime geral de licitações e contratos.
Ao contrário. A menção a este dado surgirá quando da realização da efetiva
contratação, porque, antes – mesmo quando da formação da ata de registro
de preços –, o ente estatal não se obriga a adquirir o objeto licitado. Em
resumo, como o registro de preços não cria obrigações imediatas ao Poder
Público, o certame pode iniciar independentemente de se ter dotação
orçamentária11.

Aliás, a Corte de Contas federal declarou como irrazoável a consecução


de registro de preços para posterior contratação dos valores constantes
exatamente na ata, ou seja, para celebração de contrato com objeto
absolutamente idêntico a este documento que lhe deu origem. Assim, o
tribunal entendeu que o referido objeto deveria ter sido contratado por outra
modalidade licitatória12.

O registro de preços pode ter a participação de mais de um órgão ou ente.


Logo, o certame é feito desde já com a presença de mais de um interessado,
os quais contratarão a partir da ata de preços a ser constituída. Assim,
quando outros órgãos ou entes quiserem participar do procedimento de
registro de preços, deverão manifestar sua intenção ao órgão gerenciador, no
prazo por ele estipulado, bem como concordar com o registro de preços,

11
TCU, Acórdão nº 297/2011, Pleno.
12
TCU, Acórdão nº 113/2012, Pleno.

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 32


indicando sua estimativa de demanda e o cronograma de aquisições. Esta
proposição feita por outro(s) órgão(s) público(s) deverá ser considerada no
montante a ser licitado, ou seja, na estimativa de demanda do SRP. Compete
ao órgão gerenciador deliberar quanto à inclusão posterior de participantes
que não manifestaram interesse durante o período de divulgação da intenção
de registro de preços (art. 85).

7 Contratação direta pelo sistema de registro de preços

Pelos termos do § 6º do art. 81 do PL, o sistema de registro de preços servirá


também como um parâmetro à orçamentação em contratações diretas,
porque poderá ser utilizado nas hipóteses de inexigibilidade e de dispensa
de licitação para a aquisição de bens ou para a contratação de serviços por
mais de um órgão ou entidade. Isto somente poderá ser admitido caso seja
devidamente regulamentado.

Cabe referir que o emprego do SRP às contratações diretas pode ser


admitido por outros entes que não aquele que gerenciou o certame. Enfim, é
permitido, na nossa ótica, a adesão ou o “carona” também em contratações
diretas. Claro que, no caso, deverá se provar que se está a cumprir com os
requisitos fixados para os casos de dispensa ou de inexigibilidade (arts. 73 e 74,
respectivamente).

Sistema de Registro de Preços na Nova Lei de Licitações | Juliano Heinen 33


As modalidades
licitatórias aplicáveis
à contratação de
obras e serviços de
engenharia

Marinês Restelatto Dotti1

1
Advogada da União. Especialista em Direito do Estado e em Direito e Economia pela
Universidade Federal do Estado do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora nos cursos de
Pós-graduação em Direito Público com ênfase em Direito Administrativo da UniRitter
– Laureate International Universities e em Direito Administrativo e Gestão Pública da
Fundação Escola Superior do Ministério Público no Estado do Rio Grande do Sul. Professora
em cursos de extensão: da Escola da Magistratura no Estado do Rio Grande do Sul.
Conferencista na área de licitações e contratações da Administração Pública.

3 de março de 2020

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É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
1. Modalidades licitatórias aplicáveis à execução de obra de engenharia

No atual sistema jurídico de licitações, para que a administração pública


adote a modalidade licitatória correta aplicável às contratações de obras e
serviços de engenharia, faz-se necessária a prévia definição desses objetos.

No que se refere à obra de engenharia, não há na Lei nº 10.520/2002 previsão


acerca da possibilidade de contratação por meio da modalidade licitatória
denominada de pregão. Referido diploma estabelece a utilização da
modalidade para a aquisição de bens e serviços de natureza comum.

No âmbito da administração pública federal há normas a respeito.

O Decreto nº 3.555/2000 é expresso e taxativo na vedação ao uso da


modalidade pregão para a licitação de obra de engenharia, verbis:

Art. 5º A licitação na modalidade de pregão não se aplica às contratações


de obras e serviços de engenharia, bem como às locações imobiliárias e
alienações em geral, que serão regidas pela legislação geral da Administração.

Da mesma forma o Decreto nº 10.024/2019, que disciplina a utilização do


formato eletrônico do pregão:

Art. 4º O pregão, na forma eletrônica, não se aplica a:

I – contratações de obras;

A ausência de previsão na Lei nº 10.520/02 deve ser interpretada no sentido


de que, também no âmbito dos estados, Distrito Federal e municípios, a
modalidade do pregão não pode ser utilizada nas licitações destinadas
à contratação de obras de engenharia. A razão de ser é o princípio da
legalidade, um dos pilares da doutrina administrativista, no qual reside
o dever de o agente público somente agir de acordo com o que a lei
expressamente determina.

A classificação do objeto da licitação como obra, portanto, exige a adoção


de uma das modalidades licitatórias convencionais previstas na Lei

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 35
nº 8.666/1993 (concorrência, tomada de preços ou convite), a ser definida em
razão de seu valor estimado (Decreto federal nº 9.412/2018).

2. As modalidades licitatórias aplicáveis à prestação de serviço de


engenharia

No tocante à licitação cujo objeto seja classificado como serviço de


engenharia, de natureza comum, adota-se a modalidade licitatória pregão,
conforme assentado pelo Tribunal de Contas da União por meio do verbete nº
257 de sua Súmula:

O uso do pregão nas contratações de serviços comuns de engenharia


encontra amparo na Lei nº 10.520/2002.

No âmbito do Decreto nº 10.024/2019, a utilização do pregão, no formato


eletrônico, para as licitações cujo objeto seja a prestação de serviço de
engenharia, encontra o seguinte regramento:

Art. 2º

[…]

§ 1º A utilização da modalidade de pregão, na forma eletrônica, pelos órgãos


da administração pública federal direta, pelas autarquias, pelas fundações e
pelos fundos especiais é obrigatória.

[…]

Art. 3º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

[…]

II – bens e serviços comuns – bens cujos padrões de desempenho e qualidade


possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações
reconhecidas e usuais do mercado;

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 36
III – bens e serviços especiais – bens que, por sua alta heterogeneidade ou
complexidade técnica, não podem ser considerados bens e serviços comuns,
nos termos do inciso II;

[…]

VI – obra – construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação de


bem imóvel, realizada por execução direta ou indireta;

VII – serviço – atividade ou conjunto de atividades destinadas a obter


determinada utilidade, intelectual ou material, de interesse da administração
pública;

VIII – serviço comum de engenharia – atividade ou conjunto de atividades


que necessitam da participação e do acompanhamento de profissional
engenheiro habilitado, nos termos do disposto na Lei nº 5.194, de 24 de
dezembro de 1966, e cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser
objetivamente definidos pela administração pública, mediante especificações
usuais de mercado;

[…]

Art. 4º O pregão, na forma eletrônica, não se aplica a:

[…]

III – bens e serviços especiais, incluídos os serviços de engenharia


enquadrados no disposto no inciso III do caput do art. 3º. (grifei)

Extrai-se, pois, que no âmbito da administração pública federal é obrigatória a


utilização do pregão, no formato eletrônico, quando o objeto for classificado
como serviço comum de engenharia. Sendo classificado como serviço
especial de engenharia, o caminho será a adoção de uma das modalidades
licitatórias convencionais previstas na Lei nº 8.666/1993 (concorrência,
tomada de preços ou convite), a ser definida em razão de seu valor estimado.

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 37
3. Distinção entre obra e serviço de engenharia na Lei nº 8.666/1993

Na Lei nº 8.666/1993 extrai-se o seguinte conceito de obra:

Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:

I – Obra – toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação,


realizada por execução direta ou indireta;

No tocante ao serviço, o art. 6º, II, da mesma Lei, assim o conceitua:

Serviço – toda atividade destinada a obter determinada utilidade de


interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação,
montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção,
transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico-
profissionais;

Veja-se que a Lei nº 8.666/1993 apresenta um conceito amplo de serviço,


sem detalhar, com maior precisão, o serviço de engenharia.

Para os agentes públicos que atuam na área de licitações e contratos a


distinção entre obra e serviço de engenharia é fundamental, pois a partir dela
(distinção) define-se a modalidade licitatória aplicável.

4. Distinção entre obra e serviço de engenharia no Projeto de Lei nº 1292,


de 1995

No Projeto de Lei nº 1292, de 1995, que almeja revogar a Lei nº 8.666/1993, a


Lei nº 10.520/2002 e, também, a Lei nº 12.462/2011 (Regime Diferenciado
de Contratações Públicas – RDC), os conceitos de obra e serviço estão assim
dispostos :

Art. 6º

[…]

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 38
XI – serviço: atividade ou conjunto de atividades destinadas a obter
determinada utilidade, intelectual ou material, de interesse da
Administração;

XII – obra: toda atividade estabelecida, por força de lei, como privativa
das profissões de arquiteto e engenheiro que implica intervenção no meio
ambiente por meio de um conjunto harmônico de ações que, agregadas,
formam um todo que inova o espaço físico da natureza ou acarreta alteração
substancial das características originais de bem imóvel; (grifei)

O Projeto de Lei, diferentemente da Lei nº 8.666/1993, preocupou-se em


definir o serviço de engenharia. Confira-se:

Art. 6º

XXI – serviço de engenharia: toda atividade ou conjunto de atividades


destinadas a obter determinada utilidade, intelectual ou material, de
interesse para a Administração e que, não enquadradas no conceito de obra
a que se refere o inciso XII do caput deste artigo, são estabelecidas, por
força de lei, como privativas das profissões de arquiteto e engenheiro ou de
técnicos especializados, que compreendem: (grifei)

Com maior precisão, o texto do Projeto de Lei, ainda, conceitua serviço


comum de engenharia e serviço especial de engenharia. Assim:

Art. 6º

[…]

XXI […]

a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por


objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e
qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e

b) serviço especial de engenharia: aquele que, por sua alta heterogeneidade


ou complexidade, não pode se enquadrar na definição constante da alínea a

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 39
deste inciso; (grifei)

As definições apresentadas no Projeto de Lei nº 1292, de 1995, no tocante à


obra, serviço, serviço de engenharia, serviço comum de engenharia e serviço
especial de engenharia visam a subsidiar o agente público quanto à escolha
da modalidade licitatória aplicável ao específico objeto.

Apropriado seria, no novo marco legal, a adoção do modelo instituído no


Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC (art. 12 da Lei nº
12.462/2011), o qual não contempla modalidades licitatórias, mas, tão-
somente, um rito procedimental ordinário, aplicável, indistintamente, a
qualquer desses objetos. O rito ordinário do RDC segue o paradigma do
pregão (apresentação de propostas, fase de lances, julgamento, análise
dos documentos de habilitação do licitante classificado em primeiro lugar,
recurso, adjudicação e homologação), em razão das vantagens produzidas
por essa modalidade, tais como: celeridade, ampliação da disputa, sobretudo
quando adotado o formato eletrônico, e economicidade, esta decorrente da
ampliação da competitividade e da existência de fase de lances.

Vejam-se que as definições apresentadas na Lei nº 8.666/1993 e no


Projeto de Lei nº 1292, de 1995 (nada obstante o maior detalhamento
existente no texto do novo marco legal), não são precisas o suficiente para
o reconhecimento seguro do que seja obra ou serviço de engenharia, ou
seja, não são aptas o suficiente para subsidiarem, com exatidão, a distinção
desses objetos. Será necessário, por óbvio, avaliar cada caso concreto e suas
peculiaridades para o efeito de distinguirem-se ambos os objetos.

5. Resolução nº 1.116, de 26 de abril de 2019 (Conselho Federal de


Engenharia e Agronomia – CONFEA)

A Resolução acima citada dispõe que obras e serviços de engenharia e de


agronomia, por exigirem habilitação legal para sua elaboração ou execução,
com a emissão da Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, constituem-
se em serviços técnicos especializados. Assim:

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 40
Art. 1º Estabelecer que as obras e os serviços de Engenharia e de Agronomia,
que exigem habilitação legal para sua elaboração ou execução, com a emissão
da Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, são serviços técnicos
especializados.

§ 1° Os serviços são assim caracterizados por envolverem o desenvolvimento


de soluções específicas de natureza intelectual, científica e técnica, por
abarcarem risco à sociedade, ao seu patrimônio e ao meio ambiente, e por sua
complexidade, exigindo, portanto, profissionais legalmente habilitados e com
as devidas atribuições.

§ 2° As obras são assim caracterizadas em função da complexidade e


da multiprofissionalidade dos conhecimentos técnicos exigidos para o
desenvolvimento do empreendimento, sua qualidade e segurança, por
envolver risco à sociedade, ao seu patrimônio e ao meio ambiente, e por
demandar uma interação de concepção físico-financeira que determinará a
otimização de custos e prazos, exigindo, portanto, profissionais legalmente
habilitados e com as devidas atribuições.

Ao definir serviço de engenharia como sendo serviço técnico especializado,


a Resolução nº 1.116, de 26/04/2019 – CONFEA, reflexamente, afasta a
utilização da modalidade pregão.

De salientar-se que a Resolução citada não tem força restritiva quanto


à utilização da modalidade pregão nas licitações que visem a prestação
de serviço de engenharia. Há regramento jurídico específico dispondo a
respeito, conforme demonstrado neste texto.

Ademais, caberá à autoridade competente solicitar parecer técnico a


profissional habilitado (engenheiro, arquiteto) acerca da classificação correta
do objeto da licitação como obra, serviço de engenharia, serviço comum
de engenharia ou serviço especial de engenharia, decidindo, a partir da
conclusão técnica aplicável ao caso específico, a respeito da utilização da
modalidade licitatória adequada, conforme regramento jurídico vigente.

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 41
6. Orientação Técnica IBR 002/2009, do Instituto Brasileiro de Auditoria de
Obras Públicas – IBRAOP

Registre-se que a Orientação Técnica IBR 002/2009, do Instituto Brasileiro


de Auditoria de Obras Públicas – IBRAOP (www.ibraop.org.br), constitui
importante instrumento a guiar a elaboração de parecer técnico ou laudo, por
profissional habilitado, sobre o enquadramento do objeto da licitação como
obra ou serviço de engenharia.

7. As modalidades licitatórias aplicáveis à execução de obras e à prestação


de serviços de engenharia no Projeto de Lei nº 1292, de 1995

No Projeto de Lei nº 1292, de 1995, assim estão dispostos os artigos


atinentes à aquisição de bens, à execução de obras e à prestação de serviços,
incluindo-se os de engenharia, bem como as modalidades licitatórias
aplicáveis à contratação desses objetos, os critérios de julgamento de
propostas e o rito procedimental a ser adotado de forma ordinária:

Art. 6º

[…]

XXI – serviço de engenharia: toda atividade ou conjunto de atividades


destinadas a obter determinada utilidade, intelectual ou material, de
interesse para a Administração e que, não enquadradas no conceito de obra
a que se refere o inciso XII do caput deste artigo, são estabelecidas, por
força de lei, como privativas das profissões de arquiteto e engenheiro ou de
técnicos especializados, que compreendem:

a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por


objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e
qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e
imóveis, com preservação das características originais dos bens;

b) serviço especial de engenharia: aquele que, por sua alta heterogeneidade


ou complexidade, não pode se enquadrar na definição constante da

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 42
alínea a deste inciso;

[…]

XXXVIII – concorrência: modalidade de licitação para contratação de bens


e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia,
cujo critério de julgamento poderá ser:

a) menor preço;

b) melhor técnica ou conteúdo artístico;

c) técnica e preço;

d) maior retorno econômico;

e) maior desconto;

[…]

XLI – pregão: modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e


serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou
o de maior desconto;

[…]

Art. 17. O processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência:

I – preparatória;

II – de divulgação do edital de licitação;

III – de apresentação de propostas e lances, quando for o caso;

IV – de julgamento;

V – de habilitação;

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 43
VI – recursal;

VII – de homologação.

§ 1º A fase referida no inciso V do caput deste artigo poderá, mediante ato


motivado com explicitação dos benefícios decorrentes, anteceder as fases
referidas nos incisos III e IV do caput deste artigo, desde que expressamente
previsto no edital de licitação.

[…]

Art. 28. São modalidades de licitação:

I – pregão;

II – concorrência;

III – concurso;

IV – leilão;

V – diálogo competitivo.

Art. 29. A concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a


que se refere o art. 17 desta Lei, adotando-se o pregão sempre que o objeto
possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente
definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado.

Parágrafo único. O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos


especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e
serviços de engenharia, exceto os serviços de engenharia de que trata a
alínea a do inciso XXI do caput do art. 6º desta Lei.

Modalidades licitatórias

7.1 quadro representativo

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 44
Sistematizam-se, a seguir, os objetos licitáveis, as modalidades licitatórias,
os critérios de julgamento de propostas e o rito procedimental previstos no
Projeto de Lei nº 1292, de 1995, por meio do seguinte quadro representativo:

CRITÉRIO DE
OBJETO MODALIDADE JULGAMENTO RITO
DE PROPOSTA

Menor
Concorrência
preço Melhor
(art. 6º, inciso preparatória; de divulgação
técnica ou
XXXVIII) do edital de licitação; de
conteúdo
Serviço comum Pregão (art. apresentação de propostas e
artístico
de engenharia 29, parágrafo lances, quando for o caso; de
Técnica e preço
único c/c o art. julgamento; de habilitação;
Maior retorno
6º, inciso XXI, recursal; de homologação.
econômico Maior
alínea “a”)
desconto

Menor
preço Melhor
preparatória; de divulgação
técnica ou
do edital de licitação; de
Serviço Concorrência conteúdo
apresentação de propostas e
especial de (art. 6º, inciso artístico
lances, quando for o caso; de
engenharia XXXVIII) Técnica e preço
julgamento; de habilitação;
Maior retorno
recursal; de homologação.
econômico Maior
desconto

Menor
preço Melhor
preparatória; de divulgação
Concorrência técnica ou
do edital de licitação; de
(art. 6º, inciso conteúdo
Obra de apresentação de propostas e
XXXVIII e art. artístico
engenharia lances, quando for o caso; de
29, parágrafo Técnica e preço
julgamento; de habilitação;
único) Maior retorno
recursal; de homologação.
econômico Maior
desconto

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 45
preparatória; de divulgação
do edital de licitação; de
Serviços Pregão (art. 6º, Menor preço ou apresentação de propostas e
comuns inciso XLI) maior desconto lances, quando for o caso; de
julgamento; de habilitação;
recursal; de homologação.

Menor
preço Melhor
preparatória; de divulgação
técnica ou
do edital de licitação; de
Concorrência conteúdo
Serviços apresentação de propostas e
(art. 6º, inciso artístico
especiais lances, quando for o caso; de
XXXVIII) Técnica e preço
julgamento; de habilitação;
Maior retorno
recursal; de homologação.
econômico Maior
desconto

preparatória; de divulgação
do edital de licitação; de
Pregão (art. 6º, Menor preço ou apresentação de propostas e
Bens comuns
inciso XLI) maior desconto lances, quando for o caso; de
julgamento; de habilitação;
recursal; de homologação.

Menor
preço Melhor
preparatória; de divulgação
técnica ou
do edital de licitação; de
Concorrência conteúdo
apresentação de propostas e
Bens especiais (art. 6º, inciso artístico
lances, quando for o caso; de
XXXVIII) Técnica e preço
julgamento; de habilitação;
Maior retorno
recursal; de homologação.
econômico Maior
desconto

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 46
Menor
preço Melhor
Concorrência preparatória; de divulgação
técnica ou
Serviços Concurso do edital de licitação; de
conteúdo
técnicos Diálogo apresentação de propostas e
artístico
especializados competitivo lances, quando for o caso; de
Técnica e preço
de natureza (arts 28 e 29, julgamento; de habilitação;
Maior retorno
parágrafo único) recursal; de homologação.
econômico Maior
desconto

O Projeto de Lei nº 1292, de 1995, contempla modalidades licitatórias


distintas (pregão, concorrência, concurso, leilão e diálogo competitivo) e
rito procedimental ordinário aplicável a todas elas (modalidades). Ideal que
o novo marco legal seguisse o modelo adotado no Regime Diferenciado de
Contratações Públicas – RDC (Lei nº 12.462/11), ou seja, não contemplasse
modalidades licitatórias. Nesse regime jurídico de licitações (RDC) há um rito
ordinário aplicável para o processamento da licitação, idêntico ao do pregão,
admitindo-se, excepcional e justificadamente, a inversão de fases.

Veja-se, no Projeto de Lei nº 1292, de 1995, o peculiar caso dasmodalidades


pregão e concorrência, ambas aplicáveis às licitações que visem a contratação
de serviço comum de engenharia: qual o sentido de manter-se a previsão
dessas duas modalidades no novo marco legal, aplicáveis ao mesmo objeto
(serviço comum de engenharia), quando o rito procedimental é o mesmo para
ambas?Isso acarretará dúvida por parte dos agentes públicos que atuam nos
processos de licitação, ou seja, dúvida sobre qual modalidade licitatória será
a adequada para o caso específico, ensejando apontamentos pelos órgãos de
controle quando a solução adotada não for a acertada.

Mantida a atual redação no texto do Projeto de Lei, quer dizer, mantidas as


modalidades licitatórias expressamente previstas (pregão, concorrência,
concurso, leilão e diálogo competitivo) e, ainda, a duplicidade de modalidades
(concorrência e pregão) aplicáveis à prestação de serviço comum de
engenharia, o caminho para o gestor público será o de buscar um parecer
técnico emitido por profissional habilitado (engenheiro, arquiteto) a respeito
da correta classificação do objeto. Não existindo o referido profissional,
colherá a opinião de um especialista, pessoa física ou jurídica, cuja

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 47
contratação poderá efetivar-se por meio de inexigibilidade de licitação (art.
73, inciso III, alíneas “a” e “b”). Essa contratação direta, sublinhe-se-se, seria
desnecessária se o texto do novo marco legal adotasse um rito ordinário
comum aplicável às licitações da administração pública, como o fez o RDC.

Sublinhe-se que a assessoria jurídica não possui conhecimento nem


qualificação específica para responder à dúvida a respeito da classificação do
objeto da licitação como obra ou serviço de engenharia ou, ainda, em relação
à natureza deste último (comum ou especial), sendo certo que, ao receber
pedido de parecer a respeito, deverá encaminhá-lo ao agente ou setor de
engenharia qualificado para esse fim.

Dispõe a Orientação Normativa nº 54, de 25 abril de 2014, da Advocacia-


Geral da União, que compete ao agente ou setor técnico da administração
declarar que o objeto licitatório é de natureza comum para efeito de
utilização da modalidade pregão e definir se o objeto corresponde a obra ou
serviço de engenharia, sendo atribuição do órgão jurídico analisar o devido
enquadramento da modalidade licitatória aplicável.

As modalidades licitatórias aplicáveis à contratação de obras e serviços de engenharia |


Marinês Restelatto Dotti 48
A inexigibilidade
de licitação para a
contratação de serviços
jurídicos à luz da nova
Lei de Licitações

Tatiana Camarão1

1
Mestre em Direito Administrativo pela UFMG. Assessora Técnica Especializada
de Presidência do TJMG. Diretora-secretária do Instituto Mineiro de Direito
Administrativo – IMDA. Palestrante. Professora Universitária.

7 de abril de 2021

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração desses direitos.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
No dia 1º de abril foi publicada a Lei nº 14.133/2021, novo marco regulatório
das contratações públicas e várias dúvidas têm sido levantadas com
relação a possibilidade de contratação direta de serviços jurídicos por
meio da inexigibilidade de licitação, já que fixada outra configuração para o
enquadramento das hipóteses exemplificativas elencadas no art. 74, sem a
exigência da demonstração da singularidade do objeto.

Considerando que esse modal de contratação se tornou assunto instigante


e tem sido pano de fundo para o contínuo ajuizamento de ações de
improbidade administrativa pelo Ministério Público, torna-se imprescindível
para a adequada aplicação da norma sua perfeita compreensão considerando
o novo cenário.

Segundo o art. 74, inciso III, da nova lei, é inexigível a licitação quando houver
inviabilidade de competição, em especial nos casos de:

III – contratação dos seguintes serviços técnicos especializados de natureza


predominantemente intelectual com profissionais ou empresas de notória
especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e
divulgação:

a) estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos ou projetos executivos;

b) pareceres, perícias e avaliações em geral;

c) assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

(…)

e) patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; (…)

O § 3º desse artigo estabelece que a notória especialização do profissional


ou da empresa será demonstrada pela especialidade no campo de atuação
que vai decorrer de desempenho anterior, estudos, experiência, publicações,
organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos
relacionados com suas atividades, que permita inferir que o seu trabalho
é essencial e reconhecidamente adequado à plena satisfação do objeto do

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 50
contrato.

A lei, também, deixa assentado que nessas contratações é vedada a


subcontratação de empresas ou a atuação de profissionais distintos daqueles
que tenham justificado a inexigibilidade (art. 74, § 4º).

Como já dito, a nova lei excluiu da hipótese de incidência da inexigibilidade


de licitação, a necessidade de demonstração de que o serviço deva possuir
natureza singular, atenuando as interpretações equivocadas com relação a
aplicação dessa expressão, que passou a ser considerada como algo raro e
exclusivo.

Em verdade, um serviço singular é aquele que demanda do seu prestador


conhecimento aprofundado e, por isso, trata-se de atividade diferenciada,
mas jamais única ou exclusiva.

A propósito o Ministro Dias Tóffoli já se manifestou sobre o tema, pontuando


que serviços singulares são aqueles que demandam “primor técnico
diferenciado, detido por pequena ou individualizada parcela de pessoas, as
quais imprimem neles características diferenciadas e pessoais. Trata-se de
serviços cuja especialização requer aporte subjetivo, o denominado ‘toque
do especialista’, distinto de um para outro, o qual os qualifica como singular,
tendo em vista a inviabilidade de comparar com objetividade a técnica
pessoal, a subjetividade, a particular experiência de cada qual dos ditos
especialistas, falecendo a possibilidade de competição”1.

A retirada da singularidade como elemento essencial para efeito de


enquadramento na hipótese de inexigibilidade de licitação não pode ser
desconsiderada pelos aplicadores do direito. Tem uma razão de ser. O
legislador infralegal teve o firme propósito de deixar claro que o serviço
não precisa ser único, tampouco complexo ou exclusivo, mas, sim, que ele
demanda do seu executor conhecimento, habilidade e aptidão específica,
adequada e, de plano, comprovável.

No que diz respeito aos serviços jurídicos, outra não deve ser a orientação,

1
TCU, Acórdão nº 1.273/2015 – Plenário.

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 51
devendo qualquer outra interpretação ser combatida com veemência.

Não há dúvidas de que a contratação de serviços jurídicos pode e deve ser


enquadrada como inexigibilidade por inviabilidade de competição, pois,
em tese, podem haver dois ou mais juristas tão qualificados quanto para a
pretendida solução, não sendo possível compará-los, seja em razão do preço
do serviço ou em razão de técnica.

Como estabelecer a competição se cada causídico tem sua habilidade e


destreza técnica próprias? Como comparar a natureza do trabalho por
eles prestado, dada a subjetividade do objeto? É inegável que o êxito
de um processo judicial ou administrativo depende da condução do seu
patrocinador, e não apenas do valor proposto. Por isso, a confiança na
qualidade da execução do serviço também exterioriza a dificuldade de
estabelecer critérios objetivados de escolha, elemento essencial para
justificar a licitação.

Outro elemento a fortalecer a tese de inviabilidade de competição da


contratação de serviços jurídicos e que não pode ser desconsiderado
diz respeito ao requisito confiança, que é premissa atrelada a escolha do
prestador de serviço para se buscar o que é melhor para o poder público.

O Supremo Tribunal Federal também considera a confiança um elemento


impactante para caracterização da inviabilidade. Vejamos:

EMENTA: I. Habeas corpus: prescrição: ocorrência, no caso, tão-somente


quanto ao primeiro dos aditamentos à denúncia (L. 8.666/93, art. 92),
ocorrido em 28.9.93. II. Alegação de nulidade da decisão que recebeu
a denúncia no Tribunal de Justiça do Paraná: questão que não cabe ser
analisada originariamente no Supremo Tribunal Federal e em relação à
qual, de resto, a instrução do pedido é deficiente. III. Habeas corpus: crimes
previstos nos artigos 89 e 92 da L. 8.666/93: falta de justa causa para a
ação penal, dada a inexigibilidade, no caso, de licitação para a contratação
de serviços de advocacia. 1. A presença dos requisitos de notória
especialização e confiança, ao lado do relevo do trabalho a ser contratado,
que encontram respaldo da inequívoca prova documental trazida, permite
concluir, no caso, pela inexigibilidade da licitação para a contratação dos

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 52
serviços de advocacia. 2. Extrema dificuldade, de outro lado, da licitação
de serviços de advocacia, dada a incompatibilidade com as limitações
éticas e legais que da profissão (L. 8.906/94, art. 34, IV; e Código de Ética e
Disciplina da OAB/1995, art. 7º).

Por fim, outro ponto caracterizador da inviabilidade de licitação diz respeito


a segurança quanto à sua boa execução, questão não mensurável, a ratificar
a impossibilidade de competição e sepultar qualquer dúvida quanto à
legalidade do enquadramento dos serviços advocatícios na hipótese de
inexigibilidade.

Superada a questão da exigência da demonstração da singularidade


do serviço como elemento caracterizador da contratação direta por
inexigibilidade de licitação, faz-se importante destacar que a nova lei
fez referência, no seu art. 8º, § 4º, acerca da possibilidade de contratação
de empresa ou profissional especializado, por prazo determinado,
para assessorar os agentes públicos responsáveis pela condução da
licitação, quando envolver bens ou serviços especiais cujo objeto não seja
rotineiramente contratado pela Administração.

Como se pode ver, a lei traz o contorno de avaliação que deve ser considerado
para efeito de aplicação da norma, isto é, descobrir se o serviço é rotineiro ou
comum para efeito de desqualificá-lo como passível via contratação direta.

A questão que se coloca é saber o que é habitual ou não na unidade


administrativa. Um determinado serviço pode se apresentar trivial para um
ente público e incomum para outro, a exemplo de uma concessão de serviço
público que pode ser trivial para um município de grande porte e complexo
para um município menor.

E tem mais: há serviços que muita embora sejam rotineiros têm


especificidades que fogem a categoria de atividade comum e típica da
organização. Um bom exemplo são os novos procedimentos e estruturas
previstas na nova lei, como o diálogo competitivo e a central de compras.

Até mesmo a adequação dos órgãos e entidades públicas à nova lei pode
demandar apoio de consultoria jurídica especializada, já que o corpo próprio

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 53
de procuradores, muitas vezes, não detém o conhecimento abrangente,
sistêmico e aprofundado que se faz necessário para implantação das regras,
sistemas, programas e processos estabelecidos pela novel legislação.

Não dá para argumentar, ainda, que a existência de um corpo de advogados


públicos disponíveis não permite a contratação direta. A bem da verdade,
o art. 74, §3º, é no sentido de que todo e qualquer serviço advocatício, que
pode envolver consultoria técnica, parecer, ou patrocínio ou defesa de causas
judiciais ou administrativas, pode ser contratado de modo direto, desde
que respeitada a hipótese de notório saber do profissional ou sociedade
contratada. O referido artigo não diz que o órgão ou entidade que possuir
corpo próprio de advogados não possa se valer da inexigibilidade.

Segundo voto da lavra do Ministro Dias Toffoli, no Recurso Extraordinário n°


656.558, a administração pública pode contratar advogados sem licitação,
quando houver real necessidade e nenhum impedimento legal, mesmo se
tiver procuradores concursados.

Uma outra situação que desponta diz respeito à retração econômica, crise
fiscal e reforma da previdência, que acabaram comprometendo a estrutura
das procuradorias e contratação de novos servidores e realização de
concursos, gerando exiguidade de pessoal para execução das atividades
próprias da área e necessidade de apoio de consultoria jurídica.

Não se pode também desconsiderar as diversidades regionais e sobretudo


municipais em um país de dimensões continentais, com mais de 5000
municípios com realidades tão distintas, submetidos de igual modo a uma
mesma lei de aplicação nacional.

Como podemos ver são inúmeros os fatores e trabalhos de envergadura


que poderão ensejar a necessidade da contratação direta de empresas
ou profissionais de notória especialização para consultoria jurídica:
complexidade ou especificidade da matéria, local da prestação do serviço,
grau de jurisdição, ausência de profissionais com conhecimento e expertise
para realizar o serviço.

É importante destacar que a nova lei prevê um ambiente propício e fértil para

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 54
estimular a governança nas contratações, com vistas a melhoria na eficiência
da aplicação dos recursos públicos e, consequentemente, a oferta de mais
e melhores serviços públicos à sociedade2. Dessa feita, a implantação da
governança, pressupõe uma nova forma de olhar a administração, visando
a implantação de estruturas e aperfeiçoamento qualitativo dos processos
de contratações3, que demandará consultoria específica para adequar a
organização à nova lei no prazo de até 2 anos4 a contar da publicação oficial.

Por fim, é importante alertar que esse novo olhar para as contratações
diretas como instrumento de aperfeiçoamento dos resultados das
contratações públicas deve ser considerado e aplicado na análise perceptiva
dos órgãos de controle evitando que esse tipo de contratação gere
insegurança aos gestores públicos que têm medo de adotar medidas que
possam gerar consequências gravosas no âmbito administrativo e judicial,
tais como processo administrativos e ações de improbidade administrativa.

A bem da verdade, esse olhar sistêmico e casuístico, que não a mera aplicação
seca da lei, já vem sendo exigido desde a entrada em vigor da LINDB, ora
reforçado pelo novo diploma legal das licitações e contratações públicas.

Como podemos ver, a contratação de consultoria jurídica por inexigibilidade


de licitação é possível e necessária para serviços especializados, no intuito
de que órgãos e entidades públicas regulamentem os dispositivos da nova lei
que assim o exigem e implementem as mudanças determinadas, conseguindo
avançar e progredir no atendimento do seu desiderato último que é o
interesse público.

2
TCU, Acórdão nº 1.273/2015 – Plenário.
3
Art. 11, parágrafo único. A alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança
das contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de riscos e controles
internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com
o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente íntegro e
confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e
promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações.
4
Art. 193, inciso II, da Lei nº 14.133/21.

A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços jurídicos à luz da nova Lei


de Licitações | Tatiana Camarão 55
Diálogo competitivo:
o rito de uma nova
modalidade de
licitação

Fernando Mânica1

1
Doutor em Direito pela USP. Mestre em Direito pela UFPR. Pós-Graduado em Direito
do Terceiro Setor pela FGV/SP. Professor do Mestrado Profissional em Direito da
Universidade Positivo/PR. Membro Efetivo da Associación Internacional de Derecho
Administrativo (AIDA). Coordenador Científico da empresa ADVCOM – Consultoria e
Treinamento em Parcerias. Procurador do Estado. Autor de diversos livros e artigos nas
áreas do Direito Administrativo, Terceiro Setor e Gestão da Saúde. Possui experiência
em estruturação, monitoramento e avaliação de parcerias na Administração Pública.

12 de janeiro de 2021

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
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É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
O Projeto de Lei n. 4.253/2020, aprovada pelo Congresso Nacional e
aguardando sanção presidencial, altera de forma substancial e significativa a
Lei Federal n. 8.666/1993, conhecida como Lei de Licitações.

Dentre as alterações promovidas pelo projeto, seu artigo 28 prevê as


modalidades de licitação, incluindo a modalidade “diálogo competitivo” entre
as outras já previstas na lei anterior (pregão, concorrência, concurso e leilão),
sendo as modalidades “tomada de preços” e “convite” excluídas do projeto.

O Projeto de Lei incluiu, ainda, a modalidade do diálogo competitivo como


opção a ser adotada pelo Poder Público nas licitações de concessões de
serviços públicos e parcerias público privadas (artigo 179 e 180 do projeto,
que alteram a Lei Federal n. 8.987/1995 e a Lei Federal n. 11.079/2004).

O artigo 6º, inciso XLII do Projeto de Lei define o diálogo competitivo como
a “modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras
que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente
selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma
ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os
licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos”.

O artigo 32 do Projeto de Lei prevê as hipóteses em que a modalidade diálogo


competitivo poderá ser adotada quando:

1- o objeto a ser contratado envolva inovações tecnológicas ou técnicas;


necessidades do contratante que não possam ser satisfeitas sem a adaptação
de soluções disponíveis no mercado; especificações técnicas que não possam
ser definidas com precisão suficiente pela Administração;

2- a Administração verifique a necessidade de definir e identificar os meios e


as alternativas que possam satisfazer suas necessidades, com destaque para
a solução técnica mais adequada, requisitos técnicos aptos a concretizar a
solução já definida e a estrutura jurídica ou financeira do contrato;

3- a Administração considere que os modos de disputa aberto e fechado não

Diálogo competitivo: o rito de uma nova modalidade de licitação | Fernando Mânica 57


permitem apreciação adequada das variações entre propostas.1

Para adoção da modalidade diálogo competitivo, o Projeto de Lei estabeleceu


regras as quais devem ser observadas pelo órgão ou entidade contratante,
quais sejam:

1- a Administração deverá publicar junto ao edital as necessidades e


exigências já definidas referentes ao objeto a ser contratado;

2- a Administração deverá estabelecer prazo mínimo de 25 (vinte e cinco)


dias úteis para a manifestação de interesse de participação na licitação;

3- vedação à divulgação de informações de modo discriminatório que possa


implicar vantagem para algum licitante;

4- impossibilidade da Administração revelar a outros licitantes as soluções


propostas ou as informações sigilosas comunicadas por um licitante sem o
seu consentimento;

5- a Administração poderá manter a fase de diálogo até que, em decisão


fundamentada, identifique a solução ou as soluções que atendas às suas
necessidades;

6- as reuniões com os licitantes pré-selecionados serão registradas em ata e


gravadas mediante utilização de recursos tecnológicos de áudio e vídeo;

7- a Administração deverá, ao declarar que o diálogo foi concluído:

a) juntar aos autos do processo licitatório os registros e as gravações da fase


de diálogo;

b) iniciar a fase competitiva com a divulgação de edital contendo a


especificação da solução que atenda às suas necessidades e os critérios

1
O artigo 55 do Projeto de Lei define como modo de disputa aberto a “hipótese em que os licitantes
apresentarão suas propostas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes”,
enquanto o modo de disputa fechado é a “hipótese em que as propostas permanecerão em sigilo até a data
e hora designadas para sua divulgação”.

Diálogo competitivo: o rito de uma nova modalidade de licitação | Fernando Mânica 58


objetivos a serem utilizados para seleção da proposta mais vantajosa;

c) abrir prazo mínimo de 60 (sessenta) dias úteis para todos os licitantes


apresentarem suas propostas que deverão conter os elementos necessários
para a realização do projeto;

8- a Administração poderá solicitar esclarecimentos ou ajustes às propostas


apresentadas, desde que não impliquem discriminação ou distorçam a
concorrência entre as propostas.

9- a proposta vencedora será definida pela Administração de acordo com os


critérios divulgados no início da fase competitiva, assegurada a contratação
mais vantajosa;

10- o diálogo competitivo será conduzido por comissão composta por pelo
menos 3 (três) servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes ao
quadro permanente da Administração;

11- admite-se a contratação de profissionais para assessoramento técnico da


comissão, os quais devem assinar termo de confidencialidade e deverão se
abster de atividades que possam configurar conflito de interesses;

12- órgãos de controle externo podem acompanhar e monitorar os diálogos


competitivos e podem opinar, no prazo máximo de 40 (quarenta) dias úteis,
sobre a legalidade, legitimidade e economicidade da licitação, antes da
celebração do contrato.

O Edital deve prever os critérios empregados para pré-seleção dos licitantes,


sendo admitidos todos os interessados que preencherem os requisitos
objetivos estabelecidos.

O Edital pode prever a realização de fases sucessivas, caso em que cada fase
poderá restringir as soluções ou as propostas a serem discutidas.

RITO:

Diálogo entre a Administração Pública e os particulares:

Diálogo competitivo: o rito de uma nova modalidade de licitação | Fernando Mânica 59


Diálogo competitivo: o rito de uma nova modalidade de licitação | Fernando Mânica 60
99 destaques da nova
Lei de Licitações

Marinês Restelatto Dotti1

1
Advogada da União. Especialista em Direito do Estado e em Direito e Economia
pela Universidade Federal do Estado do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora nos
cursos de Pós-graduação em Direito Público com ênfase em Direito Administrativo da
UniRitter – Laureate International Universities e em Direito Administrativo e Gestão
Pública da Fundação Escola Superior do Ministério Público no Estado do Rio Grande
do Sul. Professora em cursos de extensão: da Escola da Magistratura no Estado do Rio
Grande do Sul. Conferencista na área de licitações e contratações da Administração
Pública.

26 de fevereiro de 2021

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração desses direitos.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
O novo marco legal das licitações (PL 4253, de 2020, aguardando
sanção presidencial) repete artigos conhecidos da antiga Lei Geral de
Licitações (Lei nº 8.666/1993), da Lei do Pregão (Lei nº 10.520/2002), da
Instrução Normativa SEGES/MPDG nº 5, de 2017, assim como, incorpora
disposições do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC (Lei
nº 12.462/2011), da jurisprudência do Tribunal de Contas da União, dos
Decretos federais nº 10.024/2019 e nº 7.892/2013 e, até, do estatuto
jurídico das empresas estatais (Lei nº 13.303/2016).

A Lei nº 8.666/1993, a Lei nº 10.520/2002 e o Regime Diferenciado de


Contratações Públicas (artigos 1º a 47 da Lei nº 12.462/2011), conforme
se extrai do novo texto, serão revogados após decorridos dois anos da
publicação oficial da nova lei, traduzindo-se na opção do administrador,
durante esse período, pela utilização do regime jurídico licitatório tradicional
(inclusive na modalidade do pregão) ou diferenciado, ou pela utilização
do novo marco legal das licitações. É vedado à administração pública,
durante o citado período de dois anos, combinar regras existentes na Lei
nº 8.666/1993, na Lei nº 10.520/2002 e no RDC com as existentes no novo
marco legal, criando sistema híbrido de licitação ou de contratação direta.

As disposições do novo marco legal das licitações poderão ser aplicadas,


de forma subsidiária, à Lei nº 8.987/1995 (dispõe sobre o regime de
concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art.
175 da Constituição Federal), à Lei nº 11.079/2004 (institui normas gerais
para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da
administração pública) e à Lei nº 12.232/2010 (dispõe sobre as normas
gerais para licitação e contratação pela administração pública de serviços de
publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda e dá outras
providências).

Relacionam-se, a seguir, os principais destaques do novo diploma:

1. Regulamento federal

Estados, Distrito Federal e os Municípios poderão aplicar os regulamentos


editados pela União para execução da nova lei, salutar medida que conferirá
uniformização na aplicação das normas e, também, da atuação dos agentes

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 62


públicos envolvidos nesses processos;

2. Diretrizes

Passam a constar, expressamente, no texto legal, as diretrizes da segregação


de funções (o qual veda a designação do mesmo agente público para
atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, de modo a
reduzir a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes
na respectiva contratação) e do planejamento (a partir de documentos de
formalização de demandas, os órgãos responsáveis pelo planejamento de
cada ente federativo poderão, na forma de regulamento, elaborar plano
de contratações anual, com o objetivo de racionalizar as contratações dos
órgãos e entidades sob sua competência, garantir o alinhamento com o
seu planejamento estratégico e subsidiar a elaboração das respectivas leis
orçamentárias);

3. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro

Na aplicação da nova lei deverão ser observadas as disposições do


Decreto-Lei nº 4.657/1942, alterado pela Lei nº 13.655/2018; uma de suas
disposições, a título ilustrativo, estabelece que nas esferas administrativa,
controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos
abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão;

4. Entidades de menor porte

(a) de acordo com o novo marco legal das licitações, o tratamento privilegiado
concedido às entidades de menor porte (microempresas e empresas
de pequeno porte), previsto nos artigos 42 a 49 da Lei Complementar
nº 123/2006 (ex.: prazo especial para regularizar as situações fiscal e
trabalhista e empate ficto) não será aplicado quando o valor estimado do
item ou objeto da contratação ultrapassar a cifra de R$4.800.000,00 (quatro
milhões e oitocentos mil reais); (b) no entanto, o tratamento privilegiado
previsto nos artigos 42 a 49 da Lei Complementar nº 123/2006 será
concedido às entidades de menor porte que, no ano-calendário de realização
da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a administração
pública cujos valores somados extrapolem a cifra de R$4.800.000,00

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 63


(quatro milhões e oitocentos mil reais), devendo o órgão ou entidade exigir
do licitante declaração de observância desse limite na licitação; (c) nas
contratações com prazo de vigência superior a 1 (um) ano, será considerado o
valor anual do contrato para o efeito de limitação do tratamento privilegiado
concedido às entidades de menor porte;

5. Modalidades licitatórias

Pregão; concorrência; concurso; leilão; e diálogo competitivo;

6. Procedimentos auxiliares

Credenciamento; pré-qualificação; procedimento de manifestação de


interesse; sistema de registro de preços; e registro cadastral;

7. Critérios de julgamento

Menor preço; maior desconto; melhor técnica ou conteúdo artístico;


técnica e preço; maior lance, no caso de leilão; e maior retorno econômico
(utilizado exclusivamente para a celebração de contrato de eficiência, o qual
considerará a maior economia para a administração, sendo a remuneração
fixada em percentual que incidirá de forma proporcional à economia
efetivamente obtida na execução do contrato);

8. Critérios de julgamento/serviços técnicos especializados

Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, na licitação para a


contratação de alguns dos serviços técnicos especializados de natureza
predominantemente intelectual indicados na lei, cujo valor estimado da
contratação seja superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), o julgamento
será por melhor técnica ou técnica e preço, na proporção de 70% (setenta por
cento) de valoração da proposta técnica;

9. Modos de disputa

O modo de disputa poderá ser, isolada ou conjuntamente: (a) aberto, hipótese


em que os licitantes apresentarão suas propostas por meio de lances públicos

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 64


e sucessivos, crescentes ou decrescentes; (b) fechado, hipótese em que as
propostas permanecerão em sigilo até a data e hora designadas para sua
divulgação;

10. Intervalo mínimo de diferença de valores entre os lances

O edital de licitação poderá estabelecer intervalo mínimo de diferença


de valores entre os lances, que incidirá tanto em relação aos lances
intermediários quanto em relação à proposta que cobrir a melhor oferta;

11. Definição das demais colocações no certame

Após a definição da melhor proposta, se a diferença em relação à proposta


classificada em segundo lugar for de pelo menos 5% (cinco por cento), a
administração poderá admitir o reinício da disputa aberta, nos termos
estabelecidos no instrumento convocatório, para a definição das demais
colocações;

12. Bens e serviços especiais

São aqueles que, por sua alta heterogeneidade ou complexidade, não podem
ser descritos como comuns, exigida justificativa prévia do contratante,
atraentes da utilização da modalidade licitatória concorrência;

13. Artigos de luxo

Vedação à aquisição de artigos de luxo, competindo aos Poderes Executivo,


Legislativo e Judiciário definirem em regulamento os limites para o
enquadramento dos bens de consumo nessa categoria; a partir de 180
(cento e oitenta) dias contados da promulgação da Lei, novas compras de
bens de consumo só poderão ser efetivadas com a edição, pela autoridade
competente, do regulamento citado;

14. Grande vulto

Obras, serviços, locações e fornecimentos de grande vulto são aqueles cujo


valor estimado supere a cifra de R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de

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reais);

15. Fornecimentos contínuos

São as compras realizadas pela administração pública para a manutenção


da atividade administrativa, decorrentes de necessidades permanentes ou
prolongadas, cuja vigência contratual poderá alcançar o prazo de dez anos;

16. Serviços técnicos especializados

Passam a integrar a categoria de serviços técnicos especializados de natureza


predominantemente intelectual os trabalhos relativos a controles de
qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais,
instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do
meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem nessas
espécies;

17. Serviço contratado por escopo

Impõe ao contratado o dever de realizar a prestação de um serviço


especifico em período predeterminado, podendo ser prorrogado, desde que
justificadamente, pelo prazo necessário à conclusão do objeto;

18. Horas de serviço ou postos de trabalho

Nas licitações de serviços em geral, é vedada a adoção de critério de


remuneração do contratado com base em horas de serviço ou em postos de
trabalho, ressalvadas situações excepcionais devidamente justificadas;

19. Remuneração variável

(a) na contratação de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de


engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao
desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade,
critérios de sustentabilidade ambiental e prazos de entrega definidos no
edital de licitação e no contrato; (b) o pagamento poderá ser ajustado em
base percentual sobre valor economizado em determinada despesa, quando

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o objeto do contrato visar à implantação de processo de racionalização,
hipótese em que as despesas correrão à conta dos mesmos créditos
orçamentários, na forma de regulamentação específica; (c) a utilização de
remuneração variável será motivada e respeitará o limite orçamentário
fixado pela administração para a contratação;

20. Contratação de mais de uma empresa para execução do mesmo serviço

A administração poderá, mediante justificativa expressa, contratar mais de


uma empresa ou instituição para executar o mesmo serviço, desde que essa
contratação não implique perda de economia de escala, quando: (a) o objeto
da contratação puder ser executado de forma concorrente e simultânea
por mais de um contratado; e (b) a múltipla execução for conveniente para
atender à administração;

21. Serviço especial de engenharia

Serviço especial de engenharia é aquele que, por sua alta heterogeneidade


ou complexidade, não pode se enquadrar na definição de comum, atraente da
utilização da modalidade licitatória concorrência;

22. Estudo técnico preliminar

Instrumento obrigatório, o qual deverá evidenciar o problema a ser resolvido


e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica
e econômica da contratação, servindo de supedâneo para a elaboração do
anteprojeto, do projeto básico e do termo de referência;

23. Anteprojeto

Elaborado pela administração pública e adotado quando o regime de


execução indireta de obras e serviços de engenharia for o de contratação
integrada, consistente em peça técnica contendo todos os subsídios
necessários à elaboração dos projetos básico e executivo a cargo do vencedor
da disputa;

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24. Building Information Modelling – BIM

Em licitações de obras e serviços de engenharia e arquitetura, sempre


que adequada ao objeto da licitação, será preferencialmente adotada a
Modelagem da Informação da Construção (Building Information Modelling –
BIM) ou tecnologias e processos integrados similares ou mais avançados
que venham a substituí-la; (registre-se a existência do Decreto Federal
nº 10.306/2020, que estabelece sobre a utilização do BIM na execução direta
ou indireta de obras e serviços de engenharia realizada pelos órgãos e pelas
entidades da administração pública federal, no âmbito da Estratégia Nacional
de Disseminação do Building Information Modelling – Estratégia BIM BR,
instituída pelo Decreto nº 9.983/2019);

25. Orçamento detalhado do custo global da obra

Fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente


avaliados, é obrigatório exclusivamente nos seguintes regimes de
execução: empreitada por preço unitário; empreitada por preço global;
empreitada integral; contratação por tarefa; e fornecimento e prestação de
serviço associado;

26. Matriz de riscos

Cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre


as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial
do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos
supervenientes à contratação, obrigatória quando a contratação referir-
se a obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de
contratação integrada e semi-integrada;

27. Contratação integrada

Regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o


contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básico e
executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar
serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais
operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto;

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28. Contratação semi-integrada

Regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o


contratado é responsável por elaborar e desenvolver o projeto executivo,
executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços
especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações
necessárias e suficientes para a entrega final do objeto;

29. Exequibilidade da proposta

No caso de obras e serviços de engenharia, serão consideradas inexequíveis


as propostas cujos valores forem inferiores a 75% (setenta e cinco por cento)
do valor orçado pela administração;

30. Fornecimento e prestação de serviço associado

(a) regime de contratação em que, além do fornecimento do objeto, o


contratado responsabiliza-se por sua operação, manutenção ou ambas,
por tempo determinado; (b) sua vigência máxima será definida pela soma
do prazo relativo ao fornecimento inicial ou à entrega da obra com o prazo
relativo ao serviço de operação e manutenção, este limitado a 5 (cinco) anos
contados da data de recebimento do objeto inicial, autorizada a prorrogação
na forma da lei;

31. Licitação internacional

(a) licitação processada em território nacional na qual é admitida a


participação de licitantes estrangeiros, com a possibilidade de cotação de
preços em moeda estrangeira (o edital não poderá prever condições de
habilitação, classificação e julgamento que constituam barreiras de acesso
ao licitante estrangeiro, admitida a previsão de margem de preferência para
bens produzidos no País e serviços nacionais que atendam às normas técnicas
brasileiras); ou (b) licitação na qual o objeto contratual pode ou deve ser
executado no todo ou em parte em território estrangeiro;

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32. Concorrência

Modalidade de licitação utilizada para a contratação de serviços “comuns”


e especiais de engenharia, obra de engenharia, serviços e bens especiais e
serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual,
cujo critério de julgamento poderá ser: menor preço, melhor técnica ou
conteúdo artístico, técnica e preço, maior retorno econômico ou maior
desconto;

33. Concurso

Modalidade de licitação destinada à escolha de trabalho técnico, científico ou


artístico, cujo critério de julgamento será o de melhor técnica ou conteúdo
artístico, e para concessão de prêmio ou remuneração ao vencedor;

34. Leilão

Modalidade de licitação aplicável à alienação de bens imóveis ou de


bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, vencendo a disputa
quem oferecer o maior lance;

35. Pregão

Modalidade de licitação obrigatória para a aquisição de bens e serviços


comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de
maior desconto, o qual terá como referência o preço global fixado no edital
da licitação, sendo o desconto estendido a eventuais termos aditivos;

36. Diálogo competitivo

Modalidade de licitação para a contratação de obras, serviços e compras


em que a administração pública realiza diálogos com licitantes previamente
selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver
uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo
os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos;
é restrita a contratações em que a administração vise a contratar objeto
que envolva as seguintes condições: a) inovação tecnológica ou técnica; b)

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impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem
a adaptação de soluções disponíveis no mercado; e c) impossibilidade de
as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela
administração;

37. Credenciamento

Constitui-se no processo administrativo de chamamento público em que a


administração pública convoca interessados em prestar serviços ou fornecer
bens para que, preenchidos os requisitos necessários, credenciem-se no
órgão ou na entidade para executar o objeto quando convocados;

38. Pré-qualificação

Procedimento seletivo prévio à licitação, independente da modalidade


adotada, destinado à análise das condições de habilitação, total ou parcial,
dos interessados ou de bens que atendam às exigências técnicas ou de
qualidade estabelecidas pela administração, podendo-se, nesta última
hipótese, exigir-se amostra ou prova de conceito do bem;

39. Sistema de registro de preços

(a) trata-se do conjunto de procedimentos para realização,


mediante contratação direta ou licitação, nas modalidades pregão ou
concorrência, de registro formal de preços relativos à prestação de serviços,
inclusive de engenharia, execução de obras e à aquisição e locação de
bens para contratações futuras; o novo marco legal ampliou a formação do
registro de preços para obras (admitido na Lei nº 13.303/2016) e locação de
bens e, ainda, estabeleceu a possibilidade da formação do registro de preços
por meio de contratação direta, mas, neste caso, somente para a aquisição
de bens ou para a contratação de serviços por mais de um órgão ou entidade;
(b) o critério de julgamento será o de menor preço ou o de maior desconto
sobre tabela de preços praticada no mercado; (c) o prazo de vigência da ata
de registro de preços será de 1 (um) ano e poderá ser prorrogado, por igual
período, desde que comprovada a vantajosidade do preço; (d) no caso de
obras e serviços de engenharia, a utilização do sistema de registro de preços
será permitida desde que atendidos os seguintes requisitos: i. existência

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de projeto padronizado, sem complexidade técnica e operacional; e ii.
necessidade permanente ou frequente de obra ou serviço a ser contratado;

40. Carona

(a) trata-se do órgão ou entidade que não participa dos procedimentos


iniciais da licitação para a formação do registro de preços e, portanto, não
integra a ata de registro de preços, contudo, tem interesse em adquirir o
objeto registrado; (b) órgãos e entidades da administração pública federal
não poderão aderir à ata de registro de preços gerenciada por órgão ou
entidade estadual, distrital ou municipal (registre-se que a norma geral
que rege o sistema de registro de preços e a correspondente licitação é a
mesma para todos os entes públicos, leia-se União, Estados, Municípios
e Distrito Federal, sendo permitida, inclusive, a Estados, Municípios e ao
Distrito Federal a aplicação dos regulamentos editados pela União para
a execução da nova lei, não havendo, por isso, motivo para vedar adesões
a atas de registro de preços em razão do ente licitante, promovendo a
deselegante aparência de um federalismo de desconfiança entre esferas
administrativas); (c) as aquisições ou as contratações adicionais por meio
da adesão à ata de registro de preços não poderão exceder, por órgão ou
entidade, a 50% (cinquenta por cento) dos quantitativos dos itens registrados
na ata para o órgão gerenciador e para os órgãos participantes; (d) o
quantitativo decorrente das adesões não poderá exceder, na totalidade, ao
dobro do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços
para os mesmos órgãos (gerenciador e participantes), independentemente
do número de órgãos não participantes que aderirem; e (e) para aquisição
emergencial de medicamentos e material de consumo médico-hospitalar
por órgãos e entidades da administração pública federal, estadual,
distrital e municipal, a adesão à ata de registro de preços gerenciada pelo
Ministério da Saúde não estará sujeita aos limites retro citados;

41. Agente de contratação, comissão de contratação e pregoeiro

São os responsáveis pela condução do procedimento licitatório, definindo,


o novo marco legal, as situações em que cada um atua; as regras relativas
à atuação desses agentes serão estabelecidas em regulamento, devendo
ser prevista a possibilidade de contarem com o apoio dos órgãos de

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assessoramento jurídico e de controle interno para o desempenho das
funções essenciais à execução do novo marco legal;

42. Assessoramento de agente de contratação, comissão de contratação e


pregoeiro

Em licitação que envolva bens ou serviços especiais e cujo objeto não seja
rotineiramente contratado pela administração, poderá ser contratado, por
prazo determinado, serviço de empresa ou de profissional especializado para
assessorar os agentes públicos responsáveis pela condução da licitação;

43. Catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras

Constitui-se em sistema informatizado, de gerenciamento centralizado e


com indicação de preços, destinado a permitir a padronização de itens a
serem adquiridos pela administração pública, adequado em licitações cujo
critério de julgamento seja o de menor preço ou o de maior desconto, o qual
conterá toda a documentação e os procedimentos próprios da fase interna de
licitações;

44. Impugnação do edital e pedido de esclarecimento

Qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital de licitação por


irregularidade na aplicação da lei ou para solicitar esclarecimento sobre os
seus termos, devendo protocolá-los até 3 (três) dias úteis antes da data de
abertura das propostas; a resposta será divulgada em sítio eletrônico oficial
no prazo de 3 (três) dias úteis;

45. Contrato de eficiência

Contrato cujo objeto é a prestação de serviços, o qual poderá incluir a


realização de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar
economia ao contratante, na forma de redução de despesas correntes,
remunerando o contratado com base em percentual da economia gerada;

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46. Sobrepreço

Preço orçado para licitação ou contratado em valor expressivamente


superior aos preços referenciais de mercado, seja de apenas 1 (um) item, se
a licitação ou a contratação for por preços unitários de serviço, seja do valor
global do objeto, se a licitação ou a contratação for por tarefa, empreitada
por preço global ou empreitada integral, semi-integrada ou integrada;

47. Superfaturamento

Dano provocado ao patrimônio da administração, caracterizado, entre


outras situações, por: i. medição de quantidades superiores às efetivamente
executadas ou fornecidas; ii. deficiência na execução de obras e de
serviços de engenharia que resulte em diminuição da sua qualidade, vida
útil ou segurança; iii. alterações no orçamento de obras e de serviços de
engenharia que causem desequilíbrio econômico-financeiro do contrato
em favor do contratado; iv. outras alterações de cláusulas financeiras que
gerem recebimentos contratuais antecipados, distorção do cronograma
físico-financeiro, prorrogação injustificada do prazo contratual com custos
adicionais para a administração ou reajuste irregular de preços;

48. Reajustamento

(a) forma de manutenção do valor real do contrato, consistente na


aplicação de índice de correção monetária previsto no contrato; (b)
independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória
a previsão no edital de índice de reajustamento de preço com data-base
vinculada à data do orçamento estimado, com a possibilidade de ser
estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com
a realidade de mercado dos respectivos insumos; (c) deve ser observado o
interregno mínimo de 1 (um) ano para o efeito de concessão de reajuste;

49. Repactuação

Forma de manutenção do valor real do contrato utilizada para serviços


contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou
predominância de mão de obra;

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50. Reequilíbrio econômico-financeiro

Em simetria com o art. 65, §1º, da Lei nº 8.666/1993, os contratos poderão


ser alterados, com as devidas justificativas, por acordo entre as partes, para
restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso
de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos
imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem
a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso,
a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato; novidade trazida
pelo novo marco legal das licitações é que o equilíbrio econômico-financeiro
também será restabelecido por acordo entre as partes nas contratações de
obras e serviços de engenharia, quando a execução for obstada pelo atraso
na conclusão de procedimentos de desapropriação, desocupação, servidão
administrativa ou licenciamento ambiental, por circunstâncias alheias ao
contratado;

51. Defesa de agente público

Se as autoridades competentes e os servidores e empregados públicos que


tiverem participado dos procedimentos relacionados às licitações e aos
contratos precisarem defender-se nas esferas administrativa, controladora
ou judicial em razão de ato praticado com estrita observância de orientação
constante em parecer jurídico, a advocacia pública promoverá, a critério do
agente público, sua representação judicial ou extrajudicial;

52. Autenticação de documento por advogado

A prova de autenticidade de cópia de documento público ou particular


poderá ser feita perante agente da administração, mediante apresentação
de original ou de declaração de autenticidade por advogado, sob sua
responsabilidade pessoal;

53. Impedimentos

Não poderão disputar licitação ou participar da execução de contrato:


(a) pessoa física ou jurídica cujo impedimento decorra de sanção que lhe
tenha sido imposta, alcançando o licitante que atue em substituição a outra

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pessoa, física ou jurídica, com o intuito de burlar a efetividade da sanção
àquela aplicada, inclusive a sua controladora, controlada ou coligada,
desde que devidamente comprovado o ilícito ou a utilização fraudulenta da
personalidade jurídica do licitante; (b) o cônjuge, companheiro ou parente
em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau de dirigente
do órgão ou entidade contratante ou de agente público que desempenhe
função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato,
devendo essa proibição constar expressamente no edital da licitação;
(c) empresas controladoras, controladas ou coligadas, nos termos da Lei
nº 6.404/1976, concorrendo entre si; (d) pessoa física ou jurídica que, nos
5 (cinco) anos anteriores à divulgação do edital, tenha sido condenada
judicialmente, com trânsito em julgado, por exploração de trabalho infantil,
por submissão de trabalhadores a condições análogas às de escravo ou por
contratação de adolescentes nos casos vedados pela legislação trabalhista;

54. Consórcios

(a) desde que haja justificativa técnica aprovada pela autoridade


competente, o edital de licitação poderá estabelecer limite máximo ao
número de empresas consorciadas; (b) a substituição de consorciado
deverá ser expressamente autorizada pelo órgão ou entidade contratante
e condicionada à comprovação de que a nova empresa do consórcio possui,
no mínimo, os mesmos quantitativos para efeito de habilitação técnica
e os mesmos valores para efeito de qualificação econômico-financeira
apresentados pela empresa substituída para fins de habilitação do consórcio
no processo licitatório que originou o contrato;

55. Sociedades cooperativas

Profissionais organizados sob a forma de cooperativa poderão participar de


licitação desde que atendidos os requisitos que a lei enumera;

56. Rito ordinário para o processamento da licitação

O processo licitatório, a ser realizado preferencialmente sob a forma


eletrônica, nas modalidades concorrência e pregão, observará a seguinte
ordem: preparatória; divulgação do edital de licitação; apresentação de

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propostas e lances, quando for o caso; julgamento; habilitação (será exigida a
apresentação dos documentos de habilitação apenas pelo licitante vencedor,
exceto quando a fase de habilitação anteceder a de julgamento); recursal; e
homologação, admitindo-se, mediante ato motivado com explicitação dos
benefícios decorrentes, que a fase de habilitação anteceda a de apresentação
de propostas e lances;

57. Formato presencial e gravação em áudio e vídeo

Na hipótese excepcional de licitação sob a forma presencial, a sessão pública


de apresentação de propostas deverá ser gravada em áudio e vídeo;

58. Amostra

A administração poderá, em relação ao licitante provisoriamente classificado


em primeiro lugar, realizar análise e avaliação da conformidade das
propostas, mediante homologação de amostras, exame de conformidade e
prova de conceito, entre outros testes;

59. Centralização

Os órgãos da administração com competências regulamentares relativas às


atividades de administração de materiais, de obras e serviços e de licitações e
contratos deverão instituir instrumentos que permitam, preferencialmente,
a centralização dos procedimentos de aquisição e contratação de bens e
serviços;

60. Minutas padronizadas

Adoção de modelos de minutas de editais, de termos de referência, de


contratos padronizados e de outros documentos, admitida a adoção das
minutas do Poder Executivo federal por todos os entes federativos;

61. Diálogo com a iniciativa privada

O novo marco legal permite a convocação de particulares para auxiliar a


administração pública quanto ao melhor delineamento do objeto e/ou da

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solução que lhe seja ótima, por meio da realização de audiência pública,
consulta pública, procedimento de manifestação de interesse e da utilização
da modalidade licitatória intitulada de diálogo competitivo;

62. Pesquisa de preços

O novo marco legal das licitações define os parâmetros para a realização


da pesquisa de preços praticados no mercado, inclusive nas hipóteses de
inexigibilidade de licitação;

63. Sigilo do orçamento

Desde que justificado, o orçamento estimado da contratação poderá ter


caráter sigiloso; o sigilo do orçamento não prevalecerá para os órgãos de
controle interno e externo e será tornado público apenas e imediatamente
após a fase de julgamento de propostas;

64. Acesso ao edital

Desnecessidade de registro ou de identificação para acesso ao edital.

65. Programa de integridade

Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o


edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de
integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da
celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas
a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu
descumprimento;

66. Margem de preferência

(a) possibilidade de estipulação de margem de preferência definida em


decisão fundamentada do Poder Executivo federal; (b) Municípios com
até 50.000 (cinquenta mil) habitantes poderão estabelecer margem de
preferência de até 10% (dez por cento) para empresas neles sediadas;

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67. Vítima de violência e sistema prisional

O edital, conforme regulamento, poderá exigir que o contratado destine um


percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da
contratação a mulher vítima de violência doméstica e, também, a oriundo ou
egresso do sistema prisional;

68. Desempenho anterior

O desempenho pretérito na execução de contratos com a administração


pública deverá ser considerado no exame de pontuação técnica;

69. Análise jurídica

(a) na fase interna da licitação e nas contratações diretas, acordos, termos de


cooperação, convênios, ajustes, adesões a atas de registro de preços, outros
instrumentos congêneres e de seus termos e aditivos, o processo seguirá
para o órgão de assessoramento jurídico que realizará controle prévio de
legalidade mediante análise jurídica da contratação; (b) é dispensável a
análise jurídica nas hipóteses previamente definidas em ato da autoridade
jurídica máxima competente, que deverá considerar o baixo valor, a baixa
complexidade da contratação, a entrega imediata do bem ou a utilização de
minutas de editais e instrumentos de contrato, convênio ou outros ajustes
previamente padronizados pelo órgão de assessoramento jurídico; (c) o
parecer jurídico que desaprovar a continuidade da contratação, no todo
ou em parte, poderá ser motivadamente rejeitado pela autoridade máxima
do órgão ou entidade, hipótese em que esta passará a responder pessoal e
exclusivamente pelas irregularidades que, em razão desse fato, lhe forem
eventualmente imputadas; e (d) o membro da advocacia pública será civil e
regressivamente responsável quando agir com dolo ou fraude na elaboração
do parecer jurídico;

70. Regularidade fiscal

Serão exigidos os documentos relativos à regularidade fiscal, em qualquer


caso, somente em momento posterior ao julgamento das propostas, e apenas
do licitante mais bem classificado;

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71. Garantia de proposta

Poderá ser exigida, no momento da apresentação da proposta, a


comprovação do recolhimento de quantia a título de garantia de proposta,
como requisito de pré-habilitação;

72. Vistoria

O edital da licitação deverá prever a possibilidade de substituição da vistoria


por declaração formal assinada pelo responsável técnico do licitante acerca
do conhecimento pleno das condições e peculiaridades da contratação;

73. Qualificação técnica do subcontratado

O edital poderá prever, para aspectos técnicos específicos, que a qualificação


técnica seja demonstrada por meio de atestados relativos a potencial
subcontratado, limitado a 25% (vinte e cinco por cento) do objeto a ser
licitado, hipótese em que mais de um licitante poderá apresentar atestado
relativo ao mesmo potencial subcontratado;

74. Qualificação econômico-financeira

A critério da administração e definido no edital, poderá ser exigida


declaração, assinada por profissional habilitado da área contábil, que ateste o
atendimento pelo licitante dos índices econômicos exigidos;

75. Inexigibilidade de licitação

É inexigível a licitação quando da aquisição de materiais, de equipamentos


ou de gêneros ou contratação de serviços que só possam ser fornecidos por
produtor, empresa ou representante comercial exclusivos;

76. Dispensa em razão do valor

É dispensável a licitação para a contratação que envolva valores inferiores a


R$ 100.000,00 (cem mil reais), no caso de obras e serviços de engenharia ou
de serviços de manutenção de veículos automotores, e para a contratação

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que envolva valores inferiores a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), no caso
de outros serviços e compras; compete ao Poder Executivo federal atualizar
os valores fixados na nova Lei, com base no Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), ou pelo índice que venha a substituí-
lo, a cada dia 1º de janeiro, os quais serão divulgados no Portal Nacional de
Contratações Públicas – PNCP;

77. Dispensa de licitação em razão da emergência

É dispensável a licitação nos casos de emergência ou de calamidade pública,


quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa
ocasionar prejuízo ou comprometer a continuidade dos serviços públicos
ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens,
públicos ou particulares, e somente para aquisição dos bens necessários ao
atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de
obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 1 (um) ano,
contado da data de ocorrência da emergência ou da calamidade, vedadas
a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já
contratada com base nesse hipótese de dispensa;

78. Licitação deserta ou fracassada

É dispensável a licitação para a contratação que mantenha todas as condições


definidas em edital de licitação realizada há menos de 1 (um) ano, quando
se verificar que naquela licitação: (a) não surgiram licitantes interessados ou
não foram apresentadas propostas válidas; (b) as propostas apresentadas
consignaram preços manifestamente superiores aos praticados no mercado
ou incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes;

79. Divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas

A divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) será


condição indispensável para a eficácia do contrato e seus aditamentos;

80. Formalização do ajuste

(a) o instrumento de contrato, leia-se termo de contrato, é obrigatório

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nas contratações baseadas no novo marco legal; (b) exclusivamente nas
dispensas de licitação em razão do valor e nas compras, independentemente
de seu valor, com entrega imediata e integral dos bens adquiridos [assim
entendidas aquelas com prazo de entrega de até 30 (trinta) dias da ordem de
fornecimento], dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive quanto
a assistência técnica, a administração poderá substituir o termo de contrato
por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de
despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço;

81. Duração do contrato nas hipóteses de serviços e fornecimentos


contínuos

(a) a administração poderá celebrar contratos com prazo de até 5 (cinco)


anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos, os quais poderão
ser prorrogados sucessivamente, respeitada a vigência máxima decenal,
desde que haja previsão em edital e que a autoridade competente ateste
que as condições e os preços permanecem vantajosos para a administração,
permitida a negociação com o contratado ou a extinção contratual sem ônus
para qualquer das partes;

82. Duração do contrato de receita

Na contratação que gere receita e no contrato de eficiência que gere


economia para a administração, os prazos serão de: (a) até 10 (dez) anos, nos
contratos sem investimento; (b) até 35 (trinta e cinco) anos, nos contratos
com investimento, assim considerados aqueles que impliquem a elaboração
de benfeitorias permanentes, realizadas exclusivamente a expensas do
contratado, que serão revertidas ao patrimônio da administração ao término
do contrato;

83. Duração de contrato de operação continuada de sistemas estruturantes


de TI

O contrato que previr a operação continuada de sistemas estruturantes de


tecnologia da informação poderá ter vigência máxima de 15 (quinze) anos;

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 82


84. Prazo para a prestação da garantia da execução

O edital fixará prazo mínimo de 1 (um) mês, contado da data da homologação


da licitação e anterior à assinatura do contrato, para a prestação da garantia
pelo contratado quando este optar pela modalidade seguro-garantia;

85. Prestação da garantia da execução nas contratações de serviços e


fornecimentos contínuos

Nas contratações de serviços e fornecimentos contínuos com vigência


superior a 1 (um) ano, assim como nas subsequentes prorrogações, será
utilizado o valor anual do contrato para definição e aplicação dos percentuais
de garantia;

86. Prestação da garantia da execução contratações de obras e serviços de


engenharia de grande vulto

Nas contratações de obras e serviços de engenharia de grande vulto,


poderá ser exigida a prestação de garantia, na modalidade seguro-
garantia, em percentual equivalente a até 30% (trinta por cento) do valor
inicial do contrato, prevendo-se a obrigação de a seguradora, em caso de
inadimplemento pelo contratado, assumir a execução e concluir o objeto
do contrato, hipótese em que: (a) a seguradora deverá firmar o contrato,
inclusive os aditivos, como interveniente anuente, e poderá: i. ter livre acesso
às instalações em que for executado o contrato principal; ii. acompanhar a
execução do contrato principal; iii. ter acesso a auditoria técnica e contábil;
iv. requerer esclarecimentos ao responsável técnico pela obra ou pelo
fornecimento; (b) a emissão de empenho em nome da seguradora, ou a
quem ela indicar para a conclusão do contrato, será autorizada desde que
demonstrada sua regularidade fiscal; (c) a seguradora poderá subcontratar a
conclusão do contrato, total ou parcialmente;

87. Responsabilidade da administração

Exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime


de dedicação exclusiva de mão de obra, a administração responderá
solidariamente pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 83


encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento
das obrigações do contratado;

88. Prazo para decisão

A administração tem o dever de, explicitamente, emitir decisão sobre


todas as solicitações e reclamações relacionadas à execução dos contratos,
ressalvados os requerimentos manifestamente impertinentes, meramente
protelatórios ou de nenhum interesse para a boa execução do contrato;
salvo disposição legal ou cláusula contratual que estabeleça prazo específico,
concluída a instrução do requerimento, a administração terá o prazo de 1
(um) mês para decidir, admitida a prorrogação motivada por igual período;

89. Formalização do termo aditivo

A formalização do termo aditivo é condição para a execução, pelo contratado,


das prestações determinadas pela administração no curso da execução do
contrato, salvo nos casos de justificada necessidade de antecipação de seus
efeitos, sem prejuízo de a formalização ocorrer no prazo máximo de 1 (um)
mês;

90. Extinção do contrato

O contratado terá direito à extinção do contrato, entre outras, nas seguintes


hipóteses; (a) suspensão de execução do contrato, por ordem escrita da
administração, por prazo superior a 3 (três) meses; (b) repetidas suspensões
que totalizem 90 (noventa) dias úteis, independentemente do pagamento
obrigatório de indenização pelas sucessivas e contratualmente imprevistas
desmobilizações e mobilizações e outras previstas; e (c) atraso superior a
2 (dois) meses, contado da emissão da nota fiscal, dos pagamentos ou de
parcelas de pagamentos devidos pela administração por despesas de obras,
serviços ou fornecimentos;

91. Antecipação do pagamento

Somente será permitida a antecipação de pagamento se propiciar sensível


economia de recursos ou se representar condição indispensável para a

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 84


obtenção do bem ou para a prestação do serviço, hipótese que deverá ser
previamente justificada no processo licitatório e expressamente prevista
no edital de licitação ou instrumento formal de contratação direta, sendo
facultado à administração exigir a prestação de garantia adicional como
condição para o pagamento antecipado;

92. Prazo para pagamento

Após decorrido o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado da emissão


da nota fiscal, em razão do atraso, haverá, conforme o caso, atualização
do débito vencido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo
Especial (IPCA-E) ou pelo Índice Nacional de Custo da Construção (INCC),
ou por índice que vier a substituí-los, e incidirão juros de mora de 0,2% (dois
décimos por cento) ao mês;

93. Cartão de pagamento

As contratações com base na dispensa de licitação em razão do valor serão


preferencialmente pagas por meio de cartão de pagamento, cujo extrato
deverá ser divulgado e mantido à disposição do público no Portal Nacional de
Contratações Públicas;

94. Meios alternativos de resolução de controvérsias

Poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de


controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução
de disputas e a arbitragem;

95. Sanções administrativas

Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas


na lei as seguintes sanções: (a) advertência; (b) multa, a qual não poderá
ser inferior a 0,5% (cinco décimos por cento) nem superior a 30% (trinta
por cento) do valor do contrato; (c) multa moratória decorrente do
atraso injustificado na execução do contrato, a qual não impedirá que a
administração a converta em compensatória e promova a extinção unilateral
do contrato com a aplicação cumulada de outras sanções previstas na lei; (d)

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 85


impedimento de licitar e contratar no âmbito da administração pública direta
e indireta do ente federativo que tiver aplicado a sanção, pelo prazo máximo
de 3 (três) anos; (e) declaração de inidoneidade para licitar ou contratar
no âmbito da administração pública direta e indireta de todos os entes
federativos, pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos;

96. Desconsideração da personalidade jurídica

A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada


com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos
ilícitos previstos na lei ou para provocar confusão patrimonial e, nesse caso,
todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica serão estendidos
aos seus administradores e sócios com poderes de administração, à pessoa
jurídica sucessora ou à empresa do mesmo ramo com relação de coligação ou
controle, de fato ou de direito, com o sancionado, observados, em todos os
casos, o contraditório, a ampla defesa e a obrigatoriedade de análise jurídica
prévia;

97. Prazo para recurso

Dos atos da administração que a lei especifica caberá recurso no prazo de 3


(três) dias úteis, contado da data de intimação ou de lavratura da ata, o qual
será dirigido à autoridade que tiver editado o ato ou proferido a decisão
recorrida, que, se não reconsiderar o ato ou a decisão no prazo de 3 (três)
dias úteis, encaminhará o recurso com a sua motivação à autoridade superior,
a qual deverá proferir sua decisão no prazo máximo de 10 (dez) dias úteis,
contado do recebimento dos autos;.

98. Adoção da forma eletrônica

Os Municípios com até 20.000 (vinte mil) habitantes terão o prazo de 6


(seis) anos, contado da data de publicação da lei, para cumprimento da
obrigatoriedade de realização da licitação sob a forma eletrônica e das
regras relativas à divulgação em sítio eletrônico oficial;

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 86


99. Consórcios públicos

No caso dos Municípios com até 10.000 (dez mil) habitantes, serão
preferencialmente constituídos consórcios públicos para a realização de
compras em grande escala, nos termos da Lei nº 11.107/2005.

99 destaques da nova Lei de Licitações | Marinês Restelatto Dotti 87


Critérios de
julgamento

Jessé Torres Pereira Junior1

1
Professor. Conferencista, painelista, expositor ou relator em cursos, seminários e
congressos, regionais, nacionais ou internacionais, sobre processo administrativo,
controles da Administração, licitações, contratações e responsabilidade civil da
Administração Pública. Coordenador dos cursos de pós-graduação, lato senso, em
Direito Administrativo, da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro e da
Escola de Administração Judiciária.

20 de janeiro de 2020

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
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É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
Uma dos mais aguardados avanços do Projeto de Nova Lei de Licitações e
Contratos, aprovado pela Câmara dos Deputados, reside nos critérios de
julgamento de propostas. Não, propriamente, em sua enumeração – dos seis
critérios adotados, quatro reeditam a pauta que a Lei nº 8.666/93 chama
de “tipos de licitação” (art. 45, caput e § 1º), e dois foram transplantados,
com ajustamentos, da Lei nº 12.462/2011 (artigos 10 e 23), que instituiu
o Regime Diferenciado de Contratação -, mas, sim, em razão dos inúmeros
fatores e requisitos de sua aplicação, que abrem nova dimensão operacional
para o princípio do julgamento objetivo, que permanece do regime anterior,
porém agora instrumentalizado por parâmetros cuja elaboração haverá
de desenvolver-se na fase preparatória do processo e vinculará os agentes
julgadores das propostas, tanto que estampados no respectivo edital.

O art. 33 do Projeto alinha como critérios de julgamento de propostas: menor


preço; maior desconto; melhor técnica ou conteúdo artístico; técnica e preço;
maior lance, no caso de leilão; e maior retorno econômico. Basta a leitura
do art. 34 do Projeto para perceber-se, desde logo, a mudança de método
de avaliação de propostas até mesmo em relação ao vetusto critério do
menor preço, que deverá passar a levar em conta “o menor dispêndio para a
Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no
edital de licitação”. Ou seja, sequer o critério de maior objetividade – menor
preço – se satisfaz com a só comparação entre valores, para que prevaleça o
menor, se este desatender aos parâmetros de menor dispêndio em termos de
qualidade.

O julgamento segundo o critério do menor preço, sob o regime da Lei nº


8.666/93, sempre padeceu de inadequada simplificação, ao passar-se do
texto da lei à sua aplicação prática. Veja-se que o art. 45, § 1º, I, da Lei nº
8.666/93 considera mais vantajosa para a Administração a proposta que o
licitante apresentar “de acordo com as especificações do edital ou convite
e ofertar o menor preço”, seguindo-se que não bastaria, para ser a mais
vantajosa, que a proposta cotasse o menor preço; antes, deveria atender
às especificações do edital, cabendo a este, portanto, formular exigências
objetivas para que, uma vez atendidas, surtisse vencedora a proposta de
menor preço. Na maiora dos casos, porém, os editais, sob a regência da Lei nº
8.666/93, não enunciam requisitos objetivos de qualidade que as propostas
devam cumprir, satisfazendo-se com o menor preço independentemente da

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 89


qualidade do objeto, embora o seu art. 40, VII, requisite que o edital inclua,
como item obrigatório, “critério para julgamento, com disposições claras e
parâmetros objetivos”. E a despeito, ademais, de o verbete 177, da Súmula do
Tribunal de Contas da União, enfatizar que “A definição precisa e suficiente
do objeto licitado constitui regra indispensável da competição, até mesmo
como pressuposto do postulado de igualdade entre os os licitantes, do qual
é subsidiário o princípio da publicidade, que envolve o conhecimento, pelos
concorrentes potenciais das condições básicas da licitação, constituindo, na
hipótese particular da licitação para compra, a quantidade demanda uma das
especificações mínimas e essenciais à definição do objeto do pregão”.

Em outras palavras, no regime que se pretende revogar, a especificação do


objeto quanto às características necessárias para a Administração bastaria
a que o edital cumprisse a ordem legal e sinalizasse qual seria a proposta
vencedora: a de menor preço, independentemente da qualidade do objeto,
desde que este atendesse às especificações definidas.

Para o Projeto, será necessário averiguar, antes de consagrar o menor


preço, o menor dispêndio segundo “parâmetros mínimos de qualidade
definidos no edital”. É de esperar-se que de licitação assim estruturada e
conduzida resulte a contratação de objetos de qualidade pelo menor preço,
abolindo-se a cultura do menor preço por si só, que sempre prevaleceu
na Administração pública brasileira, em detrimento do dispêndio, ou seja,
despesas com manutenção, correção, troca, adaptação, reposição que, entre
outras providências, acompanham, em regra, a contratação de produtos de
qualidade inferior, com a decorrente prevalência do conhecido adágio de que
“o barato sai caro”. Para que bem se cumpra a nova orientação, os agentes
públicos de execução e de controle dos contratos administrativos deverão
empenhar-se na aplicação da regra do “menor dispêndio” como tradutora de
qualidade e condicionante do “menor preço”.

Daí o art. 34 do Projeto acrescentar, em seu § 1º, orientação sobre a


consideração, para a definição do menor dispêndio, dos chamados custos
indiretos, “relacionados com as despesas de manutenção, utilização,
reposição, depreciação e impacto ambiental do objeto licitado, dentre
outros fatores vinculados ao seu ciclo de vida, desde que objetivamente
mensuráveis.

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 90


A identificação do menor preço com o menor dispêndio também dependerá
de os agentes públicos praticarem, com rigor metodológico, as regras do
art. 23 do Projeto, a partir de seu caput – “O valor previamente estimado
da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo
mercado, considerados os preços constantes de bancos de dados públicos
e as quantidades a serem contradadas, observadas a potencial economia
de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto”. A verificação
do menor preço se fará, destarte, em compatibilidade com o preço de
mercado corretamente apurado pela Administração, para objetos com as
especificações e o padrão de qualidade previamente definidos, com o fim de
evitar que a proposta de preço cotado, diante do praticado pelo mercado,
vicie a escolha da proposta de menor preço do objeto qualificado.

O § 1º do art. 23 indica modos e fontes associadas de pesquisa do preço de


mercado, tratando-se de aquisição de bens e contratação de serviços em
geral: composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item
correspondente no painel para consulta de preços ou disponíveis no Portal
Nacional de Contratações Públicas (PNCP); contratações similares pela
Administração, em execução ou concluídas no período de um ano anterior
à data da pesquisa de preços; utilização de dados de pesquisa publicada em
mídia especializada ou constante de sítos eletrônicos especializados ou de
domínio amplo, com data e hora de acesso; pesquisa direta com no mínimo
três fornecedores, mediante solicitação formal de cotação e justificada a
respectiva escolha; pesquisa na base nacional de notas fiscais eletrônicas.

O § 2º arrola modos e fontes de pesquisa, tratando-se da contratação de


obras e serviços de engenharia: composição de custos unitários menores ou
iguais à mediana do item correspondente do Sistema de Custos Referenciais
de Obras (SICRO) ou do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da
Construção Civil (SINAPI); os demais meios indicados no § 1º.

Deduza-se que o Projeto não se satisfaz com pesquisa de preço junto a uma
só fonte. Quer pesquisa ampla e em fontes variadas, o que, aliás, cumpre
antiga orientação do Tribunal de Contas da União. E que surge reforçada
no art. 34, § 2º, do Projeto, que define o julgamento por maior desconto
como aquele cuja referência é o preço global fixado no edital de licitação,
estendendo-se o desconto a eventuais termos aditivos. Reforça-se, por

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 91


conseguinte, a relevância da pesquisa ampla do preço de mercado do objeto
a ser contratado, se o critério de julgamento das propostas for o de maior
desconto, já que este terá por base de cálculo o preço global do objeto
fixado no edital, após aferição na fase preliminar do processo, junto àquela
variedade de fontes e considerados os parâmetros demarcados.

Seja qual for o critério de julgamento das propostas, o Projeto municia os


agentes julgadores com vasta teia de princípios e técnicas interpretativas
na condução de cada processo. Note-se que, enquanto o art. 3º, caput, da Lei
nº 8.666/93, com a redação da Lei nº 12.349/2010, nomeava oito princípios
expressos e os que lhe fossem correlatos, além de indicar as três finalidades
sistêmicas a modelar toda licitação – garantir isonomia de tratamento aos
concorrentes, selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração
e promover o desenvolvimento sustentável –, o art. 5º do Projeto amplia
esse rol para 22 princípios expressos e vincula sua aplicação às disposições
da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, a que a Lei
nº 13.655/2018 vem de incorporar orientação específica para a interpretação
de normas regentes da atividade administrativa estatal, realçando,
sobretudo, a necessidade de se examinarem, a cada caso, os meios de que
dispunha o agente ao decidir e as consequências com que se defrontaria a
opção por tal ou qual solução que viesse a adotar no caso concreto.

Ou seja, o Projeto associa à principiologia o consequencialismo, para


medir-se o acerto ou o desacerto da conduta administrativa adotada, bem
como a responsabilização dos agentes, destacando-se a repercussão, na
interpretação das normas licitatórias, das disposições dos artigos 20 a 23
da Lei nº 13.655/2018. Adverte Odilon Cavallari de Oliveira que a nova
hermenêutica daí decorrente “busca inserir, como regra, no direito brasileiro,
a aplicação consequencialista da norma. E é aí que reside o problema.
A análise das consequências de uma decisão, embora seja muitas vezes
necessária, não pode ser adotada como técnica incondicional de decisão…
Com efeito, por vezes são de extrema importância avaliações dessa natureza
antes da decisão. Não se pode, porém, supor que se trata de método a ser
sempre aplicado, sob pena de subvertermos os mandamentos constitucionais
e legais, a fim de evitar consequências que, na visão de alguns, podem ser
consideradas indesejadas…” (in Política Pública e Controle, p. 44. Belo
Horizonte: Ed. Fórum, 2018).

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 92


A articulação entre principiologia e consequencialismo constitui
extraordinário desafio. Se, de um lado, a principiologia pretende ser
estruturante do sistema jurídico e da incidência de suas normas – sendo
eles próprios, os princípios, normas jurídicas de superior hierarquia e
eficácia imediata, cujo eventual descumprimento gera responsabilidades
-, o consequencialismo atua sobretudo no campo casuístico, pretendendo
encontrar soluções que se compatibilizem com as circunstâncias do caso
concreto, no presente e com vistas ao futuro, sobre o qual as normas jurídicas
repercutirão, quando mais de uma solução se apresente como viável e
supostamente razoável. Essa articulação, a partir daqueles parâmetros
do art. 23 do Projeto, decerto que demandará instrução processual
fundada em variada expertise de órgãos e agentes públicos, traduzida em
relatórios, estudos, laudos e pareceres, que serão tanto mais minuciosos
e multidisciplinares quanto maior for a complexidade do objeto a ser
contratado, carecendo, portanto, de prazos dilargados de elaboração e
análise. Nada, enfim, que se assemelhe a soluções rápidas e superficiais para
atender-se a interesses políticos ou gerenciais contingentes ou imediatos.

Por outro lado, o Projeto veda, expressamente, o formalismo exacerbado,


que volta e meia compromete o ato de julgar nos processos administrativos
e sempre foi censurado na jurisprudência dos tribunais judiciais e de
contas. Em seu art. 12, o Projeto manda considerar que “o desatendimento
de exigências meramente formais, que não comprometam a aferição da
qualificação do licitante ou a compreensão do conteúdo de sua proposta
não importará seu afastamento da licitação ou a invalidação do processo”
(inciso III); “o reconhecimento de firma somente será exigido quando houver
dúvida de autenticidade, salvo imposição legal” (inciso V); “É permitida
a identificação e assinatura digital por pessoa física ou jurídica em meio
eletrônico, mediante certificado digital emitido em âmbito da Infraestrutura
de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil)” (§ 2º do mesmo art. 12).

Decerto que almeja contribuir para simplificar e conferir maior objetividade


aos critérios de julgamento de propostas a regra que, posta no art. 25, § 1º,
do Projeto, veio consagrarar a orientação que o Tribunal de Contas da União
vinha ministrando: “Sempre que o objeto permitir, a Administração adotará
minutas padronizadas de edital e de contrato com cláusulas uniformes”.
Por óbvio que minutas padronizadas são incompatíveis com objetos sem

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 93


afinidade essencial com os precedentes geradores do modelo padronizado,
por isto que aquelas a estes não se aplicam. Recorde-se o julgado do TCU que
fixou a orientação da Corte de Controle, ainda na vigência da Lei nº 8.666/93:
“[…] Ao gestor caberá a responsabilidade da verificação da conformidade
entre a licitação que pretende realizar e a minuta-padrão previamente
examinada e aprovada pela assessoria jurídica. Por prudência, havendo
dúvida da perfeita identidade, deve-se requerer a manifestação da assessoria
jurídica, em vista das peculiaridades de cada caso concreto… Assim, a
utilização de minutas-padrão, guardadas as necessárias cautelas, em que,
como assevera o recorrente, limita-se ao preenchimento das quantidades de
bens e serviços, unidades favorecidas, local de entrega dos bens ou prestação
dos serviços, sem alterar quaisquer das cláusulas desses instrumentos
previamente examinados pela assessoria jurídica, atende aos princípios da
legalidade e também da eficiência e da proporcionalidade” (Plenário, Ac.
nº 1.504/2005, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues).

O art. 35 do Projeto delimita as hipóteses de cabimento do critério


de julgamento fundado na melhor técnica ou em conteúdo artístico,
esclarecendo o seu parágrafo único que pode ser utilizado “para a
contratação de projetos e trabalhos de natureza técnica, científica ou
artística”, com atribuição de prêmio ou remuneração aos vencedores.
Nesse ponto, há de distinguir-se que o Projeto está, aqui, a tratar de
critério de julgamento de propostas, não de modalidade de licitação, a que
corresponderia, no caso de atribuição de prêmio, o concurso. Nada obstante,
a distinção resultará evidenciada nos artigos 37 e 38, como se verá adiante.

O art. 36 do Projeto concentra-se no julgamento por técnica e preço, que


levará em conta “a maior pontuação obtida a partir da ponderação, segundo
fatores objetivos previstos no edital, das notas atribuídas aos aspectos
de técnica e de preço da proposta”. Nada de substancialmente diverso, a
rigor, da redundante redação da norma equivalente do art. 46, § 2º, II, da
Lei nº 8.666/93 (“a classificação dos proponentes far-se-á de acordo com
a média ponderada das valorizações das propostas técnicas e de preço, de
acordo coom os pesos preestabelecidos no instrumento convocatório”).
O tratamento traçado pelo Projeto para o julgamento por técnica e preço
apresenta-se superior ao claramente estabelecer as hipóteses de seu
cabimento e os limites de seu emprego. Mas persiste em dubiedade quanto à

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 94


natureza da decisão que o adotará.

Veja-se que o § 1º do art. 36 do Projeto assenta que tal critério


“será escolhido quando estudo técnico preliminar demonstrar que a
avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem
os requisitos mínimos estabelecidos no edital forem relevantes aos fins
pretendidos pela Adminstração nas licitações” dos objetos que arrola em
incisos a seguir (os grifos não constam do original). A redação sugere pelo
menos duas dúvidas relevantes. A primeira, quanto ao verbo designativo
da ação administrativa – escolher. A segunda, quanto ao momento da
escolha – em face dos requsitios mínimos estabelecidos no edital, ou
seja, o critério está escolhido depois de arrematado o edital e mediante
“estudo técnico preliminar”. Preliminar ao edital? Tal estudo, presume-se,
produzirá elementos que habilitarão a Administração a escolher o critério
de julgamento. Ora, estudo e escolha são anteriores ao edital, a tornar
tormentosa a interpretação desse § 1º, do art. 36, do Projeto. Ademais, o
verbo escolher traduz discrição administrativa, fortemente sugestiva de que
a Administração poderá escolher o julgamento por técnica e preço ou não,
ainda que em presença de elementos que o poderiam indicar como adequado.
Qual a escala de prioridade a observar-se na escolha? Por outro lado, os
“requisitos mínimos” não deveriam estar harmonizados com o critério de
julgamento e vice-versa, tudo esquadrinhado antes de lançar-se a escolha e
os requisitos no edital?

O rol de hipóteses em que caberia a adoção do julgamento por


técnica e preço não ajuda a dissipar as dúvidas, reforçando-as,
ao contrário, ao empregar adjetivos e advérbios nas respectivas
definições abertas. Assim: “serviços técnicos especializados de
natureza predominantemente intelectual, caso em que o critério de
julgamento de técnica e preço deverá ser preferencialmente empregado”;
“serviços majoritariamente dependentes de tecnologia sofisticada e de
domínio restrito…”; “objetos que admitam soluções específicas e alternativas
e variações de execução, com repercussões significativas e concretamente
mensuráveis sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e
durabilidade, quando essas soluções e variações puderem ser adotadas à
livre escolha dos licitantes…” (os grifos não constam do original). O teor
de incertezas e casuísmos é elevado e se agrava quando se pondera que

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 95


soluções intelectuais, dependentes de tecnologia sofisticada, à livre escolha
dos licitantes, ademais variam no tempo e no espaço, considerado o ritmo
vertiginoso de mudança e inovações que caracteriza a ciência e a tecnologia
contemporâneas.

Os §§ 2º e 3º, do art. 36, do Projeto contribuem com mais incertezas, ao


estatuírem que a valoração da proposta de preço, sempre examinada depois
da proposta técnica – nenhuma inovação em relação ao rito traçado pela
Lei nº 8.666/93 – se fará “na proporção máxima de 70% de valoração para
a proposta técnica”. Ignoram-se os fatores de ponderação sobre proporção
dessa largueza. Como também larga é a consideração sobre a influência que
o “desempenho pretérito na execução de contratos com a Administração
Pública” exercerá na pontuação técnica, sabendo-se que os dados serão
aqueles constantes de cadastros (art. 87 do Projeto) e segundo se dispuser
em regulamento, o que igualmente veicula incerteza, já que, ao fazer uso
da expressão Administração Pública, a norma está a se referir a todos os
entes integrantes da federação e suas entidades vinculadas, ao que se extrai
dos incisos III e IV, do art. 6º, do Projeto; portanto, haveria regulamento
paradigmático nacional – a desprezar as sabidamente inúmeras diversidades
regionais deste país continental – ou cada ente ou entidade teria o seu
próprio regulamento, a multiplicar soluções normativamente possíveis?

Os artigos 37 e 38 editam regras procedimentais a serem observadas tanto


no julgamento por melhor técnica como no julgamento por técnica e preço.
Duas são as principais inovações propostas: 1ª, a de que a atribuição de notas
a quesitos de natureza qualitativa será de banca designada para tal fim, de
acordo com previsão editalícia, composta por no mínimo três membros, que
poderão ser servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes aos
quadros permanentes da Administração Pública, e profissionais contratados
por seu conhecimento especializado na avaliação dos quesitos especificados
no edital; 2ª, a pontuação devida à capacitação técnico-profissional “exigirá
que a execução do respectivo contrato tenha participação direta e pessoal do
profissional correspondente”.

Chega-se ao último critério de julgamento admitido pelo Projeto, que


incorpora proposta originalmente positivada no direito brasileiro pelo
chamado Regime Diferenciado de Contratações (Lei nº 12.462/2011, artigos

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 96


10 e 23), concebido para presidir licitações e contratações de objetos
relacionados aos eventos desportivos mundiais que o Brasil sediou
entre 2013 e 2016, estendendo-se, ao longo desse período, a licitações
e contratações destinadas a obras de infraestrutura e de serviços para
aeroportos, ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento,
obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde,
obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de
estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo, ações
no âmbito da Segurança Pública, obras e serviços de engenharia relacionadas
a melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura logística,
ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação.

Trata-se do critério de julgamento por maior retorno econômico, de


utilização reservada, com exclusividade, para a celebração do chamado
“contrato de eficiência”, caracterizado pelo fato de a “remuneração ser
fixada em percentual que incidirá de forma proporcional à economia
efetivamente obtida na execução do contrato” (art. 39, caput, do Projeto).
O contrato de eficiência desafia tanto o setor empresarial privado quanto
os órgãos e entidades da Administração pública. Àquele porque cabe à
licitante apresentar duas propostas: a de trabalho, que deverá contemplar
as obras, os serviços ou os bens, que executará ou fornecerá em prazos
certos, indicando, em unidade monetária, a economia que estima gerar; a
de preço, que corresponderá a percentual sobre essa economia estimada. À
Administração porque elaborará edital explicitando parâmetros objetivos de
mensuração da economia gerada com a execução do contrato, que servirá de
base de cálculo para a remuneração devida ao contratado, estabelecido, para
efeito de julgamento da proposta, que o retorno econômico será o resultado
da economia que se estima gerar com a execução, deduzida a proposta de
preço (art. 39, § 3º). E ressalvando o § 4º do mesmo dispositivo como se dará
a remuneração do contratado nos casos em que não for gerada a economia
prevista no contrato: “a diferença ente a economia contrata e a efetivamente
obtida será descontada da remuneração do contratado; se a diferença entre
a economia contratada e o efetivamente obtida for superior ao limite máximo
estabelecido no contrato, o contratado estará sujeito às sanções que hajam
sido previstas no próprio contrato.

Em coautoria com Marinês Dotti, editamos comentários ao RDC (ed. Renovar,

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 97


2015), recordando que a remuneração variável é de há muito admitida nos
contratos administrativos, antes mesmo de introduzida pelo RDC em nosso
direito positivo, sendo exemplos as “Aquisições Baseadas no Desempenho”,
previstas no item 3.14 das regras para contratações do Banco Interamericano
de Desenvolvimento – BID e do Banco Mundial, tidas como aplicáveis
a contratos de financiamentos celebrados com essas entidades porque
compatíveis com o disposto no art. 42, § 5º, da Lei nº 8.666/93. E também
reconhecida pelo Tribunal de Contas da União (Ac. Plenário nº 589/2004),
em relação à contratação de serviços pela Administração, prevendo-se
remuneração com base em percentual sobre o benefício auferido pelo poder
público. São contratos que associam eficiência e resultado econômico em
prol da Administração, podendo ser aplicados em objetos tais como “revisão
e manutenção de sistemas de fornecimento de energia elétrica, de hidráulica,
de refrigeração de ambientes, de telefonia, de manutenção e gerenciamento
de equipamentos. O critério de julgamento com base no maior retorno
econômico serve, destarte, à formação de contrato de risco, tanto que o
contratado não auferirá remuneração, ou a terá proporcionalmente reduzida,
se não alcançar o resultado econômico a que se obrigou, podendo, inclusive,
ser sancionado por isso… O traço de união entre os dois regimes está no
princípio do julgamento objetivo, implícito no art. 37, XXI, da Constituição da
República e reiteradamente referido na Lei Geral (artigos 3º, caput, 40, VII,
41 e 45, caput), mercê do qual cabe ao instrumento convocatório, e só a ele,
estabelecer o critério de julgamento a ser adotado em cada caso, à vista de
parâmetros objetivos e previamente definidos. Qualquer que seja o critério
de julgamento adotado, a ele sobrepaira o dever jurídico de a Administração
certificar-se de que a proposta atende aos parâmetros de qualidade definidos
no edital… Mas pondere-se que a concentração de foco sobre o resultado
econômico do contrato, embora meritória e estimulante, pode constituir
armadilha jurídica se as partes, notadamente a Administração, não se derem
conta de que a eficiência, na gestão pública, há de harmonizar-se com os
demais princípios que a regem. Obtempere-se que o gestor público há de
ser eficiente com observância das balizas da legalidade, ou, na linguagem
do estado democrático de direito, da juridicidade. Eficiência contra a ordem
jurídica ou à margem dela retrata apenas conduta ilegal e antijurídica”
(Comentários ao RDC Integrado ao Sistema Brasileiro de Licitações e
Contratações Públicas, p. 426-434).

Critérios de julgamento | Jessé Torres Pereira Junior 98


Contratação integrada
e contratação semi-
integrada no projeto
da nova Lei de
Licitações: visão geral

Rafael Wallbach Schwind1


1
Professor visitante na Universidade de Nottingham, Inglaterra (2016). Doutor
(2014) e Mestre (2010) em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP).
Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto Romeu Felipe Bacellar/Unibrasil
(2004), com Curso de Extensão em Direito Econômico na Sociedade Brasileira de
Direito Público – SBDP (2003). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do
Paraná – UFPR (2003). Advogado. Sócio do escritório de advocacia Justen, Pereira,
Oliveira e Talamini – Sociedade de Advogados. Árbitro da Câmara de Arbitragem da
Federação das Indústrias do Estado do Paraná – CAMFIEP e da Câmara de Arbitragem
e Mediação de Santa Catarina – CAMESC.

29 de outubro de 2019

Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração desses direitos.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
1. Introdução

O projeto de nova lei geral de licitações contempla expressamente as figuras


da contratação integrada e da contratação semi-integrada.

Neste breve artigo, pretende-se expor qual é, em nossa visão, a lógica


que informa esses tipos de contratação. A compreensão da lógica desses
contratos é essencial para a sua correta aplicação prática e para a
interpretação das normas que os disciplinam. Nos próximos artigos que
apresentaremos neste Observatório, detalharemos melhor o seu regime
jurídico.

2. As contratações integradas e semi-integradas

O inciso XXXII do art. 6º do projeto de lei define contratação integrada como


sendo o “regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que
o contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básico e
executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar
serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais
operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto”.

O inciso XXXIII do mesmo art. 6º define contratação semi-integrada como


o “regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o
contratado é responsável por elaborar e desenvolver o projeto executivo,
executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços
especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações
necessárias e suficientes para a entrega final do objeto”.

3. Breve histórico da legislação

As contratações integradas foram previstas pela primeira vez no


Regulamento Simplificado de Licitações da Petrobras, instituído pelo Decreto
nº 2.745, de 1998. O item 1.9 estabelecia que a Petrobras poderia se valer de
contratações integradas, que compreenderiam a realização de projeto básico
e (ou) detalhamento, realização de obras e serviços, montagem, execução
de testes, pré-operação e toda as demais operações necessárias para que o
produto final fosse entregue com a solidez e a segurança exigidas.

Contratação integrada e contratação semi-integrada no projeto da nova Lei de


Licitações: visão geral | Rafael Wallbach Schwind 100
Obviamente, as características de certas contratações da Petrobras,
dotadas de relevante complexidade, justificavam a adoção de formas
contratuais anômalas. Era necessário estabelecer um regime contratual com
maleabilidade suficiente para dar conta da complexidade de certas situações.
Assim, a Petrobras poderia atribuir a um terceiro que tivesse conhecimentos
específicos o dever de conceber a solução integral de um determinado
empreendimento.

Posteriormente, as contratações integradas foram incorporadas ao Regime


Diferenciado de Contratação – RDC, conforme previsto fundamentalmente
no art. 9º da Lei nº 12.462, de 2011. Posteriormente, passaram a ser previstas
também nas regras que disciplinam as licitações nas empresas estatais em
geral, de que trata a Lei nº 13.303, de 2015 (art. 42, principalmente nos §§1º a
3º). A Lei nº 13.303 inclusive criou a figura da contratação semi-integrada, na
qual o particular não fica responsável pela elaboração do projeto básico, mas
deve elaborar o executivo.

Agora, a ideia do projeto de lei é que a futura lei geral de licitações contemple
as figuras das contratações integradas e semi-integradas, de modo que
possam ser utilizadas não apenas no âmbito das empresas estatais e dos
RDC.

4. As características básicas das contratações integradas e semi-integradas

As contratações integradas e semi-integradas possuem três características


básicas.

A primeira delas é a complexidade do objeto. Como se nota nas definições


constantes do projeto de lei, que adotam a mesma linha da legislação já
vigente, as contratações integradas e semi-integradas versam sobre objeto
de natureza complexa. Envolvem obras por meio das quais se desenvolvem
atividades específicas. Mas seu objeto não englobará apenas a execução
de obras. Compreenderá também o desenvolvimento de projetos, o
fornecimento de bens, a montagem, testes, pré-operação e demais medidas
para que o objeto final seja entregue pronto para funcionamento.

Portanto, não é permitida a realização de contratações integradas ou semi-

Contratação integrada e contratação semi-integrada no projeto da nova Lei de


Licitações: visão geral | Rafael Wallbach Schwind 101
integradas que tenham por objeto apenas a execução de uma obra pura e
simples. Esses modelos contratuais se aplicam a objetos mais complexos.
Envolvem a assunção de encargos heterogêneos por parte do contratado.

A lógica das contratações integradas e semi-integradas é que a Administração


receba um empreendimento complexo pronto para funcionamento. Sob um
certo ângulo, busca-se evitar o problema da “constelação de contratos”, em
que a Administração, para obter um objeto complexo, acaba tendo de efetuar
contratações diversas, com objetos distintos, perante contratados variados
– o que costuma ser fruto de muitos problemas em termos de gestão, por
exemplo. A contratação integrada racionaliza essas relações contratuais ao
centralizar objetos distintos dentro de um único contrato complexo1.

A segunda caraterística das contratações integradas e semi-integradas é que


a elaboração de projetos deve ficar a cargo do particular.

No caso das contratações integradas, o particular ficará responsável pela


elaboração dos projetos básico e executivo, tomando por base o anteprojeto
disponibilizado com a licitação. Já nas semi-integradas, o particular elabora
o projeto executivo (o projeto básico já é disponibilizado pela Administração
com o edital do certame).

A complexidade do objeto das contratações integradas e semi-integradas é o


fator determinante para que o particular fique responsável pela elaboração
do projeto básico e executivo (no caso das contratações integradas) ou ao
menos do projeto executivo (no caso das contratações semi-integradas).
Afinal, a Administração, ao adotar a sistemática da contratação integrada
ou semi-integrada, pretende se valer da expertise do particular inclusive no
detalhamento conceitual do empreendimento. Isso porque a complexidade
do objeto é um fator que torna igualmente complexa a própria elaboração
dos projetos pertinentes.

Disso decorre a terceira característica básica das contratações integradas


e semi-integradas, que é a participação do particular na própria concepção do

1
O mesmo objetivo se verifica em outras modalidades contratuais, como as concessões administrativas
criadas pela Lei 11.079, de 2004.

Contratação integrada e contratação semi-integrada no projeto da nova Lei de


Licitações: visão geral | Rafael Wallbach Schwind 102
empreendimento.

A elaboração de projetos pelo particular não será uma atividade mecânica.


Espera-se justamente que o particular empregue sua expertise para
desenvolver soluções que repute ser mais eficientes e econômicas. Não se
espera que o particular desenvolva uma atividade meramente mecânica.
Sob esse ângulo, pode-se dizer que as contratações integradas e semi-
integradas envolvem o reconhecimento de certos espaços de liberdade ao
particular na concepção do empreendimento. Há linhas gerais estabelecidas
pela Administração Pública que devem ser seguidas, evidentemente. Mas é
imprescindível que haja uma dose razoável de liberdade ao contratado nas
definições de aspectos relevantes do empreendimento. Do contrário, nem
mesmo faria sentido adotar a sistemática das contratações integradas ou
semi-integradas.

5. Conclusão: a necessidade da correta compreensão do racional das


contratações integradas e semi-integradas

Da breve exposição acima, conclui-se ser absolutamente fundamental a


correta compreensão do racional que informa as contratações integradas e
semi-integradas.

O primeiro ponto de atenção é que as contratações integradas e semi-


integradas procuram estabelecer uma distribuição de incentivos mais
racional.

Ao permitir que o particular elabore os projetos e participe ativamente


da própria concepção do empreendimento, busca-se evitar as constantes
disputas decorrentes dos problemas que se verificam nos projetos. É comum
que o executor de uma obra, no momento da execução, identifique problemas
nos projetos desenvolvidos. Esse tipo de situação acaba gerando disputas e
encarecendo o objeto final, inclusive com pedidos de reequilíbrio.

Nas contratações integradas e semi-integradas, será muito mais difícil que


esse tipo de problema ocorra. O mesmo contratado elaborará os projetos
(ao menos o executivo) e executará as demais atividades que integram o
objeto contratual. Assim, terá o incentivo de elaborar não apenas um projeto

Contratação integrada e contratação semi-integrada no projeto da nova Lei de


Licitações: visão geral | Rafael Wallbach Schwind 103
correto, que evite problemas no momento da execução material, mas
também um projeto mais racional, que reduza os custos de execução.

O segundo ponto de atenção diz respeito à assunção dos riscos pelo


particular.

Ao ser o responsável, em grande medida, pela concepção do empreendimento


desde a elaboração dos projetos, o particular acaba assumindo riscos mais
intensos. De um lado, é necessário que haja uma matriz de riscos bem
elaborada e que observe o racional das contratações integradas e semi-
integradas. De outro lado, é necessário que a assunção de riscos se dê
“para o bem e para o mal”. Ou seja, o particular não assume apenas os riscos
negativos. É necessário que ele tenha vantagens ao constatar e desenvolver
soluções que tornem a execução mais econômica e eficiente. Isso faz com
que a Administração Pública tenha de observar não apenas os espaços
de liberdade do particular, mas estabeleça uma distribuição de incentivos
realmente eficiente – sob pena de os resultados esperados com essas
modalidades contratuais não serem atingidos. Este é um ponto que, pela
nossa experiência prática, ainda precisa ser melhor compreendido por todos
aqueles que se envolvem com contratações integradas e semi-integradas.

Contratação integrada e contratação semi-integrada no projeto da nova Lei de


Licitações: visão geral | Rafael Wallbach Schwind 104
7 pontos do Diálogo
competitivo que você
precisa saber

Mariana Magalhães Avelar1

1
Mestre em Direito e Administração Pública pela Universidade Federal de Minas
Gerais (2016-2018). Professora Voluntária de Direito Administrativo na Faculdade
de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (2017-2018) Pós-graduada em
Gestão e Finanças pela Fundação Dom Cabral (2014-2015). Graduada em Direito pela
Universidade Federal de Minas Gerais (2008-2012).

31 de março de 2021

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gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração desses direitos.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
O diálogo competitivo chega ao direito brasileiro com franca inspiração
nas diretivas de Contratações Públicas da União Europeia que desde 2004
preveem a figura do diálogo concorrencial.

O diagnóstico (de lá e de cá) é que uma possível solução para reduzir a


assimetria de informações entre o Poder Público e os particulares passa
por reduzir a inflexibilidade do rito licitatório, fornecendo maior abertura
para que os particulares pudessem oferecer soluções para as contratações
complexas da Administração Pública.

É o reconhecimento de que a consensualidade é forma legítima de melhorar


a qualidade das contratações públicas. Como essa consensualidade será
mediada – com mais ou menos discricionariedade aos gestores públicos –
parece ser o x da questão.

O Projeto de Lei n° 4.253/2020 define o diálogo competitivo como sendo


uma modalidade de licitação voltada à contratação de obras, serviços
e compras e que compreende duas fases distintas: a primeira, em que
a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente
selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma
ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades e a segunda, na
qual os licitantes apresentam proposta final, a chamada “fase competitiva”.

Para começar nossa conversa sobre esse intrigante tema – e refletir sobre
as escolhas feitas pelo legislador brasileiro – selecionamos sete pontos
importantes para reflexão sobre o diálogo competitivo.

1. Quando a modalidade pode ser adotada?

O artigo 32 do PL prevê três grupos de hipóteses em que a modalidade do


diálogo poderá ser adotada, sendo estas as ocasiões em que:

• o objeto a ser contratado envolva: inovações tecnológicas ou


técnicas; necessidades do contratante que não possam ser
satisfeitas sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado;
especificações técnicas que não possam ser definidas com
precisão suficiente pela Administração;

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 106
• a Administração verifique a necessidade de definir e identificar
os meios e as alternativas que possam satisfazer suas
necessidades, com destaque para a solução técnica mais
adequada, requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já
definida e a estrutura jurídica ou financeira do contrato;

• a Administração considere que os modos de disputa aberto e


fechado não permitem apreciação adequada das variações entre
propostas.

Uma primeira dúvida envolve saber se as hipóteses de utilização do diálogo


são cumulativas. A redação do artigo 32 do PL não deixa claro, de modo que
nos remetemos à redação da atual Diretiva da União Europeia (Diretiva
2014/24/UE) – cuja redação é muita parecida com a do artigo do PL, mas,
ao contrário, deixa claro que as hipóteses de utilização do diálogo não são
cumulativas. Basta que o objeto a ser contratado se encaixe em um dos
grupos de hipóteses para que a modalidade possa ser utilizada.

Ainda sobre as hipóteses previstas no PL, Egon Bockmann Moreira e Flávio


Amaral Garcia (2020, p. 53) registraram que a previsão de cabimento do
diálogo nos casos de inadequação dos modos de disputa aberto e fechado
fogem à racionalidade própria da modalidade. Os autores afirmam que “o
PL parece ter confundido diálogo competitivo com o procedimento por
negociação, que igualmente, tem previsão na Diretiva 2014/24/EU e que
se caracteriza, também, por ser modalidade mais dialógica e flexível (…)
A flexibilidade é comum ao diálogo competitivo e ao procedimento por
negociação, mas se manifesta em distintos momentos: no primeiro, para
definir soluções para as necessidades públicas; no segundo, concentrada na
avaliação comparativa entre as propostas”.

Concordamos com Cristiana Fortini e Gabriel Fajardo (2018) quando


destacam que o que viabiliza o diálogo competitivo é justamente a
“necessidade da construção dialógica da solução”.

E, de fato, na Diretiva da União Europeia, essa hipótese de cabimento


está em artigo que elenca as possibilidades de utilização tanto do diálogo
concorrencial quanto do procedimento por negociação (artigo 26).

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 107
Como se vê, as polêmicas envolvendo o diálogo competitivo brasileiro
começam desde as suas hipóteses de cabimento.

2. O rito do diálogo competitivo

Um dos pontos cruciais do diálogo competitivo é a seleção de quem estaria


habilitado para o diálogo. A solução da legislação brasileira não nos parece
a mais adequada, na medida em que indica que o edital deverá estipular
critérios objetivos para a pré-seleção de quem vai participar da fase do
diálogo.

Considerando que o foco da Administração é selecionar participantes


aptos a indicar soluções que ela mesmo desconhece, como tal escolha
poderia ocorrer com critérios objetivos? Parece-nos que o receio de que
a discricionariedade abra espaço para corrupção acabou por impedir um
desenho ótimo da modalidade logo em seu começo.

Além da seleção dos licitantes, outras duas grandes fases são previstas pela
lei: a fase de diálogo e a fase competitiva.

A fase de diálogo serve para aferir possíveis soluções para as necessidades


da Administração, com estímulo à criação de inteligência coletiva que deveria
surgir das rodadas de diálogo.

Durante o diálogo, a Administração não poderá revelar a outros licitantes


as soluções propostas ou as informações sigilosas comunicadas por um
licitante sem o seu consentimento. Como forma de contrapor aproximações
pouco republicanas, contudo, o projeto de lei previu que as reuniões com os
licitantes pré-selecionados serão registradas em ata e gravadas mediante
utilização de recursos tecnológicos de áudio e vídeo.

As rodadas de conversas podem ser mantidas até que a Administração esteja


confortável em emitir decisão fundamentada na qual identifica a solução ou
as soluções que atendam às suas necessidades.

A fase competitiva inicia-se após o fim do diálogo, com a publicação de novo


edital que conterá a especificação da solução que atenda às necessidades

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 108
da Administração e os critérios objetivos a serem utilizados para seleção da
proposta mais vantajosa. Haverá prazo mínimo de 60 (sessenta) dias úteis,
para todos os licitantes pré-selecionados apresentarem suas propostas, as
quais deverão conter os elementos necessários para a realização do projeto.

3. Assessoria

A colegialidade é uma regra no diálogo competitivo e sua condução ocorrerá


por comissão de contratação composta por pelo menos 3 (três) servidores
efetivos ou empregados públicos pertencentes aos quadros permanentes da
Administração.

Mesmo com tal configuração, em muitas situações a Administração não


possuirá em seu corpo técnico servidores que possam avaliar as propostas
realizadas durante o procedimento de diálogo. Diante disso, o PL prevê
que a comissão de contratação poderá ser assessorada por profissionais
contratados com formação técnica compatível. Esses profissionais assinarão
termo de confidencialidade e abster-se-ão de atividades que possam
configurar conflito de interesses.

Assim, caso o diálogo prospere, novas oportunidades poderão surgir no


mercado de consultoria.

4. Diálogo nas Concessões e PPPs

O PL prevê a alteração da Lei nº 8.987/1995 para prever a utilização do


diálogo competitivo para a contratação de concessão de serviço público,
assim como a Lei das Parcerias Público-Privadas (Lei nº 11.079/2004).

Assim, o diálogo surge como mais uma forma de se pensar a modelagem


desses contratos, somando às estruturas tradicionais, como a contratação de
consultores externos por bancos de fomento e a utilização do Procedimento
de Manifestação de Interesse – PMI. Isso porque a modelagem final do
contrato de concessão ou PPP será construída ao longo das rodadas de
diálogo.

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 109
5. Possibilidade de controle prévio pelos Tribunais de Contas

Apesar das boas novidades, já deu para perceber que nem tudo são flores
quando o assunto é diálogo competitivo, certo?

Uma das disposições mais criticadas é justamente a previsão do art. 32,


§1º. XII, a qual indica que o órgão de controle externo poderá acompanhar
e monitorar os diálogos competitivos, opinando, no prazo máximo de 40
(quarenta) dias úteis, sobre a legalidade, a legitimidade e a economicidade da
licitação, antes da celebração do contrato.

O controle prévio das contratações públicas já foi alvo de diversas críticas


doutrinárias, inclusive sob o aspecto de sua inconstitucionalidade. Isadora
Cohen e Ana Carolina Sette escreveram recentemente sobre o tema neste
artigo.

6. Cherry-picking e outros pontos polêmicos do diálogo competitivo

Um dos pontos importantes do diálogo competitivo – e já muito discutido nos


países onde o diálogo é utilizado – diz respeito à construção da solução final
que será licitada pela Administração Pública.

Como vimos, ao final da fase de diálogo, a Administração elaborará edital


que conterá a especificação da solução que atenda às suas necessidades
e os critérios objetivos a serem utilizados para seleção da proposta mais
vantajosa.

Para selecionar a solução mais adequada para satisfazer suas necessidades,


a Administração tem duas opções, que são: selecionar integralmente (ou
quase) a solução proposta por um dos participantes do diálogo, ou construir
uma solução nova juntando as ideias e estudos apresentados pelos diferentes
participantes.

A primeira opção traz críticas já conhecidas por nós por conta do PMI, acerca
do suposto favorecimento de um participante (que apresentou a solução
adotada) em detrimento dos demais. Contudo, para o diálogo competitivo,
essa crítica ainda suscita uma pergunta adicional: já que, ao final do diálogo, o

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 110
participante pode ser chamado a apresentar proposta para uma solução que
não seja aquela que ele apresentou, por que não abrir essa fase competitiva
para outros potenciais licitantes?

Já a segunda opção, relativa à construção de uma solução “conjunta”,


cria preocupações relacionadas à confidencialidade e ao que chamamos
de cherry-picking. O cherry-picking é justamente o risco de seleção arbitrária
de aspectos apresentados pelos participantes durante a fase de diálogo
para a construção da solução adequada. E associado a esse risco está a
preocupação dos participantes de que soluções inovadoras ou informações
sensíveis que tenham apresentado à Administração Pública em caráter de
confidencialidade sejam divulgadas aos demais participantes.

Esse risco, caso não seja bem equacionado pela nossa legislação, pode
impedir os participantes de apresentarem essas soluções e informações na
fase de diálogo. Trata-se de um possível efeito deletério da falta de clareza da
lei a impedir que o diálogo competitivo cumpra seu principal papel, qual seja,
obtenção da expertise dos privados.

7. Possíveis pontos de melhoria: o que podemos aprender com a experiência


europeia

Por fim, há muito o que aprender com os países que já utilizam o diálogo
competitivo. Uma experiência interessante é aquela de Portugal, país que
utiliza muito pouco essa modalidade licitatória. Isso porque Portugal transpôs
a Diretiva da União Europeia de maneira muito particular, adaptando o rito
do diálogo para aquele das licitações tradicionais. Este, muito mais rígido
e burocrático, acabou por inutilizar o diálogo competitivo, que exige maior
flexibilidade nos diálogos e nas negociações com os particulares.

A transposição foi feita dessa forma justamente para tentar retirar, o máximo
possível, a discricionariedade do gestor público. Ao tentar tornar o processo
mais objetivo, retiraram todas as suas vantagens.

Aqui no Brasil o medo da discricionariedade (e, do lado dos gestores, o medo


dos órgãos de controle) é parecido. Aliás, o segundo ponto que levantamos
envolve justamente a necessidade de estabelecer critérios objetivos para a

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 111
seleção dos participantes no diálogo, por exemplo.

Fica, então, a reflexão, para que os nossos medos não inviabilizem, logo de
cara, o diálogo competitivo.

Referências
COHEN. Isadora. Diálogo Competitivo já nasce com a efetividade questionada. Disponível em: https://
www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/infra/dialogo-competitivo-ja-nasce-com-a-efetividade-
questionada-26032021. Acesso em 30 mar 2021.

CUKIERT, Tamara. Consensualidade nas contratações públicas: uma análise do diálogo competitivo. Tese
de Láurea. São Paulo: USP, 2018.

GARCIA, Flávio Amaral. MOREIRA, Egon Bockmann. A futura nova lei de licitações brasileira: seus
principais desafios, analisados individualmente. Revista de Direito Público da Economia [recurso
eletrônico]. Belo Horizonte, v.18, n.69, jan./mar. 202

FORTINI, Cristiana. FAJARDO, Gabriel. O avanço do diálogo competitivo no substitutivo apresentado ao


PL 6.814/17. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-mai-24/interesse-publico-oavanco-dialogo-
competitivo-substitutivo-pl681417 Consulta em 30 mar 2021

7 pontos do Diálogo competitivo que você precisa saber | Mariana Magalhães Avelar 112
O papel da assessoria
jurídica na nova lei
de licitações

Marinês Restelatto Dotti1

1
Advogada da União. Especialista em Direito do Estado e em Direito e Economia
pela Universidade Federal do Estado do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora nos
cursos de Pós-graduação em Direito Público com ênfase em Direito Administrativo da
UniRitter – Laureate International Universities e em Direito Administrativo e Gestão
Pública da Fundação Escola Superior do Ministério Público no Estado do Rio Grande
do Sul. Professora em cursos de extensão: da Escola da Magistratura no Estado do Rio
Grande do Sul. Conferencista na área de licitações e contratações da Administração
Pública.

23 de outubro de 2019

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É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos do autor do artigo, do órgão emanador da decisão
ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no artigo 46, III
da Lei nº 9.610/1998.
1. Introdução

As atribuições da assessoria jurídica nos processos de contratação da


administração pública encontram-se delineadas no regime jurídico da Lei
nº 8.666/1993, denominado de regime geral ou tradicional de licitação,
e, ainda, no regime jurídico da Lei nº 12.462/2011, instituidora do regime
diferenciado de contratações públicas.

De acordo com o primeiro regime, o geral, cumpre à assessoria jurídica da


administração analisar e aprovar as minutas de editais de licitação, bem como
as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes (art. 38, parágrafo único).
Nas contratações diretas, cumpre-lhe o exame das hipóteses de exceção à
regra da licitação (dispensa ou inexigibilidade), como bem preceitua o inciso
VI do art. 38 da Lei nº 8.666/1993 e, ainda, segundo esse mesmo dispositivo,
a emissão de pareceres jurídicos pontuais acerca da licitação. O regime
diferenciado de contratações públicas, da Lei nº 12.462/2011, como medida
de racionalização das atividades administrativas e jurídicas, estabelece
a diretriz da padronização de minutas de instrumentos convocatórios e
contratos, subordinando-as, contudo, à prévia análise e aprovação pelo órgão
jurídico.

O regime jurídico de licitações e contratações das empresas públicas,


sociedades de economia mista e suas subsidiárias, instituído pela Lei
nº 13.303/2016, também prevê a diretriz da padronização de editais e
minutas de contratos, inexistindo, contudo, nesse diploma, disposição a
respeito da prévia análise e aprovação desses instrumentos pela assessoria
jurídica da empresa estatal.

O Projeto de Lei nº 1.292, de 1995, que almeja revogar a Lei nº 8.666/1993, a


Lei nº 12.462/2011 e, também, a Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão),
estabelece uma modelagem distinta acerca das atribuições da assessoria
jurídica nos processos de licitação. Veja-se:

Art. 52. Ao final da fase preparatória, o processo licitatório seguirá para


o órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará
controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 114
§ 1º Na elaboração do parecer jurídico, o órgão de assessoramento
jurídico da Administração deverá:

I – apreciar o processo licitatório conforme critérios objetivos prévios


de atribuição de prioridade;

[…]

§ 2º O parecer jurídico que desaprovar a continuidade da contratação,


no todo ou em parte, poderá ser motivadamente rejeitado pela
autoridade máxima do órgão ou entidade, hipótese em que esta passará
a responder pessoal e exclusivamente pelas irregularidades que, em
razão desse fato, lhe forem eventualmente imputadas.

[…]

§ 4º Na forma deste artigo, o órgão de assessoramento jurídico da


Administração também realizará controle prévio de legalidade de
contratações diretas, acordos, termos de cooperação, convênios,
ajustes, adesões a atas de registro de preços, outros instrumentos
congêneres e de seus termos aditivos.

De acordo com o Projeto de Lei, cumprirá às assessorias jurídicas realizar o


controle prévio da legalidade da contratação, salutar medida que visa a evitar
relações contratuais irregulares ou prejudiciais ao interesse público.

Vislumbra-se que a atribuição de realizar o controle prévio compreenderá


uma generalidade de situações relacionadas ao processo da contratação,
elencando-se, entre outras peculiaridades, a análise dos seguintes tópicos:
o objeto da contratação; o prévio planejamento; a utilização da modalidade
licitatória adequada; a justificativa acerca da viabilidade da contratação e
dos resultados pretendidos; a adequação dos normativos que disciplinam
a contratação; o cumprimento do princípio da padronização; a observância
do parcelamento ou, ainda, a existência de justificativa acerca da divisão da
licitação em grupos/lotes; o cumprimento das regras acerca da participação
de entidades de menor porte; e a adequação da utilização do sistema de
registro de preços quando for o caso.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 115
O controle da legalidade previsto no Projeto de Lei não afastará do órgão
jurídico a já conhecida tarefa de analisar previamente minutas de editais
e contratos que instruem o processo da contratação, tendo em vista que
irregularidades e ilegalidades, costumeiramente, materializam-se nesses
instrumentos.

Mas a largueza das atribuições previstas às assessorias jurídicas na nova


lei de licitações, cuja razão de ser é conferir segurança jurídica ao gestor
público, terá de observar os contornos da delimitação de competências.
Poderá a assessoria jurídica interferir na escolha do gestor quanto à definição
do objeto a contratar? Ou ainda, poderá a assessoria jurídica imiscuir-se
em opinião técnica emitida por outro agente ou setor da administração,
originária de área estranha ao Direito? Quais as consequência advindas de
uma eventual “intromissão”?

São assuntos que serão esquadrinhados a seguir.

2. Segregação de funções

De acordo com o Decreto federal nº 9.203/2017, que dispõe sobre a


política de governança da administração pública federal direta, autárquica e
fundacional, constitui diretriz da governança pública a definição formal das
funções, competências e responsabilidades das estruturas e dos arranjos
institucionais. Assim:

Art. 4º São diretrizes da governança pública:

[…]

X – definir formalmente as funções, as competências e as


responsabilidades das estruturas e dos arranjos institucionais;

A diretriz retro citada traduz-se no princípio da segregação de funções,


desejável em setores e departamentos da administração pública, por meio
da delimitação de atribuições, competências e responsabilidades de agentes
públicos.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 116
Desde a edição do Decreto-Lei nº 200/1967, o qual dispõe sobre a
organização da administração federal, estabeleceu-se a diretriz da
compartimentalização ou segregação de atividades administrativas por
meio da coordenação, da descentralização e da delegação de competência.
Confira-se, a propósito, o disposto no art. 6º do referido diploma, em seu
texto original:

Art. 6º As atividades da Administração Federal obedecerão aos


seguintes princípios fundamentais:

I – Planejamento.

II – Coordenação.

III – Descentralização.

IV – Delegação de Competência.

V – Controle.

É importante que a administração pública promova, tanto quanto possível,


a segregação de funções no âmbito de seu setores e departamentos, em
observância às boas práticas administrativas e ao fortalecimento de seus
controles internos, atribuindo funções distintas a seus agentes e setores.

Caminha nesse sentido o projeto1 de decreto federal de governança em


contratações públicas, segundo o qual compete ao órgão ou entidade, quanto
às estruturas inerentes a esses processos, zelar pela devida segregação de
funções, em todas as suas fases. Veja-se:

Diretrizes para a definição de estrutura

[…]

Art. 13. Compete ao órgão ou entidade, quanto à estrutura inerente ao

1
http://www.participa.br/governanca-em-contratacoes-publicas/decreto-de-governanca-em-
contratacoes-publicas.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 117
processo de contratações:

[…]

IV – zelar pela devida segregação de funções, em todas as fases do


processo de contratação.

A segregação de funções produz a especialização de agentes públicos,


delimita responsabilidades e permite aos órgãos de controle avaliar a
conduta de cada agente na produção do resultado tido como inadequado,
considerando-se a responsabilidade de cada qual, dadas as circunstâncias
em que atuou. Daí ser fundamental a clara distribuição das competências,
delimitandose a responsabilidade de cada agente em todas as fases dos
processos em que atuam.

No plano gerencial, a edição de normas internas que definam as atribuições,


competências e responsabilidades dos setores e cargos existentes2 na
estrutura da administração pública mobiliza meios e distribui competências
para manejá-las. A definição de normas internas de organização e
habilitações produz os indispensáveis meios para fazer com que a estrutura
atue e produza, com eficiência, eficácia e em tempo adequado.

3. A segregação de funções nos processos de contratação

A segregação de funções deve encontrar aplicabilidade nas atividades


técnicas, jurídicas e administrativas relacionadas aos processos de

2
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO
ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. EXERCÍCIO DE
ATIVIDADES DISTINTAS DO CARGO DE ESCREVENTE TÉCNICO JUDICIÁRIO. ILEGALIDADE.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA PROVIDO.
1. O administrador deve agir de acordo com o que estiver expresso em lei, devendo designar cada servidor
para exercer as atividades que correspondam àquelas legalmente previstas.
2. Apenas em circunstâncias excepcionais previstas em lei poderá o servidor público desempenhar
atividade diversa daquela pertinente ao seu cargo.
3. Apesar da alegação do recorrido, referente ao número insuficiente de servidores na Contadoria Judicial,
não é admissível que o recorrente exerça atribuições de um cargo tendo sido nomeado para outro, para o
qual fora aprovado por meio de concurso público.
4. Recurso em mandado de segurança provido. (RMS 37.248-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe:
04/09/2013).

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 118
contratação, ou seja, na individualização de tais atividades. A atividade
administrativa não se confunde com atividade jurídica. Esta, por sua vez,
não se confunde com atividade técnica estranha ao Direito. Nesse sentido,
passo importante foi dado pela Advocacia-Geral da União por meio de seu
“Manual de boas práticas consultivas” e de suas orientações normativas ao
distinguir atribuições de órgãos consultivos de opiniões técnicas, funções
administrativas e decisões baseadas na conveniência ou oportunidade.

De acordo com o referido Manual, notadamente a Boa Prática Consultiva


nº 07, a manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com
potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa
da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos
sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de
conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir
opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter
discricionário de seu acatamento.

Significa, pois, que não é permitido à assessoria jurídica imiscuir-se na escolha


do objeto da contratação, adentrando no campo da oportunidade e da
conveniência do gestor. Se este pretende adquirir automóveis, não compete
à assessoria jurídica manifestar-se no sentido de que a aquisição deva ser
de motocicletas; se pretende contratar serviços de vigilância, não cabe à
assessoria jurídica decidir que melhor seria a contratação de recepcionistas.

Tem o gestor público a discricionariedade de optar pela contratação do


objeto que melhor atenda ao interesse público, não podendo a assessoria
jurídica adentrar no mérito dessa escolha. O prolator de uma manifestação
jurídica não se transforma num gestor público. Todavia, é dever da assessoria
jurídica pronunciar-se quando verifica que o objeto da contratação afronta
normas e princípios, passando a orientar o gestor público para que não
prossiga no seu intento, de forma motivada.

Dispõe a Orientação Normativa nº 54, de 25 abril de 2014, da Advocacia-


Geral da União, que compete ao agente ou setor técnico da administração
declarar que o objeto licitatório é de natureza comum para efeito de
utilização da modalidade pregão e definir se o objeto corresponde a obra ou
serviço de engenharia, sendo atribuição do órgão jurídico analisar o devido

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 119
enquadramento da modalidade licitatória aplicável. Ainda, a Orientação
Normativa nº 16, de 1º de abril de 2009, estabelece a competência da
administração para averiguar a veracidade do atestado de exclusividade
apresentado nos termos do art. 25, inciso I, da Lei nº 8.666/1993, ou
seja, por tratar-se de atividade administrativa e não jurídica, compete ao
setor administrativo competente aquilatar a veracidade do atestado de
exclusividade exigido pela Lei Geral de Licitações.

Extrai-se, dos conteúdos produzidos pela Advocacia-Geral da União, que a


assessoria jurídica não deve emitir manifestações sobre assuntos técnicos
e administrativos, cujo conhecimento não domina (como, por exemplo, no
tocante à definição a respeito da natureza do objeto da licitação, ou, ainda,
a definição acerca da natureza da despesa, ou melhor, a definição a respeito
da classificação orçamentária3 de dado objeto) ou cuja atribuição não lhe
compete (atividade administrativa de competência de setor ou departamento
específico da administração como, por exemplo, averiguar a autenticidade
ou validade de um documento entranhado nos autos do processo ou, ainda,
averiguar se os preços pesquisados são os praticados no mercado). Suscitada
dúvida sobre assunto de natureza técnica ou administrativa, cumpre-
lhe (ao setor jurídico) encaminhá-la ao setor técnico ou administrativo
competente para a emissão do parecer/laudo/opinião pertinente, do qual
extrairá elementos para o fim de proceder ao enquadramento jurídico que for
adequado.

Veja-se, ainda, o disposto no Decreto federal nº 10.024/19 (que regulamenta


a licitação, na modalidade pregão, na forma eletrônica, no âmbito da
administração pública federal) segundo o qual a classificação de bens e
serviços como comuns, para efeito de utilização do formato eletrônico do
pregão, depende de exame predominantemente fático e de natureza técnica.
A natureza técnica a que se refere o diploma diz respeito a aspectos atinentes
a um grau a que se acede a partir de qualificação formal e específica.

O projeto de decreto de governança em contratações públicas bem realça a


separação que deve existir entre opiniões jurídicas e técnicas relacionadas a

3
Sobre classificação orçamentária, há diretrizes no Manual de contabilidade aplicada ao setor público,
disponível em: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br>.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 120
esses processos. Assim:

Art. 11. Compete ao órgão ou entidade, quanto à gestão contratual:

I – garantir que os processos de contratação compreendam todos os


estudos técnicos preliminares que dão base à contratação, termos de
referência ou projetos básicos, editais, aditivos contratuais, pareceres
da consultoria jurídica e notas técnicas da equipe responsável pela
contratação, ordem de serviço, ocorrências que venham a impactar na
gestão do contrato e as ordens de pagamentos.

4. Conclusão

Não se pode pretender que o assessor jurídico, quando da emissão de


parecer atinente a processos de licitação e contratação direta, adentre no
campo da oportunidade e conveniência do gestor quanto à escolha do objeto
da contratação, nem que desenvolva raciocínio técnico atinente à área
estranha ao Direito. Sua formação acadêmica relaciona-se à ciência jurídica e
não a outra, razão pela qual não pode e não deve adentrar em temas cuja área
do conhecimento não domina. Nem deve aventurar-se a fazê-lo.

Segundo o art. 28 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (Lei de Introdução às


normas do Direito Brasileiro), o agente público responderá pessoalmente
por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.
O técnico, portanto, a quem foi atribuída a matéria para estudo e parecer,
responderá pessoalmente pelo equívoco grosseiro e manifesto de sua
opinião ou, ainda, em decorrência de dolo comprovado. Não é fantasioso,
sublinhe-se, o entendimento de que ações de controle, interno e externo,
podem responsabilizar a assessoria jurídica em razão de análise realizada
sobre questão técnica sobre a qual não possuía qualificação, produzindo,
indevidamente, manifestação equivocada e/ou danosa ao ente público. Cada
agente público, repise-se, deve atuar na esfera de sua competência e de
seu conhecimento (princípio da especialização), evitando-se usurpação e,
não raro, sobreposição de opinião em matéria a respeito da qual não possui
o domínio. A segregação de funções em processos de contratação visa,
justamente, evitar a produção de conteúdos por agentes que não detenham a
necessária qualificação técnico-científica e o apropriado conhecimento sobre
o assunto que lhe é submetido.

O papel da assessoria jurídica na nova lei de licitações | Marinês Restelatto Dotti 121
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