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O anteprojeto de engenharia na

contratação integrada prevista no


Regime Diferenciado de Contratações
Públicas e na Lei das Estatais e as
exigências do Tribunal de Contas da
União1

Roberto Tadao Magami Junior


Mestrando em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP), sob a orientação do Professor Doutor Jacintho Arruda Câmara. E-mail:
tadaojunior@gmail.com.

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo demonstrar quais são os requisitos exigidos para a
elaboração de um anteprojeto de engenharia na contratação integrada, tanto no Regime Diferenciado
das Contratações Públicas (Lei nº 12.462/2011) quanto na Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016),
além de traçar um paralelo entre ambos, comparando-os com o Projeto de Lei nº 6.814/2017, que
pretende unificar todos os procedimentos de licitações, revogando as Leis nºs 8.666/93, 10.520/2002
e 12.462/2011, bem como apresentar o posicionamento do Tribunal de Contas da União.
Palavras-chave: Contratação integrada. Anteprojeto de engenharia. Exigências. Regime Diferenciado
das Contratações Públicas (Lei nº 13.462/2011). Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016). Direito
Comparado. Projeto de Lei nº 6.814/2017. Tribunal de Contas da União.

Sumário: 1 Introdução – 2 Panorama sobre a contratação integrada no Direito brasileiro – 3 A origem


da contratação integrada e a evolução dos modelos de contratação – 4 Direito Comparado – 5 A con­
tratação integrada e o anteprojeto de engenharia – definição contida no Regime Diferenciado de
Contratações Públicas e na Lei das Estatais – 6 O anteprojeto de engenharia na visão do Tribunal de
Contas da União – 7 Conclusões – Referências

1 Introdução
A contratação integrada é um tema relativamente recente no Direito
Administrativo brasileiro que tem suscitado diversas discussões, principalmente
por atribuir o desenvolvimento dos projetos básico e executivo exclusivamente

1
Artigo apresentado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Pós-Graduação em
Direito – Questões Contemporâneas das Contratações Públicas.

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ao contratado, que, para tanto, deverá se ater a um anteprojeto de engenharia


previamente desenvolvido pela Administração Pública, e é exatamente aí que re-
side o problema: quais são os requisitos mínimos que devem estar previstos
nesse documento, considerando os conceitos abertos das Leis nºs 12.462/2011
e 13.303/2016?
O segundo ponto que merece destaque é que em razão da forte presença
do Estado na economia, seja direta ou indiretamente, as instituições de controle
passaram a ter um maior protagonismo visando combater a corrupção e melhorar
a gestão pública,2 dentre elas o Tribunal de Contas da União, que, a despeito de
algumas críticas construtivas,3 têm exercido seu mister constitucional de maneira
primordial.4
Daí exsurge a importância de que suas decisões sejam levadas em con-
sideração nos estudos sobre quaisquer assuntos relacionados às contratações
públicas, principalmente pela qualidade das informações técnicas advindas de
seus relatórios, cujo teor é rico em análises acerca dos atos praticados pela
Administração Pública sob a ótica da legalidade, economicidade, eficiência e
eficácia.
Avançando nesta contribuição de informações técnicas para fins acadê-
micos, enfatizo a Decisão Normativa nº 170, de 19 de setembro de 2018, do
Tribunal de Contas da União, que dispõe sobre a nova forma de prestação de
contas a partir de 2019, remodelando a concepção do relatório de gestão para
uma forma integrada, adotando infográficos para transformar dados complexos
em conteúdo facilmente compreensível tanto pelo Controle Externo quanto pela
sociedade, influenciado pelo setor privado em termos de accountability.
O próprio Tribunal de Contas afirma em sua cartilha que o propósito do rela-
tório integrado é, além de propiciar uma visão integrada das Unidades Prestadoras
de Contas quanto à estratégia, planos, e gerenciamento dos principais riscos para
melhorar seu desempenho, ser fonte de pesquisa para a academia e torná-lo de
mais fácil compreensão para a sociedade.5

2
SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda; MONTEIRO, Vera; ROSILHO, André. O valor das decisões
do Tribunal de Contas da União sobre irregularidades em contratos. Disponível em: http://bibliotecadigital.
fgv.br/ojs/index.php/revdireitogv/article/view/73331/70470.
3
RIBEIRO, Mauricio Portugal; JORDÃO, Eduardo. O TCU atua como gestor público; tratemo-lo como tal!
JOTA, 13 nov. 2018. Disponível em: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/regulacao/o-tcu-atua-
como-gestor-publico-tratemo-lo-como-tal-13112018. Aceso em: 13 nov. 2018.
4
SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Competências de controle dos tribunais de contas –
possibilidades e limites. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Org.). Contratações públicas e seu controle. São Paulo:
Malheiros, 2013.
5
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Relatório de Gestão na forma de Relato Integrado. Disponível em: https://
portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A81881F65AAE415016611F667447416.
Acesso em: 6 fev. 2019.

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Este controle dos atos e contratos administrativos decorrente da produção


de dados pelas equipes de Auditoria/Controle Interno possui imensa utilidade,
pois serve de baliza para os gestores públicos, advogados e empresários que
prestam serviços à Administração Pública e aos cidadãos comuns que podem e
devem exercer o controle social.
O presente trabalho tem o propósito de traçar este panorama sobre o tema,
levando também em consideração o Direito Comparado, especificamente o argen-
tino e o francês, e o texto do Projeto de Lei nº 6.814/2017,6 que institui normas
para licitações e contratos da Administração Pública e revoga a Lei nº 8.666, de
21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e dispositivos da
Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011.7

2 Panorama sobre a contratação integrada no Direito


brasileiro
O Regime Diferenciado das Contratações Públicas, nitidamente inspirado
no Decreto nº 2.745/98 (Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado
da Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRAS) disciplinou o regime de contratação
integrada.
Posteriormente, tanto o Regime Diferenciado das Contratações Públicas
(Lei nº 12.462/2011) quanto o Estatuto Jurídico das empresas estatais (Lei nº
13.303/2016) também abordaram o assunto, sendo de vital importância desta-
car que se trata da evolução de um modelo de contratação existente no Direito
anglo-saxão.
A contratação integrada é destinada exclusivamente para a contratação de
obras e serviços de engenharia que não sejam passíveis de fracionamento por
razões técnicas ou econômicas. Assemelha-se à empreitada integral, mas dela se
distingue quanto ao projeto básico onde nesta última já é previamente desenvolvi-
do pela Administração Pública ou por um terceiro contratado previamente.

6
Até a data de conclusão deste trabalho, o andamento do Projeto de Lei estava na comissão especial da
Câmara dos Deputados, que havia aprovado, por 17 votos a 1, um novo substitutivo apresentado pelo
relator, deputado João Arruda (MDB-PR), e que seguiria para análise do Plenário da Câmara (disponível em:
http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/ADMINISTRACAO-PUBLICA/566446-COMISSAO-
ESPECIAL-APROVA-PROPOSTA-DE-NOVA-LEI-DAS-LICITACOES-TEXTO-VAI-A-PLENARIO.html; acesso em: 6
fev. 2019).
7
No dia 12 de dezembro de 2018, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal assinaram um ato conjunto
segundo o qual, a partir de fevereiro de 2019, os projetos de lei terão numeração única, e, em razão disso,
provavelmente o Projeto de Lei nº 6.814/2017 terá uma numeração distinta (disponível em: https://
www12.senado.leg.br/noticias/materias/2018/12/19/projetos-terao-numeracao-unica-no-congresso-a-
partir-de-2019; acesso em: 13 dez. 2018).

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O Regime Diferenciado de Contratações Públicas, inicialmente editado pela


Medida Provisória nº 527/2011, teve por escopo realizar as obras da Copa das
Confederações; a Copa do Mundo; as Olímpiadas; as Paralímpiadas e os aero-
portos das Capitais e Estados distantes até 350 km das sedes destes eventos.
Posteriormente, foram incluídas as ações integrantes do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC); as obras e serviços de engenharia no âmbito
do Sistema Único de Saúde (SUS); as obras e serviços de engenharia para a
construção, ampliação, reforma e administração de estabelecimentos penais e de
unidades de atendimento socioeducativo; as ações no âmbito da segurança pú-
blica; as obras e serviços de engenharia relacionados a melhorias na mobilidade
urbana ou ampliação de infraestrutura logística; e, por fim, as ações em órgãos e
entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação.
A doutrina8 9 à época da edição do RDC teceu severas críticas quanto à
criação de um complexo procedimento para a contratação de obras e serviços
de engenharia por intermédio de Medida Provisória, na medida em que o Poder
Executivo já tinha ciência da necessidade de melhorias nas construções públicas
existentes, além da ausência de ampla discussão do projeto de Medida Provisória
por intermédio de debates com especialistas em licitações, órgãos de controle e
segmentos da arquitetura e da engenharia.
Em que pesem as críticas ao RDC, fato é que está sendo utilizado e trouxe
avanços, tal como a previsão da contratação integrada, que, se utilizada e fiscali-
zada adequadamente, importa em eficiência e redução de custos principalmente
no tocante à fiscalização do contrato, de acordo com o posicionamento da Corte
de Contas.10
De outro turno, no âmbito das estatais (empresas públicas e sociedades de
economia mista), desde o Decreto-Lei nº 2.300/8611 sempre lhes foi assegurada

8
CÂMARA, Jacintho Arruda. Tratado de direito administrativo: licitação e contratos administrativos. Vol. 6.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 260. (Coordenação de Maria Sylvia Zanella Di Pietro).
9
DALLARI, Adilson Abreu. Sem planejamento orçamentário, licitação não evita corrupção. Consultor Jurídico,
16 fev. 2017. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-fev-16/interesse-publico-planejamento-
orcamentario-licitacao-nao-evita-corrupcao. Acesso em: 18 set. 2018.
10
Na visão do Tribunal de Contas da União, os custos de fiscalização e supervisão de uma obra executada
no regime de contratação integrada são menores em relação à contratação por preço unitário, haja vista
que nessa última a fiscalização da obra está sobremaneira focada no levantamento e medição de cada
um dos serviços executados, ao passo que na contratação integrada não é necessário o levantamento
pormenorizado dos quantitativos de serviços executados, havendo tão somente um foco na qualidade
da execução e do cumprimento dos cronogramas pactuados. Todavia, “os gastos do construtor com
o gerenciamento do empreendimento tendem a ser consideravelmente mais elevados na contratação
integrada do que na empreitada por preços unitários, pois este realiza a interface entre projetistas,
executores de obras civis, fornecedores de equipamentos e responsáveis pela montagem eletromecânica”
(Acórdão nº 1.850/2015, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler, j. em 29.07.2015).
11
Artigo 86. As sociedades de economia mista, empresas públicas, fundações sob supervisão ministerial e
demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, até que editem regulamentos próprios,

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a possibilidade de editarem regulamentos próprios para as suas contratações, o


que perdurou até a edição da Lei nº 8.666/93, quando parcela da doutrina passou
a sustentar a necessidade se submissão aos ditames específicos da supracitada
lei, pelo fato de haver utilização de recursos públicos.
Após o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, que deu nova redação
aos artigos 22, inciso XXVII e 173, §1º, dispondo que lei específica regulamen-
taria o estatuto jurídico das estatais quanto aos procedimentos de licitação e
contratação de obras e serviços, cessara parcialmente o posicionamento de que a
Lei nº 8.666/93 lhes era aplicável, com a ressalva por parte do Tribunal de Contas
da União, que permitiu a contratação direta de obras e serviços quando a lei de
licitações constituísse óbice intransponível à sua atividade negocial, chegando
inclusive a declarar a inconstitucionalidade do Decreto nº 2.745/98.
A discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal, por meio de inúmeros
mandados de segurança impetrados, a título de exemplo, pela PETROBRAS S/A,
alegando que a submissão à Lei Geral de Licitações era incompatível com o am-
biente de livre concorrência e importava em vulneração ao princípio da eficiência
presente no artigo 37, caput, da Constituição Federal.
O Supremo Tribunal Federal acolheu os pedidos, sob o argumento que não
era permitido ao Tribunal de Contas da União declarar a inconstitucionalidade do
Decreto nº 2.745/98, e que a exigência de observância à Lei nº 8.666/93 afron-
taria o princípio da legalidade e o regime de exploração econômica das estatais.
Após a prática ter demonstrado que essa decisão não foi acertada em ter-
mos práticos, foi atendido o artigo 173, §1º, da Carta Magna por meio da Lei nº
13.303/2016, que disciplinou, dentre outros assuntos, a contratação integrada.

3 A origem da contratação integrada e a evolução dos


modelos de contratação
No Brasil, desde o Decreto-Lei nº 2.300/86, vigoravam as modalidades de
contratações indiretas chamadas de “Empreitada por Preço Unitário”, quando se
contrata a execução da obra ou do serviço, por preço certo de unidades determina-
das; “Empreitada por Preço Global”, que impõe uma contratação de execução da
obra ou do serviço, por preço certo e total; ou ainda a “Administração Contratada”,
onde se executa a obra ou o serviço, mediante reembolso das despesas e paga-
mento da remuneração ajustada para os trabalhos de administração.

devidamente publicados, com procedimentos seletivos simplificados e observância dos princípios básicos
da licitação, ficarão sujeitas às disposições deste decreto-lei.

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Todas elas se amoldam ao Direito anglo-saxão como Design-Bid-Build


(DBB),12 onde incumbe ao contratado, utilizando-se das diretrizes contidas em
projeto básico e/ou executivo já desenvolvidos, construir o empreendimento pre-
viamente projetado pela Administração Pública ou por um terceiro.
Este modelo, como todos sabemos, resultou em inúmeros atrasos nas
obras de infraestrutura, pois na prática sempre houve enorme distanciamento
entre os projetos básico e executivo, além de estimativas de custo que na prática
não se concretizavam por condições geológicas adversas, atrasos/ausência de
licenças, dentre outras, o que gerou ineficiência para a Administração Pública e,
por consequência, má prestação de serviços à população.
Em razão das inúmeras deficiências, se torna imprescindível a busca de no-
vos modelos, sempre visando ao atendimento do interesse público, concretizado
neste caso pelos conceitos de economicidade, eficácia, eficiência e efetividade,13
culminando com o surgimento do sistema contratual Design-Build, onde o con-
tratado se compromete a conceber um empreendimento e a construí-lo a um de-
terminado custo, ou seja, há um ponto único de responsabilidade (single point
responsibility).14
Desde a década de 1970 os países em desenvolvimento passaram a utilizar
a contratação integrada em relações comerciais internacionais.15 Posteriormente,
em 1981, a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial
(ONUDI) elaborou dois modelos de contrato para a construção de fábricas de
fertilizantes.16
Em 1988, a Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial
Internacional (UNCITRAL) publicou um Guia Legal sobre Elaboração de Contratos

12
A elaboração do projeto fica sob a responsabilidade do empreendedor (design). Na sequência são
apresentadas propostas (bid), e a conclusão se dá pela adjudicação de uma delas, finalizando-se com a
execução e a construção (build).
13
Para o Tribunal de Contas da União, suas auditorias devem analisar a observância de 4 (quatro) eixos em
todos os processos administrativos: (i) economicidade: minimizar os custos dos recursos; (ii) eficiência:
adequada correlação entre os recursos empregados e os produtos entregues em termos de quantidade,
qualidade e tempestividade; (iii) efetividade: atingir os objetivos estabelecidos e alcançar os resultados
pretendidos; e (iv) eficácia – grau de alcance das metas programadas. Fonte: ISSAI 3100 – Orientações
sobre Conceitos Centrais para Auditoria Operacional.
14
TOLEDO DA SILVA, Leonardo. Os contratos EPC e os pleitos de reequilíbrio contratual. Direito e
infraestrutura. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 23.
15
RODRÍGUEZ, Aurora Hernández. Disponível em: https://e-revistas.uc3m.es/index.php/CDT/article/
viewFile/1915/908. Acesso em: 20 nov. 2018.
16
UNIDO. Together for a sustainable future. Disponível em: https://open.unido.org/api/documents/4690826/
download/PRELIMINARY%20DRAFT%20OF%20THE%20MODEL%20FORM%20OF%20TURN-KEY%20LUMP-
SUM%20CONTRACT%20FOR%20THE%20CONSTRUCTION%20OF%20A%20FERTILIZER%20PLANT%20(0-
8808.en). Acesso em: 20 nov. 2018.

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Internacionais para Construção de Obras Industriais,17 com o escopo de assesso-


rar os países em desenvolvimento na implementação deste tipo de contrato.
No sistema Design-Build existem dois modelos de contratações que po-
dem ser consideradas integradas, mas com sutis diferenças. O primeiro é o EPC
Engineering, Procuremnet and Construction, que significa Engenharia, Suprimento
e Construção, e o segundo é o EPCM Engineering, Procurement and Construction
Management (ou Engenharia, Suprimento e Construção Gerenciada).
De acordo com Leonardo Toledo da Silva,18 atualmente o modelo mais ado-
tado de Design-Build é o EPC Turnkey Lump Sum (Empreitada Integral de Preço
Global e de Chave na Mão), também denominado contratação integrada, pois o
contratado responsabiliza-se pelo projeto (enginnering), a aquisição de materiais e
equipamentos (procurement) e a construção (construction).
Este modelo tem impulsionado as construtoras na coordenação de projetos
complexos, de modo a controlar os riscos associados ao projeto, com o objetivo
de fornecer serviços integrais de construção.19

4 Direito Comparado
O principal desiderato do Direito Comparado é reconhecer que a Ciência do
Direito inclui não apenas as técnicas de interpretação de textos de lei ou a desco-
berta de soluções para prevenir ou resolver conflitos sociais, mas também servir
de orientação para a análise de novas ideias.
Nesta senda, Konrad Zweigert e Hein Kötz propõem os seguintes
questionamentos:
(i) O modelo adotado se mostrou adequado ao atendimento das
necessidades em seu país de origem?
(ii) Tendo sido útil, também o será para o país que se dispõe a adotá-lo?20
No âmbito das contratações públicas do Direito argentino entendemos que
o regime de execução integrada foi oportunamente disciplinado pelo Decreto nº
893/2012, onde se permitiu a utilização do contrato llave en mano, ou contrato
de obra por empresa, permitindo a concentração em apenas uma pessoa jurídica

17
UNCITRAL. Legal Guide on Drawing Up International Contracts for the Construction of Industrial Works.
Disponível em: https://www.uncitral.org/pdf/english/texts/procurem/construction/Legal_Guide_e.pdf.
Acesso em: 20 nov. 2018.
18
SILVA, Leonardo Toledo da (Coord.). Melhores práticas em empreendimentos de infraestrutura: sistemas
contratuais complexos e tendências num ambiente de negócios globalizado. Direito e infraestrutura. São
Paulo: Saraiva, 2012, p. 65.
19
Idem, ibidem.
20
ZWEIGERT, Konrad; KÖTZ, Hein. Introduction to comparative law. Oxford: University Press, 2011, p. 17.

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e a realização integral de um projeto que tenha como escopo a entrega de bens ou


sistemas complexos já instalados ou também a prestação de serviços.21
Percebe-se que a utilização da contratação integrada não possui um rol taxa-
tivo de hipóteses e tampouco utiliza como parâmetro um determinado montante
para o investimento.
De acordo com o escólio de Gabriela Stortoni, a contratação integrada não
impõe exclusivamente a execução de uma obra, permitindo também o forneci-
mento de bens móveis, os quais devem ser entregues prontos, isto é, montados
para funcionar, transferindo-se ao adquirente a tecnologia, o conhecimento e as
licenças necessárias para seu funcionamento adequado, o que incluiria também
a capacitação de pessoal para a manutenção e assistência técnica posterior à
entrega.22
Ainda se valendo do Direito Comparado, desde 1986, quando ainda vigente
seu Código de Contratos Públicos (Code des Marches Publics), revogado em ju-
lho de 2015, pelo Regulamento (L’ordonnance) de 23 de julho de 201523 e pelo
Decreto (Décret) de 25 de março de 2016,24 a França utiliza a contratação integra-
da, denominada marché public de conception-réalisation.

21
ARTÍCULO 207. Las contrataciones llave en mano se efectuarán cuando se estime conveniente para
los fines públicos concentrar en un único proveedor la responsabilidad de la realización integral de un
proyecto. Se aplicará esta modalidad cuando la contratación tenga por objeto la provisión de elementos o
sistemas complejos a entregar instalados; o cuando comprenda, además de la provisión, la prestación de
servicios vinculados con la puesta en marcha, operación, coordinación o funcionamiento de dichos bienes
o sistemas entre sí o con otros existentes. Los pliegos de bases y condiciones particulares podrán prever
que los oferentes se hagan cargo de la provisión de repuestos, ofrezcan garantías de calidad y vigencia
apropiadas, detallen los trabajos de mantenimiento a realizar y todo otro requisito conducente al buen
resultado de la contratación.
22
STORTONI, Gabriela. Sobre el contrato llave en mano como modalidad de la contratación pública.
Disponível em: http://www.cba.gov.ar/wp-content/4p96humuzp/2017/10/Doctrina-Stortoni-Modalidad-
Llave-en-mano.pdf. Acesso em: 18 nov. 2018.
23
Article 33
I.-Les acheteurs peuvent conclure des marchés publics de conception-réalisation qui sont des marchés
publics de travaux permettant à l’acheteur de confier à un opérateur économique une mission portant à la
fois sur l’établissement des études et l’exécution des travaux.
Toutefois, sans préjudice des dispositions législatives spéciales, les acheteurs soumis aux dispositions
de la loi du 12 juillet 1985 susvisée ne peuvent recourir à un marché public de conception-réalisation, quel
qu’en soit le montant, que si des motifs d’ordre technique ou un engagement contractuel sur un niveau
d’amélioration de l’efficacité énergétique rendent nécessaire l’association de l’entrepreneur aux études
de l’ouvrage. Un tel marché public est confié à un groupement d’opérateurs économiques. Il peut toutefois
être confié à un seul opérateur économique pour les ouvrages d’infrastructures.
II.-Les conditions mentionnées au second alinéa du I ne sont pas applicables aux marchés publics de
conception-réalisation conclus, jusqu’au 31 décembre 2018, par les organismes d’habitations à loyer
modéré mentionnés à l’article L. 411-2 du code de la construction et de l’habitation et les sociétés
d’économie mixte de construction et de gestion de logements sociaux, soumis aux dispositions de la loi du
12 juillet 1985 susvisée, et qui sont relatifs à la réalisation de logements locatifs aidés par l’Etat financés
avec le concours des aides publiques mentionnées au 1º de l’article L. 301-2 du code de la construction
et de l’habitation.
24
Article 91
I.-Les motifs d’ordre technique mentionnés au I de l’article 33 de l’ordonnance du 23 juillet 2015 susvisée
sont liés à la destination ou à la mise en œuvre technique de l’ouvrage. Sont concernées des opérations

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Durante a vigência do Code des Marches Publics, a contratação integrada era


restrita a algumas hipóteses semelhantes às previstas no Regime Diferenciado de
Contratações Públicas.25
Após o advento do Regulamento (L’ordonnance), de 23 de julho de 2015, e
do Decreto (Décret), de 25 de março de 2016, o rol deixou de existir, e sua utili-
zação passou a ser condicionada ao preenchimento dos seguintes pressupostos:
(i) razões de ordem técnica relacionadas às condições de concepção e implemen-
tação; (ii) contratações caracterizadas por dimensões incomuns ou dificuldades
técnicas; e, (iii) contratações que promovam a eficiência energética.

dont la finalité majeure est une production dont le processus conditionne la conception, la réalisation
et la mise en œuvre ainsi que des opérations dont les caractéristiques, telles que des dimensions
exceptionnelles ou des difficultés techniques particulières, exigent de faire appel aux moyens et à la
technicité propres des opérateurs économiques.
II.-Lorsque la valeur estimée du besoin est égale ou supérieure aux seuils de procédure formalisée, les
acheteurs mentionnés à l’article 1er de la loi du 12 juillet 1985 susvisée passent des marchés publics
de conception-réalisation selon les procédures et dans les conditions mentionnées aux articles 25 ou 26
sous réserve des dispositions qui suivent:
1º Un jury est désigné par l’acheteur. Il est composé exclusivement de personnes indépendantes des
candidats. Lorsqu’une qualification professionnelle particulière est exigée pour participer à la procédure,
au moins un tiers des membres du jury doit posséder cette qualification ou une qualification équivalente.
Le jury dresse un procès-verbal d’examen des candidatures et formule un avis motivé sur la liste des
candidats à retenir. L’acheteur arrête la liste des candidats admis à réaliser des prestations.
Les candidats admis exécutent des prestations sur lesquelles se prononce le jury, après les avoir entendus.
Ces prestations comportent au moins un avant-projet sommaire pour un ouvrage de bâtiment ou, pour un
ouvrage d’infrastructure, un avant-projet accompagné de la définition des performances techniques de
l’ouvrage.
Le jury dresse un procès-verbal d’examen des prestations et d’audition des candidats et formule un avis
motivé.
L’acheteur peut demander des clarifications ou des précisions concernant les offres déposées par les
candidats. Ces précisions, clarifications ou compléments ne peuvent avoir pour effet de modifier des
éléments fondamentaux de l’offre ou des caractéristiques essentielles du marché public.
Le marché public est attribué au vu de l’avis du jury;
2º La désignation d’un jury est facultative dans les cas suivants:
a) Pour les marchés publics de conception-réalisation passés par les pouvoirs adjudicateurs dans les
hypothèses énumérées aux a à c du 1º du II de l’article 90;
b) Pour les marchés publics de conception-réalisation passés par les entités adjudicatrices en dialogue
compétitif ou en procédure négociée avec mise en concurrence préalable.
III.-Pour les marchés publics de conception-réalisation inférieurs aux seuils de procédure formalisée, les
acheteurs mentionnés au II peuvent recourir à une procédure adaptée.
IV.-Dans les cas prévus aux II et III, lorsque les documents de la consultation ont prévu la remise de
prestations, ils indiquent le montant des primes et les modalités de réduction ou de suppression des
primes des soumissionnaires dont les offres sont irrégulières.
Le montant de la prime attribuée à chaque soumissionnaire est égal au prix estimé des études de
conception à effectuer telles que définies par les documents de la consultation, affecté d’un abattement
au plus égal à 20 %.
La rémunération du titulaire du marché public tient compte de la prime qu’il a reçue.
25
Conception-réalisation: recommandations pour un bon usage du processus. Disponível em: https://www.
lemoniteur.fr/article/conception-realisation-recommandations-pour-un-bon-usage-du-processus.1319719.
Acesso em: 29 ago. 2018.

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Roberto Tadao Magami Junior

E em substituição a este arcabouço jurídico, no dia 1º de abril de 2019,


entrará em vigor Le Code de la Commande Publique. Sua edição adveio de uma
Diretiva da União Europeia para dar maior publicidade aos atos da Administração
e melhorar o combate à corrupção, culminando inclusive com a criação de uma
Agência Francesa Anticorrupção26 e, por consequência, incentivar uma série de
aperfeiçoamentos no tocante à prestação de serviços.
O Code de la Commande Publique,27 em seu artigo L2172-1, restringiu a
contratação integrada a razões técnicas ou melhorias no tocante à eficiência ener-
gética, mas não condicionou à observância de qualquer montante a ser investido
na contratação.
Por conseguinte, concluímos que não há razão para que o rol taxativo
constante do artigo 1º do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei nº
12.462/2011) ainda permaneça vigente, pois não há razoabilidade ou propor-
cionalidade na restrição de hipóteses para a contratação integrada,28 sendo sufi-
ciente o preenchimento dos seguintes requisitos já existentes em seu artigo 9º e
repetidos pelo artigo 43, inciso VI, da Lei das Estatais, quais sejam: (i) inovação
tecnológica ou técnica; (ii) possibilidade de execução com diferentes metodolo-
gias; ou (iii) possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no
mercado.
Indo na contramão destas exigências, impende escandir o Projeto de Lei nº
6.814/2017,29 que visa unificar o procedimento de contratação pública, revogan-
do as Leis nºs 8.666/93, 10.520/2002 (Lei do Pregão) e 12.462/2011 (Regime
Diferenciado das Contratações Públicas).
Seu artigo 41, §11, permite a utilização da contratação integrada indistin-
tamente para as obras, serviços e fornecimentos de engenharia, cujo orçamento
perfaça a quantia de R$10.000.000,00 (dez milhões de reais), dispensando da

26
Loi nº 1.691, du 9 décembre 2016, relative à la transparence, à la lutte contre la corruption et à la
modernisation de la vie économique. Disponível em: https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTe
xte=JORFTEXT000033558528&categorieLien=id. Acesso em: 12 fev. 2019.
27
Code de la commande publique: Version consolidée au 1 avril 2019. Disponível em: https://www.legifrance.
gouv.fr/affichCode.do?cidTexte=LEGITEXT000037701019&idSectionTA=&dateTexte=20190401. Acesso
em: 12 fev. 2019.
28
O Governo francês possui um sítio eletrônico para pesquisa de contratações públicas dividas por regiões
(http://www.e-marchespublics.com/), o que também é um dos objetivos do Projeto de Lei nº 6.814/2017:
Art. 17. Os órgãos da Administração com competências regulamentares relativas às atividades de
administração de materiais, de obras e serviços e de licitações e contratos deverão:
I – instituir instrumentos que permitam, preferencialmente, a centralização dos procedimentos de
aquisição e contratação de bens e serviços; [...].
29
O Projeto de Lei nº 6.814/2017 institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e
revoga a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e dispositivos
da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011.

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O anteprojeto de engenharia na contratação integrada prevista no Regime Diferenciado...

observância desta quantia os projetos de ciência, tecnologia, inovação e Ensino


Técnico ou Superior.
Perceba-se que o projeto de lei se olvida da prática internacional comprovada
por meio do Direito Comparado e dos requisitos já existentes no RDC e na Lei das
Estatais, pois não condiciona a utilização do regime da contratação integrada a um
prévio estudo que comprove ser técnica e economicamente adequado e tampouco
exige o preenchimento alternativo dos requisitos de (i) inovação tecnológica ou
técnica; (ii) possibilidade de execução com diferentes metodologias; ou (iii) possi-
bilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado.
Dessume-se, ainda, que o projeto de lei tende a considerar que a contrata-
ção integrada implica menores custos para a Administração e que os particulares
possuem melhores condições de gerenciar e precificar os riscos, mas não se atém
às orientações do Banco Interamericano de Desenvolvimento de que este regime
de contratação implica em maiores custos para a Administração pelo menos no
tocante aos gastos do construtor com o gerenciamento do empreendimento, pois
este realiza a interface entre projetistas, executores de obras civis, fornecedores
de equipamentos e responsáveis pela montagem eletromecânica, e que seu uso
deve ser condicionado a situações muito específicas, onde se defina com total
precisão o projeto e se realize um adequado compartilhamento de riscos.30
No mesmo diapasão do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID é o
posicionamento do Tribunal de Contas da União, que, a despeito de a literalidade
do artigo 8º, §1º, do RDC exigir que nas licitações e contratações de obras e
serviços de engenharia sejam adotados, preferencialmente, os regimes de em-
preitada por preço global, empreitada integral, ou contratação integrada, enfatiza
ser imprescindível a apresentação de estudos objetivos que justifiquem técnica
e economicamente esta última e considerem a expectativa de vantagens quanto
à competitividade, prazo, preço e qualidade em relação a outros regimes de exe-
cução, especialmente a empreitada por preço global, e, entre outros aspectos,
a prática internacional para o mesmo tipo de obra, sendo vedadas justificativas
genéricas, aplicáveis a qualquer empreendimento.31
Já no âmbito das estatais, a contratação integrada tem quase que uma fun-
ção excepcional, sendo preferencialmente adotado como modalidade de licitação
o pregão, nos termos de seu artigo 32, inciso IV.

30
BID. Ventajas y riesgos de contratos llave en mano. Disponível em: https://publications.iadb.org/
bitstream/handle/11319/6006/Ventajas%20y%20riesgos%20de%20contrato%20llave%20en%20mano.
pdf?sequence=1. Acesso em: 10 set. 2018.
31
Acórdão nº 1.388/2016, Plenário, rel. Min. Ana Arraes, j. em 01.06.2016.

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Roberto Tadao Magami Junior

Portanto, o correto em nossa opinião é que o valor da obra ou serviço (v.g.


R$10.000.000,00) não seja o fator determinante para que ocorra uma contra-
tação integrada, mas sim um estudo objetivo que comprove ser técnica e eco-
nomicamente o procedimento mais adequado, acompanhado do preenchimento
alternativo dos requisitos de (i) inovação tecnológica ou técnica; (ii) possibilidade
de execução com diferentes metodologias; ou (iii) possibilidade de execução com
tecnologias de domínio restrito no mercado.

5 A contratação integrada e o anteprojeto de engenharia –


definição contida no Regime Diferenciado de Contratações
Públicas e na Lei das Estatais
O projeto básico é um documento essencial para as licitações nas modalida-
des concorrência, tomada de preços e convite, nos termos do artigo 7º, §2º, inciso
I, da Lei nº 8.666/93.
Egon Bockman Moreira e Fernando Vernalha Guimarães o definem como “o
conjunto das informações técnicas, econômicas e ambientais que caracterizam
o objeto licitado”,32 tratando-se de documento essencial para que os licitantes
tenham o conhecimento das “características qualitativas e qualitativas da obra
ou serviço licitado, possibilitando, a partir disso, um julgamento objetivo das
propostas”.33
Mauricio Portugal, Lucas Navarro e Mario Engler relembram que a exigência
de projeto básico foi relativizada desde a edição das Leis nºs 8.987 e 9.074,
ambas de 1995, para os contratos de concessão comum e, por extensão, para
os contratos de concessão patrocinada e administrativa previstos na Lei nº
11.079/2004, mencionando apenas a necessidade de que na licitação fossem
apresentados “elementos de um projeto básico”34 que, segundo os citados auto-
res, deve conter minimamente os seguintes pontos:

(i) Conceituação e plantas baixas esquemáticas de todos os níveis.


(ii) Corte transversal e longitudinal.
(iii) Elevações das fachadas principais.
(iv) Perspectivas externas e internas.
(v) Simulações e estudos básicos do layout interno.

32
Licitação Pública: a Lei Geral de Licitações/LGL e o Regime Diferenciado de Contratações/RDC. 2. ed. São
Paulo: Malheiros Editores, 2015, p. 175.
33
Ibidem, p. 176.
34
RIBEIRO, Maurício Portugal. O Regime diferenciado de contratação. Licitação de infraestrutura para copa
do mundo e olímpiadas. São Paulo: Atlas, 2012, p. 35.

136 R. bras. de Infraestrutura – RBINF | Belo Horizonte, ano 8, n. 15, p. 125-146, jan./jun. 2019
O anteprojeto de engenharia na contratação integrada prevista no Regime Diferenciado...

(vi) Considerações e conceituação quanto às premissas e necessida-


des para instalações prediais.
(vii) Estimativa macro de custos.

No mesmo diapasão trilharam as licitações de obras e serviços de enge-


nharia, tanto no âmbito do RDC quanto das Estatais, no tocante às contratações
integradas, ao exigir apenas um anteprojeto de engenharia, desde que técnica e
economicamente justificada e cujo objeto envolva, pelo menos, uma das seguin-
tes condições: (i) inovação tecnológica ou técnica; (ii) possibilidade de execução
com diferentes metodologias; ou (iii) possibilidade de execução com tecnologias
de domínio restrito no mercado.
No Regime Diferenciado das Contratações Públicas, os artigos 9º, §2º, inci-
so I, e §3º, além do artigo 74, caput e §3º, do Decreto nº 7.581/2011, delimitam
os requisitos mínimos que devem constar no anteprojeto de engenharia, da se-
guinte forma:

1) documentos técnicos destinados a possibilitar a caracterização da


obra ou serviço, incluindo:
a) a demonstração e a justificativa do programa de necessidades,
a visão global dos investimentos e as definições quanto ao nível de
serviço desejado;
b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de
entrega;
c) a estética do projeto arquitetônico; e
d) os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia
na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à
acessibilidade.
2) A demonstração e a justificativa do programa de necessidades,
a visão global dos investimentos e as definições quanto ao nível de
serviço desejado.
3) As condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de
entrega.
4) A estética do projeto arquitetônico.
5) Os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia
na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à
acessibilidade.35

35
O artigo 1º da Lei nº 8.429, dispõe que os atos de improbidade praticados por qualquer agente público,
servidor ou não, podem ser praticados contra empresas públicas e sociedades de economia mista, e
a Lei nº 13.146/2015 passou a considerar como ato de improbidade deixar de cumprir a exigência de
requisitos de acessibilidade previstos na legislação. Logo, este é um dos requisitos obrigatórios nas
licitações das estatais.

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Já a Lei das Estatais considera anteprojeto de engenharia o documento com


elementos técnicos que permitam a caracterização da obra ou do serviço e a
elaboração e comparação, de forma isonômica, das propostas a serem ofertadas
pelos particulares, ou seja, não apresenta nenhuma diretriz segura quanto ao
mínimo necessário para constar no edital, o que nos leva a crer que devem ser
aplicadas na íntegra as exigências contidas no RDC.
Com o objetivo de melhorar os processos de contratação de projetos, tanto
na esfera pública, quanta privada, e atendendo a uma solicitação do Conselho de
Arquitetura e Urbanismo,36 a Associação Brasileira de Normas Técnicas, em 2017,
esmiuçou o conceito do anteprojeto de engenharia, por intermédio da NBR 16636-
1:2017, da seguinte forma:

6.4.5 Anteprojeto arquitetônico (AP-ARQ) 6.4.5.1


Informações de referência a serem utilizadas:
a) estudo preliminar de arquitetura (EP-ARQ);
b) estudos preliminares produzidos por outras atividades técnicas
(quando aplicável);
c) levantamento topográfico e cadastral (LV-TOP);
d) sondagens de simples reconhecimento do solo (LV-SDG);
e) legislação municipal estadual e federal vigente;
f) normas técnicas específicas.
6.4.5.2 Informações técnicas a serem produzidas: relativas à edifi-
cação (ambientes interiores e exteriores) e a todos os elementos da
edificação e a seus componentes construtivos e materiais de cons-
trução considerados relevantes.
6.4.5.3 Documentos técnicos a serem apresentados:
a) desenhos:
– planta geral de implantação;
– planta com as diretrizes de terraplenagem;
– plantas individualizadas dos pavimentos – plantas das coberturas;
– cortes (longitudinais e transversais) vinculados aos temas anterior-
mente citados – elevações (fachadas e outras);
– detalhes principais (de elementos da edificação e de seus compo-
nentes construtivos);
b) texto:
– memorial descritivo do projeto arquitetônico de edificação;
– memorial descritivo dos elementos da edificação, dos componentes
construtivos e dos materiais de construção.

36
CAU/BR. Normas da ABNT sobre projetos arquitetônicos estão em consulta pública. Disponível em: http://
www.caubr.gov.br/normas-da-abnt-sobre-projetos-arquitetonicos-estao-em-consulta-publica-participe/.
Acesso em: 17 nov. 2018.

138 R. bras. de Infraestrutura – RBINF | Belo Horizonte, ano 8, n. 15, p. 125-146, jan./jun. 2019
O anteprojeto de engenharia na contratação integrada prevista no Regime Diferenciado...

Contudo, importa ressaltar que estes conceitos ainda merecem uma com-
plementação em razão de diretrizes do Tribunal de Contas da União, consoante a
seguir se demonstrará.

6 O anteprojeto de engenharia na visão do Tribunal de Contas


da União
6.1  Instauração de processo administrativo específico para o
desenvolvimento do anteprojeto de engenharia
Em primeiro lugar, é necessária a instauração de processo administrativo
específico para o desenvolvimento do anteprojeto de engenharia, contendo as
justificativas sob os prismas econômico e técnico. Entende-se por justificativa
econômica aquela em que se demonstram em termos monetários os gastos totais
a serem realizados com a implantação do empreendimento, que devem ser inferio-
res se comparados aos obtidos com os demais regimes de execução.37
Já a justificativa técnica deve comprovar que as características do objeto per-
mitem que ocorra competição entre as licitantes para a concepção de metodolo-
gias/tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas
vantajosamente pelo Poder Público.38
Além das justificativas, deve haver um plano de ação com as medidas a
serem adotadas, os responsáveis pelas ações e o prazo previsto para a sua imple-
mentação, além dos respectivos documentos comprovando cada decisão, tudo em
observância a uma normativa interna que deve ser previamente desenvolvida, sob
pena de vulneração aos princípios da publicidade (transparência), economicidade
e eficiência previstos nos artigos 37 e 70 da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, c/c o artigo 3º da Lei nº 12.462/2011 (Lei do RDC).39

6.1.1 Pesquisa de preços


Ainda de acordo com o Tribunal de Contas da União, para a elaboração do
anteprojeto é necessário que constem no processo administrativo todas as pes-
quisas de preços; seja verificada a aplicabilidade e a economicidade dos critérios
e metodologias, composições de custos destes serviços, para ao final ser dispo-
nibilizado um orçamento completo40 com as respectivas indicações dos padrões

37
Acórdão nº 2.618/2018, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler, j. em 14.11.2018.
38
Acórdão nº 2.618/2018, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler, j. em 14.11.2018.
39
Acórdão nº 2.612/2018, Plenário, rel. Min. Vital do Rêgo, j. em 14.11.2018.
40
Acórdão nº 783/2018, Plenário, rel. Min. Augusto Sherman, j. em 11.04.2018.

R. bras. de Infraestrutura – RBINF | Belo Horizonte, ano 8, n. 15, p. 125-146, jan./jun. 2019 139
Roberto Tadao Magami Junior

de desempenho e o plano de ação para a obtenção da licença prévia ambiental


antes da licitação,41 como condição necessária à emissão da ordem de serviço
inicial das obras.42
Além disso, se faz premente a regulamentação do controle de trâmite de
orçamentos e outros documentos relativos ao regime de contratação integrada,
culminando ao final com portaria de aprovação de seu teor.43
Outrossim, sempre que o anteprojeto, por seus elementos mínimos, assim
o permitir, as estimativas de preço devem se basear em orçamento sintético tão
detalhado quanto possível, balizado pelo SINAPI e/ou SICRO,44 devendo a utiliza-
ção de estimativas paramétricas e a avaliação aproximada baseada em outras
obras similares serem realizadas somente nas frações do empreendimento não
suficientemente detalhadas pelo anteprojeto.
Merece destacar que essa exigência feita pelo Tribunal de Contas da União
ignora o artigo 66, §4º, do Decreto nº 7.581/2011 (regulamenta o RDC), que
desobriga a observância das tabelas do SINAPI e do SICRO na determinação do
custo global para execução das obras e serviços de engenharia contratados me-
diante o regime de contratação integrada.
Esta disposição é considerada ilegal pela Corte, e concordamos com este
posicionamento, na medida em que a comprovação de economicidade deve ocor-
rer por intermédio de algum critério objetivo como o são as tabelas do Sistema
Nacional de Preços e Índices para a Construção Civil – SINAPI (utilizado para a ela-
boração dos orçamentos dos projetos de construção civil) e o Sistema de Custos
Referenciais de Obras – SICRO (utilizado para a elaboração dos orçamentos de
projetos rodoviários, ferroviários, aquaviários e licitação das respectivas obras),
cada qual com sua função.
Saliente-se que a Lei das Estatais possui texto expresso (artigo 31, §2º), no
sentido de que o orçamento de referência do custo global de obras e serviços de
engenharia deverá ser obtido a partir de custos unitários de insumos ou serviços
menores ou iguais à mediana de seus correspondentes no Sistema Nacional de
Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI), no caso de constru-
ção civil em geral, ou no Sistema de Custos Referenciais de Obras (SICRO), no
caso de obras e serviços rodoviários, devendo ser observadas as peculiaridades
geográficas.

41
Acórdão nº 2.726/2016, Plenário, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, j. em 26.10.2016.
42
Acórdão nº 1.388/2016, Plenário, rel. Min. Ana Arraes, j. em 01.06.2016.
43
Acórdão nº 2.612/2018, Plenário, rel. Min. Vital do Rêgo, j. em 14.11.2018.
44
Acórdão nº 877/2016, Plenário, rel. Min. Weder de Oliveira, j. em 13.04.2016.

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6.2 Anteprojeto de engenharia elaborado por pessoal com


expertise e devidamente instruído
Para a Corte de Contas, é imprescindível que a elaboração do anteprojeto
seja feita por um profissional com expertise,45 ou seja, não é permitida a delega-
ção desta atribuição a servidores comuns.
A título de exemplo trazemos uma Tomada de Contas onde foi determinado
ao Departamento Nacional de Infraestutura de Transportes – DNIT que se crie
um ato normativo delegando competência às superintendências regionais para
elaboração, análise, aceitação e/ou aprovação de anteprojetos e projetos de en-
genharia nos casos em que as unidades locais não possuam estrutura ou ex-
pertise técnica suficiente para realização dos trabalhos delegados, sob pena de
responsabilidade por culpa in eligendo da autoridade delegante pelas eventuais
irregularidades decorrentes.
No mesmo aresto restou consignado que, em regra, faz-se necessário que
o anteprojeto preveja a arquitetura consistente do empreendimento, tendo em
vista ser essa a informação definidora do produto a ser entregue à Administração
e constitui-se em elemento fundamental para a avaliação de eventuais metodolo-
gias diferenciadas para o seu adimplemento.

6.3 Matriz de risco


De acordo com o artigo 9º, §5º, do RDC, há uma discricionariedade no tocan-
te à inserção da matriz de riscos no anteprojeto de engenharia. Caso seu teor con-
temple matriz de alocação de riscos entre a Administração Pública e o contratado,
o valor estimado da contratação poderá considerar a taxa de risco compatível com
o objeto da licitação e as contingências atribuídas ao contratado, de acordo com
metodologia predefinida pela entidade contratante.
Ocorre que, para a Corte de Contas, se trata de um item obrigatório a constar
no instrumento convocatório, com alocação a cada signatário dos riscos inerentes
ao empreendimento.46 Em que pese a obrigatoriedade de constar no instrumento
convocatório, não há como se aventar que durante a elaboração do anteprojeto
de engenharia a matriz de riscos seja desconsiderada, definindo a repartição ob-
jetiva de responsabilidades advindas de eventos supervenientes à contratação,
como medida de informação indispensável para a caracterização do objeto e das

45
Acórdão nº 2.075/2018, Plenário, rel. Min. Ana Arraes, j. em 05.09.2018.
46
Acórdão nº 2.980/2015, Plenário, rel. Min. Ana Arraes, j. em 18.11.2015.

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respectivas responsabilidades contratuais, além do adequado dimensionamento


das propostas por parte das licitantes.
No tocante às contratações integradas pelas Estatais, o artigo 42, §3º, é ex-
presso ao impor que nas contratações integradas ou semi-integradas os riscos de-
correntes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução
de projeto básico pela contratante sejam alocados como de sua responsabilidade.

6.4 Anteprojeto de engenharia padrão e necessidade de


observância das peculiaridades regionais
Uma das diretrizes do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (artigo
4º, incisos I e II), assim como da Lei das Estatais (artigo 32, inciso I), é a padro-
nização do objeto da contratação relativamente às especificações técnicas e de
desempenho e, quando for o caso, às condições de manutenção, assistência
técnica e de garantia oferecidas, assim como de instrumentos convocatórios e
minutas de contratos.
Esta providência é inclusive salutar na elaboração de anteprojetos padrão no
âmbito dos Ministérios ou Secretárias Estaduais para a construção de escolas,
hospitais, estabelecimentos prisionais, etc.
Não obstante, é necessário que se observe também a busca da maior van-
tagem para a Administração Pública, para a empresa pública ou sociedade de
economia mista, considerando custos e benefícios, diretos e indiretos, de na-
tureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, ao
desfazimento de bens e resíduos, ao índice de depreciação econômica e a outros
fatores de igual relevância.
Em uma auditoria de conformidade com objetivo de avaliar os projetos pa-
dronizados do Ministério da Saúde para obras de construção de Unidades Básicas
de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), a Corte de Contas
constatou falhas identificadas nos anteprojetos das UBS e UPA 24h e a inclusão,
para fins de registro do preço global para execução de cada obra, de itens cujos
preços são afetados pelas condições do local de implantação das UBS.47
O objetivo desta exigência é muito simples: incentivar a utilização, sempre
que possível, de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas existentes
no local da obra ou serviço de engenharia, a ser executado, com o escopo de
auxiliar no desenvolvimento sustentável da economia local, desde que não haja
prejuízo ao orçamento.

47
Acórdão nº 2.618/2018, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler, j. em 14.11.2018.

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Ainda nos casos em que ocorra a elaboração de um projeto padronizado


em nível básico ou executivo, ocorrendo a licitação pelo sistema de Registro de
Preços, é imprescindível que a Administração Pública divulgue a intenção desse
procedimento, nos termos do artigo 92 do Decreto nº 7.581/2011, com a finalida-
de de permitir a participação de outros órgãos ou entidades públicas.48
Uma constatação na leitura do acórdão é a ausência de apontamentos quan-
to à análise do material sob a ótica da sustentabilidade ambiental, que também é
uma das diretrizes contidas em ambos os diplomas legislativos, e que, portanto,
o Tribunal de Contas da União também deve exigir.

7 Conclusões
Diante de todas as considerações, cumpre sintetizarmos alguns aspectos
que condensam as conclusões apresentadas ao longo do texto.
1. A contratação integrada é um tema ainda recente no Direito Administrativo
brasileiro e que tem suscitado diversas discussões, principalmente por atribuir o
desenvolvimento dos projetos básico e executivo exclusivamente ao contratado,
cuja legislação não elenca de maneira exaustiva os requisitos que devem estar
previstos no anteprojeto de engenharia.
2. Atualmente, o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei nº
12.462/2011) possui um rol taxativo, constante de seu artigo 1º, que restringe a
contratação integrada a poucas hipóteses e, ainda, a condiciona ao preenchimen-
to dos seguintes requisitos: (i) inovação tecnológica ou técnica; (ii) possibilidade
de execução com diferentes metodologias; ou (iii) possibilidade de execução com
tecnologias de domínio restrito no mercado.
3. Considerando este peculiar panorama, torna-se imprescindível a análise
do Direito Comparado, onde citamos, a título de exemplo, tanto a Argentina quanto
a França.
4. No âmbito das contratações públicas do Direito argentino, regime de exe-
cução integrada, é assegurada a utilização do contrato llave en mano, ou contrato
de obra por empresa, para qualquer obra ou serviço, independentemente de valo-
res, ou observância de requisitos técnicos.
5. Em França, a contratação integrada é condicionada à observância de re-
quisitos de ordem técnica, mas não se exige um determinando montante para
investimento na contratação da obra ou serviço.
6. Além do Direito Comparado, ressaltamos que está pendente de análise
pelo Plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 6.814/2017, que

48
Acórdão nº 2.618/2018, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler, j. em 14.11.2018.

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institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e revoga a Lei


nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e
dispositivos da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011.
7. Seu artigo 41, §11, permite a utilização da contratação integrada indistin-
tamente para as obras, serviços e fornecimentos de engenharia, cujo orçamento
perfaça a quantia de R$10.000.000,00 (dez milhões de reais), dispensando da
observância desta quantia os projetos de ciência, tecnologia, inovação e Ensino
Técnico ou Superior.
8. Com efeito, tanto o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID quan-
to o Tribunal de Contas da União enfatizam ser imprescindível a apresentação
de estudos objetivos que fundamentem técnica e economicamente a contratação
integrada e considerem a expectativa de vantagens quanto à competitividade, pra-
zo, preço e qualidade em relação a outros regimes de execução, especialmente a
empreitada por preço global, o que demonstra a necessidade de aperfeiçoamento
do mencionado dispositivo previsto no Projeto de Lei nº 6.814/2017.
9. Em razão da vaguidão presente tanto no Regime Diferenciado de
Contratações Públicas quanto na Lei das Estatais, no que atina aos requisitos
para a elaboração do anteprojeto de engenharia, merecem destaque outras diretri-
zes que devem ser observadas, tais como as contidas na NBR 16636-1:2017, da
Associação Brasileira de Normas Técnicas.
10. Sem prejuízo, torna-se de vital importância a análise das decisões pro-
feridas pelo Tribunal de Contas da União acerca do tema, que exige a instauração
de um processo administrativo para a elaboração do anteprojeto de engenharia,
desenvolvido por um profissional com expertise.
11. No âmbito desse procedimento, devem constar inicialmente o plano de
ação, acompanhado dos critérios e metodologias para a composição de custos
dos serviços, as pesquisas de preços amparadas em orçamento sintético ba-
lizado pelo Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção
Civil (SINAPI), para obras habitacionais, de saneamento básico e de infraestru-
tura urbana e/ou Sistema de Custos Referenciais de Obras (SICRO), para obras
rodoviárias.
12. Além disso, durante a elaboração do anteprojeto de engenharia, tanto no
âmbito do RDC quando da Lei das Estatais, a matriz de riscos deve ser conside-
rada, e, portanto, definida a repartição objetiva de responsabilidades advindas de
eventos supervenientes à contratação, como medida de informação indispensável
para a caracterização do objeto e das respectivas responsabilidades contratuais.
Ao final, devem ser disponibilizados um orçamento completo e uma portaria de
aprovação de seu teor.

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O anteprojeto de engenharia na contratação integrada prevista no Regime Diferenciado...

13. E a última das diretrizes do Tribunal de Contas da União, quando da


elaboração de anteprojetos no âmbito dos Ministérios ou Secretárias Estaduais
para a construção de escolas, hospitais, estabelecimentos prisionais, etc., é a
padronização do objeto da contratação relativamente às especificações técnicas e
de desempenho e, quando for o caso, das condições de manutenção, assistência
técnica e de garantia oferecidas, assim como de instrumentos convocatórios e
minutas de contratos.

Engineering preliminary draft in design-build contracting for the Special Public Contracting System
and in state-owned companies and the demands of the Federal Audit Court
Abstract: The present work has the goal to demonstrate the requirements of a preliminary engineering
project in Design-Build contracting, both in the Differentiated Regime of Public Contracting (Law nº
12.462/2011) and in the Law of State-owned Companies (Law nº 13.303/2016). in addition to
drawing a parallel between both, comparing them with Bill nº 6.814/2017, which intends to unify all
bidding procedures, repealing Laws nº 8.666/93, nº 10.520/2002 and nº 12.462/2011, as well as
presenting the position of the Federal Audit Court – TCU.

Keywords: Design-build. Engineering draft. Requirements. Law nº 12.462/2011. Law nº 13.303/2016.


Comparative Law. Bill nº 6.814/2017. Brazilian Court of Audit.

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Recebido em: 21.02.2019


Aprovado em: 25.03.2019
Received in: Feb. 21st 2019
Approved in: Mar. 25th 2019

Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2018 da Associação


Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):

MAGAMI JUNIOR, Roberto Tadao. O anteprojeto de engenharia na contratação


integrada prevista no Regime Diferenciado de Contratações Públicas e na Lei das
Estatais e as exigências do Tribunal de Contas da União. Revista Brasileira de
Infraestrutura – RBINF, Belo Horizonte, ano 8, n. 15, p. 125-146, jan./jun. 2019.

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