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Evolução dos preços relativos no IPCA

Estudo Especial nº 36/2019 – Divulgado originalmente como boxe do Relatório de Inflação (março/2019)
- volume 21 | nº 1

A análise da evolução dos preços relativos é importante para o entendimento da dinâmica


inflacionária, ao colocar sob perspectiva tendências de longo prazo e oscilações decorrentes de
choques temporários. Considerando o comportamento heterogêneo dos diversos segmentos de
preços na economia brasileira nas últimas duas décadas, este estudo avalia a evolução dos
preços relativos a partir da desagregação da inflação de preços ao consumidor nos seguintes
componentes: alimentos no domicílio; bens industriais; serviços e monitorados.
A desagregação por componentes, considerado o Índice Nacional de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA) (Gráfico 1), 1 evidencia a trajetória ascendente dos preços relativos de alimentos e
serviços, em contraste com a evolução dos preços relativos de bens industriais. 2 O segmento de
monitorados, por sua vez, alternou episódios de elevação e redução relativa, repercutindo
questões regulatórias e de política econômica, além de oscilações associadas ao câmbio e às
adversidades climáticas no caso de preços de energia.
Gráfico 1 – Preços relativos – segmentos do IPCA
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA
140
130
120
110
100
90
80
70
60
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Serviços Alimentação no domicílio
Bens industriais Monitorados
Fonte: IBGE

O setor industrial mostra, em geral, maior capacidade de incorporar avanços tecnológicos que
resultam em redução do custo de produção e, por conseguinte, diminuição do preço relativo
dos seus produtos. Adicionalmente, os bens industriais são, em geral, passíveis de
comercialização entre economias distintas, permitindo que seus preços se beneficiem da
expansão e reorganização do comércio internacional e regional. Entre os produtos industriais, o

1Neste e nos demais gráficos do estudo, as séries dos índices de preços dos diversos componentes da inflação foram deflacionadas
pelo IPCA.
2Outras análises enfocando os segmentos de preços livres podem ser encontradas nos boxes do Relatório de Inflação: “O que
determina o comportamento da inflação de bens industriais?”, de dezembro de 2016; “Evolução recente da inflação de alimentos”,
de junho de 2016; e “Inflação no setor de serviços”, de setembro de 2016.

1
movimento de redução dos preços relativos mostra-se mais evidente para os bens duráveis,
enquanto os preços relativos de não-duráveis e semi-duráveis se aproximam de padrão mais
estável, com tendência clara de recuo desses últimos no período mais recente (Gráfico 2). Em
geral, a redução do preço relativo é mais pronunciada em categorias de bens nas quais há maior
frequência de inovações tecnológicas que resultam em criação de produtos ou substituição dos
existentes por similares de qualidade superior, com destaque para produtos eletrônicos.
Gráfico 2 – Preços relativos – bens industriais
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA
120
110
100
90
80
70
60
50
40
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Duráveis Não-duráveis Semi-duráveis
Fonte: IBGE

O segmento de alimentação no domicílio, em sentido oposto, experimentou trajetória de


inflação acima da inflação agregada 3 de meados de 2000 até o final de 2016 (Gráfico 3) 4. Para
essa dinâmica, contribuiu o crescimento da atividade econômica nas economias emergentes,
acima da média global, o que pressionou a demanda por alimentos – pela incorporação de
contingente de indivíduos de baixa renda nos mercados de consumo. Concorreram no mesmo
sentido o aumento nos preços de insumos, como terra, fertilizantes e mão-de-obra, e o avanço
expressivo nos preços de commodities. A partir de 2017, observou-se menor pressão sobre a
inflação de alimentos, repercutindo evolução benigna de preços de commodities agrícolas, em
ambiente de desaceleração do ritmo de crescimento da economia mundial e, ainda, fatores
benignos do lado da oferta doméstica de alimentos. Observa-se que, em linhas gerais, o
comportamento relativo dos preços de alimentos no Brasil encontra semelhança em países
emergentes da América Latina (Gráfico 4).

3 Naturalmente, tal tendência sofreu maior variabilidade cíclica, devido aos choques de oferta e variações cambiais.
4O Gráfico 3 compara a evolução dos preços de alimentação no domicílio com o Índice de Commodities – Brasil (IC-Br) Agropecuário
em reais, ambos deflacionados pelo IPCA.

2
Gráfico 3 – Alimentos e commodities Gráfico 4 – Preços relativos de alimentos
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA Jul/1999 = 100, deflacionado pelos respectivos IPCs
180 130
170
160 120
150
140
110
130
120
110 100

100
90 90
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Alimentação no domicílio IC-Br Agro Brasil Chile México Colômbia
Fontes: IBGE e BCB Fonte: OCDE

Os preços relativos no segmento de serviços aumentaram do início de 2003 até o final de 2014
e apresentaram certa estabilidade nos últimos quatro anos. Esse movimento refletiu, além do
menor ganho de produtividade e competição com o exterior, o efeito mais pronunciado do ciclo
econômico sobre os preços de serviços. O Gráfico 5 evidencia como os períodos de elevação dos
preços relativos de serviços coincidem com a aceleração dos salários reais de admissão 5,
sugerindo que a maior relevância do fator trabalho na estrutura de custos do setor potencializa
os efeitos do ciclo econômico sobre a inflação de serviços.
Gráfico 5 – Serviços e salário real
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA
125

115

105

95

85

75
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Serviços Sal. Adm.
Fontes: IBGE e Secretaria de Trabalho/ME

Para a trajetória dos preços monitorados (Gráfico 6), contribuíram, principalmente, os itens
energéticos (combustíveis e eletricidade), que possuem participação de aproximadamente 38%
do segmento. No caso de derivados de petróleo, destacam-se os impactos cambiais, de preços
internacionais e da política de preços praticada pela Petrobras. No período entre 2005 e 2010,
com exceção do segundo semestre de 2008, a apreciação cambial atuou no sentido de mitigar
o impacto da alta dos preços internacionais dos combustíveis, efeito também exercido por
reajustes infrequentes nas refinarias no período de 2012 a 2014. Entre 2017 e 2018, a elevação
dos preços internacionais de combustíveis teve impacto relevante na alta dos itens energéticos.
No caso de energia elétrica, questões regulatórias e irregularidades pluviométricas entre os anos

5 A série de salários médios de admissão no mercado de trabalho formal foi dessazonalizada e deflacionada pelo IPCA.

3
de 2013 e 2015 6 afetaram sensivelmente os preços relativos do segmento energético, com
impacto ainda presente nas tarifas atuais.
Gráfico 6 – Preços relativos – monitorados
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA
150

140

130

120

110

100

90
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Monitorados – Energéticas
Monitorados – Ex-energéticas e plano de saúde
Fonte: IBGE

Fora do segmento de energia, mas também com participação expressiva no segmento de


monitorados, destaca-se o item plano de saúde, que registrou aumento de preços
significativamente acima da inflação e, também, dos demais serviços de saúde (Gráfico 7). Em
particular, a aceleração dos preços de plano de saúde desde 2016 está, em parte, relacionada à
redução do número de beneficiários, sobretudo dos mais jovens, em decorrência da recessão e
posterior período de retomada gradual da atividade econômica e à continuidade do crescimento
das despesas assistenciais.
Gráfico 7 – Preços relativos – serviços de saúde
Jul/1999 = 100, deflacionado pelo IPCA
175

155

135

115

95

75
Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul Jul
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017
Plano de saúde Demais serviços de saúde
Fonte: IBGE

Em resumo, a análise do comportamento dos preços relativos dos principais segmentos do IPCA
evidencia que o segmento de monitorados foi importante fonte de oscilação dos preços relativos
na comparação histórica, em função de mudanças estruturais que impactaram o item energia

6
Houve redução média de 19% nas tarifas de energia elétrica em janeiro e fevereiro de 2013, no contexto da Medida Provisória
nº 579/2012, convertida na Lei nº 12.783/2013. Já em março de 2015 uma alta de 22% foi provocada pela revisão extraordinária
que visava a garantir o equilíbrio econômico-financeiro das concessionárias, afetadas, dentre outros fatores, pelo cenário
hidrológico adverso do ano anterior. Adicionalmente, a exposição das distribuidoras ao mercado de curto prazo em 2014, decorrente
do elevado grau de descontratação, levou à realização de operações de créditos e criação da Conta no Ambiente de Contratação
Regulada (Conta-ACR), ainda presente na composição das tarifas de energia elétrica.

4
elétrica residencial e de flutuações em preços de combustíveis. Os preços de planos de saúde
exerceram acentuada pressão para o aumento dos preços de monitorados, em especial, a partir
de 2016. Os preços livres apresentaram dinâmicas distintas entre os componentes, destacando-
se a trajetória majoritariamente ascendente dos preços relativos de alimentos e serviços no
período avaliado, e tendência clara de redução dos preços de bens industriais, particularmente,
dos duráveis.

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