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Rerum Novarum 

: sobre a condição dos operários (em latim Rerum Novarum


significa "Das Coisas Novas") é uma encíclica escrita pelo Papa Leão XIII a 15 de Maio
de 1891. Era uma carta aberta a todos os bispos, debatendo as condições das classes
trabalhadoras. Wilhelm Emmanuel von Ketteler e Edward Manning tiveram grande
influência na sua composição.

A encíclica trata de questões levantadas durante a revolução industrial, e critica, e as


sociedades democráticas no final do século XIX. Leão XIII apoiava o direito dos
trabalhadores formarem sindicatos, mas rejeitava o socialismo e defendia os direitos à
propriedade privada. Discutia as relações entre o governo, os negócios, o trabalho e a
Igreja. Muitos defendem que propunha uma estrutura social e econômica que mais tarde
se chamaria corporativismo.

A encíclica critica fortemente a falta de princípios éticos e valores morais na sociedade


de seu tempo e laica, uma das grandes causas dos problemas sociais. O documento
papal refere alguns princípios que deveriam ser usados na procura de justiça na vida
industrial e sócio-económica, como por exemplo a melhor distribuição de riqueza, a
intervenção do Estado na economia a favor dos mais pobres e desprotegidos, a caridade
do patronato aos trabalhadores.

A encíclica veio completar outros trabalhos de Leão XIII durante o seu papado
(Diuturnum, sobre a soberania política; Immortale Dei, sobre a constituição cristã dos
Estados e Libertas, sobre a liberdade humana) para modernizar o pensamento social da
Igreja e da sua hierarquia. Em geral é considerada como o pilar fundamental da
Doutrina Social da Igreja. Pelos sucessores no papado foi denominada de "Carta Magna" do
"Magistério Social da Igreja". Pode ser basicamente dividida, para fins de estudo, em quatro
grandes partes:

I - A Questão Social e o Socialismo


Inicia o texto fazendo um levantamento da situação social da época e da crise social que
o mundo passava, de conflitos, e critica a situação de miséria e pobreza que os
trabalhadores estavam submetidos em razão de um liberalismo irresponsável, de um
capitalismo selvagem e de patrões desumanos. Os trabalhadores estavam sendo vítimas
da cobiça e de uma concorrência desenfreada da ganância e de leis que haviam perdido
o sentido e os princípios cristãos: ...é necessário, com medidas prontas e eficazes, vir
em auxílio dos homens das classes inferiores, atendendo a que eles estão, pela maior
parte, numa situação de infortúnio e de miséria imerecida.

E ainda criticava a concentração das riquezas nas mãos de poucos e do mal uso que dela
faziam: A usura voraz veio agravar ainda mais o mal. Condenada muitas vezes pelo
julgamento da Igreja, não tem deixado de ser praticada sob outra forma por homens,
ávidos de ganância, e de insaciável ambição. A tudo isso deve acrescentar-se o
monopólio do trabalho e dos papéis de crédito, que se tornaram um quinhão de um
pequeno número de ricos e de opulentos, que impõe assim um julgo quase servil à
imensa multidão dos operariados.
Nesta primeira parte a encíclica refuta o critério socialista sobre a propriedade privada,
acusa de injustas e absurdas as razões aduzidas pelos socialistas. Afirma que o homem
antecede ao Estado em valor, dignidade e importância e o antecede também no tempo,
que o fim do Estado é propiciar o bem comum do homem e de prover-lhe os meios para
que possa alcançar a felicidade. Não é o homem para o Estado mas o Estado que existe
em função do homem.

Afirma que o direito de propriedade é de direito natural, fruto e baseia-se no trabalho


humano e baseia-se ainda na essência da vida doméstica. Chama de desastrosas as
conseqüências da solução socialista: Por tudo o que Nós acabamos de dizer, se
compreende que a teoria socialista da propriedade colectiva deve absolutamente
repudiar-se como prejudicial àqueles membros a que se quer socorrer, contrária aos
direitos naturais dos indivíduos, como desnaturando as funções do Estado e
perturbando a tranquilidade pública.

II - A Questão Social e a Igreja


Considera erro capital considerar que ricos e pobres são classes destinadas a se
digladiarem. Sem o concurso da Igreja os esforços dos homens não obterão êxito
satisfatório.

III - A Questão Social e o Estado


Nesta parte discorre sobre a garantia da propriedade e da paz. Fala da corrupção dos
costumes na época. Da proteção dos bens da alma, do adequado regime de trabalho, da
proteção da idade e do sexo do trabalhador e defende o justo salário.

IV - A Questão Social e ação conjunta de patrões e


empregados
Neste capítulo considera de incalculável vantagem as associações de socorro e
previdência dos trabalhadores, que são principalmente recomendáveis as associações de
operários e que estas deverão ser prudentemente organizadas.

Conseqüências
A Rerum Novarum, bem como outros trabalhos de Leão XIII e a sua acção no longo
cargo como Papa (1878–1903), deu início a uma nova forma de relacionamento entre a
Igreja Católica e o mundo moderno, que consiste na abertura da própria Igreja. A Igreja
começou a empenhar-se a procurar soluções, à luz do Evangelho e dos ensinamentos
cristãos, para os problemas sociais vividos pela humanidade.

Este documento introduziu também o princípio da subsidiariedade e estabeleceu


orientações a respeito dos direitos e deveres do capital e do trabalho. O Papa Leão XIII
refutou como falsas as teorias socialistas marxistas e defendeu a propriedade privada,
acreditando que as soluções iriam surgir das acções combinadas da Igreja, do Estado,
dos empregadores e dos empregados. No entanto, outras afirmações da encíclica
opõem-se também aos excessos do capitalismo. Na altura, o apoio do Papa a sindicatos
e a um salário decente era visto como radicalmente liberal.

A Doutrina Social da Igreja

Com esta encíclica deu-se início à sistematização do pensamento social católico,


passado a chamar-se vulgarmente de Doutrina Social da Igreja Católica. Este
pensamento vai muito além de apresentar uma simples alternativa ao capitalismo e ao
marxismo. Na "Doutrina Social da Igreja" a Igreja busca propiciar ao cristão os
princípios de reflexão, os critérios de julgamento e as diretrizes de ação donde partir
para promover esse humanismo integral e solidário. (...) Tal doutrina possui uma
profunda unidade, que provém da Fé em uma salvação integral, da Esperança em uma
justiça plena, da Caridade que torna todos os homens verdadeiramente irmãos em
Cristo. (...) a Igreja, com a sua doutrina social, não entra em questões técnicas e não
institui e nem propõe sistemas ou modelos de organização social: isto não faz parte da
missão que Cristo lhe confiou.(Compêndio, n. 3, 7 e 68).

No entanto, Pela relevância pública do Evangelho e da fé e pelos efeitos perversos da


injustiça, vale dizer, do pecado, a Igreja não pode ficar indiferente às vicissitudes
sociais: Compete à Igreja anunciar sempre e por toda parte os princípios morais,
mesmo referentes à ordem social, e pronunciar-se a respeito de qualquer questão
humana, enquanto o exigirem os direitos fundamentais da pessoa humana ou a
salvação das almas. (Compêndio, n. 71)

Muitas das posições da Rerum Novarum foram suplementadas por encíclicas


posteriores, em especial a Quadragesimo Anno de Pio XI em 1931, e a Mater et
Magistra de João XXIII em 1961, e por Papa João Paulo II em 1991 com Centesimus
annus. Que vieram a constituir o corpo da moderna Doutrina Social da Igreja.

Esta encíclica também influenciou fortemente na formação de uma novo pensamento e


movimento político, a Democracia cristã. Este pensamento defende a implantação de
uma democracia baseada nos princípios cristãos. Muitos defendem que a estrutura social
e económica proposta pela encíclica deu origem ao corporativismo. As ideias de Leão
XIII são, embora muito distorcidas, uma influência para o desenvolvimento posterior do
Fascismo italiano de Benito Mussolini.

Citações
 "Todavia a Igreja, instruída e dirigida por Jesus Cristo, eleva as suas vistas ainda
mais alto; propõe um corpo de preceitos mais completos, porque ambiciona
estreitar a união das duas classes até as unir uma à outra por laços de verdadeira
amizade".

 "Quanto aos ricos e aos patrões, não devem tratar o operário como escravo, mas
respeitar nele a dignidade do homem, realçada ainda pela do Cristão. O trabalho
do corpo, pelo testemunho comum da razão e da filosofia cristã, longe de ser um
objecto de vergonha, honra o homem, porque lhe fornece um nobre meio de
sustentar a sua vida. O que é vergonhoso e desumano é usar dos homens como
de vis instrumentos de lucro, e não os estimar senão na proporção do vigor dos
seus braços."

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