Quando iniciei o crochê, foi muito difícil. Na verdade, no início foi fácil.
Comprei a linha, escolhi a cor, tava super entusiasmado e emocionado. Nem
conseguia enxergar as possíveis dificuldades que viriam e a responsabilidade que seria. Fui dando os primeiros pontos. Parecia fácil, mas logo me perdi na conta deles e acabei tendo que contar novamente. Depois de um tempo parecia que tinha pego prática e tudo estava saindo bem. Foi justamente na certeza de que estava tudo bem, que logo mais percebi que havia perdido os pontos novamente. Tive que desmanchar vários até conseguir contar novamente. Desisti algumas vezes, várias vezes. Aí lembrava como seria especial ver tudo pronto e aquele sentimento do início voltava e eu nem lembrava porquê havia desistido, afinal, tudo poderia ser consertado. Quase tudo, porquê em um momento a linha arrebentou e tive de fazer um nó. Surgiu a dúvida: será que vai ficar aparente? Será que vale a pena continuar? Lembrei que aquela não era a primeira tentativa. Sim, houveram outras tentativas, onde nos primeiros erros acabei desistindo, por vezes parecia que a própria linha também não estava afim de soltar o novelo. Entendi que não poderia tentar do início todas as vezes que algo desse errado. Era necessário ter persistência ou passaria a vida inteira com a lembrança de muitas tentativas, que mesmo válidas, não eram inteiras. E precisava de algo inteiro, precisava concretizar, do contrário, teria apenas tentado. Foi então que precisei diversas vezes amarrar uma linha na outra. Dei um jeitinho aqui e ali para consertar. Aos poucos, depois de longos e cansativos momentos, onde sentia raiva, ria, ficava nervoso, parecia que havia pego o jeito. Comecei a fazer tudo de uma forma mais natural, não era difícil, a linha deslizava na agulha e entre meus dedos. Não vou dizer que a partir daí tudo ficou fácil. Talvez os desafios tenham ficado mais fáceis, porque havia maior habilidade para contornar os obstáculos, contornar, não ignorar, pois do contrário, tudo saía do controle e mais estresse era necessário. Quando vi, ele tava na minha frente, prontinho. Talvez ainda faltassem alguns detalhes que não havia percebido, mas eram parte da digital do meu trabalho, era o que também o tornava uma parte minha. A única forma de ter chegado nesse resultado, foi sempre, apesar de qualquer dificuldade, ter sempre a lembrança do verdadeiro motivo daquilo. Lembrar sempre de quando comprei a linha, de quando escolhi a cor, quando planejei tudo com tanto carinho. Quando ainda não tinha nem mesmo um ponto, passei a amar cada ponto dado, cada nó entre as linhas. As pessoas acharam "perfeito" vendo de longe de tanto esforço. Talvez as avarias que eu havia me importado tanto, nem fossem assim tão aparentes e caso alguma delas resolvesse dar as caras, havia ainda a possibilidade de amarrar novamente, colar ali, costurar ali. Pronto, ali estava uma parte de mim. Uma parte do meu esforço, do meu intelecto, do meu cansaço. Principalmente, uma parte enorme do meu afeto. Cada ponto dado, foi uma parte do amor que existe em mim e que se materializou. Finalmente eu tinha algo concreto, algo além de uma vontade ou uma lembrança, que sim, era em parte isso, mas que para além do líquido, não poderia escorrer, mas estava ali, diante de mim e diante de ti.