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Edmilson Rodrigues
Jurandir Novaes
Luiz Araújo
CONGRESSO DA CIDADE
LABOR EDITORIAL
Belém do Pará
2002
Capa:
Foto:
Coordenação Editorial: Labor Editorial
Revisão formal do texto: jornalista Marta Brasil
Revisão bibliográfica: Marly Jorge Brito
Supervisão Editorial:
Editoração:
1- À guisa de introdução
10 - Os autores:
1
Programa de Governo “Edmilson Prefeito”. – Belém : Frente Belém Popular (PT/PcdoB/PPS/PSTU/PCB),
outubro de 1996.
participação popular, o que é fundamental para a administração e para a
governabilidade.
Nesse sentido, a experiência do planejamento estratégico (situacional), que
tem sido usada no PT, nos movimentos sociais e na CUT, é uma conquista
importante. Se conseguirmos estabelecer uma ponte entre ele (planejamento
estratégico situacional) e o Orçamento Participativo podemos avançar na reflexão
da cidade como totalidade e na construção de novos valores, na consolidação de
um campo democrático-popular que possa alimentar o sonho de construção de
uma sociedade mais justa, igualitária.”2
Quatro anos passaram-se de uma rica experiência de participação popular e a
idéia de avançar na perspectiva de um “planejamento urbano com participação
popular” foi sendo amadurecida. Estava plantada a desafiadora semente do
processo que viria se constituir no Congresso da Cidade.
O programa de governo elaborado para referenciar o segundo mandato do
Governo do Povo, haja vista minha candidatura à reeleição em 2000, expressou-se
como qualitativa síntese dessa primeira experiência de governo democrático-
popular. Nossa proposta falava em continuidade mas apresentávamos à sociedade
um conteúdo programático com muito mais clareza e radicalidade estratégica.
Mais do que mudar a cultura política local, desejávamos a realização do poder
popular. De acordo com essa concepção, a construção da cidade sustentável
vincula-se ao objetivo estratégico de construção do socialismo.
Abaixo, excertos do programa:
“O Governo do Povo continuará profundamente comprometido em construir
o poder popular, contribuindo para o avanço das condições objetivas e subjetivas
em vista de uma cidade sustentável e um Estado socialmente controlado. Para
tanto, serão reforçados, aperfeiçoados e ampliados os canais de participação,
ajudando a construir esferas públicas não estatais onde a sociedade dispute e
amplie direitos. A Radicalização da Democracia será buscada na combinação da
democracia direta e da democracia representativa, avançando na produção e
disponibilização das informações com novas modalidades de diálogo ativo com
entidades e movimentos da sociedade civil organizada.
As ações visam a Universalização da Cidadania, desenvolvendo estratégias
includentes, que enfrentem o neoliberalismo, buscando efetivar políticas sociais
que ampliem ao máximo o acesso dos excluídos a uma melhor qualidade de vida e
cidadania.
A conquista de uma Belém Sustentável requer a criação de novas concepções
humanas, já que o desenvolvimento sustentável só é viável na medida em que a
sociedade seja sustentável, o que implica modificar o modelo político-econômico, a
situação sócio-ambiental, as relações culturais e religiosas, as relações humanas de
gênero, raça e etnia.
O projeto de cidade defendido representa o desafio de inverter prioridades,
com um projeto estratégico de desenvolvimento que busque a universalização da
2
RODRIGUES, Edmilson. Dilemas e Desafios. In : Palocci, Antônio et alli. Desafios do Governo Local: o
modo petista de governar. São Paulo : Editora Fundação Perseu Abramo, 1997, pp. 63-8.
cidadania e a conquista da sustentabilidade. O Governo do Povo, ao aprofundar a
experiência do povo na gestão de uma das esferas do Estado, ao contribuir no
processo social de construção de um futuro mais bonito, feliz, constitui-se num
processo histórico que irriga e fertiliza o solo do sonho, bem como a luta de
construir esse sonho de desenvolvimento e felicidade humana, o socialismo.
1. Participação Popular com controle social como princípio norteador das
ações de governo;
2. Construção de valores fundados em novas relações econômico-culturais e
sociais, na perspectiva de uma sociedade socialista;
3. Inversão de prioridades, proporcionando o acesso a cidade, de todos os
seus cidadãos e cidadãs;
4. Deve assumir um caráter anti-neoliberal em defesa da soberania nacional
e dos valores internacionalistas;
5. Fortalecimento dos movimentos e organizações populares para a
construção e afirmação do poder popular;
6. Construção de um projeto de desenvolvimento local tendo como eixo
central a qualidade de vida, articulado a uma estratégia regional e nacional;
7. Aprofundamento do processo de refundação de Belém com vistas a
consolidar a construção de uma cidade a partir de sua identidade cultural;
8. Manter e aprofundar as políticas de valorização do serviço e do servidor
público;
9. Produzir e dar acesso a informação como instrumento de democratização
do poder, da participação e do planejamento da cidade.
Diretrizes
3
O PRÓXIMO Passo: qualidade de vida por uma Belém Criança - Diretrizes Programáticas da Frente Belém
Popular (2001/2004). Belém : Frente Belém Popular, pp. 25-30, 2000.
da Cidade. A autoria e o objetivo de cada texto serão indicados em notas de
rodapé.
6
Sobre concepção de cidade, entre outras referências, merecem destaque três obras de LEFEBVRE, Henri: A
Cidade do Capital. Rio de Janeiro : DP&A, 1999. (onde o autor recupera as contribuições teóricas de K. Marx e
F. Engels sobre a cidade); A Revolução Urbana. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 1999 e O Direito à Cidade. São
Paulo : Editora Moraes, 1991; LEITE, Maria Angela Faggin Pereira. Uma história de Movimentos, In.: SANTOS,
Milton e SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro:
Record, 2001, pp. 433-446 e RODRIGUES, Edmilson. Aventura Urbana: trabalho, meio ambiente e qualidade de
vida em Belém. Belém : NAEA-UFPa., 1996.
7
Ver RODRIGUES, Edmilson Brito. Modos Petistas de Governar. In.: BARRETO, L., MAGALHÃES, I.,
TREVAS, V. (Orgs.) Governo e Cidadania: balanço e reflexão sobre o modo petista de governar. São Paulo : Ed.
Perseu Abramo, 1999.
A experiência política e organizativa de um governo popular local deve se
expressar como prática social inovadora, revolucionária. A capacidade de manter
viva a esperança, vivo o sonho da libertação humana, de uma sociedade feliz,
antagônica a sociedade atual produtora da barbárie. Um governo de caráter
democrático e popular, compromissado com o objetivo da transformação da
realidade social, deve colocar as dimensões cultural e política como centrais e
estratégicas, porque quando não se muda valores, não se muda nada!
As forças conservadoras, ao longo de séculos, têm governado os Municípios,
as Unidades Federativas, e a Federação Brasileira. Têm permanecido hegemônicos
nos aparatos estatais. E, a despeito de longos períodos de ditadura formal, a
hegemonia hoje é legitimada pelo voto popular, em geral corruptamente obtido
devido a farsa da democracia burguesa. Desse modo, pode-se questionar os
mandatários do poder político, mas eles vão continuar podendo dizer:
“governamos desse jeito porque temos legitimidade popular, porque o estado de
direito, 'a democracia', autoriza-nos a assim proceder, em nome do povo que nos
elegeu". A total apartação entre os interesses dos "representantes do povo" (a
maioria dos mandatários) e os do povo (a maioria, formada pelos que vivem-do-
próprio-trabalho) tem sido justificada por essa "democracia" que se resume na
realização de eleições de quatro em quatro anos. Quais as causas da manutenção
dessa velha hegemonia? Fundamentalmente, encontram-se no campo dos valores
culturais hoje hegemônicos.
A produção social de uma nova cultura política, onde o povo desempenhe o
papel de protagonista, deve ser um objetivo central de governos que têm
compromisso com a transformação social: a desconstrução de valores enraizados
no egoísmo, no individualismo e a construção de novos valores baseados no ideal
de um mundo novo, de relações novas entre homens e mulheres que se expressem
na associação democrática e livre, na solidariedade, na fraternidade, no amor.
Só o povo pode ser sujeito, protagonista, das transformações sociais. A
concepção espontaneísta que tenta convencer de que os governos devem assumir
uma postura de neutralidade política, é hipócrita. Nenhum governo é neutro!
Como não é neutro quem vê uma criança sendo violentada e cruza os braços, não
denuncia o agressor, não tenta evitar a continuidade do estado de violência. Ainda
que indiretamente, estaria também protagonizando a violência. Uma postura que
se pretenda neutra contribui concretamente, para a manutenção do “status quo”
social. Como conciliar a contradição de tanto o povo quanto o governo serem
protagonistas das transformações sociais? Como não transigir do princípio da
autonomia popular em relação ao governo sem negar a este o direito de, através
do aparelho do estado, contribuir para a realização de um projeto de futuro
representativo dos interesses populares? A construção social de uma esfera pública
não estatal de planejamento e de controle social do estado pode representar um
mecanismo político privilegiado para contribuir com a mudança da cultura
política permeada por valores burgueses e com o processo de acúmulo de forças
para as transformações estruturais necessárias para tornar possível o sonho de um
mundo novo. Uma esfera pública não estatal que respeite a autonomia da parcela
da população tida como organizada, sociologicamente falando, e daquela parcela
significativa que é tida como desorganizada, mas que nas reuniões de vizinhos,
nos rituais de umbanda, nos encontros de casais cristãos, nos trabalhos dos grupos
artísticos, nos mutirões comunitários, outras formas de resistência cultural e de
lutas pelo direito a condições dignas de vida, mesmo ao largo das entidades ou
movimentos sociais institucionalizados, participam como protagonistas da história.
A experiência do “Congresso da Cidade” 8 - planejamento socialmente
construído - tem, através da criação de espaços de debates estratégicos, decisão
política e controle popular das ações do governo e de todo o aparelho de estado,
principalmente na esfera municipal, ajudado na construção de uma esfera pública
autônoma em relação ao estado, porém sugerida, incentivada e financiada pelo
governo municipal.
O Congresso da Cidade, experimentado mais radicalmente em Belém em
2001, incorporou o acúmulo dos 4 anos de Orçamento Participativo do primeiro
mandato do Governo do Povo (1997-2000) que bebeu na fonte de Porto Alegre,
Belo Horizonte e outras experiências democráticas e populares de governo.
Incorporou, também, a tradição participativa e organizativa de algumas categorias
profissionais ou setores como: saúde, educação, assistência social; dos Conselhos
Municipais, os já tradicionais (Condição Feminina, Educação, Saúde, etc.) ou os
recentemente criados (Negros, Transportes, Turismo, Assistência Social, etc.). Vale
observar que alguns conselhos vem sendo redefinidos, a exemplo do de educação
que cumpria um papel estritamente burocrático e do próprio Conselho Municipal
de Saúde que, passaram a protagonizar políticas públicas e aperfeiçoar as
experiências de controle social. Os acúmulos obtidos com a juventude através do
Orçamento Participativo da Juventude (OPJ), o papel central desenvolvido pelo
Conselho do Orçamento Participativo (COP) e a inovadora experiência da
formação dos Conselhos de Acompanhamento e Fiscalização das obras do OP
(COFIS), enfim, esse conjunto de formas de participação e controle social foram
8
A idéia de Congresso da Cidade, como espaço permanente de participação popular no planejamento e de
execução socialmente controlada do plano definido nesse exercício de democracia participativa, surgiu por
avaliar-se como insuficientes outros instrumentos de gestão democrática participativa. Reconhece-se, por
exemplo, a importância da adoção de métodos de planejamento restritos aos membros do governo, a fim de
compatibilizar a construção dos objetivos estratégicos com a construção social cotidiana do governo. O
Planejamento para a Ação Estratégica (PAE), proposto e adotado por Luiz Sérgio Gomes da Silva, tem
contribuído para uma ação integrada e imprescindível para a apropriação, pelos membros do Governo do
Povo, dos mecanismos institucionais de administração; tem possibilitado a elaboração de estratégias para a
ação de governo a fim de qualificar a interlocução entre este e a sociedade e, por conseqüência, o próprio
processo de decisão popular sobre o plano para a cidade. O PAE tem servido de contra-ponto importante para
mediação junto aos processos autônomos de participação popular.
Concordando com Carlos Vainer (VAINER, Carlos B. Pátria, empresa e mercadoria: notas sobre a estratégia
discursiva do Planejamento Estratégico Urbano. In.: ARANTES, O. MARICATO, E. e VAINER, C. B. A
Cidade do Pensamento Único: desmanchando consensos. Rio de Janeiro : Vozes, 2000), para governos
comprometidos “com alternativas capazes de oferecer outros valores e projetos ideais de cidade” o
Planejamento Estratégico Urbano que tem Borja e Castells como ideólogos não servem de modelo alternativo
ao “padrão tecnocrático-centralizado-autoritário de planejamento. Constata-se enormes limitações à
construção do poder popular, também, na experiência de planejamento participativo centrado exclusivamente
na elaboração do orçamento da cidade - o Orçamento Participativo (OP); dessa forma, o Congresso da Cidade
pretende significar um passo além do O P, uma negação dialética: ao negá-lo, apropria-se de suas
positividades e supera-o qualitativamente.
reunidos num único processo, o Congresso da Cidade, para entre outros objetivos,
avançar na construção de uma nova cultura política contra-hegemônica aos
valores e ideologia dominantes.
Quando se governa com um horizonte centrado apenas na realização de
reformas da sociedade atual, ainda que radicais, acaba-se por reproduzir uma
cultura meramente administrativa dos problemas locais. Nesse sentido pode-se
mostrar competência na administração da crise, mas pouco se contribuirá para dar
ao espaço local o significado de palco privilegiado da luta do povo por conquistas
a serem obtidas no nível local e, especialmente, por transformações da estrutura
social brasileira e internacional, a fim de garantir conquistas estruturantes de um
projeto de futuro democrático, justo, igualitário e feliz.
A busca de mudanças da cultura política, na perspectiva da transformação
radical do modo de produção, da construção de uma sociedade socialista como
valor estratégico, é o que medeia os processos de participação que possam resultar
na construção de espaços públicos não estatais, da consciência de direitos e a
conquista do exercício do Direitos à Cidade, à cidadania cultural, que possibilitem
ao povo a condição de sujeitos do planejamento do futuro, do controle do Estado;
que lhe permita apropriar-se do patrimônio da cidade, firmando a construção do
poder popular.
Texto de Luiz Araújo, elaborado como contribuição aos debates sobre o modo de realizar o segundo mandato
do Governo do Povo em Belém (Frente Belém Popular), especialmente o desafio de gerir a metrópole através
de um processo congressual permanente, programaticamente denominado de Congresso da Cidade, em
dezembro de 2000. A fim de adequá-lo a esta publicação, fez-se algumas poucas reformulações no texto
original.
Este texto, apresentado sinteticamente em treze (13) pontos, visa contribuir
com o debate sobre concepção de governo para o segundo mandato democrático e
popular em Belém, assim como sistematizar diretrizes e prioridades de ação para o
próximo período. Para sua elaboração levou-se em consideração os escritos do
companheiro Edmilson Rodrigues sobre os modos petistas de governar, as
contribuições de Carlos Vainer sobre cidades, planejamento e papel das prefeituras
de esquerda no capitalismo, no acúmulo apresentado no Programa de Governo da
Frente Belém Popular para o período 2001-2004 e nos debates realizados durante
os quatro anos do primeiro mandato.
1. É necessário partir da constatação de que estamos tratando de um governo
municipal, numa cidade periférica, parte de um país capitalista também periférico.
Isso determina os limites das conquistas materiais que o movimento social é capaz
de arrancar, pois somente mudanças estruturais profundas serão capazes de
reverter o quadro de desigualdades e de miséria social;
2. Ao mesmo tempo em que afirmamos os limites, devemos trabalhar com
uma visão de que a Cidade não é apenas reflexo da sociedade. Ela produz
riquezas, produz e reproduz relações econômicas, políticas e culturais. Ela reflete a
estrutura social, mas, ao mesmo tempo, pode alavancar dinâmicas que acabem por
definir esta estrutura. Há, portanto, um espaço de luta contra a desigualdade que
pode e deve ser travado, como parte de um processo político de lutas estratégicas,
na esfera local;
3. A construção do poder popular se realiza através da afirmação de uma
concepção antagônica à lógica capitalista. Por isso, a “desconstrução do arcabouço
de valores burgueses e a constituição de uma nova e alternativa tessitura de
valores culturais são aspectos que dão significado para uma administração
popular”9. Esta desconstrução deve se orientar em elementos estratégicos, tais
como, a defesa intransigente da soberania nacional, pois um governo do PT deve
ser instrumento de luta antineoliberal, haja vista que a globalização neoliberal só
reconhece a soberania do capital; a radicalização democrática, “como necessidade
e possibilidade do povo experimentar o aprofundamento de formas de controle
social do Estado no bojo do processo de luta de classes e do acúmulo de forças
necessários à ruptura como o capitalismo”10 e, a elevação das condições matérias e
culturais de vida do povo;
4. A concepção expressa pelo companheiro Edmilson é concordante com a
noção de “revolução urbana” defendida por Carlos Vainer, para quem os objetivos
de um governo popular devem ser a redução das desigualdades e melhoria das
condições (materiais e imateriais) de vida das classes trabalhadoras, a constituição
de sujeitos políticos coletivos expressando os interesses das classes e grupos sociais
explorados e oprimidos e, finalmente, o enfraquecimento dos grupos e coalizões
dominantes;
9
RODRIGUES, Edmilson. Modos Petistas de Governar. In : BARRETO, L., MAGALHÃES, I. TREVAS, V.
(orgs.) Governo e Cidadania: balanço e reflexão sobre o modo petista de governar. São Paulo: Editora
Fundação Perseu Abramo, 1999. p. 29.
10
Idem, p. 32.
5. Só é possível levar adiante uma expressiva transferência de recursos
públicos para a melhoria das condições de vida da população, caso exista
organização e luta dos trabalhadores, senão o governo ficará refém da burocracia,
da rotina administrativa e sua dispersão de recursos e, o que é pior mesmo em
governos de esquerda, ficará à mercê do jogo de pressões dos grupos econômicos.
Por outro lado, dificilmente iremos avançar de maneira efetiva no engajamento
político das camadas populares, sem que estes processos, de uma forma ou de
outra, sejam traduzidos em conquistas reais, perceptíveis e valoradas
positivamente pelos explorados. Estes dois processos combinados levam ao
enfraquecimento do clientelismo e, portanto, enfraquecem o poder de fogo e
convencimento das elites;
6. O elemento constitutivo de um acordo partidário sobre a concepção de
governo deve ser o Programa de Governo, elaborado com a participação de
inúmeros setores partidários. Nos seus princípios programáticos está dito que o
segundo mandato do governo do povo “continuará profundamente comprometido
em construir o poder popular contribuindo para o avanço das condições objetivas
e subjetivas em vista de uma cidade saudável e um Estado socialmente
controlado”11 Felizmente o documento esclarece a compreensão de
desenvolvimento sustentável, o qual só é possível com a modificação do modelo
político-econômico, da situação sócio-ambiental e de alterações nas relações
culturais, religiosas e humanas;
7. É diante deste cenário que são desenvolvidas no decorrer do programa as
prioridades de governo, as quais devem viabilizar a inversão de prioridades, um
projeto estratégico de desenvolvimento e a universalização da cidadania, assim
como buscar a sustentabilidade. E é colocado como vetor principal da ação
governamental a participação popular com controle social;
8. Deve-se tomar cuidado com a visão de que a cidade por si só basta, que a
globalização levaria a destruição dos Estados Nacionais e o único espaço de
realização de transformações seriam as cidades. Derivado desta compreensão
devemos estar atentos para o debate acerca dos limites de um desenvolvimento
planejado a partir de uma cidade periférica como Belém, pois apostamos nisso
como elemento de disputa, a fim de criar dinâmicas que questionem a ordem
vigente e não como possibilidade de realização apartada de mudanças estruturais
em nossa sociedade, perspectiva que já foi abandonada por parte da esquerda;
9. Merece atenção especial o debate sobre participação popular e controle
social. Isso se justifica pelo fato da participação popular ser decisiva para a
constituição de sujeitos coletivos, mas também por que as eleições mostraram que
é necessário avançar muitos mais na transformação do cotidiano das camadas
urbanas empobrecidas, as quais continuam sendo alvo fácil do clientelismo das
elites e da perpetuação de relações patrimonialistas e populistas. Tanto quanto as
relações de trabalho, as atitudes, comportamentos e práticas do cotidiano
diferenciam os grupos e classes sociais na cidade. “São os pobres, mais que os
11
O PRÓXIMO Passo: qualidade de vida por uma Belém Criança - Diretrizes Programáticas da Frente Belém
Popular (2001/2004). Belém : Frente Belém Popular, 2000. p. 25
ricos, que dependem dos serviços públicos para um conjunto de necessidades (...)
Os formuladores de política raramente conseguem conceber o suplício que
significa depender desses serviços”12, mesmo que seja justo advertir que a privação
de acesso a bens materiais também seja a destituição do sentido e do significado do
que seja a opressão e a própria destituição;
10. Deve-se buscar democratizar profundamente o conjunto dos serviços
públicos, colocando-os sob o controle social, através da mobilização e organização
local da população que utiliza o serviço e, através da conscientização, mobilização
e valorização do servidor. “Não se trata de simples descentralização ou
desconcentração administrativas, mas de uma nova concepção de governo,
fundada na convicção de que o povo mobilizado e consciente, estruturado em
organizações de base, pode assumir diretamente, em primeira pessoa, o governo
de sua cidade”13.
11. É neste contexto que se deve realizar um ajuste da máquina
administrativa às diretrizes programáticas. Para isso deve-se: a) assegurar que a
máquina esteja, cada vez mais, moldada pelas pressões, demandas e decisões dos
fóruns deliberativos de base, ou seja, sob controle da sociedade mobilizada b)
assegurar que esta máquina atue na direção dos objetivos prioritários expressos no
programa de governo, atendendo às diretrizes gerais emanadas do próprio
governo e às orientações oriundas do processo de autogoverno;
12. O programa de governo enumera uma série de instâncias e mecanismos
de gestão, todos como partes constitutivas de uma nova forma de governar,
denominada de Congresso da Cidade, reafirmando a necessidade de resgate da
identidade cultural e da radicalização do controle social sobre o estado e os
serviços públicos. Destaca o papel importante nesta estratégia da definição de
marcas (horizontes) de governo a serem perseguidas pela ação concreta. Destaca
como diretrizes da gestão, além do controle social já enunciado, o processo de
descentralização político-administrativo e o aprofundamento dos mecanismos de
informação;
13. Muitas questões ficaram sem resolução na formulação do programa de
governo e devem ser aprofundadas à luz das diretrizes e das reflexões aqui
apresentadas. Dentre elas merecem destaque:
13.1 Visando aprofundar o autogoverno, ou seja, o poder de decisão nas mãos
dos cidadãos, como ficará a relação entre o Conselho da Cidade e o acúmulo
experimentado pelo Orçamento Participativo (OP)? Precisa-se inserir essa
experiência, o OP como parte constitutiva do Congresso da Cidade (modo novo de
governar), evitando serem partes conflitantes. Como já se disse, materializar obras
e serviços é essencial para elevar a organização popular, mas queremos transpor os
limites orçamentários e ter uma estrutura de participação que contemple a
discussão do orçamento, mas também o controle social do serviço, o planejamento
12
VAINER, B. Carlos. Além do Orçamento Participativo: algumas teses sobre governo local e reconfiguração
das relações de poder local. Rio de Janeiro, 2000. p.20. (mimeo).
13
Idem, p. 25.
de ações estratégicas que enfrentem a lógica excludente de cidade, assim por
diante;
13.2 Neste sentido é necessário definir um organograma integrando as várias
esferas de participação, inclusive reservando papel de destaque para os fóruns e
conferências de políticas setoriais e seus respectivos Conselhos, hoje atomizados e
apartados do processo de decisões estratégicas;
13.3 Devemos realizar a descentralização dos serviços, tendo como norte o
controle popular destes serviços, os conselhos distritais como prioridade e não
apenas o repasse de serviços e a duplicação de estruturas administrativas. As
administrações distritais e seus conselhos devem estar afinados com a lógica de
participação popular e com as diretrizes das marcas de governo. Descentralizar as
decisões, mas unificar a ação política a partir de um único projeto pactuado dentro
do governo e com movimento social e,
13.4 Redesenhar a atual estrutura administrativa para se tornar compatível
com as marcas de governo, com o necessário monitoramento das ações e com a
descentralização administrativa. Menos estruturas pulverizadas, ou seja, menos
burocracia e mais poder de decisão nas mãos do povo e agilidade na execução de
suas demandas.
Por fim, deve-se orientar as decisões pelas concepções aqui expostas,
procurando priorizar as posições que melhor viabilizem as diretrizes propostas.
Planejar é preciso.
O primeiro mandato do governo popular em Belém, enriqueceu muito o
debate sobre participação popular, colocando em prática, de forma radicalizada,
diversas experiências de participação política, que podem ser organizadas em três
vertentes:
a) O Orçamento Participativo (OP), que teve a capacidade de trazer para a
política moradores da periferia que nunca tinham sonhado em decidir os destinos
Este texto balizou duas palestras de Edmilson Brito Rodrigues, no 1 o Fórum Social Mundial em janeiro de
2001 no município de Porto Alegre – RS; na plenária para a constituição da “Rede de Planejadores pela
Igualdade, a Justiça e a Democracia” e na oficina sobre Democracia Participativa: "Experiências sobre
Funcionamento do Orçamento Participativo em Belém e Porto Alegre". Foi redigido em colaboração com
Jurandir Santos de Novaes e Luiz Araújo. Posteriormente, com alterações pontuais resultantes de comissão
composta por Jurandir, Luiz Araújo e Carlos Matos (Administrador do Distrito da Sacramenta), orientou os
debates no Comitê Executivo do Plano de Governo, definindo o fundamental da estrutura e funcionamento do
Congresso da Cidade para 2001 em Belém.
da utilização dos recursos públicos. Experimentou formas de participação direta
dos cidadãos, exercitando um controle direto sobre os delegados eleitos. Inovou a
experiência da esquerda ao criar as plenárias temáticas, a eleição direta para
conselheiros, o OP da juventude e a COFIS. A tentativa de elevar o horizonte do
cidadão para além de sua rua, de suas necessidades prementes, buscando debater a
dívida social, mas também um sonho de cidade, introduzindo o debate de obras
estruturais, se inscreve entre as virtudes desta vertente de participação;
b) Os fóruns de debate sobre políticas públicas realizados nas formas de
inúmeras Conferências, Seminários, Colóquios, etc., os quais conseguiram reunir
principalmente a chamada sociedade civil, ou seja, o conjunto de organizações não
governamentais, sindicais, populares ou acadêmicas. Esta vertente se materializou
num conjunto de resoluções políticas e na constituição de conselhos e outros
espaços setoriais e/ou temáticos;
c) As experiências de controle social e co-gestão constituem a terceira vertente
de participação. Neste grupo estão a criação das Comissões de Fiscalização e
Controle Social (COFIS) vinculadas ao OP, a revitalização dos Conselhos Escolares,
os Conselhos Gestores nas Unidades de Saúde, os Comitês Ambientais, dentre
outras formas de controle da prestação do serviço público; inscrevem-se ainda
iniciativas como condomínios participativos, associações e as obras de parcerias
como estratégias de relação direta de parcelas da cidade com o governo;
Apesar destes avanços, estas três vertentes não se desenvolveram com a
necessária relação entre si e caminharam por vezes separado, excetuando-se no
caso das Comissões de Fiscalização de Obras - COFIS, um mecanismo de controle
intrínseco ao OP e os Comitês Ambientais do Congresso da Cidade, que em
alguma medida se relacionou com o próprio OP. O OP debateu e deliberou sobre o
Orçamento (forma de viabilizar obras e políticas públicas), mas não travou um
debate mais profundo sobre as políticas públicas e o desenvolvimento da cidade de
forma integral. Ao mesmo tempo, as conferências deliberaram sobre políticas sem
debater o Orçamento, embora apontassem diretrizes e por vezes ações com
implicações diretas sobre o orçamento municipal.
O OP é um marco na história da cidade, foram mais de 200 mil pessoas
participando diretamente, no entanto as diversas vertentes foram se multiplicando
quantitativamente e qualitativamente. Esta desconexão portanto, reforçou os
limites de cada vertente de participação. Há necessidade, entretanto, de envolver
todos no pensar a cidade de maneira integral, todos os que participam de
processos organizativos, seja por meio de representação ou por participação direta,
o que tem sido a ênfase e a única via para participar por exemplo do OP; de
proporcionar ao cidadão uma apropriação da cidade como um todo, ampliando o
seu olhar, mesmo quando partir do que lhe é específico (sua rua por exemplo)
conquistando-o para o debate sobre os problemas e soluções para a cidade inteira.
Esse é o maior desafio do segundo mandato do Governo do Povo, ao radicalizar e
ampliar o exercício do poder popular.
14
RODRIGUES, Edmilson. Op Cit.
15
RODRIGUES, Edmilson. Op Cit.
organização social. O que se propõe aqui é a fusão das três vertentes apresentadas
acima, tendo como principal sustentáculo o Orçamento Participativo.
Uma questão extremamente relevante é que a proposta pressupõe que sejam
fundidas as atuais estruturas existentes de participação popular numa único
sistema de funcionamento, preservando toda a riqueza que cada experiência
encerra e completamente aberta para novas experiências e iniciativas, sejam elas
parte ou não da estrutura neste momento. Porém, a cada uma delas se faz
necessário superar os seus limites e ampliar o seu alcance rumo à construção do
poder popular.
Funcionamento do Governo:
Para a coordenação do Programa de Governo, são mantidas desde o primeiro
governo, estruturas a quem compete o acompanhamento do plano e sua
coordenação política, e busca assegurar uma linha clara e combinada na sua
execução, ao mesmo tempo em que, diante de cenários desenhados, vai definindo
ou redefinindo seus tempos sem prejuízo dos compromissos assumidos. São
espaços de balanço e de reflexão política acerca do governo e de questões mais
gerais que influenciam na vida da cidade e de tomada de decisão:
a) Comitê do Plano - Consiste no colegiado de governo onde são tomadas
decisões que asseguram a viabilização do Plano de Governo e que pela dinâmica
do próprio governo requer decisões rápidas, que não permitem a todo momento
convocar o secretariado. Trata-se da instância que busca aliar representação
política no governo com o sistema de gestão através das Marcas de Governo. É
coordenado pelo Prefeito e composto pelo Vice-Prefeito; Coordenadores(as) de
Marca; Secretaria de Planejamento; de Finanças; Coordenação de Relações com a
Comunidade; Coordenadoria de Comunicação e geralmente tem a Secretaria de
Assuntos Jurídicos como convidada; quando necessário, um secretário de alguma
área específica.
b) Fórum de Secretários (as) - É composto por todos os Secretários e
constitui-se do ponto de vista do funcionamento interno do governo, a instância de
maior amplitude em relação a representação. Debate temas comuns ao governo e
analisa cenários à luz de pesquisa, fatos, enfim, é o espaço de discussão política, de
estratégia e dos rumos do governo pelos principais coordenadores de cada área
setorial.
c) Comitê Orçamentário e Financeiro - Tem a função de acompanhar e de
analisar a execução orçamentária e financeira à luz das diretrizes a ações definidas
no Plano de Governo. É composto pelas Secretarias de Finanças, Planejamento e
Gabinete do Prefeito.
d) Fórum de Administradores (as) Regionais - Passou a existir a partir de
2001, resultado da experiência de implantação de todas as Administrações
Regionais, já que antes existiam apenas 3 de um total de 8; e da redefinição do seu
papel como a representação política do governo em termos formais mais próxima
do cotidiano dos cidadãos. Até o final do primeiro governo se vinculavam ao
Gabinete do Prefeito, passam então a exercer o papel em definitivo de agente
político de representação do governo e do planejamento como aqui apresentada a
sua concepção e passam ainda a ter relação direta com a Secretaria de
Planejamento. O Fórum é o espaço de planejamento comum e definição da linha
geral de atuação à luz das diretrizes de governo.
Os marcos da proposta
Texto de Jurandir Santos de Novaes, originalmente publicado em NOVAES, Jurandir, RODRIGUES,
Edmilson (orgs). Luzes na Floresta: a experiência do governo democrático e popular em Belém (1997-2000), 1ª
ed. Belém, 2000. Sintetiza os debates havidos no governo, especialmente no Comitê Executivo do Plano de
Governo e com setores sociais não governamentais, inclusive o Conselho do Orçamento Participativo (COP),
então constituído pelo processo do Orçamento Participativo (OP). Apresenta a sistematização do Congresso da
Cidade realizado no ano de 2001 de maneira ao mesmo tempo sintética e abrangente.
o reconhecimento das desigualdades, o aprofundamento da relação do Estado com
a sociedade visando o seu fortalecimento, e a instauração do debate sobre o
financiamento da cidade.
O Governo do Povo reconhece ser esta uma cidade particular, como ademais
todas as outras que, no capitalismo, engendram relações sociais geradoras de
discriminação social, política, econômica. Governos democráticos e populares
buscam implementar políticas para alterar a situação aparentemente natural a que
se encontram submetidas as cidades, traduzindo-se em uma forma de governar
que reconhece as diversas cidades que subsistem a uma suposta e aparente
homogeneidade, banalizada por práticas de governos em que os diferentes são
tratados como iguais. A cidade das diferenças, dos conflitos, é essa cidade que se
desafia implementar o Congresso da Cidade. Não fora assim, não caberia fazer do
Congresso um fórum que pensa o futuro, que reconhece que a cidade tem história,
que nela podem ocorrer transformações. Não está colocada a naturalização das
situações que devem inquietar como a injustiça e a desigualdade, banalizadas em
regra, como um fato dado e imutável.
O Congresso é o espaço do livre pensar, a usina de idéias, que transforma
práticas sociais que se colocavam até então como a única via de se relacionar com
governos. Assim, o Congresso da Cidade representa o arrojamento e a
radicalização da disposição para o diálogo e para o desnudar da cidade, por quem
a constrói. Parte de um conteúdo propositivo e crítico e que possibilita o embate de
visões. Nem por isso esse espaço faz do presente uma atualização do passado e do
futuro uma mera reprodução do presente (cf. Vainer16). Ao definir como mote O
Futuro já Começou, o Congresso da Cidade assume querer ser espaço da busca da
recriação, que leva em conta a história, mas que por isso mesmo não pode ser
copiada. O Congresso da Cidade afirma a necessidade de planejar, mas, como
afirma Vainer17, longe de ser um simples exercício de futurologia ou uma
elucubração inconseqüente sobre os futuros possíveis, é um compromisso presente
com sujeitos sociais concretos.
Como espaço de planejamento, o Congresso reafirma essa dimensão numa
perspectiva em que uma cidade não é a mesma em qualquer parte do mundo, há
diferenças internas próprias da condição econômica, política, social, cultural,
enfim, diferenças que fazem com que a inserção na globalização não signifique que
a cidade se encontre inserida em um espaço homogêneo, igual. E não poderia ser
diferente, se considerarmos a importância e a necessidade do planejamento com a
participação de cidadãos em geral. Pois ele convoca todos os atores e grupos
sociais, inclusive aqueles que se confortam com a mera reprodução da situação
vigente, a dizerem o futuro que propõem e projetam. Este enunciado dos futuros
desejados, e indesejados, para uma cidade, é um exercício fundamental, a que
devemos convocar todos os citadinos. E, desta forma, fazer da cidade e do plano,
um exercício permanente de democracia e construção de sujeitos políticos18.
É portanto, uma opção política em que a cidade vai sendo forjada por e para
16
VAINER, Carlos B. op cit
17
idem
seus cidadãos ou uma cidade para o mercado, para a competição. O processo
que vimos criando em Belém é o de afirmação da cidade construída pelos seus
cidadãos, para que estes se apropriem da cidade nas suas diversas dimensões,
como um espaço político de luta pela cidadania, de parcelas de poder que podem
contribuir para a superação das desigualdades, para a formação de consciência
crítica, libertadora.
O que buscamos, portanto, ao implantar uma forma de governar por meio do
Congresso da Cidade, é abdicar das fórmulas aparentemente fáceis, que
engendram alternativas em que a cidade é apartada de si, em que as diferenças são
dissimuladas e que poderiam até gerar uma cidade para fora e uma cidade para
dentro. Para esta visão de Congresso, o que é central é a valorização da vida, a
dignidade humana, não a construção de uma cidade mercadoria, em que cada
cidadão é concebido como consumidor no mercado ou como usuário na relação
com os serviços públicos. O cidadão é o sujeito dessa construção, e o Governo do
Povo assumiu o papel de fomentar participação de todos: "o próprio governo
assume, necessariamente, o caráter de instrumento político de construção de poder
popular (...) por dentro da estrutura do governo, possibilitar os mais amplos
espaços para a participação do povo, para o debate democrático, para o controle de
poder do Estado, para a construção pelo povo na luta, do poder popular 19.
Mas desafiar a cidade a se governar na forma de Congresso não é tarefa fácil,
particularmente em uma cidade como Belém, com enormes carências sociais
acumuladas, o que tem levado, em regra, à busca de soluções apenas imediatas.
Uma cidade cujos moradores tinham a auto-estima abalada e em que sempre coube
aos governos e a pequenas parcelas da população o poder de decidir o seu futuro.
A cidade sentia-se incapaz de tal tarefa pela condição a ela imposta. Decorrente de
uma história de governos predatórios, que tornaram seus referenciais físicos e
simbólicos sinônimo de saudade do passado, o que reduz a possibilidade do sonho
de construir o futuro. A cidade passou a desejar predominantemente o passado.
Planejar o futuro, recuperar a sua história não se colocava como tarefa possível
para a maioria.
O Governo do Povo, desde de 1997, imprimiu na cidade uma forma de
governar que já apontava para a perspectiva de Congresso com a imediata
implantação do Orçamento Participativo (OP) como instrumento de participação
popular. A decisão popular sobre a aplicação dos recursos públicos municipais foi
um salto qualitativo sem precedentes na constituição de uma democracia popular
na história política de Belém e do Estado do Pará.
Mas, se a instauração do OP foi um primeiro e grande passo para que a
cidade pudesse reduzir as enormes carências sociais, historicamente
acumuladas, outras questões importantes ainda precisavam ser solucionadas.
Urgia uma discussão mais ampla, que incorporasse diretrizes e ações que
18
idem
19
RODRIGUES, Edmilson Brito. Modos petistas de governar, In: MAGALHÃES, Inês (Org.) et al Governo e
Cidadania balanço e reflexões sobre o modo petista de governar. - São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo,
1999. p.26-34.
extrapolam a dimensão localizada das intervenções, que atraísse atores que nem
sempre se movem por esse determinante e pudesse combinar as deliberações no
âmbito da rua, do bairro, do distrito a políticas globais para a cidade. Como
estabelecer, então, um mecanismo de desenvolvimento urbano que assegurasse a
sobrevivência da cidade, seu desenvolvimento, a elevação da qualidade de vida de
seus cidadãos de forma a aglutinar as ações do Governo e, ao mesmo tempo,
combinar os elementos de conjuntura nacional e internacional em que se insere a
vida da cidade?
Por essas e outras questões, o Governo do Povo elaborou uma proposição
mais desafiadora que o próprio Orçamento Participativo. Dessa forma, o
Congresso da Cidade apresenta-se como o instrumento de que se valem os
cidadãos de Belém para decidir sobre a cidade desejada.
Para ar início, do ponto de vista mais organizativo, foi constituído um Grupo
de Trabalho com a responsabilidade de articular o âmbito interno do Governo com
a sociedade, bem como de elaborar uma proposta inicial. Desencadeou-se, então,
um processo apresentação da proposta nos fóruns do governo e da sociedade. Era
necessário consolidar a concepção de que o Congresso não representa um evento,
mas um processo, uma concepção do modo de governar, como síntese de uma
prática que foi se expressando nos diversos espaços de planejamento da cidade
provocados pelo próprio governo e por setores não governamentais. Dessa forma,
ao próprio governo teve que se reafirmar de que não se inaugurara uma nova
estrutura, uma nova instância, mas sim uma dimensão conceitual e organizativa
que o governo propunha à cidade a partir mesmo das suas estruturas, assegurando
o princípio de respeito à autonomia dos movimentos emergidos na sociedade,
devendo, contudo, radicalizar na amplitude da sua ação, no aprofundamento da
participação e, particularmente, reafirmando uma concepção de planejamento.
Esse processo da criação do ambiente necessário tinha que ser tornado público. Por
isso, com a proposta básica elaborada, foi feita, em novembro de 1998, a sua
apresentação pública em uma atividade de lançamento dos mais representativos já
ocorridos na cidade, numa demonstração de que a cidade responde a esta proposta
de governo, mas nem por isso, tão somente para o governo e pelo governo, esta
proposta deve ser conduzida, apropriada. A transformação da cultura política não
se dá em um evento, mas em uma prática contínua e permanente. Por isso, o
Congresso é um processo com momentos de síntese, como os próprios momentos
das conferências, dos colóquios, das iniciativas de co-gestão de espaços públicos e
das demais que o estruturam. ou mesmo, os fóruns de recortes político-territoriais
que vêm se impondo como mais uma alternativa à sua operacionalização. Assim,
em dois anos consecutivos, teve lugar por exemplo, o Colóquio sobre o Centro
Histórico, que debateu o projeto de recuperação daquela área.
Ao governo coube então a tarefa de fazer do Congresso o seu elemento
mobilizador central. Mas o governo não é diferente do resto da sociedade: as
estruturas não são concebidas para uma proposta tão desafiadora e, muitas vezes,
a estrutura sobrepõe-se aos desafios por se apresentar setorialmente determinada.
Foi preciso então, discutir, definir mais claramente a importância das ações
governamentais no Congresso. Pouco a pouco foi se construindo a compreensão de
que as iniciativas, não propriamente surgidas no interior do governo, mantêm-se
autônomas mas integradas, capazes de gerar um projeto de cidade também
expresso em grande medida no Programa de Governo da Frente Belém Popular.
Foram sendo adotados, assim, diversos recursos, tanto no interior do
governo, quanto em grupos sociais não governamentais, como reuniões para
identificar expectativas, fóruns promovidos ou apoiados pelo governo, como o
orçamento participativo, conferências sobre as políticas públicas, colóquios sobre
temas específicos, audiências públicas, condomínios participativos, - a associação
entre governos e empresários que lutam pela valorização dos espaços onde
concentram as suas atividades - comitês ambientais formados por moradores de
bairros ou ruas específicas e por funcionários dos órgãos municipais, que
contribuem para a gestão ambiental da cidade, inclusive nos locais de trabalho.
Foram ainda desenvolvidos projetos específicos que colocaram em evidência
questões importantes, aparentemente secundárias, se pensadas fora do contexto de
que a cidade precisa, antes de tudo, gostar de si própria e descobrir potencialidade.
A arte dos jovens expressa em pichação, reelaborada, resultou em trabalhos com
técnica de grafitagem num acontecimento inédito em Belém, que reuniu diversos
grupos (mais de 300 jovens). Outros projetos nesta busca do reconhecimento da
cidade, foram implantados em Belém: O projeto Mapas de Belém, uma abordagem
metodológica a partir da cartografia como resultado das representações sociais
como um inovador instrumento de planejamento crítico; participação em
campanhas com atores sociais, como universidades, entidades estudantis,
empresariais, de trabalhadores, voltados para o estímulo de atitudes positivas em
relação à cidade, como a educação ambiental no que se refere ao tema da limpeza
pública; projetos voltados para a geração de emprego e renda, particularmente a
pequena indústria moveleira. São exemplos que demonstram a diversidade dos
espaços, que visam suscitar a participação coletiva. São experiências que mostram
o Congresso como um processo em construção e como o resultado de distintas
intervenções, que visam despertar e restabelecer a auto-estima. Tenta-se mostrar
que as iniciativas aqui mencionadas como exemplo encerram metodologias que
fazem com que a cidade vá se descobrindo ou se redescobrindo. Em 1997, este era
um grande desafio, que se iniciou com a implementação do Programa de Governo
e tudo o que de transformador propunha. Hoje assistimos à revitalização de
espaços de grande valor/ simbólico para a cidade, como o Ver-o-Peso, à realização
de ações que fortalecem a identidade local, à restituição da orla aos cidadãos
excluídos, à implementação de políticas sociais que inauguram um quadro de
reversão dos indicadores perversos. Orientaram as iniciativas citadas a idéia de
eixos temáticos que já se colocava como alternativa de integração das políticas, por
exemplo, inclusão social, identidade cultural e comunicação.
Esses temas também resultam de pesquisas qualitativas realizadas para
fortalecer o processo do Congresso como movimento amplo, que extrapola as
ações de governo. Foram feitas, até o momento, duas pesquisas, uma por
amostragem no universo da população em geral e outra com lideranças locais pré-
selecionadas. Ambas tinham por objetivo identificar a percepção prevalecente nos
grupos sociais representados. O resultado obtido foi um amplo painel das visões
sobre a cidade, que se traduzem em elementos centrais para a proposição de temas.
Todas essas referências certamente não dão conta completamente do que
significa o Congresso e poderiam naquele momento provocar perguntas, como por
exemplo, qual a sua estrutura, quais os seus espaços de síntese, quais os critérios
de participação, como se materializa a transferência de poder aos cidadãos, enfim,
uma série de questões que surgem ao se pensar tradicionalmente as dinâmicas
coletivas. A opção naquele momento foi criar um movimento, provocar questões
que contribuíssem para a construção de uma estrutura, se necessário, mais
consolidada e enraizada tanto no governo quanto em parte da sociedade.
Até então, a possibilidade apresentada era uma estrutura inspirada em
outras experiências. Com o tempo foi sendo revelada cada vez mais imbricação
entre o que já vinha ocorrendo no governo e na sociedade civil e também podia ser
percebido que poderia ser ampliado de tal forma que o Congresso é, para o
Governo do Povo, esse movimento vivo e incessante que a cidade vive e que tem
raízes na sua história, e que se tem intensificado nos últimos 5 anos.
Dados sistematizados pela Secretaria de Gestão e Planejamento (SEGEP) mostrando a amplitude
quantitativa e do leque plural de cidadãos que, por iniciativa particular ou através de movimentos sociais,
entidades de representação de classe, organizações não governamentais, etc., participaram das várias fases do
Congresso da Cidade, até a realização do I Congresso Geral da Cidade de Belém.
Governar com participação popular não é fácil. Exige esforço extra de todos,
de pessoas que acreditam que somente participando, se informando, poderá
ocorrer alguma mudança. Somente participa quem não está acomodado, quem não
está satisfeito, quem acredita nas possibilidades de mudança.
Desde que foi lançado pela Prefeitura Municipal de Belém, sob a coordenação
geral da Secretaria Municipal de Coordenação Geral de Planejamento e Gestão -
SEGEP, no início de abril de 2001, o Congresso da Cidade já mobilizou mais de 25
mil pessoas. Entretanto, o volume da participação real pode ser bem maior já que
grande parte dos participantes freqüentou mais de um evento.
O Congresso da Cidade 2001 mobilizou todas as instituições da Prefeitura
Municipal de Belém e as principais instituições e organizações populares da
sociedade civil do Município de Belém. Participaram pessoas de todos os bairros
dos Distritos Administrativos do Município de Belém e até de municípios vizinhos,
que compõem a Região Metropolitana de Belém, como Ananindeua e Marituba.
Participação Geral no Congresso da Cidade – 200120
(Continua)
Municipais DISTRITO Fora de
CONGRESSOS TOTAL
DAMOS DAOUT DAICO DABEN DAENT DASAC DABEL DAGUA Belém
CONGRESSO
GERAL 2.824 2.824
DIREITOS
HUMANOS 1.444 1.444
MUNICIPAIS
SETORIAIS
Mulheres 45 79 68 120 349 195 164 55 150 1.225
Negros 15 36 29 44 35 84 31 274
Homossexuais 14 1 9 27 15 19 22 43 150
Deficientes 26 7 12 61 123 131 212 78 118 78 846
Índios 3 10 3 1 4 87 108
Total 85 86 84 215 535 370 442 191 399 196 2.603
MUNICIPAIS
TEMÁTICOS
Urbanístico e
Ambiental 16 8 36 14 14 16 24 1 129
Economia
Solidária 12 2 7 16 6 6 9 24 1 83
20
Os números relativos ao I Congresso Municipal das Crianças de Belém não constam do quadro. O congresso mirim, com a participação de mais de oito mil
crianças de até 12 anos de idade, só foi realizado no final do mês de novembro de 2001, posteriormente ao I Congresso Geral da Cidade de Belém. A coordenação
geral, direção das “mesas” de trabalho, a formulação de propostas para a Belém do futuro, os espetáculos artísticos, a apresentação de propostas ao prefeito e
demais adultos presentes, a eleição do Conselho das Crianças de Belém (oito membros efetivos e oito suplentes), enfim, todos os momentos do congresso, foram
protagonizados pelas próprias crianças, tendo à frente crianças que participaram das reuniões paralelas aos congressos distritais e municipais temáticos e/ou
setoriais, outras que participam de projetos sócio-educacionais mantidos pela prefeitura, ou crianças cujos pais participam de movimentos ou entidades sociais não
governamentais.
Participação Geral no Congresso da Cidade – 200121
(Continua)
Municipais DISTRITO Fora de
CONGRESSOS TOTAL
DAMOS DAOUT DAICO DABEN DAENT DASAC DABEL DAGUA Belém
Inclusão Social 2 6 35 30 26 6 11 27 1 144
Cidadania
Cultural 5 4 4 6 15 10 5 5 54
Gestão 4 6 7 10 6 15 15 6 69
Democrática
Total 0 23 34 61 98 67 51 56 86 3 479
DISTRITAIS
Urbanístico e
Ambiental 52 286 255 776 194 192 161 316 2.232
Economia
Solidária 187 142 95 329 199 31 78 454 1.515
Inclusão Social 553 116 470 755 275 146 187 600 3102
Cidadania
Cultural 127 135 200 118 202 198 257 219 1456
Gestão
Democrática 243 158 123 158 63 208 133 70 1156
Juventude 297 149 436 567 402 512 88 638 3089
Total 0 1459 986 1579 2703 1335 1287 904 2297 12550
21
Os números relativos ao I Congresso Municipal das Crianças de Belém não constam do quadro. O congresso mirim, com a participação de mais de oito mil
crianças de até 12 anos de idade, só foi realizado no final do mês de novembro de 2001, posteriormente ao I Congresso Geral da Cidade de Belém. A coordenação
geral, direção das “mesas” de trabalho, a formulação de propostas para a Belém do futuro, os espetáculos artísticos, a apresentação de propostas ao prefeito e
demais adultos presentes, a eleição do Conselho das Crianças de Belém (oito membros efetivos e oito suplentes), enfim, todos os momentos do congresso, foram
protagonizados pelas próprias crianças, tendo à frente crianças que participaram das reuniões paralelas aos congressos distritais e municipais temáticos e/ou
setoriais, outras que participam de projetos sócio-educacionais mantidos pela prefeitura, ou crianças cujos pais participam de movimentos ou entidades sociais não
governamentais.
Participação Geral no Congresso da Cidade – 200122
(Conclusão)
Municipais DISTRITO Fora de
CONGRESSOS TOTAL
DAMOS DAOUT DAICO DABEN DAENT DASAC DABEL DAGUA Belém
SETORIAIS
Urbanístico e
Ambiental 1621 1621
Economia
Solidária 2118 2118
Inclusão Social 1830 1830
Cidadania
Cultural 135 135
Gestão
Democrática 362 362
Juventude 1860 1860
Total 7926 7926
156 110 18 333 177 178 115 278 27.
TOTAL GERAL 12.279 8 4 55 6 2 0 1 2 199 826
Fonte: Secretaria Municipal de Coordenação Geral de Planejamento e Gestão (SEGEP) - Departamento de Pesquisa e
Informação (DEPI)
22
Os números relativos ao I Congresso Municipal das Crianças de Belém não constam do quadro. O congresso mirim, com a participação de mais de oito mil
crianças de até 12 anos de idade, só foi realizado no final do mês de novembro de 2001, posteriormente ao I Congresso Geral da Cidade de Belém. A coordenação
geral, direção das “mesas” de trabalho, a formulação de propostas para a Belém do futuro, os espetáculos artísticos, a apresentação de propostas ao prefeito e
demais adultos presentes, a eleição do Conselho das Crianças de Belém (oito membros efetivos e oito suplentes), enfim, todos os momentos do congresso, foram
protagonizados pelas próprias crianças, tendo à frente crianças que participaram das reuniões paralelas aos congressos distritais e municipais temáticos e/ou
setoriais, outras que participam de projetos sócio-educacionais mantidos pela prefeitura, ou crianças cujos pais participam de movimentos ou entidades sociais não
governamentais.
1. Congressos Distritais - Participação Geral nas Temáticas por Distritos
Administrativos
GRÁFICO 1
DAGUA DAMOS
18% 12%
DAOUT
DABEL 8%
7%
DAICO
DASAC 13%
10% DAENT DABEN
11% 21%
GRÁFICO 2
Percentual de Participantes nos Congressos Distritais por Temáticas
Discutidas - Belém 2001
Urbanístico e
Juventude Ambiental
Gestão
25% 18%
Democrática e
Qualidade Economia
Social do Solidária
Serviço Público 12%
9% Inclusão Social
Cidadania
24%
Cultural
12%
2. Congressos Setoriais
3. Congressos Municipais
I - Direitos Humanos
Em junho, foi realizado na Aldeia Cabana o Congresso Municipal dos
Direitos Humanos, coordenado pela Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos
(SEMAJ). Foram credenciadas 1.444 pessoas. No total, entre credenciados e
convidados, participaram mais de 2 mil pessoas de toda a cidade de Belém.
Texto publicado em “folder” de convocação dos delegados ao I Congresso Geral da Cidade de Belém, fórum
máximo de deliberação do Congresso da Cidade, dedicado à memória do professor e geógrafo negro Milton
Santos, realizado nos dias 11 e 12 de outubro de 2001.
defesa do serviço público, os mecanismos de gestão orientam a ação sobre a
cidade.
Um tema se caracterizou como orientador geral na mobilização de outros
olhares que a cidade tem, mas são obscurecidos. Grupos tradicionalmente
excluídos e segregados inauguram em abril sob o mote dos Direitos Humanos os
congressos de âmbito municipal. O I Congresso Municipal de Direitos Humanos
realizado trouxe à cena atores sociais como mulheres, negros e negras, índios,
jovens, homossexuais; moradores de áreas de ocupação. Abriu o debate com
presença da OAB, Ministério Público, Sociedade Paraense de Defesa dos direitos
Humanos, povos indígenas dentre outros. A ele sucederam-se o I Congresso
Municipal de Negros e Negras de Belém; o primeiro também de Homossexuais; de
Deficientes; de Índios; e ainda o de Mulheres este segmento entre os citados
consiste no único tema com tradição de congressos em Belém. Portanto, é um
demarcador na história da cidade. Foram debates originais em Belém, em que por
exemplo, a identidade indígena na sua face urbana, a sua relação com a história e a
própria origem da cidade foram originalmente temas debatidos com esse segmento
em Belém. Ao conjunto de congressos municipais se denomina Congressos
Municipais Setoriais.
O I Congresso Geral da Cidade de Belém é assim, um momento de síntese do
processo desenvolvido neste ano de 2001, iniciado nos meses de janeiro e fevereiro
com reuniões internas ao governo e com o Conselho do Orçamento Participativo
ao que se sucederam as Plenárias Preparatórias do Congresso em todos os 8 (oito)
Distritos Administrativos de Belém, quando foi apresentado e discutido o
funcionamento do processo de congresso; as Oficinas Preparatórias em que foram
discutidos temas transversais como Gestão Democrática e Qualidade Social do
Serviço Público; Amazônia e Financiamento; os Congressos Distritais Temáticos
(Desenvolvimento Humano por uma Economia Solidária; por um
Desenvolvimento Urbanístico e Ambiental; por Inclusão Social; por uma
Cidadania Cultural e Comunicação; Gestão Democrática e Qualidade Social do
Serviço Público e Juventude). Foram 48 congressos realizados em todos os Distritos
Administrativos de Belém.
Dentro do processo de articulação dos setores foram realizadas quase 200
reuniões que podemos caracterizá-las como congressos que se diferenciaram entre
si pelo número de participantes mas também pela grande diversidade de setores,
como feirantes, grupos folclóricos, trabalhadores e empresários, professores e
estudantes da área de turismo (envolvendo o setor de hotelaria e agentes de
viagem); empreendedores do Banco do Povo, idosos, estudantes universitários e
artistas; empresários do comércio através da Associação Comercial do Pará, dentre
inúmeros outros.
As discussões advindas dos Congressos Distritais Temáticos também foram
debatidas no âmbito municipal com participação de delegados eleitos e atores que
se integraram no decorrer do processo de congresso. Foram os Congressos
Municipais Temáticos.
O I Congresso Geral da Cidade de Belém reúne, portanto, as contribuições
deste processo e que serão objeto de deliberação para a constituição do Plano para
a Cidade de Belém em um momento que ocorrerá muito debate, conferências, atos
de irmanamento entre cidades do Brasil e do mundo, enfim uma grande festa da
democracia e da solidariedade.
APRESENTAÇÃO
Sob coordenação geral executiva da Secretaria de Gestão e Planejamento (SEGEP) o Congresso da Cidade
expressa-se num permanente e socialmente construído processo de reflexões e proposições que exige um
também permanente esforço coletivo de sistematização para a constituição do Plano da Belém do Pará do
futuro. Entre outros atores sociais, realizou a sistematização das propostas de todo o processo, inclusive do
momento de culminância – I Congresso Geral da Cidade de Belém “Milton Santos”-, a Comissão de
Sistematização assim constituída: Alessandra Lima, Aluísio Guapindaia, Ana Cristina Alcântara, Ana Vilacy
Galucio, Carlos Alberto Bordalo, Carmem Suely Oliveira, Celeste Medeiros, Georgina Galvão, Glória Rocha,
José Andrade Raiol, Kazumi Shinozaki, Karina Darwich, Lígia Ramos Marques de Souza, Luís Flávio Maia
Lima, Manoel Imbiriba Jr., Márcia Andréa Macedo, Márcio Meira, Maria José Diniz, Regina Cláudia de
Gusmão Penna, Regina Daibes, Roberto Rômulo Gadelha, Rosa Rocha, Rosane de Seixas Araújo, Rosâgela
Cecim, Sandra Helena Cruz, Selma Suely lopes Machado, Thaís Sarmanho, Vânia Regina Vieira de Carvalho.
Apresenta-se neste, excertos da síntese resolutiva do Congresso da Cidade em 2001, obtida até o I Congresso
Geral da Cidade de Belém. A memória completa do processo pode ser obtida na SEGEP.
debateram e elegeram Delegados; constatando que o caminho a trilhar é esse, a
despeito do imponderável que por vezes se impunha.
E foi crescendo, ora com muitos, ora com poucos, mas que chegou aos
milhares nos números e nas idéias expressadas nos Congressos Temáticos e nos
Setoriais. Negras e Negros defendem a necessidade de Unir Forças contra o
Racismo; as Mulheres afirmam que Sem as Meninas, Mulheres, não há Direitos
Humanos; os (as) Portador(a)s de Deficiência, Todos Sonham em Ter Acesso; um
Desenvolvimento Humano, Homossexualismo e Cidadania Cultural, é o que
sonham os homossexuais na sua busca pelo respeito, fortalecimento e
reconhecimento da sua identidade; os Jovens acreditam que a Juventude faz a
diferença; e os Índios da Cidade e os aldeados se encontram pela primeira vez para
debaterem e seguirem Construindo a Cidadania Indígena em Belém.
Foram debates que se traduziram em Diretrizes, Projetos e Ações para cada
Eixo Temático individualmente e que compõem este documento. As reflexões, as
propostas, foram sistematizadas a partir do agrupamento pelo critério da
semelhança e da possibilidade de serem reunidas sob a égide de uma Diretriz
Programática, a qual correspondem os respectivos projetos capazes de atender às
orientações apresentadas por esta Diretriz. Cada projeto corresponde a um
conjunto de ações que materializam as Diretrizes e os Projetos.
Isso se refere tanto aos resultados advindos dos Congressos Distritais, dos
Municipais Temáticos, quanto dos Setoriais. Em relação a estes últimos, os
Setoriais, inclusive Juventude, foram realizados Congressos sob orientação
Temática, ou seja, de alguma forma remeteram questões para as diversas políticas
públicas inseridas em cada Eixo. Por exemplo, o Congresso das Mulheres,
desenvolveu a discussão em torno dos cinco Eixos, a partir de textos-base para
orientação do trabalho de grupo e debates.
Os conteúdos aqui reunidos são parte de um processo onde foram realizadas
oficinas de temas transversais, como “Amazônia”, “Financiamento da Cidade” e
“Gestão Democrática e Qualidade Social do Serviço Público”.
A intersetorialidade, a visão integral das necessidades se refletem nas
diversas propostas que se entrelaçam, se comunicam entre os temas. Assim, é que a
síntese de um Congresso da Cidadania Cultural, por exemplo, pode trazer
conteúdos que a rigor se referem à Inclusão Social ou à Economia e assim por
diante.
A pauta de caráter geral relativa ao tema de “Direitos Humanos”, encontra-se
aqui apresentada de forma equivalente aos demais temas, reiterando que os
conteúdos pertinentes às diversas políticas, foram incorporados aos respectivos
Eixos. O mesmo procedimento foi adotado para as demais reuniões Congressuais
(feirantes, artistas, empresários, trabalhadores, dentre outros).
Contudo, encontram-se anexas a este documento, as cartas e moções
aprovadas por ocasião dos Congressos Setoriais relativas aos respectivos grupos
que as apresentaram e as propostas específicas de cada Eixo Temático, distribuídas
por Diretrizes e Projetos.
EIXOS TEMÁTICOS
DIRETRIZ PROGRAMÁTICA
DIRETRIZ PROGRAMÁTICA
Esta Diretriz defende a cidade para aqueles que não dispõem de moradia. A
garantia do acesso à moradia digna é condição fundamental para a efetivação
desse direito:
DIRETRIZ PROGRAMÁTICA
DESENVOLVIMENTO HUMANO
POR UMA ECONOMIA SOLIDÁRIA
DIRETRIZES PROGRAMÁTICAS
“(...) e, em tantas noites passadas, uma terá havido, pelo menos, em que
sonharam o mesmo sonho, viram a máquina de voar batendo as asas, viram o sol
explodindo em luz maior, e o âmbar atraindo o éter, o éter atraindo o ímã, o ímã
atraindo o ferro, todas as coisas se atraem entre si, a questão é saber colocá-las na
ordem justa, e então se quebrará a ordem (...)
(José Saramago em O Memorial do Convento)
Mas existe outra lógica, a lógica dos homens que sonham e se associam, que
buscam respostas novas para os problemas complexos, que mobilizam os recursos
da cidadania para encontrar saídas coletivas, que buscam combinar ajuda imediata
com a imaginação do futuro. É a lógica da experiência solidária para criar melhores
condições de vida juntos, através de políticas públicas ambiciosas. A solidariedade
que busca a inclusão é o único futuro, a única perspectiva para os problemas da
humanidade, da cidade.
Diz-se que: “juventude é um estado de espírito”. Tem cores, tem tribos, tem
ânsia por estabelecer-se no mundo. A idade é um tênue limite, mas é um tempo de
experimentação, de posicionamento diante da vida, mas também de indecisão.
Belém cidade das mangueiras e das mulheres, será também dos homens. Os
projetos e ações se desenvolvem para dar conta de reflexões que influenciem nos
meios de comunicação que criam estereótipos e padrões de comportamento de
maneira discriminatória e preconceituosa à imagem da mulher. Desenvolvem-se
também, para que no cotidiano de homens e mulheres, o ser humano seja
valorizado na sua totalidade. Todos terão maiores oportunidades de informação,
saúde, assistência, trabalho, renda, justiça e educação. Belém será igualmente o
espaço das pessoas mais velhas que juntamente com adultos e os jovens cultivarão
relações igualitárias, de solidariedade e cuidado entre as gerações, reconhecendo a
multiplicidade de expressões da identidade e da cidadania. E a cidade se constrói
como que iluminada, porque eles e elas seguirão “como encantados lado a lado”,
rendidos ao “tempo da delicadeza” sem violência ou discriminação.
5. Belém, Cidade Saudável
Cidadania Cultural é a condição básica para se ter uma cidade feliz, com
qualidade de vida. Cidadania cultural não significa somente discutir ou debater e
definir quais os projetos e ações nas áreas específicas da cultura, do esporte, do
lazer e de comunicação. Isto deve ser discutido, mas também a Cidadania Cultural
como uma dimensão fundamental da própria vida. Ela extrapola, portanto, a
atividade cultural específica, diz respeito à vida cultural cotidiana, ao direito que
se tem à qualidade de vida, o direito de ter uma cidade que possa garantir o acesso
ao saneamento, à saúde, à educação, à participação democrática da população nas
decisões do governo. Isso tudo é Cidadania Cultural.
2. Comunicação Democrática
Com base no princípio da Democracia e da igualdade, consolida-se uma
política de comunicação em Belém que apóie todos os meios de comunicação, tanto
os alternativos como os utilizados oficialmente.
DIREITOS HUMANOS
DIRETRIZ PROGRAMÁTICA
6. A Capital paraense quer ter seus direitos respeitados e viver sem violência:
Capítulo I
Da Composição e Atributos
Artigo 3º - O Conselho da Cidade tem por finalidade propor, deliberar e coordenar junto
com o governo municipal a viabilização das diretrizes e propostas emanadas do
Congresso Geral da Cidade, bem como participará do processo de elaboração do
orçamento público, deliberando sobre recursos e estimulando o controle social sobre o
serviço público.
Capítulo II
Da eleição de Conselheiros
Artigo 8º - Os conselheiros das entidades da sociedade civil, de que trata o artigo 4º, letras
“c”, “d”, “e”, “l” e “m”,, serão indicados pelas mesmas através de assembléia específica
para este fim.
Artigo 9º - Somente poderão ser candidatos ao Conselho da Cidade aqueles que atenderem
aos seguintes requisitos:
a) sejam maiores de 14 anos, exceto para os Conselheiros da Juventude, cuja idade
mínima será 12 anos e máxima 25;
b) Residam no município de Belém;
c) Residam na região administrativa em que será candidato, para o caso dos conselheiros
distritais;
d) Não estejam exercendo cargo de representação política em qualquer esfera Legislativa
ou Executiva;
e) Não estejam exercendo cargo de comissão no poder Executivo, Legislativo ou
Judiciário, de qualquer esfera, exceto para aqueles que forem servidores efetivos destes
poderes.
Parágrafo Único – As populações indígenas poderão ser representadas no Conselho da
Cidade por índios, aldeados ou não, estes residentes em Belém, conforme decisão soberana
de seu Congresso Setorial;
Artigo 10º - O mandato dos Conselheiros terá duração de dois anos, podendo haver
reeleição consecutiva.
§ 1º - Os conselheiros poderão Ter seu mandato revogado a qualquer momento, em fórum
específico;
§ 2º - A perda do mandato dos Conselheiros se dará por meio de: assembléia específica
para este fim, para os representantes das entidades; assembléia com metade mais um dos
eleitores que votaram no processo de eleição direta, para o caso dos representantes
distritais; assembléia específica para este com metade mais um dos delegados eleitos para
o congresso setorial ou temático, para o caso dos representantes dos eixos temáticos ou
setores do Congresso da Cidade.
Capítulo III
Das Atribuições
Capítulo IV
Do Funcionamento
Capítulo V
Da Organização Interna
Seção 1
I – Da Coordenação:
Seção 2
II - Da Secretaria executiva:
Seção 3
III – Do Pleno do Conselho:
Capítulo V
Disposições Gerais
Artigo 26 – Os casos omissos neste regimento serão resolvidos pelo Conselho da Cidade;
10 – SOBRE OS AUTORES