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Os Desafios da República da Indonésia: da reestruturação interna à busca pela liderança

regional.
Fernanda Nogueira
Natasha Agostini*

Introdução

A Indonésia é um país com população maior que a do Brasil e está entre as trinta maiores
economias do mundo, no entanto se comenta muito pouco sobre ele. Nesse texto visamos
oferecer um panorama geral dessa nação asiática, com foco em sua política e economia, que é
desconhecida por muitos.

Primeiro mostramos algumas informações básicas para que se tenha idéia das dimensões
do país e as peculiaridades mais relevantes de sua composição cultural e econômica. Em seguida
fazemos uma síntese breve da história indonésia, observando sua influência na evolução política
dessa nação, essencial para o entendimento dos desafios enfrentados por ela na atualidade. A
partir daí partimos para uma análise da economia do país, assinalando suas características mais
importantes e as perspectivas de desenvolvimento. Utilizando as informações dispostas no
decorrer do texto como base para compreensão, abordamos, por fim, o contexto político interno e
externo desse país, uma vez que o entendimento da história e situação indonésia é essencial para
podermos visualizar a sua inserção internacional. Por último, realizamos as considerações finais
sobre a pesquisa realizada.

Este texto não se pretende um material aprofundado sobre o tema, e sim uma análise para
os que têm pouco conhecimento sobre esse país e o seu papel no sistema internacional. Temos
como objetivo que após a leitura desse texto se forme uma idéia nítida na mente do leitor sobre a
Indonésia, essencial para os interessados em relações internacionais dado seu porte, localização
estratégica e disponibilidade de recursos.

*
Alunas da Graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

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Alguns Dados Fundamentais

A Indonésia, quarto país mais populoso do mundo, conta com 234 milhões de habitantes,
concentrados em mil das 17.508 ilhas que compõem o arquipélago. Dentre as principais ilhas
estão Kalimantan, Papua, Sumatra, Sulawesi e, com destaque, Java, onde se situam as maiores
cidades do país, a capital Jacarta e o centro político e econômico da Indonésia.

O lema nacional “União na Diversidade” pretende refletir a realidade de um país marcado


pela profusão de etnias, idiomas e culturas. Alguns dados podem ilustrar dita diversidade: o
reconhecimento de 350 grupos etno-lingüísticos no país; o domínio do idioma Bahasa Indonésia
(ou apenas “Indonésio”, língua oficial de apenas 10% da população) por todos os habitantes do
arquipélago; a convivência de 725 línguas e dialetos. O grupo predominante, tanto numérica
como economicamente, é o Javanês, correspondente a 40% da população Indonésia.

A fé islâmica é professada por cerca de 86% da população da Indonésia, o que torna este o
país de maior população muçulmana no mundo. A secular constituição do país, no entanto, tem
resistido às tentativas de incorporação de leis islâmicas àquelas do Estado, fato devido, em
grande parte, à forte oposição dos grupos islâmicos moderados. Quatro outras religiões têm sua
liberdade garantida pela constituição (Catolicismo, Protestantismo, Hinduísmo e Budismo),
sendo praticadas pela minoria da população – à exceção da ilha de Bali, de massiva orientação
hinduísta-.

A importância regional da Indonésia não se deve, unicamente, aos seus grandes números
populacionais: sua localização estratégica, entre o Oceano Índico e o Pacífico, torna-a passagem
obrigatória para os navios que fazem esse trajeto. O perigoso e longo caminho alternativo, pelo
sul da Austrália, reforça a importância da rota Indonésia, onde, tradicionalmente, o uso da força
não é medida adotada para o controle da região, já que a orientação do país é agir de maneira
mais sutil na defesa de seus interesses.

É importante salientar a riqueza da região em recursos naturais, especialmente petróleo,


gás, estanho e madeira. O país é o maior exportador de gás natural liquefeito, cuja extração se
concentra, primordialmente, na ilha de Sumatra, seguida por Java. Na área de manufaturados, as
exportações mais importantes são os têxteis e madeira industrializada. Ademais, a Indonésia se

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posiciona no mercado mundial como um exportador de commodities e importador de bens de
consumo durável e de capital.

No que tange à agricultura, observa-se a limitação imposta pela geografia do país: apenas
11,3% do território é arável. A cultura do arroz na região é tradicional, mas o produto destina-se
principalmente ao consumo interno A economia do país é afetada sensivelmente por desastres
naturais, uma vez que periodicamente a região é assolada por desastres naturais: comuns são
enchentes, atividades vulcânicas e terremotos (provocador das tsunami, ondas gigantes que em
2004 deixaram em estado calamitoso diversas províncias do país, especialmente a de Aceh).

Evolução História da Indonésia e seus Reflexos nas Características Políticas do País

Os primeiros reinos da Indonésia foram hindus e budistas. Centrados em Java, a partir do


séc. VI atingiram hegemonia na região, por meio da promoção de uma área de comércio desde
Sumatra até a Mollucas. O contato com o Islã teve início no século XI, quando da chegada dos
muçulmanos, então navegadores provenientes do Omã e da Índia e que permaneceram até o
século XVII. Já no século XII, época da formação dos primeiros assentamentos em Sumatra, o
Islã passou a ser adotado, chegando ao século XVI como a religião dominante tanto em Sumatra
quanto em Java.

A doutrina islâmica mesclou-se com a cultura existente na região, o que modelou a forma
do islamismo predominante na Indonésia. Mongóis e chineses também tentaram exercer sua
influência na região entre os séculos XIII e XV, como conseqüência do aumento de comércio
com esse país, mas não obtiveram sucesso. Desde esse momento pode-se observar a importância
da região Indonésia para o comércio e as sementes da diversidade que o país comporta.

O primeiro contato direto do povo indonésio com visitantes do Ocidente deu-se com
Marco Pólo, no final do século XII. Atraídos pelo comércio de especiarias, os portugueses e
espanhóis (que buscavam, nas ilhas do arquipélago, noz-moscada, cravo e pimenta-de-java)
deram continuidade à aproximação ocidental, sendo posteriormente seguidos por holandeses e
ingleses. Os europeus afetaram o comércio e a política da região apenas nos entrepostos de
comércio e outras áreas estratégicas, na maior parte das ilhas do arquipélago a colonização só
passou a ser efetivamente exercida em meados do século XIX.

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O comércio com o Ocidente passou a ser dominado pela Companhia Holandesa das Índias
Orientais que, apesar de não objetivar o domínio colonial, fez crescer gradualmente o poderio
holandês no arquipélago. Somente após a liquidação da Companhia, em 1799, instauraram-se
verdadeiros vínculos coloniais e, nas primeiras décadas do século XX, sob influência do
imperialismo dominante na época, o Estado holandês assumiu o controle da quase totalidade do
que hoje entendemos por Indonésia.

Foi também no século XX que os primeiros sinais de um nacionalismo começavam a


surgir no território. Já na década de 1930, os movimentos começaram a tomar expressão, mas foi
durante a II Guerra Mundial, que os planos de Independência tomaram forma.

O líder nacionalista Sukarno e seus apoiadores, que haviam sido aprisionados pelos
colonizadores, aceitaram colaborar com os japoneses após a ocupação do território pelos últimos.
Quando iminente o fim da guerra, os ocupantes permitiram que os nacionalistas estabelecessem
um comitê para preparar a independência.

Dois dias após a retirada dos japoneses, em 17 agosto de 1945, Sukarno declarou a
independência do arquipélago. Quatro anos de guerra se passaram até que os holandeses
desistissem de tentar restabelecer o sistema colonial. Pesadas pressões internacionais, incluindo
uma ameaça americana de cortar a ajuda do Plano Marshall à Holanda, agilizaram a decisão da
metrópole e, em 27 de dezembro de 1949, a independência da República dos Estados Unidos da
Indonésia - que no ano seguinte seria modificada para uma unitária República da Indonésia - foi
finalmente reconhecida.

Os anos seguintes à independência foram marcados por forte instabilidade política e


econômica. Dissidências regionais, estagnação econômica e tentativas de golpe de Estado foram
ameaças com as quais o governo de Sukarno teve que lidar. Eleito democraticamente em 1955,
ele se autoproclamou presidente vitalício, mas gradualmente perdeu apoio: uma desastrosa
campanha de guerra contra a Malásia, combinada a uma aproximação com a China maoísta e o
Partido Comunista Indonésio, causaram péssimas reações entre a sociedade civil, assim como
entre líderes muçulmanos e militares. Em 30 de setembro de 1965, um golpe de Estado forçou a
deposição de Sukarno e perpetrou ataques pela supressão do comunismo na Indonésia. Entre o
final de 1965 e o início de 1966, aproximadamente 500 mil comunistas e suspeitos foram
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assassinados e, muitos outros, presos. Em março de 1966, o poder foi transferido para Suharto,
um militar de alta patente e, a partir daí, teve início o período que ficou conhecido como a “Nova
Ordem”.

O novo líder indonésio traçou um plano de ação oposto ao de seu predecessor, baseado
em fortalecimento econômico e desenvolvimento para assegurar a unidade do país. Ele lançou a
Pancasila, ideologia constituída por cinco princípios básicos: crença em Deus, unidade nacional,
democracia, justiça e humanitarismo. Foi uma adaptação política da cultura Indonésia e teve boa
aceitação entre a população. A era da Nova Ordem prolongou-se por mais de 30 anos, porquanto
Suharto e os membros de seu partido (Golkar) eram continuamente reeleitos através de eleições
fraudulentas e marcadas por forte repressão.

Os dois pilares de sustentação da Indonésia eram o Islã e o exército. Suharto soube manter
o radicalismo islâmico à margem do poder; o exército, por sua vez, legitimava sua permanência
no comando do país. Houve forte repressão aos oponentes do regime e do unitarismo do Estado, e
as agressões e assassinatos mantinham os oposicionistas inativos. Não foram somente o medo e o
totalitarismo, porém, que mantiveram o General Suharto por trinta anos no poder: o
desenvolvimento econômico e uma suposta inclusão da população foram as chaves para o seu
sucesso.

Após a queda nos preços do petróleo na década de 80, a Indonésia voltou-se para
exportação de produtos agrícolas, que exigiam, entre outros fatores, mão-de-obra barata,
abundante nas ilhas. Junto ao desenvolvimento veio a modernização, e com ela o crescimento da
classe média e o aumento das possibilidades de consumo, o que atendia os desejos da população.
O acesso à educação expandiu-se, bem como ao saneamento, ao sistema de saúde e à eletricidade:
era inegável a melhoria no bem-estar do povo indonésio.

Apesar das melhoras nas condições de vida, todavia, o governo era corroído pela
corrupção. O suborno se tornou uma prática corrente e crescente na burocracia Indonésia,
atrapalhando os investimentos. Os governos ocidentais - até então apoiadores de Suharto em
função do combate aos comunistas na Guerra Fria -, com o fim do conflito entre as
superpotências, deram início a pressões pela abertura do comércio e liberdade política. A
tentativa de abertura, porém, esbarrou no declínio do regime de Suharto, e por conseqüência de
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sua capacidade de liderança, agravado pela percepção - por parte dos investidores – da
insustentabilidade do crescimento do país e dos prejuízos causados pela corrupção à economia, já
abalada pela fuga massiva de capitais do sudeste asiático na crise de 1997.

Identificaram-se as causas da crise, então, como sendo a tríade “Fraude, Corrupção e


Nepotismo”, todas estritamente associadas ao regime de Suharto. No entanto, essa é uma
interpretação parcial apenas. A conjuntura da época não era favorável: ditaduras perdiam apoio
das potências e a crise do sudeste asiático foi o golpe final que arruinou definitivamente a
economia de um regime que passava por inúmeras dificuldades políticas. Não houve alternativa à
renúncia e, em 21 de maio de 1998, Suharto resignou em favor de B.J. Habibie.

Durante seu breve governo, Habibie aceitou realizar um referendo concernente à situação
do Timor Leste, o qual revelou resultados largamente favoráveis à independência. Milícias Pró-
Indonésia, contudo, deflagraram um banho de sangue, queimando casas, escolas, hospitais e
lojas. As forças de paz da ONU, ao intervirem no conflito, declararam, por meio da Comissão de
Direitos Humanos, a responsabilidade dos funcionários e militares do governo pelo massacre.

K.H.A. Wahid, mais conhecido como Gus Dur, foi eleito o novo presidente, mas sua saída
foi forçada, em 2001. Entre as razões para tanto, a falta de confiança no novo líder e o
descontentamento dos líderes islâmicos e militares. Sua sucessora foi Megawati Sukarnoputri,
filha do primeiro presidente indonésio, que contava com o prestígio de seu pai, símbolo da
independência, para mobilizar a opinião pública. Ao contrário das esperanças da população, no
entanto, seu governo permaneceu nas diretrizes implementadas pelo General Suharto: utilização
do poder em benefício próprio e manipulação das finanças e negócios, sem nenhum laço com as
políticas defendidas por seu pai.

As primeiras eleições diretas da Indonésia foram realizadas em 2004, com a eleição de


Susilo Bambang Yudhoyono. Seu primeiro grande desafio foi a crise provocada pelo Tsunami,
que atingiu as ilhas, provocando milhares de mortes e somas enormes de prejuízos materiais.

Panorama Econômico da Indonésia: da Economia Guiada à abertura.

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A “Economia Guiada”, de Sukarno, iniciada em 1959 e planejada para um período de oito
anos, foi marcada por alto grau de corrupção e pela ausência de fontes claras de financiamento, o
que gerou uma inflação galopante e um grande endividamento externo. A economia indonésia,
portanto, na década de 1960, encontrava-se estagnada, fato que levou à instauração da “Nova
Ordem”, de Suharto. Medidas de estabilização, aumento da intervenção do Estado e auxílio
financeiro do Fundo Monetário Internacional (FMI) estavam entre as estratégias adotadas. O
grupo de conselheiros do governo, conhecido como a “Máfia de Berkeley” (em razão da
formação acadêmica de parte do grupo na Universidade de Berkeley), direcionava o foco à
estabilização do Balanço de Pagamentos e ao retorno do desenvolvimento do mercado privado,
desestruturado após a onde de nacionalizações promovida por Sukarno.

A busca por auxílio estrangeiro levou à formação do “Grupo Inter-Governamental na


Indonésia”, composto por nações como o Japão e Holanda e instituições internacionais como o
Banco Mundial; grupo informal que influenciava diretamente as decisões de política econômica
do país, foi responsável por implementar uma série de planos qüinqüenais com o objetivo de
estabilizar a economia, tendo como metas a responsabilidade monetária e fiscal, e a promoção da
industrialização e do desenvolvimento.

Outra questão que merece ser salientada é que a posição de membro da Organização dos
Países Exportadores de Petróleo (OPEP) favoreceu a Indonésia quando do choque de 1973: o
país, neste período, alavancou seu crescimento e vivenciou o início da prosperidade. Entretanto,
prevendo o perigo da dependência exclusiva desta commodity, o governo passou a investir na
diversificação da pauta de exportações, com materiais como a madeira e alguns produtos
manufaturados.

Apesar da prosperidade das décadas de 1970 e 1980, quando o crescimento médio anual
era de 8%, a corrupção do sistema de Suharto evidenciava a falta de uma classe propriamente
empreendedora: as grandes empresas eram encabeçadas ou pelo governo e seus grandes líderes
públicos ou pela classe capitalista de ascendência chinesa. Este sistema foi chamado por Richard
Robison de “capitalismo burocrático”, porquanto baseado em um paternalismo burocrático
conformado por figuras públicas poderosas que dominavam os principais pontos da economia
nacional e os utilizavam em favor de seu próprio poder político. O crescimento observado não era

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suficiente e tampouco sustentável para solucionar problemas estruturais econômicos mais
profundos. Assim, a desaceleração do crescimento econômico nos anos 80 denunciou os limites
da Nova Ordem e da estratégia de industrialização, levando à reconsideração do tamanho do
Estado na economia, principalmente após o colapso do mercado petrolífero em 1986.

Medidas de liberalização e desregulamentação do comércio foram insuficientes para


evitar o impacto do colapso e, em conjunção com a tríade “Fraude, Corrupção e Nepotismo”,
deixaram a economia extremamente vulnerável ao advento da crise asiática no final dos anos
1990. O Produto Interno Bruto chegou a perder quase 60% do seu valor somente em 1998, e a
população estimada na linha de pobreza subiu a 25% da população total, em contraste aos 10%
obtidos em 1994. Desde então, em grande parte em função da lentidão das reformas no sistema
bancário, legal e corporativo, além da contínua ação militar em Aceh, o crescimento tem sido
muito mais modesto, numa média de aproximadamente 2,5% ao ano.

Apesar do colapso do petróleo, a Indonésia vem registrando superávits na balança


comercial desde 1980. Seus principais produtos exportados vão do petróleo e derivados, madeira
e borracha, a equipamentos elétricos e de telecomunicações; as importações comportam
principalmente equipamentos e máquinas, produtos químicos e alimentos. Seus maiores parceiros
comerciais incluem Japão, Cingapura, Estados Unidos, União Européia, Coréia do Sul, China,
Austrália e Taiwan. O investimento estrangeiro, no entanto, vem declinando severamente,
chegando a apenas 9,3 bilhões de dólares em 2003, em comparação aos 133 bilhões em 1997;
enquanto isso, a dívida externa atingiu 132,9 bilhões de dólares em 2003, contrastando com os
2,4 bilhões no final da década de 1980.

O fim do acordo com o FMI em 2003, devido às discordâncias quanto à continuidade de


medidas econômicas restritivas, manteve estabilidade econômica, e há sinais de sucesso no
desenvolvimento de pequenas e médias empresas. O novo governo aposta em políticas mais
expansivas que, com o impulso dos altos preços das commodities no mercado mundial,
especialmente o petróleo e o gás natural, propiciam o retorno gradual do crescimento.

O crescimento, alavancado pelas commodities, vem sendo sustentado pelas políticas


econômicas do presidente Susilo, preocupado em promover a diversificação da pauta de
exportações. O Banco Central parece permanecer prudente quanto à política monetária, mantendo
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baixas taxas de inflação, reduzindo as dívidas e aumentando o nível de reservas, concedendo,
assim, maior liberdade fiscal ao governo, com possibilidades de investimento no
desenvolvimento interno.

As perspectivas no campo econômico são positivas e apontam para uma taxa média de
crescimento de 5,8% ao ano para o período de 2007 a 2011, além de um aumento substancial no
investimento direto externo, viabilizado pela estabilidade política e financeira. A estabilização da
dívida externa, em torno de 125 bilhões de dólares, também remove grande parte da relutância do
governo e do setor privado para adquirir empréstimos no exterior.

A Indonésia e suas Questões Políticas Fundamentais: das reformas, no âmbito


interno, à expansão de influência, na política externa.

No âmbito interno, é possível dizer que a estrutura política da Indonésia vem sofrendo
mudanças significativas, como a eleição democrática do presidente Susilo Bambang Yudhoyono
e o fortalecimento do Poder Legislativo. Em 2004, emendada a Constituição de 1945,
estabeleceu-se o sufrágio universal (agora, cidadãos a partir dos 17 anos estão aptos a votar) e o
mandato presidencial de 5 anos, bem como eleições democráticas para o Parlamento, com a
ampliação do número de partidos concorrentes. Além disso, a Constituição instituiu seis
principais órgãos de Estado: a Assembléia Consultiva Popular, a Presidência, a Casa de
Representantes Populares, o Conselho Regional de Representantes, a Corte Suprema e a Borda de
Auditoria do Estado, todos subordinados ao presidente nos poderes anteriores.

O sistema legal, na Indonésia, baseado na lei romano-holandesa, ainda carece de intenso


progresso, mas as reformas previstas, neste sentido, indicam perspectivas de melhoria deste
cenário. O aumento da governabilidade no país, atualmente garantida pela maioria, no
Parlamento, favorável ao presidente, favorece a estabilidade política, ainda que o bom andamento
do governo dependa, em muito, do status pacífico da região, sempre ameaçado pela possibilidade
de novas insurgências.

Cabe ao governo mostrar bons resultados das políticas que tem tomado, além de acelerar
o progresso das reformas - principalmente no sistema judiciário. Os sacrifícios decorrentes das
políticas econômicas restritivas, aparentemente necessárias ao desenvolvimento, só serão

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sustentáveis se o crescimento atingir a população como um todo, o que aumentaria, em grande
medida, o apoio popular ao atual governo.

No que tange à política externa, por sua vez, tem-se que seu objetivo principal, desde a
consolidação da Indonésia enquanto Estado-Nação, é assegurar a integridade territorial e a
segurança deste Estado. O Princípio do Arquipélago, estabelecido pelo Direito Internacional dos
Mares, deu à República maior unidade do território, incorporando o espaço marítimo entre as
ilhas. Enquanto Sukarno utilizou este princípio para legitimar sua política externa de caráter anti-
imperialista e radical, Suharto seguiu pelo caminho da cooperação, principalmente com o
Ocidente, em busca de apoio e suporte à estabilidade política e ao desenvolvimento econômico da
Indonésia.

A atuação de Suharto, no campo da política externa, permaneceu modesta e quase


imperceptível até a metade dos anos 1980, quando o então presidente decidiu conduzir a
Indonésia a um papel mais proeminente na região, afirmando, para isso, sua identidade nacional e
percebendo a importância regional do país. Sua participação na Conferência de Bandung tornou-o
a principal liderança do Movimento de Países Não-Alinhados, conseguindo, em razão desta,
presidir o encontro de 1992. No mundo Pós-Guerra Fria, contudo, tal posição não lhe conferia
mais significado tão relevante, o que não o impediu de promover a discussão de temas
importantes como cooperação econômica dos países do Movimento com os países desenvolvidos
e, ainda, a questão do colonialismo, levando a mensagem do grupo à ONU.

A Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) é o principal foco da política


regional indonésia, no qual a cooperação econômica e o estabelecimento de políticas conjuntas
frente a ameaças externas são os principais tópicos. Além disso, a organização busca a paz e a
estabilidade da região, justificando-se, assim, como uma prioridade. Houve certa resistência
inicial, por parte da Indonésia, em aceitar os tratados de livre comércio com a organização, por
receio de que seu mercado - de longe o maior dentre os países acordantes - fosse inundado por
produtos estrangeiros mais competitivos; mas, por fim, chegou-se à área de livre comércio da
ASEAN. Apesar do acordo, a Indonésia não deixou de buscar outros mercados: na Cooperação
Econômica da Ásia-Pacífico (APEC), tenta aproveitar o potencial econômico da região sem, no

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entanto, atrelar-se a acordos demasiadamente profundos – o que acabaria gerando desconfianças
nos parceiros da ASEAN, em especial Cingapura e Malásia.

A possibilidade de afirmar-se como liderança regional afeta as suas relações com os


países vizinhos. Com Papua Nova Guiné, os conflitos relativos à fronteira e às facções
separatistas, e a percepção da assimetria de poder militar entre si, levou os países à assinatura do
Tratado de Respeito, Cooperação e Amizade Mútuos, em 1986, prevenindo a intervenção em
assuntos internos e eventuais controvérsias lindeiras. O tratado foi renovado em 1992, situação
em que os dois presidentes acordaram quanto às ótimas relações bilaterais entre os dois países.

Após confrontos e reticências com Cingapura e Malásia, essas relações tornaram-se


cordiais em virtude de interesses comuns no desenvolvimento econômico, o qual é buscado
através da complementaridade das economias, num triângulo de crescimento estratégico.
Estratégica é também a posição geográfica do triângulo, revelando a necessidade de boas relações
para quaisquer futuras ações indonésias como potência na região. O mesmo pode ser dito da
Austrália, com quem sempre possuiu embates - principalmente étnicos e culturais (sendo a
imprensa australiana muito crítica ao sistema político de Jakarta): há um esforço mútuo visando a
melhoras nas relações diplomáticas, embora ainda haja grande relutância, em especial da opinião
pública australiana. Nas Filipinas, após o auxílio da ASEAN em empossar pacificamente o
presidente Corazon Aquino e a eliminação do foco comunista do Novo Exército do Povo, a visão
de Jakarta torna-se positiva e cordial frente ao país e abres-e espaço para sua participação nas
negociações de questões regionais.

As relações com a China, por sua vez, depois de cortadas em 1967 (frente à tentativa de
golpe de Estado em 1965), foram retomadas em 1990, quando da percepção de que os interesses
de ambos os países ultrapassavam os embates do passado. A existência de uma verdadeira classe
social formada por descendentes chineses na Indonésia também induziu este processo, sendo esta
classe a principal responsável pelos negócios internacionais privados no país. A expansão chinesa
demonstrou à Indonésia a necessidade de manter boas relações com a China, condição para uma
eventual ascensão ao posto de potência e, por parte da China, Jakarta é considerada um ponto
central de apoio em suas relações sul-asiáticas.

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A posição do Japão foi, durante muito tempo, temida, dados os ressentimentos da opinião
pública a respeito de uma dominação japonesa. Ainda assim, o país foi o maior investidor direto e
importador de produtos da nação Indonésia e, apesar da posição de desconfiança da ASEAN
frente à possível expansão nipônica, o país é um parceiro de extrema importância estratégica e,
ademais, responsável por prover grande parte da assistência ao seu desenvolvimento.

Com os Estados Unidos, finalmente, as relações foram mornas e cordiais na maior parte
do tempo, em grande medida pelas violações aos direitos humanos e ao sistema político
indonésio. O vislumbramento da Indonésia como um ponto de apoio anticomunista no sul da
Ásia, contudo, obrigou a superpotência a fazer vista grossa até o fim da Guerra Fria, quando
ressurgiram os embates e as divergências no campo político-diplomático resultaram na
diminuição do auxílio econômico, por parte dos EUA, à Indonésia. As recentes mudanças
estruturais da Indonésia (com políticas econômicas responsáveis e avanços no sentido da
democracia), entretanto, indicam melhores perspectivas ao relacionamento entre os dois países,
especialmente em se considerando a importância, reconhecida pelos dois governos, da
manutenção das boas relações entre eles.

Considerações Finais

Nesta breve análise é importante observar como a estrutura territorial afeta não somente a
integridade nacional, mas a unidade política do país, exigindo um forte governo para que esta
“diversidade” possa ser centralizada. A eleição de Susilo Bambang Yudhoyono e a recente
implementação das tão desejadas reformas institucionais demonstram a gradual adaptação às
mudanças na organização da arena internacional, em que seu posicionamento como liderança
regional é essencial para manter o crescimento em ascenção em que se encontra.

Apesar da grande variedade étnica e das dificuldades econômicas, sociais e políticas


apresentadas durante o artigo, a Indonésia vai lentamente tornando-se uma unidade,
direcionando-se à democracia e traçando seu caminho nas relações internacionais em busca de
um objetivo comum: tornar-se referência em crescimento e estabilidade, não só aos países de sua
região, mas também como ponto estratégico às grandes potências.

Bibliografia

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