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Apostila Lógica 2021
Apostila Lógica 2021
0. INTRODUÇÃO
O adjetivo “lógico” pode ser considerado como equivalente a “racional”, ou também “ra-
zoável”. Já o substantivo “lógica”, embora na fala informal corresponda mais ou menos a um
dos significados de “razão” ou “racionalidade”, possui também um emprego mais técnico como
nome de uma disciplina, a lógica formal. Esta abrange desde a lógica silogística, pela primeira
vez sistematizada por Aristóteles, até a moderna lógica simbólica, hoje transformada em ciên-
cia autônoma com múltiplas ramificações.
Tradicionalmente a lógica foi considerada uma disciplina fundamental para qualquer ati-
vidade científica. O estudo da lógica deveria não somente fornecer o ‘instrumento’ para o traba-
lho científico, mas também desenvolver a habilidade para o raciocínio, necessário em qualquer
área do conhecimento. Diversos fatores contribuíram para que tal posição já não possa ser de-
fendida sem alterações e distinções.
Em primeiro lugar, a evolução da lógica para o cálculo abstrato contribuiu para tornar
cada dia mais evidente o hiato entre a lógica formal e o raciocínio real, tal como é praticado
nos diversos contextos e situações, desde uma conversa informal até as mais complexas espe-
culações filosóficas ou científicas. Se, além disso, tomarmos em conta as mais recentes análi-
ses filosóficas da linguagem, o referido hiato aparece simplesmente como instransponível. As
reflexões filosóficas deixaram claro que a linguagem não é nem pode ser algo semelhante ao
cálculo, pressuposto pela lógica formal.
Os fatores apontados, além de evidenciar os limites da lógica formal como ‘instrumento’
para o trabalho científico em geral, colocam em dúvida a própria ideia de que o estudo da ló-
gica formal possa contribuir para o desenvolvimento da capacidade de elaborar argumentos só-
lidos, ou criticar os argumentos não sólidos. O que o estudo da moderna lógica formal desen-
volve é a habilidade para o cálculo abstrato. Não é sem razão que na literatura mais recente
surgem obras com o título de lógica informal que procuram estudar o raciocínio não de modo
abstrato, mas em suas manifestações concretas. Também o nosso curso não se limitará ao es-
tudo da lógica formal; incluirá aspectos e elementos que visam contribuir para a compreensão
e o exercício prático do raciocínio no dia-a-dia. Entende-se, assim, que o nosso curso só pode
ter um caráter introdutório.
Dividiremos nosso estudo em duas partes. Na primeira parte (1.), serão apresentados
aspectos da argumentação e da linguagem, básicos e fundamentais para o trabalho de análise
lógica, além de aspectos gerais da avaliação de argumentos bem como a identificação, descri-
ção e classificação das falácias informais ou não-formais. Na segunda parte (2.), abordaremos
a lógica formal propriamente dita nas duas modalidades, a lógica silogística e a lógica simbó-
lica.
1. LÓGICA E LINGUAGEM
(Observação: O que segue, em grande parte, é uma síntese baseada em Irving. M. Copi, In-
trodução à lógica, Ed. Mestre Jou, S. Paulo, 1974).
Consideremos os textos:
(1) Todas as formigas são insetos.
Todas as moscas são insetos.
Portanto, todas as moscas são formigas.
(2) O que se move não se move no lugar em que está, nem no lugar em que não está.
Portanto, o movimento é impossível.
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Os textos acima representam exemplos de raciocínio. Tais exemplos nos podem mos-
trar que todos nós raciocinamos ou somos confrontados com o raciocínio de outrem, seja no
dia-a-dia, seja num contexto mais teórico. Além disso, eles apontam para a possibilidade de
existirem raciocínios incorretos. Como distinguir um raciocínio correto de um incorreto? Uma
das finalidades do estudo da lógica é o desenvolvimento da capacidade para distinguir entre
argumentos corretos, ou válidos, e incorretos, ou inválidos. Também poderíamos dizer que o
estudo da lógica é o estudo dos métodos e princípios usados para distinguir o raciocínio
correto do incorreto. A lógica, portanto, não se interessa pelas condições psicológicas ou
mentais do raciocínio. O estudo dessas condições cabe a outras ciências. A lógica se interessa
apenas pela racionalidade do processo, se o raciocínio é como deve ser.
A importância do estudo da lógica pode ser avaliada pela importância do próprio raciocí-
nio. Assim, o raciocínio é a única habilidade que possibilita ao ser humano dominar a terra,
bem como arruiná-la. É a capacidade que mais claramente nos diferencia de outras formas de
vida existentes no planeta.
Em segundo lugar, o raciocínio nos ajuda não apenas a encontrar respostas corretas
individualmente, mas, acima de tudo, ele possui um alcance social. Numa democracia ou
numa sociedade pluralista é essencial que as pessoas sejam capazes não só de raciocinar por
si mesmas a respeito das questões atinentes ao grupo a que pertencem, mas também sejam
capazes de usar a força social da razão para se persuadirem umas às outras, e assim chegar a
uma solução comum que possa ser aceita como bem fundamentada. Certamente existem ou-
tras formas de convencimento, tais como a violência ou a manipulação. Mas o emprego da ra-
zão tem seu a seu favor vantagens de ordem moral, tais como o respeito pelo direito de os ou-
tros formarem sua própria opinião, bem como as vantagens de ordem política e legal.
Acima de tudo, porém, o raciocínio é o melhor guia para a verdade. Isto não significa
que nunca se possa “seguir a voz interior”, o instinto ou a autoridade. Significa, porém, que de-
vemos usar a razão para decidir quando devemos “seguir a voz interior”, o instinto ou a autori-
dade. Contrariamente ao que poderia parecer, a afirmação de que o raciocínio é nosso melhor
guia para a verdade não é dogmática. Isto porque, mesmo no caso de outra instância se reve-
lar como um guia confiável para a verdade, quem nos diz que a referida instância é confiável é,
ainda e sempre, a razão. Suponhamos, por exemplo, que alguém afirme ter encontrado uma
nova forma de conhecimento, e se revele capaz de diagnosticar doenças e prescrever terapias,
melhor do que qualquer de nossos profissionais. Nesse caso é a razão que nos diz que deve-
mos aceitar o novo ‘profeta” ou “visionário”, e isto com base na comparação do seu desempe-
nho com aquele dos antigos especialistas. Esta é a coisa razoável a fazer, ainda que não seja-
mos capazes de apresentar um argumento explícito e direto. Portanto, não abandonamos a ra-
zão, mas ela permanece como a suprema corte de apelação.
O exemplo anterior mostra que é preciso sensibilidade para distinguir um “juízo bem
fundamentado” de um “juízo universalmente aceito”. Também não se deve identificar racio-
nar com calcular ou medir, ou ignorar as emoções, ou apelas para a autoridade. Raciocinar, às
vezes envolve tais coisas, às vezes manda rejeitá-las. Raciocinar, neste sentido mais amplo,
significa elaborar, com o maior cuidado possível, a melhor resposta que pudermos encontrar,
usando tudo o que for útil para esta finalidade.
ama Inês” e (2) “Inês é amada por João” são duas sentenças diferentes, mas constituem uma
única proposição.
2) Aquelas proposições que “são consideradas provas evidentes de outra” são as pre-
missas do argumento. E a proposição que “é derivada das outras” é a conclusão do argu-
mento. Consideremos um exemplo:
“Ele se indispôs com quase todos os membros da comissão; consequentemente, é
pouco provável que ele seja aprovado”.
Aqui a sentença “é pouco provável que ele seja aprovado” é a conclusão; e a sentença
“ele se indispôs com quase todos os membros da comissão” é uma premissa.
3) O processo mediante o qual se passa das premissas para a conclusão chama-se in-
ferência. Ao lógico não interessa a inferência como processo mental, mas apenas a conexão
que o argumento afirma existir entre as premissas e a conclusão. Entende-se, assim, porque a
palavra “inferência” é usada também para designar a própria conclusão.
4). Por implicação de uma afirmação entende-se, em sentido amplo, aquilo que decorre
da mesma; e, no sentido mais estrito, aquilo que decorre necessariamente ou logicamente de
outra proposição. É importante atender a uma diferença gramatical entre “inferir” e “implicar”.
Premissas implicam conclusões, mas não inferem. Quem infere são as pessoas.
5) Uma das etapas na análise de argumentos é a identificação das premissas e con-
clusões. Esta identificação não pode ser feita atendendo simplesmente à ordem das senten-
ças no argumento. A conclusão tanto pode estar no início do argumento com o no fim, ou
mesmo entre as premissas.
No outro, ”a conclusão de que é absolutamente necessário que o poder executivo esteja sem-
pre (em atividade) ” baseia-se no fato de que “é sempre imprescindível a execução das leis
promulgadas”.
Em outros casos, a conexão entre os argumentos é mais estreita, como no caso em que
conclusão de um argumento serve de premissa para outro argumento. Vejamos um exemplo:
“Como não existe resistência elétrica na bobina condutora de eletricidade de um mag-
neto supercondutor, nenhuma energia é dissipada como calor, e fortes campos podem ser
mantidos sem, praticamente, qualquer consumo de energia”.
Temos aqui a premissa “não há resistência na bobina condutora de eletricidade de um mag-
neto supercondutor” da qual “nenhuma energia é dissipada como calor” é inferida como conclu-
são. Depois, num segundo argumento, a conclusão “fortes campos podem ser mantidos sem
praticamente qualquer consumo de energia” tem como premissa a conclusão do argumento an-
terior, “nenhuma energia é dissipada como calor”.
Até aqui consideramos os constituintes básicos do argumento: as premissas e conclu-
sões. Mas de um raciocínio, normalmente, também fazem parte suposições, ou seja, algo
considerado como aceito ou evidente, mas não expresso Muitas vezes as suposições são de
tal modo óbvias que não há interesse em explicitá-las. Outras vezes, porém, suspeitamos que
um argumento repousa sobre uma suposição discutível. Neste caso será importante explicitá-la
no momento de avaliar o argumento.
c) Argumentos e não-argumentos
Nem todo e qualquer texto representa um argumento. Daí a importância de saber reco-
nhecer argumentos ou de saber distinguir entre argumentos e não-argumentos.
1). Num argumento, como vimos, uma ou mais asserções são apresentadas como
justificação para outra asserção. Isto significa que a presença de sentenças asserti-
vas é condição necessária para a presença de um argumento. Portanto, pergun-
tas, pedidos, comandos, bem como meras expressões de satisfação não constituem
argumentos. Consideremos o exemplo:
“Os sinônimos são bons servos, mas amos ruins; portanto, escolham-nos com cuidado”.
Aqui temos o indicador de conclusão,“portanto”, mas o texto não constitui um argu-
mento, porque a sentença introduzida pela palavra“portanto” não é uma asserção, mas um
conselho. Além disso, todo argumento pode ser reduzido a um condicional:
“Se todos os homens são mortais e se Sócrates é homem, então Sócrates é mortal”.
Mas nem todas as proposições condicionais expressam argumentos. Vejamos a propo-
sição: “Se os objetos de arte são expressivos, então eles são uma linguagem”.
Trata-se de um mero condicional; afirma apenas uma implicação.
Em outros casos a semelhança com argumentos é ainda maior. Assim, a conjunção
“porque” pode introduzir uma razão, mas também pode introduzir uma explicação, e neste caso
não há argumento. Consideremos os exemplos:
(1) “Nenhum sistema pode existir metade matéria e metade antimatéria, porque as duas formas
de matéria se aniquilam mutuamente”.
(2) “O império romano desmoronou e pulverizou-se porque lhe faltava o espírito de liberalismo
e livre iniciativa”.
No exemplo (1) a conjunção “porque” introduz uma razão ou justificação e afirma uma
conexão lógica entre as proposições. Já no exemplo (2) a mesma conjunção indica uma expli-
cação, a causa para o desmoronamento do império romano. Trata-se de uma conexão empí-
rica, causal, não uma conexão lógica.
Certos textos, tais como artigos científicos ou editoriais de jornal, provavelmente conte-
rão argumentos. Mas dificilmente todas as partes do texto serão partes do argumento. Neste
caso, para fazer uma avaliação crítica do argumento será útil identificar os elementos que fa-
zem parte de algum argumento, separando-os das expressões que não fazem parte de argu-
mentos.
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d) Dedução e indução
Na fala ordinária estes três conceitos e seus correlatos, falsidade, invalidade e inconsistên-
cia, por vezes se confundem. Mas, no contexto da lógica, eles possuem um emprego especí-
fico. Verdade é um atributo de enunciados afirmativos. Validade é um atributo de argumentos
e designa a correção com que uma conclusão foi inferida das premissas. E um argumento é
consistente ou sólido quando as suas premissas são verdadeiras e a conclusão é derivada
validamente das premissas.
Verdade/falsidade e validade/invalidade podem ser combinadas de diferentes maneiras,
dando origem às seguintes possibilidades:
(1). As premissas podem ser verdadeiras, mas a inferência pode ser inválida. Neste caso o ar-
gumento será inconsistente ou não-sólido. Exemplo:
Todos os gatos são animais.
Todos os porcos são animais.
Portanto, todos os porcos são gatos.
(2). Uma ou mais premissas podem ser falsas, mas a inferência pode ser correta. Neste caso o
argumento será válido, mas não consistente. Exemplo:
Todos os atores de novela são brancos.
Milton Gonçalves é ator de novela.
Portanto, Milton Gonçalves é branco.
(3). Uma ou mais premissas podem ser falsas e, além disso, a inferência incorreta. Neste caso
o argumento será inválido e inconsistente. Exemplo:
Eu gosto deste curso.
Todos os exames finais são fáceis.
Portanto, obterei uma boa nota no exame.
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(4). As premissas podem ser verdadeiras e a inferência válida. Neste caso, além de ser válido,
o argumento será sólido ou consistente. Exemplo:
Todos os homens são mortais.
Sócrates é homem.
Portanto, Sócrates é mortal.
Dado que dentre os vários tipos de argumento apenas um pode levar a conclusões ne-
cessariamente verdadeiras, pode-se perguntar por que também nos interessamos pelos de-
mais. A razão é que às vezes não estamos em condições de saber se nossas premissas são
verdadeiras. Se através de uma inferência válida chegarmos a uma conclusão sabidamente
falsa, podemos ter certeza de que ao menos uma das premissas é falsa. Isto significa que se
não concordarmos com determinada conclusão que parece seguir validamente de premissas, é
provável que também não estejamos de acordo com a premissa.
Entende-se por forma do discurso a estrutura gramatical propriamente dita. Por isso,
identificar as diferentes formas do discurso é tarefa dos gramáticos no sentido tradicional. Es-
tes costumam distinguir quatro tipos básicos de sentenças: declarativas, interrogativas, ex-
clamativas e imperativas.
A função do discurso é determinada pela finalidade com que se usa uma sentença. Os
livros de lógica costumam distinguir três funções básicas:
(1) Função informativa. Aqui a linguagem é usada para descrever algo ou transmitir uma infor-
mação. Exemplo: “Amanhã não haverá aula de lógica”.
(2) Função expressiva. Neste caso a finalidade do discurso é expressar ou despertar senti-
mentos ou emoções. Exemplo: “Foi um prazer conversar com você”.
(3) Função diretiva. Neste caso, trata-se de causar ou impedir determinada ação. Exemplo:
“Feche a janela!”
É importante ter presente que existem ainda outros tipos de função da linguagem. J.L.
Austin observou que certos verbos, como “prometer”, “jurar”, quando usados na primeira pes-
soa singular do presente indicativo, possuem uma função especial, denominada de “função
operante”, porque neste caso não se trata de informar ou descrever, mas de realizar uma
ação. L. Wittgenstein chama a atenção para as “inúmeras espécies de emprego daquilo que
chamamos ‘signo’, ‘palavra’, ’frase’” (Investigações filosóficas, #23).
Também pode acontecer que uma mesma frase tenha uma função mista. Tudo isso
torna complexa a tarefa de identificar a função das diferentes frases. Em muitos casos seria ne-
cessário interrogar o autor da sentença, o que nem sempre é possível.
A relação entre significado literal e emotivo é bastante complexa. Uma mesma realidade
pode ser descrita com palavras que possuem impactos emotivos diferentes. É o caso, por
exemplo, de “burocrata”, “funcionário do governo” e “servidor público”. Pode-se dizer que o sig-
nificado literal destas três expressões é o mesmo, mas a sua carga emotiva é diferente. “Buro-
crata” tem uma conotação depreciativa, ao passo que “servidor público” traduz uma avaliação
positiva. Já a expressão “funcionário do governo” pode ser emotivamente neutra.
O contraste entre significado literal e emotivo pode ser observado neste exemplo que B.
Russell chamou de “verbos irregulares”:
“Eu sou firme;
Tu és obstinado;
Ele é um estúpido cabeça-dura”.
O uso da linguagem emotiva é perfeitamente legítimo. Contudo, quando se trata de raci-
ocinar de maneira objetiva deve-se privilegiar o discurso emotivamente neutro. Isto porque a
presença de elementos com carga emotiva facilmente leva a mal-entendidos. Por outro lado,
não se deve esquecer que, em certas áreas, como na Ética, onde aparecem termos como
“justo”, “injusto”, o discurso está longe de ser neutro.
de confusões e mal-entendidos. Mas isto não significa que estamos condenados a uma fala
vaga. O contexto ou o uso das palavras na sentença pode fornecer a precisão necessária.
e) Disputas verbais
É possível distinguir diferentes tipos de disputas ou controvérsias.
(1) Disputas reais ou genuínas. Existem quando há uma diferença autêntica de opinião entre
as partes. Uma parte acredita que determinada proposição, por exemplo, “O buraco na camada
de ozônio irá duplicar nos próximos trinta anos” é verdadeira, e outra parte acredita que ela é
falsa.
(2) Disputas meramente verbais. Ocorrem quando um lado acredita que determinada propo-
sição é verdadeira e outro lado acredita que outra proposição é falsa. As diferentes facções
não sustentam proposições opostas, mas proposições diferentes, embora possam consistir das
mesmas palavras. Por isso, em geral, essas disputas se devem à presença de ambiguidade.
Um exemplo clássico de disputa meramente verbal é descrito por W. James, e reproduzido por
I. Copi, p. 106-107. Aqui a expressão “andar em volta” é ambígua.
(3) Disputas aparentemente meramente verbais. Reúnem aspectos dos dois tipos anterio-
res, ou seja, a presença de um termo ou expressão ambígua e, além disso, há um “desacordo
na atitude”. Um exemplo apresentado por I. Copi, p. 110, diz respeito às divergências entre
USA e Rússia logo após a Segunda Guerra. Ambos concordavam que países democráticos de-
veriam ser contemplados com certos direitos, mas a sua concepção de país democrático não
era a mesma. Na opinião de muitos observadores tratava-se de uma disputa meramente verbal
que poderia ser resolvida por meio da definição de “país democrático”. Mas isto é um engano;
é que por trás da ambiguidade do termo “democrático” se escondia uma divergência profunda
de interesses e motivações éticas e políticas. Um acordo na definição deixaria o conflito intacto.
Uma disputa real pode ser resolvida mediante a apresentação de novos fatos ou maior
investigação. Na disputa meramente verbal a apresentação de novos fatos é completamente
inútil. O que se faz necessário é revelar a ambiguidade. No caso das disputas aparentemente
verbais o primeiro passo para a solução do conflito consiste na tomada de consciência da dife-
rença de “atitudes”, para depois procurar um acordo mediante negociação ou técnicas de con-
vencimento.
f) A definição
A doutrina da definição se constitui, hoje, num capítulo especializado da Filosofia da Ci-
ência. Limitaremos nossa exposição a alguns aspectos gerais e à apresentação da doutrina
clássica.
1) Aspectos gerais
Por definição, em sentido amplo, entende-se a explicação do significado de um termo
ou expressão. A definição se aplica a símbolos ou palavras, não a coisas. Mesmo uma defini-
ção como “Um triângulo é uma figura plana limitada por três linhas retas”, embora pareça refe-
rir-se ao objeto, é uma explicação da palavra “triângulo”.
Uma definição consiste de duas partes: o termo a ser definido, chamado definiendum,
e o termo ou termos usados para definir, chamado definiens.
Em correspondência com os múltiplos objetivos da definição, como eliminar a ambi-
guidade, aclarar o significado, aumentar o vocabulário, explicar teoricamente, os lógicos costu-
mam distinguir inúmeros tipos de definição.
Uma divisão simples e útil é a que distingue entre definições descritivas e estipulativas.
Chamamos descritiva a definição que descreve ou explica o significado que um termo já pos-
sui no uso da língua. São as definições encontradas no dicionário, como por exemplo, “poster-
gar significa adiar”. Por ser descritiva, tal definição pode ser verdadeira ou falsa.
Por definição estipulativa entendemos aquela que introduz um significado novo, ou que
altera um significado existente. Como exemplo do primeiro tipo temos a palavra “elétron”,
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quando foi usada pela primeira vez. A definição de “homem” como “animal racional”, ou a defi-
nição de “força” como “produto de massa e aceleração” são definições que alteram, ao menos
parcialmente, o significado de termos já existentes na língua. Uma definição estipulativa não é
verdadeira nem falsa; ela pode ser clara ou obscura, útil ou não.
não sustentar a conclusão. É o que nos pode mostrar o seguinte exemplo. Suponhamos que a
conclusão de um argumento seja “Os doadores de sangue deveriam ser pagos pela doação”.
Qual dentre as seguintes afirmações vale como razão que sustenta a conclusão:
(1) A administração serviço de doação de sangue é dispendiosa.
(2) As pessoas que normalmente doam sangue o fazem para ajudar outros.
(3) Há falta de doadores de sangue, e o pagamento iria animar mais pessoas a serem doadores.
A resposta correta é (3) porque ela sustenta a conclusão mostrando que, se for ofere-
cido pagamento pela doação de sangue, isto pode diminuir a falta de doadores. Mas (1) tam-
bém é relevante, no sentido de que ela tem certa importância para a recomendação de pagar
os doadores. Mas, se o serviço de doação de sangue já é dispendioso, então isto pode ser
uma razão para rejeitar a recomendação. Deste modo, (1) não sustenta a conclusão, antes
pesa contra a mesma.
O exemplo nos mostra que saber que a razão apresentada é relevante para a conclu-
são não basta para saber se ela sustenta conclusão. É preciso considerar também a maneira
pela qual ela tem importância para a conclusão. A base de sustentação oferecida pelas razões
pode ser mais ou menos firme. Além disso, também são diferentes as maneiras pelas quais as
razões sustentam as conclusões.
No momento de avaliar as razões que sustentam a conclusão são importantes as per-
guntas seguintes:
(1) As razões/evidências são relevantes para a conclusão?
(2) Se este for o caso, as razões/evidências oferecem uma boa base para aceitar a conclusão?
(3) Se a conclusão recomenda alguma ação ou providência, seria razoável agir com base nas
mesmas?
(4) É possível pensar em alguma outra evidência, não mencionada no argumento, capaz de en-
fraquecer ou reforçar a conclusão? Vejamos um exemplo:
“Foram desenvolvidas novas drogas capazes de combater a rejeição de órgãos trans-
plantados. No passado, a maioria de óbitos ocorridos pouco tempo após o transplante de cora-
ção eram devidas à rejeição. É provável, portanto, que as novas drogas elevem s taxas de so-
brevida dos transplantados de coração”.
É fácil de ver que as razões não apenas são relevantes para a conclusão, mas lhe dão uma
base firme de sustentação: se alguns pacientes que, de outro modo, teriam morrido, sobrevi-
vem, isto significa que a taxa de sobrevida é mais alta. Portanto, podemos considerar a conclu-
são bem fundamentada. (Para análise de textos mais extensos, veja apêndice 2, p. 39-41).
1) Falácias de relevância
O nome deriva do fato de, neste tipo de argumento, as premissas serem logicamente
irrelevantes para provar a conclusão. Se apesar disso tais argumentos possuem força de per-
suasão é porque a irrelevância lógica facilmente passa despercebida. São falácias de relevân-
cia, algumas das quais costumam ser identificadas pelo nome em latim:
(1) Argumentum ad baculum (recurso à força). Trata-se do emprego ou ameaça de emprego
da força, física ou moral, para levar as pessoas a aceitarem determinada conclusão. Exemplo:
“Não discuta comigo. Lembre-se de quem paga o seu salário”.
(2) Argumentum ad hominem (ataque pessoal). Consiste em desviar a atenção do assunto
discutido e voltá-la contra a pessoa. Aqui é possível distinguir diferentes formas.
(a) Falácia genética. Ataca-se uma tese ou instituição condenando sua origem: “Esta proposta
de ajuda aos estudantes tem por finalidade explorar os estudantes pobres, porque foi elabo-
rada por uma equipe formada por membros do professorado e da administração. Nenhum estu-
dante fez parte da equipe”.
(b) Argumento ofensivo. Ataca-se o caráter do adversário, não sua tese: “Em resposta ao ar-
gumento do cavalheiro só preciso dizer que, dois anos atrás, ele defendeu energicamente as
mesmas medidas às quais agora se opõe”.
(c) Circunstancial. procura destruir a credibilidade do adversário insinuando interesses ocul-
tos: “É claro que ele se opõe ao controle sobre os aluguéis; ele é dono de vários prédios de
apartamentos”.
(d) Envenenar o poço. Procura impedir a discussão atacando a credibilidade do adversário:
“Aqueles que discordam de mim quando afirmo que a humanidade está corrompida provam
que eles já estão corrompidos”.
(3) Argumentum ad ignorantiam (recurso ao desconhecimento). Em lugar de apresentar evi-
dências em favor de uma tese, recorre-se à falta de evidência em seu favor: “Existe vida inteli-
gente no espaço extraterrestre porque jamais alguém provou o contrário”.
Este argumento nem sempre é falacioso. Em contexto jurídico, supõe-se que alguém é
inocente enquanto não for provado culpado.
(4) Argumentum ad misericordiam. Para conseguir que determinada tese seja aceita, re-
corre-se à piedade ou compaixão: “Por favor, professor, me dê uma chance! Tive que acompa-
nhar meu pai ao médico”.
(5) Argumentum ad populum. Trata-se do apelo aos sentimentos ou emoções das multidões,
ou do ‘povo’: “Porque vocês são universitários, eu sei que lhes posso falar com seriedade a
respeito de assuntos difíceis”.
(6) Argumentum ad verecundiam (apelo à autoridade). Procura-se convencer através do re-
curso a uma instância que inspira ‘respeito’: “A ideia de financiar pesquisa com golfinhos é ridí-
cula. Nós a discutimos hoje durante o almoço, e o tesoureiro, o presidente e o diretor de pes-
soal todos foram unânimes a respeito de sua completa inutilidade”.
(7) Acidente. (Generalização ampla). Trata-se da aplicação de uma regra geral válida a um
caso atípico: “Já que andar a cavalo é um exercício saudável, o seu avô deveria praticá-lo com
frequência porque fará bem ao seu coração”.
(8) Acidente convertido (Generalização apressada). Consiste em usar uma evidência insufi-
ciente como base para uma conclusão geral: “Passei um mau bocado com meu antigo marido.
Aprendi com isso que os homens não prestam”.
(9) Falsa causa. Supõe-se uma conexão causal entre fenômenos por causa de sua proximi-
dade ou sucessão temporal: “As eleições levam as pessoas a gastarem mais. Os números são
claros. Os gastos sempre aumentam em ano de eleição”.
(10) Petitio principii. (Petição de princípio). Em lugar de oferecer provas para a sua conclu-
são, o argumento reafirma a conclusão sob outra forma; trata-se de argumentos circulares: “Mi-
lagres são impossíveis porque eles não podem ocorrer”.
(11) Pergunta complexa. É a forma interrogativa da petição de princípio: “Por que as mulheres
revelam mais interesse pela religião do que os homens? ”
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(12) Ignoratio elenchi (Desconhecimento de elenco). Procura-se provar uma conclusão que
não está em discussão: “O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois cada qual
pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os que são difíceis de contentar em qualquer
outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que tem” (R. Descartes).
(13) Rampa escorregadia (Mau precedente). Supõe-se que uma ação ou passo proposto irá
desencadear uma cadeia indesejável de fatos: “Hoje é o aborto; amanhã será o doente mental,
e depois os fracos e idosos, ou qualquer outra pessoa considerada indesejável”. Como mostra
o exemplo, este raciocínio é usado, muitas vezes, para se opor a mudanças na política ou em
outras áreas da vida social.
(14) Falsa analogia. Trata-se de tirar uma conclusão da comparação entre duas coisas incom-
paráveis: “O que é ensinado nesta escola deveria depender inteiramente do interesse dos alu-
nos; afinal, consumir conhecimento é igual a consumir qualquer outro produto, e o comprador
decide o que irá comprar”.
(15) Bifurcação (ou falso dilema). Considera-se uma distinção ou classificação como exclu-
siva ou exaustiva quando existem outras alternativas: “Ou você está do meu lado, ou você é
contra mim” “Temos que escolher entre a segurança e a liberdade. E faz parte da natureza dos
povos americanos assumir o risco da liberdade”.
(16) Falácia do apostador. Consiste na crença de que a jogada seguinte é influenciada de al-
guma forma pela anterior: Se uma moeda deu quatro vezes seguidas ‘coroa’, a possibilidade
seguinte não é 32 vezes maior de dar ‘cara’, mas é simplesmente uma em duas. “Eu concordo
com Afonso neste ponto; ele não pode estar sempre errado”
2) Falácias de ambiguidade
São as falácias decorrentes do significado duplo de palavras ou expressões. Esta ambi-
guidade pode apresentar-se sob diversas formas, donde resultam diferentes tipos de falácias.
(1) Equívoco. Consiste no emprego ambíguo de algum termo ou expressão ao longo de um
argumento. Exemplo: “Minhas sensações só perduram enquanto eu existo.
O que experimento são minhas sensações.
Portanto, o que experimento só existe enquanto eu existo.”
(2) Anfibologia. Certos enunciados, em virtude de sua construção gramatical, podem receber
diferentes interpretações. Exemplos clássicos são os oráculos gregos, como o famoso oráculo
de Delfos, dado a Creso, rei da Lídia: “Se Creso declarar guerra à Pérsia, destruirá um reino
poderoso”. Aqui o “reino poderoso” pode ser o da Pérsia, mas também o da Lídia.
(3) Ênfase. Aqui a ambiguidade resulta do acento ou ênfase em uma ou outra parte do enunci-
ado. Assim, o enunciado “Não devemos falar mal de nossos amigos” pode receber diferentes
interpretações. Pode significar que não devemos falar mal de nossos amigos, mas que seria
lícito fazer-lhes mal de outra forma; também pode significar que não devemos falar mal de nos-
sos amigos, mas que isto não vale em relação a outras pessoas.
(4) Composição. É possível distinguir duas formas desta falácia. Num primeiro caso se infere
das partes para o todo: “Todas as partes desta máquina são leves. Portanto, esta máquina é leve”.
Ou então, se pode inferir dos indivíduos para a coleção:
“Para cada coisa houve um instante em que ela não existiu. Portanto, houve um ins-
tante em que todas as coisas não existiram”.
(5) Divisão. Consiste no processo inverso do anterior. Também aqui são possíveis duas moda-
lidades. Numa primeira variante há uma transição indevida do todo para as partes:
“Esta máquina é pesada. Portanto, as partes desta máquina são pesadas”.
Na outra modalidade temos uma inferência da coleção para os seus membros:
“Os indígenas americanos estão desaparecendo.
Aquela pessoa é um indígena americano.
Portanto, aquela pessoa está desaparecendo.
14
c) Falácias especulativas
Trata-se de erros ou equívocos que não afetam a comunicação ordinária,( por exemplo ,
quando alguém pergunta “O que você está pensando?”), mas o pensamento especulativo (por
exemplo, quando perguntamos “O que é [ou, em que consiste] o pensamento?”. Embora te-
nham relação com a lógica da língua, tais falácias não se enquadram na lógica formal.
É possível distinguir diferentes tipos de falácias. As mais comuns se enquadram nos se-
guintes grupos.
(1) Falácias de sentido. Porque um conjunto de palavras se apresenta como uma sen-
tença, supomos que também deve ter um sentido, ser uma afirmação. Exemplos: “Promessas
devem ser cumpridas”; (compare com “Você deve ser mais pontual”);“Cada coisa é idêntica
consigo mesma”; “São cinco horas no sol”.
(2) Falácias de descrição. Uma palavra ou expressão que não descreve é interpretada
por analogia com outra que descreve. Sentenças com Verbos psicológicos (‘pensar’, entender’
compreender’), quando empregados na primeira pessoa do singular, não são descrições.
Exemplos: “Agora entendi!” “Espero que ele venha”.
(3) Falácias de referência. Um substantivo nos leva a procurar algo que corresponda a
ele. Assim, uma palavra que não possui referente é assimilada a outra que possui referente.
Exemplos: “Todas as palavras tem sentido”. (Compare com “Todas as árvores tem folhas”).
Cabe aqui também o exemplo do paradoxo do “monte de areia”, (apresentado por S. Schwartz,
em Uma breve história da filosofia analítica, p. 319-20). Suponha-se que temos um monte de
areia; formado por n grãos de areia (estabeleça um número para “n”); se removermos um grão
de areia, ainda teremos um monte de areia. Simbolicamente podemos representar isto assim:
“n-1”. Podemos repetir este processo (de remover um grão de areia por vez) para chegarmos a
“n-n”; mas ainda teríamos um monte de areia. De acordo com o autor, “ainda não foi proposta
uma resolução bem-sucedida”. Você tem uma solução? (Problema semelhante aparece no
exemplo do “navio de Teseu”, apresentado pelo mesmo autor (Veja, p. 231).
(4) Falácias de essência. Termos gerais como “jogo”, “linguagem”, “proposição” “regra” são
interpretados por analogia com nomes próprios, como ‘Napoleão Bonaparte ’. Assim como um
nome próprio designa uma pessoa individual, supomos também que deve haver algo comum a
tudo que chamamos de ‘jogo’, ‘linguagem’, ‘proposição, ‘regra’.
2. LÓGICA FORMAL
a) Tipos de proposições
1) Proposições categóricas, como, por exemplo, “A classe dos porcos não é um
porco”. Aqui temos uma proposição simples que estabelece uma relação entre classes, repre-
sentadas pelos termos da proposição, o sujeito do qual se predica algo, e o predicado, aquilo
que se predica do sujeito.
2) Proposições disjuntivas, como por exemplo, “Amanhã irei estudar Lógica ou Histó-
ria da Filosofia ”. Trata-se de uma proposição composta e a relação entre as proposições com-
ponentes é a disjunção.
3) Proposições condicionais ou hipotéticas, como por exemplo, “Se o ser humano não
mudar, acabará por destruir o planeta”. Também aqui temos uma proposição composta, e a re-
lação entre as proposições componentes é o condicional.
15
b) As proposições categóricas
1) Qualidade e quantidade
(a) A qualidade de uma proposição consiste no fato de ela ser afirmativa, (afirma a in-
clusão entre classes), ou negativa, (afirma a exclusão entre classes).
(b) A quantidade de uma proposição consiste no fato de a afirmação de inclusão ou ex-
clusão entre classes ser total, (refere-se a todos os membros da classe), ou ser parcial, (refere-
se apenas a uma parte dos membros da classe).
3) Representação simbólica das formas típicas. Para tanto existem os seguintes sím-
bolos convencionais:
(a) A (Afirmativa universal).
(b) I (Afirmativa particular).
(c) E (Negativa universal).
(d) O (Negativa particular).
Para fins de memorização pode-se pensar nas formas verbais “AfIrmo” e “nEgO”.
4) Distribuição
Diz-se que um termo se encontra distribuído se a proposição em que ele comparece
se refere a todos e cada um dos membros da classe designada pelo termo. Quando a proposi-
ção se refere apenas a uma parte dos membros da classe designada por um termo, diz-se que
o termo é não-distribuído.
A distribuição ou não de um termo depende de dois fatores:
(1) a natureza da proposição (se ela é afirmativa ou negativa universal ou particular);
(2) a função do termo na proposição (se ele é sujeito ou predicado).
Assim, numa proposição afirmativa universal, como “Todos os alunos são estudiosos”, o
sujeito é claramente distribuído, porquanto a proposição se refere a todos os membros da
classe dos “alunos”; já o predicado é não-distribuído, uma vez que a proposição não se refere a
todos e cada um dos membros da classe dos “estudiosos”. A partir daqui se entende que numa
proposição afirmativa particular ambos os termos são não-distribuídos.
Numa proposição negativa universal, como “Nenhum aluno é estudioso”, ambos os ter-
mos são distribuídos, ou seja, a proposição afirma que todos e cada um dos membros da
classe dos “alunos” está fora de toda a classe dos “estudiosos”, e que todos e cada um dos
membros da classe dos “estudiosos” está fora de toda a classe dos “alunos”. Uma proposição
negativa particular, como “Alguns alunos não são estudiosos”, refere-se apenas a uma parte da
classe dos alunos, razão porque o sujeito é não-distribuído. Mas ela se refere a toda a classe
dos “estudiosos”, ao afirmar que parte da classe dos “alunos está fora de toda a classe dos “es-
tudiosos”; portanto, o predicado é distribuído.
Resumindo, podemos dizer que são distribuídos os sujeitos das universais e os predica-
dos das negativas; os demais termos são não-distribuídos.
5) O quadro de oposições
(a) O quadro de oposições. Proposições categóricas, que tenham o mesmo sujeito e o
mesmo predicado, podem diferir apenas na quantidade ou apenas na qualidade, ou em ambas.
Usando o termo “oposição” para designar tais diferenças, as relações possíveis entre as quatro
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(c) Outras inferências imediatas. Ao lado das inferências, baseadas no quadro de oposições,
são possíveis outras inferências igualmente imediatas. Dentre estas distinguimos as seguintes.
(a) Conversão. Consiste na permuta de sujeito e predicado. A conversão simples é vá-
lida para as proposições E e I. Já as proposições A admitem apenas uma conversão acidental,
ou seja, além da permuta, é preciso alterar a quantidade da proposição. As proposições O nor-
malmente não admitem nenhum tipo de conversão.
(b) Obversão. Consiste na mudança da qualidade da proposição e substituição do predi-
cado pelo seu complemento. (Complemento de um termo é o conjunto de todos os elementos a
que o termo não se refere. Assim, o complemento de “aluno” é “não-aluno”). A obversão é vá-
lida para os quatro tipos de proposição.
(c) Contraposição. Consiste na substituição do sujeito pelo complemento do predicado e
a substituição do predicado pelo complemento do sujeito. As proposições A e O admitem uma
contraposição simples. As proposições E admitem apenas uma contraposição acidental; e as
proposições I não admitem nenhum tipo de contraposição.
Regra II: O termo médio deve estar distribuído pelo menos uma vez. A função do termo
médio é estabelecer uma relação necessária entre os termos extremos. Isto ocorre somente se
pelo menos um dos termos extremos estiver relacionado com a totalidade da classe designada
pelo termo médio. Caso contrário, poderia acontecer que cada um dos termos extremos esti-
vesse relacionado cada qual com uma parte da classe designada pelo termo médio, e, por-
tanto, não haveria uma relação necessária entre os mesmos, ou seja, a conclusão não segue
das premissas. E a referida relação com a totalidade da classe designada pelo termo médio so-
mente ocorre se este estiver distribuído pelo menos uma vez. Consideremos um exemplo:
Todos os filósofos são estudiosos.
Todos os matemáticos são estudiosos.
Portanto, todos os matemáticos são filósofos.
Aqui o termo médio “estudiosos” não está distribuído nenhuma vez. Isto significa que a classe
dos “filósofos” pode relacionar-se com uma parte da classe dos estudiosos, e a classe dos ma-
temáticos, com outra parte da classe dos estudiosos. Por esta razão não há uma relação ne-
cessária entre a classe dos filósofos e aquela dos matemáticos.
Regra III: Um termo distribuído na conclusão também deve estar distribuído nas premis-
sas. Ao distribuir um termo na conclusão, o silogismo se refere a toda a classe designada por
este termo, enquanto, o mesmo termo, não estando distribuído na premissa, refere-se apenas
a uma parte da referida classe. É o que acontece neste exemplo:
Todos os cães são mamíferos.
Nenhum gato é cão
Portanto, nenhum gato é mamífero.
Aqui o termo “mamífero” está distribuído na conclusão, mas não está distribuído na premissa,
ou seja, a conclusão afirma mais do que as premissas.
Regra IV: Nenhum silogismo pode ter duas premissas negativas. No caso de duas premis-
sas negativas, a premissa maior afirma a exclusão, total ou parcial, entre as classes designa-
das pelo termo médio e o termo maior; e a premissa menor afirma a exclusão, total ou parcial,
entre as classes designadas pelo termo médio e o termo menor. Deste modo não resulta uma
relação necessária entre termo maior e menor, como se vê neste exemplo:
Nenhum político é sincero.
Alguns professores não são sinceros.
Portanto, alguns professores não são políticos.
Pelo fato de as classes dos “políticos” e dos “professores” estarem fora da classe dos “since-
ros” não segue nenhuma relação necessária entre as duas primeiras.
Regra V: Se uma das premissas for negativa, a conclusão não pode ser afirmativa. Uma
conclusão afirmativa indica que há uma inclusão total ou parcial, entre as classes do termo
maior e menor. Mas esta é uma consequência que decorre somente do fato de ambas as clas-
ses referidas estarem incluídas, total ou parcialmente, em uma terceira, que é a classe desig-
nada pelo termo médio. Isto que dizer que ambas as premissas deveriam ser afirmativas. Veja-
mos um exemplo:
Alguns filósofos não são atletas.
Todos os tenistas profissionais são atletas.
Portanto, todos os tenistas profissionais são filósofos,
Se existe uma inclusão entre “atletas” e “tenistas profissionais”, como afirma a premissa menor,
e uma exclusão (parcial) entre “atletas” e “filósofos”, como afirma a premissa maior, não é pos-
sível concluir que haja uma inclusão, total ou parcial, entre “tenistas profissionais” e “filósofos”,
como afirma a conclusão.
Regra VI: Um silogismo com duas premissas universais não pode ter uma conclusão par-
ticular. Um silogismo que infringe esta regra comete a “falácia existencial”, ou seja, de premis-
sas que não afirmam a existência de membros de uma classe extrai a conclusão que afirma a
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existência de membros em uma classe, ou seja, a conclusão afirma mais do que as premissas.
Exemplo:
Todo os animais de estimação são animais domésticos.
Nenhum unicórnio é animal doméstico.
Portanto, alguns unicornes não são animais de estimação.
Pela interpretação moderna do conteúdo existencial, este silogismo é inválido porque
extrai uma conclusão particular de premissas universais. Adotando a interpretação clássica do
conteúdo existencial, o silogismo é válido, já que respeita todas as demais regras.
(a) Recusar a premissa disjuntiva. Trata-se de mostrar que a disjunção é incompleta e que há
uma terceira alternativa. Assim, no exemplo acima, é possível mostrar que, além dos estudan-
tes que simplesmente não gostam de estudar e daqueles que já gostam de estudar, há os indi-
ferentes. Para estes o estímulo pode ser necessário ou útil.
(b) Mostrar a falsidade de uma das premissas. Consideremos o exemplo:
Se a tarifa proposta produz escassez, ela será prejudicial.
Se a tarifa proposta não produzir escassez, ela será inútil.
Ora, a tarifa produzirá ou não produzirá escassez.
Portanto, a tarifa proposta ou será prejudicial ou será inútil.
Aqui seria possível contra-argumentar dizendo que, mesmo no caso de a tarifa produzir escas-
sez, isto não será prejudicial, pois, a escassez estimularia a produção nacional, e, desta ma-
neira, haveria de desenvolver o mercado de trabalho e a indústria nacional. Ou seja, mostra-se
que uma das alternativas é falsa.
(c) A formulação de um contra-dilema. Trata-se de formular novo dilema, mas com conclusão
contrária àquela do dilema original. Um exemplo clássico é o da mãe ateniense que tenta con-
vencer o filho a não entrar na política, argumentando desta forma:
Se dizes o que é justo, os homens te odiarão.
Se dizes o que é injusto, os deuses te odiarão.
Ora, terás que dizer uma ou outra coisa.
Portanto, serás odiado.
O filho responde com outro dilema:
Se digo o que é justo, os deuses amar-me-ão.
Se digo o que é injusto, os homens amar-me-ão.
Ora, terei que dizer uma ou outra coisa.
Portanto, serei amado.
Embora seja uma maneira engenhosa de enfrentar um dilema, não se trata de uma refutação.
As conclusões não são contraditórias, mas simplesmente opostas.
a) A álgebra de classes
G. Boole (1815-1864) foi o primeiro a demonstrar a possibilidade de usar fórmulas algé-
bricas para exprimir relações lógicas. Em sua obra, Análise matemática da lógica como ensaio
para um cálculo de lógica dedutiva (1847), desenvolveu um cálculo puramente algébrico a par-
tir de certo número de símbolos e operações claramente definidas. Embora a álgebra, assim
desenvolvida, fosse abstrata e susceptível de diferentes interpretações, foi interpretada, num
primeiro momento, como álgebra de classes. Ou seja, como tradução da lógica silogística em
uma teoria de equações.
1) A álgebra
(a) Com uma lista de símbolos (cuja relação completa omitimos), é possível representar as
quatro_ proposições categóricas:
A: 𝜶𝜷 = 𝟎 (O produto de α e do complemento de β é vazio, ou seja, não há nada que seja α e
não-β).
E: αβ = 0 (O produto de α e β é vazio, ou seja, não há nada que seja membro de α e também
de β).
I: αβ ≠ 0 (O produto de α e β não é vazio, ou seja, pelo menos um membro de α é também
membro_ de β).
O: αβ ≠ 0 (O produto de α e do complemento de β não é vazio, ou seja, pelo menos um mem-
bro de α não é membro de β).
24
(b) Além da lista de símbolos, o cálculo necessita de axiomas ou regras (que também
omitimos aqui) que constituirão as operações válidas no cálculo.
(c) A validade dos silogismos. Os silogismos categóricos válidos pertencem todos a dois
tipos: aqueles que contêm apenas proposições universais e aqueles que contêm ao menos
uma proposição particular. Por meio dos procedimentos de conversão, obversão e contraposi-
ção_ é possível
_ mostrar
_ que os silogismos do primeiro tipo são todos equivalentes_ à forma:
αβ = 0, βγ = 0 .. . αγ = 0; os do segundo tipo são equivalentes à forma: αβ ≠ 0, βγ = 0... αγ ≠ 0.
A validade de ambas estas formas pode ser demonstrada aplicando os axiomas ou
equivalências.
b) Os diagramas de Venn
Em sua obra “Lógica simbólica” (1881), o matemático inglês J. Venn introduziu o uso de
diagramas para representar relações entre classes. Por meio desta técnica é possível tornar
evidente a validade ou não de argumentos silogísticos.
1) Simbolização
(a) Representação de uma ou duas classes. Se um círculo representa uma classe dada, α, en-
tão a área fora do círculo representa a classe α. (Veja figura 1). Se dois círculos, parcialmente
superpostos, representam duas classes, α e β, então as classes representadas são aquelas da
figura 2.
_ - -
_
Fig.1 α α Fig. 2 αβ αβ αβ αβ
α β
(b) Representação das quatro proposições categóricas. Usando círculos para representar as
classes designadas pelo sujeito e pelo predicado, é possível diagramar as quatro proposições
categóricas. Para indicar uma classe vazia usamos o sombreado ou hachurado; e para indicar
uma classe com ao menos um membro, usamos uma cruz.
A (Todo α é β) E (Nenhum α é β)
α β α β
α β α β
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(c) Representação do argumento. Considerando que num silogismo ocorrem três termos, serão
necessários três círculos parcialmente superpostos para representar um argumento. Desta
forma, teremos as seguintes classes:
-
-- αβϒ - -
α αβϒ αβϒ β
αβϒ
- -
αβϒ
αβϒ
--
αβϒ
ϒ
2) O teste de validade do silogismo. Para testar a validade de um silogismo por meio dos dia-
gramas procede-se da seguinte maneira:
(1) Traçar os círculos e assinalar a correspondência.
(2) Diagramar as premissas, começando pelas universais, hachurando ou inserindo uma
cruz, conforme o caso.
(3) Verificar se a conclusão foi diagramada. Se este for o caso, o silogismo é válido. Po-
rém, se as premissas não decidirem claramente que área deve ser assinalada com uma cruz,
ou se a conclusão simplesmente não foi diagramada, o silogismo será inválido. Exemplos:
3) Significado do uso dos diagramas. A importância dos diagramas de Venn pode ser avali-
ada com base nas seguintes vantagens.
(1) Método claro de representação. Ao transpor a relação de inclusão ou exclusão entre
classes para uma relação puramente espacial, os diagramas possibilitam uma leitura pura-
mente mecânica desta relação.
(2) Método mecânico de testar a validade de um argumento. Ao traduzir o argumento
numa dimensão puramente espacial, os diagramas dispensam qualquer reflexão no momento
de avaliar a validade do argumento.
Revela-se, aqui, uma das características da lógica moderna ou simbólica: porque ela é
totalmente formalizada, não mais exige reflexão, mas apenas habilidade para calcular. Chega-
se, assim a uma situação paradoxal: tradicionalmente apresentada como recurso para desen-
volver a habilidade do raciocínio, a lógica parece, antes, dispensar qualquer raciocínio.
26
c) O cálculo proposicional
2) A lógica simbólica
(a) Constantes e variáveis na lógica tradicional. Já em Aristóteles encontramos o uso de
símbolos para representar o sujeito e o predicado de uma proposição. Mas as constantes lógi-
cas continuam sendo expressas por meio de palavras, como “não”, “todos”, “alguns”.
(b) Constantes e variáveis na lógica moderna. Já na álgebra de Boole tanto as variáveis
quanto as constantes são expressas em símbolos não interpretados. É a completa formaliza-
ção, ou seja, já não temos mais sentenças e argumentos concretos, mas apenas formas de
proposições e argumentos. Por causa deste abandono completo da linguagem comum, a lógica
moderna é chamada de “lógica simbólica”.
4) O cálculo proposicional.
_ De modo geral, na lógica moderna, os valores atribuídos
às variáveis já não são classes, mas proposições ou sentenças, razão porque se fala de cál-
culo proposicional ou sentencial. As principais razões para esta preferência podem ser explici-
tadas da seguinte maneira:
(1) Maior operacionalidade. Uma única letra para uma proposição inteira é mais simples e de
manejo mais fácil do que uma equação de Boole.
(2) Maior abrangência e clareza. Certas sentenças da língua normal, como “chove”, oferecem
grandes dificuldades para uma tradução em termos de classes. Já no cálculo proposicional são
representadas por uma única letra.
(3) Maior conformidade com as tendências da filosofia contemporânea. Influentes lógicos e filó-
sofos contemporâneos, como Frege, Russell e Wittgenstein concordam em que as palavras só
possuem significado dentro da proposição, sendo esta a unidade de significado.
(2) A seguir assinalamos os valores para a constante, tendo como referência os valores das
proposições componentes.
Deste modo chegamos às seguintes definições:
Negação Conjunção Disjunção Condicional Bicondicional
p ~ p p q p . q p q p v q p q p ↄ q p q p ≡ q
v FV V V V V V V V V V V V V V V V V V V V V
F VF V F V F F V F V V F V F V F F V F V F F
F V F F V F V F V V F V FV V F V F F V
F F F F F F F F F F F F FV F F F F V F
O valor de cada constante pode ser expresso do seguinte modo:
(a) A negação de p possui o valor contrário de p.
(b) A conjunção é verdadeira somente se ambas as proposições forem verdadeiras.
(c) A disjunção é falsa somente se ambas as proposições forem falsas.
(d) O condicional é falso somente se o antecedente for verdadeiro e o consequente falso.
(e) O bicondicional somente é verdadeiro se as proposições tiverem o mesmo valor.
2) O uso da tabela-verdade
(c) Prossegue-se até obter a conclusão do argumento. Se isto for possível, o argumento será
válido. Isto porque, agora, chegamos à mesma conclusão, usando apenas regras válidas.
Vejamos um exemplo:
Se a presidente for candidata, ela será reeleita.
Se ela for reeleita, terá o apoio de outros partidos.
Se ela tiver o apoio de outros partidos, terá também o apoio de outras lideranças.
Ora, a presidente não terá o apoio de outras lideranças.
Ou a presidente será candidata, ou o partido apresentará outro candidato.
Portanto, o partido apresentará outro candidato.
Usando letras maiúsculas para cada uma das proposições, e observando as normas
acima, teremos a seguinte prova formal do argumento:
1. A ﬤB
2. B ﬤC
3. C ﬤD
4. ~ D
5. A v E / .. . E
6. A ﬤC 1, 2, S.H.
7. A ﬤD 6, 3, S.H.
8. ~ A 7, 4, M.T.
9. E 5,8, S.D.
Podemos dizer que 6,7,8,9 são instâncias substitutivas de formas elementares válidas.
Deste modo, podemos definir a prova formal para determinado argumento como “sequencia de
enunciados, cada um dos quais ou é uma premissa do argumento, ou segue de enunciados
precedentes por meio de um argumento elementar válido, e isto de tal modo que o último enun-
ciado da sequencia seja a conclusão do argumento cuja validade está sendo provada”.
(Os números indicam a sequencia com que os valores foram preenchidos). Observamos
que há uma contradição: a proposição Q é ao mesmo tempo verdadeira (coluna 8) e falsa (co-
luna 9). Concluímos que o argumento é válido.
i) Sistemas dedutivos
Do ponto de vista puramente lógico um sistema dedutivo ´pode ser considerado como
um único argumento, cujas premissas são os axiomas, e os teoremas representam as conclu-
sões, derivadas dos axiomas. Também aqui o que interessa, do ponto de vista lógico, é a vali-
dade das inferências. Portanto, o aspecto mais importante de um sistema dedutivo é a necessi-
dade ou o rigor com que são provados sues teoremas.
(b) Sistema dedutivo formal. Se num sistema dedutivo os teoremas não forem deduzi-
dos rigorosamente dos axiomas, o resultado, ainda que possa ser verdadeiro, não corresponde
ao objetivo da sistematização. É o que acontece com a Geometria de Euclides. Sua obra con-
tém sérios erros, Paradoxalmente, tais erros surgiram porque Euclides “sabia demais”, ou seja,
ao trabalhar com termos da linguagem natural, termos como “ponto”, “linha”, “plano” etc., ele
usou, sem perceber, em sua demonstrações, não apenas o que era permitido pelos axiomas,
mas também “intuições” provenientes de sua familiaridade com os dados da geometria.
Com o intuito de garantir maior rigor dedutivo procurou-se reduzir ao mínimo ou eliminar
por completo a referida familiaridade com a área de conhecimento a ser sistematizada. No
caso da Geometria, isto significa que se deve abstrair do significado ordinário das palavras
como “ponto”, “linha”, etc. E a maneira de garantir essa abstração é substituir os referidos ter-
mos por símbolos arbitrários. O resultado é o que se chama sistema dedutivo formal, isto é,
um sistema cujos termos primitivos são símbolos arbitrários, e cujos axiomas e teoremas são
meras fórmulas.
O desenvolvimento puramente formal de um sistema dedutivo, além de permitir maior
rigor, oferece a vantagem da generalidade, isto é, os símbolos usados e as fórmulas podem
receber diferentes interpretações. Assim, por exemplo, um sistema formal que organiza os co-
nhecimentos de Astronomia poderia mostrar-se útil também para a Física nuclear.
(c) Sistemas logísticos. Os sistemas dedutivos, descritos até aqui, embora possam ter
certo grau de rigor, ainda usam em seu desenvolvimento a lógica ‘ordinária’, sem especificar o
que seja esta lógica. Isto significa que tais sistemas contêm pressupostos não claramente ex-
plicitados. Consequentemente, tais sistemas ainda não possuem rigor completo. Na prática isto
significa que a lista de axiomas deverá ser complementada por uma lista de regras de infe-
rência ou formas de argumento válidas.
Contudo, seria assistemático, e provavelmente impossível, listar todas as regras da ló-
gica, ou todos os modos de inferência válidos. Torna-se necessário, portanto, construir um sis-
tema dedutivo da própria lógica, ou seja, um sistema cujo objeto seja a própria lógica. É o
que se chama axiomatização da lógica, ou então, um sistema logístico.
Um sistema logístico se caracteriza pelos seguintes elementos:
(1). Uma lista de símbolos primitivos.
(2). Um critério puramente formal para distinguir sequências de símbolos em “fórmulas bem for-
madas e outras que não o são.
(3) Uma lista de “fórmulas bem formadas” assumidas como axiomas.
(4). Um critério puramente formal para diferenciar sequencias de fórmulas bem formadas em
argumentos válidos e inválidos.
(5). Um critério puramente formal para distinguir entre teoremas e não-teoremas.
É possível construir diferentes sistemas logísticos como teorias das diferentes partes da
lógica. Os mais simples são aqueles que formalizam lógica dos enunciados compostos por fun-
ção-verdade, ou seja, os cálculos proposicionais.
3) Propriedades de um sistema dedutivo
Há um certo número de características básicas que todo sistema dedutivo deve apre-
sentar. Na medida em que tais exigências são feitas a partir de “fora” do sistema, fala-se de
exigências meta-lógicas, ou meta-teoréticas.
(a) Coerência (ou consistência). Diz-se que um sistema é coerente ou consistente se
ele não inclui contradições, isto é, não permite a dedução de uma fórmula e ao mesmo tempo
também a negação desta fórmula. Esta característica é fundamental, porque um sistema incoe-
rente é sem valor. Isto porque fórmulas contraditórias resultam em proposições contraditórias,
34
e estas não podem ser todas verdadeiras. Consequentemente, tal sistema não pode constituir
a sistematização de conhecimentos, já que esses são expressos apenas em proposições ver-
dadeiras.
(b) Economia (ou independência dos axiomas). Diz-se que os axiomas são indepen-
dentes quando nenhum deles pode ser derivado de outro. Quando um axioma puder ser deri-
vado de outro, diz-se que o sistema é redundante. A redundância não invalida o sistema, mas o
torna menos elegante. O ideal, portanto, é que o sistema tenha apenas o número mínimo ne-
cessário de axiomas.
(c) Completude expressiva ou funcional. Ao construir um sistema dedutivo, normal-
mente, temos em vista alguma interpretação particular, ou seja, pensamos em formalizar os co-
nhecimentos de uma determinada área. Isto significa que o sistema deve possuir o número su-
ficiente de símbolos para representar todos os conceitos e proposições significativas perten-
centes à área em questão. Se este for o caso, diz-se que o sistema possui completude expres-
siva ou funcional.
(d) Completude dedutiva. De modo geral, diz-se que um sistema possui completude
dedutiva se ele possui o número suficiente de axiomas e regras de inferência para provar a
validade de todas as fórmulas desejadas. Portanto, um sistema será dedutivamente completo
em relação a certa área de conhecimento se todas as fórmulas que, na interpretação desejada, tra-
duzem proposições verdadeiras, puderem ser provadas como teoremas do sistema.
Trata-se agora de examinar até que ponto os elementos de lógica simbólica, anterior-
mente estabelecidos, (os símbolos e as regras de inferência) correspondem às exigências de
um sistema dedutivo, no caso, um sistema logístico. Examinaremos apenas dois aspectos: a
completude dedutiva e a completude expressiva.
Um objetivo natural de quem constrói um cálculo proposicional é que por meio dele se
possa provar a validade de todos os argumentos cuja validade pode ser provada por meio das
tabelas-verdade. Como veremos, neste sentido, as regras de inferência, acima estabelecidas,
são insuficientes.
1) Regra de substituição. Consideremos o argumento de forma: A . B/ ... B.
Testado por meio das tabelas-verdade, este argumento se mostra válido. Mas nenhuma
das regras de inferência estabelecidas permite provar sua validade. Precisamos, portanto, de
alguma regra adicional.
Considerando que apenas nos interessamos compostos por função-verdade, podemos
estabelecer o seguinte princípio: se qualquer parte de um enunciado composto for substituída
por uma expressão logicamente equivalente, o valor-verdade do enunciado resultante será o
mesmo do enunciado original. Este princípio é chamado regra de substituição. De acordo
com este princípio é possível estabelecer um conjunto de equivalências lógicas cuja validade
pode ser comprovada pelas tabelas-verdade. Cada uma dessas equivalências possui um nome
convencional e uma correspondente abreviação. A numeração indica que se trata de regras de
inferência acrescentadas à nossa lista anterior.
Com o auxílio destas regras adicionais é fácil provar a validade do argumento acima:
1. A . B / ... B
2. B . A 1, Com.
3. B 2, Simp.
(Observação. Há uma diferença importante entre as nove primeiras regras estas últi-
mas. As primeiras somente podem ser aplicadas a linhas inteiras do argumento, ao passo que
as últimas podem ser aplicadas tanto a linhas inteiras quanto a partes das mesmas).
1. (A v B) ( ﬤC . D)
2. (D v E) ﬤF / ... A ﬤF
3. A
4. A v B 3, Ad.
5. C . D 1,4, M.P.
6. D . C 5, Com.
7. D, 6, Simpl.
8. D v E 7, Ad.
9. F 2, 8, M.P.
10. A ﬤF 3-9, P.C.
Esta prova oferece a vantagem de, em geral, ser mais breve do que se usássemos ape-
nas as 19 regras.
Consideremos o argumento: A
... B v (B ﬤC)
Uma prova indireta deste argumento se apresenta assim:
1. A /.. . B (B ﬤC)
2. ~ [(B v (B ﬤC)] P. I.
3. ~ [B v (~B v C)] 2, Impl.
4. ~ [(B v ~B) v C 3, Assoc.
5. ~ (B v ~B) . ~C 4, De M.
6. ~ (B v ~B) 5, Simpl.
7. ~B . ~~B 6, De M.
O conjunto das dezenove regras, mais as regras da prova condicional e da prova indi-
reta, constitui um método de dedução completo, isto é, qualquer argumento cuja validade pode
ser estabelecida por meio das tabelas-verdade também pode ser provado como válido com o
auxílio destas regras.
1) Simbolização
(b) Quantificação
Como quantificador usaremos a letra x.
Exemplo:
Todos os homens são mortais.
Sócrates é humano.
Portanto, Sócrates é mortal.
1. (x) [ Hx ﬤMx]
2. (x) [Gx ﬤHx] / .. .(x) [Gx ﬤMx]
3. Hy ﬤMy 1, EU
4. Gy ﬤHy 2, EU
5. Gy ﬤMy 4,3, S.H.
6. (x) [Gy ﬤMx] 5, GU
(Obs.: “y”: qualquer indivíduo arbitrariamente escolhido).
CONCLUSÕES
Um juízo, ainda que superficial, a respeito da lógica deverá ter presente certos dados,
alguns dos quais emergiram ao longo de nosso estudo.
Agora podemos precisar a falácia no argumento: mesmo que tenham aparecido algu-
mas doenças novas, e alguma doenças antigas se tornaram mais comuns nos últimos trinta
anos, não segue que a população é menos saudável do que há trinta anos, porque as pessoas
podem, por um longo período de sua vida gozar de boa saúde, antes de serem vítimas das do-
enças citadas. A falácia consiste em tirar uma conclusão com base em evidência insuficiente.
Se o argumento é falacioso, não quer dizer que a conclusão é necessariamente falsa.
1. LÓGICA E LINGUAGEM......................................................................................................1
1.1. Aspectos e elementos fundamentais da argumentação..............................................1
a) Conceito e significado da lógica................................................................................1
b) O argumento. Premissas, conclusões e suposições.................................................2
c) Argumentos e não-argumentos.................................................................................4
d) Dedução e indução...................................................................................................5
e) Verdade, validade e consistência.............................................................................5
1.2. O meio linguístico.................................................................................................6
a) Forma e função do discurso......................................................................................6
b) Significado literal e emotivo.......................................................................................6
c) Tipos de acordo e desacordo....................................................................................7
d) Ambiguidade e vagueza............................................................................................7
e) Disputas verbais........................................................................................................8
f) A definição .................................................................................................................8
1.3. Avaliação de argumentos...............................................................................................10
a) Avaliação da verdade das razões e conclusões......................................................10
b) Avaliação da sustentação das conclusões...............................................................10
c) Identificação das falácias em argumentos; falácias não-formais..............................11
1) Falácias de relevância..................................................................................12
2) Falácias de ambiguidade..............................................................................13
3) Falácias especulativas..................................................................................14
2. A LÓGICA FORMAL............................................................................................................14
2.1. A lógica silogística..........................................................................................................14
a) Tipos de proposições...............................................................................................14
b) as proposições categóricas......................................................................................15
1) Qualidade e quantidade; a forma típica do silogismo...................................15
2) Distribuição...................................................................................................15
3) O quadro de oposições; inferências imediatas.............................................15
4). Outras inferências imediatas.........................................................................16
c) O problema do conteúdo existencial.........................................................................16
d) O silogismo categórico de forma típica.....................................................................17
1) A forma típica do silogismo...........................................................................17
2) Modo e figura; a forma do silogismo.............................................................18
3) Formas válidas do silogismo; regras do silogismo válido.............................18
e). Outras formas de argumento....................................................................................20
f). Uma técnica para elaborar silogismos válidos...........................................................22
2. 2. A lógica simbólica...........................................................................................................23
a) A álgebra de classes.................................................................................................23
b) Os diagramas de Venn...........................................................................................,,24
c) O cálculo proposicional.............................................................................................26
d) Símbolos para o cálculo proposicional......................................................................26
e) Constantes lógicas; sua definição.............................................................................27
f) Regras de inferência (I): as tabelas-verdade.............................................................28
g) Regras de inferência (II): a prova formal de validade...............................................30
h) A técnica da tabela-verdade abreviada ....................................................................31
i) Sistemas dedutivos....................................................................................................32
j) Completude dedutiva..................................................................................................34
l) Completude expressiva. A quantificação...................................................................36
CONCLUSÕES.........................................................................................................................38
Apêndice 1. A árvore porfiriana.................................................................................................39
Apêndice 2: Exemplos de análise de uma argumentação A árvore porfiriana.........................39
Apêndice 3: Formas válidas de silogismo.................................................................................1