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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPIRITO SANTO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS


DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS E LETRAS
BACHARELADO LETRAS/LIBRAS

ELIANA FIRMINO BURGARELLI RIBEIRO

OS 10 MANDAMENTOS EM LIBRAS ATRAVESSADOS POR DIFERENTES


VOZES

VITÓRIA/ES
2017
ELIANA FIRMINO BURGARELLI RIBEIRO

OS 10 MANDAMENTOS EM LIBRAS ATRAVESSADOS POR DIFERENTES


VOZES

Trabalho de conclusão de curso de graduação


apresentado ao Departamento de Línguas e Letras do
Centro de Ciências Humanas e Naturais da
Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel
em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de
Sinais/Língua Portuguesa.

Orientadora: Prof.ª. Dr.ª Arlene Batista da Silva.

VITÓRIA/ES
2017
ELIANA FIRMINO BURGARELLI RIBEIRO

OS 10 MANDAMENTOS EM LIBRAS ATRAVESSADOS POR DIFERENTES


VOZES

Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado ao Departamento de


Línguas e Letras do Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade
Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de Sinais/Língua
Portuguesa.

Vitória/ES, ______ de ________________________ de 2017.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Arlene Batista da Silva


Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora

_____________________________________________________
Professor(a) Examinador(a)

_____________________________________________________
Professor(a) Examinador(a)
AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus por me conceder a oportunidade de realizar mais


um dos meus sonhos, porque “D’ele e por Ele e para Ele são todas as coisas”.

Em seguida ao meu esposo, Marcos, pelo companheirismo e compreensão ao longo


dessa jornada;

Agradeço aos meus pais, José Luiz e Zilda, por me ensinarem a lutar na vida, por
apoiarem minhas escolhas e por entenderem as ausências que elas causaram em
alguns momentos do percurso até aqui;

A toda a minha família, que esteve (e ainda está) sempre na torcida por meu
sucesso, agradeço imensamente pelas orações e pelo carinho;

Sou grata também pelos professores que tive, os quais me fizeram sentir orgulhosa
pelos ensinamentos oportunizados e pela certeza de suas contribuições para
mudanças significativas em minha vida. Em um tom bem especial, à minha
orientadora Arlene Batista: uma pessoa admirável, com quem muito aprendi;

Aos meus amigos do Letras Libras, com os quais vivi momentos que serão eternos
na memória;

Ao meu par acadêmico, minha dupla, minha amiga, Sâmmya Sathler, com quem
compartilhei instantes muito especiais. Sou grata a ela por entender minha vida
corrida, e, mesmo nesse movimento, contribuir substancialmente para a minha
formação intelectual e humana;

Minha eterna gratidão à equipe de tradução do ministério Adventista dos Surdos e


das Testemunhas de Jeová, que com tanto carinho, paciência e alegria no olhar, me
recebeu. Suas respostas se constituem parte valiosa desta pesquisa. Agradeço a
acolhida cordial;
Enfim, a todos da Comunidade Surda, demais amigos e familiares que, de alguma
forma, contribuíram para que eu pudesse avançar, passo a passo, nessa trajetória.
Muito obrigada, de coração.

A Deus, toda honra e toda glória!


EPÍGRAFE

Ebenézer:
Até aqui nos ajudou o Senhor!”
(I Samuel 7.12)
RESUMO

Este trabalho relaciona-se com as pesquisas sobre a tradução de textos sensíveis


para língua de sinais. Para tanto, valer-se-á das contribuições teóricas de Bakhtin e
seus conceitos de língua, linguagem, compreensão ativa responsiva, enunciado e
enunciação. Visa a investigar a tradução de textos religiosos para Língua Brasileira
de Sinais (Libras), tendo em vista a importância que as igrejas vêm
desempenhando, não só na formação de tradutores e intérpretes de Libras, como
também nas atividades missionárias e na criação de Comunidades Surdas. Partindo
da premissa de que todo ato discursivo é influenciado pelo contexto social e histórico
em que é sinalizado/produzido, pretende-se analisar os aspectos linguísticos e
extralinguísticos que interferem na atividade da tradução. No desenvolvimento deste
trabalho, foi realizada uma pesquisa bibliográfico-documental e de campo,
recortando como objeto de análise dois vídeos traduzidos para Libras, baseados no
texto bíblico descrito em Êxodo 20:1-17, que trata dos “Dez mandamentos”. Os
resultados revelam que a atuação dos tradutores/intérpretes e suas escolhas
tradutórias são diretamente influenciadas pelas instituições religiosas e seus
discursos, pelos dispositivos de controle e pelos lugares sociais que esses sujeitos
ocupam no interior dessas instituições.

Palavras-Chave: Libras. Textos sensíveis. Os dez mandamentos.


LISTA DE IMAGENS

Imagem 1: Esquema das Etapas de Produção................................................... 35

Imagem 2: Produção dos vídeos de “Os 10 mandamentos”................................ 39

Imagem 3: Apresentação dos tradutores .............................................................. 40

Imagem 4: 1º Mandamento – descrição................................................................ 41

Imagem 5: 2º Mandamento – descrição............................................................... 42

Imagem 6: 3º Mandamento – descrição................................................................ 47

Imagem 7: 5º Mandamento – descrição................................................................ 48

Imagem 8: Equipe/Estrutura de Tradução dos Adventistas.................................. 50

Imagem 9: Site da tradução Novo Mundo............................................................. 54

Imagem 10: Materiais utilizados pelas TJ para ensino religioso dos surdos......... 56

Imagem 11: 1º Mandamento – descrição.............................................................. 58

Imagem 12: 2º Mandamento – descrição.............................................................. 59

Imagem 13: 3º mandamento – descrição.............................................................. 64

Imagem 14: 5º Mandamento – descrição.............................................................. 65

Imagem 15: Equipe/estrutura de tradução das TJ................................................. 68


SUMÁRIO

1.0 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .................................................................... 10

2.0 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA...................................................................... 14

3.0 REFERENCIAL TEÓRICO........................................................................ 20


3.1 SOBRE GÊNEROS DISCURSIVOS ......................................................... 22
3.2 SOBRE A BÍBLIA COMO GÊNERO DISCURSIVO.................................. 25
3.3 SOBRE O TEXTO OS DEZ MANDAMENTOS........................................... 26
3.4 TRADUÇÃO CULTURAL .......................................................................... 29

4.0 PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS................................ 32


4.1 INÍCIO DA PESQUISA ............................................................................. 34
4.1.1 Diário de campo........................................................................................ 34

5.0 DESCRIÇÃO DO VÍDEO 01....................................................................... 37


5.1 OS DEZ MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELOS
ADVENTISTAS.......................................................................................... 38
5.1.1 Decupagem do objeto de análise........................................................... 38
5.1.1.1 1º Mandamento ........................................................................................ 41
5.1.1.2 2º Mandamento......................................................................................... 42
5.1.1.3 3º Mandamento......................................................................................... 47
5.1.1.4 5º Mandamento......................................................................................... 48
5.2 VISITA DE CAMPO E ENTREVISTA......................................................... 49
5.3 COMENTÁRIOS GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO DOS
ADVENTISTAS......................................................................................... 50

6.0 DESCRIÇÃO VÍDEO 02............................................................................. 53


6.1 OS DEZ MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELAS TJ............................... 56
6.1.1 Decupagem do objeto de análise............................................................ 58
6.1.1.1 1º Mandamento.......................................................................................... 58
6.1.1.2 2º Mandamento......................................................................................... 59
6.1.1.3 3º Mandamento.......................................................................................... 63
6.1.1.4 5º Mandamento.......................................................................................... 64
6.2 VISITA DE CAMPO E ENTREVISTA......................................................... 64
6.3 COMENTÁRIOS GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO DAS TESTEMUNHAS
DE JEOVÁ............................................................................................. 69

7.0 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS DIFERENTES TRADUÇÕES DE OS


DEZ MANDAMENTOS....................................................................... 70

8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................... 74

9.0 REFERÊNCIAS ......................................................................................... 76

ANEXOS..................................................................................................... 79
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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Observa-se nos estudos da tradução que muitos são os fatores que influenciam o
tradutor e intérprete em suas escolhas tradutórias. Um deles se deve ao fato de que
o texto está além da simples materialização linguística, pois envolve elementos de
ordem extralinguística. Assim, pode-se dizer que o texto sensível, bem como
qualquer ato discursivo, é influenciado pelo contexto social e histórico em que é
sinalizado/produzido.

A partir dessa afirmação, surgem os seguintes questionamentos: como os textos


religiosos têm sido traduzidos para a Libras? Quais as escolhas tradutórias são
evidenciadas nas sinalizações? Que elementos extralinguísticos interferem nessas
escolhas?

De acordo com César Augusto de Assis Silva (2011), a partir da década de 80,
diversas entidades começaram a assumir a surdez, numa perspectiva sócio-
antropológica, a qual concebe o surdo não como um deficiente, mas como um
sujeito marcado por singularidades linguísticas e culturais. Silva (2011) reforça que
essa concepção tem sido a base ideológica de muitos projetos missionários de
instituições religiosas, como a Igreja Católica, as Testemunhas de Jeová, e outras
igrejas protestantes, ancorando-se também nos discursos acadêmico-científicos, por
meio de linguistas, psicólogos, fonoaudiólogos e o movimento nacional organizado
dos surdos no Brasil, liderado pela Federação Nacional de Educação e Integração
dos Surdos (FENEIS).

O antropólogo explica que as igrejas protestantes, já na década de 80, desenvolviam


um trabalho missionário utilizando a Libras, forma de comunicação que lhes parecia
a mais adequada para evangelizar os surdos. Devido a isso, houve um forte
investimento dessas igrejas na formação de intérpretes que, desde aquela época até
hoje, se dedicam a traduzir textos bíblicos para Libras e interpretar os cultos para
membros e visitantes surdos.

Nesse contexto, cumpre destacar a grande quantidade de textos bíblicos em Libras


que circula dentro e fora das igrejas, pois muitos intérpretes iniciantes, que ainda
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não têm contato com a comunidade surda, apropriam-se desses materiais para ler,
praticar a tradução e ampliar vocabulário, aprimorando, desse modo, a formação. Já
os surdos, recebem esses textos para leitura, para conhecimento da Bíblia e das
doutrinas das igrejas que os produzem.

À luz dessas considerações, ressaltamos a importância que as traduções de textos


religiosos em Libras têm na formação de surdos e de intérpretes, uma vez que as
escolhas tradutórias são carregadas de valores ideológicos, éticos e morais da
instituição que financia a produção, circulação e divulgação dessas obras. São,
portanto, documentos históricos, produtos de relações socioculturais situadas no
universo religioso (e também fora dele), quer por seu conteúdo, sua abrangência e
pelas apropriações que deles se tem feito. Por tudo isso, não podem ser
desconsiderados, ao pensarmos os Estudos da Tradução em Libras na
contemporaneidade.

A partir da pesquisa de Silva (2011), houve, desde a década de 80 até os dias


atuais, uma quantidade considerável de traduções de textos religiosos para a Libras.
No entanto, poucas são as pesquisas que tomam o processo tradutório de textos
sensíveis do Português para Libras como objeto de investigação. Assim, esta
pesquisa tem por objetivo contribuir para a ampliação do conhecimento teórico no
campo dos Estudos da Tradução, mas também para a (re)produção de
conhecimento fundamentado a partir de uma análise crítica e reflexiva, contribuindo
para que os tradutores e intérpretes de Libras possam atuar com mais competência
e profissionalismo nessa área.

Partindo dessa premissa, pretende-se conhecer, descrever e analisar traduções de


textos religiosos. Tomamos como corpus textual dois materiais produzidos em Libras
pelos adventistas do sétimo dia e as Testemunhas de Jeová. Ambas as
denominações traduziram o texto de Êxodo 20:1-17 em DVD, o qual se encontra
também disponível na internet em suas variadas redes. Esse texto é conhecido na
religião judaico-cristã como os 10 mandamentos da lei de Deus. A análise da
pesquisa visa compreender, portanto, aspectos que influenciam as escolhas dos
tradutores nessas produções.
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A partir da problemática anteriormente apresentada, organizamos um projeto de


pesquisa, cujos resultados serão organizados em capítulos neste trabalho. No
segundo capítulo, apresentamos uma revisão das literaturas encontradas em
diferentes fontes que abordam temas relacionados a essa pesquisa.
Inicialmente abordamos os conceitos apresentados por Carlos Alberto Gohn (2004)
em relação às pesquisas em torno de textos sensíveis (os livros sagrados); em
seguida dialogamos com DePaula (2011), a partir do texto “A invenção do original
via tradução, pseudotradução e autotradução”, com a temática da tradução focada
no texto original. Ancorados nessas duas perspectivas, descrevemos também os
conceitos abordados por Furlan (2004) no texto “A teoria de tradução de Lutero”.

No terceiro capítulo, recorremos às contribuições teóricas de Bakhtin e seus


conceitos de língua, linguagem, compreensão ativa responsiva, enunciado e
enunciação, assim como, as contribuições de Sobral (2008), na qual em seu livro
“Dizer o mesmo a outros” aborda variados conceitos sobre tradução, tradutor,
leitor/autor. Bakhtin (1992) defende a importância de o tradutor identificar os
diferentes gêneros discursivos. Para ele, cada ato de enunciação é composto por
diversas “vozes”. Assim, cada ato de fala é repleto de assimilações e
reestruturações dessas diversas vozes; ou seja, cada discurso é composto de vários
discursos. São esses conceitos bakhtinianas notadamente que nortearam as
análises da pesquisa, levando-nos a adotar a perspectiva dialógica entre texto de
partida, tradutor e leitor, para lançarmos um olhar ao texto bíblico de modo a
entendê-lo como um gênero discursivo específico.

O quarto capítulo consiste na apresentação dos procedimentos teóricos


metodológicos que nortearam as análises dos dados. Trata-se de uma pesquisa
bibliográfica-documental, que se desenvolve em campo, com caráter exploratório e
descritivo, buscando respostas a questões particulares dessas produções culturais,
cuja principal fonte é de natureza audiovisual.

Em relação à pesquisa de campo, importa-nos dizer que tivemos a oportunidade de


visitar os espaços onde aconteceram as gravações dos vídeos analisados. Nessa
ocasião, recorremos ao procedimento de “entrevista semiestruturada” – que é um
dos instrumentos utilizados para coleta de dados – e do “diário de campo”, para
produzirmos dados sobre o que observamos no espaço. Para a entrevista,
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elaboramos um questionário com dez perguntas que foram respondidas pelas


Testemunhas de Jeová e pelos Adventistas.

No quinto capítulo, iniciamos o trabalho de decupagem, método que no campo


audiovisual consiste na divisão de um roteiro em cenas, sequências e planos,
fazendo recortes de vídeos em unidades mínimas. Nos recortes, cada sinal
produzido pelo tradutor, bem como suas expressões/movimentos faciais e corporais
são observados, para detalhar os aspectos que influenciam o tradutor, além de
verificar, com base nos dados analisados, se há diferença no modo de tradução
entre as instituições pesquisadas.

Após recortes e análises, em cotejo com os dados produzidos por meio das
entrevistas, fizemos um comentário geral de alguns pontos relevantes nos
resultados encontrados. Partimos, para isso, de uma análise comparativa sobre as
diferentes traduções do texto fonte, estabelecendo um diálogo com o aporte teórico.
Vale esclarecer que, nesta pesquisa, não houve a intenção de avaliar
qualitativamente as traduções, caracterizando-as como a melhor ou a pior. Todo o
trabalho descritivo realizado até aqui tem como objetivo compreender o modo como
os textos bíblicos vêm sendo traduzidos para a Libras, desvelando os elementos
linguísticos e extralinguísticos que participam do processo de tradução, bem como
as escolhas tradutórias e os efeitos de sentido que podem produzir no leitor.

O sexto e último capítulo apresentam as considerações finais, retomando as


constatações presentes na revisão de literatura e nos conceitos abordados pelo
aporte teórico, identificando por fim quais conceitos relacionados à temática da
tradução de textos sensíveis, especialmente os de cunho religioso, dialogam com
esta pesquisa.
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2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Este trabalho se desdobra no campo temático da tradução de textos sensíveis,


essencialmente nos textos de cunho religioso (sagrados), área que conta com uma
vasta produção de materiais amplamente difundidos e que se revelam novas fontes
para os estudos da tradução e interpretação das línguas sinalizadas. Procuramos
investigar, no primeiro momento, o conceito de texto sensível e as problemáticas
levantadas nas pesquisas existentes sobre o processo tradutório, somadas às
diferentes versões que são criadas para cada público. Desse modo, o objetivo da
pesquisa não é criar um manual de procedimentos técnicos da tradução de textos
sensíveis, e sim compreender os fatores que influenciaram essas produções.

Dentre os estudos relacionados à temática em questão que, de alguma forma,


contribuem para ampliar o conhecimento acerca do problema de pesquisa
investigado, três deles servem de ponto de partida. O primeiro trabalho a se
destacar, especialmente no tocante ao capítulo 6, é “Pesquisa em torno de textos
sensíveis: os livros sagrados”, escrito por Carlos Alberbo Gohn (2004), e publicado
pela faculdade de letras UFMG em 2001. Essa obra nos traz importantes reflexões
sobre textos sensíveis. Outra pesquisa que, por abordar a tradução com foco no
texto original, é “A invenção do original via tradução, pseudotradução e
autotradução”, publicado em Vitória, pela Edufes, de autoria de Lillian DePaula
(2011), a qual aborda a tradução com foco no texto original. Por fim, o texto de
Furlan, publicado em 2004, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
com o título de “A teoria de tradução de Lutero” surge como uma relevante
abordagem sobre questões textuais do interesse de nossa investigação.

Para Simms (1997 apud GOHN, 2001), o que faz os textos sagrados como o texto
bíblico serem considerados sensíveis é a visão sobre Deus enquanto o seu “autor
original”; ou seja, na perspectiva cristã, a Bíblia é considerada a “palavra de Deus”, a
qual jamais deve ser confundida com a palavra (ou autoria legitimada) de quem
registrou por escrito, considerado, assim, como um mero escriba inspirado a
escrever a “Palavra Original”. Nessa perspectiva, nenhum texto é sensível, a menos
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que o público pense nele como tal. Gohn (2001) reforça essa ideia, afirmando que a
sensibilidade do texto está no olhar de quem o vê e não no texto propriamente dito.

A partir dessa lógica, entendemos que diversos tipos de textos podem ser
agregados a este grupo. Também consideramos que os motivos que levam o leitor a
ter esse olhar sensível estão geralmente relacionados ao estado, à religião, ao pudor
ou às diferentes subjetividades, o que confirma a ideia de que quem confere o
caráter ao texto sensível é o leitor. A esse respeito Gohn (2001) afirma que as
intenções e funcionalidades do texto precisam ser consideradas, pois algumas
sentenças, dependendo do tipo textual em que estão inseridas não causam reação
sensível alguma no leitor.

No que pese às traduções que foram produzidas em língua de sinais de textos


considerados sensíveis por motivos ligados à religião, a comunidade surda costuma
rejeitar ou criar objeções às traduções que focam no original, desconsiderando as
especificidades das línguas de sinais.

Carlos Alberto Gohn 2001, além de definir o que seria um texto sensível, cita alguns
exemplos do grupo dos textos sagrados: A bíblia hebraica, o novo testamento, o
alcorão, o bhagavad gita e uma edição mais recente: o evangelho segundo o
espiritismo. A maioria desses textos tem suas raízes em culturas não ocidentais e
tem sido escritos em línguas como o hebraico, grego koiné, árabe, e sânscrito. Essa
variedade de escrita possibilita um campo a ser explorado nos estudos da tradução,
considerando que, segundo Gohn, há séculos essa tarefa vem sendo desenvolvida:

A tradução de textos sagrados para línguas diferentes daquelas em que


eles foram primeiramente escritos revela um desafio que tem, por séculos,
exigido criatividade e habilidade por partes dos tradutores (GOHN, 2001. p.
150).

É importante lembrar que há uma grande produção de materiais de textos sagrados,


com caráter sensível, traduzidos para língua de sinais. Pesquisá-los se mostra uma
árdua tarefa justamente por haver um vasto campo a se explorar.

Conforme DePaula (2011), as traduções precisam também ter foco no texto original.
Na obra “A invenção do original via tradução, pseudotradução e autotradução”, a
autora nos narra um pouco da trajetória histórica da tradução dos textos sagrados,
tentando fazer um delineamento do tradutor medieval, inicialmente, estabelecendo o
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contexto cultural que o circundava para em seguida, descrever o procedimento que


adotava ao traduzir. Lillian DePaula (2011) levanta alguns dados históricos que
situam o tradutor medieval de acordo com o contexto sociocultural de seu tempo, de
forma a realçar a influência que o período teve na sua produção. Nesse sentido, o
tradutor se move limitado e dirigido por sua ideologia – conceito entendido como um
conjunto de escolhas estéticas, religiosas e poéticas – ou seja, os indivíduos e
instituições aplicam determinadas crenças à produção de certos efeitos na tradução.

Ainda segundo a referida autora, na primeira fase do período medieval, aparecem


figuras como as de são Jerônimo, Santo Agostinho e Boécio que traduziam os textos
bíblicos do grego para o latim e transformaram os textos dos antigos em textos que
condissessem com a situação daquela época. Nesse contexto, dois tipos de textos
eram traduzidos durante o período medieval – o sagrado e o secular, os textos
bíblicos e a literatura clássica – e o tipo de texto, naturalmente, determinaria o
procedimento a ser adotado. Fica claro que, na tradução do sagrado, fazia-se
necessário a literalidade, a manutenção da estrutura do original ao extremo,
justamente por haver essa sensibilidade, e dependendo da natureza do texto, ter-se-
ia maior ou menor liberdade para se ater à forma ou ao conteúdo.

A partir dessas considerações, compreendemos que os tradutores buscam extrema


fidelidade à palavra nos textos bíblicos, nos quais a tradução palavra por palavra
garantia a preservação do mistério do texto sagrado. No entanto, diferente do
procedimento adotado na tradução da Bíblia, na tradução dos clássicos, a fidelidade,
ou literalidade, poderia ser considerada uma característica negativa. Culturalmente
percebe-se que havia respeito ao traduzir os textos sagrados e receio de um castigo
divino caso o tradutor não seguisse de forma fiel e literal a tradução dos textos
bíblicos. No texto em voga, DePaula (2011) conclui seu pensamento ressaltando a
importância que essa tarefa de tradução tem de levar o passado ao futuro, pois, para
ela, o tradutor tem sobre si a responsabilidade de contribuir para a sobrevivência de
um texto ao longo dos anos. Assim, acreditamos que essa pesquisa pode contribuir
para entendermos melhor a trajetória do olhar sobre a tradução de um texto sagrado
nos dias atuais. Além da sensibilidade do texto sagrado, da importância do olhar
para o texto original, que já abordamos para que o texto continue em circulação e
vivo dentro de uma comunidade, é necessário também que o tradutor considere
principalmente o seu público alvo.
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Em se tratando da língua de sinais, caso o tradutor se atenha apenas ao texto


original, pode ocorrer uma tradução que não será compreendida pelo leitor surdo,
que em diversos casos não conta com as referências e domínio do contexto
histórico, o que a novo ver pode ser agravado pelo não domínio da Língua
Portuguesa e suas especificidades quando o tradutor utilizar uma tradução
estrangeirizadora (aquelas que mantêm a estranheza do texto original e da cultura
de partida), certamente a mensagem não será compreendida. Outro dado a ser
observado é que os materiais produzidos precisam respeitar a sensibilidade, ter foco
no original, porém, sempre respeitando o leitor para o qual esse texto será
produzido, considerando as várias questões identitárias e culturais dos surdos.

Segundo Mauri Furlan (2004), em “A teoria da tradução de Lutero”, as traduções


sagradas sempre são direcionadas por questões teológicas; tanto sua concepção
linguística como tradutológica se subordinam à sua concepção religiosa. Ele afirma
que Lutero defende uma tradução retórica, de estilo popular, não com fins estéticos,
mas comunicativos. Para ele o leitor precisa compreender o que está sendo dito, e
para que isso ocorra, alguns fatores precisam ser considerados, como, por exemplo,
o meio cultural do público alvo. Isso justifica o fato de que a tradução precisa ser
adaptada à cultura do destinatário para que ele consiga compreender as realidades
históricas, culturais e sociais relatadas na bíblia, uma vez que foram vividas em outro
tempo e espaço bem distantes dos receptores.

Essa linha teórica explica as diferentes produções existentes de um mesmo texto


base, e nos ajuda a entender o motivo por que alguns textos bíblicos, como, por
exemplo, “Os 10 mandamentos” e “O Pai nosso”, são traduzidos de forma dinâmica
para línguas sinalizadas; ou seja, são adaptados à cultura e à forma como o sujeito
surdo vê o mundo, porém sem perder as questões ideológicas.

De acordo com Furlan (2004), Lutero defende que na prática as traduções devem
privilegiar o texto na língua de chegada, porém, em alguns casos, é necessário o
estrangeirismo, por não conseguir uma equivalência na língua de chegada. Nesse
caso, o tradutor escolhe manter o original para não perder o sentido da mensagem;
ele não afirma que uma forma seja melhor do que a outra, porém diz que utilizou as
duas para expressar melhor a mensagem:
18

Na prática, observa-se o predomínio de uma tradução que privilegia o texto


na língua de chegada, mas que também admite estrangeirismos se a
formulação do original expressa melhor o conteúdo da mensagem
(FURLAN, 2004, p. 03).

Ainda segundo Mauri Furlan (2004), Lutero acredita que é preciso compreender para
comunicar. Noutras palavras, o tradutor não se vale apenas de competências
tradutórias e linguísticas. O repertório influencia muito na qualidade da transmissão
do texto fonte ao destinatário. Apesar de a Bíblia ser um livro histórico, devendo
portanto ser analisada no contexto língua e espaço, todos os textos sagrados se
tornam sensíveis justamente por essas peculiaridades. Fé e história se mesclam em
uma literatura que deve ser interpretada sem ignorar o conceito; apesar de Lutero
não ter a bíblia apenas como objeto qualquer, ele dava importância ao contexto
histórico e social em que ela foi escrita.

Lutero (apud Furlan 2004) afirma que a tradução da Bíblia deve ser fiel e inteligível a
todos, o que só é possível se o tradutor falar a mesma língua do leitor. Sendo assim,
entendemos que uma pessoa surda, por exemplo, dificilmente terá compreensão da
mensagem se a mesma não for adaptada à sua língua e cultura, por outro lado é
importante destacar que por trás do discurso de Lutero havia sua fé religiosa, e ele
coloca em questão o valor da igreja católica enquanto instituição.

Recuperando o pensamento de Furlan (2004), na perspectiva da tradução de um


texto sagrado/sensível a língua falada pelo povo deve ser considerada, para que
haja uma real compreensão da mensagem; a língua materna do povo deve ser
respeitada, porém sem esquecer o contexto e a forma de pensar de quem disse o
original. Nesse sentido, às vezes, o tradutor precisa sacrificar o estilo para se
aproximar do original. Por haver algumas palavras que não encontramos
equivalência na língua de sinais, precisamos utilizar recursos conceituados como
empréstimos linguísticos da língua original. Enfim, traduzir não é uma arte de
domínio comum, além disso, quando há estruturas de sensibilidade envolvidas essa
tarefa se torna ainda mais complexa.

Acima da boa produção textual na língua de chegada está a mensagem


contida no original, e se a mensagem não se sustém mesmo no melhor
estilo da língua de chegada, deve-se sacrificar o estilo e calcar o original
(FURLAM, 2004, p. 06).
19

No caso das línguas de sinais, pode acontecer das escolhas tradutórias focadas
apenas no público leitor, partir para o exagero, o tradutor/intérprete parte para uma
teatralização do texto bíblico, o que pode acabar provocando estranhamento por
parte dos líderes religiosos da instituição em que essas traduções são produzidas,
causando até mesmo rejeição por interpretarem que a tradução esteja ferindo o
original.

A partir desses textos reforça-se a necessidade de pesquisas que abordem a


tradução de textos sagrados para língua de sinais, uma vez que há uma diversidade
de detalhes bem como uma grande produção de materiais sinalizados por diferentes
instituições religiosas. No entanto, encontramos em nosso levantamento bibliográfico
grande contribuição para o problema pesquisado, assim como a importância dessas
produções terem o foco no texto original, porém, sem perder de vista o público
surdo, que será o receptor de suas traduções, voltando o olhar também à
sensibilidade do texto como aspecto influenciador das escolhas tradutórias.

As considerações feitas até aqui, baseadas em DePaula (2011), Gohn (2001) e


Furlan (2004), nos mostram a necessidade que o tradutor de um texto sagrado para
línguas sinalizadas tem, em considerar a especificidade desse texto, assim como
olhar para o original sem perder o foco na cultura e língua do público leitor.
20

3 REFERENCIAL TEÓRICO

No intuito de investigar as questões específicas que norteiam a tradução de textos


sensíveis, nos valemos das contribuições de Bakhtin como referencial teórico em
diálogo com outros autores cujos estudos se relacionam a este campo dos estudos
da tradução.

A análise da atuação dos tradutores e intérpretes parte da identificação e reflexão


acerca dos elementos que influenciam diretamente nas escolhas tradutórias, como
os dispositivos de controle, lugares sociais que esses sujeitos ocupam no interior
das instituições e os respectivos discursos religiosos. A partir das leituras de Adail
Sobral (2008) assumimos que, a tradução, ao contrário do senso comum e conceitos
dicionarizados, é muito mais do que a tarefa de transpor palavras de uma língua
para outra, a atividade tradutória se dá na multiplicidade das línguas. É a tradução
que mantém o texto vivo, garantindo sua sobrevida em outras línguas e culturas.
Portanto, trata-se de uma atividade que envolve competência e qualificação, pois
requer estratégias de diversas naturezas; algumas das quais podem ser adquiridas
por meio do estudo enquanto outras, desenvolvidas ou aperfeiçoadas pela formação
profissional.

Para o autor em seu livro “Dizer o mesmo a outros” (2008), o tradutor é um


leitor/autor, pois despende tempo e energia para compreender um texto e ao mesmo
tempo, busca estratégias para produzir um mesmo/novo texto em outra língua.

Porque todo ato de tradução envolve uma atividade de leitura de um texto


numa dada língua que difere da leitura em geral porque é feita do ponto de
vista de um profissional que, em vez de apenas entender o que lê ou
responder/reagir ao que lê, deve enunciá-lo para outros interlocutores, tem
de reconstituir/reconstruir/restituir o que lê em outra língua, e que, portanto,
tem de penetrar em dois universos de discurso e colocá-los numa relação
de interlocução, constituindo-se num mediador entre o autor do texto, que
se dirige a um dado público que conhece, e o público do texto traduzido, ao
qual o autor não pode dirigir-se diretamente (SOBRAL, 2008, p.7).

Percebemos então, baseados nas considerações de Sobral, que o tradutor de língua


de sinais, no processo de tradução, dialoga com o discurso de um autor, penetra no
seu universo de experiências, com as diferentes vozes que o atravessam e
reconstrói o discurso em outra língua. O sujeito surdo, público alvo do texto
21

traduzido, com o qual o autor não pode interagir face a face, se torna o interlocutor
nessa atividade dialógica, recebe essa produção, podendo ler ou responder/reagir
ao que lê.

No contexto religioso, o tradutor precisa ter conhecimento de teoria do texto, do


discurso, do gênero, da comunicação, da gramática das línguas traduzidas, para que
o sujeito surdo compreenda a mensagem que o locutor deseja passar. Conforme
Sobral (2008), importa também que o tradutor desenvolva variadas capacidades e
habilidades teóricas e práticas, para se fazer entender pelo receptor de sua
recriação, ele precisa refletir sobre sua própria prática de tradução” (SOBRAL, 2008,
p. 93).

É válido lembrar que tradutor/intérprete de textos sensíveis ocupa um lugar de


mediação entre instituições religiosas e público alvo surdo, sejam esses, membros
ou público de evangelização. O tradutor que desenvolve o papel de interlocutor,
além de traduzir o texto bíblico, precisa se atentar para as especificidades dos vários
tipos de leitores e dos vários tipos de gêneros discursivos existentes, assim como da
intenção da instituição que financia a tradução. Ele precisa ser fiel ao original sem
violar a língua para qual se traduz, respeitando o público leitor, porém sem perder a
especificidade do texto original. Quando essa tarefa se dá em espaços religiosos, na
maioria dos casos o tradutor/intérprete está sob a influência de seus pensamentos,
do discurso desse espaço em que ocupa, dos discursos culturais dos surdos e da
responsabilidade de respeitar as diferenças linguísticas.

A partir dos conceitos de Sobral (2008), em consonância com os pressupostos


Bakhtinianos, traduzir um texto sensível não seria apenas o ato de traduzir textos
bíblicos para língua de sinais, mas de fazê-lo em uma situação concreta envolvida
por questões ideológicas. Para ele,

O tradutor é um profissional cujo ofício envolve reconstruir a situação


enunciativa original na situação enunciativo-alvo [...], um pesquisador de
tudo, um generalista, um eterno curioso por força de sua atividade, um
profissional da intertextualidade, identificando os diálogos que são
produzidos entre os autores [...] (SOBRAL, 2008, p. 99).

Esse conceito de tradução é baseado na perspectiva bakhtiniana de linguagem, uma


perspectiva dialógica interacional entre emissor e receptor de uma determinada
língua e cultura. O tradutor é um sujeito se posiciona entre as duas culturas, a
22

cultura surda e a cultura ouvinte, para assim criar um novo discurso em outra língua.
É possível afirmar que ele é um estrategista; isto é, precisa adequar sua tradução à
língua, assim como à cultura e ao contexto de chegada, sem perder de vista o texto
e a mensagem do texto de partida.

3.1 SOBRE GÊNEROS DISCURSIVOS

Considerando o foco desta pesquisa, tomamos como princípio a ideia de que a


Bíblia, como livro impresso tal como a conhecemos, é formada por vários gêneros
discursivos, na modalidade escrita; ou seja, por enunciados escritos, produzidos em
condições específicas da esfera religiosa.

Bakhtin (2003) afirma que os gêneros não podem ser apreendidos apenas pela sua
forma, como produto estático, mas devem ser compreendidos principalmente pelo
viés dinâmico das suas produções. Os gêneros e os tipos de textos estão
relacionados a uma atividade. O autor se preocupa em ver como as atividades
humanas se organizam na linguagem, porque “é a linguagem que dá forma a essas
atividades sem deixar de lado o enunciante e o enunciador”(Bakhtin 2003, p. 282).
Para ele, cada ato de enunciação é composto por diversas “vozes”. Assim, cada ato
de fala e repleto de assimilações e reestruturações destas diversas vozes, ou seja,
cada discurso é composto de vários discursos. Essas vozes “dialogam” dentro do
discurso, e este diálogo é construído histórico e socialmente; isto é, o enunciado é
orientado para um interlocutor e permeado por diferentes vozes.

Nesse sentido, o tradutor de língua de sinais precisa se preocupar com o agente,


aquele que age no horizonte do enunciador, que no caso específico corresponde ao
surdo (receptor interno do texto). O enunciador/tradutor precisa estar atendo ao
receptor, atento à natureza do público, às características da linguagem que sejam
compreensivas para aquele público. Desse modo, se o texto original aborda
assuntos da área da saúde, o tradutor precisa usar argumentos dessa área, porém
levando em conta o receptor dessa recriação (Médicos, pacientes, estudantes da
área, etc..).
23

Bakhtin (2003) afirma que os sujeitos têm um infindável repertório de gêneros e


muitas vezes não se dão conta disso. Esses gêneros sofrem modificações em
consequência do momento histórico no qual estão inseridos. Cada situação social
origina um gênero, com características peculiares. Esse autor classifica os gêneros
nas seguintes categorias: a) gêneros primários: aqueles de caráter de circulação
cotidiana e b) gêneros secundários: aqueles que pertencem a esferas de
comunicação discursiva institucionalizadas.

A Bíblia, partindo desse conceito, pode ser considerada como gênero secundário,
por ser um livro que pertence a uma esfera específica da religião cristã, utilizada em
situações comunicativas mais complexas e adaptada aos diferentes públicos. Ao
longo da história, muitas versões da bíblia são traduzidas para uma linguagem ou
um público específico, como, por exemplo, a bíblia da mulher, a dos jovens, a das
crianças, entre outras. Cada uma dessas versões bíblicas foi produzida para atender
a uma especificidade de leitor, com linguagem, cores e estilos que respeitem às
necessidades de cada grupo.

Mikhail Bakhtin (2003) esclarece que as interações sociais exercem influência direta
sobre os enunciados que compõem os gêneros, ou seja, todos os elementos que
compõem o ato concreto e singular de enunciação (os interlocutores, o contexto
imediato e histórico mais amplo e a avaliação do ato) atuam como índices de
referência, pois direcionam o autor na construção dos enunciados (a forma de
composição, as escolhas linguísticas e o estilo), com vistas à construção de
compreensão ativa do interlocutor. Portanto, os gêneros são marcados por
elementos extralinguísticos vinculados a uma dada esfera social. Nessa linha,
entendemos que um tradutor, ao (re)construir um gênero discursivo, deve considerar
a dimensão social, os aspectos ideológico-discursivos que compõem a relativa
estabilidade dos enunciados e não apenas a sua materialidade linguístico-textual,
pois, conforme Bakhtin,

temos em vista o discurso, ou seja, a língua em sua integridade concreta e


viva e não a língua como objeto específico da Linguística, obtido por meio
de uma abstração absolutamente necessária de alguns aspectos da vida
concreta do discurso (BAKHTIN, 2008, p. 207).

Estabelecendo um diálogo com a temática em estudo, é possível inferir que a


tradução de “Os dez mandamentos”, dada sua complexidade, ao abordar a criação
24

de leis divinas, a história do povo de Israel em época e cultura específicas pode se


tornar incompreensível e ser rejeitada pelos sujeitos surdos se não forem
consideradas as relações dialógicas dos enunciados com contexto histórico e social
em que foram produzidos e os interlocutores a quem se dirigem esses enunciados.
Em outras palavras, se o tradutor prender-se apenas à materialidade linguística do
texto ou adotar uma tradução baseada na relação palavra-sinal, é possível que o
leitor surdo não consiga compreender os sentidos do texto bíblico.

Baseados nos estudos de Bakhtin (2003), entendemos que os gêneros são


maleáveis e dão origem a uma multiplicidade de outros gêneros, devido à sua
maleabilidade para atender a condições específicas de interação. Nesse sentido,
acreditamos que a tradução de “Os Dez Mandamentos” em Libras pode ser definida
como uma transmutação do gênero escrito (texto bíblico) para um gênero sinalizado
(em Libras), marcado ideologicamente por finalidades específicas de cada instituição
que os produz. Portanto, essa tradução/recriação sofrerá alterações no estilo de
linguagem, na seleção dos recursos lexicais e na construção composicional
determinadas pela situação de interação, sua historicidade e eventicidade.

À luz dessas considerações, entendemos que ambas as instituições religiosas que


participam desta pesquisa (adventistas e testemunhas de Jeová) possuem suas
crenças e ideologias que interferirão diretamente no ato tradutório. Portanto, os
sinais, o tipo de tradução, os recursos visuais, manuais e não-manuais utilizados
serão diretamente influenciados por esse campo da atividade humana.

Bakhtin aponta que:

O gênero não pode ser pensado fora da dimensão espaço-temporal. Logo,


todas as formas de representação que nele estão abrigadas são,
igualmente, orientadas pelo espaço tempo, enquanto o espaço é social, o
tempo é sempre histórico (BAKHTIN, 1997, p. 281).

A teoria bakhtiniana nos faz entender que o gênero tem uma existência cultural,
Ainda com relação à palavra, o autor afirma que escolhemos as palavras de acordo
com as especificidades do gênero discursivo utilizado no momento. Isso se aplica à
de escolha de qual sinal utilizar na tradução de determinado tipo de texto. A Bíblia é
um gênero discursivo, por isso sua tradução para qualquer que seja a língua precisa
levar em conta as especificidades de cada língua. É importante entender que cada
igreja tem uma interpretação do texto bíblico, baseada no que entende como
25

tradução. Isso pode levar a traduções diferentes de um mesmo texto bíblico, devido
a princípios e ideologias de cada uma.

3.2 SOBRE A BÍBLIA COMO GÊNERO DISCURSIVO

De acordo com Prof. Dr. João Cesário Leonel Ferreira (2008), em seu artigo “A
Bíblia como Literatura - Lendo as narrativas bíblicas”, a Bíblia é o termo que o
cristianismo utiliza para se referir ao seu livro sagrado, unindo as escrituras
canônicas do judaísmo e a literatura própria do movimento cristão nascente. A
palavra provém do grego “ta biblia”, que significa “os livros”. Conforme Ferreira, no
século XIII d.C. “ta bíblia”, entendida como declinação neutra plural, foi substituída
pela forma feminina singular, passando a significar “o livro”, forma que se
generalizou pelo uso latino do termo. Nessa última acepção ela foi assimilada pelas
línguas modernas do Ocidente.

A Bíblia, em sua versão mais usada no Brasil, traduzida por João Ferreira de
Almeida, está dividida em 66 livros, sendo 39 no velho testamento e 27 no novo;
sendo ainda subdividida em partes classificadas como pentateuco, livros da lei,
históricos, poéticos, proféticos, cartas e evangelhos. À luz do pensamento de
Bakhtin, cada um desses tipos de textos irá acionar recursos linguístico-discursivos
distintos. O tradutor, por sua vez, precisa se apropriar dessas características para se
fazer entender.

Como já citado anteriormente, há várias versões da Bíblia. Podemos citar a Nova


Tradução na Linguagem de Hoje, abreviadamente chamada NTLH. É uma tradução
da Bíblia em linguagem moderna em Língua Portuguesa, lançada no ano 2000 pela
Sociedade Bíblica do Brasil, assim como a Almeida Revista e Atualizada (ARA), que
apesar de se basear no texto de Almeida, apresenta-se como uma nova e muito
diferente tradução. Ela mantém o estilo clássico do Almeida antigo, mas substitui as
expressões que, em vez de sinais de erudição, se tornaram, com o tempo,
arcaísmos. Ela se alinha a novas evidências arqueológicas, diferindo, assim, da
original.
26

Ao traduzir para língua de sinais o tradutor precisa definir qual método de tradução
vai aplicar ao texto sagrado: se pela correspondência formal, que pretende traduzir o
texto literalmente ou se pela equivalência dinâmica, que permite uma segunda
tradução, produtora do valor cultural igual ou semelhante para o surdo, também
chamada de tradução idiomática (WEGNER, 1998, p. 28; EGGER, 1994, p. 61). Isso
porque “uma palavra não possui um significado individual, mas um conjunto de
significados” (STUART e FEE, 2008, p. 64). A tradução por equivalência dinâmica,
que propõe uma tradução mais vivencial para o contexto que será estudado, foi
aplicada na versão da Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH). Essa ideia é
reiterada por Ferreira quando afirma que:

Os gêneros discursivos empregados nas escrituras cristãs resultam de


coleções literárias variadas, que em conjunto visavam expressar e interagir
com determinados domínios da experiência humana. O estudo literário
pressupõe que a intencionalidade e a funcionalidade do texto por meio do
gênero literário são partes vitais no amplo processo de comunicação, cujo
gênero está intimamente correlacionado ao ambiente linguístico e
condicionamento histórico–social do autor e de seus respectivos leitores
originais. Esta noção constitui - se num caminho efetivo no acesso à
realidade significativa e construída nos respectivos textos para uma
tradução acessível ao leitor (FERREIRA, 2008).

O texto escolhido para análise é extraído do livro de Êxodo, segundo livro da Bíblia
Sagrada, que se constitui numa narrativa que mostra como o povo de Israel cresceu
no Egito durante 400 anos e passou a ser perseguido e oprimido pelo Faraó. Revela
sofrimento do povo, a preparação de Moisés como libertador, a luta contra o
opressor, o livramento, as provas no caminho para a Terra Prometida, o pacto de
Deus com o povo de Israel e as normas para ser construído o tabernáculo.

3.3 SOBRE O TEXTO OS DEZ MANDAMENTOS

Segundo João Coimbra e Deise Peres – (2009), o texto de Êxodo capítulo 20,
também conhecido como o decálogo, conjunto de leis ou dez mandamentos, é de
grande relevância para a comunidade judaico-cristã. Nesta pesquisa, o texto “Os
Dez Mandamentos” será estudado numa perspectiva linguístico-discursiva, pois o
concebemos como parte de um “produto” ideológico que conserva um elo orgânico
vivo com a ideologia do cotidiano (BAKHTIN, 1992, p. 119).
27

Conforme narrado na Bíblia, os “Dez Mandamentos”, que basilam a Lei Mosaica,


foram dados ao profeta Moisés no monte Sinai, diretamente por Deus, e foram
escritos pelos dedos de Deus em duas tábuas de pedra (Êxodo 24.12; 32.16).

Nos primeiros versículos, são abordadas regras de conduta do homem para com
Deus, proibindo a idolatria. Nesse contexto, Deus se estabelece como único digno
de adoração:

Então falou Deus todas estas palavras, dizendo: Eu sou o Senhor teu Deus,
que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão. Não terás outros deuses
diante de mim. Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma
semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, em nas
águas debaixo da terra [...]. Lembra-te do dia do sábado, para o santificar.
Seis dias trabalharás, e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado
do Senhor teu Deus; não farás nenhuma obra [...] (Êxodo 20:1-11).

Os versículos 12 aos 17 tratam da relação de convivência entre os homens e a


sociedade, trazendo à baila os relacionamentos humanos, os quais giram em torno
do respeito aos pais, ao próximo, à família, à propriedade alheia, à justiça e ao
controle dos desejos:

Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra
que o Senhor teu Deus te dá. Não matarás. Não adulterarás. Não furtarás.
Não dirás falso testemunho contra o teu próximo. Não cobiçarás a casa do
teu próximo, não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem
a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma do teu
próximo (Êxodo 20:12-17).

O livro de Êxodo, no capítulo 20, do versículo 8 a 11, registra que Deus faz uma
relação de dez prioridades atemporais, de caráter moral e espiritual, que seus filhos
deveriam seguir, demonstrando uma aliança de amor e respeito. Esse trecho bíblico
estabelece intertextualidade com o conteúdo de Apocalipse 14: 6, 7 e 12 e Ezequiel
20:12, 20, 21. No Monte Sinai, os “Dez Mandamentos” consolidaram um padrão de
leis morais e jurídicas e a liderança de Moisés, conforme pode ser observado no
versículo 12 do capítulo 24 do referido livro: “Então disse o Senhor a Moisés: Sobe a
mim ao monte, e fica lá; e dar-te-ei as tábuas de pedra e a lei, e os mandamentos
que tenho escrito, para os ensinar”.

No contexto a que se refere o do texto acima, fica claro que o código de aliança foi
decretado pelo próprio Deus (autor), dado ao profeta Moisés (interlocutor/mediador)
para repassar ao povo (receptora/interlocutor). Os Dez Mandamentos serviu como
instrumento didático, um manual de instrução, na caminhada do povo de Israel rumo
28

à terra da promessa. KANYAT (2016) afirma que o texto “Os Dez Mandamentos”,
objeto de análise nesta pesquisa, está em evidência no Brasil, circula com evidência
em programações televisivas e filmes religiosos. Os Dez Mandamentos (2014),
considerada a primeira “telenovela bíblica” do país, atualmente, muitas emissoras de
TV tem investido naquilo que se convencionou chamar de um novo gênero de ficção
televisiva: a “telenovela bíblica”. Para Kanyat, a princípio, a proposta de adaptação
de histórias bíblicas para o grande público causou estranheza, mas a aposta
resultou no maior acerto da emissora. Por diversas vezes, a telenovela alcançou a
liderança do horário nobre durante sua exibição. A novela fez tanto sucesso, que
virou filme.

A titulo de curiosidade, de acordo com KANYAT (2016), a superprodução da Record


foi escrita pela dramaturga evangélica Vivian de Oliveira. Em entrevista ao jornal O
Dia, a autora comenta que foi criada na Igreja Adventista do Sétimo Dia e, desde a
adolescência, e que a adaptação de histórias bíblicas para determinado público está
começando agora no Brasil.

O pensamento de Bakhtin (2003) assim como o de Sobral (2008) corroboram nas


estratégias usadas nesses modelos de tradução, que leva em conta que a língua é
cultura em uso. O sucesso desse tipo de tradução cultural é comprovado pelo
interesse de várias igrejas, empresas e instituições pela cultura surda,
impulsionando a produção de materiais no campo da tradução.

De modo geral, a maioria das religiões cristãs se baseia nos Dez Mandamentos para
construir suas doutrinas. Para algumas comunidades, o decálogo deixa de ser uma
Lei ultrapassada para se tornar um padrão moral em todos os tempos, que continua
sendo lido e obedecido. Mas cada uma pode enfatizar em seu discurso o
mandamento que lhe parece mais relevante. A Lei mosaica tem uma aplicação
direta no cotidiano. Nossas práticas podem, numa perspectiva comportamental, ser
parametrizadas pelas normas estabelecidas por esse texto. Sendo assim, muitas
igrejas costumam produzir estudos bíblicos, discursos, palestras aos novos adeptos,
a fim de transmitir esses valores e regras de conduta. No caso do surdo, essas
regras precisam ser traduzidas para sua língua e cultura, contribuindo dessa forma
para um comportamento ético alinhado aos padrões estabelecidos pelos discursos
que circulam nesse lugar.
29

3.4 TRADUÇÃO CULTURAL

Segundo HALL (2006), a questão da identidade do tradutor e do sujeito para o qual


se traduz deve ser extensamente considerada no ato de traduzir qualquer gênero
textual. As velhas identidades se atravessam com as novas, fragmentando, assim, o
sujeito moderno, o que talvez possamos chamar segundo Hall de “crise identitária ou
processo de deslocamento e mudanças estruturais e de processo dentro do mundo
social” (HALL, 2006, p. 07).

Nesse sentido de mudança de processos, Hall (2006) defende três concepções de


identidade que se conceitualizam em determinados períodos históricos: na era
iluminista o sujeito era definido com uma identidade unificada em si própria, suas
ações, consciência e seu núcleo interior determinavam quem ele era e como se
desenvolvia. Com as mudanças de pensamento, surge um novo conceito. A
identidade agora seria algo interativo; ou seja, esse núcleo interior definido no
iluminismo, agora passa a interagir com outras pessoas; com a cultura do mundo em
que ele habitava; com a sociedade; formando, assim, sua identidade.
A identidade então costura o sujeito à estrutura, estabilizando tanto os sujeitos
quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos reciprocamente mais
unificados e predizíveis. Argumenta-se, então, que são exatamente essas coisas
que agora estão mudando. O sujeito que previamente vivia como tendo uma
identidade unificada e estável está se tornando fragmentado, composto não só de
uma única, mas de várias identidades; algumas vezes contraditórias ou não
resolvidas. Esse processo produz o sujeito pós-moderno como não tendo uma
identidade fixa, essencial ou permanente, tornando-se uma “celebração móvel”:
formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos
representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 2014,
p.13).

Stuart Hall (2006) aborda a centralidade da cultura. Ele questiona o lugar da cultura
na sociedade, como ela é considerada e definida. Aborda questões como a posição
da cultura em relação à questões de conhecimento e conceitualização, assim como
o lugar da cultura na estrutura empírica real e na organização das atividades,
instituições, e relações culturais na sociedade em qualquer momento histórico. A
30

cultura é usada para transformar nossa compreensão, explicação e modelos teóricos


do mundo.

Com o avanço das tecnologias de informação, há quem defenda a ideia de que em


pouco tempo existirá apenas uma cultura global, considerando a aproximação de
espaços e velocidade do tempo, a que Hall (2006) claramente se opõe. Para ele
essas trocas culturais contribuem grandemente para que tenhamos acesso a
variadas culturas.

Nesse sentido, Hall 2006 argumenta que as nossas identidades culturais passam
por nossas escolhas pessoais, mas também pelos aspectos objetivos que estão
presentes nas instituições, nas atividades, nas normas e nas ações de certa cultura
que está presente em determinado tempo e lugar. Para ele a cultura pode sofrer
alterações; ou seja, mudança de atitude no modo de encarar a linguagem, porque
linguagem é forma real que um sujeito compreende a vida social e a cultura se
mantém paralela aos aspectos sociais, políticos e econômicos.

Para SKLIAR (1997) o sujeito Surdo é uma pessoa com uma cultura e hábitos
próprios que utiliza uma língua visual-espacial como forma de expressão e
comunicação. Nessa perspectiva sócio-antropológica, o surdo é concebido como um
sujeito social que se constitui a partir de sua diferença linguística e cultural que
percebem o mundo pela experiência visual. Por viver na fronteira entre duas
culturas, pode ser considerado um sujeito bilíngue/bicultural que utiliza a língua de
sinais como forma de apropriação do conhecimento e de seu desenvolvimento
global e a língua oral (modalidade escrita) como forma de interação com a
sociedade ouvinte.

Há registros sobre os surdos desde a Pré-história, na Bíblia e na antiguidade. No


entanto, nas últimas duas décadas, percebemos discursos e práticas buscando uma
ressignificação em um contexto mais apropriado à situação cultural, linguística e
identitária dos surdos. O surdo tem sido visto como autor e ator de uma cultura
minoritária, sendo um usuário de uma língua natural: a LIBRAS – Língua Brasileira
de Sinais. Além disso, vem sendo reconhecido como partícipe de um grupo que
demanda uma educação bilíngue e multicultural.
31

Segundo Skliar (1997), a Libras surge como um mecanismo de afirmação da


identidade surda, identidade negada e silenciada durante muito tempo, por meio
através da prática da oralização imposta pela sociedade (o surdo era ensinado a
“falar” através do método da repetição). Por não dominarem a oralidade, eram
excluídos e considerados incapazes de desenvolver qualquer atividade, além de não
poder ser dono de si mesmo.

Considerando que esse trabalho tem foco na Libras, língua utilizada pelos sujeitos
Surdos que possuem uma cultura e identidade própria, abordamos a cultura como
um elemento extralinguístico influenciador na escolhas tradutórias para uma
identidade e uma cultural específica, nesse caso a identidade Surda. Além disso,
levamos em conta também as influências culturais e ideológicas das instituições que
financiaram o material traduzido, situando o tempo e o lugar em que foram
sinalizadas.
32

4. PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS

Apresentaremos, a seguir, os procedimentos teórico-metodológicos utilizados para o


desenvolvimento desta pesquisa, que teve por objetivo investigar os elementos
linguístico-discursivos que influenciam a tradução da Bíblia Sagrada Cristã do Livro
de Êxodo, capítulo 20, do versículo 1 ao 17, para Língua de Sinais, traduzido por
duas instituições religiosas: Adventistas e Testemunhas de Jeová.

De acordo com Assis (2012), por meio de vasta pesquisa de campo em diferentes
instituições religiosas, após análise da trajetória de determinados agentes,
documentos e entrevistas, é possível afirmar que os espaços religiosos são palco do
início da história da comunidade surda. Há registros de que foram esses espaços
que contribuíram grandemente para pesquisas na atualidade, por serem pioneiros
no trabalho com os surdos e constituírem um grande cenário para atuação de
tradutores e intérpretes voluntários. O autor reitera a importância desses agentes e
de suas atividades missionárias cristãs, para a consolidação de um movimento
social surdo, a constituição de um mercado vinculado à Libras e a construção de um
campo acadêmico que confere legitimidade à essa língua.

Nesse sentido, os materiais audiovisuais em libras que circulam no contexto


religioso podem ser entendidos como fontes para pesquisa na área dos estudos da
tradução e grande acervo para entender como se dá o processo dialógico entre
instituição, tradutor e público-alvo, uma compreensão das relações de poder, de
diferentes vozes que circulam nesses espaços e suas influências nessas traduções.

Adotamos como metodologia a pesquisa bibliográfico-documental e de campo, com


base em uma abordagem qualitativa com caráter exploratório e descritivo, que busca
respostas a questões particulares dessas produções culturais.

Segundo Gaio, Carvalho e Simões (2008), quando utilizamos documentos na


pesquisa, objetivamos extrair deles informações, usando técnicas apropriadas para
seu manuseio e análise. Para tal, seguimos etapas e procedimentos; organizando
informações a serem categorizadas e posteriormente analisadas; por fim,
elaboramos sínteses, ou seja, na realidade, as ações dos investigadores – cujos
33

objetos são documentos – estão impregnadas de aspectos metodológicos, técnicos


e analíticos:

Para pesquisar precisamos de métodos e técnicas que nos levem


criteriosamente a resolver problemas. [...] é pertinente que a pesquisa
científica esteja alicerçada pelo método, o que significa elucidar a
capacidade de observar, selecionar e organizar cientificamente os caminhos
que devem ser percorridos para que a investigação se concretize (GAIO,
CARVALHO e SIMÕES, 2008, p. 148).

Entendemos que a abordagem qualitativa esta de acordo com os objetivos dessa


pesquisa, uma vez que procura identificar os elementos linguístico-discursivos que
influenciam na tradução de um texto sensível e que as escolhas tradutórias em torno
de textos sensíveis são carregadas de valores ideológicos, éticos e morais da
instituição que financia produção, circulação e divulgação dessas obras.
A referida metodologia norteia todo o processo de análise textual e os
questionamentos quanto à escolha do léxico, tendo em vista que o texto exige um
embasamento teológico aprofundado e que não oferece possibilidades para
adicionar informações pessoais ou contextualizadas. É um texto sensível, pois sua
compreensão exige um conhecimento prévio sobre Deus e sua relação com o
homem.

Na pesquisa documental, Silva et. al.(2009) afirma que os dois procedimentos são
fundamentais: a coleta de documentos e a análise de conteúdo. Na coleta de dados
o pesquisador deve fazer garimpagem das fontes, isto é, o recolhimento e a pré-
análise dos documentos que estejam em consonância com os objetivos da pesquisa.
Depois de selecionada a amostra documental, segue-se o trabalho com a
determinação de unidades de análise, eleição de categorias e a organização do
quadro de dados.

Marcos Napolitano (2010) sugere um conjunto de possibilidades metodológicas que


vêm sendo utilizadas por especialistas em fontes de natureza não escrita. Ele
aponta

a necessidade de articular a linguagem técnico estética das fontes


audiovisuais e musicais (ou seja, seus códigos internos de funcionamento) e
as representações da realidade histórica ou social nela contidas(ou seja,
seu “conteúdo” narrativo propriamente dito (NAPOLITANO, 2010, p. 238).

É necessário, portanto, para Napolitano, indagar, num primeiro momento, o objeto


sobre elementos linguísticos peculiares a essa língua visual espacial e, num
34

segundo momento, as influências ideológicas e as marcas de influências históricas


culturais.

Precisamos explicar que esta pesquisa foi pensada inicialmente como uma pesquisa
bibliográfico-documental, no entanto tivemos a oportunidade de visitar os espaços
onde aconteceram as gravações desses vídeos em análise, portanto nossa pesquisa
se ampliou para uma pesquisa de campo. Devido a isso, tivemos que recorrer a
procedimentos teórico-metodológicos relativos à pesquisa de campo, como
entrevista, que é um dos instrumentos utilizados para coleta de dados, e diário de
campo com informações sobre o que observamos no espaço.
Um dos modelos mais utilizados é o da entrevista semiestruturada, guiada pelo
roteiro de questões, o qual permite uma organização flexível e uma maior ampliação
dos questionamentos, à medida que as informações vão sendo fornecidas pelo
entrevistado (FUJISAWA, 2000). Desse modo, elaboramos um questionário
(ANEXO E) com dez perguntas que nortearam nossa entrevista.

O diário de campo é um instrumento utilizado pelos investigadores para


registrar/anotar os dados recolhidos para posteriores interpretações. Neste sentido,
o diário de campo foi a ferramenta utilizada nesta pesquisa para sistematizar as
experiências e basilar as análises dos resultados.

4.1 INÍCIO DA PESQUISA

4.1.1 Diário de campo

Após pesquisar o endereço e contato dos espaços de tradução das Testemunhas de


Jeová e dos Adventistas, entrei1 em contato para agendar a visita. Com data e
horário marcado para entrevista cheguei aos espaços de tradução. Ambos
localizados no estado de São Paulo, os das Testemunhas de Jeová, conhecida
como Associação Torre de Vigia - Betel, situada em um município chamado Cesário

1
O uso do verbo na primeira pessoa do singular se faz de forma proposital nas partes que se referem
aos relatos das entrevistas e visitas aos espaços de tradução que foram feitas exclusivamente pela
pesquisadora. Nas demais partes da escrita do trabalho, optamos pelo uso do verbo na primeira
pessoa do plural por entendermos que nosso discurso foi atravessado por outras vozes.
35

Lange. A entrevista com os Adventistas aconteceu na União Central Brasileira da


Igreja Adventista do Sétimo Dia em Artur Nogueira, em São Paulo.

Nos dois espaços fui recepcionada pela equipe de tradução, conheci os espaços, as
equipes, os equipamentos utilizados e os processos que são seguidos até que a
tradução seja de fato publicada. A entrevista foi gravada em áudio e vídeo, o
questionário elaborado em dez perguntas foi respondido em tom descontraído e com
informações riquíssimas que podem ser lidos nos anexos “C” e “D” deste trabalho.

As Testemunhas de Jeová nos explicaram (ANEXO D) que eles possuem etapas e


protocolos a ser seguidos no processo de tradução. Esse processo é adotado
rigorosamente por toda equipe. São protocolos tanto de revisão da tradução como
de avaliação feita pelos Surdos que são convidados para a validação. O trabalho da
equipe entrevistada, composta por Revisor (Surdo), tradutor (ouvinte), e
confrontador(ouvinte), nos mostrou muita eficácia e preocupação com a qualidade
dos seus materiais. Foi explicado que as mulheres não podem atuar como
tradutoras de textos bíblicos. Essa função é exclusiva aos homens. De igual modo,
os surdos não participam como tradutores, devido ao fato de terem dificuldade com
o português, língua do texto fonte.

Imagem 1: Esquema das Etapas de Tradução

Os Adventistas, por sua vez, me explicaram (ANEXO C) algumas etapas a serem


seguidas, porém, percebi não haver uma padronização. Eles trabalham com maior
flexibilidade e adaptação. Dependendo da equipe e do material a ser traduzido, é
possível perceber a ausência de protocolos padrão para validação e revisão de seus
materiais. Uma particularidade é a ausência de tradutores ouvintes. Todos os
tradutores são surdos, os ouvintes atuam apenas como apoio no processo
tradutório.
36

A partir dos direcionamentos que esse tipo de pesquisa nos aponta, elaboramos um
conjunto de procedimentos que nos pareceu mais adequado para analisar esses
vídeos, assim, desenvolvemos uma análise baseada nos estudos Bakhtinianos da
linguagem, procurando englobar todos os elementos linguístico-discursivos que
influenciaram na produção do objeto de pesquisa. Bem sabemos que os resultados
e conclusões de uma pesquisa são sempre provisórios e flexíveis. A seguir
descreveremos os vídeos em Libras, embasados nos conceitos do referencial
teórico e nos procedimentos metodológicos aqui descritos.
37

5 DESCRIÇÃO DO VÍDEO 01

Considerando que esta pesquisa é também de caráter documental, iniciaremos esse


capítulo com a descrição e análise de dois vídeos extraídos da Bíblia Sagrada
Cristã, recorte do livro de Êxodo capítulo 20: 1-17 para língua de sinais, traduzido
por duas instituições religiosas, Adventistas e Testemunhas de Jeová. Esse recorte
é conhecido entre os cristãos como os “Dez Mandamentos”, regras de conduta ética
e moral, dadas por Deus ao povo de Israel e que para muitas comunidades cristãs
vigoram, numa ou outra medida, até os dias atuais.

O primeiro registro, considerado um marco histórico do movimento, que deu início ao


ministério Adventista dos Surdos no Brasil, aconteceu por volta do ano de 1943, no
bairro Liberdade no Estado de São Paulo. O primeiro grupo de surdos acolhido na
igreja Adventista da Liberdade era liderado por Luiz Melito (Surdo falecido em 1996),
já a primeira intérprete da época era Cláudia Dantas de Almeida. Durante todos
esses anos, o trabalho com os Surdos na igreja Adventista avançou. Uma
importante ferramenta de divulgação utilizada é o site do Ministério
(www.surdosadventistas.com.br), criado em 30/09/2009. Essa ferramenta tem sido
importante para apoio e divulgação dos Surdos no Brasil e no mundo. São mais de
5.000 visualizações por mês.

Pastor Larry Evans, líder do ADMI (Adventist Deaf Ministries Internacional) na sede
mundial da igreja Adventista, tem feito visitas frequentes ao Brasil, para conhecer os
desafios e apoiar os projetos voltados para essa comunidade. Ele tem coordenado o
trabalho em vários países, como EUA, Quênia, Coreia do Sul, dentre outros, pois, na
sua visão, o ministério no Brasil tem se tornado referência mundial para igreja
Adventista, em consequência do volume de materiais que tem sido traduzido para
LIBRAS, da qualidade dos congressos e dos treinamentos realizados em todo
território nacional.

Segundo a líder da equipe que coordena a tradução (vide entrevista ANEXO C), a
partir de 2008, a DSA - Divisão Sul Americana (organização que administra a igreja
Adventista nos seguintes países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Ilhas
Malvinas, Paraguai, Peru e Uruguai, com algumas ilhas adjacentes nos Oceanos
38

Atlântico e Pacífico), localizada em Brasília-DF-Brasil, ficou responsável pela


tradução de vários materiais em língua de sinais, como a tradução de livros
missionários, estudos bíblicos, projetos sociais contra violência e orientação de
saúde, entre outros. Para melhor qualidade e após reunião consultiva da
comunidade surda Adventista, foi organizada uma equipe de tradução, composta por
surdos, intérpretes e pastores. Um dos maiores projetos é a tradução sistemática da
Lição da Escola Sabatina (Guia de estudo diário), no qual tradutores Surdos de
vários estados brasileiros são convidados para gravação desse periódico trimestral.
Os materiais gravados são disponibilizados no site e reproduzidos em DVDs para
distribuição gratuita.

5.1. OS DEZ MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELOS ADVENTISTAS

Os Dez Mandamentos em Libras traduzidos pelos adventistas não faz parte de uma
tradução sequencial ou sistemática dos livros da Bíblia Sagrada. Trata-se de um
recorte, uma literatura missionária baseada no conceito adventista de que a
observância desses dez princípios dados a Moisés no monte Sinai, traz, ainda nos
dias atuais, uma promessa de vida feliz. O material tem como objetivo principal, além
da nutrição espiritual, o acesso de seus membros Surdos a essa temática e a
distribuição é feita de forma gratuita em projetos de evangelização de Surdos
brasileiros usuários da língua de sinais ou a qualquer interessado.

A produção do vídeo remete a um padrão de tradução formal. Percebemos


elementos de ordem didática, uma interpretação de trechos do texto bíblico, com
explicações e contextualizações que são construídas no intuito de esclarecer
detalhes do texto religioso. O texto, ao ser traduzido, foi reorganizado. Observamos
na primeira cena a criação de uma introdução com subtítulo “Um convite e uma
promessa”, detalhado em dez capítulos. Cada capítulo descreve um mandamento.
Nesses capítulos encontram-se subdivisões para explicação do texto. Ao iniciar cada
capítulo, o tradutor utiliza uma tradução do texto bíblico referente ao mandamento
que será explicado em seguida.
39

CAPA INTRODUÇÃO

SUMÁRIO
Imagem 2: Produção dos vídeos de “Os 10 mandamentos”

Gravado em São Paulo, em uma clínica de vida saudável localizada em São Roque,
em tom de conversa informal, o vídeo encontra-se disponível na internet, no canal
do youtube: Surdos Adventistas (https://www.youtube.com/channel/UC-7-
ugc_hCMsD37tLLu1WmQ). Também por meio do site
“www.surdosadventistas.com.br”, é possível adquirir gratuitamente a coleção de
DVDs, que é distribuído por essa instituição.

O pastor Douglas Silva e sua esposa Karen Sanches, ambos surdos, iniciam uma
tradução comentada. O cenário passa ao leitor uma intenção de leveza, assim como
o tom da sinalização durante todo o discurso. Os tradutores sinalizam sentados em
duas cadeiras, em ângulo que remete à intenção de diálogo. Ao fundo, uma janela
rústica, com vidraças transparentes, possibilita visualizar elementos da natureza,
como vento balançando as árvores, ramos e raízes penduradas, árvores de
diferentes espécies e a luz solar.
40

Imagem 3: Apresentação dos tradutores I

O vídeo utiliza-se do recurso legenda apenas para apresentação dos tradutores e


para fazer referências ao texto que está sendo sinalizado. Não há qualquer tipo de
recurso de áudio. A produção optou por não utiliza recursos imagéticos. Marca de
identificação religiosa e critérios éticos que regulamentam as produções em língua
de sinais foram considerados, pois a roupa do tradutor não possui estampas ou
artefatos que atrapalhem a visualização do leitor. O Pastor utiliza camisa social de
cor azul clara e gravata preta, respeitando o padrão ético de sua profissão e o grau
de formalidade exigido. Sua esposa Karen se apresenta vestindo camisa e saia na
cor preta, dentro das regras de modéstia cristã estabelecidas pela instituição que
financia essa produção.

Imagem 3: Apresentação dos tradutores II

Na formalidade da tradução literal dos versículos bíblicos traduzidos, percebemos


que o léxico utilizado pelo tradutor é genérico. São sinais comuns a várias
comunidades cristãs. Desse modo, surdos com acesso a sinais religiosos
conseguirão compreender o sinalizador.
41

Apresentaremos, a seguir, uma amostra da tradução de quatro dos Dez


Mandamentos por meio do recurso de decupagem, seguida de glosas da
sinalização. A tradução dos outros seis mandamentos se encontra no anexo A.

5.1.1 Decupagem do objeto de análise

5.1.1.1 1º Mandamento

Não terás outros deuses diante de mim (Êxodo 20:3).

< OUTROS++ IDOLOS++ NÃO-TER>n NADA>

<ELES SUBSTITUIR DEUS NÃO >n


Imagem 4: 1º Mandamento - descrição

O texto produzido constrói, de acordo com os conceitos bakhtinianos, um produto


ideológico, pois no primeiro mandamento, êxodo 20:3, o tradutor começa
referenciando a ideologia “monoteísta”, ancorada pelo viés cristão adventista, que
crê em Deus como único ser digno de adoração e que nenhum ídolo ou imagem
poderá substituí-lo. O sinal utilizado pelo tradutor Adventista é em configuração de
mão em “d” direcionada para o céu. Nesse versículo, não aparece incorporação de
personagem, o tradutor produz a narrativa em terceira pessoa.
42

5.1.1.2 2º Mandamento

E disse Deus:
Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há
em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.
Não te encurvarás a elas nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus,
sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos, até a terceira e
quarta geração daqueles que me odeiam. E faço misericórdia a milhares
dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos (Êxodo 20:
4-6).

<NÃO ÍDOLOS EVITAR TERRA>

<ÁGUA TERRA-MODELAR OU PAU>

<OU PEDRA COISAS EVITAR>

<EVITAR COPIAR CÉÚ COISAS>


43

<EXEMPLO PÁSSAROS ESTRELAS LUA>

<SOL COPIAR FAZER ÍDOLOS>

<EVITAR OU PRÓPRIO TERRA>

<ANIMAL PESSOAS COPIAR ÍDOLOS>

<EVITAR OU PRÓPRIO DO>


44

<MAR VER PEIXE LEGAL>

<FAZER IDOLOS EVITAR PORQUE>

<DEUS É SENHOR DEUS>

<FOCO PESSOAS VIGIAR>

<CARINHO DEUS ENTÃO DEUS>

<SABE CADA PECADO MAL>


45

<PAI MÃE FILHOS GERAÇÃO>

<ATÉ PRIMEIRA SEGUNDA TERCEIRA QUARTA>

<ATÉ TODAS DEUS ESSAS>

<PESSOAS DESPREZAR DEUS MAS>

<POREM PESSOAS ESSAS AMAR>

<OBEDECER DEUS DEUS TER>


46

<MISERICÓRDIA>
Imagem 5: 2º Mandamento – descrição

Podemos verificar que o tradutor Surdo usou o sinal “EVITAR” para transmitir a ideia
de “NÃO” ou “PROIBIDO”, conforme entrevista (ANEXO C). Essa escolha se deve
ao fato histórico de que o Surdo passou por momentos de proibições traumáticas.
Enquanto, segundo ele, o sinal de “NÂO” carrega sentimentos de opressão, o sinal
de “EVITAR”, muito utilizado pela comunidade Surda para aconselhamento, seria
aceito de forma mais confortável. A intenção do tradutor, conforme entrevista, foi
provocar uma aproximação emocional do público alvo.

Nesse sentido, baseado nos estudos de Bakhtin (1986) de que o sentido de uma
palavra é construído a partir de uma situação histórica, e que poderemos apreender
o enunciado, o querer dizer, a significação da palavra a partir dessa situação,
conhecendo toda trajetória histórica que o Surdo vivenciou, o sinal de “NÃO e
PROIBIDO” são carregadas de marcas negativas, o que causaria um afastamento
do Surdo da intenção do enunciador.

Observamos também, baseados nas considerações de Sobral (2008), que o tradutor


precisa se fazer entender pelo leitor alvo da tradução. É preciso refletir se o
enunciado está fiel à intenção do texto original. Nesse mandamento, por exemplo, se
o leitor Surdo não tiver contato com discurso presente no texto fonte é possível que
não haja compreensão. Na tradução percebemos a omissão da informação que é
proibida a adoração de imagens esculpidas. Em nenhum momento, o tradutor
utilizou algum sinal ou construção da ideia/ação de uma adorar a ídolos ou da ação
de se encurvar a elas ou servi-las conforme o discurso que esse mandamento
sugere. Em vez disso, ele se utiliza de sinais presos ao texto em português, como
“<IMAGEM ESCULPIDA EVITAR COPIAR NÃO>n”, porém o ato de adorar a elas
não aparece na sinalização. Está clara a informação de que se deve evitar copiar e
fazer ídolos, mas a parte da adoração a eles não aparece no enunciado.

O tradutor utiliza o sinal de “FAZER”, porém não incorpora a ação de construir um


ídolo, o que restringe o público alvo que será alcançado. Desse modo, um leitor
Surdo que vive em contato com comunidades evangélicas que não possuem essa
prática de adoração a imagens, é possível que ele entenda por já ter um contato
47

prévio com essa orientação. No entanto, o leitor Surdo que não convive com essa
ideologia ou o Surdo que vive no interior e talvez não tenha tanto acesso à Língua
de Sinais, dificilmente entenderá o enunciado. Neste caso a utilização de
classificadores facilitaria, pois ao classificar a ação de construir um ídolo traria uma
melhor compreensão para todos os tipos de leitores.

5.1.1.3 3º Mandamento

“Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão; porque o Senhor não terá por
inocente o que tomar o seu nome em vão” (Êxodo 20:7).

<NOME DEUS ATOA 1PROVOCAR2>

<NÃO>n ELE DESCULPA>do EU>

<INOCENTE DEUS ACEITAR-NÃO>n


Imagem 6: 3º Mandamento - descrição

A tradução cultural, de acordo com Sobral (2008), acontece quando o tradutor


aproxima a palavra à cultura do receptor. Nesse mandamento, por exemplo, para a
expressão “em vão”, a tradutora utiliza o sinal de “à toa”. Em seguida, percebemos
que o verbo que aparece no texto fonte “tomarás”, que representa a ideia de “falar”
ou “usar” para a cultura dos ouvintes, foi substituída pelo sinal de “provocar”, uma
48

vez que o surdo não tem essa cultura de ficar “falando” o nome de Deus o tempo
todo como alguns ouvintes o fazem.

5.1.1.4 5º Mandamento

“Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o
Senhor teu Deus te dá” (Êxodo 20:12).

<NOS PRECISAR 1OBEDECER2 PAI>

<MÃE SUA>

<VIDA BOA PROLONGAR>


Imagem 7: 5º Mandamento – descrição

As omissões aparecem com frequência nas traduções, consistem na ausência de


algum elemento do texto original. Às vezes essas omissões acontecem de forma
consciente ou inconsciente. No 5º mandamento, que faz referência a uma benção
divina aos que honram pai e mãe, percebemos que a tradutora omite o sujeito
provedor dessa benção. É construída a ideia de que honrar pai e mãe prolongam a
vida das pessoas. Agora não há referência a Deus ou direcionamentos que passem
a ideia de que essa dádiva de vida longa seja dada por um ser divino. O que fica
evidenciado é que isso será uma consequência natural.
49

5.2 VISITA DE CAMPO E ENTREVISTA

Como forma complementar de compreender como se deu o processo de tradução


desse texto, fiz uma visita ao espaço de tradução dos adventistas e conversamos
com a equipe de tradução para entender quais eram as intenções nas produções
desses materiais em língua de sinais.

De acordo com a atual coordenadora do processo de tradução (ver ANEXO C), a


intenção inicial da instituição seria produzir um material evangelístico de qualidade,
que atendesse a todos os tipos de público alvo surdo existente no Brasil. Porém, ela
reconhece que ainda os protocolos e critérios para que isso de fato aconteça ainda
não foram todos padronizados por essa instituição. Preocupados com o
regionalismo, e em atender de forma representativa, a atual equipe é composta por
Surdos de diferentes regiões do Brasil, porém o tempo de organização dos projetos,
a rotatividade de equipe e a estrutura itinerante que é montada para as gravações
não suprem todas as necessidades que o processo tradutório exige.

[...] avançamos muito na quantidade e qualidade das traduções, porém


existem alguns outros critérios que desejamos melhorar e estamos
trabalhando para que isso de fato aconteça (ANEXO C).

Desde as primeiras traduções feitas por eles, a maior preocupação dos Adventistas
tem sido restringir a atuação a tradutores Surdos nessas produções, o que, na visão
da equipe, proporciona uma tradução com maior aceitação, pelo fato de o Surdo ser
o falante nativo da língua em questão.

[...] O ouvinte nesse processo tem o papel de apoio ao tradutor Surdo,


explicando os conceitos de palavras difíceis do português, na compreensão
do texto bíblico e na parte técnica da edição do vídeo, assim como na
construção do texto base em português, porém o tradutor para gravação é
somente o Surdo (ANEXO C).

De acordo com a entrevista em anexo, um dos recursos é a utilização de uma


imagem de fundo que combine com o assunto abordado na sinalização, respeitando
o objetivo e o tom do texto fonte. A roupa do tradutor também é um critério que está
sempre dentro dos padrões estabelecidos, conforme trecho da entrevista em anexo.

[...] a roupa precisa seguir um padrão,... ela precisa ser neutra, não pode
ser estampada, ou de listras, é necessário que seja de cor suave, algo
50

chamativo, exagerado não e aceitável, porque é preciso facilitar a


percepção visual do Surdo (ANEXO C).

De acordo com a coordenadora da equipe, reuniões administrativas com líderes e


pastores responsáveis estão sendo articuladas para melhor estruturar o processo
tradutório e principalmente para intensificar a revisão de tradução que hoje não é
feita de forma satisfatória bem como para sistematizar o processo de feedback de
seus leitores. Segundo umas das tradutoras entrevistadas, a meta das traduções
produzidas é atingir todos os níveis de leitores existentes.

[...] existem variados níveis de pessoas surdas, podemos citar os Surdos


Doutores, mestres, ou seja, diferentes níveis acadêmicos, depois os Surdos
de nível médio, Surdos com acesso ao estudo de forma geral, a ainda
aqueles Surdos que conhecem alguns sinais, porém estão afastados da
comunidade Surda por serem oralizados, e por último temos aquele grupo
de Surdos que se comunica por gestos, que não conhecem a língua de
sinais, utilizam sinais caseiros para se comunicar e a maioria deles vive em
regiões do interior sem acesso ou contato a comunidade Surda, .... para
uma maior clareza de todos esses níveis apresentados, procuro utilizar
classificadores e incorporação de personagens para que a tradução seja
acessível a essa variedade de leitor... se no momento da gravação a Joyce
(Surda que coordena a equipe de tradutores) percebe algum construção
que não está clara, retornamos a essa parte e gravamos novamente
(ANEXO C).

Imagem 8: Equipe/Estrutura de Tradução dos Adventistas

5.3 COMENTÁRIOS GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO DOS ADVENTISTAS

Na tradução utilizada pelos adventistas, percebemos o uso de intensa sinalização.


Eles usam mais sinais do que construção de cena, o tradutor na maioria das vezes
faz o sinal do verbo, mas não incorpora a ação do verbo. Não há uma
51

incorporação/encenação do personagem “Deus” pelos sinalizadores. Apesar de o


discurso estar em primeira pessoa no texto-fonte, indicando Deus como o autor das
leis como em “Não terás outros deuses diante de mim” (ÊXODO, 20:3), os tradutores
surdos constroem o discurso em terceira pessoa, fazendo referência a Deus por
meio dos sinais “DEUS” ou pelo uso da referenciação por meio do pronome “ELE”
(apontamento para o alto e para a direita). Desse modo, acabam por se tornar
narradores do discurso de Deus; ou seja, acabam por reconstruir o discurso de Deus
com sua próprias palavras, o que, a nosso ver, favorece o uso de acréscimos à
tradução em relação ao texto-fonte.

Percebemos esses acréscimos, por meio de comentários dos tradutores,


explicitações no sentido de esclarecer ao leitor surdo os sentidos de certos
enunciados, conforme pode ser observado nos quatro primeiros mandamentos.

No 1º mandamento após traduzir que não deve “ter” outros deuses, aparece o
acréscimo explicativo que esses deuses não podem “SUBSTITUIR” Deus. No 2º
mandamento os acréscimos aparecem na descrição imagética, o tradutor cita
exemplos de animais e objetos que tomam forma de deuses, como aves, lua,
estrelas, pau, pedras entre outros. Entretanto, esses exemplos não aparecem
explícitos no texto fonte. Já 3º mandamento, o acréscimo no discurso aparece
quando a tradutora utiliza o sinal de “PROVOCAR” não existente no texto fonte.
Esse acréscimo aparece no sentido de esclarecer o enunciado. Por fim, no 4º
mandamento, por exemplo, quando o tradutor utiliza o sinal de “SUBSTITUIR”,
percebemos um acréscimo para explicar que o trabalho deve ser evitado também
por terceiros. No texto fonte aparece a ordem “não farás nenhuma obra, nem tu,
nem teu filho, filha, servo, estrangeiro que está dentro das tuas portas, etc...”. O
tradutor então faz a seguinte construção <PESSOA DENTRO SUA CASA
SUBSTITUIR TRABALHO EVITAR>.

Por fim, consideramos que a tradução dos trechos referentes aos dez
mandamentos, a escolha do vocabulário (EVITAR, NÓS-PRECISAR), os
acréscimos, o uso de terceira pessoa entre outros produzem um efeito amenizante
em relação ao discurso do texto fonte, no qual há marcas de imposição, exigência
ao cumprimento das leis com punições a quem descumpri-las. Já, na tradução,
percebemos um texto mais leve, de aconselhamento, que é reforçado, inclusive,
52

pela posição dos tradutores que estão sentados, e dos textos contextualizadores
que sucedem os excertos bíblicos. O que pode passar a impressão de que os Dez
Mandamentos figuram como sugestões para a vida do cristão.
53

6 DESCRIÇÃO VÍDEO 02

As Testemunhas de Jeová, segundo informações disponíveis no site jw.org, dentre


as diversas frentes de trabalho voluntário, destacam-se pela significativa
contribuição social no trabalho realizado com os surdos. Em vários países,
voluntários, Testemunhas de Jeová ajudam milhares de surdos interessados na
mensagem que eles pregam, desde a alfabetização na sua primeira língua, como a
LIBRAS no Brasil e a LGP em Portugal, passando pelo idioma escrito de sua região,
quando se aplica. Atualmente equipes de tradutores ao redor do mundo traduzem,
produzem e distribuem gratuitamente publicações em vídeos DVDs em várias
Línguas de Sinais para o benefício dos surdos já associados com as Testemunhas
de Jeová, fornecendo suporte para várias congregações em Língua de Sinais em
diversos países.

Segundo eles, há diversas publicações em Línguas de sinais, incluindo partes da


Bíblia, todas em vídeos. Os intérpretes TJ, como são conhecidos, proporcionam
muito mais do que ajuda espiritual, servindo os surdos, acompanhando-os em
escolas, médicos, advogados, entrevistas de emprego, etc. Também estendem aos
familiares e colegas de trabalho dos surdos Testemunhas de Jeová a oportunidade
de conhecer a língua de sinais, usando para isso DVDs visuais ou outras
publicações produzidas pelas próprias Testemunhas de Jeová, com o objetivo de
facilitar o aprendizado e a inclusão social e espiritual dos surdos às suas famílias e
comunidades, aproveitando a ocasião para propagar sua fé entre essas pessoas, na
esperança de que elas também se tornem Testemunhas de Jeová.

De acordo com a entrevista (ANEXO D), no Brasil, no ano de 1982 foi formada a
primeira congregação em língua de sinais no Rio de Janeiro. Oito anos mais tarde
foi formada a segunda congregação em São Paulo, no ano de 1997 foi realizado o
primeiro congresso em Ribeirão Preto- SP, e até os dias atuais várias congregações
e congressos são realizados por todo país.

Conforme entrevista (ANEXO D), a organização das Testemunhas de Jeová se


preocupa em divulgar os seus ensinos por meio de milhões de publicações de
páginas de informação em várias centenas de línguas, sem esquecer os que têm
54

necessidades especiais, tal como os surdos ou cegos. Os TJ pregam de casa em


casa semanalmente para os surdos, com o objetivo de divulgar o reino de Jeová
Deus. Também, realizam estudos bíblicos gratuitos com os interessados em
aprender sobre a Bíblia. Durante essas visitas, os religiosos fazem exposição de
vídeos voltados para o aprendizado bíblico.

No Brasil há em média 700 grupos de surdos reunidos nas congregações das


testemunhas de Jeová. São atualmente mais de 220 congregações, que fazem
reuniões totalmente em Língua de Sinais. Porém em alguns lugares devido a menor
quantidade de surdos são organizados grupos de intérpretes que interpretam a
reunião dos ouvintes, sendo mais de 470 grupos no Brasil. Foi relatado que a
instituição tem registro de mais de 2.600 surdos que se colocaram à disposição para
ir à casa de outros surdos para ensinar o idioma e também dar cursos bíblicos.

As Testemunhas de Jeová mantêm um site próprio como página oficial de sua


organização. O “jw.org” está no ar com o formato atual, desde 2007, e a partir de
sua reformulação tem postado vídeos em Língua de Sinais. Porém eles usam sites
na internet desde 1997. Esse site inclui informação educativa publicada em 921
idiomas, como português, inglês, Chinês, Francês, Espanhol, Assírio, Bengali, Twi
entre outros idiomas, bem como mais de 80 Línguas de Sinais do mundo todo. Há
vídeos em Língua de Sinais Americana, Língua Brasileira de Sinais, Língua de
Sinais Colombiana, Língua de Sinais Japonesa, Língua Gestual Dinamarquesa,
entre outras, destacando artigos de suas publicações e esclarecendo ao público
suas crenças e identidade.

Site https://www.jw.org/pt
Imagem 9: Site da tradução Novo Mundo
55

As publicações são elaboradas para os surdos, na sede mundial nos Estados


Unidos. O texto em inglês é então encaminhado para uma das equipes de tradução,
no caso do Brasil para a filial das testemunhas de Jeová, Betel, em São Paulo, onde
são elaborados e editados os vídeos voltados para os surdos, por uma equipe de
tradução da Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. A distribuição dos vídeos se dá em
nível nacional, sem custos financeiros. A obra de educação religiosa é mantida pelos
próprios membros da congregação, por meio de donativos. Nos centros de reunião,
conhecidos por Salões do Reino, os surdos e seus familiares podem aprender Libras
por meio de um curso gratuito e sem distinção religiosa.

No início da década de 1980, uma equipe de voluntários de vários países


desenvolveu o MEPS, ou Sistema eletrônico de fotocomposição multilíngue, que
atualmente tem capacidade de auxiliar a traduzir matérias em 921 idiomas. Hoje
milhares de voluntários trabalham em seus departamentos de tradução em todo o
mundo. Lembrando que o MEPS não traduz. A tradução é feita por pessoas, mas ele
ajuda a editar em qualquer idioma que se deseja traduzir, incluindo a língua de
sinais.

De acordo com arquivos históricos disponíveis no site “jw.org” sobre o marco nas
edições e traduções, em 2009 em entrevista disponível neste mesmo site, o
coordenador de tradução falou do Centro Educacional da Torre de Vigia em
Patterson, Nova Iorque, onde muitos dos detalhes de tradução são organizados.
Segundo ele, "em alguns casos as línguas em que as Testemunhas de Jeová
empreendem a tradução das publicações da Bíblia têm apenas alguns milhares de
leitores, um fator claro que elimina qualquer sugestão de que a motivação seja a
financeira." E acrescentou: “Chegamos nesta medida na edição e tradução porque
nos preocupamos com as pessoas e queremos que o maior número possível se
beneficie de tesouros descobertos apenas com um estudo da Bíblia”.
56

Imagem 10: Materiais utilizados pelas testemunhas de Jeová para ensino religioso dos surdos.

6.1 OS DEZ MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELAS TESTESMUNHAS DE


JEOVÁ

Os Dez Mandamentos em Libras, traduzidos pelas Testemunhas de Jeová, faz parte


de um projeto de tradução para libras da Bíblia Sagrada na tradução do novo mundo
(revisada em 2015). Essa tradução “novo mundo”, feita pelos próprios tradutores da
instituição, com a justificativa de que muitos tradutores da Bíblia tomaram
despropositadamente a liberdade de omitir o nome de Deus, Jeová, das traduções
modernas, embora esse nome seja encontrado em antigos manuscritos da Bíblia.
Nas entrevistas em anexo (ANEXO D) percebemos uma preocupação da instituição
em manter a ideia de que a Bíblia originalmente foi escrita em idioma hebraico,
aramaico e grego antigo. No prefácio da edição original em inglês da Tradução do
Novo Mundo, encontramos a seguinte declaração: “Não apresentamos nenhuma
paráfrase das Escrituras. Fizemos esforços para fornecer uma tradução o mais literal
possível, conforme o idioma inglês moderno permite, e sempre que a tradução literal
não ocultar a ideia por causa de alguma estranheza.” Assim, a Comissão da
Tradução do Novo Mundo da Bíblia se esforçou para alcançar um equilíbrio entre
usar palavras e expressões que reflitam as originais, e, ao mesmo tempo, evitar um
fraseado que soe estranho ou obscureça o verdadeiro sentido. Em resultado disso, a
Bíblia pode ser lida com facilidade e o leitor pode, segundo eles, confiar plenamente
que a mensagem inspirada foi transmitida com exatidão.
57

Ainda não há a tradução de toda a Bíblia para Língua de Sinais, conforme entrevista
em anexo, os tradutores explicam que o processo é mais lento e trabalhoso, não é
uma tarefa fácil, e existe uma preocupação na qualidade dessa tradução. É preciso
que esteja dentro dos critérios estabelecidos pelas testemunhas de Jeová, para que
o material traduzido chegue até o público surdo da mesma forma que para o ouvinte:
um texto claro e inteligível na língua dele. Eles estão realizando essa tarefa aos
poucos, livro por livro.

A decisão foi então começar pelos livros de Mateus a Apocalipse, que são
conhecidos como Novo Testamento. Apesar de considerar toda a Bíblia como
importante, muitas de suas doutrinas são extraídas dos primeiros livros do Novo
Testamento. A escolha de começar a tradução para língua de sinais por esses livros
acontece exatamente por serem os livros mais usados por eles. Segundo entrevista,
após concluir a tradução do Novo Testamento, começaram então o Velho
Testamento, que são os livros de Gêneses a Malaquias. A escolha da sequência
que esses livros serão traduzidos é avaliada de acordo com a necessidade e com o
grau de importância do conteúdo.

Baseados nas etapas do projeto de tradução da Bíblia descritos acima, que


acontece a tradução do livro de Êxodo. O objeto de análise deste trabalho, os Dez
Mandamentos, aparece no capítulo vinte desse mesmo livro. O objetivo principal,
além da parte espiritual, seria o acesso de seus membros Surdos à palavra de Deus
Jeová em sua própria língua.

A produção do vídeo respeita todas as regras da instituição, seguindo todos os


protocolos padronizados pela sede norte-americana, desde a cor do fundo até o
estilo da roupa dos tradutores e a ordem que será construído o discurso. Detalhes
como o tom e o tipo textual são respeitados. Segundo eles, qualquer alteração ou
adaptação que precise ser feita para aproximação cultural do público Surdo
brasileiro, necessita ser justificada, em formulário, e enviada por e-mail para sede
mundial, o que pode ser aprovado ou não pela instituição.

O tradutor é ouvinte, e constrói sua narrativa na primeira pessoa; ou seja, Deus


Jeová falando diretamente ao povo, uma narrativa carregada de ordenanças a
serem seguidas pelo povo a quem o discurso estava sendo direcionado. As escolhas
58

do tradutor deixam claro que não é um texto em tom de aconselhamento ou


explicativo, e que a imagem que interpretam de Jeová não é de um Deus
benevolente e sim um Deus mais rigoroso. Suas construções são carregadas de
imposições, ordenanças e regras. No discurso o tradutor constrói também cenas das
consequências ditas por Deus Jeová aos que (des)obedecerem a essas
ordenanças.

6.1.1 Decupagem do objeto de análise

6.1.1.1 1º Mandamento

“Não tenha outros deuses além de mim” (Êxodo 20:3).

<OUTROS DIVERSOS REVERENCIAR++ OBEDECER++>

<NÃO>n VOCÊS 3pOBEDECER1 LIGAR>

<EU>
Imagem 11: 1º Mandamento – descrição

O tradutor inicia o enunciado construindo a cena de adoração a outros deuses para


depois negá-la. Ele produz a narrativa em terceira pessoa; incorporando o discurso
de Jeová, enfatiza com o sinal de “não” a reprovação dessa atitude.
59

O sinal de “NÃO ou PROIBIDO” é muito usado para enfatizar um Deus que exige o
cumprimento dos mandamentos dado ao povo. As expressões faciais e corporais
que o tradutor utiliza quando vai fazer as negativas, aliadas ao sinal de “NÃO”,
complementam o sentido de reprovação. Especificamente no 1º Mandamento que
reprova o ato de adoração a outros deuses, a forma como o ombro é levantado e
inclinado para frente, o franzir da testa e o movimento da sobrancelha se tornam
exemplos de recurso que provoca intensidade na negação. Esse recurso aparece
em vários outros mandamentos.

6.1.1.2 2º Mandamento

E disse Deus:

Não faça para você imagem esculpida, nem representação de algo que há
nos céus, em cima, ou na terra, embaixo, ou nas águas abaixo da terra. Não
se curve diante delas nem as sirva, pois eu, Jeová, seu Deus, sou um Deus
que exige devoção exclusiva e traz punição pelo erro dos pais sobre os
filhos, sobre a terceira geração e sobre a quarta geração daqueles que me
odeiam, mas que demonstra amor leal até pela milésima geração daqueles
que me amam e guardam os meus mandamentos (Êxodo 20:4-6).

<DEPOIS VOCÊS OLHAR>mc VER CÉU LÁ>do

<IGUAL COPIAR ESCULPIR>

<FORMA>n OU>mc TERRA EMBAIXO>


60

<PROCURAR>do VER ENCONTRAR>int IGUAL COPIAR ESCULPIR FORMA>n OU>mc

AGUA MAR>int EMBAIXO PEIXE ELES>do IGUAL FORMA ESCULPIR FORMA>n

<PROIBIDO>n <FORMA++ IDOLOS VARIOS REVERENCIAR++ OBEDECER++>

<NÃO>n VOCÊS 1OBEDECER2++ DEUS 2OBEDECER1>

<LIGADOS EU JEOVÁ ÚNICO>

<SÓ MAS VOCÊS 2OBEDECER1>


61

<EU ÚNICO NÃO^QUER EU>

<1CONTRA2 EXEMPLO EL@ FILHOS>

<GERAÇÃO FILHOS GERAÇÃO OUTRA>

<AUMENTAR TODA FAMILIA CASTIGAR+>

<SOFRER MAS EL@ 2OBEDECER1 >

<LIGADOS EU EU ORDENAR>
62

<VÁRIAS EL@ ACEITAR 2OBEDECER1 >

<EL@ FILHOS AUMENTAR GERAÇÃO FILHOS AQUEL@ GRUPOS>

<FAMILIA GERAÇÃO ATÉ 1.000>

<EU AMAR>

<1PABENÇOAR3P 1AJUDAR3P++ TODOS>

Imagem 12: 2º Mandamento - descrição

No 2º mandamento o tradutor constrói a cena da ação para depois negá-la, utiliza


descrição imagética de um sujeito que faz imagem e depois nega veementemente.
Esse mandamento aborda uma orientação bastante complexa em relação à idolatria
e/ou adoração a seres da natureza em detrimento à adoração a Deus. Se o tradutor
seguir o português e não o sentido do texto, a informação pode não ficar clara. Para
63

uma maior compreensão, o tradutor faz uso de amplificação do texto fonte para se
fazer entender pelo leitor.

6.1.1.3 3º Mandamento

“Não use o nome de Jeová, seu Deus, em vão, pois Jeová não deixará impune
aquele que usar Seu nome em vão (Êxodo 20:7)”.

< EU JEOVÁ VOCÊS 3POBEDECER1 >

<LIGAR EU VOCÊS DEUS>do

<NOME JEOVÁ IMPORTANTE>

<NÃO>n TANTO FAZ EXPLICAR>int EXPLICAR++ DESPREZAR>


64

<EU 1OLHAR3P IGNORAR>n CORRIGIR CASTIGAR!>

Imagem 13: 3º mandamento - descrição

O ato de incorporar um personagem em Libras permite o tradutor construir o perfil do


sujeito que diz. O texto fonte está na terceira pessoa, porém o tradutor incorpora a
fala na primeira pessoa. Fica claro para o leitor o comportamento, a atitude de Deus
diante dos que obedecem e diante dos que desobedecem a essa norma. O
enunciado termina com o sinal de castigo, mais uma vez evidenciando o rigor de
Jeová sobre aqueles que descumprem os mandamentos.

6.1.1.4 5º Mandamento

“Honre seu pai e sua mãe, para que você viva por muito tempo na terra que Jeová,
seu Deus, lhe dá (Êxodo 20:12).

<PAI MÃE>

<VOCÊ AMAR EDUCAÇÃO RESPEITAR PRECISA>


65

<DEPOIS LUGAR ÁREA EU>

<JEOVÁ 1AJUDAR2 1ABENÇOAR2 EU>

<VER CERTO PAI MÃE>

<AMAR EDUCAÇÃO RESPEITAR JOIA>

<EU 1AJUDAR2 1ABENÇOAR2 ANOS++ >

<PROLONGAR>
Imagem 14: 5º Mandamento – descrição
66

Observamos que a marcação da atitude de Jeová para com os que obedecem está
clara na sinalização. Quando o tradutor diz <JEOVÁ 1AJUDAR2 1ABENÇOAR2 EU>,
é possível compreender que a vida será prolongada aos que obedecem a Deus, e
isso seria uma dádiva divina condicionada à obediência.

6.2 VISITA DE CAMPO E ENTREVISTA

Para Bakhtin (1986), o social prevalece nas produções discursivas; ou seja, o que
uma única pessoa produz está repleto da fala de outros. Sendo assim a linguagem é
necessariamente dialógica, e é por meio desse processo que o sujeito toma
consciência de si próprio, o social antecede o individual. Desta forma, defendo a
importância das análises feitas. Com a oportunidade que tive de visitar o centro de
tradução das Testemunhas de Jeová, foi possível compreender melhor como se deu
o processo de tradução desse texto. Fiz uma visita e conversei com a equipe de
tradução para entender quais eram as intenções nas produções desses materiais
em língua de sinais. Logo, pude “ouvir” com os ouvidos e os olhos, conforme
entrevista em anexo, “as vozes” de outros que atravessam o tradutor de um texto
bíblico.

A entrevista de campo contribuiu com informações riquíssimas (ver ANEXO D);


conheci os processos, a equipe, os estúdios e as ideologias defendidas por essa
instituição. Isso me permitiu entender as marcas doutrinarias que estão fortemente
explícitas nos materiais traduzidos. Segundo a equipe que me recebeu, a instituição
defende a ideia de que mulheres não podem assumir o papel de ensino, por isso
não há tradutoras na tradução da bíblia para língua de sinais.

O respeito da hierarquia está claro para a equipe de tradução; estão acostumados a


seguir os padrões a eles impostos sem muitos questionamentos. De acordo com
eles, todos os padrões vêm da sede mundial, todos os detalhes são decididos lá, e é
passado como se fosse um padrão para o mundo todo. Dessa forma, todos os
países têm que obedecer ao que eles falam, fixando convenções e protocolos.

Conforme entrevista (ANEXO D), foi-me detalhado todo o processo tradutório, desde
a chegada do texto fonte até a publicação do produto final. Conforme a explicação
67

do tradutor, a equipe de tradução é composta por três pessoas: Tradutor (ouvinte),


revisor (Surdo) e confrontador (Ouvinte). O tradutor sinaliza as escolhas dele, o
Surdo atua como revisor, com a função de avaliar se os diferentes Surdos do Brasil
terão a compreensão desejada. Por exemplo, o confrontador também fará uma
análise; se faltar informação na sinalização em relação ao texto fonte em português,
o tradutor fará essa inserção. Em seguido a equipe retoma a análise. Trata-se de
uma atividade feita em conjunto: revisor, tradutor e confrontador. A revisora Surda
disse que faz algumas observações, alterando às vezes a ordem sintática do
discurso; o tradutor sinaliza novamente e após esse rascunho é enviado para o
ator/tradutor que fará efetivamente a gravação.

Às vezes as pessoas pensam que é um trabalho irrelevante, porém o nosso


trabalho não é nada fácil, é uma responsabilidade muito grande, pois como
revisora Surda, se o tradutor sinalizar e eu não prestar atenção, fizer de
qualquer jeito, pode acontecer da comunidade surda brasileira ser
prejudicada e não entender o texto e a culpa será minha, realmente é
preciso muita atenção (ANEXO D).

Além da reunião de planejamento e um software próprio chamado MIPES (ver


ANEXO D) a equipe organiza um mapa mental, recurso que auxilia no processo
tradutório:

[...] o mapa mental serve pra ajudar o revisor Surdo e me ajudar como
tradutor ouvinte a ter o mesmo modo de pensar que um surdo, porque eu
sou um tradutor, mais se são palavras, eu vou ficar muito apegado ao
português, eu não quero isso, eu quero que seja natural para o Surdo
(ANEXO D).
68

Imagem 15: Equipe/Estrutura de Tradução das Testemunhas de Jeová

6.3 COMENTÁRIOS GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO DAS TESTEMUNHAS DE


JEOVÁ

A tradução produzida pelas testemunhas de Jeová toma como texto-fonte uma bíblia
na versão escrita que difere daquela mais comumente utilizada pelas igrejas
evangélicas. Os excertos aqui descritos compõem a tradução da Bíblia em Língua
Brasileira de Sinais, produzida em material audiovisual. A tradução está organizada
por livros, divididos em capítulos e versículos.

Apenas um tradutor sinaliza todo o livro de Êxodo. Conforme já explicitamos na


descrição anterior, os Dez mandamentos, da forma como estão escritos, evidenciam
o pronunciamento de Deus em relação ao modo como o homem deve agir. Os
verbos estão em terceira pessoa, no modo imperativo, expressando as leis às quais
o homem deve cumprir.

À luz dessas considerações sobre o texto fonte, observamos que o tradutor


incorpora o discurso em primeira pessoa, ou seja, ele encena o personagem Deus
que, por meio de um discurso incisivo, declara as normas de comportamento do
indivíduo. Apesar de tratar-se de um discurso monofônico, pois somente Deus é
quem fala no texto, o tradutor constrói um outro discurso, com atitudes humanas
reprováveis (idolatria, inveja, desobediência), que coexiste no interior do discurso
divino, como pode ser mostrado no primeiro mandamento: o tradutor encena uma
pessoa adorando a outros deuses, prestando-lhes obediência. Em seguida, ele olha
69

para a câmera, muda a expressão facial, incorpora o discurso de Deus, opondo-se a


essa prática e afirma <NÃO>n VOCÊS 3pOBEDECER1 LIGAR EU>.

Em todos os dez mandamentos, há um uso reduzido de sinais. Também não há


acréscimos, a fim de contextualizar e/ou complementar os discursos. Em vez disso,
todas as atitudes humanas que são reprovadas por Deus são encenadas em
detalhes para, em seguida, serem condenadas, algumas delas, inclusive, com
indicação de punições. A incorporação do discurso de Deus pelo tradutor,
posicionando-se com veemência contra idolatria, assassinato, adultério, furto, falso
testemunho, cobiça entre outras ações construídas ao longo do discurso, produz
efeitos de sentido que remetem a um discurso autoritário, com normas rígidas a
serem seguidas.

Vale destacar que um dos sinais mais usados pelo tradutor é o sinal “PROIBIDO” ,
cujo sentido em Libras remete a um ato altamente condenável, passível de sanção,
caso descumprido. Com isso, percebemos que não há tentativa de amenizar as leis,
mas, sim, reforçar a ideia de desaprovação àqueles que não as obedecerem.

À guisa de conclusão, é importante esclarecer que não há, nesta pesquisa, a


intenção de avaliar qualitativamente as traduções, caracterizando-as como a melhor
ou a pior. Todo o trabalho descritivo realizado até aqui tem como objetivo
compreender o modo como os textos bíblicos vêm sendo traduzidos em Libras, os
elementos linguísticos e extralinguísticos que participam do processo de tradução,
as escolhas tradutórias e os efeitos de sentido que podem produzir no leitor.
70

7 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS DIFERENTES TRADUÇÕES DE OS DEZ


MANDAMENTOS

Feita a descrição das traduções, as observações e o relato das entrevistas


concedidas pelas equipes de tradução, estabeleceremos um diálogo com o aporte
teórico, a fim de discutir acerca das questões centrais que norteiam esta pesquisa.
Já de início, defendemos com Adail Sobral (2008) a ideia de que a tradução, ou o
discurso traduzido, seria um transgênero,

porque é uma ação de recorte do mundo que recorta um recorte, um


estranho gênero que se constitui vários outros gêneros, que origina pelas
mãos de um novo autor (co-autor) um discurso que vem de outro discurso e
que já tem um autor (SOBRAL, 2008).

Nesse sentido, as duas versões de “Os dez mandamentos” vinculam-se à


mensagem do texto-fonte, mas não se configuram como cópias; antes, produzem
novos sentidos, pois como transgêneros são influenciados pelos participantes da
interação verbal, pelas ideologias dos espaços sociais que os produzem, pelas
finalidades discursivas. Assim, todos esses fatores, em alguma medida, se
materializam no conteúdo temático, no estilo e na composição dos enunciados
traduzidos.

Aproximando essa discussão para os objetos pesquisados, percebemos que os


trechos bíblicos traduzidos pelos adventistas constituem parte de um material com
um caráter didático, com o objetivo de ampliar o conhecimento dos membros acerca
dos princípios religiosos que norteiam aquela instituição. No conteúdo do DVD, há
comentários dos tradutores (membros surdos da igreja), explicando e
contextualizando cada mandamento por meio de experiências do cotidiano. Nesse
sentido, parece-nos que esse caráter “didático” acaba motivando os acréscimos e,
por vezes, as simplificações das traduções dos mandamentos.

Além disso, na intenção de promover uma aceitação dos princípios religiosos


(levando em conta que o material tem como interlocutores presumidos, os membros
recém-chegados), a tradução possui uma linguagem simples, acolhedora que
71

pretende alcançar a receptividade do leitor, em vez de causar um choque e a


rejeição dos novos membros aos mandamentos.

Sobre o fato de se usar apenas tradutores surdos, membros da igreja, os


adventistas demonstram reconhecimento da comunidade surda pela igreja, como um
aspecto de identificação cultural e identidade para seus leitores.

O uso de sinalização e do discurso em terceira pessoa em detrimento da


incorporação é uma prática comum em textos com caráter explicativos, descritivos,
ligados a contextos formais. Embora o sinalizador utilize alguns classificadores,
como no 2º mandamento, ele classifica o peixe nadando nas águas. Primeiro ele faz
o sinal de peixe e logo, em seguida, utiliza a mão direita para classificar um peixe
nadando nas águas. Também percebemos que no 3º mandamento a tradutora faz
uma incorporação da ação de provocar a Deus, porém, a intensa sinalização sugere
um discurso voltado para surdos adultos que, supostamente, teriam condições de
ver um sinal e contextualizá-lo à situação que está sendo descrita.

Há ainda, um fator relacionado à esfera de produção e circulação desses discursos


que acreditamos contribuir para o uso da sinalização. Nas igrejas cristãs, quem
sinalizam os cultos são os intérpretes (ouvintes). Estes têm por hábito o uso da
sinalização em detrimento da incorporação de personagens quando se trata da
interpretação da bíblia e das cerimônias religiosas. Desse modo, inferimos que o
modo de construção composicional dos discursos dos intérpretes ouvintes acaba
tornando-se referência para a tradução de textos bíblicos para os tradutores surdos.
Em outras palavras, os surdos se apropriam dos enunciados do outro para produzir
seu discurso. De acordo com Bakhtin, ao escolhermos uma palavra:

Costumamos retirá-las de outros enunciados e antes de tudo de enunciados


congêneres como o nosso, isto é, pelo tema, pela composição e pelo estilo;
consequentemente, selecionamos as palavras segundo a sua especificação
de gênero. O gênero do discurso não é uma forma da língua, mas uma
forma típica do enunciado; como tal forma, o gênero inclui certa expressão
típica a ele inerente. No gênero a palavra ganha certa expressão típica. Os
gêneros correspondem a situações típicas da comunicação discursiva, a
temas típicos, por conseguinte a alguns contatos típicos dos significados
das palavras com a realidade concreta em circunstâncias típicas.
(BAKHTIN, 2003, 292-293).

Ao refletir sobre os modos de tradução da Bíblia pelas Testemunhas de Jeová,


concordamos com Bakhtin (2004) que “cada campo de criatividade ideológica tem
72

seu próprio modo de orientação para a realidade e refrata a realidade à sua própria
maneira” (BAKHTIN, 2004. P. 33). Além disso, observamos que toda atividade
tradutória desenvolvida desde o conteúdo temático, o estilo e a construção dos
enunciados, bem como os procedimentos de tradução são marcados pelos
princípios ideológicos da instituição religiosa que considera a língua de chegada e a
adaptação à cultura dos interlocutores como eixos norteadores para a tradução da
Bíblia. Apesar de ter como sinalizador um tradutor ouvinte, o estilo da tradução
remete a elementos discursivos próprios da língua-alvo; ou seja, os recursos visuais,
o uso da incorporação e a construção de cenas são fundantes na recriação dos Dez
Mandamentos em Libras.

Entendemos que essas escolhas tradutórias não são aleatórias. São estratégias
extremamente persuasivas, pois tais recursos estilísticos facilitam a adesão, a
aceitação do leitor surdo ao discurso que está sendo enunciado. Apoiados em
Bakhtin (2003), somos levados a crer que o tradutor se apropria do modo de dizer
próprio da comunidade surda para recriar um texto bíblico com a qual o leitor se
identifique por meio de cenas e descrições imagéticas, pois no ato tradutório, assim
como na produção de qualquer discurso

Todos os nossos enunciados [...], é pleno de palavras dos outros, de um


grau vário de alteridade ou de assimilabilidade, de um grau vário de
aperceptibilidade e de relevância. Essas palavras dos outros trazem consigo
a sua expressão, o seu tom valorativo que assimilamos, reelaboramos e
reacentuamos (BAKHTIN, 2003, p. 294-295).

É importante destacar que as traduções da Bíblia produzidas pelas Testemunhas de


Jeová e o modo como produzem os enunciados em Língua de Sinais são
historicamente marcados por uma série de protocolos regulados pela instituição
religiosa que subsidia essas produções. Apoiados em Bakhtin (2003), entendemos
que os gêneros obedecem às coerções de avaliação ideológica das esferas sociais
que os produzem para fins específicos de comunicação.

Como citado nesta pesquisa, as Testemunhas de Jeová, possuem uma sede


mundial (Betel), situada no Estado de Nova York nos Estados Unidos. Nela são
produzidos todos os materiais; também são criadas todas as regulações das
publicações. Após serem produzidos, esses textos são enviados para as filiais Betel,
sede das testemunhas de Jeová em vários países, para que façam as traduções em
suas respectivas línguas. A matriz norte-americana define todas as regras e
73

protocolos que precisam ser seguidos e qualquer adaptação necessária precisa ser
autorizada por eles.

A partir dessas considerações, podemos afirmar que a tradução de textos sagrados,


para além da preocupação com o caráter “sensível” que envolve a recriação do
discurso divino, exige do tradutor uma leitura dialógica e uma autoria que leve em
conta os seguintes aspectos: a esfera social de circulação e recepção da tradução;
as condições sociais de produção; a entoação valorativa do locutor e dos
interlocutores; o conteúdo temático; o estilo da linguagem e a construção
composicional.
74

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciar esta pesquisa, nos propusemos a investigar quais os elementos


linguístico-discursivos influenciam na tradução de um texto sensível, tendo por
objetivo também contribuir para os estudos no campo da tradução de textos
sensíveis para Libras. Tomamos como objeto de pesquisa a tradução de “Os Dez
Mandamentos” (recorte da Bíblia Sagrada cristã) para Libras, traduzidos pelos
adventistas e pelas Testemunhas de Jeová, a fim de compreender quais os fatores
que interferem nas escolhas tradutórias dos profissionais envolvidos. Assim, fomos
movidos por questões como, quais as escolhas tradutórias são evidenciadas nas
sinalizações, como acontecem as traduções dos textos religiosos para a Libras e
quais elementos linguísticos e extralinguísticos interferem nessas escolhas.

No desenvolvimento da pesquisa, e em busca de respostas para as questões


iniciais, estabelecemos, no segundo capítulo, um diálogo com recentes pesquisas
acadêmicas em torno de textos sensíveis especialmente os livros sagrados. Além
disso, dialogamos com textos com a temática da tradução com foco no texto original.
Ancorados nesses dois eixos de pesquisa, foram descritos os conceitos abordados
por Furlan (2004). Ele defende que na prática as traduções devem privilegiar o texto
na língua de chegada. Considerar o olhar que o leitor tem sobre o texto sagrado,
respeitando a intenção do texto original, porém sem perder as especificidades da
língua do texto de chegada, se torna primordial para uma tradução de qualidade.

As contribuições teóricas de Bakhtin (2003) no que tange aos conceitos de língua,


linguagem, compreensão ativa responsiva, enunciado e enunciação, assim como
sobre dialogismo – linguagem como forma de interação social – embasaram nossas
discussões e análises. A partir desses conceitos, podemos afirmar que o tradutor
enunciador precisa estar atento ao receptor, atento a natureza do público, gêneros e
características da linguagem que sejam compreensivas para aquele público.

As pesquisas no campo da tradução e interpretação em Língua de Sinais são ainda


incipientes no Brasil e ainda pouquíssimas delas lidam essencialmente com textos
sensíveis e discussões sobre o processo tradutório e escolhas lexicais. Os
resultados desta pesquisa poderão contribuir para melhor compreensão do efeito
75

causado por determinadas traduções em seus leitores/receptores, assim como


ampliar as discussões sobre a necessidade de formação para tradutores e
intérpretes.

Os resultados revelaram ainda que a atuação dos tradutores e intérpretes de textos


sensíveis e suas escolhas tradutórias são diretamente influenciadas pelas
instituições religiosas e seus discursos, pelos dispositivos de controle e pelos
lugares sociais que esses sujeitos ocupam no interior dessas instituições.
Evidenciaram também a preocupação dessas instituições com o perfil do receptor
dos enunciados e como isso interfere diretamente na tradução, apontando
possibilidades de protocolos de criação e avaliação que possam assegurar melhor
qualidade e clareza, valendo-se de pesquisas e consultas a falantes nativos da
língua alvo.

Destacamos que as ideologias, intenções e determinações destas instituições


influenciam as traduções e o modo como o leitor surdo poderá compreender a
mensagem divina. No caso dos vídeos analisados, percebemos que “Deus” assume
dois perfis: em um vídeo é construído como um Deus amável, enquanto no outro
como um Deus austero.

Com isso reiteramos a importância de que o tradutor tenha domínio das duas
línguas envolvidas na tradução, refletindo acerca das competências necessárias
para assegurar a qualidade do seu trabalho, buscando formação contínua e análises
no que pese à tradução de textos sensíveis, suas escolhas e efeitos sobre o público
alvo, repensando as práticas e pensando soluções para os desafios encontrados.
Entendemos que essa pesquisa não fecha o circuito sobre essas discussões. As
reflexões em torno da temática abordada não se encerram por aqui. Pelo contrário,
esperamos que elas sirvam como um caminho possível para o início de novas
pesquisas no campo da tradução de textos sensíveis.
76

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<http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2009/anais/pdf/3124_1712.pdf>
Acesso em: 08 agosto. 2017.
78

SILVA, C. A. A. Cultura surda: agentes religiosos e a construção de uma


identidade. São Paulo, Terceiro Nome, 2012.

SILVA, C. A. A. (2011), Entre a deficiência e cultura: análise etnográfica de


atividades missionárias com surdos. São Paulo: Tese de Doutorado em Antropologia
Social, FFLCH/ USP.

SKLIAR, C. A surdez – Um olhar sobre as diferenças. 3ª ed. Porto Alegre:


Mediação, 2005.

SCHORN, M. El niño y el adolescente sordo - Reflexiones psicoanalíticas.


Buenos Aires: Lugar editorial, 1997. p. 101-109.

SOUZA, Camilo D. Territórios de exclusão: Educação, saúde e representações de


fumantes no espaço público. Canoas: ULBRA, 2006. Dissertação (Mestrado em
Educação). Faculdade de Educação. Programa de Pós-graduação em Educação,
Universidade Luterana do Brasil, 2006.

SOBRAL, A. Dizer o “mesmo” a outros: ensaios sobre tradução. São Paulo:


Special Book Services, 2008.

THOMA, A. da S.(Org.); LOPES, Maura Corcini (Org.). A invenção da surdez:


cultura, alteridade, identidade e diferença no campo da educação. Santa Cruz do Sul
(RS): EDUNISC, 2004.

THOMA, Adriana da Silva (Org.); LOPES, M. C.(Org.). A invenção da surdez II:


Espaços e tempos de aprendizagem na educação de surdos. Santa Cruz do Sul
(RS): EDUNISC, 2006.

XIMENES, S. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa. 2ª ed. São Paulo:


Ediouro, 2000.
79

ANEXOS

ANEXO A

DECUPAGEM DOS OUTROS 6 MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELOS


ADVENTISTAS

4º MANDAMENTO:

Lembra-te do dia do sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás, e farás toda a
tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus; não farás nenhuma
obra, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o
teu animal, nem o teu estrangeiro, que está dentro das tuas portas. Porque em seis
dias fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e ao sétimo dia
descansou; portanto abençoou o Senhor o dia do sábado e o santificou (Êxodo 20:8-
11).

<VOCÊ LEMBRAR SÁBADO ELE>

<SANTIFICAR PRECISAR SEIS D-I-A>

<VOCÊ TRABALHAR>
80

<FAZER SUA VONTADE MAS>

<SETE D-I-A>

<É SÁBADO PRÓPIO DEUS>

<1FOCAR2>mc ENTAO VOCÊ EVITAR>

<TRABALHAR OU SUBSTITUIR MULHER>

<HOMEM SERVO FILHO SUBSTITUIR>


81

<TRABALHAR OU MULHER HOMEM>

<SERVO SUBSTITUIR TRABALHO SUBSTITUIR>

<OU PESSOA ANIMAL QUALQUER>

<SUBSTITUIR TRABALHO OU PESSOA>

<DENTRO SUA CASA DENTRO>

<SUBSTITUIR TRABALHO EVITAR>n


82

<ENTAO SEIS D-I-A>

<DEUS FAZER CEU>

<TERRA MAR COISAS TODAS>

<MAIS SETE D-I-A>

<DEUS DESCANSOU++ DEUS>

<SABADO>t ABENÇOAR SANTIFICAR>


83

6º MANDAMENTO:

Não matarás. (Êxodo 20:13)

<MATAR-NÃO>n

7º MANDAMENTO:

Não adulterarás (Êxodo 20:14)

<VOCÊ TRAIR AMANTE NÃO>n

8º MANDAMENTO:

Não furtarás (Êxodo 20:15)

<ROUBAR>n
84

9º MANDAMENTO:

Não dirás falso testemunho contra o teu próximo (Êxodo 20:16)

<MENTIR 1CONTRA2 PROXIMO NÃO>n

10º MANDAMENTO:

Não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o
seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma
do teu próximo (Êxodo 20:17)

<VOCÊ OLHAR PRÓXIMO-SUJEITO>

<COBIÇA CASA VER BONITA>

<HUM EVITAR>n OU DELE>


85

<MULHER OLHAR- DESEJAR IMAGINAR MULHER>

<COBIÇAR EVITAR OU SERVA>

<SERVO DELE>

<COBIÇAR VONTADE FUTURO EVITAR>n>

<OU QUALQUER BOI OU>


86

<JUMENTO DELE COBIÇAR>

<OU COISA COBIÇAR>n NADA>

<PRÓPRIO DELE COISAS COBIÇAR>

<NADA>n EVITAR>
87

ANEXO B

DECUPAGEM DOS OUTROS 6 MANDAMENTOS TRADUZIDOS PELOS


TESTEMUNHAS DE JEOVÁ

4º MANDAMENTO

Lembre-se de manter sagrado o dia de sábado. Trabalhe e faça todas as suas


tarefas durante seis dias, mas o sétimo dia é um sábado para Jeová, seu Deus. Não
faça nenhum trabalho, nem você, nem seu filho, nem sua filha, nem seu escravo,
nem sua escrava, nem seu animal doméstico, nem seu residente estrangeiro, que
está dentro das suas cidades. Pois em seis dias Jeová fez os céus, a terra, o mar e
tudo o que há neles, e no sétimo dia passou a descansar. É por isso que Jeová
abençoou o dia de sábado e o tornou sagrado. (Êxodo 20:8-11)

<AMANHÃ+++ SEMANA UM DOIS TRES QUATRO CINCO SEIS SETE>

<ESTE SETE SABÁDO ELE ESPECIAL>

<MEU ESQUECER NÃO>n AMANHÃ+++>


88

<SEMANA UM DOIS TRES QUATRO CINCO SEIS VOCÊS TRABALHAR>

<DIVERSOS LIVRE MAS SEIS>

<SETE ESTE SETE SÁBADO>

<NELE TRABALHAR DIVERSOS NADA>n

<ELE FILHO FILHA>

<OUTRO SERVO SERVA>


89

<AJUDAR OUTRO BOI OVELHA >

<DIVERSOS OUTRO ISRAEL NÃO>do

<MUDAR MORAR MAS TODOS>int

<SABÁDO ESTE SÉTIMO ESTE>

<SABÁDO TRABALHAR NÃO>n NADA>

<SÁBADO ELE ESPECIAL MEU>


90

<JEOVÁ PASSADO EU JEOVÁ>

<CRIAR EXPANSÃO SURGIR>

<CRIAR PLANETAS UNIVERSO GALÁXIAS>

<VÁRIOS CÉU DE NOVO CRIAR>

<CRIAR MUNDO SURGIR VÁRIOS DE NOVO>

<AGUA MAR RIO>


91

<VÁRIOS ENTAO>mc EU CRIAR>

<AMANHA DIA A DIA SEIS MAS>

<AMANHÃ DEPOIS SETE SÁBADO>

<TRABALHAR EU CRIAR TRABALHAR>

<NÃO>n NADA DESCANSAR ENTENDER>sn

<ENTÃO AMANHÃ SEIS SETE>


92

<ELE SÁBADO ELE ESPECIAL>

<MEU JEOVÁ>

6º MANDAMENTO

Não assassine. (Êxodo 20:13)

<MATAR>INT PROIBIDO>n

7º MANDAMENTO

Não cometa adultério. (Êxodo 20:14)

<ESPOS@ OUTRO JUNTAR NÃO>


93

<1TRAIR2 2TRAIR1 PROIBIDO>n

8º MANDAMENTO

Não furte. (Êxodo 20:15)

<ROUBAR PROIBIDO>n

9º MANDAMENTO

Não dê falso testemunho ao depor contra o seu próximo (Êxodo 20:16)

<HUM VEM EU 1VER2 ERRAR>

<EL@ 1EXPLICAR2++ MENTIR 1CONTRA2 PROIBIDO>n

10º MANDAMENTO
94

Não deseje a casa do seu próximo. Não deseje a esposa do seu próximo, nem seu
escravo, nem sua escrava, nem seu touro, nem seu jumento, nem coisa alguma que
pertença ao seu próximo. (Êxodo 20:17)

<CASA HUM VONTADE>do CASA>

<MEU PROIBIDO>n OU HOMEM DEL@>

<ESPOSA EL@ DESEJO>

<ESPOSA MINHA NÃO HOMEN DEL@>

<BURRO BOI SERVO >


95

<AJUDAR SERVA AJUDAR>

<DIVERSOS VOCÊ OLHAR>do DESEJO EL@ MEU QUERER EL@>

<COBIÇAR++ >n PROIBIDO>n


96

ANEXO C – TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS

EQUIPE: MINISTÉRIO ADVENTISTA DOS SURDOS

Importante ressaltar que os nomes dos participantes foram substituídos por nomes
fictícios para preservar a identidade dos mesmos.

Entrevistados:

Pedro – (Surdo) - Tradutor I

André – (Surdo) – Tradutor II

Tiago - (Surdo)– Tradutor III

Ester – (Surda) – Tradutor IV

Sulamita - (Surda) – Tradutor V

Entrevistador: Apresentação do investigador e da entrevista/projeto, considerações


iniciais.

Entrevistador: Por que uma preocupação dos Adventistas em traduzir textos da


bíblia para língua de sinais?

Tradutor I: Nós adventistas acreditamos que o desenvolvimento espiritual da


pessoa se dá através do estudo das escrituras sagradas. A tradução de passagens
bíblicas para a língua de sinais é uma das formas de ajudar o surdo que faz o uso e
compreende essa língua a ter o seu próprio desenvolvimento espiritual.

Tradutor III: A bíblia é a palavra de Deus. Ele é mais importante que qualquer
pessoa, qualquer deficiente, seja cego, cadeirante ou surdo precisa saber o que está
escrito na palavra de Deus. O surdo tem barreiras na comunicação. Esses entraves
linguísticos em relação ao português traz dificuldades ao surdo para compreender o
que está escrito na Bíblia. Se traduzir para Libras o surdo irá compreender a vontade
de Deus e poderá decidir obedecer. Se o Surdo não conhecer a vontade de Deus
descrita na bíblia como irá obedecer? Por isso a importância de traduzir o que está
97

escrito para língua própria do surdo, se ele tiver acesso será fácil aprenderá sobre o
amor a Deus e amor ao próximo.

Entrevistador: Qual a importância de se traduzir os Dez Mandamentos?

Tradutor I: Como adventistas compreendemos que a Bíblia deve ser usada como
um todo e que tudo o que foi escrito nela é inspirado pelo Espírito Santo. Os Dez
Mandamentos contidos em Êxodo 20:1-17 são de grande significado por ser parte
da base daquele povo que o Senhor escolheu e que continua sendo hoje até o dia
da volta de Jesus de acordo com Apocalipse 12:17.

Tradutor III: Nós adventistas aprendemos os 10 mandamentos, em primeiro lugar


quem foi que escreveu os 10 mandamentos? Você sabe quem? Importante saber ,
pois a bíblia explica que os 10 mandamentos foram escritos pelo próprio dedo de
Deus. Ele fez questão de escrever porque ele desejava a obediência do povo e essa
obediência demonstraria uma relação de amor. Os 4 primeiros mandamentos fazem
referência ao amor a Deus, nos quais podemos aprender como demonstrar amor a
Deus. Os outros 6 mandamentos nos ensinam como amar o próximo. Esse é o
resumo da lei em 2 mandamentos, amar a Deus e amar as pessoas. O desejo de
Deus é que vivamos bem, em ligação com ele, então se resumem os 4
mandamentos. Também se quiser viver em paz com as pessoas, não ter adultérios,
roubos, violência etc, compartilhe amizades é o resumo da obediência aos outros 6
mandamentos. Se não nos atentarmos em conhecer profundamente os 10
mandamentos e saber quem os escreveu, como iremos fazer a vontade de Deus?
Como obedecer? Fica difícil saber, por isso a bíblia apresenta a lei de Deus, alguns
falam “a lei é de Moisés”, mas na verdade não é, a lei é de Deus, ela revela o caráter
moral do próprio Deus.

Tradutor V: Todos nossos materiais são produzidos principalmente com foco


evangelístico! Os membros Surdos estudam diariamente com a lição em libras.
Além disso, qualquer material que receberem que tenham tudo em libras eles
assistem.
98

Entrevistador: Como aconteceu a gravação de Os Dez Mandamentos? Quais as


etapas?

Tradutor I: A primeira etapa foi a escolha do livro sobre os Dez Mandamentos que
trouxesse mais significado para o nosso cotidiano e também aquele era o livro do
ano para a Igreja Adventista do Sétimo Dia. A segunda etapa foi a escolha do
método de tradução. A terceira etapa consiste em analisar o conteúdo e adaptá-lo
para o público alvo. A quarta etapa foi dividir as partes da tradução entre os
tradutores. A quinta e última etapa é o processo de gravação que engloba o tempo
de filmagem, local, roupas, etc.

Tradutor V: Aceleramos o processo devido ao pouco tempo que tivemos, pois cada
tradutor precisava voltar aos seus estados, isso pode ter trazido prejuízos na
qualidade da tradução, devido à ausência de tempo para revisar e corrigir. Receber
o material a ser traduzido com antecedência também é de grande importância. Há
alguns anos estamos lutando para inserir intérprete em nossa TV "novo tempo",
porém ainda não é uma realidade.

O Pastor nos fornece os termos para assinar para nós assumirmos a


responsabilidade de gravar e liberação de imagens que fazemos quando gravamos.
Mas não tem protocolos, critérios e regras de como deve ser gravado como um
exemplo de ética, tipo de roupas, maquiagem, tempo de gravação, etc. E nós
fazemos a partir das regras que conhecemos da cultura surda como devem ser
usados. E também eles pedem a carta a cada três meses para provar que somos
membros da IASD.

Atualmente, conseguimos um estúdio fixo apenas para gravar a lição da escola


sabatina para surdos. Em cada trimestre gravamos no mesmo lugar. Como sempre,
é a mesma equipe de surdos com intérprete responsável para gravar. Mas os outros
demais materiais como gravar o livro da esperança seria em outros estúdios, de
forma itinerante, a edição acaba sendo feita por técnicos que não têm conhecimento
da libras. Depois fica difícil para conseguir editar, pois precisa chamar intérprete a
disposição para poder editar senão fica errado.
99

Avançamos na quantidade e qualidade das traduções, porém existem alguns outros


critérios que desejamos melhorar e estamos trabalhando para que isso de fato
aconteça.

Entrevistador: Como é composta a equipe de tradução? Há tradutores surdos?

Tradutor I: A tradução de Os Dez Mandamentos foi feita somente por dois surdos
que possuem grande conhecimento do assunto, fluentes na Libras e identificados
com a cultura dos surdos.

Tradutor II: O ouvinte nesse processo tem o papel de apoio ao tradutor surdo,
explicando os conceitos de palavras difíceis do português, na compreensão do texto
bíblico e na parte técnica da edição do vídeo, assim como na construção do texto
base em português, porém o tradutor para gravação é somente o surdo.

Entrevistador: Quais as semelhanças e diferenças na tradução de línguas orais


para língua de sinais?

Tradutor I: A principal diferença entre a língua de sinais e a oral é que a primeira é


visual e a outra é a audível. A língua de sinais prioriza a cultura do surdo, o que faz
que o tradutor possua habilidade de adaptar o texto para que o surdo possa
compreender. Diferente da língua oral em que a tradução escrita para oral se faz na
mesma língua portuguesa e é mais generalizada. Fora essas diferenças, existem,
sim, muitas semelhanças.

Entrevistador: Existe um padrão de cenário e roupa para os tradutores. Como é


feita essa definição?

Tradutor I: Há uma equipe de gravação que define o cenário e os vestuários


priorizando a clareza da tradução.

Tradutor II: A roupa precisa seguir um padrão. A precisa ser neutra. Não pode ser
estampada ou de listras. É necessário que seja de cor suave, algo chamativo ou
exagerado não é aceitável, porque é preciso facilitar a percepção visual do surdo.
100

Entrevistador: Na tradução, são usados muitos classificadores e incorporação dos


personagens. Por que esses recursos são importantes?

Tradutor I: Na tradução de Os Dez Mandamentos para a língua de sinais foram


usados os classificadores e a incorporação dos personagens como uma forma de
alcançar diferentes grupos de surdos como aqueles que estão mais isolados ou
crianças surdas que não são tão fluentes em Libras. É também uma forma de dar
mais qualidade ao material.

Entrevistador: Que perfil de leitor surdo vocês pretendem alcançar?

Tradutor I: Dos mais jovens e interessados em religião.

Tradutor V: Queremos adaptar os materiais o melhor possível para todos os tipos


de identidade da cultura surda. Porém, infelizmente, ainda não temos uma central
disponível para essas produções. As gravações são feitas por membros voluntários
de diferentes estados que se encontram geralmente em um único final de semana
para as gravações. Eles são convidados pela instituição que financia todas as
despesas. Essa representatividade dos estados se dá em atenção aos sinais
regionais (regionalismo).

Tradutor IV: Existem variados níveis de pessoas surdas. Podemos citar os surdos
Doutores, mestres, ou seja, diferentes níveis acadêmicos, depois os surdos de nível
médio; surdos com acesso ao estudo de forma geral. Há ainda aqueles surdos que
conhecem alguns sinais, porém estão afastados da comunidade surda por serem
oralizados e, por último, temos aquele grupo de surdos que se comunica por gestos,
que não conhecem a língua de sinais, utilizam sinais caseiros para se comunicar e a
maioria deles vive em regiões do interior sem acesso ou contato a comunidade
surda. Para uma maior clareza de todos esses níveis apresentados procuro utilizar
classificadores e incorporação de personagens para que a tradução seja acessível a
essa variedade de leitor. Se no momento da gravação a Joyce(Surda que coordena
a equipe de tradutores) percebe alguma construção que não está clara, retornamos
a essa parte e gravamos novamente.
101

Entrevistador: Qual versão da bíblia foi usada no processo de tradução para língua
de sinais?

Tradutor I: Almeida Revista e Atualizada.

Entrevistador: Vocês conseguem receber um feedback da compreensão desses


textos pelos leitores? De que forma? O que eles dizem?

Tradutor I: Aquele que faz a entrega ou postagem do material também está


assumindo a responsabilidade de receber o feedback e repassar a nós produtores.
Já recebemos reclamações como o tempo, a falta de imagens durante as traduções
que facilitariam a compreensão e que em alguns materiais o arquivo em vídeo não
abria. Mas recebemos também elogios como a qualidade de filmagem, o uso de
tradutores surdos que fez com que a tradução ficasse mais interessante e a
qualidade do material como o menu.
102

ANEXOS D – TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS

EQUIPE: TESTEMUNHAS DE JEOVÁ

Importante ressaltar que os nomes dos participantes foram substituídos por nomes
fictícios para preservar a identidade dos mesmos.

Entrevistados:

Rosa – (Surda) - Revisor

Margarida - (ouvinte) – Confrontador

Edward – (ouvinte) - Tradutor I

Arthur – (ouvinte) – Tradutor II

William - (ouvinte) – Tradutor III

Entrevistador: Apresentação do pesquisador e da entrevista/projeto, considerações


iniciais.

Entrevistador: Por que uma preocupação das Testemunhas de Jeová em traduzir


textos da bíblia para língua de sinais?

Tradutor I: - A nossa organização se preocupa principalmente em ensinar a Bíblia,


então mesmo nas outras publicações que a gente fala, a sentinela ou vídeo para
crianças é da Bíblia, daí a gente baseia todas as nossas crenças na Bíblia, a gente
não têm crenças separadas da Bíblia, então a principal publicação a ser traduzida é
a Bíblia, tanto que todos os outros idiomas escritos, todos praticamente já têm a
Bíblia completa. A língua de sinais ainda não tem a Bíblia completa porque é
demorado e a gente se preocupa muito em fazer um negócio certinho, explicar
direitinho que aquilo que está escrito ali realmente esteja em língua de sinais do jeito
certo que o surdo vai entender o mesmo que o ouvinte entendeu, então vamos
fazendo aos poucos para traduzir com calma e ficar bem traduzido.

Entrevistador: Qual a importância de se traduzir Os Dez Mandamentos?


103

Tradutor I: - Aí, qual foi à decisão de fazer primeiro Mateus a Apocalipse que é
chamado de Novo Testamento, porque esse a gente usa muito, no dia a dia muitas
coisas que Jesus falou estão em Mateus, Marcos, Lucas e João que fala muito de
Jesus o que Jesus ensinou e tudo baseado. Daí é a estrutura de como que Jesus
ensinou que deveria ser a organização, a questão de ter congregações, os homens
estarem em pé ensinando, todas as regras de intuição, como deveriam ser as
reuniões, está ali entre Mateus e Apocalipse. E aqui o de antes, que é Gênesis até
Malaquias, na verdade foi só um resumo baseado nisso aqui. Mateus e Apocalipse
se baseiam naqueles, só que aquele é a história antiga, coisas que serviram no
passado e com a vida de Jesus Cristo mudou algumas coisas então a gente fechou
primeiro Mateus a Apocalipse, depois começou a voltar, aí pegou Gênesis, Êxodo e
está fazendo os outros, só que a gente fez alguns livros menores que foram feitos
depois porque têm alguns livros que demoram muito para traduzir e às vezes os
surdos, nosso público lá, tá querendo mais, eles já viram tudo, já viram Mateus a
Apocalipse. Às vezes, demora bastante, mais de um ano para traduzir Gênesis, pra
traduzir Êxodo. Então a gente falou assim: vamos fazer os menores para que o
surdo já receba para estudar em casa e nas reuniões a gente vai estudando esses
que já estão prontos, aí depois que já está pronto, então a gente começa de novo
com os maiores. O objetivo é ter a Bíblia inteira, porque aí o surdo vai poder ter a
ligação, entender porque que Jesus falou isso. Jesus falou isso porque estava ligado
com o que foi dito lá atrás com Moisés, aí Jesus ensinou um negócio aqui que está
em deuteronômio, que está lá em Malaquias, então tem uma ligação da bíblia que
vai fazendo sentido. A tradução é feita de acordo com a maior necessidade, assisti,
mas os livros da bíblia mais assistidos e mais estudados são traduzidos primeiro, as
doutrinas atuais que a gente segue é o que está baseado depois de Jesus Cristo. A
gente usa algumas coisas do Velho Testamento, mas muitos detalhes do dia a dia,
mais práticos foi Jesus que ensinou quando veio a terra, tem coisas que
antigamente se aplicavam a Nação de Israel que foram substituídas com Jesus.

Entrevistador: Como aconteceu a gravação de Os Dez Mandamentos? Quais as


etapas?

Revisor : - As etapas de tradução de qualquer texto segue mesmo processo. Às


vezes, eu pego o texto fonte em português e percebo que é uma história, por
exemplo, a história de Ana, sabe a história de Ana que orava e chorava? Então eu
104

faço uma descrição imagética dessa história ali no quadro branco. Construo o
cenário das cenas dela chorando, do acusador de Ana que criticava ela, eu mesma
faço esses desenhos construindo as cenas, depois no momento que o tradutor está
sinalizando eu percebo que faltou, por exemplo, a cena do acusador, então eu
aponto para o desenho da cena no quadro de aviso o tradutor à ausência dessa
informação, então aí fica tudo certinho, essa construção imagética descrevendo as
cenas que faço me ajuda no momento da tradução. Sem ela eu não conseguiria
perceber as ausências, os desenhos realmente me ajudam, é muito bom.

Entrevistador: Como é composta a equipe de tradução? Há tradutores surdos?

Revisor: a equipe de tradução é composta por três pessoas: Tradutor (ouvinte),


revisor (Surdo) e confrontador (Ouvinte). O tradutor sinaliza as escolhas dele. Eu
atuo como revisor surdo. Minha análise será se os diferentes surdos do Brasil terão
a compreensão desejada. Por exemplo, o confrontador também fará uma análise, se
falta informação na sinalização em relação ao texto fonte em português, o tradutor
fará essa inserção, e voltamos à análise. Uma atividade feita em conjunto, revisor e
confrontador. Eu observando o tradutor sinalizando, o confrontador lendo o texto
fonte, o tradutor sinalizando e eu como revisora observando as escolhas, se os
surdos brasileiros irão entender de forma clara ou não. Faço minhas observações,
alternando, às vezes, a ordem sintática do discurso. O tradutor sinaliza novamente e
após esse rascunho é enviado para o ator/tradutor que fará efetivamente a
gravação. Às vezes, as pessoas pensam que é um trabalho irrelevante, porém o
nosso trabalho não é nada fácil, é uma responsabilidade muito grande, pois como
revisora surda, se o tradutor sinalizar e eu não prestar atenção, fizer de qualquer
jeito, pode acontecer da comunidade surda brasileira ser prejudicada e não entender
o texto e a culpa será minha, realmente é preciso muita atenção, contribuir com o
tradutor para que os surdos brasileiros ao assistirem entendam de forma clara o
texto traduzido, e eu como revisora tenho a função de fiscalizar esse processo.

Entrevistador: Quais as semelhanças e diferenças na tradução de línguas orais


para língua de sinais?
105

Tradutor I: a grande diferença no processo tradutório das línguas orais para as de


sinais, é que na língua de sinais você tem que viver aquela informação, por exemplo
na gravação dos “10 mandamentos”, o que era os “10 mandamentos”? era Deus
falando com Moisés o que o povo estava fazendo de errado e que ele não queria
que fizesse mais, então lendo o texto tá dizendo: Deus disse isso para Moisés,
Moisés escreveu isso pode,isso é proibido , isso não pode, agora em sinais você vai
ter que fazer todos os personagens, então você daquilo ali desenha pro Surdo o que
está dizendo no texto escrito, Deus disse, ai você faz Deus, igual está na bíblia,
Deus olha pra baixo chama Moisés e fala, olha você escreve ai, vou falar 10 coisas
que está errado, que você não deve, fazer, aí Moisés vai direcionar o olhar para
Deus e construir essa cena, às vezes é necessário personificar o povo fazendo, eles
fazem aqueles ídolos, e ficam se curvando a eles, não tem nada disso escrito, o
texto escrito diz: não deve adorar ídolos, mas como que foi construir isso para que
na língua de sinais faça sentido, teve que construir a ideia de alguém montando um
desenho um quadro e a pessoa se abaixando e adorando aquilo, aí volta para
posição de Deus falando, isso que eles fazem ali não pode, está errado. A língua de
sinais você tem que viver aquilo que está escrito, nas línguas orais não acontece
assim. A tradução do inglês para o português que agente faz aqui, ela tem que ser o
mais fiel possível, então, por exemplo, se originalmente foi escrito uma informação
numa estrutura passando aquela ideia daquela forma, não posso mudar demais
aquilo, a língua oral tem isso, essa regra, você vai tentar fazer o mais natural
possível, para o público daqui, o brasileiro vai ler e vai sentir tocar o coração assim
como o inglês lê lá, só que tem coisas que não dá pra fugir das palavras, você não
consegue muito acrescentar coisas, tradução não e redação, então quando você
está traduzindo, você não pode acrescentar ideias que não estão ali,na língua de
sinais também não acrescenta, mais você consegue botar explícito o que está
implícito, mais do que o texto escrito, a gente fala muito isso, coisas que estão, você
lendo, você deduz que foi Deus que falou que Moisés estava lá escrevendo o que
Deus estava falando, ali não fala Moisés olhou para cima mas por dedução agente
constrói a cena para ficar mais explícito, mais visual, todas as traduções na verdade
tem essa liberdade, tornar implícito o que está implícito, só que às vezes o ouvinte
não tem essa necessidade tanto quanto o Surdo.
106

Nas línguas orais o processo é o mesmo, eles tem reunião de projeto, mapa mental,
só que as língua de sinais tem mais liberdade para adaptação da língua, em relação
a gramática, a cultura, o feedback das línguas orais também acontece da mesma
forma, eles convidam pessoas para ler o texto traduzido, se o texto for para criança
eles dão pra criança ler, do mesmo jeito que agente faz aqui com a língua de sinais,
essa mesma preocupação.

Tradutor II: Esse MIPES que é um programa que foi criado pela gente, a gente tem
acesso a perguntas que outros tradutores fizeram, então às vezes outros países,
estão traduzindo a mesma coisa que agente está traduzindo, e eles ficaram em
dúvida de alguma coisa, e perguntaram para o redator, e o redator vai explicar, não
isso tá dizendo isso, o sentido é esse, então às vezes eles podem ajustar,
acrescentando ou diminuindo informações baseados nessa pergunta, e a gente
consegue ter acesso a isso.

Confrontador: agente pode fazer perguntar também como já aconteceu algumas


vezes, por exemplo, uma ilustração que combina com alguém que seja ouvinte, por
exemplo, em relação à música, o Surdo não vai entender, então a gente usa o
MIPEs para mandar uma pergunta, olha tem como dar uma outra opção, adaptar
para a cultura surda? Então tem isso também, essa leve adaptação para quem é
Surdo, porque tem ilustração que eles não vão entender. Esse processo não
acontece na tradução da Bíblia, apenas outras literaturas como “A Sentinela”.

Vamos supor, se existe uma comparação ou ilustração de uma pessoa que seja
poeta, ele usa palavras, ele usa poesia, música, um Surdo não entende se usar
exatamente “palavras”, então tem que usar “sinais”, então pra gente não tirar e não
acrescentar agente precisa pedir autorização, e como se fosse essa central de
perguntas, agente manda nossa pergunta e eles mandam uma opção pra gente que
não mude o entendimento, o entendimento de alguém ouvinte ou Surdo precisa ser
igual, então essa é a preocupação deles, mesma informação só que adaptada para
um Surdo, aí eles vão ver se permitem ou não essa adaptação.

Revisor: a gente organiza o que chamamos de mapa mental, eu pego o tópico


principal da história, por exemplo, o tempo todo o texto fonte fala de Ana, existe uma
107

repetição, é como se fosse a chave primária do texto, nesse caso a chave primária é
Ana, depois eu percebo qual será o objetivo do texto, nesse caso será oração, o
clamor dela a Deus, qual objetivo que eu preciso passar para o público alvo que no
caso são os Surdos, como aplicar isso na vida deles, depois eu me preocupo qual o
tom deste artigo, se vai ser alegre, triste, de conselho ou normal, então essa
topicalização eu também faço ali no cantinho do quadro branco, porque no momento
da tradução vai que o tradutor exagera na sinalização , eu rapidamente lembro a ele
do tom, que não é preciso exagerar na expressão facial, essa construção de tópicos
me ajudam muito no momento da revisão, e por último a estrutura do artigo, é
cronológico, vai ser necessário uma linha de tempo, ou um artigo explicativo,
comparativo, essas marcas do tipo de texto, geralmente são marcados na
movimentação do ombro do ator/tradutor pra frente, para trás, para o lado, ou se for
explicativo no espaço neutro, o tipo do texto influencia na atuação do ator/tradutor.

Tradutor II: A nossa preocupação é que o tom, o tipo de texto o modo em que o
texto fonte foi construído para os ouvintes, gostaríamos que chegasse ao Surdo da
mesma forma, temos essa preocupação, então essa reunião de projeto serve pra
isso, do revisor, confrontador e tradutor, e a subjetividade de cada um, o modo de
pensar dos três, a gente tenta unir isso, e a confrontadora que fica com essa parte
da fidelidade ao texto fonte, em todos esses critérios, principalmente no público alvo,
por exemplo, se for criança, preocupação com esse tipo de público alvo, se ele irá
entender.

Tradutor I: (interrompe a fala) vai chegar um momento da historinha que ela precisa
entender o que ela precisa fazer.

Tradutor II: então a gente vai mesclando isso dentro do texto, o mapa mental serve
para ajudar o revisor Surdo e me ajudar como tradutor ouvinte a ter o mesmo modo
de pensar que um surdo, porque eu sou um tradutor, mas se são palavras, eu vou
ficar muito apegado ao português, eu não quero isso, eu quero que seja natural para
o Surdo, do jeito que um Surdo gosta, então o desenho que a Surda faz vai me
ajudar, porque então eu vou começar a pensar como os Surdos, de um modo mais
visual, eu vou ver os desenhos e vou começar imaginar, hum tenho uma história em
português mais e o surdo como isso ficaria para chamar a atenção dele, como eu
vou contar de um modo que toque o coração dele ou que motive ele ao que agente
108

quer no objetivo ali descrito no mapa mental? Então a gente faz esses desenhos pra
ajudar

Entrevistador: Existe um padrão de cenário e roupa para os tradutores. Como é


feita essa definição?

Tradutor I: Isso agente tem uma sede mundial, tudo isso e decidido lá, e é passado
como se fosse um padrão para o mundo todo, então, todos os países têm que
obedecer ao que eles falam, assim, serve para criar padrão, se não ficaria cada país
de um jeito, roupa é complicada, então vem definido, geralmente é roupa social para
passar um tom formal, mais sério, então, por exemplo, na língua de sinais temos um
padrão da cor usada no fundo, temos a sentinela que o padrão é azul, temos a
bíblia que o padrão é meio cinza, meio marronzinho né.., e tem os desenhos
aplicados a fundos da história....

Entrevistador: Na tradução, são usados muitos classificadores e incorporação dos


personagens. Por que esses recursos são importantes?

Tradutor III: dependendo do trabalho, por exemplo, no caso de êxodo e uma


história, um relato que aconteceu em um lugar e vai se passando em outros lugares
até chegar no êxodo, então para você tornar vivo, o surdo e muito visual, eles
gostam muito disso, de você vivenciar os personagens, então a gente consegue
identificar quem é Moisés , quem é Deus, o faraó, então se você personificar e
classificar, muito melhor será para o Surdo, então existe diferença de tradução, na
narrativa eu posso fazer esse mesmo relato de êxodo narrando, só olhando pra
câmera e ir narrando, isso não vai surtir o efeito que o surdo quer, ele quer vivenciar,
uso de de classificador, por isso eu gosto de usar bastante classificador, porque pelo
meu convívio com o surdos eu sei que é assim no dia a dia deles, eles falam e
contam coisas vivendo, então eles vivem tudo, então a gente tenta colocar essas
técnicas também nas traduções para tornar viva a leitura da bíblia, agora em outras
publicações depende muito, tem artigo que combina você classificar e tem artigo que
não, não adianta você forçar, a gente chama colocar um quadrado no círculo, não
adianta, não vai encaixar, se é narrativa, explicativa, que é pra fazer a pessoa
raciocinar, então você tem uma expressão específica, então vai depender do que for
os classificadores torna viva a mensagem, a incorporação você tem que jogar os
109

sentimentos corretos, a gente não sabe todos os detalhes, se foi exatamente aquele
sentimento, mais é um próximo que agente consegue alcançar, se por exemplo
Deus estava bravo naquele momento, vai ter que jogar as expressões fechadas, as
expressões é a reação dele mas se ele está feliz aí você já muda a expressão, tudo
envolve expressões e classificadores. os 10 mandamentos por exemplo, no monte
quando foi entregar para Moisés, eu utilizo muito o sinal de proibido, quando é uma
coisa considerada errada por Deus ai você já tem que trocar o tom, Deus odeia
quando você está adorando outro ídolo, que não seja ele, então tem que passar,
porque eram ações que o povo estava fazendo, a tendência era aquela , então Deus
falava isso é proibido, não faça imagens e no tom e na expressão no movimento da
cabeça, que você passa essa ideia. as vezes utilizo a direção do olhar para
demarcar distâncias, se ele está ao meu lado, às vezes Deus olhando pra baixo, ou
olhando pra câmera pra separar o personagem, às vezes estou fazendo um
personagem e eu preciso separar o personagem do ator, utilizo essa técnica de
direção do olhar para marcar os personagens . o objetivo é que o Surdo que esteja
assistindo consiga identificar os personagens, ah aquele ali é Moisés, ou é Deus.

O Surdo no dia a dia não fica quebrando as mensagens, é igual ouvir um áudio e ele
fica interrompendo, então se você faz uma leitura corrente fica agradavel, entao é
semelhante para língua de sinais .

Quando Deus fala eu direciono o olhar para baixo (povo), isso é muito importante,
essa marca, estabelecer os lugares do discurso dos personagens, e voltar a fazer
referência e ele no mesmo lugar, como eu vou colocar um personagem do lado
esquerdo e logo em seguida citar ele do lado direito, precisa manter esse
personagem naquele espaço até o final do discurso.

No momento da revisão de tradução se marcamos o mesmo personagem em lugar


diferente isso é identificado e precisa ser refeito. o revisor Surdo vai achar estranho,
nao vai entender a mensagem e perde o objetivo, então a gente não quer que a
tradução fique com erros, agente faz a revisão para evitar o máximo possível essas
falhas.

Com o posicionamento dos personagens e as expressões e direção do olhar eu


consigo reduzir alguns sinais desnecessários, por exemplo, o olhar já identifica o
110

personagem, Moisés, por exemplo, eu uso o cajado, quando eu faço cajado é


Moisés, então eu não preciso usa mais o sinal dele, o Surdo fará referência ao
cajado, então é menos um sinal e fica mais rápida a percepção com o uso do
classificador. a história fica bonita de ver, fica agradável aos olhos,então sao
técnicas que a gente vai usando, se for mulher a gente usa bolsa, ou classifica o
jeito feminino para marcar o personagem, assim a tradução fica mais leve.

Entrevistador: Que perfil de leitor surdo vocês pretendem alcançar?

Revisor: Todos os níveis, desde os que moram nas grandes cidades até os Surdos
do interior que tem pouco contato com a Libras.

Entrevistador: Qual versão da bíblia foi usada no processo de tradução para língua
de sinais?

Confrontador: Tradução do Novo Mundo (revisão de 2015)

Entrevistador: Vocês conseguem receber um feedback da compreensão desses


textos pelos leitores? De que forma? O que eles dizem?

Tradutor I: Geralmente esse feedback é feitos aqui, a gente filma e arquiva ,


alguns Surdos são convidados a vir pra cá, pra assistir, agora mesmo tínhamos
quatro Surdos ali assistindo uma gravação, agente fez o convite para Surdos de
regiões diferentes pra eles assistirem, e dar opinião deles:

- Ah não, essa escolha não tá legal, os Surdos lá da minha região não vão
entender.

Agente convida, combina e eles vêm pra assistir e dar o feedback deles.

Revisor: A maioria dos Surdos responde de forma positiva, a fala é:

- A língua de sinais me ajuda, eu gosto!

Existe uma minoria que acaba reclamando dos sinais regionais, mas fazer o que,
isso é próprio da língua, no geral a sinalização eles gostam, é possível um
aprendizado, porque antes recebiam o texto apenas em português, às vezes o
Surdo gosta de ler também o texto em português, mas não entende com clareza, ah
111

a língua de sinais ajuda entender corretamente, uma clara compreensão, o texto


escrito é importante, porém falta uma explicação de algumas palavras que os
Surdos não entendem, então é isso que a maioria dos Surdos relata que gostam
muito de receber o texto sinalizado. Esse questionário externo geralmente é feito
informalmente, presencialmente com os Surdos, a maioria não gravamos porque
muitos desses surdos ficam nervosos ou envergonhados em frente à câmera, nesse
caso escolhemos entrevista informal, a gente faz a pergunta, eles relatam o que
acham, avaliam de forma positiva ou negativa e a gente faz esses registros, às
vezes eles relatam alguma sugestão de melhorias que tomo nota e repasso pra
equipe de intérpretes, às vezes pedidos para melhorar alguns recursos como
expressão do sinalizador, etc..., essas perguntas são feitas no espaço da igreja, em
congressos ou na casa dos surdos quando vamos estudar com eles, a maioria avalia
de forma positiva, um ou outro que às vezes reclama, os Surdos mais velhos
geralmente da velocidade da sinalização, então em respeito a esse perfil eu repasso
a informação aos intérpretes pra sempre que possível reduzir para uma sinalização
mais calma. A faixa etária dos entrevistados varia, desde mais jovens a idosos.

Tradutor I: - Como a gente tem congregações em todas as cidades, têm


congregações de português e tem congregações de língua de sinais também, eles
sempre entram em contato com agente, como aqui é uma sede, o pessoal de lá
manda cartas, filmagens, essa semana mesmo agente recebeu a filmagem de 12
pessoas diferentes que filmaram e mandaram por e-mail, e aí passou, chamou a
equipe inteira e a gente assistiu, tinha um do Ceará que tava dizendo “muito
obrigado eu gosto muito de estudar em casa, no congresso teve um vídeo eu gostei
muito”, e explicou o que ele gostou, aí teve um do Nordeste, Santa Catarina, etc...,
então o pessoal manda mesmo, eles têm o contato daqui no site e aí eles manda os
vídeos.
112

ANEXO E

CARTA DE APRESENTAÇÃO DO PESQUISADOR

Vitória, ..... de ......................... de 2017.


Senhor (a) .......................................,
Por meio desta apresentamos a acadêmica Eliana Firmino Burgarelli Ribeiro
Santos, do. 8.º período do Curso Letras-Libras Bacharelado, devidamente
matriculado (a) nesta Instituição de ensino, que está realizando a pesquisa intitulada

“Os 10 mandamentos em LIBRAS atravessados por diferentes vozes”. O objetivo da

pesquisa é conhecer os processos de tradução em língua de sinais e a relevância da


tradução da Bíblia em Língua de Sinais como um documento histórico,um tema
ainda quase não pesquisado.
Na oportunidade, solicitamos autorização para que realize a pesquisa através
da coleta de dados entrevistas com ..............................................................................
Queremos informar que o caráter ético desta pesquisa assegura a
preservação da identidade das pessoas participantes.
Uma das metas para a realização deste estudo é o comprometimento da
pesquisadora em possibilitar, aos participantes, um retorno dos resultados da
pesquisa. Solicitamos ainda a permissão para a divulgação desses resultados e
suas respectivas conclusões, em forma de pesquisa, preservando sigilo e ética,
conforme termo de consentimento livre que será assinado pelo participante.
Esclarecemos que tal autorização é uma pré-condição.
Agradecemos vossa compreensão e colaboração no processo de
desenvolvimento desta futura profissional e da iniciação à pesquisa científica em
nossa região. Em caso de dúvida, você pode procurar a coordenação do GEPLES
(Grupo de Estudos e Pesquisas em Libras e Educação de Surdos) por meio do e-
mail: arleneincrivel@gmail.com
Atenciosamente,

..........................................................................................................
PROFª. DRª. ARLENE BATISTA DA SILVA
Coordenadora do GEPLES
Professor (a) orientador(a)
113

ANEXO F

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu_______________________________________________________
portador do RG. Nº __________________, CPF: ______________ aceito participar
da pesquisa intitulada “Os 10 mandamentos em LIBRAS atravessados por
diferentes vozes”, desenvolvida pela acadêmica / pesquisadora Eliana Firmino
Burgarelli Ribeiro, e permito que obtenha fotografia, filmagem ou gravação de minha
pessoa para fins de pesquisa científica. Tenho conhecimento sobre a pesquisa e
seus procedimentos metodológicos.
Autorizo que o material e informações obtidas possam ser publicados em
aulas, seminários, congressos, palestras ou periódicos científicos. Porém, não deve
ser identificado por nome em qualquer uma das vias de publicação ou uso.
As fotografias, filmagens e gravações de voz ficarão sob a propriedade do
pesquisador pertinente ao estudo e, sob a guarda dos mesmos.

....................., ..... de ................................... de 201.......

__________________________________________
Nome completo do pesquisado
114

ANEXO G

CONSENTIMENTO PARA FOTOGRAFIAS, FILMAGEM E GRAVAÇÕES DE VOZ

Eu __________________________________________________________,
portador do RG. Nº __________________, CPF: ______________ permito que o
pesquisador abaixo relacionado obtenha fotografia, filmagem ou gravação de minha
pessoa para fins de pesquisa, científico e educacional.
Concordo que o material e informações obtidas relacionadas possam ser
publicados em aulas, seminários, congressos, palestras ou periódicos científicos.
Porém, não deve ser identificado por nome em qualquer uma das vias de publicação
ou uso.
As fotografias, filmagens e gravações de voz ficarão sob a propriedade do
pesquisador pertinente ao estudo e, sob a guarda do mesmo.

__________________________________________________
ASSINATURA

Acadêmico/Pesquisador: Eliana Firmino Burgarelli Ribeiro


Professor Orientador: Arlene Batista da Silva

.....................,........de.....................2017.
115

ANEXO H

ROTEIRO DE PERGUNTAS

1. Por que uma preocupação das Testemunhas de Jeová/ Adventistas em traduzir


textos da bíblia para língua de sinais?

2. Qual a importância de se traduzir os dez mandamentos?

3. Como aconteceu a gravação dos dez mandamentos? Quais as etapas?

4. Como é composta a equipe de tradução? Há tradutores surdos?

5. Quais semelhança e diferenças na tradução de línguas orais para língua de


sinais?

6. Existe um padrão de cenário e roupa para os tradutores. Como é feita essa


definição?

7. Na tradução, são usados muitos classificadores e incorporação dos


personagens. Por que esses recursos são importantes?

8. Que perfil de leitor surdo vocês pretendem alcançar?

9. Qual versão da bíblia foi usada no processo de tradução para língua de sinais?

10. Vocês conseguem receber um feedback da compreensão desses textos pelos


leitores? De que forma? O que eles dizem?

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