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PROGRAMAS DE GOVERNO

A inclusão social e a popularização da ciência e


tecnologia no Brasil
Ildeu de Castro Moreira interesses e determinações (econômicas, políticas,
Departamento de Difusão e Popularização de Ciência e Tecnologia. militares, culturais etc.) que presidem seus processos
Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social. Ministério
da Ciência e Tecnologia e aplicações. O significado social e cultural da
ciência como atividade humana, socialmente
condicionada e possuidora de uma história e de
tradições, fica muitas vezes camuflado nas
A POPULARIZAÇÃO DA CIÊNCIA E TECNO-
representações escolares e em muitas atividades de
LOGIA COMO UM ELEMENTO DE INCLU-
divulgação, particularmente na mídia. Falar de
SÃO SOCIAL
inclusão social no domínio da difusão ampla dos
A inclusão social é um dos grandes desafios de nosso conhecimentos científicos e tecnológicos e de suas
país que, por razões históricas, acumulou enorme aplicações compreende, portanto, atingir não só as
conjunto de desigualdades sociais no tocante à dis- populações pobres, as dezenas de milhões de
tribuição da riqueza, da terra, do acesso aos bens brasileiros em tal situação, mas também outras
materiais e culturais e da apropriação dos conheci- parcelas da população que se encontram excluídas
mentos científicos e tecnológicos. A inclusão social no que se refere a um conhecimento científico e
pode ser entendida como a ação de proporcionar para tecnológico básico. A razão principal para o presente
quadro reside na ausência de uma educação
populações que são social e economicamente exclu-
científica abrangente e de qualidade no ensino
ídas – no sentido de terem acesso muito reduzido
fundamental e médio do país.
aos bens (materiais, educacionais, culturais etc.) e
terem recursos econômicos muito abaixo da média Em contrapartida, são condicionantes para o
dos outros cidadãos – oportunidades e condições de desenvolvimento científico e tecnológico do país a
serem incorporadas à parcela da sociedade que pode formação de profissionais qualificados em número
usufruir esses bens. Em um sentido mais amplo, a suficiente e seu aproveitamento adequado, além do
inclusão social envolve também o estabelecimento aumento do conhecimento científico e do interesse
de condições para que todos os habitantes do país pela ciência e tecnologia entre a população em geral
possam viver com adequada qualidade de vida e e, em particular, entre os jovens. Consideradas as
como cidadãos plenos, dotados de conhecimentos, características do mundo moderno, a educação
meios e mecanismos de participação política que os informal, aí incluída a divulgação científica (termo
capacitem a agir de forma fundamentada e consci- utilizado aqui também no sentido da popularização
ente. Um dos aspectos da inclusão social é possibili- da CT) tem adquirido importância crescente. Ela se
tar que cada brasileiro tenha a oportunidade de ad- processa por meio de instrumentos variados como os
quirir conhecimento básico sobre a ciência e seu meios de comunicação, os centros e museus de
funcionamento que lhe dê condições de entender o ciência, os programas de extensão universitários, os
seu entorno, de ampliar suas oportunidades no mer- eventos de divulgação, a educação a distância e
cado de trabalho e de atuar politicamente com co- outros. Contudo, o Brasil não dispõe ainda de uma
nhecimento de causa. política pública ampla destinada à popularização da
CT. Ao longo dos anos, surgiram alguns programas
Para a educação de qualquer cidadão no mundo ou iniciativas tópicas como editais para centros e
contemporâneo, é fundamental que ele tanto possua museus de ciência ou o Prêmio José Reis do CNPq,
noção, no que concerne à ciência e tecnologia (CT), mas há a necessidade urgente de se estabelecerem
de seus principais resultados, de seus métodos e usos, políticas gerais e de se formular e executar um
quanto de seus riscos e limitações e também dos programa nacionalmente articulado nesta direção.

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Ildeu de Castro Moreira

Um passo dado pelo atual governo foi a criação de cidadania (na avaliação de riscos e nas escolhas
um departamento voltado para a popularização da políticas), por razões de desempenho econômico e
Ciência e Tecnologia, dentro da Secretaria de CT pelas questões de decisão pessoal (como aquelas
para Inclusão Social (Secis) no Ministério da Ciência referentes à saúde individual). Um outro papel, de
e Tecnologia, que tem, como sua vertente principal, caráter mais interno, surgiu no horizonte da
o objetivo de contribuir para a melhoria da divulgação divulgação científica neste século, em virtude da
científica e da educação científica. Como a inclusão extrema especialização nos campos científicos:
social é uma das prioridades políticas do governo, a é necessário divulgar a ciência entre os próprios
popularização da CT passa a ser também uma linha cientistas e técnicos. Mais recentemente, novas
de ação importante. perspectivas começaram a ser delineadas a partir de
experiências e reflexões na interface entre ciência e
UM POUCO DA HISTÓRIA DA DIVULGA- sociedade. Ao “analfabetismo científico” – aliás, uma
ÇÃO CIENTÍFICA expressão pouco adequada – do público pode ser
A difusão da ciência para o público é tão antiga contraposta, em muitos casos, uma ignorância da
quanto ela própria. A divulgação científica, a partir instituição científica em relação aos aspectos sociais
do estabelecimento da ciência moderna nos séculos da relação com o público e aos condicionantes da
XVI-XVII, apresentou fases distintas, com finalida- ciência. O aprimoramento da cultura científica não
des e características que refletiam o contexto, as implica que ocorra uma linha de mão única na
motivações e os interesses da época. Razões diversi- transmissão do conhecimento: do virtuoso científico
ficadas para essa ação podem ser identificadas des- ao leigo iniciado. Algumas novas iniciativas têm
de o século XVII: Galileu, por exemplo, exerceu um insistido na importância de se proceder a uma ação
trabalho intenso de divulgação, não só da física e da de comunicação que leve em conta a real
astronomia, mas também dos novos métodos de pen- complexidade do processo.
sar e experimentar. No século XVIII, as maravilhas A divulgação científica no Brasil, em que pese sua
da ciência foram exibidas ora como provas da exis- real fragilidade ao longo do tempo, tem pelo menos
tência de Deus, ora como meio para difundir os co- dois séculos de história. As primeiras iniciativas um
nhecimentos necessários ao progresso e à afirmação pouco mais organizadas de difusão da chamada ci-
da razão; a ciência se tornou primeiro uma fonte de ência moderna no Brasil passaram a ocorrer após a
interesse e de diversão para a aristocracia e poste- transferência da Corte portuguesa, em 1808, que pro-
riormente, com o Iluminismo, foi elevada à catego- duziu importantes transformações na vida política,
ria de importante instrumento político. No século cultural e econômica do país e levou à criação das
XIX, com a Revolução Industrial, a ciência adqui- primeiras instituições ligadas à ciência, à publica-
riu um caráter econômico e político mais explícito ção dos primeiros livros e ao surgimento da impren-
ao se tornar símbolo e instrumento para o progresso sa. Na segunda metade do século XIX, as atividades
e para a liberação social. Em contrapartida, as expe- de divulgação se intensificaram em todo o mundo,
dições dos naturalistas europeus a várias partes do na seqüência da segunda revolução industrial na
mundo tiveram um papel importante na incorpora- Europa, acompanhando as esperanças sociais cres-
ção de conhecimentos produzidos em outras cultu- centes acerca do papel da ciência e da técnica. Uma
ras. No século XX, o vínculo entre CT e o tecido onda de otimismo em relação aos benefícios do pro-
econômico-militar se estreitou e emergiram novas gresso técnico percorreu o mundo e atingiu, ainda
relações entre o contexto sociocultural e a ciência; que em escala bem menor, o Brasil. Naquele mo-
surgiu também o marketing institucional, a profissio- mento, o que poderia ser chamado de pesquisa ci-
nalização de divulgadores da ciência e uma inser- entífica no país era ainda limitado a poucas pessoas
ção grande nos meios de comunicação de massa. isoladas e em algumas áreas como astronomia, ciên-
As motivações de hoje para a popularização da CT cias naturais e doenças tropicais.
ocupam todo um espectro: elas vão da prosperidade As décadas de 1920/30 do século passado ficaram
nacional ao reconhecimento do conhecimento marcadas pela intensificação das iniciativas de di-
científico como parte integrante da cultura humana, vulgação científica. Um dos objetivos da pequena elite
passando pelo seu significado para o exercício da acadêmica que a promovia era sensibilizar o poder

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A inclusão social e a popularização da ciência e tecnologia no Brasil

público, o que propiciaria a criação e a manutenção tro ou museu de ciências a cada ano. Para fins com-
de instituições ligadas à ciência, além de possibilitar parativos, a visitação a museus em alguns países eu-
maior valorização social da atividade de pesquisa. No ropeus chega a atingir 25% da população. Do ponto
entanto, o caráter da divulgação científica era ainda de vista da formação de profissionais na área de co-
fragmentado e lacunar, reflexo direto da situação municação em ciência, as iniciativas são ainda inci-
muito frágil do meio científico de então. pientes, embora haja um interesse crescente por cur-
sos deste tipo. Faltam também estudos e análises mais
Após a II Guerra Mundial, com a política nacional- aprofundadas sobre as estratégias, práticas e o im-
desenvolvimentista e as tentativas de desenvolvimen- pacto das atividades de divulgação e sobre as ca-
to na área nuclear, diversas instituições científicas racterísticas, atitudes e expectativas da audiência.
foram criadas em seqüência. Afinada com o contex- A valorização acadêmica das atividades de exten-
to da época, a ciência surgiu aí com uma perspecti- são, em particular na divulgação científica, é ainda
va redentora e como um instrumento para a supera- pequena. Pontos positivos a serem destacados foram
ção do subdesenvolvimento nacional. Em 1948, foi a criação recente, pelo CNPq, do Comitê Temático
criada em São Paulo a Sociedade Brasileira para o de Divulgação Científica e o surgimento de vários
Progresso da Ciência (SBPC). Suas reuniões anuais, editais para divulgação científica e extensão uni-
que circulam pelas principais cidades, logo se torna- versitária.
riam um espaço importante para a discussão dos
grandes problemas da ciência no país e para a orga- Do lado da mídia, a cobertura sobre CT nos meios
nização dos cientistas. Nos anos 1960, sob o influxo de comunicação é no geral deficiente e freqüente-
de transformações ocorridas, nos EUA, na educação mente de qualidade inferior. Na mídia impressa e
em ciências, iniciou-se no Brasil um movimento edu- televisiva, a ciência é apresentada usualmente como
cacional renovador, escorado na importância da ex- um empreendimento espetacular, no qual as desco-
perimentação para o ensino de ciências. Tal movi- bertas científicas são episódicas e realizadas por in-
mento, entre outras conseqüências, levou ao surgi- divíduos particularmente dotados. As aplicações reais
mento de centros de ciência no país, ligados mais ou imaginadas da ciência recebem grande ênfase,
diretamente ao ensino formal, que contribuíram para mas o processo de sua produção, seu contexto, suas
as atividades de popularização da ciência. limitações e incertezas são usualmente ignorados e
predominam modelos conceituais simplificados so-
QUADRO ATUAL DAS ATIVIDADES DE bre a relação ciência e público, como o ‘modelo de
EDUCAÇÃO E DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA déficit’.
Tem sido observada nas duas últimas décadas uma Quanto à educação científica formal, o quadro se
expansão significativa de ações relacionadas à di- apresenta sombrio, com o desempenho em geral muito
vulgação científica no Brasil: criação de centros e baixo dos estudantes brasileiros nos assuntos que
museus de ciência; surgimento de revistas e websi- envolvem ciências e matemáticas. O ensino de ci-
tes; maior cobertura de jornais sobre temas de ciên- ências é, em geral, pobre de recursos, desestimulan-
cia, em especial aqueles ligados à genética moderna te e desatualizado. Curiosidade, experimentação e
e seus impactos; publicação crescente de livros; or- criatividade geralmente não são valorizadas. Ao lado
ganização de conferências populares e outros even- da carência enorme de professores de ciências, em
tos que despertam interesse em audiências diversifi- especial professores com boa formação, predominam
cadas por todo o país. Mas o quadro se mostra ainda condições de trabalho precárias e pouco estímulo ao
frágil e limitado com amplas parcelas da população aperfeiçoamento. As deficiências graves em labora-
brasileira sem acesso à educação científica e à infor- tórios, bibliotecas, material didático, inclusão digi-
mação qualificada sobre CT. Como um reflexo da tal e outras só fazem tornar mais difícil o quadro. Se
desigualdade na distribuição da riqueza, dos recur- nosso ensino médio sofreu expansão acelerada nos
sos em CT e dos bens educacionais, os museus de últimos anos, ainda assim uma parcela muito pequena
ciência estão fortemente concentrados em poucas de brasileiros conclui esta etapa. A média de esco-
áreas do país. Apesar do crescimento expressivo dos laridade dos brasileiros (menos de oito anos) é mui-
últimos anos, um número muito pequeno de brasi- to baixa quando comparada com países desenvolvi-
leiros, cerca de 1% da população, visita algum cen- dos e mesmo com outros países latino-americanos.

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Ildeu de Castro Moreira

No ensino universitário, é ainda muito reduzida a PROPOSTAS PARA A FORMULAÇÃO DE


proporção de estudantes (11% em relação à popula- UMA POLÍTICA DE POPULARIZAÇÃO DA
ção), quase 80% deles em faculdades particulares. CT
E apenas 1% dos jovens brasileiros se volta para car-
reiras em áreas de CT. Como vimos, a divulgação científica e tecnológica
tem um papel importante na formação permanente
Em função desta análise, algumas linhas prioritárias de cada pessoa e no aumento da qualificação geral
de ação no domínio da divulgação científica e tec- científico-tecnológica da sociedade. Em função dis-
nológica foram estabelecidas pela Secis/MCT para o to, muitos países têm estabelecido, nas últimas dé-
período 2004/2006: cadas, políticas e programas nacionais voltados para
a popularização da CT, como ocorreu na Inglaterra,
1. apoio a centros e museus de ciência (criação e
EUA, Chile, França e China. Na formulação e exe-
fortalecimento de centros e museus de ciência, iti- cução de um programa deste gênero devem ser mo-
nerância de exposições, Programa Ciência Móvel); bilizados setores sociais como universidades, insti-
2. estímulo a uma presença maior e mais qualificada tuições de pesquisa, centros e museus de ciência,
da CT na mídia; entidades científicas, profissionais e sindicais, órgãos
governamentais, mídia impressa e televisiva, empre-
3. colaboração na melhoria do ensino de ciências sas e outras entidades, com a finalidade de promo-
nas escolas (em parceria com o MEC), com apoio a ver um conjunto de atividades de divulgação cien-
olimpíadas, feiras de ciências, concursos e outros tífica de forma articulada e permanente. O progra-
eventos e à melhoria da qualificação e das condi- ma deve ser estabelecido a partir de ampla discus-
ções de trabalho dos professores; são com os setores interessados e atuantes na produ-
ção e na transmissão de conhecimentos. Uma pro-
4. criação e consolidação da Semana Nacional de posta inicial para uma política pública de populari-
Ciência e Tecnologia. A realização da Semana Na- zação da CT foi apresentada e discutida recente-
cional de Ciência e Tecnologia em 2004 e 2005 teve mente na III Conferência Nacional de Ciência, Tec-
êxito grande; nologia e Inovação, e alguns de seus principais pon-
5. apoio a eventos importantes de divulgação cientí- tos estão sintetizados abaixo.
fica, como encontros da Sociedade Brasileira para o Diretrizes gerais para uma política pública de po-
Progresso da Ciência (SBPC) e entidades similares, pularização da CT
as comemorações do Ano Mundial da Física (2005),
ou do centenário do vôo do 14-Bis (2006); As ações nesta direção devem contribuir para o au-
mento da apreciação coletiva do valor e da impor-
6. promoção de ações regionais de divulgação em tância da CT no mundo moderno, para um conheci-
parceria com governos estaduais e municipais, uni- mento científico-tecnológico geral mais aprofunda-
versidades e instituições de pesquisa, Terceiro Setor do, para uma valorização e estímulo da capacidade
e outras; criativa e de inovação e para um entendimento por
parte do cidadão do funcionamento do aparato ci-
7. apoio à formação e qualificação de comunicado-
entífico-tecnológico, inclusive de seus vínculos e li-
res em ciência e busca de valorização acadêmica da
mitações.
área;
Entre os objetivos centrais da popularização da CT,
8. programas dos centros vocacionais tecnológicos e estão suas contribuições para promover a melhoria e
de inclusão digital com forte componente voltada maior atualização/modernização do ensino das ciên-
para a popularização da CT; cias em todos os níveis de ensino, com ênfase nas
9. estabelecimento de cooperações com governos e ações e atividades que valorizem e estimulem a cri-
organismos internacionais [Ibero-América (Cyted), atividade, a experimentação e a interdisciplinarida-
Mercosul (Recyt), Unesco, RedPop e outros] na área de; aumentar a auto-estima dos brasileiros neste
da popularização da CT. domínio com uma justa apreciação das contribui-
ções de indivíduos, instituições e empresas nacio-
nais; estimular o uso e a difusão da CT em ações de

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A inclusão social e a popularização da ciência e tecnologia no Brasil

inclusão social e redução das desigualdades; pro- extensão e divulgação científica; (b) criar uma agên-
mover ações que estimulem o aumento da participa- cia de notícias em CT, ágil e eficiente, em parceria
ção na CT de jovens de todos os segmentos (por do MCT com entidades de CT, universidades, insti-
exemplo: mulheres e jovens de estratos sociais po- tuições de pesquisa, secretarias de CT e outras; (c)
bres); estimular que as atividades de PCT não se estimular a formação cidadã para todos os estudan-
restrinjam às áreas de ciências exatas e naturais, mas tes das universidades e instituições tecnológicas pú-
que incorporem também as ciências sociais e huma- blicas com a criação de um mecanismo que faça com
nas; promover interação entre ciência, a cultura e a que o estudante de escola superior pública desen-
arte, com maior aproximação da CT ao cotidiano volva, ao longo da formação universitária, um perío-
das pessoas e valorizando os aspectos culturais e hu- do de atividades comunitárias; (d) estabelecer cur-
manísticos da ciência; promover o respeito ao meio sos de formação/qualificação para comunicadores da
ambiente e à diversidade regional e cultural e o re- ciência, inclusive à distância; (e) promover pesqui-
conhecimento de conhecimentos populares e tradi- sas periódicas sobre a percepção pública da CT e a
cionais; estimular e promover maior participação construção de indicadores em parceria com outras
popular nas questões gerais de CT. iniciativas internacionais; (f) promover a distribui-
Propostas organizativas de caráter geral ção de livros de educação científica e divulgação
científica para bibliotecas públicas; (g) realizar ações
Duas propostas de caráter geral foram sugeridas. junto aos espaços legislativos para informar parla-
A primeira delas é a criação do Fórum Nacional de mentares e assessores sobre temas de CT; (h) esti-
Popularização de Ciência e Tecnologia com partici- mular a criação de empresas inovadoras para a pro-
pação da comunidade científica e tecnológica, de dução de materiais didáticos e de divulgação de CT.
governos, empresas e da sociedade civil. Seu objeti-
vo será articular todos estes setores no sentido de 2. Meios de comunicação
formular e executar políticas e ações voltadas para a (a) atuar em parceria com tevês e rádios estatais e
educação científica e a popularização da CT no Bra- comunitárias, além de universidades, instituições de
sil. Este fórum seria também o responsável por um pesquisa, centros e museus de ciência, para o de-
grande portal de educação e divulgação científicas. senvolvimento de programas de divulgação da CT
Como segundo ponto foi proposto o estabelecimento em rádio e TV; (b) apoiar iniciativas de populariza-
e aplicação do Programa Nacional de Popularização
ção da CT de secretarias estaduais e municipais,
da CT para a próxima década (2006-2016).
inclusive a produção de encartes em jornais locais;
Algumas linhas de ação e programas específicos (c) ampliar o uso de revistas de DC nas escolas (como
já tem sido feito com a revista Ciência Hoje das
São citados abaixo alguns tópicos que podem nor- Crianças); (d) promover estágios de jornalistas em
tear a discussão de linhas de ação para a populariza- laboratórios de pesquisa e de cientistas interessados
ção da CT. Ressalte-se que não podem ser ignora- em redações de meios de comunicação; (e) estimu-
das as inúmeras contribuições das universidades e lar a criação de desenvolvimento de programas/cam-
instituições públicas de pesquisa, apesar das dificul- panhas de inclusão social no que tange à educação
dades financeiras que criam obstáculo forte para o científica (tevês, jornais, ônibus, metrô etc.).
desenvolvimento científico e tecnológico. Mas é
necessário reconhecer que o potencial de ação des- 3. Educação científica
sas instituições é muito maior do que o efetivamen-
te realizado, tanto no âmbito da pesquisa e do ensi- (a) apoiar iniciativas de introdução das ciências no
no, quanto no das atividades de extensão e de inte- ensino fundamental; (b) apoiar programas de
ração com a comunidade, nas quais a divulgação aprimoramento da formação inicial e qualificação
científica se insere. de professores nas áreas de ciências (com o MEC,
secretarias estaduais e municipais, universidades e
1. Popularização da CT outras instituições). Promover a valorização da
atividade do professor com bolsas, apoio a projetos
(a) promover ações junto às universidades e agên- de pesquisa nas escolas e estágios em laboratórios,
cias de fomento para a valorização do trabalho em premiações etc.; (c) estimular e apoiar a realização

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de feiras de ciências, olimpíadas, certames e co (ou estrutura similar) para renovação e inovação
concursos que favoreçam a criatividade, a inovação educacional em ciências e matemática com recur-
e a interdisciplinaridade; (d) produzir e distribuir sos provenientes dos lucros nada desprezíveis dos
material didático de qualidade (livros, softwares, bancos. Em contrapartida, um mecanismo adotado
laboratórios, equipamentos, livros etc.) para o ensino em certos países europeus (e em determinados pro-
básico; (e) criar um programa para que todas as gramas da Fapesp) faz com que os projetos de pes-
escolas de ensino médio tenham laboratórios de quisa de longa duração tenham pequeno percentu-
ciências e que eles sejam utilizados de fato; (f) al associado a atividades de Pesquisa em C e T.
possibilitar o acesso à internet em todas as escolas
brasileiras; (g) apoiar programas como o Cientistas As profundas desigualdades na distribuição das opor-
nas Escolas; (h) promover o uso de tecnologias tunidades educacionais e do conhecimento são ain-
da desafios grandes para a inclusão social em nosso
assistivas na educação científica.
país. A incorporação de grandes parcelas marginali-
Ficou claro, a partir dos debates da III Conferência, zadas da população é uma tarefa importante, cuja
que é premente a necessidade de profunda reforma chance de êxito dependerá do estabelecimento de
educacional em todos os níveis, em particular no que um processo coletivo suficientemente amplo, que
se refere à educação científica. Não um movimento envolva órgãos governamentais, instituições de pes-
apenas da comunidade científica e educacional ou quisa, universidades, entidades científicas e tecno-
de órgãos governamentais, mas bem mais amplo e lógicas, cientistas, comunicadores, pesquisadores,
que congregue, além das escolas, universidades e professores e estudantes.
instituições científicas, muitos outros setores soci-
No entanto, não devemos nos esquecer que a ciên-
ais. A educação deve ser vista como um problema
cia, por si mesma, não resolve os graves problemas
de Estado, e deve se buscar o estabelecimento de de desigualdades sociais, de desemprego, de degra-
uma espécie de pacto nacional para renovar a edu- dação ambiental, para não falar de problemas éti-
cação brasileira na próxima década. Esse é um dos cos. Mais ciência e tecnologia não significa neces-
grandes desafios deste início de milênio. sariamente mais justiça, maior igualdade e melho-
res condições de vida, particularmente no Terceiro
4. Fontes de financiamento
Mundo. Trata-se de uma condição necessária, mas
Ao se formular uma proposta de programa voltado não suficiente. Não custa lembrar Einstein: “Não
superestimem a ciência e seus métodos quando se
para a popularização da CT, um dos aspectos impor-
trata de problemas humanos!.(...) O intelecto tem
tantes é a análise das possíveis fontes de financia-
um olho aguçado para os métodos e ferramentas, mas
mento. Para a execução de tais ações, podem ser
é cego quanto aos fins e valores.”
relacionadas com possíveis financiadores: (1) o go-
verno federal, por meio do MCT, MEC, outros mi- Terminemos com uma palavra de alerta do grande
nistérios, agências de fomento e empresas estatais; divulgador da ciência Carl Sagan:
(2) emendas parlamentares; (3) secretarias de CT
estaduais e municipais e FAPs; (4) setor privado: Construímos uma civilização global na qual os
apoio direto ou uso da Lei de Inovação e da Lei Rou- elementos mais cruciais dependem profundamen-
anet; (5) apoio de organismos internacionais. te da ciência e da tecnologia. Arranjamos as coi-
sas de modo que quase ninguém entende a ciên-
Novos mecanismos para financiamento de ativida- cia e a tecnologia. Essa é uma prescrição para um
des de educação e divulgação científicas podem ser desastre. Em todos os usos da ciência é insufici-
imaginados, como o uso de recursos provenientes dos ente, e na verdade é perigoso, produzir somente
Fundos Setoriais. Este mecanismo foi usado para isto, uma pequena confraria de profissionais altamen-
em escala muito pequena, em 2005; em 2006 houve te competentes e bem pagos. Ao contrário, al-
um acréscimo substantivo dos recursos dos Fundos guns entendimentos fundamentais dos achados
destinados a esta finalidade, embora ainda perma- e métodos da ciência devem estar disponíveis na
neçam pequenos. Uma possibilidade que tem sido escala mais ampla.
levantada é a criação de um fundo setorial específi-

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