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Eduardo Machado
Eduardojtmachadomail.com
[MESMIDADE DE DEUS] 0
Sinopse
O núcleo central do escrito propõe uma reflexão acerca da natureza de Deus enquanto
realidade fundante da existência e das suas relações com o cosmos a partir de três
atributos fundamentais – amor, consciência e luz.
Entre outros aspectos possíveis, pode encontrar-se ao longo das suas linhas dois
diálogos fundamentais que, de alguma forma, por incontornáveis que são, sempre
estiveram presentes no decurso de toda a história daquela filosofia espiritual que centrou
a sua dinâmica especulativa em torno de uma origem radical de toda a existência. São
eles: o diálogo trindade/unidade e o diálogo transcendência/imanência.
Ao propor uma reflexão sobre Deus e suas relações com a sua criação, o escrito tem
implícitos os principais vectores estruturantes, para além das múltiplas propostas
espirituais concretas que proliferam no mundo, do caminho de reencontro do Homem
consigo mesmo e com Deus; vectores, esses que poderão e se calhar deverão ser
tornados explícitos numa fase posterior.
Hoje, mais do que nunca, urge uma nova investigação espiritual, única capaz de permitir
encontrar os novos caminhos que a ciência, a cultura e a sociedade necessitam de trilhar
para encontrarem as respostas e as vias estruturantes de um mundo que hoje se augura,
com um mais profundo sentido de justiça, de caridade, uma nova política de exploração
de recursos e novos conceitos capazes de permitirem e enquadrarem socialmente o
crescimento da Humanidade no sentido da realização da sua verdadeira natureza.
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Mesmidade
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consciente é a própria unidade da mesmidade, objectivada perante si
mesma.
26. Contemplar implica uma saída de si mesma, voltada sobre si mesma. Sai
de si mesma pela forma, voltada para si mesma, porquanto a forma é
forma de si mesma.
28. O devir e a sucessão dos entes são formas que a própria mesmidade
assume. Não se esgotando em nenhum deles, nem tão-pouco na própria
forma a mesmidade está, no entanto, presente em tudo, apesar de
exterior a si.
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31. A formação do princípio consciente, por desdobramento da mesmidade
em si mesma, é já um acto criador.
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45. O espaço/tempo é pura possibilidade de forma; é o vazio, em cada
momento, na sua possibilidade concreta.
49. A consciência individual, enquanto tal, é uma ilusão, pois ela não é mais
do que um auto-reconhecimento da consciência no criado.
50. Na mesmidade, tudo está em tudo de uma forma plena; no mundo, tudo
está em tudo de uma forma potencial; por tal motivo, no mundo, temos
uma interacção permanente de tudo com tudo. Por isso, o devir
específico de cada homem se inscreve num devir global; no caso
especificamente humano, num devir colectivo. Nenhum homem controla
totalmente o seu devir e, muito menos, quando este se inscreve num
devir colectivo.
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57. Todo o criado, enquanto criação que a mesmidade faz de si própria,
tende para a mesmidade, o que mais não é do que estar no movimento
de retorno a si.
70. O amor tende para si mesmo. Tudo na existência tende para a unidade que é a
expressão e realização desse amor.
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Mesmidade
1. Mesmidade é
2. Mesmidade é
3. A sua potenc
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4. Potencialidad
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própria. Da mesma forma que um ser humano, ao longo da vida, evolui e se
transforma, não se esgotando em nenhuma das suas experiências nem em
nenhum dos diversos papéis que desempenha ao longo da vida, não
deixando, contudo de ser ele próprio, assim também a mesmidade é
plenamente em cada momento, não se esgotando naquilo que é.
5. Mesmidade e
6. O devir conc
7. A transcendê
Ser e não-ser são realidades relativas que existem uma por relação à outra.
Os limites de um são o início do outro. A possibilidade ou potencialidade de
um é constrangida ou por si próprio ou pelo outro. A potencialidade pura
está para além destes constrangimentos e daí o carácter absolutamente
transcendente da mesmidade relativamente a esta dualidade. Ser e não-ser
são já realidades do domínio do existente ou do acto relativo. Resultam da
dinâmica de criação específica de cada momento, da mesmidade. O
movimento e a mudança estruturam-se com base em dinâmicas geométricas
de combinação de ser e não-ser. O presente é; o passado [já] não é; o
futuro [ainda] não é. No espaço, o aqui é [o aqui]; o ali não é [o aqui] mas,
por outro lado, é [o ali]. A mesmidade é o tempo todo e o espaço todo. É a
própria possibilidade do espaço e do tempo. A potencialidade relativa de
ente, ou de um qualquer criado, radica na potencialidade pura ou infinita da
mesmidade. A potencialidade relativa é uma ilusão. Resulta apenas da
antecipação de uma possibilidade de evolução da mesmidade no contexto
das suas infinitas possibilidades. Estas radicam na sua potencialidade pura.
Um jovem muito inteligente é potencialmente um homem ou uma mulher
brilhante. Se morrer precocemente, essa potencialidade não chega a
concretizar-se. O brilho augurado em jovem é apenas a antecipação de uma
possibilidade entre muitas, tendo-se concretizado a da morte, também ela,
uma de entre muitas. A única verdadeira potencialidade é aquela que
efectivamente se concretiza em acto. Só se concretiza a potencialidade total,
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aquela que é sem constrangimento, a potencialidade pura da mesmidade que
se cria a si mesma pela concretização da sua própria possibilidade.
Enquanto potencialidade pura, em cada momento, gera novas
possibilidades, de si mesma e, como tal, não é encerrável por si própria,
escapando-se, continuamente, no imenso abismo da sua própria
potencialidade. Na potencialidade relativa está-se perante uma
possibilidade concreta e específica e, de algum modo, resultado de um
constrangimento. Uma criança é um adulto potencial e não um outro animal
ou mesmo outra realidade qualquer. A força que lhe confere a
potencialidade é, ao mesmo tempo, a força que a constrange e que a impede
de se tornar algo diverso daquilo que é a sua potencialidade específica. Na
potencialidade pura ou absoluta não há constrangimento e, como tal,
potencialidade pura é mera possibilidade, possibilidade infinita. Na
potencialidade pura há uma absoluta identidade entre intensidade de
possibilidade e diversidade de possibilidade. Enquanto na potencialidade
relativa, devido ao constrangimento, a possibilidade de diversidade é
reduzida, na pura, pela inexistência de constrangimento, ela é absoluta,
total. Nesta possibilidade infinita, a mesmidade não está constrangida, nem
por si mesma ou, melhor dizendo, está constrangida pela sua própria
possibilidade, só que, como esta é infinita e, portanto, indeterminável, ela é
constrangida pela infinitude da sua possibilidade e, como tal, é não
constrangida. Não constrangida significa livre de si e, como tal,
transcendente a si própria.
8. A mesmidade
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potencialidade pura ou possibilidade infinita, na qual se inscreve a
necessidade da sua transcendência. A sua unidade é, portanto, uma unidade
potencial mas nunca inteiramente realizada de uma vez por todas, devido ao
seu carácter transcendente.
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é, está sempre em expansão. Como a sua essência é criadora, a mesmidade
só se realiza criando. Criar é, portanto, o encontro consigo mesma e, por
isso, a coincidência entre os movimentos de contracção ou recolhimento e
de expansão. Aparentemente contraditórios são o mesmo.
9. No moviment
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de si, por infinitude, o amor é puro. Na sua essencialidade é puro amor, sem
objecto.
10. A absoluta tr
desdobramento da mesmidade, sobre si mesma e em si mesma.
11. O desdobram
12. Enquanto po
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13. Ao contempla
14. Contemplar
contemplado. Esta autonomização plena é a criação, é um simples vir à
existência.
15. A objectivaçã
por contemplação e enquanto exteriorização, gera o real. O existente é a
exteriorização e objectivação do nada enquanto possibilidade total da
mesmidade.
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Contemplar-se implica uma exteriorização relativamente a si mesma. Dada
a unidade intrínseca da mesmidade, a saída de si própria dá-se através de si
própria. Exterioriza-se através da sua própria possibilidade, contemplando-
a. Quando contempla, encontra-se a si própria e realiza-se, tornando-se
aquilo que é. A dimensão do amor, enquanto consciência, é o culminar do
processo de encontro consigo mesma; como a sua essência é criadora,
porque amorosa, porque potencialidade pura não constrangida, encontra-se
a si própria, criando. Nesta conformidade, a dimensão do amor enquanto
consciência é a condição do processo criador. Pela consciência de si, a sua
potencialidade pura é acto puro. Enquanto potencialidade pura, livre de
todo o constrangimento, a mesmidade é pura afirmação espontânea de si
própria; afirmação, essa, movida pela dinâmica do amor em si e por si que
a leva a repetir-se indefinidamente nesse acto amoroso. É nessa afirmação
de si que reside o seu poder criador. O amor em si e por si, enquanto força
absolutamente unificadora, gera como que uma compressão infinita de si
mesma, por realização da unidade absoluta. A afirmação pura de si mesma
tem toda essa força infinita, o que equivale a dizer potencialidade infinita.
Enquanto afirmação pura de si mesma, é a afirmação da sua própria
possibilidade, possibilidade essa que é afirmada porque conhecida, em
resultado da consciência que, através da contemplação, desenvolve acerca
de si própria. A contemplação, porque permite uma afirmação concreta e
concretizadora de si mesma, é condição de criação. Contudo, porque não há
afirmação sem consciência, elas são uma única e mesma realidade. É pela
consciência que se afirma em si própria, perante si própria e perante nada
mais, pois nada mais há para além de si.
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reconciliação. Como a sua essência é amor, esta auto-reconciliação, que o é
sempre com a sua essência, é uma auto-reconciliação amorosa que é a
afirmação de si própria; que a transforma em acto puro de si mesma e que
constitui a criação.
16. Mesmidade, p
17. O princípio c
18. No momento
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em acto puro de si. A luz, enquanto resultado e condição do encontro do
amor consigo próprio através da consciência é, no fundo, a primeira
estrutura de forma e, por isso, ela é o acto criador originário. Como existe
uma unidade intrínseca entre amor, consciência e luz, também aqui se
verifica não ser concebível a existência da mesmidade sem a criação de si
mesma. A luz é o esplendor de si própria enquanto acto puro [de si] e é o
momento originário. Como se transcende continuamente a si própria e,
consequentemente, se busca e se reencontra, há um enriquecimento
progressivo dos sentidos de si e, com isso, um enriquecimento das formas e,
portanto, da criação. Se a mesmidade existisse encerrada no interior da sua
própria possibilidade, porque sem limites, estando ela totalmente presente
em todo e qualquer ponto de si própria, não teria possibilidade de
movimento e de evolução. Ora, como possibilidade infinita, ela é também
possibilidade do seu próprio movimento e da sua própria evolução. Ao
exteriorizar-se, pela concretização dos sentidos possíveis que contempla em
si própria, gera novas perspectivas em si mesma, a partir das quais se
reencontra com o sentido de si mesma. É a partir dessas novas perspectivas
que regressa a si, reintegrando esses sentidos no sentido originário que a
todos contém e do qual nunca saiu, num processo de integração contínuo e
de celebração da sua própria unidade.
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20. O princípio c
21. Resultante da
objectivada perante si mesma.
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Este é o fundo sobre o qual se produz o desdobramento, é a própria
“matéria” que o permite sem perda de unidade. É o Espírito Santo também
que induz na mesmidade o movimento de busca permanente de si mesma. É,
portanto, a sua acção que conduz ao reencontro da mesmidade consigo
própria, geradora dos momentos de luz resultantes do fulgor amoroso do
reencontro e que é o acto originário de criação. Por esse motivo, na
espiritualidade cristã, o Espírito Santo é vulgarmente associado à Luz.
24. A forma é o
criadora, dá forma, gerando um existente. Contudo, essa forma não é mais
do que uma forma possível, na mesmidade contemplada por si mesma.
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25. A contemplaç
não é um resultado da contemplação – é a própria contemplação.
26. Contemplar i
28. O devir e a su
29. A exteriorida
geração da consciência. A objectivação e a formação do princípio
consciente são um único processo - a contemplação criadora.
31. A formação d
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34. Mesmidade é
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35. O princípio c
36. A consciência
37. A consciência
pela geração da vontade.
38. Vontade é o d
39. Consciência
potenciada pelo sentido originário.
43. Só através de
transparência.
44. O existente é
45. O espaço/tem
46. A ordem é o r
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instância radica no facto de serem perfeitos, unos e completos em si
mesmos. Esta unidade torna-os igualmente transparentes em si próprios e
perante si próprios, resultando daí a dimensão da consciência. Esta é,
portanto, uma auto-transparência do ser perante si mesmo.
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forma e conteúdo, se capta a si mesmo. A diferença entre o grande vazio que
a mesmidade é e o mero nada é que este vazio, totalmente transparente a si
mesmo, encerra todos os sentidos que uma consciência perante o vazio
consegue gerar, enquanto o nada é uma mera possibilidade, um dos infinitos
sentidos que a mesmidade pode encontrar para si própria. Pleno de si
mesmo, por ser livre de todo e qualquer constrangimento, o vazio é
abundância pura de si mesmo e, nesta abundância, reside a sua dimensão e
dinâmica amorosas.
47. O desdobram
Não tem sido possível, até hoje, captar a forma que o princípio consciente
assume na matéria nem, tão pouco, nos seres vivos que não o Homem.
Começa a haver alguns vislumbres sobre formas possíveis de inteligência
em alguns animais mas o seu conhecimento é, ainda, rudimentar. No
Homem, contudo, já muito começa a ser dito. De absolutamente essencial,
encontra-se a dualidade como estrutura fundante da consciência. Dualidade
que se manifesta de diversas formas, como por exemplo: no espaço, com o
aqui e o não aqui, interior/exterior; no tempo, com o agora e o não agora;
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eu/outro; consciente/inconsciente; ser/não ser. Este carácter dual da
consciência humana é a estrutura gnoseológica fundante e está na base da
sua percepção do mundo. A dualidade entre o “aqui” e o “não aqui”
permite uma noção de espaço contínuo e com dimensões. Sem a alternância
“aqui” e “não aqui” não haveria dimensões no espaço. A alternância da
dualidade é que permite a explicação do mundo aos olhos da minha
consciência. Toda a forma se dá por alternância. Na mesmidade, a
dualidade gerada no desdobramento, contudo já superada originariamente e
superada também pela auto-transparência pura, está na origem do acto
contemplativo criador.
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ser, a transcendência absoluta do princípio consciente é possível pela
possibilidade infinita. A possibilidade infinita de algo e a transcendência
absoluta do princípio consciente originam-se mutuamente. A transcendência
absoluta do princípio consciente reside no potencial absoluto de algo e, este,
na possibilidade infinita, absolutamente radical da consciência. Só na
vacuidade suprema é possível o todo potencial.
48. A consciênci
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“momento” contemplativo que lhe dá origem. O aperfeiçoamento dessa
sintonia permite, a cada homem concreto, a evolução no sentido de si
mesmo e, em última análise, está na origem da evolução do pensamento
ético, estético, científico e filosófico, bem como da ascese interior do sentir.
49. A consciência
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que permite e produz a auto-contemplação criadora, pressupõe, quando
abordado por uma mente dual como a humana, duas dimensões: uma, de
consciência e outra, quase se pode dizer, obscuramente potencial. Existem
uma por relação à outra: a obscuridade, por relação à consciência; a
consciência, por relação à obscuridade. No complexo humano passa-se algo
semelhante. É o Homem e o seu devir. O devir, em cada homem, não é mais
do que a contemplação activa e comprometida das suas próprias
possibilidades. Torna-se consciente delas na medida em que se lhe impõem
com a sua realidade, com a sua imediatez, assumindo elas essa realidade,
para si, na medida em que delas toma consciência.
50. Na mesmidad
global; no caso especificamente humano, num devir colectivo. Nenhum
homem controla totalmente o seu devir e, muito menos, quando este se
inscreve num devir colectivo.
52. A mesmidade
enquanto consciência ilimitada de si mesma, na sua mesmidade, até do seu
próprio desconhecido, enquanto desconhecido, é consciente.
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inconsciente. È deste tipo de dinâmica que resultam as patologias psíquicas.
Estas resultam de uma negação do ser, do ser na minha existência que se
quer dar, mas que eu não quero que se dê. O Homem tem, portanto, duas
dinâmicas de inconsciência: uma criadora e criativa e outra inibidora da
criação, da espontaneidade do ser. A negação de ser resulta de
condicionamentos artificiais da consciência, muitas vezes por educação;
outras, por incapacidade de vivenciar a incomportabilidade do sofrimento.
Esta resolve-se de duas formas possíveis: por negação ou supressão e por
superação. A negação consiste num relegar para fora da esfera do
consciente. Sendo o devir algo que não está no âmbito da esfera das opções
humanas e, como tal, compulsivo, impondo-se ao Homem, a negação
daquele gera realidades autónomas a que chamamos (na esteira de Freud)
complexos que são elementos fracturantes da identidade única de cada
homem. A superação, e em particular a da incomportabilidade, reside na
busca de sentidos progressivamente mais elevados que permitam integrar
esse sofrimento num conjunto existencial e vivencial harmonioso. O
verdadeiro sofrimento, na sua incomportabilidade, reside no facto de a sua
vivência não ter, por vezes, sentido. O sentido é o verdadeiro factor de
sublimação do sofrimento. O sentido dos sentidos é o amor e, por isso, ele é
o verdadeiro sublimador do sofrimento. Este resulta de uma desordem.
Quando entendido à luz do amor, uma ordem mais profunda é infundida,
perdendo o sofrimento a sua dimensão avassaladora e transformando-se
num factor de harmonia e desenvolvimento interiores.
53. A consciência
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carne, a ascese do Homem em direcção a si mesmo é completa. O sentir é a
forma específica de consciência da corporeidade. O sentir é a consciência
enquanto carne. Nesta unidade intrínseca reside a verdadeira consciência, à
luz da qual adquire sentido pleno a vida humana. O corpo, enquanto
“topos” e porque é “topos”, é condição absoluta de realização e de auto-
reconhecimento da consciência da mesmidade, topos de si mesma. O sentir
próprio da carne e na carne introduz uma dimensão de verdade imediata,
concreta iniludível, sendo através dele que se concretiza a ligação íntima e
original à vida vibrante, para além de tudo o que se pode dizer, que a
mesmidade, na sua inefabilidade, também é.
55. Mesmidade é
56. Mesmidade t
59. A criação é d
60. O culminar d
oceano da consciência.
61. O retorno é u
62. O amor é o c
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A mesmidade, na sua natureza essencial, é absolutamente transcendente à
criação. Não o ser significaria ficar apegada e, portanto, constrangida por
si mesma. Contudo, a criação, enquanto mesmidade, tende para si própria e,
como tal, todo o seu movimento é determinado por um regresso a si mesma,
por um reencontro, uma fusão consigo mesma. A mesmidade está presente
na criação, em cada ente, de uma forma absoluta, mas potencial. O
reencontro pleno da mesmidade consigo própria culmina quando, pela via
do ente e em ente, se reconhece a si própria como mesmidade. Quando tal
acontece dá-se a divinização do ente e consuma-se a unidade plena da
mesmidade em todas as suas dimensões. É a plena identificação da
imanência com a transcendência sem perda de nenhuma. É a transcendência
na imanência e a imanência na transcendência, constituindo isto a superior
forma de realização da unidade da mesmidade. Enquanto transcendência
total, a mesmidade é absolutamente consciente de toda a sua imanência.
Enquanto imanência não é consciente da sua transcendência. Enquanto
imanência ela é, simplesmente. Contudo, todo o seu potencial de
transcendência e, como tal, de consciência está presente. A sua unidade
essencial compele a criação e cada ente em particular a um movimento de
retorno a si mesma. Este movimento é alimentado pela energia amorosa
primordial que está presente na mais pequena partícula da criação e pela
via da experiência. O mesmo é dizer que é pela via do amor, da consciência
e da luz. A mesmidade é, portanto, origem, destino e caminho de si mesma.
Pela sua unidade intrínseca a mesmidade não é susceptível de fragmentação
e, por isso, está totalmente presente em tudo e em cada partícula da criação.
Na sua transcendência tudo conhece, tudo vive, de tudo é consciente. Na sua
imanência, não. Esta faz parte do seu próprio desconhecido, do qual,
contudo, enquanto transcendente a si por via da consciência amorosa, é
consciente. Pela sua unidade intrínseca, a mesmidade não pode deixar de
estar totalmente presente em tudo. Em cada partícula da existência está
presente todo o fulgor, todo o potencial da mesmidade. Apesar de totalmente
presente em cada partícula, esta última mais não é do que uma mera
possibilidade da mesmidade e, como tal, limitada, constrangida. Contudo,
como nela toda a mesmidade está presente, esse constrangimento não é
absoluto mas relativo e, como tal, ultrapassável, necessariamente
ultrapassável.
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65. A escassez é
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oceanos. O nascimento e a morte de uma flor é uma forma de evolução que
não se perde na morte. Nas sementes que largou e que deram origem a
novas flores está presente essa experiência de nascimento, glória e morte.
Nas partículas que resultam da sua desintegração está gravada essa
experiência. Essas partículas, por essa experiência acumulada estão um
pouco mais próximas da realização plena. O vento leva-as e a
contemplação da mesmidade integra-as com outras partículas que, pela sua
experiência, conseguem gerar formas mais completas, capazes de vivências
mais ricas. Pela unidade intrínseca de cada ente, manifestada na forma, o
conjunto dessas partículas forma um todo, tornando-se, cada uma, o
conjunto de todas, atingindo assim um nível de complexidade cada vez
maior. Desta forma, cada partícula absorve as vivências daquela nova
forma mais complexa em que se integrou, que vive em si e da qual faz parte
integrante. As partículas constituem um novo ente, uma forma e esse mesmo
ente transmite-lhes a sua própria complexidade, fazendo-as evoluir e
tornando-as mais aptas a virem a constituir um outro ente mais complexo,
mais rico em possibilidades. Mais rico em possibilidades significa mais
próximo de realizar em si a possibilidade infinita da mesmidade na sua
essência.
70. O amor tende para si mesmo. Tudo na existência tende para a unidade
que é a expressão e realização desse amor.
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amor da mesmidade, se alimenta do amor da mesmidade e caminha em
direcção ao amor da mesmidade. Em cada ser que se estrutura de uma
forma mais complexa e mais amorosa revela-se a própria mesmidade na
busca de si mesma, na sua dinâmica de realização absoluta [de si mesma].
O encontro da mesmidade consigo própria gera luz [em si própria e para si
própria]. Quanto mais profundo e completo o encontro mais intensa a luz.
Seres mais ricos e complexos, gerados segundo o princípio de ordem
inerente à mesmidade, são seres com maior intensidade luminosa. O acto de
luz é o acto resultante do encontro da mesmidade consigo própria, através
do qual, por contemplação, dá forma a si própria, perante si própria e por si
própria. A forma, por conseguinte, é luz. De um ponto de vista relativo,
quanto maior a complexidade, maior a luz. De um ponto de vista absoluto,
forma é forma, qualquer que seja a sua complexidade; e forma é luz. O que
varia segundo a complexidade é a consciência própria da luz. Contudo,
como consciência é luz, mais consciência implica mais luz. A partícula mais
elementar tem potencial infinito de luz, advindo daí a sua capacidade de
integrar formas cada vez mais complexas. O seu potencial de luz vai-se
tornando acto de si próprio na medida em que, pela experienciação, se vai
tornando cada vez mais consciente de si.
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do curto alcance do olhar humano pois, em absoluto, não há
sustentabilidade fora da mesmidade. A afirmação de Cristo “Eu sou o
caminho, a verdade e a vida” não tem um mero sentido moral, conforme
habitualmente tem sido considerado. Tem, sim, o mais profundo e radical
alcance ontológico.
Tudo aquilo que se apresenta perante uma consciência não é mais do que
ela mesma objectivada perante si própria. O diálogo entre a consciência e
aquilo que se lhe apresenta é um diálogo que tende à celebração de uma
nova unidade, regresso a si própria. É o diálogo entre a consciência e a
manifestação de si mesma. A consciência perante a realidade é como a
consciência perante de si mesma, objectivada. Os conteúdos da consciência
são o espelho de si própria, pois são produzidos em si e por si própria. Sem
estes conteúdos a consciência não teria dinâmica nem possibilidade de
evolução. É em função deste diálogo entre o “si” e aquilo que contrapõe a
“si” (produzido por si) que a consciência se resolve a si mesma, gerando
novas unidades, novas integrações, novos níveis de auto-transparência.
Neste diálogo consigo própria vai-se progressivamente auto-testemunhando
e é esse movimento que a leva numa dinâmica ascendente a libertar-se dos
seus conteúdos, o que permite a celebração de uma nova unidade. Este
movimento ascensional é possível pelo terceiro vértice do triângulo. Este é o
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princípio de ordem, unidade pura, que celebra continuamente novos níveis
de unidade entre opostos (ou contrapostos), isto em direcção ao reencontro
pleno da mesmidade consigo própria. Nesse momento, os dois restantes
vértices do triângulo integram-se no terceiro, numa coincidência perfeita
num único ponto. A matriz de toda a criação (que é a mesma da evolução,
pois entre ambas não há distinção) é trina. No acto da criação temos o “si”
da mesmidade que, por desdobramento contemplativo, gera o perante “si”,
gerando os dois, por sua vez, numa unidade perfeita, o universo criado. Esta
matriz preside ao processo de evolução de todo o universo criado, desde a
mais elementar partícula, até à forma mais complexa. Tudo é e tem
consciência ainda que não necessariamente uma consciência discursiva nos
termos a que habitualmente se chama consciência. É a consciência que o
electrão tem do núcleo que o mantém na órbita daquele. O núcleo é o
espelho do electrão. O núcleo é estável, é positivo; o electrão é instável, é
negativo. Cada um é a expressão inversa do outro. Cada um constitui a
complementaridade, é o factor de completude do outro, em função da
unidade que é o átomo.
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poderia pensar, a unidade da forma não é um factor de encerramento em si
própria, mas um factor de liberdade, de libertação de si e, como tal, de
abertura ao mundo. Aquilo que não é completo existe preso em si mesmo
pela necessidade de se realizar a si mesmo, após o que, e somente após o
que, se liberta de si abrindo ao mundo. Esta transcendência de si própria
pela sua própria unidade, que constitui uma dinâmica essencial da criação,
é o motor de toda a evolução. Inscreve-se na natureza amorosa essencial da
mesmidade, de abertura e expansão crescente, por um lado e de máxima
integração e celebração de unidades sucessivamente mais abrangentes, por
outro. Pela sua unidade a forma transcende-se e abre-se ao mundo, criando
condições para se integrar em formas mais ricas e complexas. É a
realização de si que gera a transcendência de si.
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nasceram. O pior e único sofrimento, que está na base de todos os outros, é
o sofrimento da consciência divina encarcerada no efémero, no ente.
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lado, ao falar centralmente do amor, Jesus propõe a realização de uma
totalidade de cada um em si mesmo, por via do amor e da aceitação. A via
de Buda é uma via de integração pela consciência; a via de Jesus é uma via
de integração pelo amor. Dado que amor e consciência são expressões do
mesmo, ambas as vias conduzem à iluminação. O amor proposto por Jesus,
pela sua incondicionalidade, absolutiza tudo e, com isso, relativiza também.
Absolutiza tudo enquanto divino, presença e imagem de Deus. Relativiza
tudo uma vez que o amor, na sua máxima expressão, nada discrimina, nada
distingue e, com isso, relativiza. A inalterabilidade da consciência realiza-se
em Jesus, por via do amor e em Buda, por via da consciência da
transitoriedade. O núcleo, o objectivo é alcançar esse estado de consciência
amorosa, inalterada que é consciência pura, transcendente, da própria
mesmidade e, com isso, a iluminação. Chama-se iluminação pois é o acto
supremo de luz. É o acto de reencontro da mesmidade consigo própria.
Neste acto, tal como no de criação, a mesmidade encontra-se a si própria
num acto amoroso. Aí, a energia do amor introduz fulgor na transparência
da consciência.
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tempo. É um mero caminho de consciência, de recuperação de uma auto-
transparência perdida.
Como a mesmidade está totalmente presente em cada ente, também nele está
a sua transcendência. Este elemento é gerador da dinâmica de evolução que
conduz os entes ao longo de um percurso que culmina com despertar da
mesmidade neles, enquanto eles.
Tal como na mesmidade, também nos entes existem estas duas dimensões – o
mundo interior e o mundo exterior. É a partir da sua interioridade que a
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mesmidade se manifesta. O mundo interior é um único e é nele que se
encontra a unidade transcendente da consciência da mesmidade. De alguma
forma o mundo interior pode ser visto como o interior do sol, a partir do
qual se manifestam os raios. Uma vez manifestado no exterior, cada raio
diverge dos demais, sendo, num certo sentido, individualizável. Tem
consciência de si enquanto raio e sente-se individualizado, muito embora
possa reconhecer provir de uma fonte da qual provêm todos os demais. Se
só fosse vista a projecção dos raios numa parede escura, sem ser vista a sua
trajectória a partir do sol, dir-se-ia que eram meros pontos de luz, vendo-se
eles próprios como tal, como individualidades. Se um raio encetasse um
caminho, através de si mesmo, de retorno até ao sol, ao atingi-lo,
compreender-se-ia como um dos infinitos olhares que este dirige ao mundo.
Sem deixar de se compreender como raio, compreender-se-ia como sol.
Compreenderia que a única forma que este tem de olhar o mundo é
tornando-se raio. Compreenderia igualmente que quem queria olhar o
mundo era o próprio sol e que, para o poder fazer, se confinado a um raio.
Compreenderia que a solidão que havia sentido enquanto raio, não era a
sua solidão, mas sim a solidão do próprio sol que, ao confinar-se num raio,
tinha saudades de ser todos os raios e que, por isso, havia encetado todo
aquele caminho de regresso. Compreenderia igualmente que, como a sua
trajectória é absolutamente rectilínea, havia regressado pelo mesmo
caminho. Como ele é um raio e não um ponto, foi ele mesmo o caminho de si
próprio para o mundo, bem como o caminho de si próprio para si próprio.
Compreenderia que não havia caminho fora de si, fora do sol.
Compreenderia que o caminho de saída era um caminho em que
continuamente se tinha criado, gerando novas exterioridades de si mesmo e
que o caminho de regresso o era através de si mesmo, um caminho interior.
Compreenderia que, embora se tivesse reencontrado, não havia deixado de
ser raio, dado que se via na mesma como raio projectado no mundo. Ver-se-
ia mesmo como um raio muito mais luminoso pois então realizaria de forma
mais profunda o próprio sol. Perceberia que outros raios, movidos pela
mesma solidão, o procuravam. Num acto de profunda compaixão manter-se-
ia como raio ao serviço dos outros raios, para que todos pudessem
regressar. Mas regressar como, se ele nunca havia deixado de ser raio?
Então, o regresso não era uma auto-aniquilação de si próprio como tantas
vezes havia temido. Compreenderia então que o regresso tinha sido um acto
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de consciência, realizado por via do seu próprio mundo interior.
Compreenderia que ele próprio era a porta entre o sol e o raio e que, dessa
forma, havia realizado o equilíbrio entre os seus dois mundos e que esse era
o ponto de perfeição, pois não há sol sem raios, nem raios sem sol. A partir
desse momento veria que os outros eram tão brilhantes quanto ele. A sua
aparente palidez resultava do facto de serem o sol, não terem realizado num
acto de consciência a união do relativo com o absoluto. Eram raios mas não
tinham ainda sido iluminados pela consciência plena de si, como sol.
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