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“Meça suas palavras na Internet,

parça”
12/08/2015 | 15h14
Por Mariana Giorgetti Valente
Por Dennys Antonialli, Francisco Brito Cruz e Mariana Giorgetti Valente

Se você já reclamou de algum produto ou serviço nas redes sociais, como Facebook ou
Twitter, você deve saber que geralmente funciona. Cada vez mais, as empresas se
preocupam com a sua reputação na rede e designam funcionários responsáveis por
acompanhar os comentários e postagens associados a elas para oferecer respostas ou
prestar satisfações.

Mas o alvo nem sempre é uma empresa. Pode ser que a sua reclamação seja dirigida a
um funcionário ou atendente específico: uma situação de grosseria, descaso ou mau
atendimento. Nesses casos, é preciso ter mais cuidado para que a reclamação não vire
ofensa ou ataque pessoal.

Foi o que aconteceu com um professor de um clube esportivo no interior de São Paulo.
Em dezembro de 2013, ele foi alvo de um comentário na página do clube no Facebook,
postado por um dos associados, que se disse indignado por acreditar que o professor não
teria ajudado uma senhora a entrar na piscina para a aula de hidroginástica. Por isso,
chamou-o de “vagabundo” e “safado”:

“fiquei indignado, quando uma senhora bem idosa tentava descer a escada da piscina e o
VAGABUNDO que estava instruindo, não foi capaz de ajudar a senhora a descer a
escada para participar da aula e foi amparada por outras duas senhoras, e o cara olhando
de fora…sabe esta safado (sic) que só esta empregado porque esta velhinha sem valor
aos olhos dele deve se associada a muitos anos e sustenta empregos e mesmo assim não
é tratada como deveria”.
Segundo o professor, a senhora estava acompanhada de sua filha, que teria ajudado a
mãe a entrar na piscina, não tendo havido maiores problemas durante a aula. Mas não
demorou para que o comentário postado no Facebook chegasse aos ouvidos dos
responsáveis pelo Departamento Pessoal do clube, que pediu esclarecimentos ao
funcionário.

Depois de tudo explicado, o problema se tornou o comentário raivoso do associado, que


ofendia o professor e continuava disponível na Internet. O clube decidiu então, alegando
descumprimento do estatuto, suspender o associado por um mês. Não satisfeito, o
professor ofendido decidiu mover um processo judicial contra ele, alegando violação ao
seu direito à honra e à intimidade (art. 5, X, da Constituição Federal), e pedindo uma
indenização por danos morais.  Em primeira instância, o associado foi condenado pagar
indenização no valor de R$ 15.000,00.

A decisão

Documento
 foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo   PDF
, que considerou ter havido abuso por parte do associado. A corte destacou que nem
sempre os casos de troca recíproca de ofensas ensejam indenização por dano moral, já
que, “no calor da discussão”, as pessoas são capazes de pegar bem pesado.

Buscou ser razoável: considerou que se tratava de um caso em que estavam em questão
dois direitos individuais, o de liberdade de expressão e o de inviolabilidade da honra e
da imagem do indivíduo, que precisavam ser sopesados. Ponderou e entendeu que os
comentários do associado sobre o professor foram vexatórios e humilhantes, além de
desproporcionais, pois ridicularizaram-no publicamente, expondo-o inclusive diante de
outros colegas de profissão.

Afirmou, ainda, que a identidade do professor estava clara na postagem, e também não
colocou em dúvida a identidade do associado, que tampouco negou autoria do
comentário, afirmando somente que já tinha sido suficientemente penalizado, com a
suspensão pelo clube, e que o pagamento de R$ 15.000,00 configuraria enriquecimento
sem causa ao professor.

Não existe direito que seja absoluto. É claro que queremos nosso direito de reclamar, de
“xingar muito no Twitter”, e seria absurdo, do ponto de vista da liberdade de expressão,
que fôssemos proibidos de nos exaltar. Pelo nosso sistema jurídico, ainda, a regra é que
discursos não sejam limitados previamente, mas possam sofrer controle posterior, caso
o direito seja abusado. Isso é importante, para que a crítica e a opinião possam circular
livremente.

Quem determina se houve abuso ou não é o juiz, que deve considerar o contexto e as
circunstâncias de cada caso, e sem se deixar guiar pelo mero uso de palavras mais
agressivas ou exaltadas. Em todo caso, tanto na Internet como fora dela, a mensagem
do Mc Brinquedo pode ajudar: meça suas palavras.

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