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CURADORIA ESPECIAL

E ATUAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA

Por Fernanda Evlaine

SUMÁRIO
2
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS...........................................................................................................................3
1.1. Teorias acerca da natureza jurídica da curadoria especial...................................................................5
2 PODERES DO CURADOR ESPECIAL...............................................................................................................6
3 INCAPAZ.....................................................................................................................................................8
3.1. Incapaz sem representante legal.............................................................................................................8
3.2. Incapaz cujos interesses colidem com o do seu representante................................................................9
4 RÉU PRESO REVEL (art. 72, II, 1ª parte, CPC).............................................................................................10
5 RÉU REVEL CITADO POR EDITAL OU HORA CERTA (art. 72, II, 2ª parte, CPC).............................................10
6 CITANDO IMPOSSIBILITADO DE RECEBER CITAÇÃO (art. 245 CPC)............................................................11
7 AUSENTE (art. 671, I CPC)..........................................................................................................................12
8 INCAPAZ QUE CONCORRE COM SEU REPRESENTANTE NA PARTILHA QUANDO HOUVER COLISÃO DE
INTERESSES (art. 671, II CPC)............................................................................................................................12
9 INTERDIÇÃO..............................................................................................................................................13
10 AÇÃO POSSESSÓRIA COM INTEGRANTES HIPOSSUFICIENTES NO POLO PASSIVO (art. 554, §1º, e 565,
§2º, CPC)..........................................................................................................................................................14
11 BIBLIOGRAFIA UTILIZADA......................................................................................................................15
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1
ATUALIZADO EM 15/07/2018

CURADORIA ESPECIAL

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A Curadoria Especial é o instituto de Direito Processual que visa salvaguardar os interesses jurídicos
daqueles que se encontram em situação peculiar de vulnerabilidade, proporcionando-lhes uma proteção
especial para que seus direitos possam ser eficazmente defendidos em juízo.
A todos é assegurado o direto de escolha de um defensor de confiança, como expressão dos princípios
do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. No entanto, há casos em que a pessoa se
encontra em situação de vulnerabilidade sem que haja defensor constituído para que resguarde seus interesses
jurídicos.
Ocorre que, na atual ordem constitucional, é inadmissível que aqueles que se encontram em
determinadas situações de hipossuficiência não tenham um defensor apto a proteger seus direitos em juízo, o
que violaria os princípios retromencionados, bem como o do acesso à justiça.
É para esses casos que a lei estabelece a figura do curador especial, que tem como objetivo defender os
interesses da parte vulnerável no processo. Assim, tem-se que o curador especial exerce um munus público
dentro do processo.
A curadoria especial vem prevista principalmente no art. 72 do Código de Processo Civil. Vamos dar uma
olhada?2

Art. 72.  O juiz nomeará curador especial ao:

I - incapaz, se não tiver representante legal ou se os interesses deste colidirem com os daquele, enquanto
durar a incapacidade;

II - réu preso revel, bem como ao réu revel citado por edital ou com hora certa, enquanto não for
constituído advogado.

Parágrafo único.  A curatela especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.

Como determina o parágrafo único do artigo 72 do CPC, bem como art. 4º, XVI da Lei Complementar nº
80/94, a curadoria especial é atribuição institucional da Defensoria Pública. É importante salientar, no entanto,
que se trata de atribuição atípica, uma vez que a função principal da Defensoria é a defesa dos interesses dos
necessitados, conforme art. 134 da CF/88.

1
As FUCS são constantemente atualizadas e aperfeiçoadas pela nossa equipe. Por isso, mantemos um canal aberto de
diálogo (setordematerialciclos@gmail.com) com os alunos da #famíliaciclos, onde críticas, sugestões e equívocos,
porventura identificados no material, são muito bem-vindos. Obs1. Solicitamos que o e-mail enviado contenha o título do
material e o número da página para melhor identificação do assunto tratado. Obs2. O canal não se destina a tirar dúvidas
jurídicas acerca do conteúdo abordado nos materiais, mas tão somente para que o aluno reporte à equipe quaisquer dos
eventos anteriormente citados.
2
Há outros dispositivos que tratam da curadoria especial, que serão destrinchados mais à frente.
4
Portanto, por se tratar de função atípica, o exercício da curadoria especial pela Defensoria Pública
prescinde de comprovação da hipossuficiência financeira, bastando que haja o enquadramento entre as
hipóteses legais. Nesse caso, a atuação do órgão é legitimada em virtude da hipossuficiência jurídica das
pessoas elencadas no dispositivo legal.

#PISANOFREIO #APROFUNDAMENTO #DEOLHONAORAL: Apesar da distinção clássica entre funções típicas e


atípicas da Defensoria Pública, muitos doutrinadores entendem que, com a inclusão das funções atípicas no
texto constitucional, a atuação da DP em curadoria especial pode ser classificada como função típica, de forma
que a antiga dicotomia estaria superada.

Destarte, embora usual, é de certa forma impróprio falar em nomeação de Defensor Público para atuar
como curador especial, tendo em vista que tal atribuição não advém de ordem judicial, mas da força da lei, não
havendo que se falar, pelo mesmo motivo, em cessação da nomeação ou designação da Defensoria Pública por
ordem judicial.
Caso o magistrado entenda que a defesa não está sendo exercida de forma satisfatória, ou discorde de
eventual despacho de não-atuação do Defensor Público, por exemplo, não lhe cabe desconstituir a “nomeação”,
ou designar Defensor diverso, mas poderá enviar Ofício à Corregedoria da Defensoria Pública, para que os fatos
sejam apurados e eventuais medidas cabíveis tomadas internamente, de forma a assegurar a independência
funcional da instituição. Trata-se ato privativo do Defensor Público!
“TÁ, MAS E QUANDO NÃO TEM DEFENSORIA?”
Bom, nos casos em que não houver Defensoria Pública instalada na Comarca, a função de curadoria
especial será dada a qualquer pessoa capaz cujos interesses não conflitam com os da parte a ser defendida. No
entanto, o mais comum é que o juiz nomeie advogado dativo, pois este já poderá defender os interesses da
parte em juízo, ao passo que, caso haja nomeação de pessoa sem capacidade postulatória, seria necessário
ainda a contratação de um advogado para o caso concreto.

#ATENÇÃO: Rogéria Fagundes Dotti3, entretanto, ressalta que, nos casos do inciso II (réu preso revel e réu citado
fictamente sem advogado constituído), tendo em vista que o objetivo da lei é justamente a defesa dos
interesses processuais do réu ausente, o curador deverá possuir capacidade postulatória.

#NÃOCONFUNDA: A Curadoria Especial não se confunde com a tutela ou a curatela. A curadoria especial é
instituto de direito processual, e possui finalidade específica, que, uma vez atingida, esgota a atuação do
curador especial. A tutela e curatela, por sua vez, são institutos de direito material, e têm como objetivo uma
regência geral de pessoas e bens.

3
Breves Comentários do Novo Código de Processo Civil, p. 255
5
#NÃOCONFUNDA #APROFUNDAMENTO: A Curadoria Especial do processo civil também não se confunde com a
curadoria especial do processo criminal. Isto porque há distinção entre curadoria especial lato sensu - que
engloba todos os casos de atuação da DP que dispensam a investigação de hipossuficiência financeira ; e stricto
sensu - que é a regulamentada pelo CPC. #FOCANATABELA:

CURADORIA ESPECIAL LATO SENSU CURADORIA ESPECIAL STRICTO SENSU


Processo criminal
Promoção dos Direitos Humanos
Demanda coletiva de hipervulneráveis
CPC
CPC

1.1.Teorias acerca da natureza jurídica da curadoria especial


Existem, majoritariamente, três teorias para explicar a atuação da curadoria especial: Teoria da
representação, Teoria da substituição processual e Teoria distintiva4
A teoria da representação afirma que o curador atua em juízo em nome do curatelado, pleiteando e
defendendo seus direitos. Haveria, portanto, atuação em nome alheio. No entanto, o instituto da representação
processual se destina a suprir a incapacidade absoluta ou relativa em juízo, de forma que não se revela
adequado abrigar todas as hipóteses de atuação da curadoria especial sob esta modalidade, como se todos
fossem incapazes.
A teoria da substituição processual, por sua vez, afirma que o legislador teria conferido ao curador
especial legitimidade extraordinária para atuar, em nome próprio, na postulação e defesa dos interesses dos
curatelados em juízo. O curador especial seria, assim, substituto processual do curatelado. Porém, nos casos de
defesa dos interesses dos incapazes, o indivíduo incapaz permanece como parte da relação processual, não
havendo que se falar em substituição. Inadequada também, portanto, esta teoria.
A teoria distintiva, por fim, afirma que a natureza jurídica da curadoria especial apresenta variação
conforme a hipótese legal de atuação. No caso de atuação em prol do interesse de incapazes, teria natureza
jurídica de representação processual. Nos casos de atuação em benefício de réu ausente ou segregado, a
natureza jurídica da curadoria especial seria de parte extraordinariamente legitimada, substituindo, assim, o
curatelado no processo. É com esta teoria que se identificam os doutrinadores.

2 PODERES DO CURADOR ESPECIAL

O curador especial assume os ônus, faculdades, direitos e deveres relativos à situação jurídica ativa ou
passiva em que se encontre a parte, podendo, portanto, praticar os atos processuais típicos inerentes à tal
posição. Sublinhe-se que, se não possuir capacidade postulatória, deverá, naturalmente, constituir advogado
que o represente. O curador especial, portanto, tem poder para apresentar contestação, produzir provas,
interpor recursos, etc.
4
ESTEVES, Diogo e SILVA, Franklyn Roger Alves. Fredie Didier Jr. (Coor.) Defensoria Pública, Salvador: Juspodivm, 2015, pp.
157-162. (Coleção Repercussões do Novo CPC)
6

#ATENÇÃO Importantíssimo salientar que o curador especial não possui o ônus da impugnação específica, ou
seja, poderá apresentar contestação por negativa geral, sem que com isso sejam presumidos verdadeiros os
fatos alegados na inicial, nos termos do art. 341, parágrafo único, do CPC.

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA O STJ já pacificou, em sede de recurso repetitivo, que o curador especial é


dispensado de oferecer garantia ao Juízo para opor embargos à execução 5. Essa mesma lógica deve ser aplicada
à sistemática da impugnação ao cumprimento de sentença e à execução fiscal. Ou seja, CURADORIA ESPECIAL =
desnecessidade de garantia do juízo.

#OLHAOGANCHO: Impugnação ao cumprimento de sentença e garantia do juízo


O Novo CPC modificou o tratamento da impugnação ao cumprimento de sentença, permitindo que seja
interposta, em qualquer caso, mesmo sem a garantia do juízo, mas o oferecimento de depósito, penhora ou
caução suficientes suspende os atos executórios. 6
Ei, coach, mas como era mesmo antes do NOVO CPC?
MODALIDADE CPC OLDSTYLE NOVO CPC
DESNECESSIDADE DE GARANTIR O
JUÍZO
IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE NECESSIDADE DE GARANTIR O
*Execução é suspensa com a
SENTENÇA JUÍZO
garantia (desde que haja fumus +
periculum)
DESNECESSIDADE DE DESNECESSIDADE DE GARANTIR O
GARANTIR O JUÍZO JUÍZO
EMBARGOS À EXECUÇÃO COMUM *Execução é suspensa com a *Execução é suspensa com a
garantia (desde que haja fumus garantia (desde que haja fumus +
+ periculum) periculum)
EMBARGOS À EXECUÇÃO EM NECESSIDADE DE GARANTIR O NECESSIDADE DE GARANTIR O
EXECUÇÃO FISCAL JUÍZO JUÍZO

5
STJ, REsp n. 1.110.548/PB.
6
Atenção: estamos falando aqui da regra geral e não dos casos de curadoria especial.
7
#OLHAOGANCHO: Execução Fiscal e necessidade de garantia do juízo por parte do beneficiário de assistência
gratuita e assistido da Defensoria.
Em caso de execução fiscal, o STJ entende7, com base no princípio da especialidade, que mesmo o beneficiário
da assistência gratuita (mas não em caso de curadoria especial, que, como vimo, dispensa a garantia), deve
oferecer garantia do juízo como pressuposto de conhecimento dos embargos. STJ. 2ª Turma. REsp 1.437.078-RS,
Info 538. No entanto, matérias de ordem pública e que não exijam dilação probatória, antigamente arguidas
por meio de exceção de pré-executividade, podem ser arguidas sem garantia, por simples petição nos autos de
execução.8

Voltemos...
O curador especial não tem poderes de disposição de direitos da parte, uma vez que não é titular do
direito material discutido. Não poderá, portanto, renunciar, transigir, ou reconhecer a procedência do pedido,
por exemplo.

* #DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA #IMPORTANTE: O curador especial tem legitimidade para propor reconvenção


em favor do réu cujos interesses está defendendo. STJ. 4ª Turma. REsp 1.088.068-MG, Rel. Min. Antonio Carlos
Ferreira, julgado em 29/08/2017 (Info 613).

Ademais, o curador especial faz jus aos honorários advocatícios oriundos de sua atuação, exceto quando
se tratar de defensor público, tendo em vista que este é remunerado mediante subsídio em parcela única,
cabendo à Defensoria Pública (e não ao Defensor), se for o caso, os honorários sucumbenciais, nos termos do
art. 85, §19 do CPC*, ressalvada a hipótese em que ela venha a atuar contra pessoa jurídica de direito público de
que faça parte, ou que integre a mesma Fazenda Pública. 9

#SELIGANASÚMULA Súmula 421, STJ: Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando
ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença. 10

7
Embora esse seja o entendimento do STJ, boa parte da doutrina e dos tribunais pátrios vêm entendendo pela
desnecessidade dessa garantia, já que tal exigência fulmina qualquer possibilidade do exercício do direito de defesa.
#TeseInstitucionaldaDP
8
Para que o devedor possa oferecer embargos, exige-se a garantia do juízo mesmo que ele seja beneficiário da assistência
judiciária gratuita? SIM. O STJ assim entende, com base no princípio da especialidade. O art. 3º da Lei 1.060/1950 (que
prevê a assistência judiciária gratuita) é cláusula genérica, abstrata e visa à isenção de despesas de natureza processual,
como custas e honorários advocatícios, não havendo previsão legal de isenção de garantia do juízo para embargar.   Desse
modo, em conformidade com o princípio da especialidade das leis, o disposto no art. 16, § 1º, da Lei 6.830/1980 deve
prevalecer sobre o art. 3º, VII, da Lei 1.060/1950, o qual determina que os beneficiários da justiça gratuita ficam isentos dos
depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao
exercício da ampla defesa e do contraditório. STJ. 2ª Turma. REsp 1.437.078-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em
25/3/2014 (Info 538).
9
STJ. 5ª Turma. REsp 1.102.459-RJ, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ-RJ), julgado em
22/5/2012.
10
Atenção: diante da autonomia orçamentária das Defensorias Públicas, é tese institucional, que deve ser suscitada em
segunda fase e prova oral, a superação do referido entendimento sumulado, por não haver mais espaço para se falar em
qualquer confusão patrimonial.
8

* No entanto, vale destacar a nova posição do STF sobre o assunto #VAIDESPENCAREMPROVA:

* #SELIGANAJURISPRUDÊNCIADOSTF: Agravo Regimental em Ação Rescisória. 2. Administrativo. Extensão a


servidor civil do índice de 28,86%, concedido aos militares. 3. Juizado Especial Federal. Cabimento de ação
rescisória. Preclusão. Competência e disciplina previstas constitucionalmente. Aplicação analógica da Lei
9.099/95. Inviabilidade. Rejeição. 4. Matéria com repercussão geral reconhecida e decidida após o julgamento
da decisão rescindenda. Súmula 343 STF. Inaplicabilidade. Inovação em sede recursal. Descabimento. 5. Juros
moratórios. Matéria não arguida, em sede de recurso extraordinário, no processo de origem rescindido. Limites
do Juízo rescisório. 6. Honorários em favor da Defensoria Pública da União. Mesmo ente público. Condenação.
Possibilidade após EC 80/2014. 7. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. Agravo a
que se nega provimento. 8. Majoração dos honorários advocatícios (art. 85, § 11, do CPC). 9. Agravo interno
manifestamente improcedente em votação unânime. Multa do art. 1.021, § 4º, do CPC, no percentual de 5% do
valor atualizado da causa. STF. Plenário. AR 1937 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/06/2017,
Acórdão Eletrônico DJe-175 DIVULG 08-08-2017 PUBLIC 09-08-2017.

Resume aê, coach:


Calma, e #FOCANATABELA
HAVERÁ CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS
SITUAÇÃO FÁTICA
ADVOCATÍCIOS?
Defensor Público NÃO
SIM – honorários pagos pelo ente estatal com base
Advogado dativo
no art. 5º, LXXIV da CF
HAVERÁ CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS
SITUAÇÃO FÁTICA
SUCUMBENCIAIS?
SIM – caso em que os honorários serão destinados ao
Defensoria Pública Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública
(#CITAQUEDÁAUDIÊNCIA)
NÃO – SÚMULA 421 STJ

* Após as ECs 45/2004, 74/2013 e 80/2014, passou a


Defensoria pública – atuação contra pessoa jurídica
ser permitida a condenação do ente federativo em
de direito público de que faça parte, ou que integre
honorários advocatícios em demandas patrocinadas
a mesma Fazenda Pública (DPU em juízo contra
pela Defensoria Pública, diante de autonomia
União ou autarquia federal, p ex)
funcional, administrativa e orçamentária da
Instituição. STF. Plenário. AR 1937 AgR, Rel. Min.
Gilmar Mendes, julgado em 30/06/2017.

Vamos analisar agora cada uma das hipóteses de incidência da curadoria especial.
9

3 INCAPAZ11

3.1. Incapaz sem representante legal

A curadoria especial do incapaz sem representante legal está prevista no art. 72, I, 1ª parte, do CPC, e
art. 142, parágrafo único, 2ª parte, do ECA. No entanto, atente para o fato de que o ECA trata apenas da
incapacidade oriunda da menoridade.
Incapaz é aquele que não possui aptidão para praticar direta e pessoalmente os atos da vida civil, nos
termos dos arts. 3º e 4º do Código Civil. O incapaz será representado ou assistido por seus pais, tutor ou
curador, como determina o art. 71 do CPC.
No entanto, mesmo quando este não tiver representante legal, seus interesses jurídicos estarão a salvo,
posto que o legislador determinou que lhe seja nomeado curador especial, sobretudo tendo em vista que os
atos praticados pelo incapaz não representado ou assistido serão nulos ou anuláveis, respectivamente, de forma
que a curadoria especial resguarda ainda o direito de acesso do incapaz à justiça.
É importante salientar ainda que a atuação do curador especial ocorrerá tanto no polo passivo como no
polo ativo, e ainda nos casos de intervenção de terceiros, e perdurará enquanto perdurar a incapacidade.

3.2. Incapaz cujos interesses colidem com o do seu representante

Previsão do art. 72, I, 2ª parte do CPC e art. 142, parágrafo único, 1ª parte do ECA, tem-se que o juiz
nomeará curador especial ainda nos casos em que os interesses deste forem colidentes com os interesses de
seu representante legal.
Nesse caso, embora o incapaz esteja representado, a colidência de interesses faz com que o
representante não tenha condições de exercer legitimamente sua função de representante ou assistente.
Segundo Pontes de Miranda12, conflito de interesses “é qualquer situação em que o ganho de causa por parte do
incapaz diminuiria, direta ou indiretamente, qualquer interesse econômico ou moral do pai, tutor ou curador”.
Exemplo clássico é o da ação negatória de paternidade movida pelo pai em face do filho menor, ou a
ação de investigação de paternidade póstuma, movida pelo filho menor em face dos herdeiros de seu falecido
genitor, entre os quais pode constar a genitora do menor.
Aqui, igualmente, a atuação do curador especial poderá ocorrer tanto no polo passivo como no polo
ativo, e perdurará enquanto perdurar a incapacidade.
11
É importante traçar aqui breves comentários acerca da mudança de paradigma trazida pelo Estatuto da Pessoa Com
Deficiência do que diz respeito aos incapazes.
A partir da entrada em vigor do Estatuto, as pessoas com deficiência passam a ser consideradas plenamente capazes,
havendo uma desconstrução ideológica. A pessoa com deficiência passa a ser considerada, em uma perspectiva igualitária,
plenamente capaz, mesmo com a necessidade de se utilizar institutos protetivos como a curatela e a tomada de decisão
apoiada. À luz dos arts. 2º, 6º e 84 do Estatuto, a incapacidade civil no Brasil foi reconstruída. Todos os incisos do art. 3º do
CC foram revogados, sendo que, atualmente, a única hipótese de incapacidade absoluta no ordenamento jurídico é o caso
dos menores impúberes.
Para aprofundamento do tema, recomendamos a leitura do material Ciclos “Principais reflexos do Estatuto da Pessoa com
Deficiência”.
12
PONTES DE MIRANDA, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I. Rio de Janeiro: Forense, 1973, pp. 286/287.
10

#DEOLHONAJURISPRUDÊNCIA #AJUDAMARCINHO
Já decidiu o STJ que, a priori, não é necessária a nomeação de curador especial na ação de destituição de
poder familiar proposta pelo Ministério Público:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO INCAPAZ DE ALTERAR O JULGADO. DESTITUIÇÃO DE
PODER FAMILIAR. MINISTÉRIO PÚBLICO. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL DA DEFENSORIA PÚBLICA AOS
MENORES. DESNECESSIDADE. ECA. ART. 201, INCISOS III E VIII. SÚMULA Nº 83⁄STJ. INCIDÊNCIA. JULGADO DE
ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. NOVA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL PEDIDO PARA
PREVALÊNCIA DO ENTENDIMENTO ANTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. 1. Compete ao Ministério Público, a teor do
art. 201, III e VIII, da Lei nº 8.069⁄90 (ECA), promover e acompanhar o processo de destituição do poder familiar,
zelando pelo efetivo respeito aos direitos e às garantias legais assegurados a crianças e adolescentes. 2.
Resguardados os interesses da criança e do adolescente, não se justifica a nomeação de curador especial na
ação de destituição do poder familiar. 3. Estando o acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência
pacífica desta Corte, tem incidência a Súmula nº 83⁄STJ, aplicável por ambas as alíneas autorizadoras. 4. A
requerida modulação de efeitos não merece acolhimento, inexistindo previsão legal para tal postulação no
julgamento de recurso especial, ausente a declaração de inconstitucionalidade de lei. Diante disso, neste feito, a
eventual mudança de jurisprudência. 5. Agravo regimental não provido. STJ – Terceira Turma. AgRg no REsp
1177622/RJ, rel. Min. RICARDO BILLAS BÔAS CUEVA, DJe 29/04/2014

*#NOVIDADELEGISLATIVA: A Lei nº 13.509, de 2017 consubstanciou o julgado acima, modificando o Estatuto da


Criança e do Adolescente, fazendo constar que:
Art. 162. § 4º. Quando o procedimento de destituição de poder familiar for iniciado pelo Ministério Público, não
haverá necessidade de nomeação de curador especial em favor da criança ou adolescente.

4 RÉU PRESO REVEL (art. 72, II, 1ª parte, CPC)

Em razão da situação peculiar de vulnerabilidade do réu preso, o legislador determina também a


atuação do curador especial para defesa de seus interesses, assegurando o contraditório e o devido processo
legal, até porque, nesta hipótese, o não comparecimento do réu a juízo se dá em virtude de inação involuntária,
posto que se encontra recolhido ao cárcere.

#ATENÇÃO A curadoria especial do réu preso se dará qualquer que seja a modalidade de prisão, seja por
sentença condenatória transitada em julgado, prisão cautelar, ou mesmo prisão civil. No entanto, não terá
cabimento quando o réu estiver gozando de liberdade, ainda que provisória, livramento condicional, ou regime
aberto. Deve haver, portanto, efetivo cerceamento da liberdade.
11
É importante destacar também que a atuação do curador especial em favor do réu preso que não
apresenta defesa afasta os efeitos da revelia, o que torna impróprio o termo “revel” utilizado pelo legislador.
Ademais, entende-se necessária a nomeação de curador especial nos casos em que o advogado do réu preso
abandona a causa e este não constitui novo causídico.

5 RÉU REVEL CITADO POR EDITAL OU HORA CERTA (art. 72, II, 2ª parte, CPC)

A citação por edital se dará nos casos elencados no artigo 256 do CPC, ao passo que a citação por hora
certa ocorre nas hipóteses do artigo 252.
#NEVERFORGET
A citação por edital, com vocês já sabem, é uma modalidade de citação ficta, ou seja, presume-se que o
destinatário tenha tomado conhecimento do conteúdo desta pela publicação do edital.
A citação com hora certa, por sua vez, será realizada quando o Oficial de Justiça, tendo procurado por duas
vezes o citando em seu domicílio ou residência, sem o encontrar, suspeita que ele esteja se ocultando para não
receber a citação.

#RELEMBRANDO
EDITAL HORA CERTA
Citando desconhecido ou incerto Oficial de Justiça procura por duas vezes
+
Lugar ignorado, incerto ou inacessível (após
Suspeita de ocultação
esgotamento dos meios disponíveis para localização
ENTÃO
do réu) Intima qualquer pessoa da família ou vizinho e
retorna no dia útil seguinte para citação na hora
Demais casos expressos em lei
designada

O réu citado fictamente não comparece em juízo por inação involuntária, tendo em vista que não teve
conhecimento da citação, atuando em seu favor o curador especial. Assim, não há como confundir essa hipótese
com a revelia, vez que nesta o réu citado pessoalmente, por inação voluntária, não responde ao chamamento
da justiça.

6 CITANDO IMPOSSIBILITADO DE RECEBER CITAÇÃO (art. 245 CPC)

Suspeitando o Oficial de Justiça de que o réu é mentalmente incapaz ou está impossibilitado de receber
o ato citatório, certificará o ocorrido, lavrando certidão (art. 245, §1º). O juiz competente, então, nomeará
médico especializado para realizar perícia no prazo de cinco dias (art. 245, §2º), sendo tal diligência dispensada
caso a família apresente declaração do médico do citando que ateste sua incapacidade (art. 245, §3º).
12
#ATENÇÃO #OLHAOGANCHO Deve-se ter em mente que, com o advento do Estatuto da Pessoa com
Deficiência, bem como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, norma de estatura
constitucional, todos os dispositivos referentes a pessoas com deficiência devem ser interpretados à luz
daqueles diplomas.

Se constatada a capacidade do citando, o Oficial de Justiça realizará a citação normalmente, seguindo o


processo seu curso regular. Em caso de incapacidade, nomear-se-á curador, respeitando-se a preferência legal
(art. 1.775 CC – CAD), exclusivamente para a causa.
Havendo colidência de interesses, deverá o réu ser representado por curador especial. Portanto, a
atuação do curador especial no caso do art. 245 se dará de forma subsidiária, quando o citando incapaz não
tiver quem o represente em juízo.

7 AUSENTE (art. 671, I CPC)

Aqui o Código de Processo Civil se utiliza do termo “ausente” em sua concepção lexicográfica, e não no
sentido técnico-jurídico do termo. Isto porque ao ausente, ou seja, aquele que desapareceu de seu domicílio
sem deixar notícias (arts. 22 e seguintes CC), será nomeado curador, para que lhe sejam administrados os bens,
sendo esta a figura de direito material.
Já sabemos que a curadoria especial é instituto de direito processual e não material. Portanto, não há de
se dar ao art. 671 a acepção jurídica do termo “ausente”, mas seu sentido comum, daquele que não está
presente.
Por exemplo, em processo de inventário e partilha, sendo impossível a localização de algum dos
sucessores, ou estando este em local inacessível (e portanto, ausente), será feita sua citação por edital, e
nomeado curador especial.

8 INCAPAZ QUE CONCORRE COM SEU REPRESENTANTE NA PARTILHA QUANDO HOUVER COLISÃO DE
INTERESSES (art. 671, II CPC)

É importante ressaltar que não é em qualquer caso de inventário e partilha que haverá colisão de
interesses entre incapaz e seu representante. Por vezes seus interesses convergem. Dessa forma, apenas haverá
nomeação de curador especial em caso de comprovada colidência de interesses.
O curador especial, assim, não atua como fiscalizador do interesse dos incapazes. Tal munus é
desemprenhado pelo Ministério Público. A atuação do curador especial apenas se dará em falta de
representação legítima, quando comprovado o conflito de interesses.

#ATENÇÃO O art. 72, I do CPC tem espectro mais amplo do que o art. 671, II, uma vez que aquele fala de
qualquer situação em que haja conflito do incapaz com seu representante, ao passo que este trata apenas do
13
processo de inventário e partilha. Ademais, é comum que no processo de inventário haja convergência de
interesses entre incapaz e representante, o que não é verdade em processos em que estes ocupam polos
opostos (ação de investigação de paternidade, p ex). Dessa forma, a colidência de interesses de que trata o art.
72, I é presumida, sendo imperiosa a atuação da curadoria especial em face da menor sombra de possiblidade
de conflito de interesses.

9 INTERDIÇÃO

Antes de adentrar na sistemática do CPC, que ainda faz referência à interdição, é preciso relembrar os
ensinamentos advindos do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

#ATENÇÃO #OLHAOGANCHO O Estatuto da Pessoa com Deficiência modificou o instituto da curatela, além de
instituir a tomada de decisão apoiada. Corrente majoritária da Doutrina entende que o instituto da interdição
desapareceu completamente, apesar do CPC se utilizar da expressão “interdição” em seu artigo 747.  Com a
tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência tem sua autonomia privada resguardada. O instituto da
tomada de decisão apoiada é preferencial em relação à curatela. Há dois conselheiros que auxiliam a pessoa
com deficiência na tomada de decisões.

Para aprofundamento do tema, recomendamos a leitura do material Ciclos “Principais reflexos do


Estatuto da Pessoa com Deficiência”. Por hora, trataremos da curadoria especial nos termos trazidos pelo CPC,
mas fazendo a ressalva doutrinária provocada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência referente ao processo de
interdição.
No processo de interdição, o legitimado ativo (art. 747 CPC) formulará petição demonstrando a
incapacidade do interditando para administrar seus bens e, se for o caso, para praticar atos da vida civil (art.
749, CPC). Recebida a exordial, o magistrado ordenará a citação e interrogará o interditando.
Ora, tratando-se de pessoa realmente incapacitada, é esperado que não haja apresentação de defesa.
Portanto, não seria admissível que o interditando ficasse sem defesa num processo que pode levar à retirada de
sua capacidade civil. Portanto, o CPC determina que, caso o interditando não constitua advogado, ser-lhe-á
nomeado curador especial.
#DEOLHONADOUTRINA Aqui cabe trazer uma crítica formulada por Diogo Esteves e Franklyn Roger Alves Silva 13:
entende o doutrinador que, embora o CPC trate apenas dos casos de ausência de advogado constituído, tendo
em vista que no início do processo de interdição não é possível determinar adequadamente se o interditando
possui ou não capacidade plena para os atos da vida civil, inclusive de firmar procuração ad judicia, e que tal
informação não será certa senão tardiamente, mediante prolação de sentença, e levando em consideração
ainda que ao Ministério Público não cabe mais a representação judicial do incapaz, mas apenas a atuação como
custos legis, deve ser nomeado curador especial ainda que o réu constitua advogado, para garantia da

13
ESTEVES, Diogo e SILVA, Franklyn Roger Alves. Fredie Didier Jr. (Coor.) Defensoria Pública, Salvador: Juspodivm, 2015,
p.156. (Coleção Repercussões do Novo CPC)
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legitimatio ad processum. Ademais, não deve o procurador constituído ser tido como represente processual do
interditando, mas mero mandatário deste.

10 AÇÃO POSSESSÓRIA COM INTEGRANTES HIPOSSUFICIENTES NO POLO PASSIVO (art. 554, §1º, e 565,
§2º, CPC)

Dando concretude ao paradigma constitucional de atuação da DP na defesa dos direitos coletivos dos
necessitados, bem como na promoção dos Direitos Humanos, o Novo CPC inovou ao prever a necessidade de
intimação da Defensoria Pública em caso de ação possessória ajuizada em face de grande número de pessoas
entre as quais figurem pessoas em situação de hipossuficiência econômica. Repara:

§ 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas
a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais,
determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de
hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública.

O dispositivo é de importância ímpar, tendo em vista a flagrante situação de vulnerabilidade em que se


encontram pessoas hipossuficientes que são demandadas em ações possessórias, casos que infelizmente têm se
multiplicado nos grandes centros brasileiros.
Sendo a propriedade e a moradia Direitos Humanos fundamentais, previstos na Constituição Federal e
na Convenção Americana de Direitos Humanos, assim como o contraditório e a ampla defesa, verifica-se grande
acerto do legislador em prever a hipótese de curadoria especial quando os demandados em ação possessória
encontram-se em situação de hipervulnerabilidade.
É importante ressaltar ainda que a hipossuficiência prevista no CPC não deve ser interpretada
unicamente como hipossuficiência econômica, mas também do ponto de vista organizacional, quando há
dificuldade do grupo de pessoas em se organizar para promover a defesa de sua posse em juízo.
Trata-se de hipótese de atuação em legitimação extraordinária, visto que a Defensoria Pública atuará
em favor não só daqueles citados por edital, mas de toda a coletividade hipossuficiente demandada, em
substituição processual.
Destaca-se ainda a enorme relevância da prerrogativa do curador especial de apresentar defesa por
negativa geral no presente caso, tendo em vista os inerentes obstáculos à obtenção e gerenciamento de
informações relativas a todos os assistidos envolvidos na ação possessória.
Norma semelhante, só que mais específica, é encontrada nos casos de litígio coletivo pela posse de
imóvel proveniente de esbulho ou turbação, caso em que, tendo a ação sido ajuizada há mais de ano e dia da
turbação ou esbulho, o juiz designará audiência de mediação, e intimará a Defensoria Pública quando houver
parte beneficiária da gratuidade da justiça, nos termos do art. 565 §2º, CPC.
15
Embora aqui o Código utilize a expressão “parte beneficiária da gratuidade da justiça”, deve-se
interpretar o artigo no mesmo sentido da regra mais ampla prevista no art. 554, §1º, a saber, de que a atuação
da DP ocorrerá em favor de pessoas em situação de hipossuficiência.

11 BIBLIOGRAFIA UTILIZADA

DIDIER JÚNIOR, Fredie (Coor.) Defensoria Pública, Salvador: Juspodivm, 2015, (Coleção Repercussões do Novo
CPC)

FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima; CUNHA, Maurício Ferreira. Novo Código de Processo Civil para concursos – 6 ed.
rev., ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2016.

RÉ, Aluísio Iunes Monti Ruggeri. Manual do Defensor Público. – 3 ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Juspodivm,
2016.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil comentado. Salvador: Juspodivm, 2016.

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