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Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim
aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus (Mt 7,21). Nisto conhecemos
que amamos os filhos de Deus: se amamos a Deus e guardamos os seus
mandamentos (I Jo 5,2).
Cristo amando como ele nos amou (Jo 13,34-35) 5, assim como os valores instrumentais do
seguimento de Cristo pobre, casto e obediente. (78-79)
Os constitutivos essenciais de uma pessoa com vocação compreendem estruturas, conteúdos e
dialéticas. A estrutura do eu-ideal é constituído pelos ideais pessoais e propostos pela vocação
cristã que o indivíduo escolhe realizar. O eu-atual é formado pelo conceito que a pessoa tem de si,
de seus atos singulares e como membro de um grupo, pelas características da própria personalidade
que conhece de si e aquelas que ainda não conhece.
Os conteúdos do eu são os valores ideais da sua existência – valores finais – e modos ideais de
comportamento. A união com Deus, o seguimento de Cristo, os valores da pobreza, castidade e
obediência constituem o ponto de referencia para entender a autotranscendência do amor da vocação
cristã (79-80).
As necessidades são tendências à ação fruto de um déficit do organismo ou de potencialidades
naturais inerentes que buscam realizar-se (80); elas podem ser neutras ou dissonantes à vocação
cristã chegando a formar inconsistências. É dos valores e das necessidades pessoais que se vem a
formar as atitudes da pessoa. A atitude é um estado mental pronto a um responder organizado
segundo as experiências e que exerce uma influência diretiva sobre a atividade mental e física; é um
modo estável de responder e atuar segundo as diversas situações que a vida oferece (80-81).
A atitude de ajuda aos outros pode ter seu fundamento nos valores da caridade cristã formando uma
consistência, um acordo entre o eu ideal e o eu-atual ou ser motivado por uma dependência afetiva
formando uma inconsistência, onde, mais que dar, busca-se receber. Nesta dialética do eu, o eu-ideal
é sempre consciente, mas o eu-atual pode ser consciente ou até subconsciente. A relação entre os
valores, atitudes e necessidades formam quatro tipos de consistências ou inconsistências psíquicas
(AVC 1, 205-209; 295-306; AVC 2, 32-34). A inconsistência psicológica se dá quando uma
necessidade é compatível com os valores, mas não com a atitude habitual. Uma in/consistência pode
ser central, se este atributo do eu é importante para o eu ideal e para a consecução dos próprios fins
(fim vocacional), para o eu-atual (enquanto objeto de forte atração ou repulsão afetiva, seja no nível
consciente ou inconsciente) e se existe uma inadequação das forças para controlar suas
manifestações. Aplicado isso a vocação, a primeira dimensão tem como horizonte próprio os valores
autotranscendentes e conduzem a virtude ou ao pecado. A segunda dimensão tem como horizonte
próprio os valores autotranscendentes e naturais combinados dispondo ao bem real ou ao bem
aparente. As três dimensões podem ter uma influência sobre a liberdade do homem para a
autotranscendência teocêntrica e para a vocação, seja de forma consciente (a primeira), de modo
subconsciente (a segunda) ou de forma patológica (a terceira) (84).
O sistema motivacional humano pode favorecer ou dificultar ao chamado vocacional influindo sobre
a liberdade e sobre o sistema de simbolização, principalmente os valores objetivos de Deus e os
valores subjetivos.
2.3. Aplicação da teoria à vocação
Podemos distinguir quatro passos do caminho vocacional: o dom e mistério do chamado de Deus
que fala ao coração humano mediante a graça e convida a ordenar a vida no amor de Deus; a
cooperação do homem que busca conhecer melhor este mistério. São percebidos por favor divino,
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Amai-vos uns aos outros. Como eu vos tenho amado, assim também vós deveis
amar-vos uns aos outros. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos
amardes uns aos outros (Jo 13,34-45).
valores antes não percebidos gerando toda a ressonância emotiva. O terceiro momento é a decisão de
empreender ou não o caminho optando pelos ideais vocacionais. O último momento é o processo de
integração deste eu em todos os elementos da personalidade no exercício diário de uma liberdade
efetiva que se transcende com a vida de Cristo.
Para que se dê esta integração, é necessária que os valores autotranscendentes sejam integrados às
disposições conscientes a virtude e a santidade; superado o pecado pela virtude, o segundo nível de
progresso se refere ao servir a Deus segundo um bem real implicando as dimensões conscientes e
subconscientes. Finalmente se busca a união de amor com Deus por si mesmo chegando a uma
entrega total de si ao Outro e aos outros com liberdade de si mesmo internalizando os valores de
Cristo. É necessário que o eu-ideal se integre ao resto da personalidade apropriando-se (fazendo-os
próprio) dos valores de Cristo, aceitando-os pelo valor que tem em si mesmo, não tanto pelas
vantagens que poderiam trazer a mim (87-88).
A maturidade na primeira dimensão (horizonte dos valores transcendentes e ideais) que exige
considerar não só o conteúdo (o quê) dos valores, mas também sua função (o porquê), aceitando e
vivendo-os pela sua importância intrínseca não tanto pela vantagem pessoal para favorecer a
internalização ou interiorização. A imaturidade na segunda dimensão atua como resistência a
internalização; o candidato não é consciente das suas frustrações e por isso as repete buscando
algum tipo de compensação na sua opção vocacional criando assim um círculo vicioso pois essas
gratificações não solucionam sua ansiedade. Também favorece a internalização ter expectativas
realistas e adequadas.
Pelo contrário, dificulta o crescimento vocacional a complacência no qual extrinsecamente se aceita
ou muda uma atitude ou valor para conseguir uma vantagem ou evitar um dano e a identificação no
qual se adotam atitudes e ideais não tanto pelo valor intrínseco, mas porque são importantes para a
pessoa que o adota (o tema da pureza de intenção). S. Inácio de Loyola diz à respeito: é preciso que
todos se esforcem por ter a intenção reta não apenas acerca do estado de sua vida, mas ainda de
todas as coisas particulares, sempre pretendendo nelas puramente o servir e o comprazer a Divina
Bondade por si mesma e pelo amor e pelos benefícios tão singulares para os quais nos predispôs
[internalização ou identificação internalizante], mas que por temor de penas ou esperança de
prêmios [complacências], embora disso devam também obter ajuda; e que sejam exortados amiúde
a buscar em todas as coisas Deus, Nosso Senhor, afastando, na medida do possível, de si o amor a
todas as criaturas [identificação não internalizante], por colocar esse amor no criador delas, a Ele
em todas amando e a todas Nele, conforme sua santíssima vontade (92).
A motivação humana é teleológica (em vista de um fim...) e axiológica (... para a realização de um
valor) porque tende a autotranscendência teocêntrica; quando o cristão escolhe sua vocação, tende
mais a autotranscender-se que a autorealizar-se. Por isso, a infidelidade nas atitudes
(comportamentos concretos) suscita menos sentimento de culpa que a infidelidade nos valores; por
isso também descuidamos mais das atitudes que dos valores. Porém, quanto mais uma pessoa for
inconsistente, será mais influenciado pelo ambiente.
3. Entrevista e avaliação vocacional
Para poder ajudar a discernir e a compreender melhor o chamado, se busca recolher os dados
pessoais necessários seguindo o método de entrevista profissional. Assim se pode compreender o
ambiente onde se origina a vocação e identificar os sinais vocacionais no quadro de toda a vida ao
longo do seu desenvolvimento humano, intelectual, religioso e vocacional. Isto é essencial para quem
faz o acompanhamento vocacional, mas também para que a pessoa possa compreender melhor o
próprio chamado.
3.1. Metodologia da entrevista: entrevista, testes psicológicos, elaboração de dados, relatório final
Na entrevista, é necessário: fazer anotações transcrevendo com a maior fidelidade literal possível, ir
em profundidade, fazer um resumo final junto com o candidato vendo o seu parecer. Não esquecer de
tomar em conta as impressões da entrevista.
- Ficha de identificação
- situação vocacional presente e evolução vocacional (verificando a presenta/ausência dos temas
vocacionais, da relação com Jesus/Deus); problema que lhe preocupe no presente; perguntas abertas
existenciais
- história familiar: ver sistematicamente as figuras paternas e maternas e outras figuras parentais
(caso hajam: avós, tios); ver a relação com eles, com os outros (socialibilidade), valores, educação,
autonomia, autoestima, confiança, as manifestações afetivas (infância, adolescência, presente), suas
manipulações e agressividades
- história pessoal: sentimentos, pensamentos, imagem de si, amizades (relações entre iguais,
superiores, inferiores, sua importância para a pessoa, a capacidade de amar/confiar, entregar-se e
estabelecer relações profundas); mundo acadêmico e laboral; êxitos e fracassos, responsabilidade,
perseverança.
- sexualidade: identidade sexual segura (?) e maturidade psicossexual, manifestações sexuais em
pensamentos e atos que reflitam a necessidade psicológica de dependência, exibicionismo,
agressividade/domínio; qual a influência da Cultura de permissivismo, falta de compromisso e de
educação para o amor/doação; integração da sexualidade (vocação ao amor) em toda a pessoa. O
celibato pelo Reino dos céus requer uma opção serena, livre e madura/consciente sem repressão nem
complexos nem expectativas ingênuas sobre a facilidade e fidelidade com tal compromisso.
- traços de personalidade manifestados na visão de si (autoconceito), ideais, projetos, em
pensamentos, sentimentos e comportamentos:
* Visão de si (eu-ideal): como é agora (eu-atual consciente), o que gosta/desgosta de si, como os
outros lhe veem; qual é a concepção (o que significa para ti?) e vivencia dos valores/ideais cristãos e
religiosos
* Sentimentos mais frequentes (quais são, de onde vem, o que se faz com eles?): tristeza, alegria,
amor/ódio, ciúme, inveja, frustração, culpa, ansiedade
* Uso do tempo: como o utiliza?, quais são seus valores (seus 3 maiores desejos, o que faria se
ganhasse na loteria, como se vê em 10 anos?)
* Identificação: com quais personalidades/pessoas se identifica?
* Sonhos: quais são seus sonhos a “olhos aberto” e quando dorme?
- narração completa da história da vocação (após a narração da história pessoal): família, início,
medo, falhas, fidelidade, alegria/paz, certezas
- Experiência de Deus: como é Deus para a pessoa? como reza? Como vive sua vida cristã,
sacramentos, compromisso pastoral/apostólico (não só o que faz, mas qual a ressonância interior de
significado, por quê o faz?)?
- atração carismática (o quê e por que?), opinião sobre o Instituto, sobre a formação, votos, vida
comum, evangelização, carisma.
3.2. Segunda entrevista
É possível ter outra entrevista para completar/verificar a informação, gerar sentimentos, sentido,
confrontação/interpretação e proposta. Também se pode aplicar algum teste psicológico
3.3. A avaliação vocacional
Em vista a elaborar os dados obtidos na entrevista e ver suas qualidades. Sabendo que a graça de
Deus, a vontade pessoal e os ideais/valores não são medidos pelos testes psicológicos, busca-se um
diagnóstico de toda a vida vivida do candidato.
Busca-se conhecer o eu ideal (valores), eu-atual/real (necessidades), as dialéticas (virtude/pecado,
consistência/inconsistências, normalidade/psicopatologia) e comprovar se o valor/ideal cristão-
vocacional é real/constatado, vivo e vivido/operante. Passos:
- indagar possível presença de impedimentos, irregularidade canônica e psicopatologica
- descobrir quais são seus principais valores (que lhe movem na vida, pois esta é a base que guiará
suas decisões; um valor predominante se transforma num critério existencial de vida), ideais,
atrações predominantes (transcendentes, religioso [união com Deus], cristão [seguimento de Cristo],
consagrado/vocacional [seguimento de Cristo em pobreza, castidade, obediência, vida fraterna
comum, missão/ministério]).
- Maturidade cristã e vocacional (como estes valores são vivido afetiva e efetivamente?): suas
virtudes/pecados, chamada a santidade e progressiva transformação em Jesus, reação a Palavra viva
de Deus, resposta a graça divina...
*1ª dimensão: internalização/interiorização dos valores: valor feito próprio por motivo da
essência do mesmo valor e não por outros fins (complacência, identificação)
*valor das provas (como se viveu os momentos de provações?): verifica a autenticidade da
presença e da consistência dos valores. A vocação é germinal (chamada a crescer) e
vulnerável (ao ambiente porque se apoia em valores evangélicos e naturais).
* in/consistências vocacionais: qual é a relação entre os valores e as necessidades, eu-
ideal/atual, coerência de vida; se o valor conhecido e querido é vivido embora com a fraqueza
humana esporádica e com o combate espiritual... ou não.
*2ª dimensão. Bem real ou aparente? Quais são suas motivações naturais, suas necessidades
básicas e a relação entre as duas?
+necessidades dissonantes: agressividade, dependência afetiva, evitar o perigo,
complexo de inferioridade, exibicionismo, gratificação sexual, necessidade de
humilhação, inferioridade exagerada.
- se inconscientes, podem impedir a autotranscendencia vocacional; se
conscientes, levam a luta espiritual.
- uma necessidade pode gerar muitas atitudes afins
- qual a relação entre os principais valores vocacionais e as inconsistências?
Na vida real, qual é mais forte?
-qual a necessidade dissonante central que leva a inconsistência central? Tem
alguma dinâmica não controlada pelo sujeito? O valor vocacional é
significativo/importante para o eu atual?